Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 732/2014-T
Data da decisão: 2015-06-17  Selo  
Valor do pedido: € 9.436,42
Tema: IS – Verba 28 da TGIS - Propriedade Vertical
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Processo n.º 732/2014-T

 

Requerente: A, S.A.

Requerida: Autoridade Tributária e Aduaneira

Imposto do Selo (“IS”)

 

O árbitro Dra. Maria Antónia Torres, designada pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formar Tribunal Arbitral Singular, constituído em 26 de Dezembro de 2014, acorda no seguinte:

 

       1.    RELATÓRIO

 

1.1  A, S.A., contribuinte fiscal n.º …, doravante denominada “Requerente”, com sede na …, requereu a constituição de tribunal arbitral, ao abrigo do artigo 2.º, n.º 1, alínea a), e artigo 10.º, ambos do Decreto-lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (adiante RJAT[1]).

 

1.2. O pedido de pronúncia arbitral tem por objecto a declaração de ilegalidade, e consequente anulação, do acto tributário de liquidação de IS nº 2014 ..., datado de 17 de Março de 2014, no valor total de €9 436,42, relativo ao ano de 2013, com termo de pagamento em 30 de Novembro de 2014, da autoria do Director-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante a Requerida ou AT), e constante da nota de liquidação junta pela Requerente no seu pedido de pronúncia arbitral, e que aqui se dá por articulada e reproduzida, para todos os efeitos legais, a qual diz respeito a um terreno propriedade da Requerente e actualmente inscrito na matriz urbana sob o nº... e sito na Freguesia de ....

 

1.3. A fundamentar o seu pedido alega a Requerente que o imóvel a que se refere a liquidação de Imposto de Selo é um terreno para construção e, por esse facto, não pode ser considerado como prédio “com afetação habitacional” para efeitos de aplicação da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto de Selo.

 

1.4. A Autoridade Tributária e Aduaneira defende que o pedido de declaração de ilegalidade, e consequente anulação, da liquidação controvertida, deveria ser julgado improcedente dado que o art.º 6º, n.º 1 do CIMI integra na categoria de prédios urbanos os terrenos para construção.

 

1.5. Foi ainda acordada pelas partes a dispensa da reunião do tribunal arbitral prevista no artigo 18º do RJAT.

 

2.    SANEAMENTO

      

O Tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria, em conformidade com o artigo 2.º do RJAT.

 

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas (cf. artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março). 

 

Não foram identificadas nulidades no processo.

 

3.    QUESTÕES A DECIDIR

Constitui questão decidenda nos presentes autos a de saber se o imóvel que foi objeto da liquidação de imposto de selo acima referida, sendo terreno para construção, tem ou não afetação habitacional e, consequentemente, se lhe é ou não aplicável a verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto de Selo (TGIS), redacção existente à data a que a liquidação respeita.

4.           FACTOS PROVADOS

Com relevo para a apreciação e decisão do mérito, têm-se por provados os seguintes factos:

4.1 A Requerente é proprietária do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana sob o nº ... e sito na Freguesia de ...;

4.2 O prédio é um terreno para construção e tem um valor patrimonial de €2 830 926,91, (conforme liquidação adicional), não existindo à data qualquer edificação no terreno;

4.3 A Requerente foi notificada da liquidação de IS emitida sob o nºs 2014 ..., referente ao ano de 2013, e datada de 17 de Março de 2013, referente ao imóvel acima referido;

4.4 Tudo conforme documentos juntos com o pedido arbitral e na resposta apresentada pela Requerida;

4.5 Em 22 de Outubro de 2014 a Requerente apresentou pedido de constituição do Tribunal Arbitral – cf. requerimento electrónico no sistema do CAAD.

5.    FACTOS NÃO PROVADOS

 

Não existem factos com relevo para a decisão de mérito que não se tenham provado, sendo consensual a conformação da matéria de facto por ambas as partes.

 

 

6.    FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO

 

A convicção do Tribunal fundou-se na análise crítica dos documentos indicados relativamente a cada um dos pontos da matéria de facto, respeitando o litígio unicamente a questões de direito.  

