Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 1373/2024-T
Data da decisão: 2025-07-07  IVA  
Valor do pedido: € 2.272,18
Tema: IVA – Aquisição de serviços de publicidade consubstanciados na aquisição de direitos de utilização de Camarotes nos Estádios de Futebol (“Pacotes corporate”): Exclusão parcial do direito à dedução à luz das alíneas d) e e) do n.º 1 do art.º 21.º do CIVA e da Circular n.º 20/2009; Regra da inversão do sujeito passivo aplicável aos serviços de construção civil - alínea j) do n.º 1 do art.º 2.º do CIVA.
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DECISÃO ARBITRAL

SUMÁRIO:

 

1.     O direito à dedução do IVA é elemento estruturante do sistema comum do imposto, mas está sujeito a exclusões expressamente previstas na lei, como resulta do artigo 21.º, n.º 1, do CIVA, cuja compatibilidade com o direito da União Europeia tem sido afirmada pela jurisprudência do TJUE.

2.     As despesas que, pela sua natureza, são facilmente desviáveis para consumos privados ou não diretamente indispensáveis à atividade produtiva, como as de alojamento, alimentação, receção ou divertimento, são consideradas consumos finais e, por isso, excluídas do direito à dedução, salvo verificação rigorosa das exceções previstas nos n.ºs 2 e 3 do artigo 21.º do CIVA.

3.     No caso sub judicio, a Requerente não logrou demonstrar, com o grau de exigência probatória que lhe incumbia, que os serviços prestados pela B... se afastavam das tipologias de despesa excluídas, nem que se tratava, inequivocamente, de um serviço publicitário unitário e dedutível, com caráter estritamente profissional.

 

I. RELATÓRIO:

 

1.     A..., LDA., titular do número de identificação fiscal..., com sede na Rua ... n.º..., ...-...  ... (doravante, Requerente), apresentou, em 18.12.2024, pelas 17:06 horas, pedido de pronúncia arbitral, invocando o disposto no número 1 do artigo 2.º e nos artigos 10.º e seguintes, todos do Decreto-Lei n.º  10/2011, de 20 de Janeiro, que estabelece o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (de ora em diante apenas designado por RJAT), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira. 

2.     No pedido de pronúncia arbitral (doravante PPA), a Requerente optou por não designar árbitro.

3.     Nos termos do n.º 1 do artigo 6.º do RJAT, o Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem designou árbitro singular que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável. 

4.     Em 06.02.2025, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, por aplicação conjugada da alínea a) e b) do n.º 1 do art.º 11º do RJAT e dos art.º 6º e 7º do Código Deontológico.

5.     Em conformidade com o estatuído na alínea c) do n.º 1 do art.º 11º do RJAT, na redacção que lhe foi introduzida pelo art.º 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Tribunal Arbitral Singular foi constituído em 25.02.2025 para apreciar e decidir o objecto do processo.

6.     Em 02.04.2025, a Requerida apresentou Resposta, defendendo-se por impugnação, refutando os vícios imputados pela Requerente às liquidações de IVA e JC, de 2019 que a seguir se discriminam, suscitando ainda a questão do valor da ação que no seu entendimento deve ser corrigido e ainda, à condição, exceção dilatória (invocada na condição do tribunal entender que a Requerente peticionou a anulação da totalidade das liquidações sindicadas e melhor identificadas) que obsta ao prosseguimento do processo, conducente à absolvição da instância quanto à pretensão em causa, de acordo com o previsto nos artigos 576.º, n.º 2, 577.º, alínea a) do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT. 

7.      Ainda em 02.04.2025, a Requerida apresentou igualmente o Processo Administrativo a que se refere o no n.º 2 do art.º 17º do Decreto-Lei n.º 10/2021, de 20 de Janeiro (doravante PA).  

8.     Em 14.05.2025, foi proferido e inserido no Sistema de Gestão Processual do CAAD (doravante SGP) o seguinte despacho: “[C]onsiderando que: - Face aos articulados apresentados pelas partes afigura-se que as questões a apreciar e decidir se reconduzirão, fundamentalmente, a questões de direito, sendo que a Requerente e a Requerida, nos respetivos articulados, deixaram bem expressas as suas posições; - Não foi apresentada prova l; - Não descortina o Tribunal, na presente lide, a existência de factualidade relevante controvertida; - Não foram suscitadas exceções, pelo que, não há exceções que seja necessário apreciar e decidir antes de se conhecer do pedido; DECIDE-SE, ao abrigo dos princípios da autonomia do tribunal arbitral na condução do processo, da celeridade, da simplificação e informalidade processuais (artigos 16º, alíneas c) e e), 19º,nº 1 e 29º, nº 2 do RJAT), e do princípio da proibição de atos inúteis (art.º 130º do Código de Processo Civil, ex vi da alínea e) do nº 1 do artigo 29º do RJAT): i) Dispensar a realização da reunião prevista no artigo 18.° do RJAT; ii) Facultar às partes a possibilidade de, querendo, apresentarem alegações escritas simultâneas, podendo a Requerente e Requerida fazê-lo no prazo de dez dias, contados da notificação do presente despacho, em conformidade com o disposto no n.º 1 do art.º 120.º do CPPT, aplicável ex vi do disposto na alínea a) do n.º 1 do art.º 29.º do RJAT. A decisão final será proferida e notificada às partes até ao termo do prazo fixado no artigo 21º, nº 1 do RJAT, devendo a Requerente, no mesmo prazo de 10 dias, proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente, nos termos do n.º 3 do artigo 4.° do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e comunicar o mesmo pagamento ao CAAD (Cfr. art.º 4.º, n.º 4 do Regulamento de Custas nos processos de Arbitragem Tributária). NOTIFIQUE-SE. Lisboa, 14 de maio de 2025. O Árbitro, Ass.(...).”

9.     Em 21.05.2025, a Requerente apresentou no SGP do CAAD alegações finais, onde, no essencial, repristinou a posição defendida no PPA, remetendo para ali, e trouxe ainda à colação a recente Decisão Arbitral de 28.03.2025, proferida no âmbito do processo nº 896/2024-T, dizendo ter a mesma relevância para os presentes autos, particularmente, no contexto da discussão da legitimidade da dedução do IVA incorrido pela Requerente na aquisição de serviços de publicidade à B..., S.A. e dando nota de que “[N]o aludido processo arbitral, que tem subjacente uma situação de facto em tudo semelhante à dos presentes autos e que também foi impulsionado por uma entidade pertencente ao Grupo F..., o Tribunal Arbitral concluiu que: “In casu, a AT assumiu como bom o mencionado nas faturas emitidas pela B..., S.A. e dispensou-se de demonstrar que os serviços que a prestadora reputa como acessórios nas faturas consubstanciam, em primeiro lugar, despesas abrangidas pelo artigo 21.º do CIVA e, em segundo lugar, ainda que fossem abrangidas pelo artigo 21.º, em qual das alíneas do n.º 1, c), d) ou e) estavam abrangidas. Em resumo, a prova produzida nos autos não permite concluir, sem qualquer margem de dúvida, pela existência de facto tributário e consequentemente, pela desconsideração do direito à dedução do IVA. Conclui-se, assim, que as correções efetuadas e as consequentes liquidação enfermam de ilegalidade, por violação do disposto nos artigos 58.º, 74.º e 77.º todos da LGT.” Afirmando ainda a Requerente que as correções efetuadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira e que se encontram em discussão nos presentes autos contrariam o entendimento da jurisprudência oportunamente referida no Pedido de Pronúncia Arbitral, mas, também, a esclarecedora decisão arbitral recentemente proferida no âmbito do processo nº 896/2024-T, já transitada em julgado, juntando cópia da decisão arbitral que sobre ele recaiu.

10.  A Requerida não apresentou alegações finais, nem mesmo requerimento superveniente ao abrigo do princípio do contraditório, pronunciando-se sobre as alegações finais apresentadas pela Requerente em 21.05.2025 e, nomeadamente, sobre a circunstância da Requerente haver feito junção à petição que consubstanciou as referidas alegações de cópia da decisão arbitral tirada no Processo nº 896/2024-T.   

11.  A pretensão objeto do pedido de pronúncia arbitral consiste: i) na declaração de ilegalidade da decisão de indeferimento (parcial) expresso da Reclamação Graciosa n.º ...2023... apresentada com vista à anulação das demonstrações de liquidação de IVA n.ºs 2023... 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023... e 2023..., das demonstrações de liquidação de juros de IVA n.ºs 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023... e 2023... e das demonstrações de acerto de contas n.ºs 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023... e 2023..., referentes ao ano de 2019; bem assim como ii) na consequente declaração de ilegalidade (parcial) daqueles mesmos atos de liquidação de IVA, reportados ao ano de 2019 e que totalizam, segundo a Requerente, na parte sindicada, o montante de 22.608,63 € (valor da ação), por, alegadamente, estarem enfermados do vício de violação de lei.  

12.  Fundamentando o seu pedido, a Requerente alegou, em síntese, o seguinte:

 

I.A) Breve síntese das alegações da Requerente:

A)   A Requerente sustenta que o contrato celebrado com a B... S.A. configura, na sua globalidade, uma prestação unitária de natureza publicitária, no âmbito da qual foram adquiridos serviços com o objetivo de promover a imagem institucional da empresa, nomeadamente através da associação à marca C... no contexto do programa “...”.

B)    No entender da Requerente, os chamados “serviços acessórios”, ou seja, a bilhética, a hospitalidade e o merchandising, não constituem um fim autónomo ou de consumo pessoal/lúdico, mas são instrumentos operacionais da estratégia de marketing e ativação da marca, sendo, por isso, funcionalmente dependentes da prestação principal publicitária.

C)   A Requerente defende que não é aplicável, de forma automática, o artigo 21.º, n.º 1, alíneas d) e e) do CIVA, que exclui do direito à dedução determinadas despesas de receção ou de luxo/divertimento. Alega que, para a aplicação dessa norma, seria necessária a demonstração factual de que tais serviços foram usados com finalidade pessoal ou recreativa, o que não ocorreu no caso concreto.

D)   Com base na jurisprudência do TJUE (designadamente o acórdão Tellmer Property, processo C-572/07), a Requerente sustenta que os serviços acessórios devem seguir o regime fiscal da prestação principal, sempre que não tenham autonomia funcional nem representem um fim em si mesmos. Assim, os elementos acessórios devem ser considerados parte integrante da prestação publicitária e, portanto, o IVA suportado naquela parte das prestações contratadas igualmente dedutível.

E)    A Requerente rejeita que a Circular n.º 20/2009 da AT possa ser usada como fundamento autónomo para restringir o direito à dedução, invocando o seu caráter meramente interpretativo e interno. Entende que a AT não pode, com base na Circular, impor um critério de repartição contratual (como o 80/20), quando este não está previsto nem no contrato nem em norma legal vinculativa.

F)    A referência (no descritivo) nas faturas à existência de “10% de serviços acessórios” nos termos da Circular n.º 20/2009 é, segundo a Requerente, irrelevante do ponto de vista jurídico, pois as faturas são documentos comerciais, não vinculativos, e podem conter classificações subjetivas que não refletem a realidade económica da operação.

G)   A Requerente alega que, uma vez juntos aos autos os contratos, as faturas e os elementos que identificam o objeto da prestação como publicidade, cumpriu o seu ónus inicial de demonstrar a afetação à atividade económica. A partir daí, entende que competia à AT demonstrar concretamente que os serviços acessórios se subsumem às despesas previstas nas alíneas do artigo 21.º, n.º 1, e que foram efetivamente usados com fins não empresariais ou recreativos.

H)   A exclusão da dedução, alega a Requerente, viola o princípio da neutralidade do IVA, previsto tanto no CIVA como na Diretiva IVA (2006/112/CE), caso não esteja cabalmente demonstrado o caráter não empresarial das despesas. Cita diversos acórdãos do TJUE (v.g. C-224/11, C-104/12, C-516/14, C-630/19) que apontam no sentido de que só há lugar à exclusão da dedução quando se prove desvio para fins privados.

I)     Por fim, a Requerente invoca a decisão arbitral proferida no processo n.º 896/2024-T, onde, em situação idêntica, o Tribunal arbitral considerou que a AT não tinha justificado suficientemente o enquadramento dos serviços acessórios nas alíneas do artigo 21.º, e concluiu pela manutenção do direito à dedução.

J)     A Requerente discorda ainda da correção efetuada pela AT no que respeita à fatura emitida pela sociedade D..., Lda., por considerar que não se verificam os pressupostos para aplicação da regra da inversão do sujeito passivo, prevista na alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do Código do IVA.

K)   Sustenta, para o efeito, que os serviços objeto dessa fatura, conforme resulta do orçamento n.º ...-19 (junto como documento n.º 41), não constituem trabalhos de construção civil, mas antes serviços de manutenção técnica e assistência a equipamentos integrados no imóvel.

L)    Com efeito, e conforme resulta da análise do conteúdo do referido orçamento, grande parte das prestações descritas reporta-se à substituição de lâmpadas, manutenção de painéis de alarme, reparações de comandos e pequenos ajustes técnicos em equipamentos existentes, os quais, no entendimento da Requerente, não se reconduzem à definição legal ou jurisprudencial de “trabalhos de construção civil”.

M)  Para sustentar a sua posição, a Requerente invoca expressamente o Anexo II do Ofício-Circulado n.º 30101/2007, de 31 de maio, da própria Autoridade Tributária, onde se encontra uma lista exemplificativa de serviços aos quais não se aplica a regra da inversão, entre os quais se incluem: "Assistência técnica, manutenção e reparação dos equipamentos que fazem parte do imóvel, desde que não impliquem serviços de construção."

N)   A Requerente entende, assim, que as prestações contratadas à D..., Lda. se enquadram inequivocamente neste tipo de operações excluídas, designadamente na assistência técnica a dispositivos eletrónicos e na manutenção de componentes não estruturais, pelo que a aplicação da alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA não tem fundamento.

O)   Consequentemente, a Requerente entende que o IVA foi corretamente liquidado pela prestadora dos serviços (D..., Lda.) e que o mesmo é totalmente dedutível, sendo de desconsiderar o disposto no n.º 8 do artigo 19.º do CIVA, normativo que impede o direito à dedução quando o IVA é liquidado fora dos casos em que o sujeito passivo adquirente deve assumir essa obrigação.

P)    Com base nestes argumentos, a Requerente conclui que a correção efetuada pela AT enferma de erro de direito e de facto, porquanto: i) Assentou numa aplicação indevida da regra de inversão, desconsiderando o conteúdo do orçamento contratual; ii) Ignorou a própria doutrina administrativa constante do Ofício-Circulado n.º 30101/2007iii) Violou os artigos 19.º e 20.º do CIVA, que regulam o direito à dedução.

Q)   A Requerente contesta igualmente a correção efetuada pela AT quanto à fatura emitida por E..., relativa a serviços descritos como “montagem de trabalhos de carpintaria e caixilharia”.

R)   Sustenta que a AT considerou, sem qualquer diligência de verificação da realidade subjacente, que tais serviços se enquadram na regra da inversão do sujeito passivo, prevista na alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA, presumindo tratar-se de trabalhos de construção civil. Consequentemente, a AT recusou o direito à dedução com base no disposto no n.º 8 do artigo 19.º do CIVA.

S)    A Requerente defende, no entanto, que a referida prestação não se pode configurar como titulando trabalhos de construção civil, mas sim o fornecimento e montagem de bens móveis, cuja instalação não afeta estruturalmente o imóvel, nem consubstancia uma operação com caráter de permanência ou incorporação material.

T)    Nesta medida, entende que se trata de uma prestação sujeita às regras gerais de IVA, com liquidação pelo prestador, e que o IVA constante da fatura foi corretamente deduzido.

U)   Acrescenta ainda que a AT não concretizou nem demonstrou os elementos que permitiriam reconduzir, de forma segura, a prestação à categoria de “trabalhos de construção civil”, limitando-se a uma referência genérica à designação do serviço. Esta insuficiência de fundamentação, no entender da Requerente, viola os deveres legais impostos à administração tributária nos termos dos artigos 74.º e 75.º da LGT, e impede a exclusão do direito à dedução.

V)   Com base nestes argumentos, requer a anulação da correção, por ilegalidade da aplicação da regra da inversão e indevida recusa do direito à dedução do IVA suportado.

W) Conclui a Requerente peticionando que deve o PPA ser julgado procedente, e, em consequência, deve ser promovida a anulação do despacho de indeferimento parcial da reclamação graciosa, com as demais consequências legais, nomeadamente, a respetiva anulação das liquidações de IVA sub judicio

13.  Em 02.04.2025, a Requerida apresentou resposta, na qual, em escorço, alega:

 

I.B) Breve síntese das alegações da Requerida:

 

A)   A AT sustenta que parte dos serviços adquiridos pela Requerente, designadamente os designados como “serviços acessórios” (a bilhética, a hospitalidade e o merchandising), se reconduz às despesas de receção, luxo e divertimento, previstas nas alíneas c), d) e e) do n.º 1 do artigo 21.º do CIVA, não conferindo, por isso, direito à dedução do IVA.

B)    A AT defende que, ainda que tais serviços estejam incluídos num contrato de publicidade, não podem escapar à exclusão legal objetiva do direito à dedução por força do estatuído nas referidas normas do artigo 21.º do CIVA.

C)   Perante a ausência de critério contratual de repartição entre serviços principais e acessórios, a AT considera legítima a aplicação do critério residual constante do ponto 19 da Circular n.º 20/2009, que estabelece uma repartição de 80% para serviços principais (publicidade) e 20% para acessórios (não dedutíveis).

D)   A Circular é invocada como instrumento interpretativo interno da AT, que orienta a sua prática administrativa, sem pretensão de ter força normativa vinculativa para o contribuinte.

E)    No que respeita aos serviços prestados por D..., Lda. e E..., a AT defende que, tratando-se de serviços de construção civil, deveria ter sido aplicada a regra de inversão do sujeito passivo (artigo 2.º, n.º 1, alínea j) do CIVA).

F)    Como as faturas foram emitidas com IVA, e não com menção à autoliquidação, a AT considera que o IVA mencionado é indevidamente liquidado, pelo que, nos termos do artigo 19.º, n.º 8 do CIVA, não é dedutível.

G)   Volvendo novamente para o contrato de publicidade, a AT alega que a Requerente não logrou demonstrar que os “serviços acessórios” foram efetivamente utilizados como meio instrumental de promoção da imagem institucional, sendo antes presumivelmente reconduzíveis a finalidades de lazer, luxo ou acolhimento.

H)   Reforça que o ónus da prova sobre a afetação dos bens ou serviços à atividade tributável recai sobre o sujeito passivo(artigo 74.º, n.º 1 da LGT), como também afirmado na jurisprudência do STA (Acórdão de 15.11.2017, Proc. n.º 0485/17).

I)     A AT salienta que as faturas emitidas pela B..., S.A. referem expressamente que 10% dos serviços são “acessórios nos termos da Circular n.º 20/2009”, pelo que, ao não contestar esta classificação no momento da receção das faturas, a Requerente aceitou tacitamente essa qualificação. Invoca, para o efeito, o dever de diligência que se pode intuir do disposto nos artigos 29.º e 36.º do CIVA, que impõe ao sujeito passivo a obrigação de verificar se a faturação corresponde à realidade.

J)     Como respaldo para a hermenêutica que sustenta, a Requerida invoca: i) A decisão arbitral do Processo n.º 1050/2024-T, que confirma a possibilidade de a AT aplicar o artigo 21.º do CIVA mesmo em contratos de publicidade quando se verifique a presença de “serviços acessórios” legalmente excluídos; ii) O Acórdão do TCA Norte de 21.12.2016 (Proc. n.º 01517/08.4BEBRG), que reconhece a validade da aplicação do critério 80/20 na ausência de repartição contratual; iii)Jurisprudência do TJUE, nomeadamente o Processo C-630/19, que valida a compatibilidade do artigo 21.º do CIVA com o direito da União, mesmo quando não se admite prova em contrário da afetação estritamente profissional.

K)   A AT defende que o Tribunal não pode anular integralmente os atos de liquidação impugnados por três razões cumulativas: i) A Requerente aceitou expressamente uma das correções (aquisição de bilhetes de futebol — €104,72); ii) Parte das correções foi deferida em sede de reclamação graciosa (e não é impugnada no PPA); iii) O pedido de pronúncia arbitral não questiona essas parcelas, nem o ato de liquidação na sua globalidade.

