Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 418/2025-T
Data da decisão: 2025-10-06  IRS  
Valor do pedido: € 14.786,52
Tema: IRS- Mais-valias Imobiliárias
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SUMÁRIO:

A inutilidade superveniente da lide e a consequente extinção da instância, ocorre quando o Requerente obtém a plena satisfação do seu pedido em virtude da revogação do ato de liquidação pela AT, após a constituição do Tribunal Arbitral, do ato de liquidação que havia impugnado

DECISÃO ARBITRAL

 

I – RELATÓRIO

 

A..., maior, de nacionalidade suíça, titular do Passaporte n.º ..., emitido pela Confederação Suíça a 15.09.2016 e válido até 14.09.2026, titular do NIF ... e B..., maior, de nacionalidade francesa, titular do Passaporte n.º..., emitido pela República Francesa a 18.04.2023 e válido até 17.04.2033, titular do NIF..., ambos residentes em ..., ... Colónia, Alemanha, em regime de Coligação, vêm, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e dos artigos 10.º e seguintes, todos do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), e do artigo 99.º e na alínea a) do número 1 do artigo 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do RJAT, apresentar pedido de pronúncia arbitral relativamente ao ato de liquidação adicional de IRS e respetivos juros compensatórios com o n.º 2025..., com o valor global de € 209.732,90, que corrige a autoliquidação n.º 2024... no valor de € 194.946,38, de onde resulta a diferença por eles a pagar de € 14.786,52 (catorze mil setecentos e oitenta e seis euros e cinquenta e dois cêntimos).

Na perspetiva dos Requerentes, esta liquidação adicional, resultou da AT não ter considerado as despesas de comissões pagas à Imobiliária, apesar de no processo de divergências eles terem junto a respetiva escritura de alienação, como lhe foi solicitado pela AT, e nela constar a menção relativamente à intervenção da respetiva Imobiliária, fundamentando a AT a desconsideração de tal despesa pelo facto da respetiva fatura da mediadora não conter a identificação do imóvel alvo de mediação.

O pedido de constituição de tribunal arbitral foi aceite e notificado à AT em 28/04/2025, não tendo os Requerentes procedido à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 1 e no artigo 11.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou o signatário como árbitro do Tribunal Arbitral singular, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 18 de junho de 2025, as partes foram devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas b) e c), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.

Assim, em conformidade com o preceituado no artigo 11.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, o Tribunal Arbitral singular foi constituído em 08 de julho de 2025, tendo, em 10 do mesmo mês, proferido o seguinte Despacho: “Notifique-se o dirigente máximo do serviço da Administração Tributária, nos termos dos n.º 1 e 2 do artigo 17.º do RJAT, para, no prazo de 30 dias, apresentar resposta e solicitar a produção de prova adicional, caso queira, devendo ser remetido ao Tribunal Arbitral, nos termos do nº 2 do citado artigo 17º do RJAT, cópia do processo administrativo dentro do prazo de apresentação da resposta, aplicando-se, na falta de remessa, o disposto no n.º 5 do artigo 110.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.”

Em 04/09/2025, veio, AT em Requerimento da mesma data, informar que, por despacho da Subdiretora Geral de 28-07-2025, foi revogado parcialmente o ato de liquidação de IRS n.º 2025..., referente ao ano de 2023, ora impugnado, conforme documento que juntou aos autos.

 

II – SANEAMENTO

 

O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente para conhecer

do pedido, em conformidade com o preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, 6.º, n.º 1 e 11.º, n.º 1, do RJAT (com a redação introduzida pelo artigo 228.º da lei nº 66-B/2012, de 31 de dezembro).

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se devidamente representadas de harmonia com os artigos 4.º e 10.º,n.º 2, do RJAT, e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.

O processo não padece de nulidades.

 

III- FUNDAMENTAÇÃO

1.As questões a dirimir são as seguintes:

Se a liquidação n.º 2025..., com o valor global de € 209.732,90, que corrige a autoliquidação n.º 2024... no valor de € 194.946,38, de onde resulta a diferença pagar pelos Requerentes no montante de € 14.786,52, sofre dos vícios por elas aduzidos e, por isso, deverá ser anulada ou não sofrendo deverá ser mantida na ordem jurídica.   

 

 

2 - Matéria de Facto

 

 

a)      O presente pedido de pronúncia foi apresentado e aceite em 28/04/2025, vindo o Tribunal a ser constituído em 08 de julho de 2025 que em 10 do mesmo mês proferiu Despacho de notificação da Requerida nos termos e efeitos do artigo 17º do RJAT.

b)     A AT, em Requerimento de 04/09/2025, veio informar que o ato de liquidação de IRS n.º 2025..., referente ao ano de 2023, aqui impugnado, havia sido parcialmente, revogado conforme Despacho da Senhora Subdiretora-geral de 28-07-2025.

c)     Face a esta revogação o Tribunal proferiu Despacho, em 04/09/2025 a notificar os Requerentes, para em 10 dias, querendo, alegarem o que tiverem por conveniente relativamente à aludida revogação.

d)    Em 08/09/2025, vieram suscitar algumas dúvidas sobre o conteúdo do Requerimento de 04/09/2025 da AT que, entretanto, por ela esclarecidas, levou a que os Requerentes, em 22/09/2025, viessem aos autos aceitar o procedimento de anulação proferido pela AT e considerar desnecessário o prosseguimento dos mesmos.

