Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 12/2025-T
Data da decisão: 2025-09-12  IVA  
Valor do pedido: € 2.102.747,28
Tema: IVA - CEIF – Contribuição Extraordinária s/Indústria Farmacêutica
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SUMÁRIO:

A regularização do IVA contido nas notas de crédito emitidas pelas empresas aderentes ao Acordo celebrado entre a Representante da Indústria Farmacêutica e os Ministérios das Finanças, da Economia e da Saúde é legal em obediência aos critérios estabelecidos no artigo 90.º da Diretiva IVA e 78.º do CIVA, considerando os Acórdãos do TJUE de 12-09-2024, proferido no Processo C-248/23 (Novo NORDISK AS) e de 06-10-2021, proferido no Processo C-717/19(Boehringer Ingelheim).

 

 

DECISÃO ARBITRAL

Os árbitros Prof.ª Doutora Regina de Almeida Monteiro (Presidente), Dr. Martins Alfaro e   Prof. Doutor Miguel Patrício(Adjuntos), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formar o Tribunal Arbitral, constituído em 10-03-2025, decidiram o seguinte:

 

1. Relatório

A... LDA., com sede em..., ...-..., ..., Oeiras, titular do número de identificação fiscal ..., apresentou pedido de pronúncia arbitral, pugnando pela anulação contra as liquidações adicionais de IVA e juros n.º 2024..., relativa ao período de 2021/02, n.º 2024 ..., relativa ao período de 2021/06, n.º 2024..., relativa ao período de 2021/09, n.º 2024..., relativa ao período 2021/12, n.º 2024..., relativa ao período de 2022/02, n.º 2024..., relativa ao período de 2022/02, n.º 2024..., relativa ao n.º 2022/03, n.º 2024..., relativa ao período 2022/03, n.º 2024..., relativa ao período 2022/09, n.º 2024..., relativa ao período de 2022/10, n.º 2024..., relativa ao período de 2022/12, e as respetivas demonstrações de acerto de contas, que apuraram um valor a pagar de € 1.874.020,97.

 

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante também identificada por AT ou Requerida).

 

1.1. Do pedido

A Requerente formaliza o seu pedido:

“Nestes termos e nos melhores de direito, solicita-se respeitosamente a V. Exas. que se dignem conceder provimento ao presente pedido de pronúncia arbitral determinando, em consequência, a anulação das liquidações adicionais de IVA e juros n.º 2024..., relativa ao período de 2021/02, n.º 2024..., relativa ao período de 2021/06, n.º 2024..., relativa ao período de 2021/09, n.º 2024..., relativa ao período 2021/12, n.º 2024..., relativa ao período de 2022/02, n.º 2024..., relativa ao período de 2022/02, n.º 2024..., relativa ao n.º 2022/03, n.º 2024..., relativa ao período 2022/03, n.º 2024..., relativa ao período 2022/09, n.º 2024..., relativa ao período de 2022/10, n.º 2024..., relativa ao período de 2022/12, e as respetivas demonstrações de acerto de contas, que apuraram um valor a pagar de € 1.874.020,97.

Mais se requer a indemnização por prestação indevida de garantia a ser paga pela AT, nos termos do artigo 53.º da LGT e artigo 171.º do CPPT.”

 

1.2. Tramitação processual

A Requerente apresentou em 31-12-2024 o pedido de pronúncia arbitral (PPA) o qual foi aceite pelo Exmo. Senhor presidente do CAAD em 03-01-2025 e nessa data foi automaticamente notificada à AT.

A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 2, alínea a) e do artigo 11.º, n.º 1, alínea a), ambos do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD em 18-02-2025 designou como árbitros do Tribunal Arbitral coletivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável. 

Na mesma data as partes foram notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.

Em conformidade com o disposto no artigo 11.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, o Tribunal Arbitral coletivo ficou constituído em 10-03-2025, o qual foi nessa data comunicado às partes.

Por despacho de 10-03-2025, a Requerida foi notificada para apresentar Resposta e juntar o Processo Administrativo, (PA).

Em 22-04-2025 a Requerida apresentou a Resposta, notificada a 23-04-2025.

Por despacho de 24-04-2025, o Tribunal Arbitral notificou a Requerente para indicar os factos (ou tema da prova) sobre que pretende a inquirição das testemunhas arroladas.

Mais solicitou à Requerida para proceder à junção do Processo Administrativo (PA).

Por Requerimento de 29-04-2025, a Requerente procedeu à junção aos autos de cópias das decisões proferidas pelos Tribunais Arbitrais no âmbito do processo n.º 644/2024-T, de 21 de janeiro de 2025, do processo n.º 877/2024-T, de 17 de março de 2025, do processo n.º 948/2024-T, de 7 de abril de 2025, e pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra no âmbito do processo n.º 376/23.1BESNT, de 31 de dezembro de 2024 e do processo n.º 749/23.0BESNT, de 15 de janeiro de 2025, por supervenientes, ao abrigo do n.º 3 do artigo 423.º do CPC, aplicável ex vi do artigo 29.º do RJAT.

Em 30-04-2025 foi proferido o seguinte despacho: “Tendo a Requerente apresentado um requerimento em 29-04-2025 e junto documentos considerando o disposto nos artigos 415.º n.º 1 e 427.º do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1 e) do RJAT, notifique-se a AT para que se pronuncie no prazo de 5 dias”, não tendo a Requerida se pronunciado sobre essa junção.

Por requerimento de 05-05-2025 a Requerente indicou os factos sobre os quais as testemunhas deveriam prestar depoimento.

Em 12-05-2025 a Requerida juntou o PA.

Por despacho 17-06-2025, notificado a 18-06-2025 foi decidido: “considerando que os temas de prova indicados pela Requerente entende-se que não existe matéria de facto controvertida relevante para decisão da causa que possa ser esclarecida pela inquirição de testemunhas”.

E o abrigo dos princípios da autonomia do Tribunal Arbitral na condução do processo, da celeridade, da simplificação e informalidade processuais (artigos 19.º, n.º 2, e 29.º, n.º 2, do RJAT) dispensa-se a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT. 

Concede-se às partes a possibilidade apresentarem alegações escritas, querendo, no prazo simultâneo de 20 dias, contados da notificação do presente despacho.

A AT apresentou as suas alegações por e-mail de 16-07-2025, em que afirmou: “remete-se e dá-se por integralmente reproduzido o aduzido em sede de Resposta e aí peticionado”.

Em 16-07-2025, a Requerente apresentou as suas alegações.

Em 04-09-2025, foi proferido despacho prorrogando o prazo para prolação da decisão arbitral nos termos do artigo 21.º, n.º 2, do RJAT.

 

1.3. Admissão dos documentos juntos pela Requerente em 29-04-2025

Atendendo ao facto de os documentos juntos pela Requerente que consistem em decisões do CAAD, disponíveis no site do CAAD e uma decisão do TAF de Sintra e na falta de oposição da Requerida, e por serem decisões devidamente publicitadas e acessíveis publicamente, decide-se admitir esses documentos.

 

2. Saneamento

O Tribunal Arbitral coletivo foi regularmente constituído e é materialmente competente para conhecer do pedido, que foi tempestivamente apresentado nos termos dos artigos 5.º e 10.º, n.º 1, alínea a), do RJAT. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e estão regularmente representadas, em conformidade com o disposto nos artigos 4.º e 10.º, n.º 2, ambos do RJAT.

O processo não enferma de nulidades, nem existem exceções ou questões prévias que cumpra conhecer e que obstem à apreciação do mérito da causa.

 

3. Matéria de facto

3.1. Factos provados

a)             A Requerente é uma sociedade por quotas registada para o exercício da atividade de comércio por grosso de produtos farmacêuticos (CAE 46460), atividade sujeita a imposto e que confere o direito à dedução; (cfr. PPA e RIT).

b)            A Requerente é uma empresa da indústria farmacêutica associada da Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica, (APIFARMA); (cfr. RIT).

c)             Em sede do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), é, de acordo com o disposto no artigo 2.º, n.º 1, a), do Código do IVA (CIVA), um sujeito passivo, enquadrado no regime normal com periodicidade mensal, de acordo com o artigo 41.º, n.º 1, a), do CIVA; (cfr. RIT).

d)            Enquanto titular da autorização de introdução no mercado de diversos fármacos, a Requerente vende fármacos a entidades do Serviço Nacional de Saúde (SNS); (cfr. PPA e RIT).

e)             Pelo fornecimento de produtos farmacêuticos (mormente medicamentos) às entidades do SNS, a Requerente emite, maioritariamente, faturas com IVA à taxa reduzida de 6%, nos termos da verba 2.5 da Lista I, anexa ao Código do IVA; (cfr. PPA e RIT).

f)              No exercício da sua atividade, a Requerente aderiu ao acordo celebrado, em 14-04- 2016, entre o Estado e a indústria farmacêutica; (cfr. declaração de adesão ao Acordo APIFARMA, junta ao PPA como doc. 3 ao PPA e cópia junta no RIT). 

g)             Em virtude da adesão ao Acordo celebrado entre o Estado Português e o setor da indústria farmacêutica, a Requerente vinculou-se a participar no esforço conjunto destinado a garantir a sustentabilidade financeira do SNS e a assegurar o acesso equitativo da população aos medicamentos. Para esse efeito, assumiu a obrigação de efetuar uma contribuição de natureza voluntária, cujo montante é calculado proporcionalmente à despesa incorrida pelo SNS com os medicamentos comercializados pela Requerente; (cfr. RIT).

h)            O cálculo do montante de tais contribuições é definido por uma fórmula fornecida pela APIFARMA e que corresponde à aplicação de uma percentagem ao valor da despesa pública com medicamentos, com base em indicadores fornecidos pelo Infarmed relativamente a compras de medicamentos efetuadas por entidades pertencentes ao SNS; (cfr. PPA e RIT)

i)              O pagamento da contribuição em 2021 e 2022 foi realizado mediante a emissão de notas de crédito aos hospitais e/ou pagamento à ACSS, I.P. (cfr. doc. 4 junto com o PPA).

j)              Como resultado da emissão das notas de crédito, a Requerente deixa de receber (e a entidade destinatária das notas de crédito deixa de pagar) a totalidade do preço refletido em faturas anteriormente emitidas às entidades do SNS pela venda de medicamentos, o que inequivocamente implica uma redução do valor tributável das operações tituladas por aquelas faturas; (cfr. PPA)

k)             Afirma a Requerente que Existe, portanto, um nexo inequívoco entre as notas de crédito emitidas pela Requerente e as vendas de medicamentos anteriormente efetuadas às entidades do SNS.”

l)              A Requerente regulariza, a seu favor, o IVA liquidado nas vendas daqueles medicamentos às entidades do SNS, em estrito cumprimento do disposto no artigo 78.º do Código do IVA e nos artigos 73.º e 90.º da Diretiva IVA.

m)           Do procedimento adotado pela Requerente: a emissão de notas de crédito e posterior regularização, a seu favor, do IVA nelas contido:

Conforme resulta da cláusula 5.ª do Acordo APIFARMA e da declaração de adesão ao mesmo, a Requerente concretiza a sua contribuição mediante a emissão de notas de crédito em benefício das entidades do SNS (cfr. declaração de adesão, doc. 3 junto com o PPA e a lista de notas de crédito – doc. 6 junto com o PPA e RIT).

n)            Para o efeito, a Requerente recebe trimestralmente comunicações da APIFARMA com indicação do montante da sua contribuição (cfr. doc. 5 junto com o PPA).

o)             Neste caso, aplica a lógica first in first out, ou seja, a Requerente concretiza a sua contribuição, trimestralmente, mediante a emissão de notas de crédito em benefício das entidades do SNS que compensam as faturas mais antigas anteriormente emitidas a estas entidades; (cfr. doc. 7 junto com o PPA). 

