Sumário: Tendo sido revogados os atos objeto do pedido de pronúncia arbitral e sido declarada, pela Requerente, a perda do interesse no prosseguimento do processo arbitral, por inutilidade da lide, deve reconhecer-se a falta de objeto processual, que constitui causa de extinção da instância (artigo 277.º, alínea e), do CPC), devendo ser a Requerida condenada nas respetivas custas.
DECISÃO ARBITRAL
1. A..., NIF..., residente na Rua ..., n.º..., ..., ... - ... Sintra (de ora em diante designada “Requerente”), apresentou no dia 06.01.2025 um pedido de constituição de tribunal arbitral em matéria tributária, que foi aceite, visando, em termos imediatos, a declaração de ilegalidade do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa dos seguintes atos tributários:
1.1. Liquidação de IRS referente a 2021, com o n.º 2022..., na qual se apurou um valor de coleta total (antes de deduções à coleta) de € 20.709,36;
1.2. Liquidação de IRS referente a 2022, com o n.º 2023..., na qual se apurou um valor de coleta total (antes de deduções à coleta) de € 123.089,38; e
1.3. Demonstração de liquidação de IRS de 2023 com o n.º 2024... .
2. Nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 6.º e da alínea b) do n.º 1 do art.º 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (de ora em diante, “RJAT”), o Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”), no dia 25.02.2025, designou comos árbitros os signatários, não tendo as partes, depois de devidamente notificadas, manifestado oposição a essa designação.
3. Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do art.º 11.º do RJAT, o tribunal arbitral foi constituído a 17.03.2025.
4. Nesse mesmo dia17.03.2025 foi notificado o dirigente máximo dos serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira (de ora em diante “Requerida” ou “AT”) para remeter ao Tribunal Arbitral cópia do processo administrativo que pudesse existir e, querendo, no prazo de 30 dias, apresentar resposta e solicitar produção de prova adicional.
5. Por requerimento de 30.04.2025, a Requerida informou o Tribunal de que, por despacho da Senhora Subdiretora-geral de 27.04.2025, haviam sido revogadas as liquidações objeto do pedido, tendo o Tribunal solicitado à Requerente que se pronunciasse.
6. Por requerimento de 07.05.2025, a Requerente, atenta a revogação dos referidos atos de liquidação, declarou que perdera o interesse no prosseguimento do processo arbitral, por inutilidade da lide, requerendo a sua extinção.
7. O artigo 13.º, n.º 1 do RJAT prescreve o seguinte:
“Nos pedidos de pronúncia arbitral que tenham por objeto a apreciação da legalidade dos atos tributários previstos no artigo 2.º, o dirigente máximo do serviço da administração tributária pode, no prazo de 30 dias a contar do conhecimento do pedido de constituição do tribunal arbitral, proceder à revogação, ratificação, reforma ou conversão do ato tributário cuja ilegalidade foi suscitada, praticando, quando necessário, ato tributário substitutivo, devendo notificar o presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) da sua decisão, iniciando-se então a contagem do prazo referido na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º”
8. A Requerida tomou conhecimento do pedido de constituição do tribunal arbitral em data não posterior ao dia 12.01.2025, dispondo, nos termos do preceito acabado de transcrever, de 30 dias (úteis) para proceder à revogação dos atos tributários cuja ilegalidade foi suscitada.
9. Sucede que só a 30.04.2025 a Requerida informou o Tribunal que as liquidações, por despacho de 27.04.2025, haviam sido revogadas, portanto, em momento muito posterior ao da constituição do tribunal arbitral, que ocorreu a 17.03.2025.
10. Como é evidente, a Requerida pode sempre, para lá do prazo a que se refere o n.º 1 do artigo 13.º do RJAT, proceder à revogação do ato tributário posto em crise, sendo certo que dessa revogação têm de extrair-se todos os efeitos processuais e jurídico-tributários que ela implica, nomeadamente no que se refere à restituição das quantias exigidas pelo ato revogado, caso hajam sido pagas, ao pagamento das custas processuais e, bem assim, se isso se justificar, ao pagamento de juros indemnizatórios.
11. Por força da revogação dos atos tributários cuja ilegalidade é neste processo sindicada, deixa de haver objeto do litígio, devendo ser tida por extinta a instância quanto ao pedido formulado pela Requerente, nos termos do disposto nos artigos 277.º, alínea e) e 611.º do Código do Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1 alínea e) do RJAT[1], se a pretensão do requerente tiver sido integralmente satisfeita com a dita revogação.
12. Ora, a própria Requerente, como vimos, considerou ter perdido o interesse no prosseguimento do processo, requerendo, a final, a extinção do mesmo por inutilidade superveniente da lide.
13. Decisão: decide o Tribunal julgar extinta a instância, por impossibilidade superveniente da lide, nos termos do disposto nos artigos 277.º, alínea e) e 611.º do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1 alínea e) do RJAT, razão por que se abstém de se pronunciar sobre as questões suscitadas pela Requerida no pedido de pronúncia arbitral, nomeadamente a referente aos juros indemnizatórios.
14. Valor da causa: de harmonia com o disposto no n.º 4 do art.º 299.º e no n.º 2 do art.º 306.º, ambos do CPC, no art.º 97.º-A do CPPT e ainda do n.º 2 do art.º 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 95.325,19 (noventa e cinco mil, trezentos e vinte e cinco euros e dezanove cêntimos).
15. Custas: para os efeitos do disposto no n.º 2 do art.º 12 e no n.º 4 do art.º 22.º do RJAT e do n.º 5 do art.º 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em € 2.754,00 (dois mil, setecentos e cinquenta e quatro euros), nos termos da Tabela I anexa ao dito Regulamento, a suportar, como se disse, integralmente pela Requerida
Lisboa, 21 de maio de 2025
O Presidente do Tribunal Arbitral,
José Poças Falcão
O Árbitro Adjunto,
Arlindo José Francisco
O Árbitro Adjunto (Relator),
Nuno Pombo
[1] V. CARLA CASTELO TRINDADE, Regime Jurídico da Arbitragem Tributária – anotado, Almedina, 2016, pág. 337.