Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 1016/2024-T
Data da decisão: 2025-05-08  IRS  
Valor do pedido: € 27.251,33
Tema: IRS – Mais-valias imobiliárias – Regime transitório
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O ganho decorrente da alienação onerosa de prédio que, à data da entrada em vigor do Código do IRS, não era sujeito a tributação em sede de Imposto de Mais-Valias, é excluído de tributação em sede de IRS, por força da aplicação do regime transitório da Categoria G previsto no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de novembro, independentemente da alteração posterior e da sua qualificação (terreno para construção) na data em que foi alienado.

DECISÃO ARBITRAL

I.          {C}{C}Relatório

A..., viúva, natural da freguesia de ..., concelho de ..., titular do número de identificação fiscal (“NIF”)..., portadora do cartão de cidadão número ..., emitido pela República Portuguesa e válido até 06-06-2028, residente na Rua ..., n.º..., ..., ...-... ... (“Requerente”), apresentou, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (“RJAT”), requerimento de constituição de tribunal arbitral singular em matéria tributária e pedido de pronúncia arbitral com vista à anulação do despacho de indeferimento da Reclamação Graciosa com o n.º ...2022..., ofício..., do Serviço de Finanças de ..., notificado à Requerente em 31-05-2024.

É demandada a Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT” ou “Requerida”).

A)     {C}{C}Constituição do Tribunal Arbitral

O pedido de constituição do tribunal arbitral singular foi aceite pelo Senhor Presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”).

Pelo Presidente do Conselho Deontológico do CAAD foi comunicada a constituição do presente tribunal arbitral singular em 13-11-2024, nos termos da alínea c) do número 1, do artigo 11.º do RJAT.

B)     {C}{C}História Processual

No pedido de pronúncia arbitral a Requerente pede, em síntese, a anulação do despacho de indeferimento do pedido de reclamação graciosa e consequente aplicação da exclusão de tributação do ganho decorrente da alienação onerosa do artigo urbano ... e que teve origem no prédio inscrito na matriz rústica sob o artigo ..., sito na freguesia de ..., que deu origem ao artigo rústico n.º ...  (“Prédio”). Em conformidade, pede que seja incluído no “anexo G1” da sua declaração de IRS, relativamente ao ano de 2019, a venda do referido imóvel de modo a proceder-se à imediata e plena reconstituição da legalidade. A Requerente pede, ainda, a condenação da Requerida no pagamento de juros indemnizatórios e no pagamento das custas judiciais devidas.

Como fundamento da sua pretensão, a Requerente alega, em suma, que o Prédio vendido pela Requerente em 2019, por este constituir um prédio rústico com data de aquisição anterior a 01-01-1989, não se encontrava sujeito a tributação em sede de IRS, ao abrigo do regime transitório da categoria G, estatuído no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de novembro (“DL 445-A/88”), que aprovou o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”). A Requerente acrescenta que, ainda que tenha ocorrido posteriormente um facto modificativo do conteúdo do respetivo direito de propriedade, por via do pedido de inscrição na matriz de um lote de terreno para construção urbana, afastada estava a sujeição a IRS, por aplicação do referido regime transitório, porquanto os ganhos decorrentes da sua transmissão não estavam também sujeitos a tributação na vigência do abolido Imposto de Mais-Valias (“IMV”). Conclui, assim, a Requerente pela necessária aplicação do regime transitório da categoria G, previsto no artigo 5.º do DL 445-A/88, à alienação do Prédio pela Requerente em 2019. Ao pedido de pronúncia arbitral foram juntos procuração forense, 5 documentos e 1 testemunha.

Foi proferido despacho arbitral, tendo em vista a notificação do dirigente máximo do serviço da administração tributária para, no prazo de 30 dias, apresentar resposta e solicitar a produção de prova adicional.

A Requerida apresentou a sua resposta, tendo aí alegado que as mais-valias resultantes da alienação de terrenos para construção estão sujeitas a IRS, sempre que os respetivos prédios tenham sido adquiridos pelos titulares em data posterior à entrada em vigor do antigo IMV, e desde que estivessem sujeitas a este imposto. Acrescenta que a norma transitória contida no artigo 5.º do DL 445-A/88, ressalva apenas os tipos de ganhos que não eram sujeitos ao IMV. Sustenta a Requerida que a metodologia de interpretação da aludida norma transitória, relativamente às mais-valias imobiliárias, deve assentar na simulação da sua eventual sujeição ao IMV, caso este imposto ainda estivesse em vigor na data da alienação, sendo que em caso afirmativo essa mais-valia estará também sujeita a IRS, e em caso negativo não estará.

Conclui a Requerida que deve improceder a pretensão da Requerente, por falta de apoio legal.

I.           {C}{C}Saneamento

O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 4.º e 5.º, todos do RJAT.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão regularmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º, n.º 2, ambos do RJAT, e dos artigos 1.º a 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.