p)            A Requerente afirma que as notas de crédito, “configuram documentos retificativos de faturas anteriormente emitidas às entidades do SNS, são emitidas em concretização do objetivo de redução da despesa pública com a aquisição de medicamentos, nos termos previstos no art.º 5.º do Acordo APIFARMA, ou seja, destinam-se a reduzir o preço, logo, o valor tributável, dos fornecimentos anteriormente realizados”; (cfr. doc. 4 e doc. 7 juntos com o PPA). 

q)            As notas de crédito emitidas pela Requerente, em cumprimento do referido Acordo, fazem referência ao Acordo APIFARMA; (cfr. doc. 6 junto com o PPA). 

r)             Através do extrato das notas de crédito emitidas para o Acordo APIFARMA, é possível estabelecer uma relação entre o valor da contribuição que é devido pela Requerente, concretizado mediante a emissão de tais notas de crédito, e a parte que respeita a cada entidade; (cfr. doc. 8 junto com o PPA e notas de crédito constantes do RIT).

s)             O montante de cada uma das notas de crédito é subtraído ao valor que as entidades do SNS devem à Requerente pela aquisição de medicamentos; (cfr. doc. 7 junto com o PPA). 

t)              Ao aderir ao Acordo APIFARMA, a Requerente renunciou a uma fração da contrapartida que deveria ser paga pelas entidades do SNS, ou seja, há uma parte da contrapartida das vendas de medicamentos às entidades do SNS que não chega a ser recebida pela Requerente (cfr. doc. 7 junto com o PPA).

u)            Essa relação direta resulta não só do facto de terem sido emitidas notas de crédito que fazem referência expressa ao Acordo APIFARMA, mas também por existir uma listagem de conta corrente, que é partilhada e aceite pelas partes intervenientes (fornecedor e adquirente), que reflete exatamente essa realidade, i.e., que a nota de crédito reduz o montante devido pelas entidades do SNS à Requerente pela aquisição de medicamentos; (cfr. doc. 7 junto com o PPA e RIT). 

v)             A Requerente considerou as notas de crédito por si emitidas às entidades do SNS nas suas declarações periódicas de IVA, o que levou a uma alteração do valor tributável e do valor do imposto devido ao Estado.

w)           A requerente afirma: “Como estas notas de crédito consistem em verdadeiras reduções do preço, a Requerente regularizou, a seu favor, o IVA liquidado nas faturas inicialmente emitidas às entidades do SNS pelo fornecimento de medicamentos – imposto que a Requerente entregou nos cofres do Estado, mas que nunca chegou a receber das entidades do SNS -, em estrito cumprimento do disposto no artigo 78.º do Código do IVA e nos artigos 73.º e 90.º da Diretiva IVA”.

 

Do procedimento de inspeção tributária interna relativa ao ano de 2021

x)             Ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI2024..., de 20 de fevereiro de 2024, a Requerente foi objeto de uma inspeção tributária interna, de âmbito parcial, com vista a verificar a sua situação tributária em sede de IVA, com referência ao ano de 2021.

y)             Consta do RIT nomeadamente o seguinte:

“Em resultado da ação de inspeção interna, parcial efetuada à sociedade A..., Lda., NIPC ... (doravante A... ou sujeito passivo), ao exercício de 2021, relativamente ao Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), detetaram-se as situações passíveis de correção técnica que, seguidamente, se descrevem de forma sucinta:

Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA)

O imposto sobre o valor acrescentado que a A... regularizou a seu favor, com base nas notas de crédito emitidas para Hospitais Públicos incluídos na rede do Serviço Nacional de Saúde (SNS), no valor de € 724.559,24 inscrito no campo 40 das declarações periódicas de IVA de fevereiro e dezembro de 2021, vai ser objeto de correção por não respeitar a operações enquadráveis no Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (ver ponto V do presente relatório).

A legislação indicada reporta-se àquela que se encontrava em vigor à data dos factos relatados.

II. Objetivos, âmbito, extensão e duração da ação de inspeção

II.1. Credencial, motivo, âmbito e incidência temporal

O procedimento inspetivo interno, incidente sobre o período de 2021 e de âmbito parcial (CIVA), nos termos da al. b) do n.º 1 do art.º 14.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA), efetuado ao sujeito passivo A..., Lda., NIPC..., está credenciado pela Ordem de Serviço n.º OI2024... de 2024/02/20, emitida pela Unidade dos Grandes Contribuintes (UGC).

A presente ação inspetiva tem como base de análise as declarações de IVA do período de 2021, entregues pelo sujeito passivo.

II.2. Data do início e do fim dos atos de inspeção, interrupções, suspensões e

prorrogações verificadas

O início do procedimento inspetivo foi notificado ao sujeito passivo através do documento com o código

....

(...)

V. Descrição dos factos e fundamentos das correções/irregularidades

1. Os factos

Da análise das operações tributáveis realizadas pela A..., Lda, em 2021 constatou-se que, cerca de 91,80% das operações ativas são tributadas à taxa reduzida de imposto ao abrigo da alínea a) do ponto 2.5 da Lista I anexa ao Código do IVA (produtos farmacêuticos e similares).

Quanto às operações passivas, as mesmas consubstanciam-se essencialmente na aquisição de produtos farmacêuticos, sendo uma parcela mais reduzida referente a outros bens e serviços sobre os quais incide a taxa normal de IVA.

O IVA inscrito no campo 40 da Declaração periódica de IVA dos meses de fevereiro e dezembro tem por base, maioritariamente, as notas de crédito por si emitidas, com o descritivo “Protocolo 2020” e “Protocolo 2021” e nos comentários:

· “No âmbito do Acordo de 2020 – 4ª Parcela”;

· “No âmbito do Acordo de 2021 – 1ª e 2ª Parcelas”;

· “No âmbito do Acordo de 2021 – 3ª Parcela”.

 

relativas a comparticipações / contribuições resultantes da adesão da A..., como associada da Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica (APIFARMA), aos Acordos assinados entre o Estado Português e a Indústria Farmacêutica.

No âmbito desse Acordo, a A... emitiu em fevereiro e dezembro de 2021, a título de contribuição financeira, notas de crédito nos montantes, respetivamente, de € 2.822.048,48 e € 9.978.498,07 (com IVA incluído) e regularizou a seu favor o imposto que mencionou nas mesmas, no montante total de 724.559,24, ver anexo 1 e quadro seguinte:

 

As notas de crédito emitidas em fevereiro respeitam ao valor da comparticipação apurada na 4.ª tranche da parcela de 2020 e as emitidas em dezembro de 2021 respeitam ao valor da comparticipação apurada na 1.ª, 2.ª e 3.ª tranches das parcelas de 2021 conforme se constata do descritivo dos lançamentos contabilísticos e respetivos documentos (ver anexo 2).

 

2. O Acordo entre o Estado Português e a Indústria Farmacêutica

Em 15 de março de 2016, à semelhança do que se verifica desde 2012 (data do primeiro Acordo) foi assinado um Acordo entre o Estado Português e a Indústria Farmacêutica com o intuito de atingir os objetivos orçamentais de despesa pública com medicamentos em ambulatório, incluindo subsistemas, e hospitalar do Serviço Nacional de Saúde (SNS) com vista a garantir a sustentabilidade do SNS (ver anexo n.º 3) e no qual é determinado o valor da contribuição financeira a cargo das empresas aderentes (200 milhões de euros) assim como as datas das dívidas vencidas e não pagas que o Ministério da Saúde se compromete a liquidar em cada exercício.

As empresas da Indústria Farmacêutica aderentes ao Acordo aceitam, por essa via, colaborar no esforço de sustentabilidade da despesa pública em medicamentos, mediante o pagamento de uma contribuição na parte que exceder os objetivos de despesa pública com medicamentos. Em contrapartida, o Ministério da Saúde compromete-se, entre outras medidas de simplificação administrativa no mercado dos medicamentos, a pagar a dívida contabilizada e vencida das empresas aderentes.

Para concretizar o Acordo referido, em anexo ao mesmo, as empresas aderentes (entre as quais se inclui a A..., como associada da APIFARMA e na qualidade de titular de introdução no mercado e empresa responsável pela comercialização de medicamentos registados no INFARMED), juntam uma declaração de adesão na qual é definida a forma de apuramento e repartição da contribuição da indústria farmacêutica no mercado ambulatório e hospitalar. O apuramento do valor anual da contribuição cabe ao INFARMED, sendo comunicado pela APIFARMA aos seus associados que aderiram ao Acordo (ver anexo 4).

(...)

3. Reflexos Financeiros do Acordo na A... no exercício de 2021

Nos termos previstos pelo Acordo celebrado entre o Estado Português e a Indústria Farmacêutica (representada pela APIFARMA) e respetivos Anexos de adesão do ano de 2021 (ver anexos 7 e 8), a APIFARMA comunica a cada empresa aderente, o montante da contribuição calculada com base nos valores de encargos do SNS veiculados pelo INFARMED (ver anexos 9 a 12).

Nas comunicações da APIFARMA para a A... designadas por “Contribuições a realizar no âmbito do Acordo Governo – APIFARMA 2021 (ver anexo 9), encontra-se estipulado que, e passa a citar-se: “Deverá, a partir da data desta comunicação, e com a maior brevidade possível, efetuar o pagamento, podendo proceder ao mesmo por duas formas:

a) Emissão de notas de crédito aos hospitais do SNS, as quais devem ser identificadas inequivocamente quanto ao âmbito, com a frase “No âmbito do Acordo de 2021” (…)”.

b) Pagamento em numerário à ACSS, I.P., por transferência bancária (…).”

No âmbito do Acordo e conforme se encontra estipulado no Anexo de adesão, foi determinado que o pagamento, cujo total corresponde ao valor da comparticipação calculada pela APIFARMA, se materializasse através da emissão de notas de crédito aos hospitais do Serviço Nacional de Saúde, com o descritivo “No âmbito do Acordo de 2021”.

As contribuições financeiras, apuradas nos termos do Acordo e respetivo Anexo de Adesão, com base nos valores de encargos do SNS, e comunicadas pela APIFARMA à A..., cifram-se em 2021 no montante total de € 12.075.987,31.

A A... optou pela emissão de notas de crédito, com IVA incluído, sendo o valor líquido desse imposto, em 2021 de € 12.075.987,31 (12.800.546,55/1,06) (ver anexo 1), o qual contabilizou a débito na conta 71810011 – “Descontos e Abatimentos em Vendas” (ver anexo 13).

(...)

 

4.4 Conclusão interlocutória

Com este mecanismo, e consoante as duas situações distintas que podem ocorrer, o SNS diminui a sua dívida para com os fornecedores de medicamentos, quer seja por via das notas de crédito que regularizam as dívidas mais antigas, quer seja pela realização de uma receita adicional que lhe servirá de meios financeiros, provavelmente, para proceder a pagamentos atuais ou futuros relacionados com despesas de medicamentos.

Mas o que constatamos é que o mecanismo utilizado pela empresa A... origina um tratamento fiscal desigual face às empresas que pagam CEIF.

A A..., como aderente ao Acordo estabelecido entre o Estado Português e a Indústria Farmacêutica, procede à emissão de notas de crédito aos hospitais do SNS, com regularização do IVA, como se fosse um abatimento ao valor das suas vendas, recuperando parte do IVA anteriormente liquidado.

Com a utilização deste mecanismo, a A... reverte a seu favor, sob a forma de crédito de imposto, uma parte do valor da contribuição (correspondente ao valor do IVA) que deveria entregar ao Estado.