L)    A Requerida invoca os princípios de disponibilidade do processo e de congruência entre pedido e sentença (arts. 608.º e 609.º do CPC, aplicáveis subsidiariamente via art.º 29.º/1/e) do RJAT). Traz à colação jurisprudência consolidada do STA(Acórdãos de 30.01.2019 e 05.12.2018) que sustentam a possibilidade de anulação parcial do ato de liquidação, desde que a ilegalidade não o contamine no todo e referências doutrinárias de Jorge Lopes de Sousa e Lebre de Freitas no sentido de que o tribunal não pode conhecer além do que foi pedido.

M)  A Requerida peticiona, por dever de representação, que o tribunal limite o juízo de anulação apenas às correções efetivamente impugnadas e na parte ainda não deferida

N)   Caso o tribunal interprete que a Requerente pediu a anulação total, deverá considerar-se a incompetência material do Tribunal Arbitral nessa parte (por extravasar a causa de pedir), constituindo exceção dilatória conducente à absolvição da instância, nos termos dos arts. 576.º/2 e 577.º/a) do CPC.

O)   Sustenta ainda a Requerida que o valor da causa indicado no PPA deve ser corrigido para excluir: i) a correção aceite pela Requerente (€104,72), e ii) as correções deferidas na reclamação graciosa (€17.257,60), dando um total de €17.362,32, além dos correspondentes juros compensatórios, fundamentando o seu petitório no n.º 3 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, referindo que o valor da causa é o da liquidação impugnada, donde, se parte da liquidação não foi impugnada, não deve integrar o valor processual, sob pena de fixação incorreta das custas.

P)    Defendendo finalmente que deve ser deve ser julgada procedente a exceção dilatória invocada na condição do tribunal entender que a Requerente peticionou a anulação da totalidade das liquidações sindicadas e melhor identificadas acima, absolvendo-se, em conformidade, a entidade Requerida da instância, e/ou mesmo que assim não se entenda, julgado improcedente o presente pedido de pronúncia arbitral, e absolvida a Requerida de todos os pedidos, tudo com as devidas e legais consequências. 

 

14.  Cumpre, então, agora, proferir decisão.

 

II. SANEAMENTO:

 

15.  O Tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria atenta a conformação do objecto do processo, dirigido aos atos de liquidação de IVA e JC, reportados a 2019, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a) e 11.º, n.º 1, todos do RJAT. 

16.  As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas (Cfr. artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março). 

17.  A ação é tempestiva, porque apresentada no prazo previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT, de acordo com a remissão operada para o artigo 102.º, n.º 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”). 

18.  O processo não enferma de nulidades. 

 

III. DECISÃO:

 

III.A) Factos que se consideram provados:

 

19.  Antes de entrarmos na apreciação das questões acima elencadas, cumpre fixar a matéria factual que é relevante para a respectiva decisão:

A)   A Requerente é uma sociedade unipessoal por quotas, com início de atividade em 01/10/2004, dedicada ao comércio a retalho de produtos farmacêuticos (CAE 47730), integrando o Grupo F... . (Cfr. art.º 17.º do PPA e fls. 27 do PA – denominado no SGP do CAAD ficheiro “PA 1373_2024_T A... Lda.pdf” e fls. 8 do RIT, junto ao PPA como Doc. n.º 37). 

B)    No âmbito do procedimento inspetivo que dealbou a coberto da Ordem de Serviço n.º OI2022..., a AT efetuou correções aritméticas ao IVA deduzido no montante total de 19.634,50 €, com fundamento na indevida dedução de imposto associado à aquisição de: (i) serviços de publicidade, cujo IVA corrigido, face ao referido no ponto V.2.1.1.3 do RIT, ascendia a 8.050,00 €; (ii) serviços de construção civil (D..., Lda. e E...), cujo IVA corrigido, face ao referido nos pontos V.2.1.2.1 e v.2.1.2.2 do RIT, ascendia, respetivamente, a 322,00 € e a 340,18 €; (iii) bilhetes para jogos de futebol cujo IVA corrigido, face ao referido no ponto V.2.1.1.1 do RIT, ascendia a 104,72 €; (iv) serviços à G..., cujo IVA corrigido, face ao referido no ponto V.2.1.1.2 do RIT, ascendia a 10.817,60 €. (Cfr. Ponto V.2 do RIT, a fls. 99 a 103 do PA – denominado no SGP do CAAD ficheiro “PA 1373_2024_T A... Lda.pdf” e fls. 80 a 84 do RIT, junto ao PPA como Doc. n.º 37). 

C)   No ponto V.2.1.1.3 do RIT refere-se: “[C]onforme o já mencionado no capítulo V.1.1.6.3do presente relatório, o SP registou quatro faturas relativas a “Parceria Publicitaria”, que englobam 10% de “Serviços Acessórios”, mas, apesar de notificado para tal, não apresentou o contrato que expõe as condições de tal parceria. Sendo mencionada a Circular n.º 20/2009, de 28 de julho, importa relevar que a mesma se refere a “Aquisição de direitos de utilização de camarotes nos estádios de futebol”, designados de “Pacotes Corporate”, e que, nas situações aí previstas, reparte a possibilidade de dedução do IVA nas despesas de “publicidade e de promoção da imagem” (artigo 20.º, n.º 1, do Código do IVA), e a exclusão de dedução de IVA nas despesas relativas aos serviços “acessórios”, compreendendo as referentes à utilização do “espaço empresarial” (alíneas c) a e) do n.º 1 do artigo 21.º do Código do IVA). Ora, o SP não provou a que se refere a “Parceria Publicitária”, tendo mesmo deduzido a totalidade do IVA. Assim, contrariando o disposto no n.º 1 do artigo 20.º do CIVA, deve o IVA deduzido ser corrigido, no campo 24 das DP ́s, nos montantes e períodos respetivos:

 

 (Cfr. Ponto V.2.1.1.3 do RIT, a fls. 100 e 101 do PA – denominado no SGP do CAAD ficheiro “PA 1373_2024_T A... Lda.pdf” e fls. 81 e 82 do RIT, junto ao PPA como Doc. n.º 37). 

 

D)   No ponto V.2.1.2.1 do RIT refere-se: “[R]elativamente à fatura emitida por D... LDA., NIPC..., que descreve:    

 

 

 

(...) O SP não apresentou o orçamento identificado, o que não permite discernir o serviço efetivamente prestado. Conclui-se, assim, que não estão cumpridos os requisitos previstos no n.º 5 do artigo 36.º do CIVA, nem mesmo se torna possível verificar que os mesmos foram necessários para a transmissões de bens do SP. Assim, deve ser corrigido o campo 24 da DP do período 201905 no montante de 322,00 €.” (Cfr. Ponto V.2.1.2.1 do RIT, a fls. 101 e 102 do PA – denominado no SGP do CAAD ficheiro “PA 1373_2024_T A... Lda.pdf” e fls. 82 e 83 do RIT, junto ao PPA como Doc. n.º 37). 

E)   No ponto V.2.1.2.1 do RIT refere-se: “[O] SP registou IVA dedutível com base na fatura emitida pelo fornecedor E..., NIF ..., que descreve “Montagem de trabalhos de carpintaria e caixilharia”, com liquidação de IVA (...). No entanto, este tipo de serviços, nos termos da alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA, está sujeito a autoliquidação, pelo que, de acordo com o n.º 8 do artigo 19.º do CIVA (“Nos casos em que a obrigação de liquidação e pagamento do imposto compete ao adquirente dos bens e serviços, apenas confere direito a dedução o imposto que for liquidado por força dessa obrigação.”), o IVA deduzido não é aceite. Importa relevar que, de acordo com o disposto na alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º (são sujeitos passivos de IVA “as pessoas singulares ou coletivas referidas na alínea a) que disponham de sede, estabelecimento estável ou domicílio em território nacional e que pratiquem operações que confiram o direito à dedução total ou parcial do imposto, quando sejam adquirentes de serviços de construção civil, incluindo a remodelação, reparação, manutenção, conservação e demolição de bens imóveis, em regime de empreitada ou subempreitada”) (sublinhado nosso), e artigos 19.º a 26.º e n.º 13 do artigo 36.º do CIVA, a que acrescem os esclarecimentos emanados no Ofício n.º 30.101, de 2007-05-24, da Direção de Serviços do IVA, há́ lugar à inversão do sujeito passivo, cabendo ao adquirente a liquidação e entrega do imposto que se mostre devido, sem prejuízo do direito à dedução, nos termos gerais do CIVA, designadamente do previsto nos seus artigos 19.º a 26.º. Ou seja, será́ de aplicar a regra da inversão do sujeito passivo sempre que: 1. se esteja na presença de aquisição de serviços de construção civil; 2. o adquirente seja sujeito passivo de IVA em território nacional e aqui pratique operações que confiram, total ou parcialmente, o direito à dedução do IVA. No caso concreto, ao estarmos perante aquisições de serviços de construção civil e sendo o sujeito passivo de IVA em território nacional, praticando operações que conferem o direito à dedução do IVA, a fatura atrás identificada deveria ter sido emitida sem IVA (fazendo a devida menção de “IVA - autoliquidação”, nos termos do n.º 13 do artigo 36.º do CIVA), competindo à A... liquidar e entregar o imposto devido (mencionando-o na respetiva declaração periódica de IVA), procedendo à dedução do IVA respetivo, nos termos dos artigos 19.º e 20.º do CIVA. Por outro lado, a não observação da correta aplicação da regra da inversão do sujeito passivo, implica, nos termos do n.º 8 do artigo 19.º do CIVA, que o adquirente dos serviços de construção civil, no caso a A..., veja prejudicado o direito à dedução do IVA contido, erroneamente, nas faturas emitidas pelos seus fornecedores.  Assim, deve ser corrigido o valor de 340,18 € no campo 24 da declaração periódica do período 201907.” (Cfr. Ponto V.2.1.2.1 do RIT, a fls. 102 e 103 do PA – denominado no SGP do CAAD ficheiro “PA 1373_2024_T A... Lda.pdf” e fls. 83 e 84 do RIT, junto ao PPA como Doc. n.º 37). 

F)    A Requerente celebrou um contrato com a B..., S.A. no âmbito do qual adquiriu serviços de publicidade. Tais serviços estão titulados com a emissão de quatro faturas, nºs 402018070089, 402018090062, 402018120075 e 402010040112, respetivamente datadas de 31.01.2019, 14.03.2019, 19.06.2019 e 15.10.2019, todas com IVA liquidado que se cifra em 2.012,50, num total de 8.050,00 € que a Requerente deduziu na totalidade no campo 24 das respetivas declarações periódicas de IVA. (Cfr. fls. 100 e 101 do PA – denominado no SGP do CAAD ficheiro “PA 1373_2024_T A... Lda.pdf” e fls. 81 e 82 do RIT, junto ao PPA como Doc. n.º 37). 

G)   AAT refere que as faturas emitidas pela B..., S.A. apresentam a seguinte descrição: “Parceria publicitária de acordo com contrato celebrado. Os “serviços acessórios” considerados em conformidade c/ n.º 6 da circular n.º 20/2009 da DGI representam 10% do valor da presente parceria e encontram-se discriminados em documento anexo” (Cfr. fls. 82 do PA – denominado no SGP do CAAD ficheiro “PA 1373_2024_T A... Lda.pdf” e fls. 63 do RIT, junto ao PPA como Doc. n.º 37). 

H)   Apenas em sede de reclamação graciosa juntou o contrato que inicialmente não tinha sido apresentado no decorrer do procedimento inspetivo. (Cfr. fls. 100 e 101 do PA – denominado no SGP do CAAD ficheiro “PA 1373_2024_T A... Lda.pdf” e fls. 81 e 82 do RIT, junto ao PPA como Doc. n.º 37). 

I)     A AT aceitou parcialmente a dedução, fixando em 80% a parcela relativa a serviços principais (publicidade) e em 20% a parcela acessória, com fundamento na Circular n.º 20/2009 e na ausência de discriminação contratual ou factual mais precisa. (Facto não controvertido).

J)    A Requerente sustenta que todos os serviços visavam promover a imagem da empresa, sendo os serviços “acessórios” meros instrumentos de ativação da marca, sem autonomia funcional, nem uso pessoal ou recreativo. (Facto não controvertido).

K)   A Requerente deduziu IVA constante de uma fatura da D..., Lda., no valor de € 322,00, sem, contudo, ter inicialmente apresentado o orçamento subjacente. (Cfr. Ponto V.2.1.2.1 do RIT, a fls. 101 e 102 do PA – denominado no SGP do CAAD ficheiro “PA 1373_2024_T A... Lda.pdf” e fls. 82 e 83 do RIT, junto ao PPA como Doc. n.º 37). 

L)   Posteriormente, em sede de reclamação graciosa, apresentou o orçamento n.º ...-19, que inclui diversos serviços, classificados como de manutenção técnica, que a Requerente diz não abrangidos pela regra de inversão do sujeito passivo da alínea j) do n.º 1 do art.º 2.º do CIVA. (Cfr. artigos 64.º a 68.º do PPA) 

M)  O orçamento foi igualmente junto ao PPA como Doc. n.º 41. 

N)   A AT entendeu que os serviços configuravam serviços de construção civil, devendo a fatura ser emitida sem IVA, cabendo à Requerente proceder à autoliquidação (regra da inversão). Por isso, concluiu que o IVA liquidado na fatura não era dedutível nos termos do art.º 19.º, n.º 8 do CIVA. (Facto não controvertido). 

O)   A AT identificou uma fatura com a descrição: “Montagem de trabalhos de carpintaria e caixilharia”, no valor de € 340,18 cujo IVA deduzido pela Requerente. (Cfr. Ponto V.2.1.2.2 do RIT, a fls. 102 do PA – denominado no SGP do CAAD ficheiro “PA 1373_2024_T A... Lda.pdf” e fls. 83 do RIT, junto ao PPA como Doc. n.º 37). 

P)    Entendeu que se tratava de serviço de construção civil, aplicando também aqui a regra de inversão do sujeito passivo (alínea j) do n.º 1 do art.º 2.º do CIVA), considerando não dedutível o imposto liquidado erroneamente na fatura. (Cfr. Ponto V.2.1.2.2 do RIT, a fls. 102 do PA – denominado no SGP do CAAD ficheiro “PA 1373_2024_T A... Lda.pdf” e fls. 83 do RIT, junto ao PPA como Doc. n.º 37). 

Q)   A Requerente sustenta que a prestação em causa consubstancia um mero fornecimento de bens móveis(carpintaria e caixilharia), que não se ligam materialmente ao imóvel com carácter de permanência, não se aplicando a inversão do sujeito passivo. (Cfr. artigos 69.º a 72.º do PPA).

R)   A AT identificou a dedução de IVA no valor de € 104,72, relativo à aquisição de bilhetes para um jogo de futebol.

S)    A Requerente aceitou esta correção, reconhecendo que o imposto é não dedutível nos termos do art.º 21.º do CIVA. 

T)   A AT corrigiu, inicialmente, o valor de € 10.817,60 de IVA deduzido relacionado com a G..., S.A.. Após a fase de reclamação graciosa e audição, a AT aceitou a dedução na íntegra, anulando esta correção. (Cfr. fls. 195 do PA – denominado no SGP do CAAD ficheiro “PA 1373_2024_T A... Lda.pdf”).

U)   A Requerente foi objeto de um procedimento de inspeção tributária, de âmbito geral, por referência ao ano de 2019, realizado pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Braga, credenciado pela Ordem de Serviço n.º OI2022... . (Cfr. RIT, junto ao PPA como Doc. n.º 37 e a fls. 20 a 40 do PA – denominado no SGP do CAAD ficheiro “PA 1373_2024_T A... Lda.pdf”). 

V)   A Requerente apresentou reclamação graciosa que, junto da AT, veio a tomar o n.º ...2023..., parcialmente deferida (Cfr. fls. 3 a 19 do PA – denominado no SGP do CAAD ficheiro “PA 1373_2024_T A... Lda.pdf”), o que motivou o presente pedido de pronúncia arbitral, onde peticiona a declaração de ilegalidade da decisão de indeferimento parcial da reclamação graciosa e, presume-se, a anulação parcial dos identificados atos de liquidação de IVA (já que não os ataca in totum), com fundamento na: i) alegada finalidade publicitária unitária das despesas contratadas com a B..., S.A.; ii) inaplicabilidade da regra de inversão do sujeito passivo aos serviços da D..., Lda. e de E...; iii) violação dos princípios da legalidade e da necessidade de fundamentação das correções da AT (arts. 74.º e 77.º da LGT).

W) Por despacho de 08.07.2024, do Exm.º Senhor Diretor de Finanças da Direção de Finanças de Braga, foi projetada deferir parcialmente a reclamação graciosa apresentada e referida no ponto V) do probatório, por remissão para o despacho do Exmº Senhor Chefe de Divisão de 08.07.2024, que dizia: “[P]elas razões de facto e de direito melhor expressas na proposta de decisão, concordo com as conclusões da mesma no sentido do deferimento parcial do pedido. Caso superiormente se venha a decidir em conformidade, proponho, ainda, se notifique o/a interessado/a para, querendo e no prazo de 15 dias, exercer por escrito o direito de participação na decisão do procedimento aqui em causa, em conformidade com o disposto no art.º 60.º, n.ºs 1, alínea b) e 6 da Lei Geral Tributária. À consideração superior. Chefe de Divisão. José Mário Costa. 08.07.2024. Assinado eletronicamente, no sistema GPS, mediante autenticação com senha pessoal.” (Cfr. fls. 190 do PA – denominado no SGP do CAAD ficheiro “PA 1373_2024_T A... Lda.pdf”).

X)   O projeto de decisão referido no ponto W) do probatório e os despachos que o estavam a fundamentar, estavam ancorados na informação também datada de 08.07.2024 e que, a dado passo, referia: “B. IVA referente às faturas emitidas por B...  SA NIF ... - Conforme já mencionado supra, a IT desconsiderou o IVA contido em quatro faturas cujo descritivo remete para “de acordo com contrato celebrado” devido a não poder validar o seu conteúdo.
A reclamante neste procedimento também não apresentou o referido contrato, pelo que se mantêm os motivos que originaram a correção efetuada. C. IVA contido na fatura emitida por D... LDA., NIPC ... - Neste caso não foi apresentado o referido orçamento que permitisse discernir os serviços efetivamente prestados, pelo que do desconsiderado o IVA registado como dedutível uma vez que não estavam cumpridos os requisitos do artigo 36 n.º 5 do CIVA. A reclamante vem agora apresentar o referido orçamento. Analisado o mesmo, constata-se que os serviços prestados por esta entidade são serviços de construção civil aos quais se aplica o disposto na alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA, ou seja, o IVA é devido pelo adquirente. Determina a alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do Código do IVA que são sujeitos passivos de IVA «as pessoas singulares ou coletivas referidas na alínea a) que disponham de sede, estabelecimento estável ou domicílio em território nacional e que pratiquem operações que confiram o direito à dedução total ou parcial do imposto, quando sejam adquirentes de serviços de construção civil, incluindo a remodelação, reparação, manutenção, conservação e demolição de bens imóveis, em regime de empreitada ou subempreitada.» O ofício-circulado n.º 30 101/2007, de 24 de maio, esclarece que a norma abrange todos os serviços de construção civil, independentemente de verificarem o conceito de empreitada ou subempreitada definidos nos termos do Código Civil, que se consubstanciem numa obra. Ora, o referido ofício, contempla no seu ponto 1.5 a entrega de bens móveis, esclarecendo o seguinte: «1.5.1. A mera transmissão de bens (sem instalação ou montagem por parte ou por conta de quem os forneceu) não releva para efeitos da regra de inversão. 1.5.2. A entrega de bens, com montagem ou instalação na obra, considera-se abrangida pela regra de inversão, desde que se trate de entregas no âmbito de trabalhos contemplados pela Portaria n.º 19/2004, de 10 de janeiro, independentemente de o fornecedor ser ou não obrigado a possuir alvará́
ou título de registo nos termos do Decreto-Lei n.º 12/2004, de 9 de janeiro. 1.5.3. Excluem-se da regra de inversão os bens que, inequivocamente, tenham a qualidade de bens móveis, isto é, bens que não estejam ligados materialmente ao bem imóvel com caráter de permanência.» Portanto, a montagem e fornecimento dos bens que constam do orçamento estão ligados materialmente ao bem o que determina que o imposto seja devido pelo adquirente. Ora, se foi liquidado IVA pelo fornecedor, o mesmo não pode ser deduzido nos termos do n.º 8 do artigo 19.º do CIVA. D. IVA referente a fatura emitida por E..., NIF ... -Relativamente a esta correção o motivo da correção prende-se com o facto de mais uma vez a fatura em causa se referira a serviços de construção civil e o IVA liquidado pelo fornecedor não pode ser deduzido, nos termos do n.º 8 do artigo 19.º do CIVA. (...).”
  (Cfr. fls. 190 a 197 do PA – denominado no SGP do CAAD ficheiro “PA 1373_2024_T A... Lda.pdf”).

