Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 167/2025-T
Data da decisão: 2025-10-19  IRS  
Valor do pedido: € 9.543,87
Tema: IRS – Isenção prevista no artigo 37.º, n.º 1, alínea b), do EBF – Pensões de Reforma – NATO.
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SUMÁRIO

1. O prazo de caducidade de três anos, previsto no n.º 2, do artigo 45.º, da LGT não tem lugar nos casos em que só através do cruzamento de dados e de outras informações pode a AT realizar a sua ação de controle às Declarações de Rendimentos (Modelo 3 – IRS).

 2. O benefício fiscal consagrado na alínea b), do n.º 1, do artigo 37.º, do EBF, apenas abrange os rendimentos pagos em razão do exercício efetivo de funções, rendimentos que decorrem ou estão associados à prestação efetiva de trabalho, encontrando-se, por isso, excluídos os rendimentos pagos a título de reforma, quando já não subsiste a relação laboral.

 

DECISÃO ARBITRAL

 

A árbitra, Sónia Martins Reis, designada pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formar o Tribunal Arbitral, constituído em 30 de Abril de 2025, acorda conforme segue:

 

 

I.              Relatório

 

A..., NIF ... e B..., NIF ..., com domicílio fiscal sede na Rua ..., n.º ..., ..., ...-... Barcarena, doravante designados por “Requerentes”, vieram deduzir pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1 a) e 10.º e 15.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária ou “RJAT”), em conjugação com os artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março. 

 

É demandada a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante referida por “AT” ou “Requerida”. 

 

Constitui pretensão dos Requerentes o pedido de anulação da nota de Liquidação de IRS n.º 2024...no valor de € 9.543,87, assim como o reconhecimento ao pagamento dos juros indemnizatórios.

 

Como causa de pedir, alegam, em suma, vários vícios substantivos.

 

(i) A caducidade do direito à liquidação; 

(ii) Erro sobre os pressupostos de Direito ao não considerar isenta de tributação a pensão de reforma paga pela NATO.

 

Sobre a caducidade da liquidação em crise nos autos vem, sucintamente, dizer que é um erro imputável à AT, uma vez que foi a própria que deu a indicação aos Requerentes de que os rendimentos da pensão de reforma da NATO, auferida pela Requerente A..., tinham de ser declarados no anexo H.

 

E que em sentido inverso e contradizendo as suas próprias informações, teria vindo em 2024, alegar que a pensão em causa deveria ter sido antes declarada no anexo J.

 

E sempre se estará perante um erro da AT, uma vez que a pensão da NATO é para ser efetivamente declarada no anexo H, e não no J.

 

E que mesmo que não se estivesse perante um erro da AT, isto é, se a pensão da NATO fosse para ser declarada no anexo J, sempre se estaria, diz, perante um erro no preenchimento da declaração de IRS, nos termos e para os efeitos do n.º 2 do artigo 45.º da Lei Geral Tributária.

 

E que nos termos do referido n.º 2 do artigo 45.º da LGT, no caso de erro evidenciado na declaração do sujeito passivo, o prazo de caducidade do direito à liquidação é de três anos.

 

Estando em causa o IRS do ano de 2020, sustentam que a respetiva liquidação lhes deveria ter sido notificada até ao final do ano de 2023 e que como apenas foram notificados da Nota de Liquidação apenas no dia 23 de outubro de 2024, a mesma já caducou.

 

No que se refere ao erro nos pressupostos de Direito, alegam que a questão essencial é determinar se as pensões pagas pela organização internacional NATO a partir da Bélgica se inserem no âmbito de aplicação da alínea b) n.º 1 do artigo 37. do EBF.

 

Sendo que no seu entender a resposta deve ser positiva, desde logo no âmbito do Princípio da Confiança dos contribuintes, uma vez que foi em conformidade com essas informações da própria AT que determinaram a forma de apresentação da declaração de IRS, no que à pensão da NATO diz respeito.

 

E que os Requerentes se limitaram a atuar em conformidade com os sinais exteriores produzidos pela própria Administração Tributária sobre a matéria, com as referidas informações, produzidas pela própria AT sobre o tema nos anos anteriores, que foram suficientemente concludentes para nelas depositarem legitimamente a sua confiança.

 

Em segundo lugar vêm chamar à colação o artigo 19.º da Convenção de Ottawa (Convenção sobre o Estatuto da Organização do Tratado do Atlântico Norte, dos Representantes Nacionais e do Pessoal Internacional, de 30 de setembro de 1951) e o artigo 7.º do Protocolo de Paris (Protocolo sobre o Estatuto dos Quartéis Generais Militares Internacionais).

 

O primeiro parágrafo do artigo 19. ° da Convenção de Ottawa determina que os funcionários da NATO "serão isentos de impostos sobre os vencimentos e emolumentos que lhes forem pagos pela Organização, na qualidade de funcionários desta”.

 

E que no seu entender, os termos vencimentos e emolumentos englobarão as situações de pensões de reforma. 

 

Sustenta, tal como já acima referimos quanto à Convenção de Ottawa, que os termos vencimentos e emolumentosenglobarão as situações de pensões de reforma e tal não deixa de ser um vencimento.