A A... efetuou a seguinte contabilização (incorreta) com reflexos em contas de IVA apuramento e em contas de gastos (ver anexo 13):

· Débito da conta 24330010 – “Imposto sobre o valor acrescentado – IVA liquidado” pelo montante do IVA regularizado a seu favor, mencionado nas notas de crédito.

· Débito da conta 71810011 – “Descontos e Abatimentos em Vendas” pelo valor base das notas de crédito.

· Crédito da conta 21110010 – “Clientes não Afiliados c/c” pelo valor total das notas de crédito.

Ora, uma vez que a A... detém créditos vencidos e não pagos sobre os hospitais do SNS (seus clientes) e aderiu ao acordo amplamente mencionado e explicado no ponto V.1 deste relatório, o procedimento contabilístico deveria ter sido o seguinte:

· Débito da conta 688800 – “Outros gastos e perdas – Outros”

· Crédito da conta 21 – “Clientes – Outros”

Pela totalidade do valor da nota de crédito, a qual não deve ter qualquer referência a Imposto sobre o Valor Acrescentado.

Na eventualidade de a A... não ter créditos sobre os seus clientes (hospitais do SNS), o lançamento

contabilístico, poderia, por exemplo, ser o seguinte:

· Aquando da estimativa do valor da sua comparticipação:

Débito da conta 688800 – “Outros gastos e perdas – Outros”

Crédito da conta 248 – “Estado e Outros entes públicos – Outras contribuições”

· Aquando do pagamento do valor da sua comparticipação:

Débito da conta 248 – “Estado e Outros entes públicos – Outras contribuições”

Crédito da conta 12 – “Depósitos à ordem”

 

5. Enquadramento jurídico-tributário da contribuição constante do Acordo

Encontra-se estipulado no Acordo assinado entre o Estado Português e a Indústria Farmacêutica (APIFARMA), assim como na declaração de adesão e comunicados efetuados pela APIFARMA aos seus associados (ver anexo 8) que o pagamento da contribuição se realiza de duas formas alternativas:

· Emissão de nota de crédito no montante da contribuição apurada (proporcionalmente ao valor faturado a cada entidade do SNS no período objeto de pagamento) contra a liquidação de faturas (emitidas ao SNS) não pagas e vencidas por critério de antiguidade;

· Pagamento por transferência bancária a favor da ACSS da contribuição apurada, no caso do valor das faturas não pagas e vencidas ser inferior ao valor da contribuição.

Assim, só no caso do valor das faturas emitidas ao SNS que se encontram em dívida para a empresa aderente ser inferior ao valor apurado para efeitos de contribuição, se verificará um fluxo financeiro de saída, da empresa aderente para a ACSS e consequentemente um recebimento efetivo por parte desta entidade a título de contribuição no âmbito do Acordo.

Caso contrário, apenas se verifica uma diminuição da dívida do SNS para com a empresa aderente em valor equivalente ao da contribuição por via do efeito da emissão das notas de crédito.

Quer isto dizer que, com base no acordo, a A... em vez de entregar ao Estado o quantitativo a que está obrigada, vai receber menos esse montante por parte dos seus clientes (hospitais do SNS).

Como está bem claro no Acordo a forma de pagamento não consubstancia qualquer desconto relativamente a vendas efetuadas anteriormente.

(...)

Para que essa desigualdade não aconteça, a nota de crédito deve funcionar apenas e tão só como um documento de quitação dos créditos não pagos e vencidos, e não como um documento de desconto do valor da faturação anteriormente emitida. Em concreto, o que se verifica é uma liquidação das faturas mais antigas em dívida e não uma retificação do valor tributável das mesmas, ou seja, o pagamento da contribuição por parte da A... concretiza-se através do não recebimento dos valores faturados mais antigos, vencidos e não pagos.

Como já se referiu, a forma de cálculo da contribuição de cada aderente baseia-se no volume de vendas de medicamentos que esse realizou no período (trimestre) correspondente ao período de pagamento da contribuição.

Refira-se novamente que, através da emissão das notas de crédito, a A... apenas liquida uma parte dos créditos em dívida por parte do SNS em montante igual ao valor da contribuição que teria de entregar ao Estado (caso não estivesse no Acordo).

Ora esta situação não se enquadra nas situações previstas no n.º 7 do artigo 29.º do CIVA em conjugação com n.º 2 do artigo 78.º do mesmo diploma, pois, em termos práticos, a operação de pagamento da contribuição não se consubstancia num abatimento ou desconto sobre o valor das suas vendas uma vez que não se verifica uma diminuição do valor tributável das operações ativas anteriormente realizadas conforme previsto no artigo 16.º do CIVA.

O valor da faturação anteriormente realizada ao SNS e sobre a qual o sujeito passivo liquidou o respetivo IVA, não sofreu qualquer diminuição, apenas foi objeto de liquidação financeira por parte do SNS através do mecanismo da emissão de um crédito em seu favor, a título de contribuição financeira (leia-se a título de substituição da CEIF – contribuição a que a A... está sujeita, face à atividade exercida).

A emissão destas notas de crédito traduz o pagamento da contribuição financeira a que a A... está obrigada e como tal nunca poderão dar lugar à regularização de IVA, por parte do fornecedor, pois não tem enquadramento nas situações previstas no artigo 78.º ou em qualquer outro artigo do Código do IVA.

A situação em que o credor prescinde do recebimento da contraprestação, em substituição de um não pagamento, não é uma situação em que tenha havido uma alteração do valor tributável da operação que ocorreu anteriormente, tal como se verificaria se estivéssemos perante um desconto ou devolução dos produtos anteriormente faturados. Também não se trata de um caso de incobrabilidade do valor faturado por um dos processos referidos no artigo 78.º n.º 7 ou no n.º 4 do artigo 78.º-A, ambos do CIVA.

É a própria forma de apuramento da contribuição financeira em favor do SNS que, como já foi referido, segue a metodologia preconizada na CEIF, a qual determina que a sua base tributável incide sobre o total das vendas de medicamentos realizadas em cada trimestre, sendo que esse valor de venda “corresponde à parte do preço de venda ao público, deduzido do imposto sobre o valor acrescentado (IVA).” (alínea a) do n.º 2 do artigo 3.º do regime da CEIF).

Ora, se a contribuição financeira a liquidar ao ACSS se materializa em meios monetários, sendo por isso uma operação excluída da sujeição a IVA, então forçosamente a nota de crédito que a concretiza não tem enquadramento em sede deste imposto.

A emissão de nota de crédito aqui em crise é equivalente, em termos de produção de efeitos, a uma entrega em dinheiro por parte da A... ao Estado, tal como o faria se pagasse a CEIF.

(...)

6. Conclusão

Em 2015 entrou em vigor a Contribuição Extraordinária sobre a Indústria Farmacêutica (CEIF), cujo principal objetivo é o de garantir a sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde, na vertente dos gastos com medicamentos.

A CEIF resulta da aplicação de uma determinada taxa sobre o volume de vendas de medicamentos para o SNS e incide sobre um grupo específico de produtores e comercializadores da indústria farmacêutica.

Paralelamente à existência da Contribuição Extraordinária sobre a Indústria Farmacêutica (CEIF), em 2016 (à semelhança do que se verificou em anos anteriores desde 2012), foi assinado um Acordo entre o Estado Português, representado pelos Ministros das Finanças, da Economia e da Saúde e a Indústria Farmacêutica que visa contribuir para a sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

As empresas que aderiram a esse Acordo, através da APIFARMA, comprometem-se a colaborar para atingir os objetivos orçamentais anuais de despesa pública com medicamentos em ambulatório e hospitalar do Serviço Nacional de Saúde, com vista a garantir a sustentabilidade do SNS.

À semelhança da CEIF, esta contribuição tem a natureza jurídica de contribuição financeira, uma vez que existe

um benefício na sua aplicação - a receita vai permitir a sustentabilidade do SNS. Além disso, permite que as necessidades financeiras associadas ao SNS sejam satisfeitas junto dos produtores e comercializadores da indústria farmacêutica (liquidação das dívidas vencidas e não pagas a estes fornecedores de medicamentos).

Neste âmbito, a APIFARMA tem como função comunicar às empresas aderentes as respetivas contribuições a pagar trimestralmente, conforme estabelecido no Acordo e no Anexo de adesão, sendo essa contribuição calculada com base na classificação dos medicamentos e nos valores do SNS.

Tanto a Contribuição Extraordinária sobre a Indústria Farmacêutica como os Acordos estabelecidos entre o Estado Português e a Indústria Farmacêutica têm como objetivo comum garantir a sustentabilidade orçamental e financeira do Serviço Nacional de Saúde (SNS), baixando a despesa pública em medicamentos.

Como está em causa o pagamento de um tributo, não se verifica, a redução de preço prevista no artigo. 90º, nº 1, da Diretiva IVA e no artigo 78º, nº 2, do CIVA. Assim o pagamento em causa consubstancia o cumprimento duma obrigação no âmbito de relação jurídico-tributária e não no âmbito de relação jurídica de direito privado sobre que incide o IVA.

No caso concreto da A... e porque a mesma aderiu ao Acordo (já amplamente explicado) verificámos que:

· De acordo com os valores comunicados pela APIFARMA a empresa estava obrigada a contribuir para o SNS em € 12.800.546,55;

· O que a A...  fez, foi emitir notas de crédito pelo valor a que está obrigada, contabilizando-as a débito de contas de rendimentos e de IVA liquidado por crédito da diminuição da dívida dos hospitais.

· Os procedimentos adotados pelo sujeito passivo tiveram como consequência o não pagamento por parte do Estado (à A...) do valor em causa, o qual seria exatamente igual ao que a A... teria de entregar nos cofres do Estado (e não o fez) sob a forma de CEIF.

Conclui-se assim que a empresa deduz / regulariza indevidamente IVA a seu favor, infringindo os artigos 19º e 20.º do Código do IVA, uma vez que a contribuição financeira devida pelos aderentes ao Acordo, não constitui a contrapartida de uma prestação de serviços ou transmissão de bens, tal como definidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 1.º do CIVA, tratando-se de uma operação fora do âmbito de aplicação do imposto.

Deste modo, propõe-se a correção do IVA regularizado a favor do sujeito passivo no campo 40 das declarações periódicas de IVA de fevereiro e dezembro de 2021, nos montantes, respetivamente, de € 159.738,58 e € 564.820,66 (perfazendo um total de € 724.559,24), uma vez que, conforme já referido, as operações refletidas nas notas de crédito emitidas pela A... não resultam de situações enquadráveis na alínea a) do n.º 1 do artigo 1.º do Código do IVA por respeitarem a operações fora do campo de incidência desse Imposto.

A título complementar, refere-se que a correção dos valores inscritos no campo 40 das declarações periódicas de fevereiro e dezembro de 2021, irá originar uma retificação dos valores do imposto apurado nestes meses, assim como o crédito de imposto reportado para os meses seguintes, sendo possível que daí se verifiquem valores de imposto a pagar nos períodos de IVA subsequentes.”

z)             No âmbito deste procedimento inspetivo, a Requerente foi notificada pelos SIT do Relatório Final de Inspeção Tributária (“Relatório de Inspeção de 2021”), no qual os SIT fizerem correções no montante total de  724.559,24 relativas a IVA (alegadamente) indevidamente regularizado pela Requerente, a seu favor, contido em notas de crédito emitidas às entidades do SNS ao abrigo do artigo 5.º do Acordo APIFARMA; (cfr. doc. n.º 1 junto com o PPA).

