Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 171/2025-T
Data da decisão: 2025-10-08  IRS  
Valor do pedido: € 5.534,90
Tema: IRS. Informações prestadas por administrações tributárias estrangeiras ao abrigo de convenções internacionais de assistência mútua. Apresentação, pelo sujeito passivo, de prova em contrário.
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Sumário

As informações prestadas pelas administrações tributárias estrangeiras ao abrigo de convenções internacionais de assistência mútua a que o Estado Português esteja vinculado, fazem fé quando fundamentadas e se basearem em critérios objetivos, sem prejuízo da prova em contrário do sujeito passivo ou interessado.

Apresentada prova em contrário, compete a AT contrariar a prova apresentada pelo contribuinte mediante informações atualizadas e objetivas, acompanhadas de adequada fundamentação.

 

Decisão arbitral

O árbitro signatário, designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formar o Tribunal Arbitral Singular, constituído em 2025-05-02, decide o seguinte:

I – Relatório

A..., NIF ..., residente em ... ..., Polónia, (doravante designado por “Requerente”), vem apresentar pedido de pronúncia arbitral (PPA) e constituição de Tribunal, em que é parte a “Autoridade Tributária e Aduaneira”, (doravante designada por “Requerida” ou “AT”), ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, e dos n.º 1 e 2.º do artigo 10.º, ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, (RJAT), com as alterações subsequentes, em conjugação com os artigos 1.º e 2.º, da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.

O PPA é apresentado na sequência do despacho de indeferimento, exarado em 2024-11-18, do recurso hierárquico da decisão de indeferimento proferida no âmbito do procedimento de revisão do ato tributário n.º ...2024... relativo à liquidação de IRS n.º 2023..., do ano de 2020, no montante de € 5.534,90, solicitando a correção da matéria tributável de rendimento obtido no estrangeiro (Grécia), invocando a existência de injustiça grave ou notória.

 

Na tramitação do presente processo foram praticados os principais atos processuais seguintes:

Em 2025-02-19, a Requerente apresentou pedido de pronúncia arbitral (PPA), aceite em 2025-02-21.

Em 2025-05-02, por despacho do Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, foi constituído o Tribunal arbitral coletivo, em conformidade com o preceituado no artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro - (RJAT).

Em 2025-05-08, foi notificado o Despacho arbitral previsto no artigo 17.º do RJAT e em cumprimento do referido despacho, a Requerida apresenta resposta em 2025-06-03.

Em 2025-07-02, foi proferido despacho ao abrigo do art.º 18.º do RJAT.

II - Saneamento

O Tribunal arbitral singular encontra-se regularmente constituído e é competente – cf. alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e artigos 5.º e 6.º, todos do RJAT.

As Partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade – cf. artigos 4.º e 10.º do RJAT e do artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

O PPA é tempestivo uma vez que foi apresentado no prazo previsto na alínea a) do nº 1 do artigo 10.º do RJAT.

O Processo não padece de vícios que o invalidem e não existem incidentes que importe resolver. 

III – Da posição das partes

1.      Da Requerente

A parte Requerente apresenta PPA na sequência do referido indeferimento, alegando, em síntese, a factualidade seguinte:

-  Que em “(…) 05/12/2023, a AT informou o (…) Requerente que a declaração de rendimentos (2020-...), apresentada em 15/12/2021, não relacionava os rendimentos obtidos no estrangeiro, faltando o anexo “J”.”

- O Requerente, em face da referida notificação, apresentou, em 18/12/2023, uma primeira declaração de substituição (2020-...) nos termos pretendidos pela AT, ou seja, incluindo o anexo “J” com os valores indicados pela AT.

- Após receção da liquidação, o Requerente constatou que os rendimentos considerados como obtidos no estrangeiro (na Grécia), no montante de 19.832,14 Euros, incluíam não só os rendimentos efetivamente auferidos na Grécia, mas a estimativa dos rendimentos auferidos em Portugal e declarados na Grécia (18.283,60 Euros).

- Nessa sequência, procedeu à correção doo elementos declarados na Grécia e à apresentação de nova declaração de substituição (2020-...) em Portugal, a qual foi mantida pela AT em situação de «não liquidável».