 

7.         DO DIREITO

A Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, aditou a verba 28 à Tabela Geral de Imposto de Selo (TGIS), com a seguinte redacção:

28 – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000 – sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:

28.1 – Por prédio com afetação habitacional – 1 % (…);

Nas disposições transitórias que constam do artigo 6.º daquela Lei n.º 55-A/2012, estabeleceram-se as seguintes regras:

c) O valor patrimonial tributário a utilizar na liquidação do imposto corresponde ao que resulta das regras previstas no Código do Imposto Municipal sobre Imóveis por referência ao ano de 2011; (…)

f) As taxas aplicáveis são as seguintes:

i) Prédios com afetação habitacional avaliados nos termos do Código do IMI: 0,5 %;

ii) Prédios com afetação habitacional ainda não avaliados nos termos do Código do IMI: 0,8 %;

A verba 28.1 TGIS e as subalíneas i) e ii) da alínea f) do n.º 1 do artigo 6.º da Lei n.º 55-A/2012, contêm, assim, um conceito que não é utilizado em qualquer outra legislação tributária que é o de “prédio com afetação habitacional”.

O conceito mais aproximado do teor literal desta expressão utilizada é a de «prédios habitacionais», que o n.º 2 do artigo 6.º do CIMI define como abrangendo «os edifícios ou construções» licenciados para fins habitacionais ou, na falta de licença, que tenham como destino normal fins habitacionais.

No entanto, a não coincidência dos termos da expressão utilizada na verba n.º 28.1 da TGIS (“prédio com afectação habitacional”) com a que se extrai do n.º 2 do artigo 6.º do CIMI (“prédios habitacionais”), aponta no sentido de não se ter pretendido utilizar o mesmo conceito.

Acresce que, no mesmo artigo, se distingue claramente entre prédios urbanos habitacionais e terrenos para construção.

Seguindo de perto outros acórdãos do CAAD proferidos sobre a mesma matéria, entendemos que a palavra «afetação», neste contexto de utilização de um prédio, deve significar «acção de destinar alguma coisa a determinado uso». Assim, «prédio com afetação habitacional», não poderá ser um prédio apenas licenciado para habitação ou destinado a esse fim (isto é, não bastará que seja um «prédio habitacional»), tendo de ser um prédio que tenha já efetiva afetação a esse fim.

Assim, ” é de concluir que os elementos interpretativos disponíveis, inclusivamente as «circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada», apontam claramente no sentido de não se ter pretendido abranger no âmbito de incidência da verba n.º 28.1 as situações de prédios que ainda não estão afetos à habitação, nomeadamente os terrenos para construção detidos por empresas”.

Acresce que, com a Lei de Orçamento de Estado para 2014, foi a verba 28.1 TGIS expressamente alterada, de forma a incluir, a partir de 01.01.2014, os prédios para construção, o que reforça a nossa convicção de que tais prédios não eram abrangidos pela redacção vigente até 31.12.2013.

8.         DECISÃO

Ora, o prédio da Requerente é um terreno para construção, não se estando perante um prédio com afetação habitacional atual, não existindo, tão pouco, qualquer edificação no referido terreno. Não se verifica assim, à data, a afectação a um fim habitacional.

Por este facto, entendemos que a liquidação de IS cuja declaração de ilegalidade é pedida enferma de vício de violação daquela verba n.º 28.1 TGIS, por erro sobre os pressupostos de direito, o que justifica a declaração da sua ilegalidade e consequente anulação (artigo 135.º do CPA).

Em face do exposto, determina-se a declaração de ilegalidade e de anulação do acto de liquidação de IS objecto do presente pedido, tudo com as legais consequências.

Fixa-se o valor do processo em € 9 436,42 de harmonia com o disposto nos artigos 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”), 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 306.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.

 

O montante das custas é fixado em € 918 a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira, de acordo com o disposto nos artigos 12.º, n.º 2 do RJAT e 4.º, n.º 4 do RCPAT.

 

 

 

 

Notifique-se.

Lisboa, 17 de Junho 2015

 

Texto elaborado em computador, nos termos do artigo 131.º, n.º 5 do Código de Processo Civil (CPC), aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT, com versos em branco.

 

A redacção do presente Acórdão arbitral rege-se pela ortografia antiga.

 

O árbitro,

 

 

Maria Antónia Torres

 

* * *

 

 



[1] Acrónimo de Regime Jurídico da Arbitragem Tributária.