 

2.1 - Fundamentação da Decisão sobre a Matéria de Facto 

 

O Tribunal não tem que se pronunciar sobre todos os detalhes da matéria de facto que foi alegada pelas Partes, cabendo-lhe o dever de selecionar os factos que poderão interessar à decisão e discriminar a matéria que julga provada e declarar a que considera não provada (cfr.artigo123.º, n.º 2, do CPPT, e artigo 607.º, n.º 3, do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são selecionados e conformados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções para o objeto do litígio no direito aplicável (conforme artigo 596.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

A convicção do Tribunal Arbitral fundou-se na livre apreciação das posições assumidas pelas Partes, no teor dos documentos juntos aos autos, por elas não contestados.

 

       2.2- Factos não provados 

Não se considera a existência de outros factos não provados com relevância para a decisão.

 

3 - MATÉRIA DE DIREITO

3.1 – Apreciação da Inutilidade superveniente da lide

 

Revelam os autos que os Requerentes apresentaram em 28/04/2025 pedido de constituição de Tribunal Arbitral que veio a ser constituído em 08/07/2025 e que em 10/04/2025 proferiu Despacho, nos termos e efeitos do artigo 17º do RJAT, vindo a AT (Requerida), em 04/09/2025, apresentar Requerimento no qual informa que o ato impugnado foi revogado, conforme documento anexado, no qual se verifica, em conclusão, que deverá ser dado provimento ao peticionado nos autos, aceitando-se a título de despesa e encargo o valor suportado com a prestação de serviços de intermediação, ao abrigo do artigo 51º do CIRS, que foi confirmada por Despacho de 28/07/2025 da Exma Senhora Subdiretora Geral da AT. 

Em 22/09/2025 os Requerentes vieram aos autos, informar que aceitam o procedimento de anulação proferido pela AT, considerando desnecessário o prosseguimento dos mesmos.

A extinção da instância por inutilidade superveniente da lide ocorre quando, após o início do processo, um facto ocorrido durante a pendência da instância torna desnecessária a decisão do tribunal sobre o mérito da ação. Isso acontece porque a pretensão do autor deixou de ter interesse, quer pelo desaparecimento dos sujeitos ou do objeto do processo, quer pela obtenção da satisfação pretendida por uma via diferente. Esta situação, regulada pelo artigo 277.º, alínea e) do Código de Processo Civil português, resulta na extinção da instância. 

Sobre matéria idêntica já́ o STA se pronunciou, conforme Acórdão de 30 de Julho de 2014 – Pº 0875/14 e no qual se refere: 

 “…A inutilidade superveniente da lide (que constitui causa de extinção da instância - al. e) do art. 277.º do CPC) verifica-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a solução do litígio deixe de interessar, por o resultado que a parte visava obter ter sido atingido por outro meio…”.

 

Em face do exposto, entende este Tribunal que se verifica a inutilidade superveniente da lide quanto à apreciação da legalidade e consequente anulação do ato tributário impugnado pelo Requerente, de tal forma que se julga extinta a instância nos termos e para os efeitos previstos no artigo 277.º, alínea e), do Código do Processo Civil (doravante “CPC”), aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.

 

3- 2 Da Responsabilidade da Custas

 

Considerando que a revogação do ato impugnado nos presentes autos foi efetuada na pendência dos mesmos, conclui-se que, quer a impossibilidade, quer a inutilidade da lide, são imputáveis à Requerida AT, por força do disposto no artigo 536.º, n.º 3 e 4 do CPC, pelo que lhe cabe a responsabilidade pelo pagamento do valor integral das custas.

 

IV - DECISÃO

Em Face do exposto o Tribunal decide:

a)     Julgar extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos do artigo 277.º, alínea e) do CPC, aplicável, ex vi, artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.

b)    Fixar o montante das custas em € 918,00, de acordo com o disposto na tabela I referida no artigo 4º do RCPAT, que ficam a cargo da Requerida, conforme disposto no nº 4 do artigo 22º do RJAT e do artigo 527º nº 2 do CPC, aplicável ex vi alínea e) do nº 1 do artigo 29º do RJAT. 

c)      Fixar o valor do processo em € 14.786,52 de harmonia com as disposições contidas no artigo 299º, nº 1, do CPC, artigo 97º-A do CPPT, e artigo 3º, nº2, do RCPAT.

Notifique-se

Lisboa, 06 de outubro de 2025

O Árbitro,

 

Arlindo José Francisco