- Mais alega, em suma, que a AT não apreciou a situação de injustiça grave e notória, abstendo-se de contestar os factos invocados pelo contribuinte, ou seja, que o valor dos rendimentos efetivamente obtidos na Grécia e a ser considerados são de € 1.548,50 e não de € 19.832,14

- Que apresentou declaração de substituição, considerando os valores corretos e efetivamente auferidos, que não foi aceite pela AT; 

- Que a falta de apreciação dos factos invocados e que configuram a situação de «Injustiça Grave e Notória «, invocada e que a AT expressamente aceita para considerar tempestivo o pedido de revisão do ato tributário configura um vício de insuficiência de fundamentação do ato decisório de que se recorre.

- Conclui o Requerente, solicitando a anulação dos atos administrativos, a devolução do montante pago, acrescido de juros indemnizatórios.

2.      Da Requerida

A Requerida na Resposta ao PPA, alega, em síntese, o seguinte:

- Ao contrário do que alega o Requerente, da base de dados da Requerida, nomeadamente da aplicação “SITI – Sistema Integrado de Trocas de Informação”, é possível constatar que as autoridades fiscais da Grécia comunicaram que, em 2020, o Requerente auferiu naquele país, os seguintes rendimentos, Doc. 1: ⋅ Rendimentos prediais: €1.630,00 / Imposto pago: €232,28, Pensões (segurança social): €18.283,60 Juros: €0.04

- Afirma, a AT, não perceber como podem os rendimentos comunicados pela administração fiscal grega, respeitantes a pensões da segurança social, estar integrados nos rendimentos provenientes de Portugal, quando estes últimos, tanto quanto se sabe, se resumem aos referentes a trabalho dependente, pagos pela entidade Universidade Católica Portuguesa, conforme declarado pelo Requerente, e se se extrai das bases de dados da AT. 

- Igualmente, assinala que a tradução do documento junto pelo Requerente como Doc. 7, que supostamente sufraga a bondade da posição que defende, não respeita ao documento emitido pelas Autoridades Fiscais da Grécia, e tanto assim é que os valores constantes no documento e na tradução não coincidem.

- Recorda que, nos termos do estatuído no artigo 74.º da LGT, o ónus da prova recai sobre quem invoca os factos, in casu, sobre o Requerente que afirma que os valores comunicados pela autoridade fiscal grega à Requerida não correspondem à verdade. 

- Entende que o Requerente não logrou fazer prova, tendo em conta que a tradução do documento trazido aos autos não corresponde à tradução do documento que indica, como se constata pela falta de coincidência dos valores inscritos.

- Que inexiste qualquer evidência de que os rendimentos comunicados pela Grécia estão integrados nos provenientes de Portugal, como alegado pelo Requerente, os mesmos devem ser tributados em território português.

- Afirma a AT que os rendimentos obtidos por um residente em Portugal, como sucedia à data dos factos, com a natureza de pensões de natureza não pública, pagas ao abrigo da legislação da segurança social grega, aplicar-se-á o artigo 18.º da Convenção, onde se concluiu que os ditos €18.283,60 estão sujeitos a tributação, e não isentos, em Portugal.

- Que não se vislumbra a situação de injustiça grave e notória assinalada pelo Requerente, nem tão pouco a ilegalidade e desproporcionalidade imputada à liquidação objeto da lide, devendo, em consequência improceder os pedidos de anulação da liquidação e do despacho que recaiu sobre o recurso hierárquico, bem como o pedido de devolução do imposto pago pelo Requerente.

IV – Matéria de facto

O Tribunal arbitral, com relevo para a decisão, atento tudo o que foi alegado pelas partes e a prova junta, maxime, os documentos juntos com a Petição Inicial (PI) e com o Processo Administrativo, considera provado o seguinte:

-    O Requerente teve a sua residência em Portugal de 2017-09-01 até 2023-07-04;

-    O Requerente, em relação à liquidação de IRS do ano de 2000, apresentou recurso hierárquico da decisão de indeferimento, proferida em 2024-06-18, no âmbito do procedimento de revisão do ato tributário n.º ...2024... relativo à liquidação de IRS n.º 2023..., do ano de 2020, no montante de € 5.534,90.

-    O recurso hierárquico foi objeto de despacho de indeferimento em 2024-10-15.

-    A Requerida fundamenta a decisão nas suas bases de dados, nomeadamente da aplicação “SITI – Sistema Integrado de Trocas de Informação”, e no reporte realizado pelas autoridades fiscais da Grécia, as quais comunicaram que, em 2020, o Requerente auferiu naquele país, os seguintes rendimentos: prediais: €1.630,00, com imposto pago de €232,28; pensões de €18.283,60 e juros de €0.04.