 

Do procedimento de inspeção tributária interna relativa ao ano de 2022

aa)          Os SIT no Projeto do Relatório de Inspeção de 2022, com base na ordem de serviço OI2024..., e que obteve a confirmação do Chefe de equipa em 23-07-2024, fundamentaram as correções efetuadas com base seguintes argumentos:

V. Descrição dos factos e fundamentos das correções/irregularidades

Correção ao Imposto – IVA

1. Os factos

Da análise das operações tributáveis realizadas pela A..., Lda, em 2022 constatou-se que, cerca de 68,05% das operações ativas são tributadas à taxa reduzida de imposto ao abrigo da alínea a) do ponto 2.5 da Lista I anexa ao Código do IVA (produtos farmacêuticos e similares).

Quanto às operações passivas, as mesmas consubstanciam-se essencialmente na aquisição de produtos farmacêuticos, sendo uma parcela mais reduzida referente a outros bens e serviços sobre os quais incide a taxa normal de IVA.

O IVA inscrito no campo 40 da Declaração periódica de IVA dos meses de fevereiro, setembro, outubro e dezembro têm por base, maioritariamente, as notas de crédito por si emitidas, com o descritivo “Protocolo 2021”

e “Protocolo 2022” e nos comentários:

· “No âmbito do Acordo de 2021 – 4ª Parcela”;

· “No âmbito do Acordo de 2022 – 1ª Parcela”;

· “No âmbito do Acordo de 2022 – 2ª Parcela”;

· “No âmbito do Acordo de 2022 – 3ª Parcela”.

relativas a comparticipações / contribuições resultantes da adesão da A..., como associada da Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica (APIFARMA), aos Acordos assinados entre o Estado Português e a Indústria Farmacêutica.

No âmbito desse Acordo, a A... emitiu em fevereiro, setembro, outubro e dezembro de 2022, a título de contribuição financeira, notas de crédito nos montantes, respetivamente, de € 3.488.977,65, € 3.324.154,22, € 3.876.421,20 e € 6.026.711,69 (com IVA incluído) e regularizou a seu favor o imposto que mencionou nas mesmas, no montante total de € 946.203,63, ver anexo 1 e quadro seguinte:

As notas de crédito emitidas em fevereiro respeitam ao valor da comparticipação apurada na 4.ª tranche da parcela de 2021, as emitidas em setembro de 2022 respeitam ao valor da comparticipação apurada na 1.ª tranche das parcelas de 2022 e fecho de contas de 2020 e as emitidas em outubro e dezembro de 2022 respeitam ao valor da comparticipação apurada na 2.ª e 3.ª tranches conforme se constata do descritivo dos lançamentos contabilísticos (ver anexo 13) e respetivos documentos (ver anexo 2).

 

3. Reflexos Financeiros do Acordo na A... no exercício de 2022

Nos termos previstos pelo Acordo celebrado entre o Estado Português e a Indústria Farmacêutica (representada pela APIFARMA) e respetivos Anexos de adesão do ano de 2022 (ver anexos 7 e 8), a APIFARMA comunica a cada empresa aderente, o montante da contribuição calculada com base nos valores de encargos do SNS veiculados pelo INFARMED (ver anexos 9 a 12).

Nas comunicações da APIFARMA para a A... designadas por “Contribuições a realizar no âmbito do Acordo Governo – APIFARMA 2022” (ver anexo 9), encontra-se estipulado que, e passa a citar-se: “Deverá, a partir da data desta comunicação, e com a maior brevidade possível, efetuar o pagamento, podendo proceder ao mesmo por duas formas:

a) Emissão de notas de crédito aos hospitais do SNS, as quais devem ser identificadas inequivocamente quanto ao âmbito, com a frase “No âmbito do Acordo de 2022” (…)”.

b) Pagamento em numerário à ACSS, I.P., por transferência bancária (…).”

No âmbito do Acordo e conforme se encontra estipulado no Anexo de adesão, foi determinado que o pagamento, cujo total corresponde ao valor da comparticipação calculada pela APIFARMA, se materializasse através da emissão de notas de crédito aos hospitais do Serviço Nacional de Saúde, com o descritivo “No âmbito do Acordo de 2022”.

As contribuições financeiras, apuradas nos termos do Acordo e respetivo Anexo de Adesão, com base nos valores de encargos do SNS, e comunicadas pela APIFARMA à A..., cifram-se em 2022 no montante total de € 15.770.061,13.

A A...optou pela emissão de notas de crédito, com IVA incluído, sendo o valor líquido desse imposto, em 2022 de € 15.770.061,13 (16.716.264,76/1,06) (ver anexo 1), o qual contabilizou a débito na conta 71810011 – Descontos e Abatimentos em Vendas” (ver anexo 13).

(...)

4.4 Conclusão interlocutória

(...)

A A... efetuou a seguinte contabilização (incorreta) com reflexos em contas de IVA apuramento e em contas de gastos (ver anexo 13):

· Débito da conta 24330010 – “Imposto sobre o valor acrescentado – IVA liquidado” pelo montante do IVA regularizado a seu favor, mencionado nas notas de crédito.

· Débito da conta 71810011 – “Descontos e Abatimentos em Vendas” pelo valor base das notas de crédito.

· Crédito da conta 21110010 – “Clientes não Afiliados c/c” pelo valor total das notas de crédito.

Ora, uma vez que a A... detém créditos vencidos e não pagos sobre os hospitais do SNS (seus clientes) e aderiu ao acordo amplamente mencionado e explicado no ponto V.1 deste relatório, o procedimento contabilístico deveria ter sido o seguinte:

· Débito da conta 688800 – “Outros gastos e perdas – Outros”

· Crédito da conta 21 – “Clientes – Outros”

Pela totalidade do valor da nota de crédito, a qual não deve ter qualquer referência a Imposto sobre o Valor Acrescentado.

Na eventualidade de a A... não ter créditos sobre os seus clientes (hospitais do SNS), o lançamento contabilístico, poderia, por exemplo, ser o seguinte:

· Aquando da estimativa do valor da sua comparticipação:

Débito da conta 688800 – “Outros gastos e perdas – Outros”

Crédito da conta 248 – “Estado e Outros entes públicos – Outras contribuições”

· Aquando do pagamento do valor da sua comparticipação:

Débito da conta 248 – “Estado e Outros entes públicos – Outras contribuições”

Crédito da conta 12 – “Depósitos à ordem”

Encontra-se estipulado no Acordo assinado entre o Estado Português e a Indústria Farmacêutica (APIFARMA), assim como na declaração de adesão e comunicados efetuados pela APIFARMA aos seus associados (ver anexo 8) que o pagamento da contribuição se realiza de duas formas alternativas:

· Emissão de nota de crédito no montante da contribuição apurada (proporcionalmente ao valor faturado a cada entidade do SNS no período objeto de pagamento) contra a liquidação de faturas (emitidas ao SNS) não pagas e vencidas por critério de antiguidade;

· Pagamento por transferência bancária a favor da ACSS da contribuição apurada, no caso do valor das faturas não pagas e vencidas ser inferior ao valor da contribuição.

Assim, só no caso do valor das faturas emitidas ao SNS que se encontram em dívida para a empresa aderente ser inferior ao valor apurado para efeitos de contribuição, se verificará um fluxo financeiro de saída, da empresa aderente para a ACSS e consequentemente um recebimento efetivo por parte desta entidade a título de contribuição no âmbito do Acordo.

Caso contrário, apenas se verifica uma diminuição da dívida do SNS para com a empresa aderente em valor equivalente ao da contribuição por via do efeito da emissão das notas de crédito.

Quer isto dizer que, com base no acordo, a A... em vez de entregar ao Estado o quantitativo a que está obrigada, vai receber menos esse montante por parte dos seus clientes (hospitais do SNS).

Como está bem claro no Acordo a forma de pagamento não consubstancia qualquer desconto relativamente a vendas efetuadas anteriormente.

Os efeitos obtidos pelo Estado são equivalentes em termos de resultado final (quer sejam emitidas notas de crédito quer haja pagamentos efetivos): no primeiro caso, diminui o saldo da dívida do SNS em medicamentos; no segundo caso, o montante em dinheiro recebido permitirá fazer face aos compromissos financeiros do SNS, ou seja, com grande probabilidade, solver dívidas dos fornecedores de medicamentos.

Em ambos os casos, o objetivo de melhorar a sustentabilidade financeira e orçamental do SNS é atingido, assim como se espera também que o impacto económico e financeiro nas empresas aderentes seja equivalente. Se assim não fosse, ou seja, se o resultado económico não fosse igual para ambos os casos (menos recebimento = não pagamento), violar-se-iam os princípios da equivalência e da igualdade subjacentes ao pagamento da contribuição a favor do Estado, entre aderentes ao Acordo consoante esses tivessem créditos vencidos ou não ao SNS. 

Para que essa desigualdade não aconteça, a nota de crédito deve funcionar apenas e tão só como um documento de quitação dos créditos não pagos e vencidos, e não como um documento de desconto do valor da faturação anteriormente emitida. Em concreto, o que se verifica é uma liquidação das faturas mais antigas em dívida e não uma retificação do valor tributável das mesmas, ou seja, o pagamento da contribuição por parte da A... concretiza-se através do não recebimento dos valores faturados mais antigos, vencidos e não pagos.

Como já se referiu, a forma de cálculo da contribuição de cada aderente baseia-se no volume de vendas de medicamentos que esse realizou no período (trimestre) correspondente ao período de pagamento da contribuição.

Refira-se novamente que, através da emissão das notas de crédito, a A... apenas liquida uma parte dos créditos em dívida por parte do SNS em montante igual ao valor da contribuição que teria de entregar ao Estado (caso não estivesse no Acordo).

Ora esta situação não se enquadra nas situações previstas no n.º 7 do artigo 29.º do CIVA em conjugação com n.º 2 do artigo 78.º do mesmo diploma, pois, em termos práticos, a operação de pagamento da contribuição não se consubstancia num abatimento ou desconto sobre o valor das suas vendas uma vez que não se verifica uma diminuição do valor tributável das operações ativas anteriormente realizadas conforme previsto no artigo 16.º do CIVA.

O valor da faturação anteriormente realizada ao SNS e sobre a qual o sujeito passivo liquidou o respetivo IVA, não sofreu qualquer diminuição, apenas foi objeto de liquidação financeira por parte do SNS através do mecanismo da emissão de um crédito em seu favor, a título de contribuição financeira (leia-se a título de substituição da CEIF – contribuição a que a A... está sujeita, face à atividade exercida).

A emissão destas notas de crédito traduz o pagamento da contribuição financeira a que a A... está obrigada e como tal nunca poderão dar lugar à regularização de IVA, por parte do fornecedor, pois não tem enquadramento nas situações previstas no artigo 78.º ou em qualquer outro artigo do Código do IVA.

(..)

É a própria forma de apuramento da contribuição financeira em favor do SNS que, como já foi referido, segue a metodologia preconizada na CEIF, a qual determina que a sua base tributável incide sobre o total das vendas de medicamentos realizadas em cada trimestre, sendo que esse valor de venda “corresponde à parte do preço de venda ao público, deduzido do imposto sobre o valor acrescentado (IVA).” (alínea a) do n.º 2 do artigo 3.º do regime da CEIF).

Ora, se a contribuição financeira a liquidar ao ACSS se materializa em meios monetários, sendo por isso uma operação excluída da sujeição a IVA, então, forçosamente a nota de crédito que a concretiza não tem enquadramento em sede deste imposto.

A emissão de nota de crédito aqui em crise é equivalente, em termos de produção de efeitos, a uma entrega em dinheiro por parte da A... ao Estado, tal como o faria se pagasse a CEIF.

A acontecer a sua emissão, não pode a mesma ser objeto de liquidação de IVA dada a natureza da operação que lhe está subjacente: “Contribuição a realizar no âmbito do acordo Governo-APIFARMA 2022” (leia-se “contribuição financeira devida pelo acordo de 2022”) (ver anexos 9 a 12).