 

Por um princípio de igualdade fiscal, desde logo estabelecido no artigo 13.º e no n.º 1 do artigo 104.º da Constituição da República Portuguesa, se os rendimentos e as pensões dos funcionários e outros agentes da União Europeia poderão estar isentos de IRS, por igualdade de circunstâncias também o deverá estar a pensão da NATO auferida, vem aduzir.

 

Conclui dizendo que a pensão auferida pela Requerente A... deverá ser abrangida, segundo os Princípio da Igualdade Fiscal, da Legalidade e da Confiança que, como indicado, encontram consagração constitucional, respetivamente, nos artigos 13.º e no n.º 1 do artigo 104.º e no artigo 8.º e no artigo 2.º, todos da CRP.

 

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi apresentado em 19-02-2025, tendo o Tribunal Arbitral sido constituído em 13-08-2025 e tendo o processo seguido a sua normal tramitação.

 

Em conformidade com os artigos 5.º, n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a) e 11.º, n.º 1, alínea a), todos do RJAT, o Exmo. Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou a árbitra do Tribunal Arbitral Singular, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável. 

 

As Partes, notificadas dessa designação, em 08-04-2025, não se opuseram, nos termos dos artigos 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) e 8.º do RJAT, 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD. 

 

A Requerida ou AT veio contestar por impugnação alegando, em síntese, como segue.

 

Vem dizer que os Requerentes não têm qualquer razão.

 

Que a aplicação do prazo de caducidade do direito à liquidação de 3 anos, estabelecido no n.º 2 do artigo 45.º da LGT, ao invés do prazo-regra de 4 anos estabelecido no n.º 1 do mesmo preceito legal, pressupõe a subsunção do caso dos autos ao “caso” de “erro evidenciado na declaração do sujeito passivo”.

 

E que o erro a que se refere o nº 2 deste art. 45º é “aquele que é detetável mediante simples análise da declaração.”.

 

E que no caso sub judice é a Divisão de Gestão da NATO/OTAN, nos termos dos art.42.º do Regulamento das Pensões das Organizações Coordenadas e do art.15.º do Regulamento de Pensões DCPS, que procede à comunicação à AT das declarações individuais das pensões e ajustes fiscais pagos aos pensionistas daquela Organização a residir em Portugal.

 

E que foi no âmbito dessa comunicação e respetivo cruzamento da informação prestada com os dados constantes da base dados da AT que se constatou a existência de uma situação de omissão declarativa por parte da Requerente, A... .

 

Que a AT está, no caso sub judice, dependente de cruzamento de informação, de documentação externa e que se a deteção do erro obrigar à consulta de informação não contida na declaração, ainda que em poder da AT, tal prazo (do art.45.º, n.º 2) é inaplicável (cita o Ac. TCAS, de 21/05/2020 proferido no Processo n.º 194/12.2BELRS).

 

Pelo que, sustenta, o ato de liquidação em causa foi efetuado dentro do prazo de caducidade previsto no n.º 1 do art.45.º da LGT e, portanto, é um ato legal.

 

Já sobre o invocado erro nos pressupostos de Direito, vem dizer que as organizações que se encontram abrangidas pelo artigo 37.º do EBF são organizações cujo conceito é diferente dos Estados e que são exemplo paradigmático dessas entidades a ONU, OCDE, NATO ou FMI.

 

Que tanto a alínea a) como a b) do n. º1 do supra referido normativo legal prescrevem que as renumerações auferidas por pessoas ao serviço daquelas organizações ficam isentas em sede de IRS, nos termos do direito internacional aplicável ou desde que haja reciprocidade.

 

Apesar de não existir na lei uma definição única do conceito de “renumeração” invoca o CIRS e o Código de Trabalho para conseguir fazer uma delimitação do mesmo.

 

Que o conceito de renumeração deve ser entendido como compensação monetária, que inclui tanto vencimentos fixos como variáveis.

 

E que para além da renumeração Principal/Direta (salário, vencimento) é ainda elemento integrante do conceito de renumeração, as remunerações complementares/suplementar que, nos termos do contrato de trabalho ou dos usos, assumirem carácter regular ou habitual. Verifica-se, no seu entendimento, que o conceito de “renumeração” pressupõe sempre o pagamento de trabalho e não abrange as situações de pensões de reforma.

 

Pelo exposto, entendem que não deve ser aplicável o benefício fiscal previsto no art.37.º, n. º1 do EBF às pensões de reforma.

 

E que a partir do momento em que a Requerente se aposentou, os valores pagos pela NATO/OTAN têm a natureza de rendimentos de pensões e são enquadráveis na categoria H, deixando de beneficiar da isenção prevista no art.37.º, n.º 1 do EBF.

 

Pugna, a final, pela improcedência da ação arbitral e a manutenção da liquidação em crise nos autos.

 

Entendeu o Tribunal, por despacho arbitral, dispensar a realização da reunião do Tribunal Arbitral prevista no artigo 18.º do RJAT, bem como as alegações escritas.