-    O Requerente contestou o valor dos rendimentos auferidos na Grécia, no ano de 2020, alegando que na realidade auferiu 1.548,56 euros e não 19.832,14 euros, precisando que a diferença de 2 cêntimos para 18.283,60 euros (19.832,14 Euros – 1.548,56 Euros), resulta de ajustes de valores.

-   O Requerente precisou que aquele montante (18.283,60 euros) foi declarado na Grécia como a estimativa dos rendimentos auferidos em Portugal e que tem origem nessa declaração inicial, não sendo rendimentos auferidos na Grécia. 

-    O Requerente apresentou novas declarações na Grécia e em Portugal, a última declaração de substituição: 2020-..., apresentada junto da AT, a qual foi classificada como “não liquidável”. 

-   O Requerente apresenta documento emitido pela autoridade tributária da Grécia em 2024-01-12, acompanhado de tradução certificada.

-    Nesse documento e do valor dos rendimentos declarados pelo Requerente na Grécia em relação ao ano de 2020, não consta o montante de 18.283,60, contendo o registo de rendimentos de reduzido valor e imposto de 232,29 euros.

Em face das alegações e dos elementos de prova juntos aos autos e identificados, considera-se não existirem factos relevantes não provados.

1. Motivação da decisão da matéria de facto

O Tribunal não tem de se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe apenas selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada e com relevância para a decisão – Cf. n.º 2, do art.º 123.º do CPPT e n.º 3 do art.º 607.º do CPC, aplicável, ex vi, alíneas a) e e) do n.º 1, do art.º 29.º do RJAT. 

A convicção do Tribunal quanto à matéria de facto dada como provada, assenta nos factos alegados, no reconhecimento de factos não controvertidos, na apreciação do PPA e documentos, da resposta e alegações da Requerida, do Processo Administrativo e documentos juntos, como indicado em relação aos factos dados como provados. 

Esse julgamento teve, ainda, presente as disposições legais sobre o ónus da prova, o inquisitório, a igualdade das partes, a economia dos atos e os deveres de imparcialidade do Tribunal.

Existindo um documento recente apresentado pelo Requerente como proveniente da autoridade tributária da Grécia, competia à AT verificar a evolução e consistência da informação relevante para efeitos fiscais nas respetivas bases de dados e canais de troca de informação (CCN), designadamente a existência de informação ou registos atualizados e disponíveis para consulta ou solicitar a respetiva atualização.

O rendimento tributário do Requerente e o último documento da autoridade da Grécia, podendo ser confirmado, não foi contestado pela Requerida mediante prova atual e objetiva em contrário, contesta apenas com registos eletrónicos anteriores a esse documento e alega que “(…) a tradução do documento trazido aos autos não corresponde à tradução do documento que indica, como se constata pela falta de coincidência dos valores inscritos.”

Porém, a tradução é consistente com o documento traduzido no montante de imposto liquidado na Grécia relativos a rendimentos de reduzido valor e onde não consta o montante em litígio de 18.283,60, ou valor semelhante, mas antes registos de rendimentos de reduzido valor e com imposto final apurado igualmente de montante diminuto: 232,29 euros .

Apesar de nova informação comunicada e apresentada pelo Requerente como emitida pela autoridade da Grécia em 2024-01-12, a Requerida continuou a sustentar a sua posição em informação recolhida em data anterior - informação transmitida à AT com última data em 2022-07-15, proveniente da Grécia, referência ELPT- IP- IPI2022071... -454c323032323..., através da rede comum de comunicações (CCN), constando do(s) registo(s) EL_PT_DAC1- REC- AEOI- IPI-1657... do ficheiro EL_PT_DAC1-MSG- AEOI- IPI165702... .

A AT não demonstra, através de registos e elementos de prova objetivos e atuais, que o montante de € 18.283,60, foi efetivamente auferido pelo Requerente na Grécia e que esse montante continua a constar de registos atualizados e comunicados por parte daquela autoridade, designadamente na referida rede CCN, à data da apresentação da última declaração de substituição.

Termos em que não logrou a Requerida contrariar os montantes declarados pelo Requerente na última declaração de substituição de IRS para o ano de 2020, mediante registos ou informação contemporânea ou posterior à data dessa declaração.