Tal acontece porque a contribuição em questão não tem enquadramento nesse imposto por se encontrar fora do âmbito da sua aplicação.

O Código do IVA, no seu artigo 1.º, n.º 1, sujeita a imposto sobre o valor acrescentado as transmissões de bens e as prestações de serviços efetuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal.

(...)

Assim, sendo a contribuição financeira/entrega de meio monetários pelos aderentes ao Acordo à entidade pública que centraliza as operações financeiras do SNS, a ACSS, não constitui a contrapartida de uma prestação de serviços ou transmissão de bens, tal como definidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 1.º do CIVA, tratando-se, por conseguinte, de uma operação fora do âmbito de aplicação do imposto.

Os movimentos contabilísticos, já referidos no ponto anterior, efetuados pela A..., permitiram que esta empresa efetuasse sob a forma de IVA, a recuperação do valor a que está obrigada a entregar ao Estado em termos de CEIF (leia-se no caso em concreto: contribuição estipulada no Acordo).

Como está em causa o pagamento de um tributo, não se verifica, a redução de preço prevista no artigo. 90º, nº 1, da Diretiva IVA e no artigo 78º, nº 2, do CIVA. Assim o pagamento em causa consubstancia o cumprimento duma obrigação no âmbito de relação jurídico-tributária e não no âmbito de relação jurídica de direito privado sobre que incide o IVA.

No caso concreto da A... e porque a mesma aderiu ao Acordo (já amplamente explicado) verificámos que:

· De acordo com os valores comunicados pela APIFARMA a empresa estava obrigada a contribuir para o SNS em € 16.716.264,76;

· O que a A... fez, foi emitir notas de crédito pelo valor a que está obrigada, contabilizando-as a débito de contas de rendimentos e de IVA liquidado por crédito da diminuição da dívida dos hospitais.

· Os procedimentos adotados pelo sujeito passivo tiveram como consequência o não pagamento por parte do Estado (à A...) do valor em causa, o qual seria exatamente igual ao que a A... teria de entregar nos cofres do Estado (e não o fez) sob a forma de CEIF.

Conclui-se assim que a empresa deduz / regulariza indevidamente IVA a seu favor, infringindo os artigos 19º e 20.º do Código do IVA, uma vez que a contribuição financeira devida pelos aderentes ao Acordo, não constitui a contrapartida de uma prestação de serviços ou transmissão de bens, tal como definidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 1.º do CIVA, tratando-se de uma operação fora do âmbito de aplicação do imposto.

Deste modo, propõe-se a correção do IVA regularizado a favor do sujeito passivo no campo 40 das declarações periódicas de IVA de fevereiro, setembro, outubro e dezembro de 2022, nos montantes, respetivamente, de € 197.489,27, € 188.159,68, € 219.420,07 e € 341.134,61 (perfazendo um total de € 946.203,63), uma vez que, conforme já referido, as operações refletidas nas notas de crédito emitidas pela A... não resultam de situações enquadráveis na alínea a) do n.º 1 do artigo 1.º do Código do IVA por respeitarem a operações fora do campo de incidência desse Imposto.

A título complementar, refere-se que a correção dos valores inscritos no campo 40 das declarações periódicas de fevereiro, setembro, outubro e dezembro de 2022, irá originar uma retificação dos valores do imposto apurado nestes meses, assim como o crédito de imposto reportado para os meses seguintes, sendo possível que daí se verifiquem valores de imposto a pagar nos períodos de IVA subsequentes.

bb)         Na sequência das correções efetuadas pelos SIT em sede de IVA, a Requerente foi notificada dos atos de liquidação adicional de IVA e juros compensatórios nesta sede postos em crise, e respetivas demonstrações de acerto de contas, referentes aos meses de fevereiro, junho, setembro e dezembro de 2021; (cfr. doc. 9 junto com o PPA).

 

 

 

 

 

 

 

cc)          Os Serviços de Inspeção Tributária (SIT), não obstante reconhecerem expressamente que as notas de crédito emitidas pela Requerente compensam as faturas anteriormente emitidas – e que, deste modo, as entidades do SNS beneficiárias das notas de crédito diminuem a sua dívida à Requerente –, acabam por concluir que não se verifica uma redução do valor tributável das operações anteriormente realizadas e, em consequência, rejeitam a regularização do IVA anteriormente liquidado (cfr. pp. 14 e 15 do Relatório de Inspeção de 2021 e do Relatório de Inspeção de 2022).

dd)         A Requerente foi notificada das demonstrações de acertos de contas de IVA referentes ao período de 2021, num montante total de € 159.738,58 (acrescidas das demonstrações de acertos de contas de juros no valor de € 30.304,13). 

ee)          A Requerente solicitou ao banco B..., sucursal em Portugal, a favor da AT, a prestação da garantia bancária n.º ..., que garante o pagamento até ao montante de € 2.400.000,00 (cfr. garantia bancária – doc. 10 junto com o PPA).

 

Do procedimento de inspeção tributária a 2022:

ff)            Ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI2024..., de 20 de fevereiro de 2024, a Requerente foi objeto de uma inspeção tributária interna, de âmbito parcial, com vista a verificar a sua situação tributária em sede de IVA, com referência ao ano de 2022.

gg)          No âmbito deste procedimento inspetivo, a Requerente foi notificada pelos SIT do Relatório Final de Inspeção Tributária (cfr. Relatório de Inspeção relativo a 2022”), no qual os SIT fizerem correções no montante total de € 946.203,63 relativas a IVA (alegadamente) indevidamente regularizado pela Requerente, a seu favor, contido em notas de crédito emitidas às entidades do SNS ao abrigo do artigo 5.º do Acordo APIFARMA; (cfr. doc. 2 junto com o PPA).

hh)         No RIT relativo ao exercício de 2022, os SIT relativamente às correções efetuadas mantêm com base os argumentos que já haviam sido utilizados no RIT de 2021; (cfr. RIT relativo a 2022).

ii)            Na sequência das correções efetuadas pelos SIT em sede de IVA, a Requerente foi notificada dos atos de liquidação adicional de IVA e juros compensatórios nesta sede postos em crise, e respetivas demonstrações de acerto de contas, referentes aos meses de fevereiro, março, setembro, outubro e dezembro de 2022; (cfr. doc. 11 junta com o PPA).

 

 

 

 

jj)            Apesar de o valor de correções em sede de IVA resultante do Relatório de Inspeção de 2022 ascender a € 946.203,63, as liquidações adicionais de IVA emitidas para este ano e notificadas à Requerente perfizeram o montante total de € 1.708.514,04 (acrescidas de liquidações de juros no valor de € 204.189,16); (cfr. liquidações adicionais de IVA constantes dos autos).

kk)         A Requerente foi notificada das demonstrações de acertos de contas de IVA referentes ao período de 2022, num montante total de € 1.511.024,29 (acrescidas das demonstrações de acerto de contas de juros no valor de € 172.953,97). 

ll)            A Requerente solicitou, a favor da AT, ao B... SA, a prestação da garantia bancária n.º..., no montante de € 2.400.000,00; (cfr. doc. 10 junto com o PPA).

 

3.2. Factos não provados

Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado.

 

3.3. Fundamentação da decisão da matéria de facto

O juiz (ou o árbitro) não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria de facto alegada, tendo antes o dever de selecionar a que interessa à decisão, tendo em conta a causa de pedir que suporta o pedido formulado pelo autor, e decidir se a considera provada ou não provada (artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis por força do artigo 29.º, n.º 1, a) e), do RJAT). 

Por outro lado, segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal deve basear a sua decisão em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas e da envolvência. 

Assim, o presente Tribunal Arbitral formou a sua convicção quanto à factualidade provada tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, como prevê o artigo 110.º do CPPT, a prova documental produzida. 

 

4. Questões a decidir

Nos presentes autos está em causa a ilegalidade de liquidações adicionais de IVA relativas aos períodos de 2021 e 2022 que resultam de correções efetuadas pelos SIT, na sequência de ações inspetivas ao IVA deduzido pela Requerente no campo 40 das suas declarações periódicas e contido em notas de crédito emitidas às entidades do SNS ao abrigo do artigo 5.º do Acordo APIFARMA.

Há que determinar se as liquidações impugnadas padecem das ilegalidades que a Requerente lhes imputa, decorrentes da violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto e de direito; 

E no caso de procedência do pedido, há que decidir se a Requerente tem direito à indemnização por prestação indevida de garantia a ser paga pela AT.

 

4.1. Posição da Requerente

Em síntese, entende a Requerente que:

“A (i)legalidade das liquidações aqui reclamadas tem de ser aferida de acordo com a resposta às seguintes perguntas: 

O sistema comum do IVA, tal como traçado pela Diretiva IVA, permite situações em que os sujeitos passivos (fornecedores) entreguem ao Estado, a título definitivo, um montante de IVA superior ao que foi efetivamente recebido do adquirente?

As notas de crédito emitidas pela Requerente ao abrigo do Acordo APIFARMA, com vista a compensar as faturas anteriormente emitidas às entidades do SNS pela venda de medicamentos, configuram efetivas reduções do preço inicialmente praticado e, nessa medida, implicam uma redução, a favor da Requerente, do valor tributável das operações efetuadas?

Entende a Requerente que é negativa a resposta à primeira questão e positiva a resposta à segunda questão, concluindo, assim, que as regularizações, a seu favor, do IVA contido nas notas de crédito emitidas ao abrigo do Acordo APIFARMA foram corretamente efetuadas. 

Como resulta da factualidade descrita, estas notas de crédito foram emitidas pelo montante correspondente à contribuição da Requerente ao abrigo do mencionado Acordo APIFARMA.”

 

4.2. Posição da Requerida

Em síntese, a Requerida defende a improcedência do presente pedido de pronúncia arbitral, alegando, nomeadamente:

“No âmbito do controlo e análise das declarações periódicas de IVA, entregues para os períodos dos anos de 2021 e 2022, foi sujeita aos procedimentos inspetivos internos, de âmbito parcial, credenciados, respetivamente, pelas Ordens de Serviço n.ºs OI2024... e OI2024..., levados a efeito pelos Serviços de Inspeção Tributária (SIT) da Unidade dos Grandes Contribuintes (UGC).

Da análise efetuada resultou provado que a Requerente regularizou IVA, a seu favor, com base em notas de crédito emitidas, ao abrigo do acordo celebrado entre o Estado e a Indústria Farmacêutica, para Hospitais Públicos incluídos na rede do Serviço Nacional de Saúde (SNS), as quais, por não respeitarem a operações enquadráveis no Código do IVA, foram objeto de correção.

A Requerida defende que a Contribuição Extraordinária sobre a Indústria Farmacêutica (CEIF), aprovado pelo artigo 168.º da Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro (OE- 2015) tem a natureza jurídica de uma contribuição financeira.

Os SIT alegam ainda o seguinte: 

“Como já se referiu, a forma de cálculo da contribuição de cada aderente baseia-se no volume de vendas de medicamentos que esse realizou no período (trimestre) correspondente ao período de pagamento da contribuição.

Refira-se novamente que, através da emissão das notas de crédito, a A... apenas liquida uma parte dos créditos em dívida por parte do SNS em montante igual ao valor da contribuição que teria de entregar ao Estado (caso não estivesse no Acordo).

Ora esta situação não se enquadra nas situações previstas no n.º 7 do artigo 29.º do CIVA em conjugação com n.º 2 do artigo 78.º do mesmo diploma, pois, em termos práticos, a operação de pagamento da contribuição não se consubstancia num abatimento ou desconto sobre o valor das suas vendas uma vez que não se verifica uma diminuição do valor tributável das operações ativas anteriormente realizadas conforme previsto no artigo 16.º do CIVA.