Y)   Em 26.07.2024, a Requerente exerceu o direito de audição no âmbito do procedimento de reclamação graciosa n.º ...2024..., em que se discutiam correções efetuadas em sede do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, tendo juntado, para o efeito, contratos celebrados com a B..., S.A. atinentes à aquisição de serviços de publicidade. Mediante e-mail de 06.09.2024, 11:40 horas, a Requerente dirigiu-se à AT como segue: “[T]endo em consideração que a técnica que se encontra a analisar o procedimento de reclamação graciosa n.º...2023..., em que se discutem correções efetuadas em sede do Imposto sobre o Valor Acrescentado (“IVA”), é comum ao procedimento de reclamação graciosa n.º ...2024..., correndo ambos os procedimentos os seus termos na Direção de Finanças de Braga, e atendendo a que as correções em discussão nos aludidos procedimentos de reclamação graciosa em sede de IRC e IVA resultaram do mesmo Relatório de Inspeção Tributária, requer-se, ao abrigo dos princípios da colaboração e da boa-fé́, que os contratos celebrados com a B... atinentes à aquisição de serviços de publicidade juntos no âmbito do procedimento de reclamação graciosa n.º ...2024... (e que aqui se juntam novamente como documentos n.ºs 1 e 2), sejam igualmente tidos em consideração no âmbito do procedimento de reclamação graciosa n.º...2023... .” (Cfr. fls. 198 e 199 do PA – denominado no SGP do CAAD ficheiro “PA 1373_2024_T A... Lda.pdf”).

Z)   Por despacho de 13.09.2024, do Exm.º Senhor Diretor de Finanças da Direção de Finanças de Braga, foi deferida parcialmente a reclamação graciosa apresentada e referida no ponto V) do probatório, por remissão para o despacho do Exmº Senhor Chefe de divisão de 13.09.2024 que dizia: “[P]elas razões de facto e de direito melhor expressas na proposta de decisão, concordo com as conclusões da mesma no sentido do deferimento parcial do pedido. Caso superiormente se venha a decidir em conformidade, proponho se notifique, nos termos legalmente previstos, o/a interessado/a da respetiva decisão. À consideração superior. Chefe de Divisão... . 13.09.2024. Assinado eletronicamente, no sistema GPS, mediante autenticação com senha pessoal.” (Cfr. fls. 203 do PA – denominado no SGP do CAAD ficheiro “PA 1373_2024_T A... Lda.pdf”).

AA)                Estribando-se a decisão de deferimento parcial referida no ponto Z) do probatório na informação de 13.09.2024, que, a dado passo, diz: “[E]m cumprimento do disposto no art.º 60.º, n.º 1 alínea b) da Lei Geral Tributária - exercício do direito de participação (audição) do contribuinte no procedimento tributário - foi a reclamante notificada para se pronunciar, em 15 dias, sobre o teor do projeto de decisão da reclamação. O representante da reclamante exerceu o direito de defesa no prazo estabelecido tendo a defesa sido enviada com data de 2024-07-26. No se requerimento refere que: “1. A Direção de Finanças de Braga pondera pelo indeferimento parcial da reclamação graciosa, entre outros motivos, “pela falta do contrato celebrado [referente à aquisição de serviços à B...] para asseverar qual é a parceria publicitária em causa” – cf. documento n.º 1 que aqui se junta. 2. Neste sentido, a Reclamante junta como documentos n.ºs 2 e 3 os respetivos contratos celebrados com a B... atinentes à aquisição de serviços de publicidade. O motivo pelo qual foi desconsiderado este gasto prende-se com a falta do contrato celebrado para asseverar qual é a “parceria publicitária” em causa.  Após solicitação de apoio à IT, foi esclarecido o seguinte: “No seguimento do solicitado, informo que: - As faturas emitidas pela entidade B... que se encontram registadas na contabilidade do SP, apresentam a seguinte descrição:

 

 

 

- E totalizam 35.000,00 € de gastos (conta 6222) e 8.050,00 € de IVA deduzido (conta 24323132311): 

 

 

 

 

Da leitura dos contratos apresentados, releva-se:  

Sendo que nas clausulas terceira (“Serviços de Publicidade e de Promoção de Imagem”) e quarta (“Serviços Acessórios de Hospitalidade e Bilhética e Merchandising”), são discriminados os serviços prestados. 

- Determina a Circular n.º 20/2009 de 28 de julho, de forma resumida, que:
• A aquisição dos "Pacotes Corporate" confere aos seus titulares a possibilidade de publicitar e promover a sua imagem e os seus logótipos em vários suportes de comunicação, nomeadamente, publicidade nos camarotes, nas revistas do Clube, nos painéis instalados no espaço multifuncional, na sala de imprensa, bem como na publicidade na imprensa efetuada pelos clubes. 

• Mas, associado às diferentes tipologias de "Pacotes" encontra-se um vasto conjunto de direitos. Por um lado, o acesso a um camarote que pode ser utilizado como escritório ou sala de reuniões e a "apoio logístico e de secretariado necessário à prossecução das operações correntes da atividade dos clientes" (envio de faxes, serviço de fotocópias etc.) que é designado de "espaço empresarial". Por outro lado, a dispor, nos dias de jogos, de lugares sentados no camarote ou na bancada adjacente, de serviços de catering, de lugares no parque de estacionamento do estádio e, em alguns casos, a receber convites para assistir a jogos das competições europeias no estrangeiro, incluindo viagem, estadia e bilhetes.

• Reconhecendo-se a dificuldade, quer para os titulares dos "Pacotes" quer para as entidades que os comercializam, em proceder à discriminação de todos os serviços neles incluídos, aceita-se que se proceda ao agrupamento dos serviços em dois conjuntos: um, para os serviços "principais", e outro, para os serviços ditos "acessórios". 

• Consideram-se serviços "principais" os serviços de "publicidade e de promoção da imagem" do titular do "Pacote". Os serviços "acessórios" incluem, nomeadamente, os lugares sentados no camarote ou na bancada adjacente, o catering, os serviços de hospedeiras, os lugares de estacionamento, os convites para assistir aos jogos das competições europeias no estrangeiro e os serviços conexos com a utilização dos camarotes como "espaço empresarial". As prestações de serviços designadas de "espaço empresarial" compreendem a utilização do camarote como escritório, mas também como local de receção de clientes, de fornecedores ou de terceiros, permitindo ainda a assistência a eventos desportivos. Uma vez que o direito de utilização dos camarotes não pode ser dissociado da sua utilização como espaço lúdico para assistir a eventos desportivos, os serviços de "espaço empresarial" devem ser incluídos no conjunto de serviços designado de "acessórios".

• Uma vez efetuada a repartição dos serviços em dois conjuntos dos serviços incluídos em cada "Pacote" e desde que os encargos ou gastos incorridos pelos titulares sejam comprovadamente indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto, o seu tratamento fiscal deve ser o seguinte: a) As despesas com os serviços "principais" (de publicidade e de promoção da imagem') são aceites como custo, nos termos do n.º 1 do artigo 23. ° do Código do IRC; b) As despesas com os serviços ditos "acessórios", incluindo nestas as referentes à utilização do "espaço empresarial", são igualmente aceites como custo, mas, como configuram «despesas de representação» ficam sujeitos à tributação autónoma, prevista na alínea a) do n.º 3 do artigo 81. ° do Código do IRC, (...) c) O IVA incluído nas despesas de «publicidade e de promoção da imagem» é dedutível nos termos do artigo 20.º n.º 1 do Código do IVA. d) O IVA incluído nas despesas relativas aos serviços «acessórios», compreendendo as referentes à utilização do «espaço empresarial», encontra-se excluído do direito à dedução do IVA nos termos das alíneas c) a e) do n.º 1 do artigo 21.o do Código do IVA. - Assim, do confronto desta Circular com o contrato celebrado com a B..., denominado de ..., conclui-se que o mesmo se enquadra naquela circular. Enquadramento este, que é conferido pela própria B..., aquando da emissão da fatura correspondente a cada um dos pagamentos previstos contratualmente ((““Os serviços acessórios” considerados em conformidade com o n.º 6 da circular n.º 20/2009 da DGI, representam 10% do valor da presente parceria e encontram- se descriminados em documento anexo.”), ainda que fazendo referência a uma percentagem menor do que aquela que é acolhida na referida Circular n.º 20/2009, para efeitos de repartição do preço contratado entre os denominados serviços «principais» e «acessórios» associados ao tipo de contrato em referência, tal como definidos na circular destacada, mas que não resulta de qualquer cláusula contratual do contrato celebrado.  - Ou seja, a percentagem de 10% identificada nas faturas processadas não tem qualquer previsão contratual não sendo, em consequência, possível aferir da sua consistência e adequação ao tipo de serviços «principais» e «acessórios» incluídos no contrato celebrado, nem mesmo em resultado dos elementos fornecidos pelas partes. - Em relação à contabilização das faturas em causa, o sujeito passivo efetuou o registo dos gastos totais e considerou a dedução do IVA na totalidade. - A Circular n.º 20/2009 determina que, em regra, na falta de qualquer critério legal ou contratual para a repartição do valor do contrato pelas componentes de serviços «principais» e «acessórios», 80% do valor dos serviços prestados/adquiridos corresponde aos serviços «principais» (normalmente referentes a publicidade) e 20% corresponde a serviços «acessórios». - À falta de outro critério de repartição do preço do contrato pelas componentes de serviços «principais» e «acessórios» transacionados entre a A... e a B..., através do CONTRATO ..., devidamente fundamentado, dever-se-á́ aplicar o critério de repartição previsto no n.º 10 da Circular n.º 20/2009, designadamente o de 80% e 20%, respetivamente, para cada um dos tipos de serviços destacados. - Assim, em consonância com a Circular (n.º 12) (20% de serviços acessórios): “(d) O IVA incluído nas despesas relativas aos serviços «acessórios», compreendendo as referentes à utilização do «espaço empresarial», encontra-se excluído do direito à dedução do IVA nos termos das alíneas  c) a e) do n.º 1 do artigo 21.º do Código do IVA.”: fica excluído do direito à dedução o valor de 402,50 € por fatura, ou seja, o total de 1.610,00 €. IV. Conclusão: Concluindo, face a tudo o que foi analisado, e em particular aos pontos A e B do projeto, deve a presente reclamação graciosa ser parcialmente deferida, nos termos expostos na presente informação. É o que me cumpre informar. À consideração superior.” (Cfr. fls. 207 a 210 do PA – denominado no SGP do CAAD ficheiro “PA 1373_2024_T A... Lda.pdf”).

BB)                 Em 18.12.2024, pelas 17:06 horas, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo (Cfr. Sistema de Gestão Processual do CAAD);

CC)                O PPA foi aceite em 19.12.2024, pelas 14:21 horas. (Cfr. Sistema de Gestão Processual do CAAD).

III.B) Factos não provados:

20.  Os serviços qualificados como “acessórios” no contrato celebrado com a B..., nomeadamente os relativos a bilhética, a hospitalidade e o merchandising, tenham sido utilizados exclusivamente no âmbito da atividade publicitária da Requerente ou como instrumento de promoção institucional, não se demonstrando o seu afastamento de uma possível utilização pessoal, recreativa ou de luxo;

21.  Os serviços prestados por E..., consistentes em “montagem de trabalhos de carpintaria e caixilharia”, não integrem a noção de serviços de construção civil para efeitos da aplicação da regra de inversão do sujeito passivo prevista na alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA;

22.  A AT tenha individualizado e fundamentado, em concreto, qual das alíneas c), d) ou e) do n.º 1 do artigo 21.º do CIVA se aplica a cada um dos “serviços acessórios” incluídos nas correções — ainda que tenha invocado genericamente a aplicação do referido preceito e o teor da Circular n.º 20/2009.

23.  Não se provaram outros factos com relevância para a decisão das questões submetidas a julgamento.

 

III.C) Fundamentação da decisão sobre a matéria de facto:

 

24.  Relativamente à matéria de facto, importa, antes de mais, salientar que o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de seleccionar os factos que importam para a decisão e distinguir a matéria provada da não provada, tudo conforme o artigo 123.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e o artigo 607.º, n.ºs 3 e 4 do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT.

25.  Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. art.º 596.º do CPC).

26.  A convicção sobre os factos assim dados como provados (acima explicitados) fundou-se: i) nos documentos juntos aos autos, nomeadamente os contratos, faturas, orçamentos (nomeadamente o Doc. n.º 41), comunicações e peças processuais, que foram devidamente analisados e não impugnados quanto à sua autenticidadeii) nas posições processuais assumidas por ambas as partes no decurso da inspeção tributária, da reclamação graciosa e da presente arbitragem, sendo considerados factos admitidos ou não contestados com relevância para o caso; iii) no teor do contrato celebrado com a B..., S.A., que, apesar de apresentado apenas em sede de reclamação graciosa, veio demonstrar a existência de um pacote global de prestação de serviços de natureza publicitária, incluindo serviços que a AT reputa de "acessórios" (bilhética, hospitalidade e merchandising); iv) nas faturas emitidas pelos fornecedores (B...S.A., D..., Lda., E...), das quais resulta o valor do IVA deduzido e a forma de faturação (com ou sem IVA), bem como das menções feitas nas mesmas (ex. remissão à Circular 20/2009); v) Na documentação junta aos autos pela Requerente, especialmente o orçamento n.º ...-19 (D..., Lda.), que permite inferir que parte dos serviços descritos têm natureza de manutenção e assistência técnica, com aparente afastamento da noção de “serviços de construção civil”; vi) Na ausência de prova concreta sobre a afetação de certos serviços à atividade tributável da Requerente, em especial no que respeita: - à utilização efetiva dos serviços acessórios incluídos no contrato com a B..., S.A. (ex. camarotes, brindes, hospitalidade); - ao uso profissional ou não dos serviços prestados por E... .

 

III.D) Do Direito:

 

III.D.1) Da delimitação do objeto do processo e da anulação parcial dos atos de liquidação:

27.  Antes de se conhecer do mérito das correções impugnadas, cumpre delimitar o objeto da presente ação arbitral, designadamente quanto à extensão do pedido de anulação dos atos tributários de liquidação de IVA.

28.  Constata-se que, conforme resulta da petição inicial e dos elementos juntos aos autos, a Requerente não impugna a totalidade das correções promovidas pela Administração Tributária (AT) no decurso da ação inspetiva. Em concreto: i)Admite e aceita expressamente a correção respeitante ao IVA deduzido na aquisição de bilhetes para um jogo de futebol, no valor de € 104,72ii) Não impugnou a correção relativa à G..., no valor de € 10.817,60, que foi integralmente deferida em sede de reclamação graciosaiii) Por outro lado, a correção referente à B..., S.A. (publicidade), no montante de € 8.050,00foi impugnada na íntegra, pois não foi objeto de deferimento parcial em sede graciosa; iv) As correções relativas à D..., Lda. (€ 322,00) e a E... (€ 340,18) foram igualmente impugnadas, não tendo sido objeto de deferimento parcial.

29.  [1]Assim, o objeto da presente instância arbitral está limitado à apreciação da legalidade das correções ao IVA deduzido no montante global de € 2.712,18, correspondente às despesas: €1.610,00 com a B..., S.A., € 322,00 com a D..., Lda. € 340,18 e com E... .

30.  As restantes correções não se incluem no objeto do litígio, quer por terem sido aceites expressamente pela Requerente(como a dos bilhetes), quer por terem sido totalmente deferidas na fase administrativa (como a da G...).

31.  Nos termos do artigo 2.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, compete aos tribunais arbitrais a apreciação da legalidade de atos de liquidação de tributos na medida em que tenham sido impugnados. E, conforme decorre dos artigos 608.º e 609.º do Código de Processo Civil (aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT), o Tribunal está vinculado à causa de pedir e ao pedido formulado, não podendo conhecer de objeto ou quantidade superior ao que tiver sido pedido.

32.  A este propósito, refere Jorge Lopes de Sousa (Código de Procedimento e de Processo Tributário, Áreas Editora, 6.ª ed., vol. II, págs. 318-319) que "o juiz não pode conhecer na sentença de questões não suscitadas pelas partes, nem condenar em objeto ou em quantidade superior ao pedido". Esta orientação encontra-se firmemente acolhida na jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, designadamente no acórdão de 30.01.2019, processo n.º 0436/18.0BALSB, onde se afirma que a anulação do ato tributário deve ser apenas parcial quando a ilegalidade invocada e reconhecida apenas afeta parte das correções.

33.  [2]Assim sendo, o objeto do presente processo deve considerar-se limitado às correções efetivamente impugnadas e não deferidas na fase administrativa. O Tribunal não se pode pronunciar sobre o segmento da liquidação correspondente à correção aceite pela Requerente (€ 104,72) nem sobre o segmento já integralmente deferido (€ 10.817,60); tal como também não pode pronunciar-se sobre o segmento parcialmente deferido da AT em sede de reclamação graciosa, no montante de €6.440,00 (respeitante às faturas da B... S.A.). Consequentemente, a eventual anulação dos atos tributários será sempre parcial, restringindo-se ao montante de € 2.272,18, correspondente exclusivamente às seguintes parcelas ainda controvertidas: i) €1.610,00 (B... S.A.); ii) €322,00 (D..., Lda); €340,18 (E...), com exclusão das correções não impugnadas ou já decididas favoravelmente à Requerente. 

34.  Nestes termos, não se verifica qualquer incompetência material deste Tribunal Arbitral, improcedendo a exceção dilatória suscitada (à condição) pela Requerida, nos termos dos artigos 576.º/2 e 577.º, alínea a) do CPC.

III.D.2) Apreciação do mérito da causa:

 

§ 1.º

DA ILEGALIDADE DAS CORREÇÕES REFERENTES AO IVA DEDUZIDO INERENTE AOS SERVIÇOS ADQUIRIDOS À B..., S.A.

 

35.  Resulta dos autos que a Requerente celebrou com a B...S.A., um contrato de parceria publicitária que lhe conferiu, entre outros, o estatuto de “...”.

36.  Está em causa nos presentes autos a legalidade da correção efetuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), que excluiu parcialmente o direito à dedução do IVA suportado pela Requerente, no âmbito do aludido contrato celebrado com a sociedade B..., S.A., ao abrigo do qual esta última se comprometeu a prestar serviços publicitários e outros serviços associados, descritos como “serviços acessórios”.

37.  Nas faturas emitidas ao abrigo desse contrato é indicada uma prestação de serviços globais, com a menção de que “os serviços acessórios considerados em conformidade com o n.º 6 da Circular n.º 20/2009 da DGI representam 10% do valor da presente parceria”. Não obstante esta menção, verifica-se que o contrato celebrado não discrimina os serviços em termos de valor ou percentagem, nem identifica, de forma precisa, os elementos da prestação considerados principais ou acessórios, sendo essa classificação feita apenas em termos genéricos. (cfr. Ponto AA) do Probatório). 

38.  Neste contexto, a Autoridade Tributária procedeu à exclusão parcial do direito à dedução do IVA com base no disposto no artigo 21.º, n.º 1, do Código do IVA, invocando a existência de “serviços acessórios” correspondentes a despesas de hospitalidade, bilhética e merchandising — tipologia que, em regra, integra as categorias legalmente excluídas do direito à dedução.

39.  O artigo 21.º, n.º 1 do Código do IVA estabelece um regime de exclusão do direito à dedução para um conjunto de despesas consideradas, pela sua natureza, de difícil controlo, suscetíveis de desvio para consumos particulares ou de finalidade recreativa. 

40.  Vejamos, então, em pormenor e doravante, os contornos do instituto do direito à dedução previsto no ordenamento jurídico-tributário nacional e comunitário.  

41.  A dedução do imposto suportado pelos sujeitos passivos nas operações intermédias do circuito económico é um elemento central do funcionamento do sistema do IVA, que tem como objetivo tributar apenas o consumo final. 

42.  O direito à dedução pressupõe, pois, que os sujeitos passivos recuperem, em regra, o IVA suportado em bens e serviços com vista à realização de operações tributadas, dentro dos limites estabelecidos no Código do IVA. 

43.  Nesse sentido, o art.º 19.º, n.º 1 do CIVA estatui no sentido de que, para apuramento do imposto devido, os sujeitos passivos deduzem ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efetuaram: i) o imposto devido ou pago pela aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos; ii) o imposto devido pela importação de bens; iii) o imposto pago pelas aquisições de bens ou serviços abrangidas pelas alíneas e), h) e j) e l) do n.º 1, do art.º 2.º; iv) o imposto pago como destinatário de operações tributáveis efetuadas por sujeitos passivos estabelecidos no estrangeiro, quando estes não tenham no território nacional um representante legalmente acreditado e não tenham faturado imposto; v) e, finalmente, o imposto pago pelo sujeito passivo à saída dos bens de um regime de entreposto não aduaneiro, de acordo com art.º 15.º, n.º 6 do CIVA. 