 

 

II.            Saneamento

 

O Tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a) e 11.º, n.º 1, todos do RJAT. 

 

As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas (cf. artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março). 

 

O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo de 90 dias previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT. 

 

Não foram identificadas questões que obstem ao conhecimento do mérito.

 

 

III.      Fundamentação 

 

1.     Dos Factos

 

Com relevo para a decisão, importa atender aos seguintes factos que se consideram provados:

 

  1. Em 19-02-2025, os Requerentes apresentaram pedido de pronúncia arbitral – cf. registo de entrada no SGP do CAAD. 
  2. O presente pedido arbitral tem por objeto a decisão proferida no âmbito do procedimento tributário n.º... que deu origem a um processo de contraordenação por omissões e inexatidões na declaração de IRS correspondente ao ano de 2020, e ainda à correção da declaração IRS do ano de 2020 que originou a Nota de Liquidação de IRS n.º 2024... no valor de € 9.543,87. Essa alteração oficiosa deu origem à Nota de Liquidação de IRS n.º 2024... correspondente ao ano de 2020, no montante de € 9.543,87, a qual foi notificada aos Requerentes a 23/10/2024. – cf. PA junto aos autos e Documento n.º 1 junto pelos Requerentes com o seu PPA.
  3. Em 21/06/2021, os Requerentes entregaram a declaração de IRS referente ao ano 2020, n.º ...-2020-... -..., que foi liquidada em 23/06/2021 (liquidação n.º 2021...) tendo originado um valor a pagar de € 1.190,31 – cf. PA junto aos autos.
  4. Foram declarados rendimentos de categoria A (trabalho por conta de outrem), rendimentos da categoria F (rendimentos prediais), rendimentos da categoria G (mais-valias e outros incrementos patrimoniais) e Anexo H (benefícios fiscais e deduções), sendo que neste último foi declarado o montante de € 32.015,14, para efeitos de determinação da taxa, auferidos na categoria de pensões de reforma pagas pela NATO/OTAN, a partir da Bélgica – cf. PA junto aos autos.
  5. A referida declaração anual de rendimentos Modelo 3 de 2020 dos Requerentes, A... e B..., foi selecionada para efeitos de análise de verificação da declaração de rendimentos de fonte estrangeira, pensões de reforma, pagos ou colocados à disposição pela NATO/OTAN, a partir da Bélgica – cf. PA junto aos autos.
  6. No âmbito dessa análise, a AT considerou que os Requerentes declararam o montante de €32.015,14, pagos ou colocados à disposição pela NATO/OTAN, no anexo H, quadro 4, quando os mesmos deveriam ter sido declarados no anexo J, quadro 5.º – cf. PA junto aos autos.
  7. Para efeitos de justificação/correção desse erro foram os Requerentes notificados, através do ofício n.º ..., de 24/05/2024 (entregue em 27/05/2024- Portal CTT), da intenção de se proceder ao preenchimento do montante referido no anexo J, quadro 5A código H01, País 056, subentendendo-se que esse valor deveria ser retirado do anexo H, quadro 4 – cf. PA junto aos autos.
  8. Na sequência dessa notificação, os Requerentes apresentaram, a 12/06/2024, uma exposição escrita, acrescida de cópias de diversa documentação, à Direção de Finanças de Lisboa, alegando que o rendimento em causa, por ter sido pago ou colocado à disposição pela NATO/OTAN, ficaria isento nos termos do art.37.º, n. º1, al. b) do EBF. – cf. PA junto aos autos.
  9. A Direção de Finanças de Lisboa propugnou no seu despacho de 20/06/2024 pelas seguintes propostas: - Elaboração de documento único de correção com as seguintes correções: inscrição no montante de €32.015,14 no quadro 5Ado anexo J, Código H01, país 056, e à eliminação do valor de €32.015,14do quadro 4 do anexo H, por ser inaplicável; - Instauração de processo de contraordenação, nos termos do art.54.º, 59.º, 60.º e 67.º, todos do RGIT (ou a instauração de processo de redução de coima, nos termos do art.29, a 30.º, ambos do RGIT, se, entretanto, os contribuintes, em sede de resposta à notificação final, submeterem declaração de substituição com as propostas de correções recomendadas) – Cf. PA junto aos autos.
  10. Os Requerentes foram notificados da decisão final proferida pela Autoridade Tributária e Aduaneira no âmbito do procedimento tributário n. ...2024... cf. Documento n.º 2 junto pelos Requerentes com o seu PPA.
  11. Os Requerentes procederam ao pagamento da nota de liquidação em crise nos autos, mas sob protesto, não prescindindo da discussão sobre a legalidade da mesma. Cf. Documento n.º 4 junto pelos Requerentes com o seu PPA.

 

 

2. Factos Não Provados

 

Não resulta dos autos prova para firmar, como invocam os Requerentes, de que a Requerente A... se enquadra como civil internacional da NATO. 

