Decisão Arbitral
Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr. Jorge Manuel Figueiredo e Prof. Doutor Tomás Castro Tavares (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 11-06-2025, acordam no seguinte:
1. Relatório
A..., S.A., com o número de identificação fiscal..., com sede na ...–..., em Lisboa, adiante simplesmente designada por “Requerente”, apresentou pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante “RJAT”), tendo em vista a anulação da liquidação adicional de IRC do exercício de 2020, na parte respeitante à desconsideração do benefício fiscal CFEI.
A Requerente pede ainda a restituição da importância que considera indevidamente retida, com juros indemnizatórios.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante também identificada por “AT” ou simplesmente “Administração Tributária”).
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 31-03-2025.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral coletivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
Em 21-05-2025, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral coletivo foi constituído em 11-06-2025.
A Autoridade Tributária e Aduaneira foi notificada nos termos do artigo 17.º, n.º1, do RJAT, mas nada veio dizer.
Em 11-08-2025, a Requerente apresentou um requerimento em que pede a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, por o acto impugnado ter ido anulado administrativamente em 28-07-2025, pedindo que a Autoridade Tributária e Aduaneira seja responsabilizada pelas custas do processo.
A Autoridade Tributária e Aduaneira foi notificada deste requerimento e confirmou a execução da decisão administrativa de anulação.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e do n.º 1 do artigo 10.º, ambos do RJAT e é competente.
As partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigo 4.º e n.º 2 do artigo 10.º, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março) e o Tribunal é competente.
O processo não enferma de nulidades.
2. Matéria de facto
2.1. Factos provados
Consideram-se provados os seguintes factos com relevo para a decisão:
A) Em 03-12-2024, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu em nome da Requerente a liquidação adicional de IRC n.º 2024..., bem como a respectiva liquidação de juros compensatórios, relativa a IRC do ano de 2020, na parte em que foi desconsiderada a dedução à coleta de IRC do benefício fiscal Crédito Fiscal Extraordinário de Investimento II (“CFEI”), no valor de € 664.207,43 (documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
B) Em 27-03-2025, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo;
C) Em 28-07-2025, a Subdirectora Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira proferiu despacho em que, além do mais, decidiu a «anulação da liquidação adicional de IRC n.º 2024..., de 03/12/2024, referente ao período tributário de 2020 e respetiva liquidação de juros compensatórios, sendo devidos juros indemnizatórios, nos termos do n.º 1 do artigo 43.º da LGT, porquanto, os acordos de revogação dos contratos de trabalho, com fundamento em extinção dos respetivos postos, celebrados entre 2020 e 2022, não integram as modalidades de despedimento coletivo ou extinção do posto de trabalho, consagrados respetivamente nos artigos 359.º e segs e 367.º e segs do CT, aprovado em anexo à Lei n.º 7/2009 de 12 de fevereiro e consequentemente, não se verifica qualquer exclusão do direito ao benefício fiscal, mantendo, assim, a Requerente o direito de usufruir do incentivo em causa» (documento junto pela Requerente em 11-08-2025, cujo teor se dá como reproduzido).
2.2. Factos não provados e fundamentação da decisão da matéria de facto
2.2.1. Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos com o pedido de pronúncia arbitral.
2.2.2. Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado.
3. Matéria de direito
A Requerente impugnou a liquidação de IRC e juros compensatórios, na parte em que foi desconsiderada a dedução à coleta de IRC do benefício fiscal Crédito Fiscal Extraordinário de Investimento II (“CFEI”), no valor de € 664.207,43.
As liquidações de IRC e juros compensatórios foram revogadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira, que reconheceu o direito da Requerente a juros indemnizatórios.
Os Requerentes defendem que deve ser extinta a instância por inutilidade superveniente da lide.
O interesse processual dos Requerentes era obterem a anulação das liquidações impugnadas e o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios,
Tendo as liquidações sido anuladas administrativamente e sido reconhecido o direito a juros indemnizatórios, verifica-se inutilidade superveniente da lide pois estão satisfeitas as pretensões da Requerente.
O interesse em agir constitui um pressuposto processual ( [1] ) ou condição da acção ( [2]) e "consiste na necessidade de usar do processo, de instaurar ou fazer prosseguir a acção".( [3] )
A desnecessidade no prosseguimento da acção reconduz-se à falta de um pressuposto processual ou condição da acção que constitui uma excepção dilatória inominada de conhecimento oficioso [artigos 277.º, alínea e), 576.º, n.º 2, 577.º e 578.º do CPC, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT].
Esta excepção dilatória é causa de extinção da instância e implica a absolvição da Requerida da instância, nos termos dos artigos 277.º, alínea e), e 278.º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Civil, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.
4. Encargos do processo
De harmonia com o disposto no artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, «da decisão arbitral proferida pelo tribunal arbitral consta a fixação do montante e a repartição pelas partes das custas directamente resultantes do processo arbitral».
Pelo que se referiu ocorre uma causa de extinção da instância que é imputável a Autoridade Tributária e Aduaneira, pois apenas revogou a liquidação depois de constituído o Tribunal Arbitral.
A regra básica sobre responsabilidade por encargos dos processos é a de que deve ser condenada a parte que a elas houver dado causa, entendendo-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).
No caso em apreço, a causa de extinção da instância é imputável à Autoridade Tributária e Aduaneira, pelo que lhe é imputável a responsabilidade pelas custas do presente processo.
5. Decisão
Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:
– absolver da instância a Autoridade Tributária e Aduaneira;
– julgar extinta a instância;
– condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagar as custas do presente processo.
6. Valor do processo
De harmonia com o disposto no art. 306.º n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 664.207,43.
7. Custas
Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 9.79200, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo Autoridade Tributária e Aduaneira.
Lisboa, 16-09-2025
Os Árbitros
(Jorge Lopes de Sousa)
(Jorge Manuel Figueiredo)
(Tomás Castro Tavares )
[1] Neste sentido, ANSELMO DE CASTRO, Direito Processual Civil Declaratório, volume II, páginas 253-254.
[2] Neste sentido, MANUEL DE ANDRADE, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, páginas 82-83.
[3] ANTUNES VARELA, J. MIGUEL BEZERRA, e SAMPAIO E NORA, Manual de Processo Civil, 1.ª edição, página 170.