44.  O n.º 2 do mesmo normativo estabelece, no entanto, um condicionalismo formal, segundo o qual só confere o direito à dedução o imposto mencionado em faturas passadas em forma legal, em nome e na posse do sujeito passivo, considerando-se passadas na forma legal, as faturas que contenham os requisitos enunciados no n.º 5 do art.º 36.º ou no n.º 2 do art.º 40.º, ambos do CIVA. 

45.  Por seu lado, o artigo 20.º, n.º 1 do CIVA, determina que só pode deduzir-se o imposto suportado pelo sujeito passivo para a realização de transmissões de bens e prestações de serviços sujeitos a imposto e dele não isentas, nos termos da sua alínea a), ou nas operações elencadas na sua alínea b).

46.  Intuindo-se das aludidas normas que o imposto susceptível de desoneração por via do exercício do direito à dedução, corresponde, em princípio, a todo o imposto suportado pelo sujeito passivo para o exercício da sua atividade económica, ou seja, a imposto que tenha sido suportado em aquisições de bens e serviços que sejam utilizados para a realização de operações activas tributadas. 

47.  Contudo, a regra geral do direito à dedução comporta algumas excepções, as quais têm previsão legal no art.º 21.º do CIVA, que, sob a epígrafe “Exclusões do direito à dedução”,  estatui como segue: “1 - Exclui-se, todavia, do direito à dedução o imposto contido nas seguintes despesas: a) Despesas relativas à aquisição, fabrico ou importação, à locação, à utilização, à transformação e reparação de viaturas de turismo, de barcos de recreio, helicópteros, aviões, motos e motociclos. É considerado viatura de turismo qualquer veículo automóvel, com inclusão do reboque, que, pelo seu tipo de construção e equipamento, não seja destinado unicamente ao transporte de mercadorias ou a uma utilização com carácter agrícola, comercial ou industrial ou que, sendo misto ou de transporte de passageiros, não tenha mais de nove lugares, com inclusão do condutor; b) Despesas respeitantes a combustíveis normalmente utilizáveis em viaturas automóveis, com exceção das aquisições de gasóleo, de gases de petróleo liquefeitos (GPL), gás natural e biocombustíveis, cujo imposto é dedutível na proporção de 50 %, a menos que se trate dos bens a seguir indicados, caso em que o imposto relativo aos consumos de gasóleo, gasolina, GPL, gás natural e biocombustíveis é totalmente dedutível: i) Veículos pesados de passageiros; ii) Veículos licenciados para transportes públicos, exceptuando-se os rent-a-car; iii) Máquinas consumidoras de gasóleo, GPL, gás natural ou biocombustíveis, bem como as máquinas que possuam matrícula atribuída pelas autoridades competentes, desde que, em qualquer dos casos, não sejam veículos matriculados; iv) Tractores com emprego exclusivo ou predominante na realização de operações culturais inerentes à actividade agrícola; v) Veículos de transporte de mercadorias com peso superior a 3500 kg; c) Despesas de transportes e viagens de negócios do sujeito passivo do imposto e do seu pessoal, incluindo as portagens; d) Despesas respeitantes a alojamento, alimentação, bebidas e tabacos e despesas de recepção, incluindo as relativas ao acolhimento de pessoas estranhas à empresa e as despesas relativas a imóveis ou parte de imóveis e seu equipamento, destinados principalmente a tais recepções; e) Despesas de divertimento e de luxo, sendo consideradas como tal as que, pela sua natureza ou pelo seu montante, não constituam despesas normais de exploração. 2 - Não se verifica, contudo, a exclusão do direito à dedução nos seguintes casos: a) Despesas mencionadas na alínea a) do número anterior, quando respeitem a bens cuja venda ou exploração constitua objecto de actividade do sujeito passivo, sem prejuízo do disposto na alínea b) do mesmo número, relativamente a combustíveis que não sejam adquiridos para revenda; b) Despesas relativas a fornecimento ao pessoal da empresa, pelo próprio sujeito passivo, de alojamento, refeições, alimentação e bebidas, em cantinas, economatos, dormitórios e similares; c) Despesas mencionadas nas alíneas a) a d) do número anterior, quando efectuadas por um sujeito passivo do imposto agindo em nome próprio mas por conta de um terceiro, desde que a este sejam debitadas com vista a obter o respectivo reembolso; d) Despesas mencionadas nas alíneas c) e d), com excepção de tabacos, ambas do número anterior, efectuadas para as necessidades directas dos participantes, relativas à organização de congressos, feiras, exposições, seminários, conferências e similares, quando resultem de contratos celebrados directamente com o prestador de serviços ou através de entidades legalmente habilitadas para o efeito e comprovadamente contribuam para a realização de operações tributáveis, cujo imposto é dedutível na proporção de 50 %; e) Despesas mencionadas na alínea c) e despesas de alojamento, alimentação e bebidas previstas na alínea d), ambas do número anterior, relativas à participação em congressos, feiras, exposições, seminários, conferências e similares, quando resultem de contratos celebrados directamente com as entidades organizadoras dos eventos e comprovadamente contribuam para a realização de operações tributáveis, cujo imposto é dedutível na proporção de 25 %. f) Despesas relativas à aquisição, fabrico ou importação, à locação e à transformação em viaturas elétricas ou híbridas plug-in, de viaturas ligeiras de passageiros ou mistas elétricas ou híbridas plug-in, quando consideradas viaturas de turismo, cujo custo de aquisição não exceda o definido na portaria a que se refere a alínea e) do n.º 1 do artigo 34.º do Código do IRC; g) Despesas relativas à aquisição, fabrico ou importação, à locação e à transformação em viaturas movidas a GPL ou a GNV, de viaturas ligeiras de passageiros ou mistas movidas a GPL ou a GNV, quando consideradas viaturas de turismo, cujo custo de aquisição não exceda o definido na portaria a que se refere a alínea e) do n.º 1 do artigo 34.º do Código do IRC, na proporção de 50 %; h) Despesas respeitantes a eletricidade utilizada em viaturas elétricas ou híbridas plug-in. 3 - Não conferem também direito à dedução do imposto as aquisições de bens referidos na alínea f) do n.º 2 do artigo 16.º, quando o valor da sua transmissão posterior, de acordo com legislação especial, for a diferença entre o preço de venda e o preço de compra.”

48.  Tais exclusões do direito à dedução estão, sobretudo, relacionadas com imposto relativo a aquisições de determinados bens ou serviços cujas características os torna não essenciais à atividade produtiva ou facilmente desviáveis para consumos privados e, por isso, não empresariais.

49.  Em sede de IVA e nos termos e em conformidade com o disposto na alínea d) do n.º 1 do art.º 21.º do Código do IVA, encontra-se excluído do exercício do direito à dedução o imposto suportado nas “Despesas respeitantes a alojamento, alimentação, bebidas e tabaco e despesas de receção, incluindo as relativas ao acolhimento de pessoas estranhas à empresa e as despesas relativas a imoveis ou parte de imóveis e seu equipamento, destinados principalmente a tais receções.” Nos termos da alínea e) do n.º 1 do art.º 21.º do CIVA, encontra-se igualmente excluído do exercício do direito à dedução o imposto suportado em “Despesas de divertimento e de luxo, sendo consideradas como tal as que, pela sua natureza ou pelo seu montante, não constituam despesas normais de exploração.

50.  As normas  vindas de explicitar constituem o quadro normativo interno que permite dirimir o dissidio sub judicio

51.  Volvendo agora a nossa abordagem para o ordenamento jurídico-comunitário, diga-se que o exercício do direito à dedução em sede de IVA consubstancia uma das principais características deste imposto, em conformidade, aliás, com o regime consagrado na Sexta Diretiva (Diretiva 77/388/CEE, do Conselho, de 17.5.1977), concretamente no seu art.º 17.º [que corresponde ao art.º 167.º e seguintes da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro, relativa ao sistema comum do IVA (vulgarmente denominada de "Diretiva IVA")], preceito que consagra as regras do exercício do direito à dedução do imposto, contemplando diversos requisitos objetivos e subjetivos do exercício do referido direito. É precisamente neste enquadramento que se deve aferir da validade das exclusões previstas no artigo 21.º do CIVA, na medida em que estas não podem contrariar o regime comum do IVA consagrado na Diretiva 2006/112/CE. A jurisprudência do TJUE tem reiteradamente sublinhado que o direito à dedução não pode ser restringido senão nas hipóteses expressamente previstas ou autorizadas por esta Diretiva.

52.  O direito comunitário é matriz e fundamento do Sistema Comum do IVA. 

53.  Sendo que, o direito interno dos Estados-membros (o nacional e a tal propósito, basicamente explicitado acima) não pode conceber e adotar soluções legislativas que se mostrem em contravenção com a matriz a que todos devem obediência. 

54.  O direito à dedução é elemento estruturante e basilar de funcionamento do IVA e, por princípio, não pode ser limitado ou simplesmente excluído, excepto nas situações previstas expressamente no normativo comunitário em vigor. Vejamos,

55.  O aludido Sistema Comum do IVA, já o dizia o art.º 2.º da Diretiva n.º 67/227/CEE (o que se mantém perfeitamente inalterado na actual Diretiva n.º 2006/112/CE) “(...) consiste em aplicar aos bens e serviços um imposto geral sobre o consumo exatamente proporcional ao preço dos bens e serviços, seja qual for o número de operações ocorridas no processo de produção e de distribuição anterior ao estádio de tributação.”

56.  O cálculo do IVA pelos operadores económicos efetua-se através do designado método subtrativo indirecto, em conformidade com o estabelecido no 2.º parágrafo do n.º 2 do art.º 1.º da actual Diretiva n.º 2006/112/CE - “Diretiva IVA” - nos seguintes termos: “Em cada operação, o IVA, calculado sobre o preço do bem ou serviço à taxa aplicável ao referido bem ou serviço, é exigível, com prévia dedução do montante do imposto que tenha incidido diretamente sobre o custo dos diversos elementos constitutivos do preço.” 

57.  O regime das deduções que enforma o Sistema Comum do IVA, visa, assim, desonerar inteiramente o empresário do imposto que suporte no âmbito de todas as suas atividades económicas, desde que, elas próprias, estejam efetivamente sujeitas a imposto. Como reiteradamente vem afirmando o TJUE: “O sistema comum do IVA garante, por conseguinte, uma neutralidade perfeita quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas, independentemente dos respetivos fins ou resultados, desde que essas atividades estejam, em princípio, elas próprias sujeitas a IVA”. Neste sentido vejam-se Acórdãos do TJUE: - de 5.7.2018, Proc.C-320/17, Marie Participations; -  de 2.5.2019, Proc. C-225/18, Grupa Lotos; - de 3.7.2019, Proc. C-316/18, The Chancellor, Masters and Scholars if the University of Cambridge; e - de 26.2.2020, Proc. C-630/19, PAGE International.

58.  O direito à dedução “constitui um princípio fundamental do sistema comum do IVA instituído pela legislação da União, pelo que o referido direito faz parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípioser limitado.” (Cfr. Acórdão do TJUE de 14.6.2917, Proc. C-38/16, Compass Contract Services e ainda Acórdão do TJUE de 18.10.2018, Proc. C- 153/17, Volkswagen Financial Services). “Importa ainda sublinhar que este entendimento (de que o direito à dedução é regra, e a sua limitação exceção) é firmemente sustentado pela jurisprudência comunitária. O TJUE tem afirmado que qualquer exclusão deve ser interpretada de forma estrita, sendo proibida uma leitura extensiva das normas que restrinjam esse direito. Neste sentido, repise-se, veja-se a jurisprudência que dimana do Acórdão do TJUE tirado no Proc. C- 153/17.

59.  O regime comunitário das deduções tem consagração expressa na Diretiva 2006/112/CE, do Conselho, de 28/11/2006 (doravante, DIVA), entre outros, nos seus artigos 167.º, 168.º e 178.º, correspondentes aos artigos 17.º e 18.º da anterior Diretiva 77/388/CEE (Sexta Diretiva IVA). 

60.  Dispondo a alínea a) do art.º 168.º, da DIVA, no sentido de que, na medida em que os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das suas operações tributadas, o sujeito passivo tem, em princípio, direito a deduzir o imposto devido ou pago relativo a esses bens ou serviços. No plano formal, a dedução do imposto relativo à aquisição de bens e serviços implica, em conformidade com o disposto na alínea a) do art.º 178.º da DIVA, a posse de uma factura emitida nos termos legais, isto é, contendo todos os elementos previstos na norma da diretiva relativa à facturação. 

61.  Não obstante, a DIVA, no seu art.º 176.º, exclui o exercício do direito à dedução em relação às “[D]espesas que não tenham carácter estritamente profissional, tais como despesas sumptuárias, recreativas ou de representação.”  

62.  A DIVA autoriza que os Estados-Membros possam consagrar nas suas legislações nacionais exclusões do direito à dedução, na condição de as mesmas constarem de legislação anterior à adopção do IVA, tal como delineado no âmbito do sistema comum. Vejamos: para além de limitações ou exclusões por razões conjunturais que podem emergir após consulta ao Comité do IVA (Cfr. art.º 177º da DIVA); ou até de limitações ou exclusões excepcionalmente autorizadas pelo Conselho, deliberando por unanimidade e sob proposta da Comissão, para evitar situações de fraude ou evasão fiscal (Cfr. art.º 395.º da DIVA), releva ainda como fundamento para o afastamento do direito à dedução, a vigência de normas de direito interno que vigorassem em momento anterior a 1.1.1979 ou vigorassem em momento anterior à data de adesão de um determinado Estado-Membro à União Europeia (Cfr. art.º 176.º da DIVA que dispõe:“[O] Conselho, deliberando por unanimidade, sob proposta da Comissão, determina quais as despesas que não conferem direito à dedução do IVA. Em qualquer caso, são excluídas do direito à dedução as despesas que não tenham carácter estritamente profissional, tais como despesas sumptuárias, recreativas ou de representação. Até à entrada em vigor das disposições referidas no primeiro parágrafo, os Estados-Membros podem manter todas as exclusões previstas na respectiva legislação nacional em 1 de Janeiro de 1979 ou, no que respeita aos Estados-Membros que tenham aderido à Comunidade após essa data, na data da respectiva adesão. – a parte por nós destacada a carregado e sublinhado é vulgarmente conhecida como cláusula “standstill”). A aplicação da cláusula standstill tem sido admitida apenas nos limites estritos em que existia já, à data de adesão do Estado-Membro, uma disposição legal que consagrava a exclusão. É entendimento pacífico do TJUE que tal cláusula não permite o alargamento posterior das exclusões existentes, como resulta do acórdão C-409/99 (Metropol), onde se refere que não se pode dar interpretação extensiva a esta derrogação.

63.  Tal autorização encontrava-se igualmente expressa no n.º 6 do art.º 17.º, da Diretiva 77/388/CEE (sexta Directiva), em vigor à data de adesão da República Portuguesa à então Comunidade Económica Europeia, com a seguinte redacção: “O mais tardar antes de decorrido o prazo de quatro anos a contar da data da entrada em vigor da presente directiva, o Conselho, deliberando por unanimidade, sob proposta da Comissão, determinará quais as despesas que não conferem direito à dedução do imposto sobre o valor acrescentado. Serão excluídas do direito à dedução, em qualquer caso, as despesas que não tenham carácter estritamente profissional, tais como despesas sumptuárias, recreativas ou de representação. Até à entrada em vigor das disposições acima referidas, os Estados-membros podem manter todas as exclusões previstas na legislação nacional respectiva no momento da entrada em vigor da presente directiva[3].”

64.  A Sexta Directiva do Conselho entrou em vigor em 17/05/1977. 

65.  No que respeita a Portugal, o CIVA entrou em vigor em 01.01.1986 (cfr. artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de Dezembro, na redacção dada pela Lei n.º 42/85, de 22/08), na mesma data em que entrou em vigor o Acto Relativo às Condições de Adesão do Reino da Espanha e da República Portuguesa e as Adaptações dos Tratados, em anexo ao Tratado de Adesão, assinado a 12.06.1985, tendo Portugal ficado obrigado a dar cumprimento ao sistema comum do IVA, a partir de 01.01.1989. 

66.  O artigo 395.º do Acto de Adesão dispõe como segue: “Os novos Estados membros porão em vigor as medidas necessárias para darem cumprimento, a partir da adesão, ao disposto nas directivas e decisões, na acepção do artigo 189.º do Tratado CEE e do artigo 161.º do Tratado CEEA, bem como nas recomendações e decisões, na acepção do artigo 14.º do Tratado CECA, a menos que seja fixado um prazo na lista constante do anexo XXXVI ou noutras disposições do presente Acto.

67.  Nos termos do artigo 395.º do Acto de Adesão e Anexo XXXVI, estava a República Portuguesa obrigada a adoptar, a partir de 01.01.1989, as medidas necessárias ao cumprimento da Sexta Directiva.

68.  Tendo presente que a adesão à CEE teve efeitos a partir de 01.01.1986, que o Código de IVA não se encontrava em vigor em 31/12/1985 e que não existia na ordem jurídica nacional qualquer disposição que excluísse o direito à dedução do IVA nessa data, uma vez que o Código do Imposto de Transacções (CIT) revogado pelo CIVA, não previa as exclusões à dedução do IVA previstas no artigo 21.º do CIVA, colocava-se a questão de saber se poderia ou não o legislador nacional introduzir as exclusões e as limitações ao direito à dedução com base na cláusula “standstill”. 

69.  Sobre a compatibilidade das limitações e exclusões do direito à dedução com o normativo comunitário, constantes do art.º 21.º do CIVA, foi, em decisão arbitral proferida no processo 207/2019-T que tramitou no CAAD, suscitado o reenvio prejudicial e colocadas ao TJUE as seguintes questões: 1) O artigo 17.º, n.º 6, 2.ª parte, da Sexta Directiva do Conselho, de 17 de Maio de 1977 (ao referir que os Estados-Membros «podem manter todas as exclusões previstas na legislação nacional respectiva no momento da entrada em vigor da presente directiva») permitia que um novo Estado Membro, na data da respectiva adesão, introduzisse na sua legislação interna exclusões do direito à dedução de IVA? 2) O artigo 17.º, n.º 6, 2.ª parte, da Sexta Directiva tem alcance idêntico ao artigo 176.º, 2.ª parte, da Directiva n.º 2006/112/CE, do Conselho, de 28.11.2006 (ao estabelecer que os Estados-Membros que tenham aderido à Comunidade após 1 de Janeiro de 1979 podem manter todas as exclusões previstas na respectiva legislação nacional na data da respectiva adesão), quanto à data relevante para apurar quais «as exclusões previstas na respectiva legislação nacional» que podem ser mantidas? 3) No pressuposto de que, à face da Sexta Directiva, Portugal podia manter todas as exclusões previstas na legislação nacional respectiva em 1 de Janeiro de 1989, data da entrada em vigor a Sexta Directiva em Portugal, essa possibilidade foi alterada pela Directiva n.º 2006/112/CE, ao indicar como data relevante a da adesão (1 de Janeiro de 1986)? 4) O artigo 176.º, 2.ª parte, da Directiva n.º 2006/112/CE, do Conselho, de 28-11-2006, não se opõe a que, na data da adesão de Portugal às Comunidades Europeias, comecem a vigorar regras (como as constantes no artigo 21.º, n.º 1, do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado) que estabelecem a exclusão do direito à dedução de imposto respeitante a determinadas despesas (inclusivamente de alojamento, alimentação, bebidas, aluguer de viaturas, combustível e portagens), em situação em que tais regras tinham sido publicadas e inicialmente previstas para entrarem em vigor antes da adesão, mas foi diferida a sua entrada em vigor para a data em que ocorreu a adesão? 5) O artigo 168.°, alínea a) da Diretiva 2006/112 e o princípio da neutralidade devem ser interpretados no sentido de que se opõem a que na legislação interna de um Estado Membro sejam consagradas regras de exclusão do direito à dedução (como as constantes do artigo 21.º, n.º 1, do CIVA, relativas a despesas de alojamento, alimentação, bebidas, aluguer de viaturas, combustível e portagens) aplicáveis mesmo quando se faz prova de que os bens e serviços adquiridos foram utilizados para os fins das operações tributadas do sujeito passivo? 6) O artigo 176.° da Diretiva 2006/112 e o princípio da proporcionalidade opõem-se a que as exclusões do direito a dedução nela não previstas, mas que podem ser mantidas pelos Estados- Membros ao abrigo da sua 2.a parte, sejam aplicáveis quando se faz prova de que as despesas respectivas têm natureza estritamente profissional e os bens e os serviços foram utilizados para os fins das operações tributadas do sujeito passivo?” 