O valor da faturação anteriormente realizada ao SNS e sobre a qual o sujeito passivo liquidou o respetivo IVA, não sofreu qualquer diminuição, apenas foi objeto de liquidação financeira por parte do SNS através do mecanismo da emissão de um crédito em seu favor, a título de contribuição financeira (leia-se a título de substituição da CEIF – contribuição a que a A... está sujeita, face à atividade exercida).

A emissão destas notas de crédito traduz o pagamento da contribuição financeira a que a A... está obrigada e como tal nunca poderão dar lugar à regularização de IVA, por parte do fornecedor, pois não tem enquadramento nas situações previstas no artigo 78.º ou em qualquer outro artigo do Código do IVA.”

 

5.1. Diretiva IVA (DIVA)

O artigo 73.º da DIVA dispõe:

Nas entregas de bens e às prestações de serviços, que não sejam as referidas nos artigos 74.º a 77.º, o valor tributável compreende tudo o que constitui a contraprestação que o fornecedor ou o prestador tenha recebido ou deva receber em relação a essas operações, do adquirente, do destinatário ou de um terceiro, incluindo as subvenções diretamente relacionadas com o preço de tais operações

 

O artigo 78.º da DIVA tem a seguinte redação:

“O valor tributável inclui os seguintes elementos:

a) Os impostos, direitos aduaneiros, taxas e demais encargos, com exceção do próprio IVA;

b) As despesas acessórias, tais como despesas de comissão, embalagem, transporte e seguro, exigidas pelo fornecedor ao adquirente ou ao destinatário.

Para efeitos da alínea b) do primeiro parágrafo, os Estados-Membros podem considerar despesas acessórias as que sejam objecto de convenção separada.”

 

O artigo 90.º desta Diretiva determina:

1. Em caso de anulação, rescisão, resolução, não pagamento total ou parcial ou redução do preço depois de efectuada a operação, o valor tributável é reduzido em conformidade, nas condições fixadas pelos Estados-Membros.

2. Em caso de não pagamento total ou parcial, os Estados-Membros podem derrogar o disposto no n.º 1.

 

De mencionar, ainda, o disposto no artigo 401.º da DIVA, que dispõe:

“Sem prejuízo de outras disposições comunitárias, as disposições da presente directiva não impedem que um Estado–Membro mantenha ou introduza impostos sobre contratos de seguros e sobre jogos e apostas, impostos especiais de consumo, direitos de registo e, em geral, todos os impostos, direitos e taxas que não tenham a natureza de impostos sobre o volume de negócios, desde que a cobrança desses impostos, direitos e taxas não dê origem, nas trocas comerciais entre Estados-Membros, a formalidades relacionadas com a passagem de uma fronteira.”

 

5.2. A Contribuição Extraordinária sobre a Indústria Farmacêutica (CEFI)

O Regime da Contribuição Extraordinária sobre a Indústria Farmacêutica foi introduzido pelo artigo 168.º da Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2015:

“É aprovado o regime que cria a contribuição extraordinária sobre a indústria farmacêutica com a seguinte redação:

“Artigo 1.º

Objeto1 - O presente regime cria uma contribuição extraordinária sobre a indústria farmacêutica, doravante designada por contribuição, e determina as condições da sua aplicação.

2 - A contribuição incide sobre o volume de vendas e tem por objetivo garantir sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde (SNS) na vertente dos gastos com medicamentos.

 

Artigo 2.º

Incidência subjetiva

Estão sujeitas à contribuição as entidades que procedam à primeira alienação a título oneroso, em território nacional, de medicamentos de uso humano, sejam elas titulares de autorização, ou registo, de introdução no mercado, ou seus representantes, intermediários, distribuidores por grosso ou apenas comercializadores de medicamentos ao abrigo de autorização de utilização excecional, ou de autorização excecional, de medicamentos.

(...)

 

Artigo 5.º 

1- Pode ser celebrado acordo entre o Estado Português, representado pelos Ministros das Finanças e da Saúde, e a indústria farmacêutica visando a sustentabilidade do SNS através da fixação de objetivos de valores máximos de despesa pública com medicamentos e de contribuição de acordo com o volume de vendas das empresas da indústria farmacêutica para atingir aqueles objetivos.

2 - Ficam isentas da contribuição as entidades que venham a aderir, individualmente e sem reservas, ao acordo a que se refere o n.º 1 nos termos do número seguinte, mediante declaração do INFARMED - Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, I. P.

3 - A isenção prevista no presente artigo produz efeitos a partir da data em que as entidades subscrevam a adesão ao acordo acima referido e durante período em que este se aplicar em função do seu cumprimento, nos termos e condições nele previstos.

4 - O texto do acordo previsto no n.º 1 deve ser publicitado no sítio na internet do INFARMED - Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, I. P.”.

 

Artigo 6.º

Liquidação

1 - A contribuição é liquidada pelo sujeito passivo, através de declaração de modelo oficial, a aprovar por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da saúde, que deve ser enviada por transmissão eletrónica de dados durante o mês seguinte ao período a que respeita a contribuição.

2 - A dedução das despesas de investigação e desenvolvimento é feita igualmente em cada declaração do sujeito passivo.

 

Artigo 7.º

Pagamento

1 - A contribuição liquidada é paga durante o prazo estabelecido para o envio da declaração referida no n.º 1 do artigo anterior nos locais de cobrança legalmente autorizados.

2 - Não sendo efetuado o pagamento da contribuição até ao termo do respetivo prazo, começam a correr imediatamente juros de mora e a cobrança da dívida é promovida pela Autoridade Tributária e Aduaneira, nos termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário.”

 

Artigo 10.º

Consignação

1 - A receita obtida com a contribuição é consignada ao Serviço Nacional de Saúde, gerido pela ACSS, I. P., constituindo sua receita própria.

2 - Os encargos de liquidação e cobrança incorridos pela Autoridade Tributária e Aduaneira são compensados através da retenção de uma percentagem de 3 /prct. do produto da contribuição, a qual constitui receita própria.

Nos termos do Acordo de 2015, o pagamento da contribuição era realizado mediante a emissão de notas de crédito aos hospitais e/ou pagamento à ACSS, I.P. 

 

O Ministério da Saúde comprometeu-se a desenvolver todos os esforços para continuar a proceder ao pagamento da dívida total por fornecimentos hospitalares das empresas aderentes ao mesmo anterior a 31 de dezembro de 2013 e para garantir que o valor da dívida hospitalar a 31 de dezembro de 2015 fosse inferior, em cada empresa aderente, ao valor apurado a 31 de dezembro de 2014. 

Em 28 de março de 2016, foi celebrado o Acordo APIFARMA, relativo ao triénio 2016-2018, através do qual as empresas aderentes se vincularam a uma contribuição financeira no valor de 200 milhões de euros, com a possibilidade de acréscimo na medida da respetiva proporção, caso a empresa aderente fosse representativa de uma quota superior a 75% dos encargos totais do SNS.

O Acordo APIFARMA foi aditado a 3 de fevereiro de 2017, mediante o Aditamento ao Acordo APIFARMA, mantendo, no essencial, inalteradas as disposições previstas no Acordo APIFARMA. 

Do exposto resulta, desde logo, que não obstante o regime da CEIF e o Acordo APIFARMA preverem o pagamento de um montante pelas empresas da indústria farmacêutica, designado como “contribuição”, a natureza e contornos de um regime e do outro não se confundem.

Com efeito, o regime da CEIF criou uma verdadeira obrigação tributária, a cujo pagamento ficaram obrigadas as entidades que procedam à primeira alienação, a título oneroso, em território nacional, de medicamentos de uso humano, podendo a AT promover a cobrança coerciva da dívida e sendo o incumprimento da obrigação sancionado nos termos do RGIT. 

Em resultado de subfinanciamento do SNS, em particular desde os anos 90, o Estado teve necessidade de criar instrumentos económicos e financeiros com vista a acautelar a sustentabilidade do SNS e o acesso aos medicamentos.

Foi neste contexto que, em 1997, o Estado e a APIFARMA, em representação da indústria farmacêutica, celebraram protocolos com vista a garantir a sustentabilidade orçamental e financeira do SNS e o acesso dos cidadãos a medicamentos.

Em 2012 foi celebrado um Acordo entre os Ministérios da Saúde, da Economia, do Emprego e das Finanças e a indústria farmacêutica, nos termos do qual as empresas aderentes se comprometeram a colaborar numa redução da despesa com medicamentos no valor de 300 milhões de euros e a prestar uma contribuição na parte que excedesse os objetivos de despesa pública com medicamentos.

Dado o avultado valor da contribuição que as empresas farmacêuticas tinham sido convocadas a fazer, o Acordo de 2012 foi aditado pelas partes em 2013 (“Aditamento de 2013”). Nos termos do aditamento, as empresas farmacêuticas aderentes comprometiam-se a efetuar uma contribuição de 122 milhões de euros para a redução da despesa pública com medicamentos, mediante o pagamento de uma contribuição em valor proporcional à sua quota de mercado, calculada por referência ao mercado hospitalar total. O pagamento da contribuição era realizado mediante a emissão de notas de crédito aos hospitais.

Em junho de 2014, foi celebrado entre os Ministérios das Finanças e da Saúde e a APIFARMA, em representação da Indústria Farmacêutica, um novo Acordo (“Acordo de 2014”), através do qual as empresas aderentes se vinculavam a efetuar uma contribuição no valor de 160 milhões de euros para a redução da despesa pública com medicamentos, mediante o pagamento de uma contribuição em valor proporcional à sua quota de mercado, calculada por referência aos encargos totais do SNS. O pagamento da contribuição era realizado mediante a emissão de notas de crédito aos hospitais e/ou pagamento à Administração Central do Sistema de Saúde, I.P. (“ACSS, I.P.”).

O Acordo de 2014 foi posteriormente revisto e, em novembro de 2014, foi celebrado, entre as mesmas partes, novo Acordo para 2015 (“Acordo de 2015”), através do qual as empresas farmacêuticas aderentes se vinculavam a uma contribuição no valor de 180 milhões de euros, calculada considerando o total de vendas por tipo de medicamento, com a possibilidade de acréscimo na medida da respetiva proporção, caso a empresa aderente fosse representativa de uma quota superior a 75% dos encargos totais do SNS. Caso o valor da despesa pública fosse ultrapassado, as empresas aderentes pagariam ainda o montante que excedesse o objetivo máximo, durante o primeiro trimestre de 2016. O pagamento da contribuição era realizado mediante a emissão de notas de crédito aos hospitais e/ou pagamento à ACSS, I.P.

Em março de 2016, foi celebrado entre os Ministérios das Finanças, da Economia e da Saúde e a APIFARMA, em representação da Indústria Farmacêutica, um novo Acordo referente ao triénio 2016-2018 (“Acordo APIFARMA”), aditado em 2017, através do qual as empresas aderentes se vincularam a uma contribuição financeira no valor de 200 milhões de euros, com a possibilidade de acréscimo na medida da respetiva proporção, caso a empresa aderente fosse representativa de uma quota superior a 75% dos encargos totais do SNS. Caso o valor da despesa pública fosse ultrapassado, as empresas aderentes pagariam ainda o montante que excedesse o objetivo máximo, durante o primeiro trimestre de 2017, na proporção da sua responsabilidade pelo aumento da despesa pública, e com limites máximos expressamente previstos. 

Em fevereiro de 2017, foi assinado um aditamento ao Acordo APIFARMA (“Aditamento ao Acordo APIFARMA”) que, apesar de ter introduzido algumas alterações relativamente aos prazos e medidas para controlo da despesa pública, manteve, no essencial, inalteradas as disposições previstas naquele Acordo.