 

3. Fundamentação da Decisão da Matéria de Facto

 

Quanto aos factos essenciais a matéria assente encontra-se conformada de forma idêntica por ambas as partes e a convicção do Tribunal formou-se com base nos elementos documentais (oficiais) juntos ao processo e acima discriminados cuja autenticidade e veracidade não foi questionada por nenhuma das partes.

 

De referir que o Tribunal não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de selecionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta(m) o pedido formulado pela Requerente enquanto autor (cfr. artºs.596º, nº.1 e 607º, nºs. 2 a 4, do C.P. Civil, na redação que lhe foi dada pela Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr. artº. 123.º, nº. 2, do CPPT).

 

Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº. 607º, nº. 5, do C.P. Civil, na redação que lhe foi dada pela Lei nº 41/2013, de 26/6). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na Lei (v.g. força probatória plena dos documentos autênticos - cfr. artº. 371º, do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.

 

Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, em face das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2 do CPPT, 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT. 

 

No que se refere aos factos provados, a convicção do Tribunal fundou-se, essencialmente, na análise crítica da prova documental junta aos autos.

 

III.    Do Direito

 

 Na apreciação dos vícios imputados ao ato cuja declaração de ilegalidade é pedida deverá começar-se pelos “vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos” (cfr. artigo 124.º, n.º 2, do CPPT, aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT), já que “a arbitragem tributária visa reforçar a tutela eficaz e efectiva dos direitos e interesses legalmente protegidos dos contribuintes” (cfr. artigo 124.º, n.º 3, da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril).

 

Neste sentido começar-se-á por apreciar o vício de violação de lei por caducidade do direito à liquidação, ao abrigo do artigo 99.º, alínea a) do CPPT.

 

Apreciando.

 

 Dispõe o artigo 45.º, n.ºs 1 e 2, da LGT, respetivamente, o seguinte:

 

1 - O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro.

2 - No caso de erro evidenciado na declaração do sujeito passivo o prazo de caducidade referido no número anterior é de três anos. (Redação da Lei n.º 82-E/2014, de 31 de dezembro).”.

 

Como e bem decidiu o colendo Supremo Tribunal Administrativo, no acórdão proferido em sede do processo 0991/15, de 24-05-2016 e citando-o:

 

I – A Aplicação do prazo de caducidade do direito à liquidação de 3 anos, estabelecido no n.º 2 do artigo 45.º da LGT, ao invés do prazo-regra de 4 anos estabelecido no n.º 1 do mesmo preceito legal, pressupõe a subsunção do caso dos autos ao “caso” de “erro evidenciado na declaração do sujeito passivo”.

II – O critério legal para a redução para três anos do prazo de caducidade não é o da desnecessidade de recurso a fiscalização externa, antes o de se tratar de “erro evidenciado na declaração do sujeito passivo”, o que pressupõe que se trate de erro “que é detectável mediante simples análise dessa declaração”, de erro “que a Administração tributária possa detectar por um mero exame da coerência dos seus elementos, sem recurso a qualquer outra documentação externa, mesmo quanto esta esteja em poder da administração tributáriae obtida por inspecção interna ou externa ou por meios de qualquer outra natureza”, pois que “Só quando o erro resultar exclusivamente do exame da declaração e seus anexos se justifica o previsto encurtamento do prazo de caducidade, porque o próprio contribuinte pôs de imediato à disposição da Administração Tributária os meios necessários à atempada detecção do erro”. (negrito nosso).

 

E mais recentemente o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido em sede do processo n.º 1916/09.4BELRS, de 05/06/2025 e citando-o:

 

“II - O critério legal para a redução para três anos do prazo de caducidade não é o da desnecessidade de recurso a fiscalização externa, antes o de se tratar de "erro evidenciado na declaração do sujeito passivo", o que pressupõe que se trate de erro que é detectável mediante simples análise dessa declaração.”.

 

Face à jurisprudência emanada dos nossos Tribunais Superiores é seguro concluir que o n.º 2 do artigo 45.º da LGT será inaplicável nas hipóteses em que só através do cruzamento de dados e de outras informações pode a AT realizar cabalmente a sua ação de controle das declarações de rendimentos.

 

Ora, decorre dos autos que tal atividade inspetiva implicou o cruzamento de diversas fontes de informação, pois como refere a AT: “(...) é a Divisão de Gestão da NATO/OTAN, nos termos dos art. 42.º do Regulamento das Pensões das Organizações Coordenadas e do art. 15.º do Regulamento de Pensões DCPS, que procede à comunicação à AT das declarações individuais das pensões e ajustes fiscais pagos aos pensionistas daquela Organização a residir em Portugal.”. (cf. Resposta e PA).

 

Acrescentando que, “(...) foi no âmbito dessa comunicação e respetivo cruzamento da informação prestada com os dados constantes da base de dados da AT que se constatou a existência de uma situação de omissão declarativa por parte da Requerente….”. (cf. Resposta e PA).

 

Pelo que não se está perante um mero erro evidenciado na declaração do sujeito passivo, mas uma potencial omissão declarativa de rendimentos, a qual não se extrai de forma evidente da própria declaração de IRS apresentada pelos Requerentes, mas, antes, através do cruzamento da informação prestada pela Divisão de Gestão da NATO/OTAN com os dados constantes da base de dados da AT.