70.  Em resposta às (acima transcritas) questões prejudiciais, o TJUE, em despacho fundamentado datado de 17.09.2020, proferido no processo C-837/19, Super Bock Bebidas, determinou: “ O artigo 17.°, n.°6, da Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme, bem como o artigo 168.°, alínea a), e o artigo 176.° da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, devem ser interpretados no sentido de que não se opõem à legislação de um Estado-Membro entrada em vigor na data da adesão deste à União Europeia segundo a qual as exclusões do direito a dedução do imposto sobre o valor acrescentado que incide sobre as despesas respeitantes, designadamente, a alojamento, alimentação, bebidas, aluguer de viaturas, combustível e portagens se aplicam igualmente no caso de serdemonstrado que essas despesas foram efetuadas para a aquisição de bens e de serviços utilizados para os fins das operações tributadas.”

71.  Na data de entrada em vigor em Portugal da 6.ª Directiva, ou seja, como visto, em 1.1.1989, o ordenamento jurídico interno tinha a vigorar as exclusões e limitações ao exercício do direito à dedução previstas no art.º 21º do CIVA e manteve-as exactamente ao abrigo do aludido regime de exclusão prévia, consubstanciado na aplicação da referida “clausula standstill”.

72.  Por conseguinte, uma vez que as exclusões e limitações ao direito à dedução do imposto devido ou pago pelo sujeito passivo nos inputs em que incorre, constituem limitação ao princípio da neutralidade do imposto e a sua introdução no direito interno, por transposição do normativo comunitário, só é possível em conformidade com norma expressamente prevista na Directiva matriz que regula e harmoniza o Sistema Comum do IVA e esclarecido que está que as exclusões e limitações ao direito à dedução previstas no art.º 21.º do CIVA não estão em contravenção como o normativo comunitário, estando, aliás, suportadas na acima referida cláusula de "congelamento" ou “standstill”; resolvida a questão da compatibilidade do art.º 21º do CIVA com o normativo comunitário em vigor, adequado se mostra discorrer sobre o tipo de despesas cujo IVA suportado não é susceptível de dedução: as despesas cujo IVA suportado está excluído (ou limitado) de desoneração por via do exercício do direito à dedução nos termos do art.º 21.º do CIVA (mesmo na sua redacção à data de entrada em vigor da 6.ª Directiva em Portugal) são despesas que, pela sua natureza, podem ser facilmente desviáveis para fins privados ou não empresariais, consubstanciando-se, assim, em consumos finais e, por isso, não susceptíveis de desoneração em IVA.  

73.  A razão de ser das exclusões ao exercício do direito à dedução radica no facto de se tratar de consumos que, não obstante, possam ser absolutamente necessários para a prossecução de determinadas atividades, são facilmente desviáveis para consumos privados. Colocando-se até a questão de saber se as limitações ou exclusões previstas no art.º 21º do CIVA subsistem mesmo que os bens ou serviços que originaram o imposto suportado sejam insuscetíveis de utilização privada ou até mesmo que se demonstre que tais bens ou serviços têm carácter estritamente profissional. 

74.  A jurisprudência comunitária emanada do TJUE[4], vem firmando entendimento consolidado que vai no seguinte sentido:   i) As exclusões e limitações podem aplicar-se a todo o tipo de despesas, incluindo aquelas que têm carácter estritamente profissional; as que constituem um instrumento indispensável ao exercício da atividade; e as que não são susceptíveis de, no caso concreto, serem utilizadas para fins privados; ii) Não pode ser excluído ou limitado o exercício do direito à dedução relativamente a bens e serviços de modo que o conteúdo do direito à dedução resulte esvaziado; iii) Não pode ser alargado o âmbito das exclusões e limitações após a data de 1.1.1979 ou após a data da adesão do respectivo Estado-Membro, conquanto essa adesão haja ocorrido após o dia 1.1.1979  (cláusula standstill), ou seja, alterações ulteriores no sentido do alargamento das exclusões ou limitações já a vigorar violam claramente o normativo comunitário. Mesmo que o sujeito passivo demonstre que a despesa foi exclusivamente afeta a fins profissionais, a jurisprudência do TJUE (cfr. Despacho do TJUE – Oitava Secção – de 26.02.2020, P.º C-630/19, PAGE International) considera que, desde que a norma de exclusão nacional seja compatível com o artigo 176.º da Diretiva IVA e tenha fundamento anterior à adesão (cláusula standstill), a exclusão prevalece. Tal demonstração não basta, pois, o critério determinante é a natureza objetiva da despesa e o seu enquadramento legal. Na parte dispositiva de decisão o TJUE declara: “[O] artigo 168.°, alínea a), e o artigo 176.° da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a uma legislação nacional que, após a adesão do Estado‑Membro em causa à União Europeia, reduz o âmbito das despesas excluídas do direito à dedução do imposto sobre o valor acrescentado, autorizando, em certas condições, uma dedução parcial do imposto sobre o valor acrescentado que incide sobre tais despesas, entre as quais, nomeadamente, as relativas à alimentação, ainda que o sujeito passivo comprove que essas despesas foram integralmente afetas ao exercício da sua atividade económica tributável.”

75.  Inferindo-se daqui que o IVA suportado nas despesas de receção e em despesas de divertimento e luxo, não obstante ligado à realização de atividades empresariais, não era, em princípio, suscetível de desoneração por aplicabilidade das alíneas d) e e) do n.º 1 do art.º 21º do CIVA, ou seja, não era o facto de haver uma inequívoca ligação dos inputs consubstanciados nas despesas de receção e nas despesas de divertimento e luxo à realização de atividades tributadas que conferia à Requerente a possibilidade de desoneração do IVA suportado naquelas despesas.    

76.  Entre as exclusões do direito à dedução e que têm relevância para o caso sub judicio, nos termos e em conformidade com o referido na alínea d) e e) do n.º 1 do art.º 21.º do CIVA, encontra-se o imposto suportado em “[D]espesas respeitantes a alojamento, alimentação, bebidas e tabacos e despesas de recepção, incluindo as relativas ao acolhimento de pessoas estranhas à empresa e as despesas relativas a imóveis ou parte de imóveis e seu equipamento, destinados principalmente a tais recepções" e em Despesas de divertimento e de luxo”.

77.  Do que vem de ser  dito pode inferir-se que a desoneração do IVA suportado em despesas subsumíveis nas alíneas d) e e) do n.º 1 do art.º 21º do CIVA, é a excepção, ou seja, em principio, ela está incontornavelmente excluída ou afastada por aplicação daquele normativo e só é admitida na hipótese do redébito com vista à obtenção do seu reembolso, admitindo-se a sua desoneração a 100% e desde que cumpridos determinados formalismos; sendo ainda admitida a desoneração do IVA suportado para as hipóteses previstas nas alíneas d) e e) do n.º 2 do art.º 21.º do CIVA (que aqui não relevam).

78.  Foi recentemente prolatada decisão arbitral tirada no Processo n.º 709/2023-T. Na declaração de voto formulada na referida decisão arbitral diz-se: “[C]ompete agora fazer uma análise detalhada da jurisprudência existente, designadamente, temos o TJUE, que já se pronunciou sobre esta questão nos processos 513/2020-T e 425/2018- T, que para esse fim solicitaram o reenvio prejudicial, conforme de seguida, sumariamente, se elenca.” 

79.  No âmbito do citado Processo n.º 425/2018-T e por decisão de 7 de Agosto de 2019, foi enunciada a seguinte questão que foi submetida a reenvio prejudicial ao abrigo do art.º 267.º do Tratado de funcionamento da União Europeia: “(...) a apreciação da questão de saber se a Requerente tem direito à dedução integral do IVA incidente sobre serviços de catering que subcontratou a terceiros no âmbito das prestações de serviços de organização eventos promocionais que habitualmente realiza junto de clientes internacionais não residentes em território nacional, ao abrigo quer do disposto no artigo 21.º n.º 1 alínea d), quer do disposto no artigo 21.º, n.º 2, alínea c), ambos do Código do IVA.” Concretamente foi colocada ao TJUE a seguinte questão: “A correta interpretação da alínea a) do artigo 168.º e do artigo 176.º da Diretiva 2006/112/CE, do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, e dos princípios da neutralidade do IVA e da proporcionalidade, permitem que o legislador português, na alínea d) do n.º 1 e na alínea d) do n.º 2 do artigo 21.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de Dezembro, limite em 50% o direito à dedução do IVA suportado com despesas de alimentação, ainda que o sujeito passivo comprove que a totalidade de tais despesas foi integralmente afecta ao exercício da sua atividade económica tributada?” 

80.  Tal pedido de reenvio prejudicial, feito ao abrigo do art.º 267.º do TFUE, deu origem ao Processo n.º C-630/19, onde foi proferido, em conformidade com o art.º 99.º do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, despacho fundamentado, de 26 de Fevereiro de 2020, que pode ser lido in https://curia.europa.eu/juris/document/document.jsf?text=&docid=224104&pageIndex=0&doclang=PT&mode=lst&dir=&occ=first&part=1&cid=734823 .

81.  Nos pontos 20 a 38 do referido Despacho fundamentado, diz-se: “(...) 20 O órgão jurisdicional de reenvio pergunta ao Tribunal de Justiça, em substância, se o artigo 168.°, alínea a), e o artigo 176.° da Diretiva IVA devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal que, após a adesão do Estado‑Membro em causa à União Europeia, reduz o âmbito das despesas excluídas do direito à dedução do IVA, autorizando, em certas condições, uma dedução parcial do IVA que incide sobre tais despesas, entre as quais, nomeadamente, as relativas à alimentação, ainda que o sujeito passivo comprove que essas despesas foram integralmente afetas ao exercício da sua atividade económica tributável. 21 A este respeito, importa, em primeiro lugar, recordar que, segundo jurisprudência constante, o direito à dedução previsto no artigo 168.°, alínea a), da Diretiva IVA faz parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípio, ser limitado. É imediatamente exercido em relação à totalidade do IVA que tenha onerado as operações efetuadas a montante (v., nomeadamente, Acórdão de 2 de maio de 2019, Grupa Lotos, C‑225/18, EU:C:2019:349, n.º 25 e jurisprudência referida). 22 O regime das deduções visa, com efeito, desonerar inteiramente o empresário do encargo do IVA devido ou pago no âmbito de todas as suas atividades económicas. O sistema comum do IVA garante, assim, a neutralidade quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas, independentemente dos respetivos fins ou resultados, desde que essas atividades estejam elas próprias, em princípio, sujeitas ao IVA (Acórdão de 2 de maio de 2019, Grupa Lotos, C‑225/18, EU:C:2019:349, n.º 26 e jurisprudência referida). 23 Daqui resulta que, na medida em que o sujeito passivo, agindo nessa qualidade na data em que adquire um bem ou um serviço, utilize esse bem ou esse serviço para as necessidades das suas operações tributadas, está autorizado a deduzir o IVA devido ou pago em relação ao referido bem ou ao referido serviço (Acórdão de 2 de maio de 2019, Grupa Lotos, C‑225/18, EU:C:2019:349, n.º 27 e jurisprudência referida). 24 Em segundo lugar, resulta igualmente da jurisprudência que só são permitidas derrogações ao direito à dedução do IVA nos casos expressamente previstos nas disposições das diretivas que regem esse imposto (Acórdão de 2 de maio de 2019, Grupa Lotos, C‑225/18, EU:C:2019:349, n.º 28 e jurisprudência referida).25 Entre essas derrogações figura o artigo 176.°, segundo parágrafo, da Diretiva IVA, em substância idêntico ao artigo 17.°, n.º 6, segundo parágrafo, da Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme (JO 1977, L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54; a seguir «Sexta Diretiva»), e cuja adoção não teve incidência na jurisprudência relativa à interpretação desta última disposição (Acórdão de 2 de maio de 2019, Grupa Lotos, C‑225/18, EU:C:2019:349, n.º 29 e jurisprudência referida). 26 Tal como o artigo 17.°, n.º 6, segundo parágrafo, da Sexta Diretiva que o precedeu, o artigo 176.°, segundo parágrafo, da Diretiva IVA contém uma cláusula de standstill que prevê, nomeadamente, para os Estados que aderem à União, a manutenção das exclusões nacionais ao direito à dedução do IVA, que eram aplicáveis antes da data da respetiva adesão, até que o Conselho adote as disposições previstas no primeiro parágrafo desse artigo 176.°, o que, até à data, o Conselho ainda não fez (Acórdão de 2 de maio de 2019, Grupa Lotos, C‑225/18, EU:C:2019:349, n.º 30 e jurisprudência referida). 27 Em terceiro lugar, a competência residual dos Estados‑Membros para manter as exclusões nacionais ao direito à dedução do IVA, em aplicação do artigo 176.°, segundo parágrafo, da Diretiva IVA, não é, porém, absoluta. Foi neste sentido que o Tribunal de Justiça declarou que a cláusula de standstill não visa permitir a um novo Estado‑Membro alterar a sua legislação interna por ocasião da sua adesão à União, cujo efeito consista em alargar o âmbito das exclusões existentes, num sentido que afaste essa legislação dos objetivos da Diretiva IVA, o que seria contrário ao próprio espírito dessa cláusula (Acórdão de 2 de maio de 2019, Grupa Lotos, C‑225/18, EU:C:2019:349, n.º 31 e jurisprudência referida). 28 A situação já será diferente, como também declarou o Tribunal de Justiça no que respeita à interpretação do artigo 17.°, n.º 6, segundo parágrafo, da Sexta Diretiva, quando, depois da entrada em vigor da referida diretiva, a regulamentação de um Estado‑Membro reduza o âmbito das exclusões existentes, aproximando‑se dessa forma do objetivo desta diretiva. Nessa situação, o Tribunal de Justiça admitiu que essa regulamentação está coberta pela derrogação prevista no artigo 17.°, n.º 6, segundo parágrafo, da Sexta Diretiva (v., neste sentido, nomeadamente, Acórdãos de 14 de junho de 2001, Comissão/França, C‑345/99, EU:C:2001:334, n.º 22, e de 15 de abril de 2010, X Holding e Oracle Nederland, C‑538/08 e C‑33/09, EU:C:2010:192, n.º 67). 29 Em conformidade com o que foi recordado no n.º 25 no presente despacho, uma vez que a jurisprudência relativa à interpretação do artigo 17.°, n.º 6, segundo parágrafo, da Sexta Diretiva é pertinente para a interpretação do artigo 176.°, segundo parágrafo, da Diretiva IVA, há, portanto, que considerar que uma regulamentação de um Estado‑Membro que reduza o âmbito das exclusões que existiam em 1 de janeiro de 1979, ou, se esse Estado‑Membro aderiu à União após essa data, na data da sua adesão, está abrangida pela derrogação prevista no referido artigo. 30 Por outro lado, cabe aos órgãos jurisdicionais nacionais determinar o conteúdo da legislação nacional à data da adesão do Estado‑Membro em causa e averiguar se essa legislação teve por efeito alargar o âmbito de aplicação das exclusões existentes após a adesão (v., neste sentido, Acórdão de 2 de maio de 2019, Grupa Lotos, C‑225/18, EU:C:2019:349, n.º 33 e jurisprudência referida). 31 No caso em apreço, importa precisar, antes de mais, que, em conformidade com o artigo 395.° do Ato relativo às condições de adesão do Reino de Espanha e da República Portuguesa e às adaptações dos Tratados (JO 1985, L 302, p. 23), interpretado em conjugação com o anexo XXXVI do mesmo ato, a República Portuguesa, que aderiu às Comunidades Europeias em 1 de janeiro de 1986, pôde diferir até 1 de janeiro de 1989 a aplicação integral das regras que constituem o sistema comum do IVA (Acórdão de 8 de março de 2012, Comissão/Portugal, C‑524/10, EU:C:2012:129, n.º 13). 32 Em seguida, resulta dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça que, à data da adesão da República Portuguesa, o artigo 21.° do Código do IVA excluía do direito à respetiva dedução o imposto pago a montante que incidia sobre as despesas respeitantes à alimentação e que, na sequência de uma alteração do referido artigo, em 2005, o direito à dedução do IVA para este tipo de despesas foi admitido, em certas condições, até ao limite de 50 %. 33 Afigura‑se, assim, sob reserva de verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio, que, na sequência da alteração do artigo 21.° do Código do IVA, despesas que estavam totalmente excluídas do direito à dedução do IVA passaram a conferir, em certas condições, um direito à dedução parcial deste imposto. Por conseguinte, essa alteração, que reduz o âmbito das despesas excluídas deste direito à data da adesão da República Portuguesa à União, está abrangida pela cláusula de standstill prevista no artigo 176.°, segundo parágrafo, da Diretiva IVA (v., por analogia, Acórdão de 14 de junho de 2001, Comissão/França, C‑345/99, EU:C:2001:334, n.ºs 23 e 24). 34 Por último, importa ainda apreciar, em conformidade com a jurisprudência, se a legislação nacional em causa prevê de maneira suficientemente precisa a natureza e o objeto dos bens ou dos serviços para os quais fica excluído o direito à dedução do IVA, a fim de garantir que a faculdade concedida aos Estados‑Membros não sirva para prever exclusões gerais a esse regime (Acórdão de 2 de maio de 2019, Grupa Lotos, C‑225/18, EU:C:2019:349, n.º 40 e jurisprudência referida). 35 A este respeito, há que observar que, no Acórdão de 15 de abril de 2010, X Holding e Oracle Nederland (C‑538/08 e C‑33/09, EU:C:2010:192, n.ºs 50 e 51), o Tribunal de Justiça entendeu que categorias de despesas relativas ao fornecimento de refeições e de bebidas ao pessoal de um sujeito passivo assim como ao fornecimento de alojamento estavam definidas de forma suficientemente precisa, pelo que a exclusão do direito à dedução, prevista pelo direito nacional em causa nesse processo, estava abrangida pelo âmbito de aplicação da cláusula de standstill. 36 Além disso, no Acórdão de 2 de maio de 2019, Grupa Lotos (C‑225/18, EU:C:2019:349, n.º 42), o Tribunal de Justiça também considerou que a categoria de despesas relativa aos «serviços de alojamento e de restauração», na medida em que diz respeito à natureza dos referidos serviços, estava definida de forma suficientemente precisa na perspetiva das exigências estabelecidas pela jurisprudência. 37 À semelhança do que o Tribunal de Justiça declarou no Acórdão de 2 de maio de 2019, Grupa Lotos (C‑225/18, EU:C:2019:349), no processo principal, a categoria das despesas relativas à alimentação prevista no artigo 21.°, n.º 1, alínea d), e n.º 2, alínea d), do Código do IVA parece estar definida de forma suficientemente precisa na perspetiva das exigências estabelecidas pela jurisprudência. 38 Por outro lado, importa recordar que a circunstância, mencionada pelo órgão jurisdicional de reenvio, de as despesas incorridas pelo sujeito passivo poderem ser exclusivamente afetas ao exercício das suas atividades profissionais não prejudica o alcance da cláusula de standstill prevista no artigo 176.°, segundo parágrafo, da Diretiva IVA. Com efeito, atendendo à letra e à génese do referido artigo, esta cláusula autoriza os Estados‑Membros a excluir do direito à dedução do IVA categorias de despesas que têm caráter estritamente profissional, quando estas últimas estejam definidas de forma suficientemente precisa, na aceção da jurisprudência referida no n.º 34 do presente despacho (v., neste sentido, Acórdão de 2 de maio de 2019, Grupa Lotos, C‑225/18, EU:C:2019:349, n.ºs 47 e 48).”

82.  Termos em que o TJUE declarou: “O artigo 168.°, alínea a), e o artigo 176.° da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a uma legislação nacional que, após a adesão do Estado‑Membro em causa à União Europeia, reduz o âmbito das despesas excluídas do direito à dedução do imposto sobre o valor acrescentado, autorizando, em certas condições, uma dedução parcial do imposto sobre o valor acrescentado que incide sobre tais despesas, entre as quais, nomeadamente, as relativas à alimentação, ainda que o sujeito passivo comprove que essas despesas foram integralmente afetas ao exercício da sua atividade económica tributável.”