O Acordo APIFARMA, celebrado no dia 15 de março de 2016 e revisto em 2017, foi prorrogado desde 2019 até aos dias de hoje, mantendo-se em vigor

Do Acordo celebrado em 15-03-2016 entre o Estado Português e a Indústria Farmacêutica, aplicável aos exercícios de 2021 e 2022, consta nomeadamente o seguinte:

Acordo entre o Estado Português, representado pelos Ministros das Finanças, da Economia e do Mar, e da Saúde, e a Indústria Farmacêutica, representada pela APIFARMA A 15 de Março de 2016 entre o Estado Português, representado pelos Ministros das Finanças, da Economia e da Saúde, e a Indústria Farmacêutica, representada pela APIFARMA, foi celebrado um Acordo com vigência nos anos de 2016, 2017 e 2018, Acordo esse que foi prorrogado para os anos de 2019, 2020 e 2021. Os pressupostos subjacentes à celebração do Acordo assentaram essencialmente na importância em considerar mecanismos de sustentabilidade da despesa na política do medicamento, tanto por via da eficiência na utilização dos recursos, como da consideração de procedimentos excecionais de alocação de recursos em função de situações extraordinárias, temporalmente definidas, envolvendo mecanismos de partilha de risco e na importância de concretizar a médio prazo um referencial para a despesa pública com medicamentos, mais próximo dos valores médios da União Europeia, tendo em conta os níveis de rendimento, no sentido de criar condições sustentáveis geradoras de partilha de ganhos entre o Estado e os agentes do setor. Considerando a manutenção destes pressupostos, a importância de continuar a garantir uma convergência de esforços e a desenvolver políticas de continuidade no que se refere às formas de articulação entre o Estado e os agentes do setor da indústria farmacêutica, e tendo presente o contexto nacional decorrente da declaração de pandemia decretada pela Organização Mundial da Saúde, as Partes acordam em replicar no ano de 2022 o modelo do Acordo.

Cláusula Única 

O Acordo celebrado no dia 15 de março de 2016 e referente ao triénio 2016-2018, entre o Estado Português, representado pelos Ministros das Finanças, da Economia e da Saúde, e a Indústria Farmacêutica, representada pela APIFARMA, é aplicado para o ano de 2022 nos mesmos termos e condições que vigoraram no ano de 2021, sendo a adesão por parte das empresas da indústria farmacêutica realizada nos termos da Cláusula 4ª do Acordo de 2016. 

Lisboa, 26 de abril de 2022

 

São sujeitos passivos desta contribuição as entidades que procedem à primeira alienação em território nacional de medicamentos (titulares de autorização ou registo, de introdução no mercado, ou seus representantes, intermediários, distribuidores por grosso ou apenas comercializadores de medicamentos) – artigo 2.º do regime. A base tributável da contribuição é obtida a partir do total das vendas de medicamentos realizadas em cada trimestre (n.º 1 do artigo 3.º do regime), abatida das despesas de investigação e desenvolvimento (n.º 4 do mesmo artigo), desde que realizadas em território nacional e devidas e pagas a contribuintes portugueses.

Contudo, nos termos do artigo 5.º deste regime (“Acordo para sustentabilidade do SNS”), ficam isentas da CEIF as entidades que aderiram ao Acordo celebrado entre o Estado e a Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica (APIFARMA).

De facto, pode ler-se no n.º 2 deste artigo que: “Ficam isentas de contribuição as entidades que venham a aderir, individualmente e sem reservas ao acordo a que se refere o n.º 1 nos termos do número seguinte, mediante declaração do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, IP”.

Finalmente, e não menos importante para a sua caracterização, o diploma da CEIF prevê que “a receita obtida com a contribuição é consignada ao Serviço Nacional de Saúde, gerido pela ACSS. I.P. constituindo sua receita própria.” (ver artigo 10.º da CEIF).

 

5.3. A Jurisprudência do TJUE

Sobre matéria idêntica à dos presentes autos pronunciou-se o TJUE no Acórdão de 12-09-2024, no Processo C-248/23 (Novo NORDISK AS), sobre a questão da dedutibilidade ao preço dos medicamentos (isto é, ao valor tributável do IVA) dos pagamentos feitos ao Estado pelo sujeito passivo em cumprimento de uma obrigação legal, de uma parte do seu volume de negócios resultantes da venda dos seus produtos farmacêuticos que beneficiem de um financiamento público, nos seguintes termos:

(...)

“39     Quanto ao direito, reconhecido pela legislação nacional, de as sociedades farmacêuticas deduzirem do montante dos pagamentos controvertidos as contribuições pagas no âmbito dos contratos sobre o volume de comparticipação relativas ao período de referência, deduzidas do IVA, bem como as despesas destinadas à investigação e ao desenvolvimento, há que salientar que, embora o exercício desse direito possa, se for caso disso, reduzir o montante desses pagamentos, não tem qualquer efeito sobre o facto de, tendo em conta as considerações expostas nos n.os 36 a 38 do presente acórdão, os referidos pagamentos poderem ser qualificados de imposto, na aceção do artigo 78.º, primeiro parágrafo, alínea a), da Diretiva IVA.

40        Por um lado, o NEAK é o beneficiário final dos pagamentos efetuados tanto a título da obrigação legal como a título dos contratos sobre o volume de comparticipação.

42        Nestas circunstâncias, o facto gerador dos pagamentos controvertidos pode coincidir com o facto gerador do IVA devido sobre os medicamentos subvencionados e comercializados. Por conseguinte, estes pagamentos podem, ao abrigo do artigo 78.º, primeiro parágrafo, alínea a), da Diretiva IVA, ser incluídos no valor tributável do IVA.

42        Nestas circunstâncias, o facto gerador dos pagamentos controvertidos pode coincidir com o facto gerador do IVA devido sobre os medicamentos subvencionados e comercializados. Por conseguinte, estes pagamentos podem, ao abrigo do artigo 78.º, primeiro parágrafo, alínea a), da Diretiva IVA, ser incluídos no valor tributável do IVA.

43        No que respeita à questão de saber se os montantes pagos por empresas farmacêuticas aos organismos de segurança social por ocasião de uma venda de medicamentos subvencionados podem, no entanto, ser abrangidos pelo artigo 90.º, n.º 1, da Diretiva IVA, há que recordar, por um lado, que o Tribunal de Justiça já declarou que o desconto concedido, ao abrigo de uma lei nacional, por uma empresa farmacêutica a uma empresa privada de seguros de saúde implica, na aceção do artigo 90.º, n.º 1, da Diretiva IVA, uma redução do valor tributável a favor desta empresa farmacêutica, quando sejam efetuadas entregas de produtos farmacêuticos por intermédio de grossistas a farmácias que efetuam essas entregas a pessoas cobertas por um seguro de saúde privado que reembolsa aos seus segurados o preço que pagaram pela aquisição dos produtos farmacêuticos (Acórdão de 20 de dezembro de 2017, Boehringer Ingelheim Pharma, C-462/16, EU:C:2017:1006, n.º 46).

44        A este respeito, é irrelevante a argumentação do Governo Húngaro segundo a qual, no processo que deu origem a esse acórdão, o caráter privado da empresa de seguros de saúde constituía uma diferença primordial, ao passo que, no caso em apreço, os pagamentos controvertidos têm caráter de receita fiscal. Com efeito, como resulta do n.º 33 do presente acórdão, o beneficiário real dos pagamentos controvertidos não é a autoridade tributária, mas o NEAK, que os utiliza para a subvenção do preço de compra dos medicamentos, da mesma forma que nesse processo.

45        Por outro lado, o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 90.º, n.º 1, da Diretiva IVA se opõe a uma legislação nacional que prevê que uma empresa farmacêutica não pode deduzir do seu valor tributável do IVA a parte do seu volume de negócios proveniente da venda de medicamentos subvencionados pelo organismo estatal do seguro de saúde que paga a esse organismo, com base num contrato celebrado entre este último e essa empresa, com o fundamento de que os montantes pagos a esse título não foram determinados com base nas modalidades previamente fixadas por essa empresa no quadro da sua política comercial e que esses pagamentos não foram efetuados com fins promocionais (Acórdão de 6 de outubro de 2021, Boehringer Ingelheim, C-717/19, EU:C:2021:818, n.º 55).

46        Ora, as modalidades segundo as quais, no caso em apreço, os pagamentos controvertidos foram efetuados por força da obrigação legal não podem pôr em causa a qualificação desses pagamentos como redução de preço, na aceção do artigo 90.º, n.º 1, da Diretiva IVA.

47        Com efeito, primeiro, o Tribunal de Justiça já esclareceu que o âmbito de aplicação do artigo 90.º, n.º 1, da Diretiva IVA abrange as reduções de preços resultantes tanto dos contratos celebrados entre uma empresa farmacêutica e um organismo estatal do seguro de saúde como de obrigações legais como as que estão em causa no processo principal (v., neste sentido, Acórdão de 6 de outubro de 2021, Boehringer Ingelheim, C-717/19, EU:C:2021:818, n.os 48 e 49).

48        Além disso, as partes no processo confirmaram na audiência que a finalidade dos pagamentos efetuados por força da obrigação legal é idêntica à dos pagamentos efetuados com base nos contratos sobre o volume de comparticipação celebrados entre o organismo de segurança social e as empresas farmacêuticas, a saber, subvencionar o preço de compra dos medicamentos vendidos mediante receita médica e comparticipados pela segurança social no âmbito de tratamentos ambulatórios.

49        Segundo, a circunstância de, no processo principal, o beneficiário direto das entregas dos medicamentos em causa não ser o organismo estatal do seguro de saúde que reembolsa a posteriori o montante da subvenção à farmácia, mas sim os próprios segurados que pagam o preço subvencionado à farmácia, não é suscetível de romper o nexo direto que existe entre a entrega de bens efetuada e a contrapartida recebida (Acórdão de 6 de outubro de 2021, Boehringer Ingelheim, C-717/19, EU:C:2021:818, n.º 45 e jurisprudência referida).

50        Com efeito, uma vez que a farmácia deve pagar o IVA não só sobre o montante pago pelo paciente mas também sobre o montante que lhe é pago pelo organismo estatal do seguro de saúde para os medicamentos subvencionados, deve considerar se que este último interveio como consumidor final de uma entrega efetuada por uma empresa farmacêutica sujeita a IVA, pelo que o montante recebido pela autoridade tributária não pode ser superior ao que foi pago pelo consumidor final (Acórdão de 6 de outubro de 2021, Boehringer Ingelheim, C-717/19, EU:C:2021:818, n.º 46 e jurisprudência referida).

51        A este respeito, no que se refere à determinação do consumidor final, não é pertinente o argumento apresentado pelo Governo Húngaro de que os montantes devidos a título da obrigação legal são recebidos pela autoridade tributária. Com efeito, como foi recordado no n.º 44 do presente acórdão, esta última transfere imediatamente esses montantes para o NEAK, que concede uma subvenção relativa ao preço de compra dos medicamentos vendidos mediante receita médica e comparticipados pela segurança social no âmbito de tratamentos ambulatórios.

52        Ora, o mecanismo dessa transferência imediata milita a favor da qualificação dos pagamentos controvertidos de redução de preço na aceção do artigo 90.º, n.º 1, da Diretiva IVA.

53        Contrariamente ao que alega o Governo Húngaro, o artigo 401.º desta diretiva não se opõe a esta interpretação, tendo em conta o contexto deste artigo. Com efeito, a circunstância de os Estados Membros poderem manter ou introduzir determinados impostos, direitos ou taxas nas condições previstas neste artigo não obsta, de modo nenhum, a que esses impostos, direitos ou taxas devam, por força do artigo 78.º, primeiro parágrafo, alínea a), da referida diretiva, ser tidos em conta para efeitos da determinação do valor tributável do IVA, a título de redução do preço, na aceção do artigo 90.º, n.º 1, da mesma diretiva.