A autodeclaração de imposto de IRS a cargo do contribuinte constitui o ponto de partida do processo de liquidação, para o qual aquele fornece os elementos necessários à determinação do imposto a pagar, consistindo a liquidação no processamento da informação veiculada pelo contribuinte e do seu cruzamento com outros registos e/ou informação que a respetiva autoridade tributária disponha, por forma a verificar o rigor dos elementos autodeclarados e chegar ao resultado final: o valor exato do imposto.

A precisão da liquidação depende diretamente do rigor e integralidade dos registos e rendimentos contidos na autodeclaração e na integridade e atualidade dos dados sobre o contribuinte conhecidos pela AT, maxime, quando não aceita os registos declarados pelo contribuinte.

A integridade e atualidade de ambos esses dois universos de registos, quer os comunicados pelo contribuinte, quer os conhecidos e detidos pela AT, revelam-se condições indispensáveis para o ato de liquidação e para o correto apuramento do imposto, não podendo aquela autoridade vir contrariar uma autoliquidação, através de elementos indiretos e anteriores à data da declaração de substituição apresentada pelo contribuinte/Requerente, maxime, quando este informou sobre a incorreção e falta de atualidade dos elementos na posse das autoridades (Grega e Portuguesa) e apresenta elementos novos, substituindo os inicialmente declarados, os quais não foram contrariados, por parte da AT, com registos e meios de prova contemporâneos com a data da última declaração de substituição. 

V – Do mérito – fundamentação de direito

Atenta a factualidade e a prova, a questão estruturante ínsita no presente PPA em resultado dos atos de autoliquidações apresentadas pelo Requerente e dos atos administrativos praticados pela Requerida (atentos os rendimentos declarados e contestados pela AT com prova indireta e não atual), consiste na falta de demonstração plena por parte da AT de rendimentos diferentes daqueles que foram autodeclarados pelo contribuinte na declaração de substituição, continuando utilizar informação indireta e anterior a essa segunda declaração de rendimentos apresentada pelo Requerente.

Apesar da questionável qualidade das alegações e dos respetivos elementos de suporte apresentados pelo Requerente, resulta manifesta a omissão pela AT da apreciação dos novos elementos de prova e do seu confronto com elementos atuais e que poderiam ser conhecidos ou solicitados por parte da AT, pelo que ao não liquidar a declaração de substituição apresentada pelo contribuinte/Requerente, mantendo em vigor uma primeira declaração e respetiva liquidação com base em elementos indiretos (CCN) anteriores a essa nova declaração, incorre em erro que lhe é imputável.

No contexto da indevida determinação de rendimentos e liquidação indevida de imposto, a revisão da matéria tributável é um procedimento administrativo instrumental e necessário, através do qual se analisa e retifica o valor sobre o qual um imposto foi calculado.

A revisão tem como objetivo principal a confirmação que o mesmo facto tributário está devidamente apurado, determinar o valor exato do imposto que deve ser pago e anular a cobrança indevida, porquanto o contribuinte apenas deve suportar o encargo fiscal legalmente previsto, atentos os rendimentos por si declarados e não contrariados pela AT, com base em elementos atuais e objetivos.

Acresce que podendo reunir a AT os elementos que lhe permitem conhecer ou detetar o erro nas autoliquidações do contribuinte, tem a obrigação de proceder à revisão oficiosa do/s ato/s tributário/s, nos termos do Artigo 78.º da LGT. 

Tendo a AT realizado esse procedimento em relação à primeira declaração do contribuinte/Requerente, era-lhe exigido igual procedimento em relação à última declaração de substituição, atentos os novos elementos conhecidos, designadamente à atualização dos elementos indiretos (CCN) utilizados aquando daquela primeira liquidação.

Nos termos estatuídos nos n.ºs 1 e 4 do artigo 76.ºda LGT: “1 – As informações prestadas pela inspeção tributária fazem fé, quando fundamentadas e se basearem em critérios objetivos, nos termos da lei. (...) 4 – São abrangidas pelo n.º 1 as informações prestadas pelas administrações tributárias estrangeiras ao abrigo de convenções internacionais de assistência mútua a que o Estado Português esteja vinculado, sem prejuízo da prova em contrário do sujeito passivo ou interessado.”