83.  Tal como se diz na declaração de voto que está junta à decisão arbitral tirada no Processo n.º 709/2023-T e que aqui vimos seguindo de perto, na Decisão Arbitral proferida no citado Processo n.º 425/2018-T, decidiu-se o seguinte: “Como vimos, feito o reenvio prejudicial veio o TJUE entender, realizada que foi uma digressão pela jurisprudência do TJUE bem como uma incursão temporal pelas regras do nosso CIVA nos termos enunciados supra, que o artigo 168.º, alínea a), e o artigo 176.º da Diretiva IVA devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a uma legislação nacional que, após a adesão do Estado-Membro em causa à União Europeia, reduz o âmbito das despesas excluídas do direito à dedução do imposto sobre o valor acrescentado, autorizando, em certas condições, uma dedução parcial do imposto sobre o valor acrescentado que incide sobre tais despesas, entre as quais, nomeadamente, as relativas à alimentação, ainda que o sujeito passivo comprove que essas despesas foram integralmente afetas ao exercício da sua atividade económica tributável.” 

84.  Ademais e no âmbito do citado Processo n.º 513/2020-T, por decisão de 8 de Julho de 2021, foi enunciada a seguinte questão que foi submetida a reenvio prejudicial ao abrigo do art.º 267.º do Tratado de funcionamento da União Europeia: “[O] princípio da equivalência opõe-se a uma regulamentação nacional em sede de IVA como a prevista no artigo 21.º, n.º 1, do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA), mantida ao abrigo da cláusula stand still, que prevê exclusão total ou em 50% do direito à dedução do IVA suportado com despesas relativas a viaturas, despesas de deslocação e estadia e despesas de representação, relativamente às quais se admite, em sede de imposto sobre o rendimento, a relevância total como gastos (sem prejuízo de controle a posteriori e sujeição a condições) ou, através de imposição de tributações autónomas, se admite uma dedutibilidade real como gastos em percentagem maior do que 50%?”

85.  Tal pedido de reenvio prejudicial, feito ao abrigo do art.º 267.º do TFUE, deu origem ao Processo n.º C-459/21, onde foi proferido, em conformidade com o art.º 99.º do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, despacho fundamentado de 9 de Dezembro de 2022, que pode ser lido in https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX:62021CO0459 .

86.  O TJUE decidiu que o artigo 21.º, n.º 1, do CIVA não é incompatível com o princípio da equivalência. Na fundamentação deste Acórdão, processo C‐459/21, cujo teor se dá como reproduzido, refere-se, além do mais, o seguinte: “24 As requerentes no processo principal alegam que tais despesas beneficiam de um regime pretensamente mais favorável, quanto à sua dedutibilidade, no âmbito de um imposto direto regulado pelo direito nacional, a saber, o IRC. A este respeito, consideram que o legislador nacional deveria alinhar o mecanismo do direito à dedução vigente em matéria de IVA com o previsto para a dedutibilidade de despesas em sede de IRC, sob pena de violação do princípio da equivalência. 25 Não se pode deixar de observar que esta argumentação assenta numa compreensão errada do alcance do princípio da equivalência. 26 Com efeito, por um lado, o alcance do direito à dedução do IVA suportado a montante é, como o Governo português e a Comissão salientaram com razão nas suas observações escritas, uma questão de ordem material. Não se trata de uma modalidade processual de uma ação destinada a assegurar a salvaguarda de direitos conferidos às requerentes no processo principal pelo direito da União. 27 A este respeito, a interpretação do princípio da equivalência sugerida pelas requerentes no processo principal teria por efeito desvirtuar o alcance deste princípio. Com efeito, se tal interpretação fosse acolhida, haveria o risco de o âmbito de aplicação do referido princípio ser alargado a qualquer questão de ordem material como, em matéria fiscal, a fixação da taxa de IVA. Ora, essa extensão iria além da finalidade prosseguida pelo mesmo princípio, a saber, o enquadramento da autonomia processual dos Estados-Membros. 28 Por outro lado, contrariamente ao que defendem, em substância, as requerentes no processo principal, o mecanismo do direito à dedução do IVA e o regime de dedutibilidade de despesas em sede de um imposto direto, como o IRC, não são comparáveis para efeitos da aplicação do princípio da equivalência. 29 Com efeito, um imposto indireto como o IVA e um imposto direto como o IRC revestem uma natureza fundamentalmente diferente. 30 Além disso, o mecanismo de dedutibilidade, nestas duas formas de imposto, não é comparável e não tem um objeto e uma causa de pedir semelhantes na aceção da jurisprudência recordada no n.º 20 do presente despacho. Com efeito, embora seja certo que o mecanismo instituído pelo artigo 168.° da Diretiva IVA assenta na dedução do imposto suportado a montante com as despesas referidas nesta disposição, a dedutibilidade em sede de imposto direto pressupõe a dedução dessas despesas, enquanto tais, para efeitos do cálculo do lucro tributável. 31 Por conseguinte, há que responder à questão submetida que o princípio da equivalência deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma regulamentação nacional, mantida ao abrigo do disposto no artigo 176.°, segundo parágrafo, da Diretiva IVA, e que institui uma exclusão total ou parcial do direito à dedução do IVA suportado com despesas relativas a determinados veículos, a deslocações e a estadias, bem como com despesas de representação, mesmo no caso de essas despesas beneficiarem de um regime pretensamente mais favorável, quanto à sua dedutibilidade, no âmbito de um imposto direto regulado pelo direito nacional.”

87.  O Tribunal de Justiça da União Europeia pronunciou-se sobre a questão colocada, declarando o seguinte: “O princípio da equivalência deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma regulamentação nacional, mantida ao abrigo do disposto no artigo 176.°, segundo parágrafo, da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, e que institui uma exclusão total ou parcial do direito à dedução do IVA suportado com despesas relativas a determinados veículos, deslocações e a estadias, bem como com despesas de representação, mesmo no caso de essas despesas beneficiarem de um regime pretensamente mais favorável, quanto à sua dedutibilidade, no âmbito de um imposto direto regulado pelo direito nacional.”

88.  Devidamente sopesadas as decisões de reenvio supra melhor identificadas e que estão referidas na declaração de voto acima referida (e igualmente aqui trazida à colação) e que aqui se repristinam[5], o Tribunal Arbitral Singular não pode deixar de as acompanhar, louvando-se, aliás, nelas (e ainda na decisão do TJUE, consubstanciada no despacho fundamentado datado de 17.09.2020, proferido no processo C-837/19, caso Super Bock Bebidas e que veio na sequência de reenvio prejudicial suscitado no Processo n.º 207/2019-T acima sobejamente transcrita) para defender no sentido de que as exclusões (ou limitações) do direito à dedução, previstas no artigo 21.º do CIVA, não violam o direito comunitário e aplicam-se, mesmo que, no caso, se demonstre que a totalidade de tais despesas foi integralmente afecta ao exercício da sua atividade económica tributada. 

89.  Não é o simples facto de os serviços de receção ou até das despesas de divertimento e luxo se terem destinado ou terem sido utilizados(as) para a realização de operações tributáveis, que justifica, ipso facto, a dedutibilidade do IVA suportado e contido nas faturas que titulam a incorrência de tais custos. Este entendimento (de que a mera afetação a operações tributáveis não basta para legitimar a dedução) vem sendo reafirmado pelo TJUE sublinhando que certas categorias de despesa, pela sua natureza, podem ser automaticamente excluídas da dedução, mesmo quando ligadas à atividade da empresa. É, por isso, a classificação da despesa que prevalece sobre a sua alegada utilização.

90.  Não devendo olvidar-se que as decisões do TJUE constituem fonte de direito imediata, logrando-se, com isso, a desejável uniformidade e harmonização na aplicação do direito comunitário no espaço físico da união europeia. 

91.  E também que a jurisprudência do TJUE (aqui chamada à colação) não pode deixar de beneficiar do chamado “precedente vinculativo” na medida em que vincula todos os tribunais nacionais dos Estados-membros tal como resulta do acórdão do TJUE de 15 de Julho de 1964, Pº Costa/Enel – 6/64, disponível in https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:61964CJ0006&from=NL  . 

92.  E ainda da vigência do princípio da interpretação conforme com o direito da União, que decorre da interpretação que o TJUE faz das disposições conjugadas dos artigos 4.º, n.º 3 do TUE e 288.º, n.º 3 do TFUE. 

93.  Tal princípio impõe que o intérprete ou aplicador do direito nacional atribua às disposições nacionais um sentido conforme ou compatível com as disposições do direito da União. E quanto ao sentido e alcance deste princípio, no acórdão Von Colson[6], o TJUE entendeu que a obrigação de interpretação da norma nacional que transpõe uma diretiva, em conformidade com o texto e objetivo daquela, obriga o juiz nacional a dar prioridade ao método – de entre os métodos de interpretação permitidos pela ordem jurídica interna – que lhe permita atribuir à disposição nacional em causa uma interpretação compatível com a Directiva. 

94.  Assim, na análise da questão sub judicio, não pode este Tribunal Arbitral Singular deixar de sopesar convenientemente o quadro jurisprudencial do TJUE e do CAAD e ainda do STA acima traçado. 

95.  A questão central nos presentes autos é a de saber se há (ou não) dedução indevida do IVA sobre os serviços ditos “acessórios”. 

96.  Neste ponto, a AT sustenta que os “serviços acessórios” titulados nas faturas da B..., S.A. se reconduzem a despesas abrangidas pelas alíneas c) a e) do artigo 21.º, n.º 1 do CIVA.

97.  É certo que a AT não indica concretamente qual das alíneas previstas no n.º 1 do art.º 21.º do CIVA se deve aplicar, aludindo, genericamente, às alíneas c), d) ou e) daquele normativo. 

98.  Por outro lado, também não identifica nem descreve os serviços acessórios.

99.  Presume, sem o demonstrar (adiante cuidar-se-á de saber se essa demonstração cabia à AT ou à Requerente), que esses 20% são despesas de receção, luxo ou divertimento.

100.                E partindo daqui quer excluir parte da dedução com base no referido na Circular n.º 20/2009. A propósito da invocação da referida circular, diga-se que as circulares são meramente orientações internas da AT e não vinculam nem a Requerente nem os tribunais. Têm, na hierarquia normativa, valor meramente interpretativo e interno. Não podem, por si, criar obrigações ou alterar pactos privados. A AT não pode simplesmente invocar uma Circular para “preencher” lacunas contratuais da Requerente ou para impor um critério de repartição de encargos não acordado.

101.                É certo que o contribuinte tem o ónus da prova dos factos constitutivos do direito à dedução, nos termos e em conformidade com o disposto no artigo 74.º da LGT. 

102.                Contudo, a Requerente, in casu, juntou os contratos e as faturas que titulam as despesas, com descrição do respetivo objeto (parceria publicitária), e prestou esclarecimentos sobre a natureza dos serviços adquiridos.

103.                Assim, a Requerente cumpriu o seu dever inicial de colaboração e produziu os meios de prova do direito à dedução. 

104.                E uma vez cumprido este ónus inicial, competiria, em princípio, à AT (cuidaremos adiante de tratar a questão de saber em que termos a AT estava adstrita a tal obrigação), enquanto entidade que corrige e restringe o direito à dedução, demonstrar que o IVA suportado respeita a despesas efetivamente excluídas, identificando-as e enquadrando-as nas alíneas do artigo 21.º do CIVA. Essa exigência decorre diretamente do disposto no artigo 77.º da LGT (dever de fundamentação); do princípio do inquisitório (art.º 58.º da LGT); e do n.º 2 do  artigo 266.º da CRP, que impõe à Administração Pública atuar com base na legalidade e na verdade material. 

105.                Isto dito, meridianamente se conclui que o simples argumento de que “o ónus da prova recai sobre a Requerente” não era suficiente para justificar uma correção que a AT tinha de fundamentar técnica e factualmente.

106.                A Requerida invoca a Decisão arbitral prolatada no Processo n.º 1059/2024-T, onde se afirma que, nestes casos, o ónus da prova impende sobre o contribuinte, sendo que, do ponto de vista deste Tribunal, esse entendimento não exclui a obrigação da AT de justificar as suas correções com base em factos concretos e demonstrados, ou seja, o ónus da prova que em matéria do direito à dedução impende sobre o contribuinte, não autoriza a AT a fazer correções de forma arbitraria sem fundamentação clara, sobretudo quando a AT altera unilateralmente a qualificação das despesas (como in casu), já que, para a Requerente são despesas (acessórias) que devem seguir a natureza da operação principal (marcadamente publicitária), enquanto que, para a Requerida, são despesas autónomas que se subsumem nas exclusões e limitações previstas no art.º 21º do CIVA.

107.                A Requerida invoca ainda o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA) de 15-11-2017, proc. n.º 0485/17, para sustentar que o ónus da prova do direito à dedução do IVA recai sobre o sujeito passivo (aqui, a Requerente). O acórdão citado estabelece o seguinte: "É sobre o sujeito passivo que impende o ónus da prova dos factos constitutivos do direito à dedução do IVA, designadamente que os bens ou serviços adquiridos foram utilizados nas suas operações tributáveis." Este entendimento não é controverso, trata-se, aliás, de jurisprudência estável e donde se retira que o sujeito passivo deve demonstrar que adquiriu bens ou serviços no interesse da sua atividade tributável. Para isso, deve apresentar faturas, contratos, documentos de suporte, e eventualmente esclarecer a utilização dos bens ou serviços.

108.                Tal ónus que impende sobre o contribuinte tem limites e não exonera a AT das suas obrigações, ou seja, o cumprimento pelo contribuinte do seu ónus inicial (apresentação de faturas e contratos que titulam os serviços) não autoriza a AT a rejeitar a dedução sem fundamento claro. Quando a AT requalifica parcialmente uma despesa como “acessória” e excluída do direito à dedução, está a invocar factos modificativos ou impeditivos e sobre ela passa a recair também um ónus de contraprova, conforme se intui do disposto no n.º 2 do artigo 74.º da LGT.

109.                Nos termos do artigo 74.º, n.º 1 da LGT, é sobre a Requerente que recai o ónus da prova dos factos constitutivos do seu direito à dedução, ou seja, a demonstração de que os bens e serviços adquiridos foram efetivamente utilizados no âmbito da sua atividade económica, e nas suas operações tributáveis.

110.                Tal obrigação inclui não apenas a apresentação de faturas formalmente válidas, mas também a demonstração de que as despesas não se subsumem, pela sua natureza ou utilização, nas categorias de exclusão previstas no artigo 21.º do CIVA, nomeadamente nas alíneas d) e e) do n.º 1. Ou seja, a Requerente tem de provar, de forma positiva, que os “serviços acessórios” alegadamente adquiridos no âmbito de uma parceria publicitária não são, na realidade, despesas de receção, luxo ou divertimento.

111.                A jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem reiteradamente confirmado este entendimento. No Acórdão de 15.11.2017 (proc. n.º 0485/17), o STA deixou expresso que “cabe ao sujeito passivo demonstrar que os bens ou serviços adquiridos foram utilizados nas suas operações tributáveis, para efeitos do direito à dedução do IVA.”.

112.                Ainda assim, e sem prejuízo do ónus principal recair sobre a Requerente, a AT, enquanto entidade que promove a exclusão do direito à dedução com base em determinadas qualificações jurídicas (v.g., consideração de determinada despesa como “despesa de divertimento”), tem igualmente o dever de fundamentar as suas correções de forma clara e suficientemente concreta, nos termos do artigo 77.º da LGT. Este dever não inverte o ónus da prova, mas complementa o princípio da legalidade e da verdade material, previsto no artigo 266.º da CRP e no artigo 58.º da LGT.

113.                Assim, embora a AT esteja obrigada a fundamentar as suas decisões nos termos do artigo 77.º da LGT, não lhe cabia, no presente caso, provar que os serviços em causa constituíam despesas de receção, luxo ou divertimento. Essa prova incumbia à Requerente, enquanto sujeito passivo que pretendeu exercer o direito à dedução, demonstrando que os denominados “serviços acessórios” estavam integrados numa operação publicitária, sem finalidade recreativa ou uso particular. 

114.                Não tendo logrado fazê-lo, falhou no cumprimento do ónus probatório que sobre si recaía.

115.                Assim, embora recaia sobre a Requerente a prova da afetação das despesas à sua atividade tributada, não se exige à AT que prove de forma positiva que as despesas se enquadram nas alíneas impeditivas do artigo 21.º do CIVA, bastando que, à luz do seu conteúdo descritivo e da natureza dos serviços, as possa qualificar como potencialmente incluídas nas exclusões legais. 

116.                A invocação da Circular 20/2009 ou a menção a “serviços acessórios” na fatura, conjugadas com a ausência de prova bastante por parte da Requerente quanto à sua funcionalidade publicitária, são suficientes, in casu, para legitimar a correção efetuada."

117.                No presente caso, a Requerente apresentou contrato com a B..., S.A. e faturas titulando uma “parceria publicitária”. A AT aceita que parte do serviço é publicidade e dedutível, mas aceita, em função do descritivo da fatura que 10% dos serviços prestados são “serviços acessórios”, reformulando essa percentagem para 20%, por aplicação da Circular n.º 20/2009 e fundada no teor das faturas que estão a titular os serviços aqui em causa e ainda no conteúdo do contrato com a B..., S.A.. A cláusula 3.ª do contrato indica que a Requerente recebe serviços de publicidade e promoção de imagem. A cláusula 4.ª faz referência a serviços de hospitalidade, bilhética e merchandising, que a AT qualifica como “acessórios”.

118.                O contrato trata os serviços como um "pacote" único e finalisticamente publicitário. Mesmo que o contrato discrimine diferentes componentes da prestação (ex: bilhetes, merchandising, hospitalidade), pode colocar-se a questão de saber se tais componentes do serviço contratado são autónomos do ponto de vista do IVA. Não devendo olvidar-se a trazida à discussão pela Requerente jurisprudência do TJUE, especialmente o acórdão C-572/07 (Tellmer Property) que a dado passo refere: “Uma prestação deve ser considerada acessória de uma principal quando não constitui para o cliente um fim em si mesma, mas um meio de beneficiar nas melhores condições da prestação principal.”

119.                O que importa avaliar in casu é saber se a Requerente pretende bilhetes, serviços de receção com alimentação e bebidas ou merchandising como um fim em si mesmo, ou se, ao invés, pretende, tão-só, associar a sua imagem à do clube, no quadro de uma estratégia publicitária global, recebendo os serviços referidos como meramente acessórios e sem autonomia de per se, na medida em que o acesso a bilhética, merchandising ou hospitalidade faz parte do “ambiente de patrocínio”, sem autonomia económica nem intenção de uso pessoal. E, a ser assim, não se trata de uma aquisição de bilhetes para uso recreativo, mas de um instrumento de promoção institucional e relacional, que é marcadamente publicitário.

120.                Emergindo assim como foros de elevada importância a questão de saber se aqui os bilhetes foram usados pelos sócios da empresa para seu próprio lazer; se o merchandising foi oferecido como brindes não relacionados com atividade comercial; se hospitalidade visou fins de recreação e não de promoção empresarial.

121.                Não podendo o Tribunal ignorar que a jurisprudência arbitral e do TJUE protege uma visão funcional da publicidade: tanto a jurisprudência do TJUE como várias decisões arbitrais (v.g., por todos, o Processo n.º 52/2018-T) têm acolhido a ideia de que a dedução de IVA é legítima sempre que as despesas estejam ligadas à atividade tributada e à promoção da imagem da empresa, ainda que envolvam serviços "mistos", salvo, claro está, prova clara de desvio ou consumo particular.

122.                Não basta a mera invocação da Circular e o teor contratual para se sustentar que o IVA ligado à parte acessória da prestação de serviços está automaticamente excluído direito à dedução. Exige-se mais: a prova concreta de que tal componente acessória do serviço em causa se reconduz, de facto, a despesas abrangidas pelas alíneas d) ou e) do artigo 21.º/1 do CIVA.

123.                É preciso provar (ou retirar da falta de prova as respetivas consequências) o uso pessoal ou não empresarial das prestações de serviços acessórias. Mesmo que os serviços de hospitalidade, bilhética e merchandising sejam descritos no contrato (cláusula 4.ª), isso não prova, ipso facto, que essas despesas visem finalidades recreativas ou de luxo, ou que configurem consumos privados. É necessária a demonstração de que: i) os bilhetes foram usados para fins de lazer dos sócios, e não como parte de um plano de hospitalidade empresarial ou de marketing; ii) os produtos de merchandising não foram usados para promoção institucional (ex: brindes a clientes ou parceiros); iii)os serviços de receção ou hospitalidade não estavam integrados numa lógica de promoção de imagem ou ativação de marca. Essa demonstração factual é essencial, e veremos adiante se recai sobre a AT, ou se, ao invés, é sobre a Requerente que impende esse ónus. 