 

Não tendo lugar o encurtamento do prazo de caducidade previsto no n.º 2 do artigo 45.º da LGT, e devendo, outrossim, aplicar-se o prazo geral de quatro anos consagrado no n.º 1, do artigo 45.º, da LGT, o que significa, atento o probatório fixado, que, à data da notificação da liquidação (23.10.2024), não havia ainda caducado o direito à liquidação de imposto.

 

Razão pelo qual improcede este pedido apresentado pelos Requerentes. 

 

Entrando no erro quanto aos pressupostos de Direito imputado pelos Requerentes ao não considerar isenta de tributação a pensão de reforma paga pela NATO.

 

Comecemos, então, por convocar o regime jurídico que para os autos releva traçando os inerentes considerandos de direito reputados de relevo.

 

De harmonia com o disposto no artigo 2.º do CIRS, com a epígrafe de “Rendimentos da Categoria A”:

“1 - Consideram-se rendimentos do trabalho dependente todas as remunerações pagas ou postas à disposição do seu titular provenientes de:

a) Trabalho por conta de outrem prestado ao abrigo de contrato individual de trabalho ou de outro a ele legalmente equiparado;

b) Trabalho prestado ao abrigo de contrato de aquisição de serviços ou outro de idêntica natureza, sob a autoridade e a direção da pessoa ou entidade que ocupa a posição de sujeito ativo na relação jurídica dele resultante;

c) Exercício de função, serviço ou cargo públicos; (…)

2 - As remunerações referidas no número anterior compreendem, designadamente, ordenados, salários, vencimentos, gratificações, percentagens, comissões, participações, subsídios ou prémios, senhas de presença, emolumentos, participações em coimas ou multas e outras remunerações acessórias, ainda que periódicas, fixas ou variáveis, de natureza contratual ou não.”.

 

Mais dispõe o artigo 18.º do CIRS que:

“1 - Consideram-se obtidos em território português:

a) Os rendimentos do trabalho dependente decorrentes de atividades nele exercidas, ou quando tais rendimentos sejam devidos por entidades que nele tenham residência, sede, direção efetiva ou estabelecimento estável a que deva imputar-se o pagamento.”.

 

De convocar, para o efeito, o artigo 37.º do EBF, o qual sob a epígrafe de “Isenção do pessoal das missões diplomáticas e consulares e das organizações estrangeiras ou internacionais” preceitua que:

“1 - Fica isento de IRS, nos termos do direito internacional aplicável ou desde que haja reciprocidade:

a) O pessoal das missões diplomáticas e consulares, quanto às remunerações auferidas nessa qualidade;

b) O pessoal ao serviço de organizações estrangeiras ou internacionais, quanto às remunerações auferidas nessa qualidade.

2 - As isenções previstas no número anterior não abrangem, designadamente, os membros do pessoal administrativo, técnico, de serviço e equiparados, das missões diplomáticas e consulares, quando sejam residentes em território português e não se verifique a existência de reciprocidade.

3 - Os rendimentos isentos nos termos do nº 1 são obrigatoriamente englobados para efeito de determinação da taxa a aplicar aos restantes rendimentos.

4 - O reconhecimento relativo ao preenchimento dos requisitos de isenção, quando necessário, é da competência do Ministro das Finanças.”.

 

Dimanando, igualmente, do artigo 19.º da Convenção de Ottawa que: “os funcionários da Organização compreendidos no artigo 17 serão isentos de imposto sobre os vencimentos e emolumentos que lhes forem pagos pela Organização na qualidade de funcionários desta. Todavia, um Estado membro e o Conselho, atuando em nome da Organização, poderão concluir acordos que permitam àquele estado recrutar e afetar à Organização os seus próprios nacionais, que devem fazer parte do pessoal internacional desta, com exceção, se esse membro o desejar, de qualquer nacional que não resida no seu território. O referido Estado membro pagará, em tal hipótese, os salários e emolumentos das pessoas em questão pelos seus próprios fundos, conforme tabela que determinará. Estes salários e emolumentos poderão ser objecto de imposto pelo Estado membro em questão, mas não poderão sê-lo por outro Estado Membro.”

 

Desde já se diga que os Requerentes não têm razão quanto ao que invocam.

 

Sobre esta matéria já se pronunciou o CAAD em sede do processo 107/2025-T, que analisou questão, de facto e de direito, em tudo idêntica à dos presentes autos e cujos pontos principais, a seguir transcritos, este Tribunal adere in totum:

 

“43.          Assim, a atribuição do benefício fiscal constante do citado artigo (37.º, n.º 1, alínea b), do EBF), implica que o beneficiário da isenção seja membro do quadro de pessoal do respetivo serviço da organização estrangeira ou internacional, que a isenção resulte da aplicação de uma norma ou tratado de direito internacional ou de um princípio de reciprocidade entre Estados e que a remuneração tenha sido auferida exclusivamente no âmbito deste mencionado circunstancialismo.