Neste sentido, recorda-se a Decisão arbitral – Processo n.º 908/2024-T: “Para contrariar a força probatória das informações oficiais obtidas pela Autoridade Tributária (AT) de congéneres autoridades fiscais estrangeiras ao abrigo de convenções de assistência mútua a que o Estado Português esteja vinculado (resultante do n.º 4 do artigo 76.º da LGT), não é exigido ao sujeito passivo que faça prova do contrário, pois “a lei não lhes atribui força probatória plena, bastando gerar dúvidas fundadas sobre os factos nelas afirmados, como resulta do preceituado no art.º 346.º do CC” (cf. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 28.01.2021, processo n.º 00007/04.9BEMDL; Decisão Arbitral de 21.06.2022, processo n.º 601/2022-T)”.

“Não tendo o legislador estipulado que prova devem os sujeitos passivos apresentar para contrariar as informações obtidas pela AT de congéneres autoridades fiscais estrangeiras ao abrigo de convenções de assistência mútua a que o Estado Português esteja vinculado, vigora o regime da prova livre, no âmbito do qual os elementos apresentados pelos sujeitos passivos são apreciados pelo tribunal arbitral com inteira liberdade, mas segundo a sua experiência, prudência e o bom senso”. 

O Requerente apresentou, oportunamente, dúvidas fundadas sobre os rendimentos considerados pela AT e, ainda, prova documental em contrário. 

Porém, a AT não apresenta prova atual, indireta ou documental, que comprovasse os alegados rendimentos auferidos na Grécia, limitando-se a invocar a informação antiga recebida da Grécia contestada pelo Requerente, pelo que lhe competia apresentar prova e elementos objetivos e atuais, por forma a contestar fundamentadamente os elementos novos apresentados pelo contribuinte.

Incumbe à AT o dever de investigação (princípio do inquisitório) por forma a poder contrariar os dados do contribuinte e confirmar os factos que invoca, assentes em uma mera comunicação antiga de outro país, sem ser fundamentada com provas objetivas e atuais, concomitantes com a emissão de documento pela autoridade da Grécia e/ou com a última declaração de substituição apresentada pelo Requerente, conduzindo à subsequente falta de fundamentação do ato administrativo. – cf. CAAD, Proc. n.º 905/2024-T

AT teve oportunidade de proceder à análise e avaliação da prova e da matéria controvertida, podendo ter efetuado o correto enquadramento jurídico-tributário dos factos e, consequentemente, a plena reconstituição dos rendimentos e a subsequente legalidade dos atos objeto do litígio. Não o tendo feito, manteve indevidamente uma declaração de rendimentos em situação de “não liquidável” e a liquidação de um imposto por montante superior ao devido, em função da manutenção do acréscimo de 18.283,60, nos rendimentos do Requerente.

Termos em que se reconhece o direito do Requerente à restituição do imposto pago em excesso, acompanhado dos respetivos juros indemnizatórios sobre esse valor, depois de decorrido um ano, contado da apresentação do pedido até à data do processamento da respetiva nota de crédito – alínea c) do n.º 2 do artigo 43.º e artigo 100.º da LGT e artigo 61.º da LGT

VI - Decisão

Termos em que o Tribunal Arbitral singular decide: 

-   Anular parcialmente a liquidação de IRS do ano de 2020, na parte referente aos alegados rendimentos auferidos na Grécia, como exposto.

-   Anular a decisão de indeferimento do recurso hierárquico.

-   Condenar a Requerida a restituir o montante de imposto pago em excesso e respetivos juros indemnizatórios.

VII - Valor do Processo 

Fixa-se o valor do processo em € 5.534,90, em conformidade com o disposto, na al. a) do n.º 1 do artigo 97.º-A do Código de Procedimento e Processo Tributário e nos n.ºs 1 e 2 do artigo 306.º do Código de Processo Civil, aplicáveis por força das alíneas a), c) e e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.

VIII - Custas

Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 612,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, de harmonia com o disposto no n.º 2 do artigo 12.º e no n.º 4 do artigo 22.º, ambos do RJAT.

Atento este enquadramento normativo e o teor da decisão, cumpre à parte Requerente suportar 65% da taxa arbitral e à parte Requerida os restantes 35%, o que se determina.

 

Registe-se e notifique-se.

 

Lisboa, 08 de outubro de 2025.

 

 

O Tribunal Arbitral Singular,

 

 

 

Vítor M. R. Braz