124.                Na sua Resposta, a Requerida defende que basta observar a descrição das faturas para se retirar dela que a componente acessória dos serviços aqui em causa pode subsumir-se nas alíneas d) e e) do n.º 1 do art.º 21º do CIVA. A Requerida centra-se na valorização do conteúdo das faturas, enfocando o dever de diligência que impendia sobre a Requerente na verificação da conformidade das mesmas e invocando jurisprudência sobre o valor probatório das faturas. Para a Requerida, impende sobre o contribuinte (neste caso a Requerente) um dever de diligência que se consubstancia como segue: i) O artigo 29.º, n.º 1, alínea b), e o artigo 36.º do CIVA obrigam o sujeito passivo a verificar se as faturas estão corretas, já que servem de base à dedução do IVA; ii) O contribuinte tem o dever de exigir faturas completas e conformes à realidade, e pode até ser penalizado se aceitar faturas com erros grosseiros ou omissões relevantes. 

125.                Nesse sentido, advoga a Requerida que se as faturas indicavam que 10% dos serviços são “acessórios nos termos do n.º 6 da Circular n.º 20/2009”, então, a Requerente devia ter-se oposto a essa qualificação no momento da receção e registo das faturas, caso as considerasse incorretas.

126.                O Tribunal acolhe esta posição da Requerida já que é legítimo exigir ao sujeito passivo um grau mínimo de atenção e conformidade documental. 

127.                É certo, no entanto, que as faturas não têm força vinculativa probatória absoluta. 

128.                Não pode aceitar-se que tudo o que consta na fatura vincula o contribuinte para efeitos fiscais, mesmo que a mesma tenha sido emitida por terceiro (in casu, a B..., S.A.) e contenha expressamente referida uma qualificação jurídica consubstanciada na expressão “serviços acessórios nos termos da Circular 20/2009”

129.                Não obstante e ainda assim, o conteúdo da fatura não é vinculativo nem infalível do ponto de vista jurídico, não podendo olvidar-se que descritivo comercial pode conter classificações subjetivas ou automatismos de faturação.

130.                O Tribunal entende que o conteúdo da fatura pode ser impugnado, corrigido ou interpretado à luz do contrato e da realidade económica que conforma a operação. 

131.                A AT estava obrigada a analisar a realidade económica que conformava a prestação em causa, especialmente quando o contribuinte apresenta elementos contratuais e justificações que põem em causa a descrição sumária constante das faturas aqui em causa. 

132.                A AT parece sustentar que a simples remissão da fatura para o “n.º 6 da Circular 20/2009” basta para enquadrar os serviços como despesas excluídas do direito à dedução (art.º 21.º CIVA). 

133.                A tal propósito o Tribunal considera que isso é juridicamente insustentável, já que: i) a Circular não tem valor normativo, i.e., vincula apenas a AT, não os contribuintes ou tribunais; ii)  a fatura não identifica, em termos do descritivo, o conteúdo concreto dos “serviços acessórios”, nem justifica porque é que 10% se reportam a esses e não a publicidade; iii) a Circular serve de ponto de partida interpretativo interno, mas não substitui o dever da AT de demonstrar que os serviços se enquadram nas alíneas d) ou e) do art.º 21.º do CIVA.

134.                Mesmo aceitando-se que a Requerente podia (e talvez devesse) ter contestado as faturas quando recebidas, isso não obstava a que o fizesse em sede procedimental ou até nesta sede, conquanto lograsse demonstrar que a natureza das despesas aqui em causa é iminentemente publicitária, provando ainda que os elementos acessórios da prestação, encarada como um todo unitário, não são um fim em si mesmos, mas apenas instrumentos de ativação da marca e visibilidade comercial. Invocando, como aliás faz, jurisprudência do TJUE naquele sentido, mais concretamente o Acórdão prolatado no âmbito do Processo C-572/07, onde se determina que prestações não independentes da principal devem seguir o regime fiscal desta.

135.                Isto dito se conclui que mesmo que o descritivo da fatura esteja mal formulado ou remeta para uma Circular, isso não basta para a AT excluir o direito à dedução, sem que se faça prova adicional do desvio de finalidade.

136.                Na sua Resposta, a AT dá um especial enfoque às tensões reais que existem nesta matéria entre o direito à dedução do IVA e as exclusões previstas no artigo 21.º do CIVA: i) Sustenta, apoiada em jurisprudência do TJUE que identifica, a finalidade anti-abuso do artigo 21.º do CIVA; ii) Defende que a interpretação do TJUE valida a incontornável compatibilidade dessa norma com o direito comunitário, inclusive com referência ao processo C-630/19; iii) Dá nota de que a jurisprudência arbitral e até a nacional, em determinados contextos, rejeita o direito à dedução mesmo quando a despesa tem conexão com a atividade empresarial.

137.                Tal como se explicitou acima, o artigo 21.º do CIVA exclui a possibilidade de desoneração do IVA suportado relativamente às operações ali previstas independentemente da sua finalidade empresarial ou de, essas despesas, se poderem desviar para consumos privados e apartados do interesse societário. Tal norma que tem um caráter objetivo e restritivo, está pensada para evitar deduções em despesas de uso misto ou de difícil controlo. Visa impedir abusos ou fraudes, ao excluir automaticamente certas categorias, como sejam, v.g., despesas de receção, refeições, alojamento, divertimento, luxo. Como sobejamente acima se deu nota (o que aqui se deve considerar repristinado), refere o TJUE que tais exclusões e limitações do direito à dedução em sede de IVA não violam o direito comunitário, e não é necessário que o legislador nacional admita/permita prova em contrário no sentido oposto, ou seja, se a despesa se insere, de forma clara e direta, numa das categorias do art.º 21.º/1 do CIVA, então o direito à dedução fica, de facto, excluído, mesmo que o bem ou serviço adquirido e relativamente ao qual foi suportado IVA que se pretendia dedutível, seja usado na atividade da empresa, ou seja, mesmo que tais inputs tivessem demonstradas finalidades empresariais.

138.                É verdade que a norma é objetiva, mas exige um prévio enquadramento fáctico: é preciso demonstrar com clareza que a despesa corresponde, de facto, a "despesas de receção", ou "de luxo", de “divertimento”, ou de "alojamento", etc.. 

139.                Também é certo que a referência nas faturas à Circular 20/2009 não basta.

140.                Por outro lado, o contrato menciona a bilhética, a hospitalidade e o merchandising, mas é precisa a demonstração de que essa parte da prestação de serviços aqui em causa tenha sido usada com finalidade recreativa ou com desvio para consumos privados.

141.                A Requerente alega, aliás, com apoio jurisprudencial, que tudo integra um pacote publicitário, o que, se for verdadeiro, afasta a exclusão automática. Mesmo reconhecendo que o art.º 21.º pode excluir certas deduções de forma objetiva, sustenta que o direito à dedução deve refletir a realidade económica, e que o critério determinante é se a despesa tem conexão direta com a atividade tributável. Além disso, como o próprio TJUE determinou no processo C-572/07 (Tellmer Property) quando um serviço “acessório” não tem autonomia funcional nem é um fim em si mesmo para o adquirente, não pode ser separado da prestação principal e deve seguir o mesmo regime fiscal, o que, in casu, seria o da publicidade. A posição da Requerente parece sustentar que a realidade económica da operação (aqui aparentemente publicitária) pode justificar a dedução integral, se os “serviços acessórios” forem meios para atingir um fim publicitário (não fins em si mesmos).

142.                Há elementos probatórios nos autos que favorecem a posição da Requerente e apontam para a finalidade publicitária unitária das prestações de serviços aqui em causa. 

143.                Atentando-se ao objeto do contrato celebrado com a B..., S.A., concretamente para a sua clausula principal, sai meridianamente claro que estamos perante uma parceria publicitária no âmbito do “...”. A Requerente obteve o estatuto de “Premium Partner”, o que em si mesmo é um instrumento de promoção institucional e de associação de imagem daquela ao clube. As cláusulas 3.ª e 4.ª do contrato descrevem: i) Serviços principais - publicidade e promoção de imagem; ii) Serviços acessórios - a bilhética, a hospitalidade, e o merchandising. A Requerente argumenta que estes últimos não são um fim em si mesmos, mas um meio de reforçar a visibilidade da marca — por exemplo, através da receção de parceiros comerciais num camarote, oferta de brindes personalizados, etc. A Requerente invoca corretamente a jurisprudência do TJUE (C-572/07), que determina que prestações acessórias que não constituem fins autónomos devem seguir o regime da prestação principal. Também invoca que não houve utilização particular dos bens ou serviços (ex: uso recreativo dos bilhetes pelos sócios ou gerentes), pelo que não há desvio de finalidade.

144.                No entanto, entende o Tribunal que a prova produzida pela Requerente enferma de relevantes limitações. Não há nos autos demonstração de como os "serviços acessórios" foram concretamente utilizados.  A Requerente não apresentou, v.g., listagem de convidados para eventos de hospitalidade; justificação dos bilhetes como parte de ações de marketing; faturas ou campanhas relacionadas com distribuição de merchandising como brindes de carácter empresarial, etc..

145.                Por outro lado, a Requerente faz uma aceitação silenciosa das faturas com referência à Circular 20/2009 e ao valor percentual de 10%, não as rejeitando. 

146.                A Requerida sublinha, com toda a pertinência, que a Requerente aceitou faturas com a menção de “10% de serviços acessórios” sem as contestar na altura, o que, do ponto de vista deste Tribunal Arbitral Singular, não pode deixar de fragilizar a sua posição, mesmo que isso não seja, como visto, absolutamente determinante.

147.                Esta ausência de reação no momento oportuno traduz-se, para o Tribunal, num comportamento revelador de falta de diligência na verificação da conformidade documental, e afasta a ideia de um erro grosseiro praticado nas faturas que, caso existisse, deveria ter motivado um pedido de retificação imediato. 

148.                Pesa-embora tal silêncio não faça prova plena, reduz a credibilidade da posição posterior assumida em sede de reclamação graciosa e impugnação.

149.                Ademais, não há evidência de ter sido produzida prova, nem em sede inspetiva ou graciosa, nem mesmo nos presentes autos, sobre o caráter publicitário dos chamados serviços "acessórios", ou seja, a Requerente reage, mas não parece ter sido proativa na demonstração da instrumentalidade económica dessas despesas, tal como se exigia tendo em vista atacar as pretensões corretivas da AT.

150.                Na apreciação que o Tribunal faz, a Requerente construiu uma narrativa plausível e juridicamente fundamentada de que a globalidade da despesa visa uma finalidade publicitária unitária, mas, para ser totalmente convincente e afrontar o enquadramento da AT, faltam-lhe elementos documentais ou factuais concretos que permitissem demonstrar como os "serviços acessórios" foram efetivamente integrados na promoção da imagem da empresa.

151.                A Requerida, na sua Resposta, traz à colação o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 21.12.2016, proferido no âmbito do Processo n.º 01517/08.4BEBRG que transcreve abundantemente, o que aqui se deve considerar reiterado. Com respaldo na referida decisão, a posição da Requerida apresenta: i) Um enquadramento jurisprudencial sólido (TCA Norte, 21.12.2016 e que pode ser lido inhttps://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/fad657e2c585aeb5802580c10054f0f7?OpenDocument&Highlight=0,01517%2F08.4BEBRG); ii) Uma base doutrinal interna clara e sistematizada(Circular n.º 20/2009); iii) um raciocínio proporcional entre a finalidade da norma e a limitação do direito à dedução, com apelo à luta contra a evasão fiscal. Não obstante, no plano prático e legal, é ainda necessária a demonstração, no concreto, que os serviços adquiridos se enquadram nos “acessórios” ali descritos, e que a sua exclusão da dedução é proporcional, necessária e juridicamente fundamentada.

152.                É juridicamente relevante na argumentação da Requerida que as alíneas d) e e) do n.º 1 do art.º 21.º do CIVA estão conformes com o Direito da EU. O TJUE já o confirmou tal como vimos acima e para onde se remete. A exclusão objetiva de certas categorias de despesas, mesmo que ligadas à atividade empresarial, é compatível com o princípio da neutralidade do IVA, desde que tenha fundamento anti-abuso. Por outro lado, a Circular 20/2009 tem uma lógica interna coerente, i.e., distingue entre serviços “principais” (publicidade/promoção) e serviços “acessórios” (bilhética, catering, hospitalidade, etc.). Estabelece percentagens orientadoras (80%/20%) que não são cegas, mas indicativas e aceitáveis se compatíveis com a realidade dos serviços prestados. A jurisprudência nacional já aceitou a aplicação deste entendimento. O Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 21.12.2016, proferido no âmbito do Processo n.º 01517/08.4BEBRG, mostra que, na ausência de elementos que permitam autonomizar com rigor as componentes do contrato, a aplicação dos critérios da Circular pode ser admissível, por razões de proporcionalidade e simplicidade fiscal.

153.                No entendimento deste Tribunal, na prática, muitos destes “pacotes publicitários” servem essencialmente para proporcionar hospitalidade recreativa e acesso privilegiado a jogos de futebol, num modelo que, na fronteira entre marketing e lazer, gera justamente as tensões que o artigo 21.º do CIVA visa regular. No terreno, sabemos que muitos destes contratos com SAD´s ou clubes servem para Proporcionar camarotes a clientes ou parceiros; para oferecer bilhetes, catering e merchandising como brindes; e reforçar relações comerciais num ambiente informal. Não custa reconhecer que isso pode ter um valor estratégico para as empresas, mas também é o tipo de despesa que o legislador quis controlar com as normas anti-abuso previstas nas alíneas d) e e) do n.º 1 do art.º 21.º do CIVA, por serem de difícil fiscalização e facilmente desviáveis para consumos particulares.

154.                Não obstante, o emergir de dúvidas sobre a dedutibilidade do IVA não basta por si para liminarmente se excluir o direito à dedução que é um pilar fundamental do mecanismo de funcionamento do imposto. 

155.                A dúvida legítima sobre a adequação da desoneração in casu, não pode ser respondida apenas com a aparência ou com base em presunções. Tem de haver prova concreta de desvio de finalidade. Não se pode negar a dedução de IVA apenas porque a despesa poderia ser usada para fins privados. É necessário demonstrar que foi.

156.                No entendimento deste Tribunal se uma determinada empresa convida clientes, parceiros ou fornecedorespara estarem presente num jogo de futebol com o fito de se reforçarem relações comerciais ou para ativação da marca, isso não pode deixar de ser considerado marketing institucional e já a desoneração do IVA suportado na aquisição dessas prestações é inquestionável. Noutra perspetiva, se se comprovar que os bilhetes foram usados por sócios da empresa, por familiares ou amigos, meramente para fins recreativos, então, a exclusão da dedução é válida.

157.                A dedução é possível se a finalidade principal do contrato for publicitária (v.g., associação de marca à imagem do clube) e se os serviços “acessórios” forem instrumentos dessa finalidade (v.g., receção de clientes, promoção institucional). É ainda necessária a ausência de prova de uso recreativo ou particular dos serviços incluídos. Dito de outro modo: a exclusão da dedução só é legítima se houver prova concreta de que os serviços foram usados com finalidade pessoal, recreativa ou de luxo, e não como parte de uma estratégia de marketing empresarial.

158.                A Requerente tinha de provar que o contrato foi celebrado para promover a imagem da empresa e que os bilhetes e o merchandising foram usados no contexto da atividade comercial. 

159.                No essencial tinha de provar que não houve benefício privado ou uso pessoal dos serviços.

160.                O cerne da questão é saber se há ou não prova suficiente nos autos de que os serviços acessórios foram efetivamente usados com finalidade publicitária e não recreativa ou pessoal e acaso tal prova inexista, o direito à dedução do IVA fica irremediavelmente comprometido.

161.                E nem se diga que o ónus da prova do direito à dedução recai sobre a Requerida. Vejamos,

162.                O artigo 74.º, n.º 1 da LGT determina que: “A administração fiscal deve provar os factos constitutivos dos seus direitos e a parte contrária os factos constitutivos dos seus.”

163.                O direito à dedução do IVA é um direito do contribuinte, logo, é a Requerente quem tem de provar que os serviços adquiridos foram usados no âmbito de operações tributadas (art.º 19.º e 20.º do CIVA). Tem ainda de provar que os chamados “serviços acessórios” fazem parte de uma estratégia publicitária legítima, e não foram consumidos para fins pessoais, de recreio ou de luxo. 

164.                A jurisprudência dos tribunais superiores (v.g., acórdão do STA de 15.11.2017, proc. 0485/17) tem reiterado isso com clareza.

165.                A ausência de prova concreta nos autos fragiliza decisivamente a posição da Requerente. 

166.                Não tendo sido feita prova: i) de quem usou os bilhetes ou o merchandising; ii) que tipo de ação publicitária foi executada no âmbito do contrato; iii) de que forma isso se traduziu em benefício para a imagem comercial da Requerente, então, a Requerente não cumpriu o seu ónus probatório que sobre si impendia, respaldada esta posição interpretativa na jurisprudência que dimana do acima referido acórdão do STA de 15.11.2017, proc. 0485/17.

167.                Não basta alegar que a prestação é global e publicitária, é preciso prová-lo. 

168.                A jurisprudência do TJUE (P.º C-572/07, entre outros,) permite que se trate como única uma prestação composta por vários elementos desde que se prove a sua unidade económica e funcional. No caso concreto, a Requerente alegou que o serviço é unitário e visa promover a imagem da empresa, mas, do ponto de vista do tribunal, não apresentou prova suficiente disso, sendo que não cabia à Requerida provar o uso pessoal ou o desvio de finalidade. 

169.                Cabia à Requerente demonstrar o uso empresarial e publicitário das prestações de serviços aqui em causa.

170.                E face a essa ausência probatória, prevalece a presunção legal de que os serviços se enquadram nas alíneas d) e e) do n.º 1 do artigo 21.º do CIVA, ou seja, de que estamos perante despesas de receção, divertimento ou luxo, excluídas da dedução.

171.                Finalmente, importa ainda dizer que a Requerida lança ainda a seguinte linha de argumentação: “A Autoridade Tributária considera relevante o facto de a B... aludir na fatura emitida à Requerente à Circular no 20/2009, mas, por outro lado, desconsidera a percentagem de 10% de serviços acessórios identificada nas referidas faturas, considerando uma percentagem mais elevada de 20%. Ora, conforme resulta da decisão de indeferimento parcial da reclamação graciosa, tendo em conta a Circular e o contrato celebrado entre a Requerente e a B..., a percentagem de 10% identificada nas faturas processadas não tem qualquer previsão contratual, não sendo possível aferir qual a percentagem dos “serviços principais” e dos “serviços acessórios”. No entanto, a Circular n.º 20/2009 determina que, em regra, na falta de qualquer critério legal ou contratual para a repartição do valor do contrato pelas componentes de serviços principais e acessório, 80% do valor dos serviços prestados/adquiridos correspondem aos “serviços principais” e 20% corresponde aos “serviços acessórios”. Conclui-se assim que, à falta de outro critério de repartição do preço do contrato pelas componentes de “serviços principais” e “serviços acessórios” transacionados entre a Requerente e a B..., o critério de repartição a aplicar seria o previsto no n.º 10 da Circular n.º 20/2009, designadamente o de 80% e 20%, para cada um dos tipos de serviços destacados. Face ao exposto, o critério utilizado pela Autoridade Tributária foi devidamente fundamentado, uma vez que o contrato celebrado entre a Requerente e a B... era omisso quanto à repartição do valor pelos tipos de serviços aqui em causa. Como acima referido, sobre questão semelhante importa destacar a decisão arbitral recentemente proferida no processo no 1050/2024-T, para que se remete, em cujo sumário se pugna o seguinte:«1. O ónus de invocar a dedutibilidade de uma despesa prevista numa categoria genérica de «serviços acessórios de publicidade» no confronto com a previsão no artigo 21.º do CIV A é do Sujeito Passivo. 2. A existência de «serviços acessórios de publicidade» que integram a previsão normativa do artigo 21.º do CIVA e são tributados no IVA normal com direito a dedução, autorizam a AT a fazer as correções que resultem do cumprimento estrito da norma que impede a dedução de determinados serviços.»”