44.          Ora, tendo por base o quadro normativo supra evidenciado e o recorte probatório dos autos, ter-se-á de concluir que não se encontram reunidos todos os pressupostos acima referidos para que possa ser concedida a isenção em causa. 

45.          Desde logo, porque o referido preceito legal (artigo 37.º, n.º 1, alínea b), do EBF), prescreve que se encontram isentas de IRS as remunerações auferidas por pessoas ao serviço daquelas organizações (estrangeiras ou internacionais).

46.          Deste modo, naquela que se nos afigura a melhor interpretação, o dito benefício fiscal apenas abrange os rendimentos pagos em razão do exercício efetivo de funções ou, por outras palavras, rendimentos que decorrem ou estão associados à prestação efetiva de trabalho, excluindo, por isso, os rendimentos típicos de pessoas retiradas da vida (laboral) ativa).  

47.          Em suma, trata-se de rendimentos auferidos por quem está ao serviço de tais organizações (estrangeiras e internacionais), exigindo-se, assim, que o vínculo laboral ainda persista e que a remuneração recebida seja devida a esse título.  

48.          No entanto, e como é bom de ver, o Requerente, no ano de 2020 (ano da liquidação aqui sindicada), não estava ao serviço de qualquer organização (designadamente, da NATO/OTAN), encontrando-se, sim, com o estatuto de reformado

49.          sendo o montante por si auferido relativo a pensões, as quais são devidas pela passagem à situação de reforma, situação essa diversa de quem está no ativo.

50.          Porquanto, a passagem à reforma extingue a relação jurídica laboral existente entre a entidade patronal e o trabalhador, nascendo então o direito às prestações patrimoniais denominadas pensões. 

51.          Aliás, os rendimentos auferidos pelo Requerente têm uma natureza distinta – consoante este se encontre no exercício de funções (Rendimentos da categoria Aou na qualidade de reformado (Rendimentos da categoria H) – que, como é consabido, obedecem a um regime jurídico-tributário também ele diferente.

52.          Neste sentido, consideramos que o conceito de “remunerações” pressupõe sempre um pagamento/uma contrapartida pela efetiva prestação de trabalho e, por isso, não inclui as situações de reforma/aposentação.

53.          Com efeito, acompanhamos, no que a esta questão respeita, o entendimento da AT de que apesar de não existir na lei uma definição única do conceito de “remuneração”o CIRS e o Código do Trabalho (em que tal conceito é menos lato do que naquele) oferece-nos uma delimitação do mesmo

54.          que nos permite concluir (quer do artigo 2.º, do CIRS, quer dos artigos referentes à remuneração constante do Código do trabalho), que tal conceito está sempre relacionado com aquilo que o trabalhador recebe enquanto se encontra no ativo. 

55.          Já a pensão de reforma em causa nos autos implica que o Requerente não execute qualquer prestação de trabalho, encontrando-se extinto o vínculo laboral entre este e a NATO/OTAN/

56.          pelo que, estamos perante duas realidades completamente distintas e que terão, naturalmente, um tratamento fiscal diferenciado

57.          Em síntese, e como conclui a AT: “(...) enquanto o Requerente se encontrava no ativo os rendimentos pagos pela NATO eram enquadráveis na categoria A, sendo certo que os mesmos beneficiavam da isenção prevista no art. 37.º, n.º 1, do EBF. Todavia, a partir do momento em que o Requerente se aposentou, os valores pagos pela NATO têm a natureza de rendimentos de pensões e são enquadráveis na categoria H, deixando de beneficiar da isenção prevista no art. 37.º, n.º 1, do EBF.”

58.          Por outro lado, é ponto assente que é a própria norma em análise que exige que a isenção esteja consagrada em instrumento de direito internacional; em suma, o benefício fiscal constante da alínea b), do n.º 1, do artigo 37.º, do EBF, só exequível se existir efetivamente direito internacional que preveja a isenção consignada.

59.          Sucede que, não existe qualquer norma de direito internacional que conceda a isenção a título de IRS sobre pensões pagas pela NATO/OTAN a ex-funcionários ou pensionistas

60.          Pois, pese embora os Requentes apelem a três instrumentos jurídicos de direito internacional (Convenção de Ottawa[2] (e respetivo Acordo Suplementar – Resolução da Assembleia da República n.º 221/2019, de 7 de novembro –); Protocolo de Paris[3] e; Protocolo Relativo aos Privilégios e Imunidades da União Europeia),

61.          a verdade é que tais diplomas não fornecem quaisquer elementos suscetíveis de suportar a sua tese

Vejamos, 

62.          Os Requerentes começam por chamar à colação o artigo 19.º da Convenção de Ottawa, bem como o artigo 7.º do Protocolo de Paris (cuja redação é semelhante), considerando que tais normas lhe são aplicáveis (seguindo igual raciocínio para ambas). 

63.          Contudo, os Requerentes limitaram-se a transcrever parte do artigo 19.º da dita Convenção, fazendo a interpretação que mais lhe convinha, o que resultou numa aplicação errada da norma ao caso dos autos. 

