Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 1/2025-T
Data da decisão: 2025-06-25  Liquidação  
Valor do pedido: € 20.821,46
Tema: Extinção da instância por inutilidade superveniente da lide.
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SUMÁRIO: 

Verifica-se a inutilidade superveniente da lide e a consequente extinção da instância, se o Requerente obteve a plena satisfação do seu pedido em virtude da revogação pela AT, após a constituição do Tribunal Arbitral, do ato de liquidação que havia impugnado.

 

DECISÃO ARBITRAL

1. Relatório

“A..., LDA”., sociedade comercial por quotas com o NIPC..., sede social sita na...,  ..., veio requerer a constituição do Tribunal Arbitral submetendo à apreciação do mesmo, a pretensão formulada no âmbito do processo de Impugnação Judicial com o nº 220/11.2BELRS, pendente de decisão na 3 ª Unidade Orgânica do Tribunal Tributário de Lisboa, visando a anulação do ato tributário de liquidação nº 2010..., datado de 2010/11/26, no valor de € 20.821,46. 

Tendo efetuado o pagamento, requereu, também, a Requerente, o pagamento de juros indemnizatórios

 

1.1- O pedido de constituição do Tribunal foi aceite pelo Senhor Presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) e automaticamente notificado à AT no dia 02 de janeiro de 2025.

A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.° e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.° do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), o Senhor Presidente do Conselho Deontológico designou como árbitro o signatário da decisão.

O Tribunal foi regularmente constituído em 10 de março de 2025 e é materialmente competente à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

 

1.2- Por requerimento de 15-04-2025, a Requerida veio comunicar que procedeu à anulação do ato de liquidação adicional n.º 2010..., emitido em 26.11.2010, referente ao período de tributação de 2009, da qual resultou um valor a pagar de 20.821.46 €, incluindo juros de mora no montante de 1.362,15 € (liquidação n.º 2010...).

 Mais requereu a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide.

1.3- Notificada a Requerente para se pronunciar, nada referiu. 

 

2. Matéria de facto

2.1. Factos provados

Considera-se como provada a seguinte matéria de facto:

a- A Requerente solicitou a constituição do Tribunal Arbitral, submetendo à apreciação, a pretensão formulada no âmbito do processo de Impugnação Judicial com o nº 220/11.2BELRS pendente de decisão na 3 ª Unidade Orgânica do Tribunal Tributário de Lisboa, visando a anulação do ato tributário de liquidação nº 2010 ..., datado de 2010/11/26, no valor de € 20.821,46.

b- Tendo efetuado o pagamento, requereu, também, a Requerente, o pagamento de juros indemnizatórios

c- Para fundamentar o seu pedido alegou, a Requerente, a não consideração de prejuízos fiscais relativos a anos anteriores, especificamente 2009.

d- Por despacho proferido pela Subdiretora Geral em 24.06.2024, a AT, procedeu á revogação do ato tributário. comunicando que procedeu à anulação do ato de liquidação adicional n.º 2010..., emitida em 26.11.2010, referente ao período de tributação de 2009, da qual resultou um valor a pagar de €20.821.46, incluindo juros de mora no montante de 1.362,15 € (liquidação n.º 2010...). 

 

2.1.1 Factos Não Provados

Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado. 

 

2.2. Fundamentação da decisão da matéria de facto 

Ao Tribunal incumbe o dever de selecionar os factos que interessam à decisão e discriminar a matéria que julga provada e declarar a que considera não provada, não tendo de se pronunciar sobre todos os elementos da matéria de facto alegados pelas partes, tal como decorre dos termos conjugados do artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e do artigo 607.º, n.º 3, do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT.

Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram assim selecionados e conformados em função da sua relevância jurídica, a qual é definida tendo em conta as várias soluções plausíveis das questões de direito para o objeto do litígio, tal como resulta do artigo 596.º, n.º 1 do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.

Tendo em conta as posições assumidas pelas partes, nomeadamente os factos invocados no RI, que não mereceram contestação, o Requerimento da AT e prova documental constante dos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.

 

3. Matéria de direito

3.1.- QUESTÃO PREVIA – Inutilidade superveniente da lide

3.1.1- Nas causas de extinção da instância do processo declarativo, as quais são aplicáveis aos autos, está prevista a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide no art.º 277.º, alínea e) do CPC. 

Como refere o acórdão do STA n.º 02321/17.4BEPRT de 06.06.2022 “(…) De acordo com a doutrina e a jurisprudência a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide verifica-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objeto do processo ou, por outro lado, porque encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida.

Num e noutro caso, a causa deixa de interessar - além por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por ele já ter sido atingido por outros meios (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 9/01/2013, rec.1208/12; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 27/11/2019, rec.873/07.6BELSB; José Lebre de Freitas e Outro, Código de Processo Civil Anotado, I Vol., 4ª. Edição, Almedina, 2021, pág.561 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. Edição, 2011, pág.307 e seg.).

Só se verifica a inutilidade superveniente da lide quando essa inutilidade for uma inutilidade jurídica.

A utilidade da lide correlaciona-se, assim, com a possibilidade da obtenção de efeitos úteis da mesma pelo que a sua extinção só deve ser declarada quando se conclua que o seu prosseguimento não poderá trazer quaisquer consequências vantajosas para o autor/recorrente. (…)”

 

3.1.2- Nos autos, face ao pedido efetuado e aos argumentos expendidos no Requerimento inicial, a Recorrente formulou o pedido de anulação do ato praticado e reembolso das importâncias pagas, acrescidas de juros, por as considerar ilegais. 

Pelo que, tendo a AT revogado o ato, considera-se que a Recorrente viu satisfeita a sua pretensão e a solução do litígio nestes autos deixando de interessar por ter sido atingida por outro meio. 

Acresce que, apesar de a AT não se ter pronunciado na decisão revogatória, sobre reembolso do montante pago e ao pagamento de juros indemnizatórios, resulta do art. 100.º da LGT que a mesma AT está obrigada à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade. 

Logo, a AT está obrigada a proceder à restituição do montante anulado e do pagamento dos respetivos juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei.

O eventual incumprimento dessas obrigações é uma questão de execução da decisão administrativa e não de prolação de sentença por este Tribunal.

No caso, em apreço, como se referiu, a AT procedeu à anulação do ato de liquidação, como pedia a Requerente, pelo que viu, portanto, satisfeita a sua pretensão.

 Juridicamente, falando, a solução do litígio destes autos deixou de interessar por ter sido atingida por outro meio (arts. 278.º, alínea e), do CPC, ex vi 2.º, alínea e), do CPPT). 

 

3.1.3- Assim, o Tribunal julgará extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, sendo a extinção da instância imputável à Requerida, para efeito de custas, por força do art. 536.º, n.ºs 3 e 4, do CPC, uma vez que foi ela que deu causa à inutilidade.

 

4. DECISÃO 

Nestes termos, decide o Tribunal Arbitral Singular:

- julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide. 

- condenar a Requerida nas custas do processo, por ter dado causa à inutilidade.

 

5. Valor do processo

De harmonia com o disposto nos artigos 296.º, 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de €20.821,46, valor económico do dissenso e indicado pela Requerente, sem oposição da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

6. Custas

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em €1.224.00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a integral cargo da Requerida.

 

Lisboa, 25jun2025

 

O árbitro

 

Fernando Miranda Ferreira