54        Além disso, resulta da decisão de reenvio que, através dos pagamentos controvertidos, a Novo Nordisk renuncia a uma fração da contrapartida paga pelo grossista.

55        Ora, não seria conforme com o princípio da neutralidade fiscal recordado no n.º 32 do presente acórdão que o valor tributável com base na qual é calculado o IVA devido pela empresa farmacêutica, enquanto sujeito passivo, fosse mais elevada do que o montante que esta acaba por receber. Se assim fosse, este princípio não seria respeitado (v., neste sentido, Acórdão de 6 de outubro de 2021, Boehringer Ingelheim, C-717/19, EU:C:2021:818, n.º 44, e jurisprudência aí referida).

56        Assim, uma vez que uma parte da contrapartida obtida na sequência da venda dos medicamentos pela empresa farmacêutica não foi recebida por esta última devido à contribuição que envia ao organismo estatal de seguro de saúde, que paga às farmácias uma parte do preço desses medicamentos, há que considerar que o preço desses medicamentos foi reduzido depois de efetuada a operação, na aceção do artigo 90.º, n.º 1, da Diretiva IVA (Acórdão de 6 de outubro de 2021, Boehringer Ingelheim, C-717/19, EU:C:2021:818, n.º 47).

57        Com efeito, a empresa farmacêutica não pôde dispor livremente da totalidade do preço recebido aquando da venda dos seus produtos às farmácias ou aos grossistas (v., por analogia, Acórdão de 20 de dezembro de 2017, Boehringer Ingelheim Pharma, C 462/16, EU:C:2017:1006, n.º 43 e jurisprudência referida).

58        Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à questão submetida que o artigo 90.º, n.º 1, da Diretiva IVA deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional nos termos da qual uma empresa farmacêutica que está obrigada a entregar, ao organismo estatal de seguro de saúde, uma parte do seu volume de negócios resultante da venda dos seus produtos farmacêuticos que beneficiam de um financiamento público, não tem direito de reduzir a posteriori o valor tributável a título dos montantes entregues, tendo em conta que estes são efetuados ex lege, que a sua base tributável pode ser reduzida através de dedução dos pagamentos efetuados ao abrigo de um contrato relativo ao volume da comparticipação e das despesas efetuadas pela empresa para efeitos de investigação e de desenvolvimento no setor da saúde, e que o montante devido é cobrado pela autoridade tributária, que o transfere imediatamente para o organismo estatal de seguro de saúde.

 

5.4. Apreciando

O IVA é um imposto de matriz comunitária plurifásico, que assenta numa estrutura de entrega e respetiva dedução, pelos vários intervenientes na cadeia, até ao consumidor final, que o suporta, sem o poder deduzir.

O IVA funciona pelo método indireto subtrativo, de acordo com o qual o sujeito passivo deduz, ao imposto liquidado nos seus outputs, o imposto liquidado nos respetivos inputs.

O direito à dedução do IVA é um princípio fundamental do sistema comum do IVA que não pode, em princípio, ser limitado e que é exercido imediatamente para a totalidade dos impostos que oneraram as operações efetuadas a montante (vide, neste sentido, designadamente, Acórdãos TJUE Mahagében e Dávid, C 80/11 e C 142/11; Bonik, C 285/11; e Petroma Transports C 271/12, e demais jurisprudência aí citada, todos disponíveis em http://curia.europa.eu).

Com efeito, o regime das deduções visa libertar integralmente o empresário do peso do IVA devido ou pago no âmbito de todas as suas atividades económicas. O sistema comum do IVA garante, por conseguinte, a neutralidade quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas, quaisquer que sejam os fins ou os resultados dessas atividades, na condição de as referidas atividades estarem, em princípio, elas próprias sujeitas ao IVA (para o efeito, atente-se, designadamente, nos Acórdãos Dankowski, C 438/09; Tóth, C 324/11; Petroma, C-271/12, Senatex, C 518/14, Paper Consult, C 101/16, e jurisprudência aí referida disponíveis em http://curia.europa.eu).

A Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, estabelece o sistema comum do IVA na União Europeia. Esta diretiva substituiu a anterior Diretiva 77/388/CEE e visa harmonizar as legislações dos Estados-Membros em matéria de IVA.

 

Em síntese, podemos referir como principais pontos da DIVA os seguintes:

Define o conceito de IVA e os princípios gerais do sistema comum.

Estabelece as regras sobre:

Operações tributáveis (entregas de bens, prestações de serviços, importações).

Localização das operações para efeitos de tributação.

Isenções aplicáveis.

Obrigações dos sujeitos passivos (declarações, registos, faturas).

Permite algumas derrogações e regimes especiais para determinados setores ou situações.

A diretiva tem como objetivo garantir a neutralidade fiscal e facilitar o funcionamento do mercado interno, assegurando que o IVA seja aplicado de forma uniforme em todos os países da UE.

O princípio da neutralidade e da proporcionalidade é alcançado através do mencionado direito à dedução e do reembolso, constituindo a regra, no apuramento do imposto devido.

O IVA tem por base uma estrutura de entrega e respetiva dedução, pelos vários intervenientes na cadeia, atá ao consumidor final, que o suporta sem o poder deduzir.

O IVA funciona através do método indireto subtrativo, de acordo com o qual o sujeito passivo deduz, ao imposto liquidado nos seus outputs, o imposto liquidado nos respetivos inputs.

direito à dedução é o mecanismo que transforma o IVA num imposto verdadeiramente neutro e proporcional. Ele assegura que os operadores económicos não sejam penalizados por participar na cadeia produtiva e que o imposto não se torne um encargo injustificado. A aplicação rigorosa destes princípios é essencial para o bom funcionamento do mercado interno da UE.

A contribuição financeira prevista no Acordo APIFARMA equivale a uma redução do preço inicialmente praticado.

Essa redução altera o valor tributável da operação, o que legitima a emissão de nota de crédito e a consequenteregularização do IVA.

Entendemos que a interpretação da Autoridade Tributária que nega essa dedução viola o princípio da neutralidade fiscal consagrado no artigo 90.º da Diretiva IVA, tal como interpretado pelo TJUE nos casos Boehringer e Novo Nordisk. 

 

Neste âmbito, como tem sido pacificamente entendido pela jurisprudência e é corolário da obrigatoriedade de reenvio prejudicial prevista no artigo 267.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), que substituiu o artigo 234.º do Tratado de Roma (anterior artigo 177.º), a jurisprudência do TJUE tem carácter vinculativo para os Tribunais nacionais, quando tem por objeto questões de Direito da União Europeia (neste sentido, podem ver-se os seguintes Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo: de 25-10-2000, processo n.º 25128, publicado em Apêndice ao Diário da República de 31-1-2003, p. 3757; de 7-11-2001, processo n.º 26432, publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, p. 2602; de 7-11-2001, processo n.º 26404, publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, p. 2593).

A supremacia do Direito da União Europeia sobre o Direito Nacional tem suporte no n.º 4 do artigo 8.º da CRP:

“as disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respectivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático”.

 

Entende este Tribunal Arbitral que é legítimo que o sujeito passivo emita uma nota de crédito ou fatura de regularização, deduzindo o IVA correspondente à redução de preço, desde que indique claramente que essa dedução decorre do Acordo celebrado com o Estado através da APIFARMA.

Como ficou exposto, o legislador reconheceu às entidades aderentes ao Acordo referido, que visa a sustentabilidade do SNS, o direito a deduzirem o montante da contrapartida, da CEIF, o IVA que liquidaram nos seus outputs.

Apesar desse direito poder reduzir o montante da CEIF, não tem qualquer efeito sobre a qualificação da transação titulada pelas notas de crédito, em causa nestes autos, como operação tributável em sede de IVA.

 

Pelo exposto, tem de se concluir que os atos de liquidação adicional na fonte impugnados nestes autos enfermam de vício de violação de lei que justifica a sua anulação, de acordo com o disposto no artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT, pelo que julga-se procedente o presente PPA. 

 

6. Indemnização por prestação de garantia indevida

A Requerente, além do pedido de declaração de ilegalidade e anulação do ato de liquidação, pediu que lhe fosse reconhecido o direito a indemnização por garantia indevidamente prestada, como consta do probatório.

Ficou provado que a Requerente a prestação da garantia bancária n.º..., que garante o pagamento à AT até ao valor de € 2.400.000,00

O regime do direito a indemnização por garantia indevida, consta do artigo 53.º da LGT, e estabelece o seguinte:

“Artigo 53.º - Garantia em caso de prestação indevida

1. O devedor que, para suspender a execução, ofereça garantia bancária ou equivalente será indemnizado total ou parcialmente pelos prejuízos resultantes da sua prestação, caso a tenha mantido por período superior a três anos em proporção do vencimento em recurso administrativo, impugnação ou oposição à execução que tenham como objecto a dívida garantida.

2. O prazo referido no número anterior não se aplica quando se verifique, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços na liquidação do tributo.

3. A indemnização referida no número 1 tem como limite máximo o montante resultante da aplicação ao valor garantido da taxa de juros indemnizatórios prevista na presente lei e pode ser requerida no próprio processo de reclamação ou impugnação judicial, ou autonomamente.

4. A indemnização por prestação de garantia indevida será paga por abate à receita do tributo do ano em que o pagamento se efectuou.”

O artigo 171.º, n.º 1, do CPPT determina que “a indemnização em caso de garantia bancária ou equivalente indevidamente prestada será requerida no processo em que seja controvertida a legalidade da dívida exequenda”, adiantando o respetivo n.º 2 que a “indemnização deve ser solicitada na reclamação, impugnação ou recurso ou em caso de o seu fundamento ser superveniente no prazo de 30 dias após a sua ocorrência”.

No caso em apreço, e na sequência do suprarreferido, é manifesto que o erro subjacente às liquidações adicionais de IVA é imputável à Autoridade Tributária e Aduaneira. 

 

Por isso, a Requerente tem direito a indemnização pela garantia prestada no valor correspondente às despesas comprovadas com a sua emissão e manutenção a determinar em execução de sentença.

 

7. Decisão

De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:

a) Julgar totalmente procedente o pedido de pronúncia arbitral; 

b) Anular as liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios n.º 2024..., relativa ao período de 2021/02, n.º 2024..., relativa ao período de 2021/06, n.º 2024 ..., relativa ao período de 2021/09, n.º 2024..., relativa ao período 2021/12, n.º 2024..., relativa ao período de 2022/02, n.º 2024..., relativa ao período de 2022/02, n.º 2024..., relativa ao n.º 2022/03, n.º 2024 ..., relativa ao período 2022/03, n.º 2024..., relativa ao período 2022/09,  n.º 2024..., relativa ao período de 2022/10, n.º 2024 ..., relativa ao período de 2022/12, e as respetivas demonstrações de acerto de contas, que apuraram um valor a pagar de € 1.874.020,97; 

c) Condenar a Requerida a indemnizar a Requerente dos gastos com a prestação de garantia indevida no valor correspondente às despesas comprovadas com a sua emissão e manutenção até ao seu cancelamento, a determinar em execução de sentença.

 

8. Valor do processo 

De harmonia com o disposto nos artigos 296.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 2.102.747,28, indicado pela Requerente sem oposição da Autoridade Tributária e Aduaneira. 

 

9. Custas

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 27.540,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 12 de setembro de 2025

 

 

Os Árbitros

 

(Regina de Almeida Monteiro – Presidente e Relatora)

 

 

(Martins Alfaro – Adjunto)

 

 

(Miguel Patrício – Adjunto)