64.          Pois bem, dispõe o artigo 19.º, do referido diploma que: “Os funcionários da Organização compreendidos no artigo 17 serão isentos de impostos sobre os vencimentos e emolumentos que lhes forem pagos pela Organização na qualidade de funcionários desta. Todavia, um Estado membro e o Conselho actuando em nome da Organização, poderão concluir acordos que permitam àquele Estado recrutar e afectar à Organização os seus próprios nacionais, que devem fazer parte do pessoal internacional desta, com excepção, se esse Estado membro o desejar, de qualquer nacional que não resida habitualmente no seu território. O referido Estado membro pagará, em tal hipótese, os salários e emolumentos das pessoas em questão pelos seus próprios fundos, conforme tabela que determinará. Estes salários e emolumentos poderão ser objecto de imposto pelo Estado membro em questão, mas não poderão sê-lo por outro Estado membro. Se um acordo desta natureza, firmado por um Estado membro, for ulteriormente alterado ou denunciado, os Estados membros não poderão ser obrigados, com base na primeira cláusula deste artigo, a isentar de imposto os salários e emolumentos pagos aos seus próprios súbditos.”

65.          Considera o Tribunal Arbitral que o referido preceito legal não compreende a realidade do Requerente. 

66.          Pois, por um lado, o citado artigo pertence ao Título IV, da mencionada Convenção, cujo título é “Pessoal internacional e peritos ao serviço da Organização” (e não pessoal internacional e peritos que tenham estado ao serviço da Organização);

67.          por outro lado, a própria redação da norma fala em vencimentos e emolumentos (e não em pensões de reforma ou de aposentação), pagos pela Organização a funcionários desta (e não pagos pela Organização a ex-funcionários desta ou a pensionistas) e;

68.          por fim, utiliza expressões como “recrutar e afectar à Organização” os seus próprios nacionais”, o que implica, em conjunto com o restante teor da norma, que se esteja perante funcionários/trabalhadores no ativo (negrito e sublinhado nosso).

69.          Em síntese, entende o Tribunal Arbitral que a aplicação do artigo 19.º da aludida Convenção pressupõe, tal como no direito interno, um trabalhador em exercício de funções. 

70.          No que respeita à Resolução da Assembleia da República n.º 221/2019, de 7 de novembro (Acordo Suplementar à Convenção de Ottawa), designadamente, ao estipulado na alínea b), do n.º 2, do artigo 10.º: 

“2 - Relativamente aos Civis Internacionais da OTAN (NICs):

a)    (...)

b)    Os NICs estão isentos de todos os impostos relativos aos salários e emolumentos que lhes sejam pagos na qualidade de Civis Internacionais da OTAN, bem como das contribuições para os regimes de segurança social e de pensões portugueses, desde que estejam abrangidos por planos de pensões e seguros de grupo da OTAN com carácter obrigatório.

(...)”

 71.          os Requerentes apenas referem que o Sujeito Passivo “(...) se enquadra ainda como NIC, isto é, como Civil Internacional da NATO, precisamente pela pensão que aufere da Organização.”.

72.          A definição de Civis Internacionais da OTAN (NICs) remete para o pessoal da Agência NCI (Agência para a Informação e Comunicações da OTAN, que inclui a Academia NCI – Academia para a Informação e Comunicações da OTAN –; a CSU Lisboa –  Unidade de Apoio ao Cliente da Agência NCI, que é parte integrante da Agência NCI e presta apoio descentralizado à Agência NCI e aos comandos militares da OTAN em Portugal –; o Terminal Terrestre de Satélite F12 e; quaisquer outros estabelecimentos da Agência NCI em Portugal) recrutado de entre os nacionais membros da Aliança e afeto à dita agência (Cfr. artigo 1.º, alíneas e), g), h), l), do citado diploma).

73.          Compulsados os autos, resulta somente que o Requerente trabalhou para a NATO/OTAN e, que, aos dias de hoje, aufere pensões, pagas por essa Organização, na qualidade de reformado, 

74.          ou seja, desconhece-se qual era a sua categoria profissional, quais eram as suas funções, a que “unidade/serviço” estaria afeto e, se estaria (ou não) abrangido por algum plano de pensões e seguros de grupo da OTAN com carácter obrigatório,

75.          o que o impossibilita o Tribunal, de aplicar, também, esta norma, porquanto, o Requerente não alegou, nem tampouco demonstrou que os seus pressupostos se encontram preenchidos

76.          Por último, recorreram, ainda, os Requerentes ao Protocolo Relativo aos Privilégios e Imunidades da União Europeia, designadamente, ao seu artigo 12.º, “(...). Os funcionários e outros agentes da União ficam isentos de impostos nacionais que incidam sobre os vencimentos, salários e emolumentos pagos pela União.”, 

77.          referindo que “por um princípio de igualdade fiscal, desde logo estabelecido no artigo 13.º e no n.º 1 do artigo 104.º da Constituição da República Portuguesa, se os rendimentos e as pensões dos funcionários e outros agentes da União Europeia poderão estar isentos de IRS, por igualdade de circunstâncias também o deverá estar a pensão da NATO auferida pelo Impugnante.”