172.                Este argumento final da Requerida é tecnicamente defensável e está construído com base em dois pilares que, em conjunto, podem sustentar legalmente a correção efetuada, sobretudo perante a ausência de prova concreta da Requerente. Vejamos, 

173.                1.º pilar - A Circular 20/2009 como critério subsidiário de repartição (80%/20%). A Requerida afirma que a percentagem de 10% mencionada nas faturas não está contratualmente prevista, logo não existe critério legal ou contratual que permita autonomizar os valores com rigor. Assim sendo e na falta de outro critério, aplica-se o critério indicativo da Circular n.º 20/2009, ou seja, 80% como “serviços principais” (dedutíveis) e 20% como “acessórios” (não dedutíveis). Este raciocínio faz sentido do ponto de vista técnico-fiscal, desde que não exista prova em contrário (e já vimos que não há) e desde que a AT não presuma arbitrariamente tal relação 80% versus 20%, mas use a Circular como critério de prudência e proporcionalidade, o que, do ponto de vista deste Tribunal, foi feito. Neste contexto, a Circular não está a ser aplicada como norma vinculativa, mas como critério auxiliar aceitável, como já foi validado por jurisprudência (vide v.g., acórdão do TCA Norte de 21.12.2016 e algumas decisões do CAAD acima referidas). A aplicação desta proporção, ainda que não vinculativa, apresenta-se, no entender deste Tribunal, como uma solução tecnicamente prudente e fiscalmente proporcional, por ser uma regra de experiência administrativa adotada face à dificuldade material de segregação rigorosa destas prestações. O critério é, assim, uma forma aceitável de concretizar o princípio da proporcionalidade na luta contra a evasão fiscal.

174.                2.º pilar - O contrato não contém critério de repartição e o ónus de prova recai sobre a Requerente. A AT diz  que não há no contrato entre a Requerente e a B..., S.A. qualquer cláusula que discrimine valores ou percentagens entre “serviços principais” e “acessórios”. Se a Requerente discordava da repartição proposta na Circular, competia-lhe apresentar uma proposta alternativa justificada, com base em critérios funcionais ou na utilização efetiva dos serviços. Como não o fez, a AT está legitimada a aplicar um critério proporcional razoável(80/20), desde que este seja coerente com a natureza dos serviços descritos. Isto alinha-se com as regras aqui aplicáveis sobre o ónus da prova previstas no artigo 74.º da LGT e com respaldo na jurisprudência acima citada prolatada no processo 1050/2024‑T onde se reafirma que ónus da prova da dedutibilidade de despesas “acessórias” recai sobre o sujeito passivo e ainda que a AT pode aplicar a norma do artigo 21.º do CIVA mesmo quando a despesa esteja integrada num contrato publicitário, se os serviços incluídos forem daqueles claramente excluídos da dedução, como a bilhética, a hospitalidade, etc.

175.                Este entendimento, relativamente ao qual este Tribunal não vê razões para dissentir, alinha-se com a lógica do artigo 21.º do CIVA como norma objetiva e anti-abuso e reforça a legalidade de correções feitas com base em critérios padronizados, na medida em que está ausente prova factual concreta do contribuinte em sentido contrário. E na falta de prova concreta da Requerente quanto à utilização efetiva e publicitária dos chamados “serviços acessórios”, considera este Tribunal ser legítima a aplicação do critério 80/20 previsto na Circular n.º 20/2009, com exclusão da dedução do IVA correspondente aos 20% associados a despesas não dedutíveis nos termos das alíneas d) e e) do n.º 1 do artigo 21.º do CIVA. Acresce que o contrato, a fatura e a ausência de prova concreta formam um conjunto que sustenta, com razoável segurança, a presunção de que 20% dos serviços prestados se subsumem na previsão do artigo 21.º, n.º 1, alíneas d) e e), do CIVA. A aplicação do critério 80/20 surge, neste caso, não como solução automática, mas como resposta equilibrada à falta de elementos que permitam uma individualização mais rigorosa.

176.                Estando em causa nos presentes autos a legalidade da correção efetuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), que excluiu parcialmente o direito à dedução do IVA suportado pela Requerente, no âmbito de um contrato celebrado com a sociedade B..., S.A., ao abrigo do qual esta última se comprometeu a prestar serviços publicitários e outros serviços associados, descritos como “serviços acessórios” e na ausência de critério contratual ou documental que permita autonomizar com rigor os valores atribuíveis aos chamados “serviços principais” e “acessórios”, a Requerida aplicou o critério constante do ponto 10 da Circular n.º 20/2009, adotando uma repartição de 80% para serviços principais e 20% para serviços acessórios, como critério subsidiário e padronizado, aceitando-se, aliás, que essa Circular expressa uma orientação interpretativa interna que, embora não vinculativa para os contribuintes ou tribunais, pode ser utilizada pela AT enquanto critério técnico, desde que proporcional, razoável e coerente com a natureza da operação contratada.

177.                O artigo 21.º, n.º 1 do Código do IVA estabelece um regime de exclusão do direito à dedução para um conjunto de despesas consideradas, pela sua natureza, de difícil controlo, suscetíveis de desvio para consumos particulares ou de finalidade recreativa. Tais exclusões aplicam-se independentemente da afetação concreta da despesa à atividade tributável do sujeito passivo, conforme jurisprudência constante do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) e acima sobejamente identificada. 

178.                No caso vertente, a Requerente celebrou um contrato que lhe atribuiu o estatuto de “Premium Partner” do C..., nos termos do qual lhe foram atribuídos, além da promoção da sua imagem, direitos como: i) acesso a camarotes e bilhetes para jogos; ii) produtos de merchandising; iii) Serviços de hospitalidade e receção. Estes serviços, tal como descritos no contrato e identificados genericamente na fatura, integram tipicamente os chamados “pacotes corporate” comercializados por sociedades anónimas desportivas e clubes, os quais foram objeto de análise na Circular n.º 20/2009. Embora as circulares não sejam fontes formais de direito, a sua utilização como critério interpretativo e padronizado é admissível, na medida em que contribuem para assegurar a uniformidade e previsibilidade da ação administrativa,  conforme tem sido aceite pela jurisprudência, designadamente no acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 21.12.2016 (proc. n.º 01517/08.4BEBRG), onde se afirma que: “A aplicação de um critério de repartição de 80%/20% entre serviços principais e acessórios, nos casos em que não exista discriminação contratual ou documental, é compatível com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade e visa salvaguardar a coerência do sistema fiscal.”

179.                Nessa conformidade e considerando que o contrato não define percentagens nem valores atribuídos a cada tipo de serviço e que as faturas que estão a titular as prestações de serviços aqui em causa mencionam uma repartição de 10% para serviços acessórios, sem qualquer suporte contratual, factual ou documental e ainda que aRequerente não juntou qualquer prova da utilização dos serviços acessórios para fins estritamente publicitários, nem demonstrou que os mesmos não consubstanciam despesas de receção ou de natureza recreativa (v.g.,assistência a jogos, distribuição de brindes, acesso a camarotes), a Autoridade Tributária atuou corretamente ao aplicar o critério residual previsto na Circular n.º 20/2009, que estabelece uma repartição padrão de 80% para serviços principais (com direito à dedução do IVA) e 20% para serviços acessórios (sem direito à dedução, nos termos das alíneas d) e e) do n.º 1 do artigo 21.º do CIVA. 

180.                A hermenêutica sustentada pela AT, aliás, materializada nas liquidações sindicadas, encontra respaldo na jurisprudência arbitral recente, nomeadamente na decisão proferida no processo n.º 1050/2024-T, onde se sumariou que: “1. O ónus de invocar a dedutibilidade de uma despesa prevista numa categoria genérica de «serviços acessórios de publicidade», no confronto com a previsão no artigo 21.º do CIVA, é do sujeito passivo. 2. A existência de ‘serviços acessórios de publicidade’ que integram a previsão normativa do artigo 21.º do CIVA [...] autoriza a AT a fazer as correções que resultem do cumprimento estrito da norma que impede a dedução de determinados serviços.”

181.                É certo que a  Requerente invoca, em sede de alegações, a decisão arbitral proferida em 28.03.2025 no âmbito do processo n.º 896/2024-T, sublinhando que, no mesmo, se reconheceu o direito à dedução do IVA suportado no âmbito de um contrato de parceria publicitária com a B..., S.A., por falta de demonstração, por parte da Autoridade Tributária, de que os serviços reputados como “acessórios” se reconduziam a categorias de exclusão previstas no artigo 21.º, n.º 1, do CIVA.

182.                Sem prejuízo do respeito institucional devido às decisões proferidas por outros Tribunais Arbitrais, importa sublinhar que a questão sub judicio, nomeadamente, a de saber se os chamados “serviços acessórios” integrados em contratos de parceria publicitária devem ou não ser excluídos do direito à dedução do IVA, tem vindo a ser objeto de interpretação jurisprudencial não uniforme, tanto na jurisprudência arbitral como na jurisprudência dos tribunais superiores. Em particular, constata-se que a decisão prolatada no processo n.º 896/2024-T adota uma interpretação claramente divergente daquela que este Tribunal sufraga, sobretudo quanto à aplicação da cláusula de exclusão do direito à dedução nas alíneas d) e e) do artigo 21.º, n.º 1, do CIVA, e quanto ao valor a atribuir à remissão contratual ou documental para os “serviços acessórios”.

183.                Neste Tribunal Arbitral Singular, entende-se, em consonância com a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Administrativo acima identificada, que o ónus de prova da afetação dos serviços à atividade tributável, bem como da não subsunção das despesas nos domínios de exclusão objetiva do artigo 21.º, impende sobre o sujeito passivo. 

184.                Assim, não se exige à Autoridade Tributária que prove o uso privado ou recreativo, bastando-lhe invocar de forma razoável o enquadramento normativo da exclusão, quando não tenha sido feita prova em contrário.

185.                Trata-se, pois, de uma divergência objetiva de entendimento jurídico quanto à aplicação das normas de exclusão do direito à dedução, que só reforça a necessidade de valorização do princípio da prova efetiva por parte do sujeito passivo, como garante de segurança jurídica e de não banalização do exercício do direito à dedução em situações de fronteira entre publicidade e consumo final.

186.                Importando ainda recordar que, como visto, nos termos do artigo 74.º, n.º 1 da LGT, o ónus da prova dos factos constitutivos do direito à dedução recai sobre o sujeito passivo, pelo que, competia, pois, à Requerente demonstrar que os “serviços acessórios” incluídos na parceria contratada, nomeadamente, a bilhética, a hospitalidade e o merchandising, se encontravam funcionalmente integrados na prestação principal de publicidade, não se reconduzindo, na realidade, a despesas de receção ou de caráter lúdico ou recreativo. 

187.                Contudo, entende o Tribunal, não foi feita prova documental ou factual suficiente para sustentar essa tese.

188.                Em síntese, o Tribunal considera que: i) a Requerente não apresentou prova suficiente de que os chamados serviços acessórios foram utilizados exclusivamente para fins publicitários e no contexto da sua atividade tributável; ii) O contrato e as faturas não permitem identificar com precisão o valor nem a natureza concreta dos serviços acessórios; iii) A AT, perante essa omissão e com base na Circular n.º 20/2009, adotou um critério proporcional, técnico e razoável (80/20), que se mostra conforme com a jurisprudência e com os princípios da legalidade e da proporcionalidade fiscal; e finalmente iv) o direito à dedução do IVA incidente sobre os serviços acessórios deve, portanto, ser excluído, nos termos das alíneas d) e e) do artigo 21.º, n.º 1 do CIVA.

189.                Por conseguinte, a correção efetuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira mostra-se legal, proporcional, devidamente fundamentada e conforme com o direito nacional e da União Europeia, impondo-se, nesta parte, a improcedência do pedido do pedido de pronúncia arbitral apresentado pela Requerente.

 

§ 2.º

DA (I)LEGALIDADE DA CORREÇÃO REFERENTE AO IVA DEDUZIDO INERENTE AOS SERVIÇOS ADQUIRIDOS À D..., LDA.

 

190.                No âmbito do procedimento de reclamação graciosa, a Requerente apresentou o orçamento n.º ...-19, emitido pela B..., Lda., o qual serve de suporte à fatura correspondente. A Autoridade Tributária e Aduaneira, analisando esse documento, entendeu que os serviços prestados pela B..., Lda. se consubstanciam em trabalhos de construção civil, nos termos previstos na alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do Código do IVA, pelo que, deveria ter sido aplicado o regime de inversão do sujeito passivo, ou seja, a obrigação de liquidação do imposto caberia à Requerente, enquanto adquirente dos serviços.

191.                Como o IVA foi liquidado pelo prestador ( B..., Lda.), e não pela adquirente, a AT entendeu que o imposto assim liquidado não confere direito à dedução, com fundamento no disposto no n.º 8 do artigo 19.º do Código do IVA, segundo o qual: “Nos casos em que a obrigação de liquidação e pagamento do imposto compete ao adquirente dos bens e serviços, apenas confere direito a dedução o imposto que for liquidado por força dessa obrigação.”

192.                Esta posição da AT encontra respaldo no Ofício-Circulado n.º 30 101, de 31 de maio de 2007, que clarifica o âmbito de aplicação da norma da alínea j) do artigo 2.º do CIVA, determinando que se encontram aí abrangidas as situações em que os serviços prestados estejam materialmente ligados a bens imóveis, designadamente, trabalhos de montagem, adaptação, instalação ou remodelação física de espaços comerciais ou instalações técnicas.

193.                A AT entendeu, com apoio documental (orçamento e fatura), que estão verificados os pressupostos materiais da aplicação da alínea j) do artigo 2.º, e que, consequentemente, a dedução do IVA suportado na fatura emitida pela D..., Lda. não era admissível, dado que tal imposto foi indevidamente liquidado por terceiroA AT sustenta que os serviços prestados pela D..., Lda. se enquadram na alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA, por se tratarem de “trabalhos de construção civil”, sendo, portanto, aplicável a regra de inversão do sujeito passivo. 

194.                No entanto, essa qualificação jurídica assenta numa presunção genérica, não sustentada em análise detalhada do orçamento n.º ...-19 (Documento 41), junto aos autos. Ora, do descritivo do referido orçamento constam expressamente várias operações de manutenção técnica e reparação de equipamentos, sem qualquer intervenção sobre a estrutura do imóvel ou obra de construção.

195.                Deste modo, os serviços descritos não se enquadram na alínea j), conforme resulta, aliás, da própria doutrina administrativa da AT plasmada no Anexo II do Ofício-Circulado n.º 30101/2007, que exclui da inversão serviços como os que constam do Documento 41 junto aos autos.

196.                Em consequência, o IVA liquidado pela D..., Lda. nas respetivas faturas não foi indevidamente faturado. 

197.                Logo, não se aplica a limitação constante do n.º 8 do artigo 19.º do CIVA e a Requerente tinha pleno direito à sua dedução. 

198.                A correção efetuada pela AT, neste ponto, deve, por isso, ser considerada ilegal.

 

§ 3.º

DA (I)LEGALIDADE DA CORREÇÃO REFERENTE AO IVA DEDUZIDO INERENTE AOS SERVIÇOS ADQUIRIDOS A E...

 

199.                No que respeita à fatura emitida por E..., no valor de € 340,18 de IVA, a Requerida fundamenta a exclusão do direito à dedução com base na regra de inversão do sujeito passivo prevista na alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do Código do IVA, que determina que, nos serviços de construção civil prestados por sujeitos passivos nacionais a outros sujeitos passivos com direito à dedução, é o adquirente quem está obrigado à liquidação do imposto.

200.                De acordo com a AT, a operação em causa configura um serviço de construção civil, cuja natureza implica um vínculo físico e funcional ao imóvel. Assim sendo, nos termos do artigo 36.º, n.º 13 do CIVA, a fatura deveria ter sido emitida sem menção ao IVA, fazendo constar a expressão “IVA – autoliquidação”. Ora, tal não sucedeu: o prestador liquidou indevidamente IVA, o qual foi posteriormente deduzido pela Requerente.

201.                A este respeito, o n.º 8 do artigo 19.º do CIVA é absolutamente claro ao prever que, quando a liquidação do imposto é legalmente exigida ao adquirente, o direito à dedução apenas existe relativamente ao imposto efetivamente liquidado pelo adquirente, por força da sua obrigação legal. Ou seja, o imposto mencionado na fatura, por ter sido liquidado indevidamente pelo prestador e não pelo adquirente, não é dedutível.

202.                A Requerente, por seu turno, limita-se a contestar a qualificação da operação como serviço de construção civil, alegando que poderá tratar-se de um fornecimento de bens móveis não incorporados permanentemente no imóvel, e que, portanto, não implicariam a aplicação da regra da inversão. 

203.                No entanto, não apresenta qualquer elemento probatório que suporte tal alegação, designadamente, não junta documentação técnica, fotografias, esclarecimentos do fornecedor, ou qualquer outro meio que permita afastar, com segurança, a qualificação jurídica atribuída pela AT. 

204.                É total a ausência de prova a este propósito. 

205.                Ademais, a Requerente não logrou afastar o entendimento da AT quanto à natureza dos trabalhos realizados, nem impugnou, com base em elementos objetivos, que os mesmos se integram no conceito de prestação de serviços de construção civil, tal como entendido pela jurisprudência e doutrina administrativa (v. g., Ofício Circulado n.º 30101/2007, de 31 de maio).

206.                Pelo que, estando reunidos os pressupostos de aplicação da regra de inversão e tendo a fatura sido emitida em desconformidade com o artigo 36.º, n.º 13 do CIVA, a dedução do IVA nela contido não pode ser aceite, à luz do artigo 19.º, n.º 8 do CIVA. 

207.                Esta é, aliás, uma posição consolidada na jurisprudência fiscal e arbitral, que reconhece a irrelevância tributária do IVA liquidado indevidamente por um prestador em violação da regra da inversão, bem como a impossibilidade de a Requerente dele se aproveitar via dedução.

208.                Assim, conclui-se que a correção efetuada pela Autoridade Tributária quanto à fatura emitida por E... mostra-se legal, proporcional, e devidamente fundamentada, devendo a mesma ser mantida.

IV. DECISÃO:

 

Face ao exposto, o Tribunal Arbitral Singular decide:

 

A)   Manter, na parte não infirmada nos presentes autos, a decisão que recaiu sobre a reclamação graciosa n.º ...2023...;  

B)   Julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral apresentado pela Requerente, anulando parcialmente os atos de liquidação de IVAapenas na parte correspondente à correção de € 322,00, relativa ao IVA indevidamente corrigido com base na fatura emitida pela entidade D..., Lda.;

C)   Julgar improcedente o pedido na parte remanescente, mantendo-se válidas as correções efetuadas pela Autoridade Tributária: 1) No montante de € 1.610,00[7], respeitante ao IVA deduzido em serviços adquiridos à B..., S.A., por subsunção parcial nas alíneas d) e e) do n.º 1 do artigo 21.º do CIVA; 2) No montante de € 340,18, respeitante à fatura emitida por E..., por aplicação da regra de inversão do sujeito passivo (artigo 2.º, n.º 1, alínea j) do CIVA);

 

V. VALOR DO PROCESSO:

 

[8]Fixo o valor do processo em 2.272,18 € em conformidade com o disposto no art.º 97.º-A do CPPT, aplicável por remissão do art.º 3º do regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT), não tendo a anulação parcial do valor da ação repercussão na taxa de arbitragem devida, que se mantém inalterada.

 

VI. CUSTAS:

 

Fixo o valor das Custas em 1.224,00 €, calculadas em conformidade com a Tabela I do regulamento de Custas dos Processos de Arbitragem Tributária em função do valor do pedido (sendo que, tal valor foi o indicado pela Requerente no PPA e não contestado pela Requerida e corresponde ao valor das liquidações sindicadas), a cargo da Requerente na proporção de 96,3% e da Requerida na proporção de 3,70%, em função da sucumbência respetiva,  nos termos do disposto nos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4 do RJAT e ainda art.º 4.º, n.º 5 do RCPAT e art.º 527, nºs 1 e 2 do CPC, ex vi do art.º 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 07 de julho de 2025.

 

O texto da presente decisão foi elaborado em computador, nos termos do n.º 5, do art.º 131.º do Código de Processo Civil, aplicável por remissão da alínea e), do n.º 1, do art.º 29.º do RJAT.

 

 

 

 

 

O árbitro,

 

(Fernando Marques Simões)

 

 



[1] De acordo com o despacho de retificação de 2025-07-10

[2] De acordo com o despacho de retificação de 2025-07-10

[3] Carregado e sublinhado nosso.

[4] Acórdão de 05.10.1999, Proc. -305/97, Royscot e o.; Acórdão de 14.06.2001, Proc. C-40/00, Comissão contra Franca; Acórdão de 08.01.2002, Proc. C-409/99, Metropol.  

 

[5] Devendo referir-se ainda a decisão jurisprudencial do STA de 3.2.2021, tirada no Processo n.º 0353/11.5BECTB e que pode ser lida inhttps://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/af20c493cd54a00980258677003a28cb?OpenDocument&ExpandSection=1#_Section1 e aqui se deve considerar reproduzida.

[6] Cfr. acórdão Von Colson, de 10 de abril de 1984, proc. 14/83.

[7] De acordo com o despacho de retificação de 2025-07-10

[8] De acordo com o despacho de retificação de 2025-07-10