78.          Mais uma vez, discorda-se da posição perfilhada pelos Requerentes.

79.          Porquanto, o Requerente já não é funcionário da NATO/OTAN e o Protocolo em questão aplica-se apenas às instituições, órgãos, e organismos da União Europeia – “UE” – (como membros das instituições, funcionários e agentes da UE), que nada têm a ver com a NATO/OTANque obedece a instrumentos jurídicos próprios e distintos–. 

80.          Trata-se de âmbitos/realidades manifestamente diferentes e, por isso, não há qualquer ofensa ao princípio da igualdade, que, conforme consabido, consiste em que se dê tratamento igual ao que for essencialmente igual e que se trate diferentemente o que for essencialmente diferente

81.          Assim, é inequívoco que não existe qualquer norma ou tratado internacional que especificamente preveja uma isenção, em sede de IRS, sobre pensões pagas pela NATO/OTAN a ex-funcionários ou pensionistas, pelo que o enquadramento factual descrito nos autos fica também, por este segmento argumentativo, excluído do benefício fiscal aqui em causa.

82.          Neste sentido, não há, ao contrário do que referem os Requerentes, qualquer violação do artigo 8.º, n. º1, da CRP– “As normas e os princípios de direito internacional geral ou comum fazem parte integrante do direito português”, nem tampouco é a liquidação inconstitucional, por força desse artigo.

83.          Da mesma forma que, também, não houve qualquer ofensa ao princípio da confiança, pois, a notificação da AT, datada de 11.10.2018 – que refere: “(...) verifica-se que não foram declarados no anexo H os rendimentos de pensão pagos pela NATO no valor de €17.887,40” –, junta aos autos pelos Requerentes, fez-se acompanhar de outro documento, um ofício de 05.11.2018, do qual consta que: “Da análise efetuada aos documentos/alegações apresentados relativamente à notificação da(s) divergência(s) identificada(s) na declaração de rendimentos Modelo 3 do ano de 2016 com a identificação..., informa-se que se encontram devidamente esclarecidas as questões submetidas a apreciação, pelo que se procederá de imediato ao encerramento do processo e consequente desbloqueio da sua declaração de IRS”. 

84.          Ou seja, da análise desta documentação não se consegue concluir sem margem para dúvidas que até 2020 a AT era do entendimento de que as pensões em causa estavam abrangidas pela dita isenção: se por um lado refere na notificação que aquelas deviam ser declaradas no anexo H, por outro lado, emite um ofício que parece aceitar que aqueles rendimentos não sejam aí declarados, pois, não consta dos autos que os Requerentes tenham entregue a respetiva declaração Modelo 3 de Substituição, conforme as instruções dadas pela AT (Cfr. Ponto L. dos Factos Provados), desconhecendo-se, também, como foram preenchidas as Declarações de IRS em todos os anos seguintes.

85.          Desta feita, e face a todo o exposto, falecem todos os segmentos argumentativos deduzidos pelos Requerentes, não padecendo o ato tributário de liquidação de IRS aqui sindicado de qualquer ilegalidade, devendo manter-se na ordem jurídica, o que acarreta, também, a improcedência da pretensão da devolução do imposto pago, acrescido de juros indemnizatórios.“

 

Aqui chegados importa ainda dizer que a AT deve nortear a sua ação em obediência, fundamentalmente, ao princípio da legalidade. Sendo aquela pensão objetivamente um rendimento tributável, não é por vários anos antes ter emitido um mero ofício (Documento n.º 5 junto aos autos pelos Requerentes com o seu PPA) que é algo dúbio quanto à forma de declarar o rendimento (ainda que não seja claro quanto ao facto de ser ou não tributável) que anos volvidos lhe impõe esse entendimento quando o princípio da legalidade determina objetivamente a tributação do rendimento em causa nos autos.

 

Por tudo o acima exposto improcede este pedido, e, bem assim, o pagamento de juros indemnizatórios subsidiário ao mesmo.

 

IV.    Decisão 

 

À face do exposto, acorda este Tribunal Arbitral em:

(a)   Julgar integralmente improcedente o pedido de pronúncia arbitral formulado pelos Requerentes, mantendo na ordem jurídica o ato tributário de liquidação de IRS impugnado no valor de € 9.543,87 e, em consequência, absolver a Requerida do pedido. 

(b)  Condenar os Requerentes nas custas do processo, por terem dado azo à ação. 

 

V.      Valor da Causa

 

 Fixa-se ao processo o valor de 9.543,87€, por ser aquele que corresponde ao valor da liquidação expressamente impugnada cuja anulação se pretende, nos termos do disposto no artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT, aplicável ex viartigo 29.º, n.º 1 alínea a) do RJAT, e do artigo 3.º, n, º 2, do RCPAT. 

 

 

VI.       Custas

 

Custas no montante de € 918,00, a suportar pelos Requerentes, em conformidade com a Tabela I anexa ao RCPAT e com o disposto nos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4 do RJAT e 4.º do RCPAT. 

 

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 19 de Outubro de 2025.

 

 

A árbitra,

 

Sónia Martins Reis