II.          {C}{C}Matéria de facto

A)    {C}{C} Matéria de Facto Provada

Com relevo para a apreciação e decisão das questões suscitadas, dão-se como assentes e provados os seguintes factos:

i)       {C}{C}Em 14-03-1973, por escritura pública, a Requerente adquiriu conjuntamente com o seu marido, B... (“ADC”), 1/4 do Prédio;

ii)      {C}{C}Em 30-01-2018, por óbito do seu marido, veio à posse da Requente 1/3 da quota-parte da herança indivisa – 1/8.

iii)    {C}{C}Em 2019, foi inscrito na aludida matriz o terreno para construção...;

iv)    {C}{C}Em 18-10-2019, o Prédio foi alienado;

v)      {C}{C}A requerente apresentou a Declaração Modelo 3 de IRS (n.º ...-2019-...) do ano de 2019, acompanhada dos anexos A, G e H, tendo declarado no anexo G a alienação onerosa do Prédio, adquirido em dois momentos diferentes: 13% em 1973 e 4% em 2018;

vi)    {C}{C}Posteriormente, submeteu declaração de substituição (n.º ...-2019-...) com o anexo “G1”, onde mencionou a parte adquirida em 1973, mantendo o anexo G com os mesmos valores relativos à parte adquirida em 2018, que ficou no estado de “Declaração Não Liquidável”, tendo sido convolada na reclamação graciosa n.º...2022...;

vii)   {C}{C}Por ofício n.º ... de 24-05-2024, a Requerente foi notificada da decisão de indeferimento da reclamação graciosa.

B.     {C}{C}Matéria de Facto Não Provada

Não existe factualidade relevante para a decisão da causa dada como não provada.

C.     {C}{C}Motivação da Decisão da Matéria de Facto

Conforme resulta da aplicação conjugada do artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e do artigo 607.º, n.º 3, do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis por força do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT, ao Tribunal Arbitral incumbe o dever de selecionar os factos que interessam à decisão e discriminar a matéria que julga provada e declarar a que considera não provada, não tendo de se pronunciar sobre todos os elementos da matéria de facto alegados pelas partes.

Desta forma, os factos pertinentes para o julgamento da causa foram selecionados e conformados em função da sua relevância jurídica, a qual é determinada tendo em conta as várias soluções plausíveis das questões de direito para o objeto do litígio, tal como decorre do artigo 596.º, n.º 1, do CPC, aplicável por força do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.

Nestes termos, tendo em conta as posições assumidas pelas partes e a prova documental junta aos autos, consideraram-se provados e não provados, com relevo para a decisão, os factos anteriormente elencados.

III.         {C}{C}Questão a decidir

A questão que cabe apreciar no âmbito do presente processo prende-se com a legalidade do indeferimento expresso da reclamação graciosa apresentada pela Requerente contra o ato de liquidação de IRS, referente ao ano de 2019, e, muito concretamente, determinar se a parte do Prédio adquirida em 1973 e alienada em 2019 pela Requerente está abrangida pela exclusão de tributação decorrente do regime transitório da categoria G, previsto no artigo 5.º do DL 445-A/88.

IV.        {C}{C}Matéria de direito

A.     {C}{C}Da legalidade do ato impugnado

Nos termos do artigo 9.º, n.º 1, alínea a), do Código do IRS, constituem incrementos patrimoniais sujeitas a tributação em sede de IRS as mais-valias.

Por sua vez, constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem da alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis e afetação de quaisquer bens do património particular a atividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário (vide artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do Código do IRS, na sua redação em vigor à data relevante dos factos).

Sem prejuízo daquelas normas de incidência, o artigo 5.º do DL 445-A/88 determina que «[o]s ganhos que não eram sujeitos ao imposto de mais-valias, criado pelo Código aprovado pelo Decreto-Lei n.º 46 373, de 9 de Junho de 1965, bem como os derivados da alienação a título oneroso de prédios rústicos afectos ao exercício de uma actividade agrícola ou da afectação destes a uma actividade comercial ou industrial exercida pelo respectivo proprietário, só ficam sujeitos a IRS se a aquisição dos bens ou direitos a que respeitam tiver sido efectuada depois da entrada em vigor deste Código.»

Ou seja, apenas se encontram sujeitos a tributação em IRS se a aquisição dos bens ou direitos de cuja transmissão provêm se houver efetuado depois da entrada em vigor do Código do IRS.

O artigo 1.º do revogado Código do IMV dispunha que o imposto incidia sobre os ganhos realizados através de, entre outros atos, transmissão onerosa de terreno para construção, qualquer que fosse o título por que se operasse, quando dela resultassem ganhos não sujeitos aos encargos de mais valia previstos no artigo 17.º da Lei n.º 2030, de 22-07-1948, ou no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 41616, de 10 de Maio de 1958, e que não tivessem a natureza de rendimentos tributáveis em contribuição industrial.

Por fim, o § 2.º daquele normativo estabelecia que eram havidos como terrenos para construção «os situados em zonas urbanizadas ou compreendidos em planos de urbanização já aprovados e os assim declarados no título aquisitivo».

Da conjugação das referidas normas resulta que não podem beneficiar do regime transitório da categoria G os ganhos com a alienação de ativos imobiliários que já eram sujeitos a tributação em sede de IMV, isto é, os ganhos resultantes da alienação onerosa de (i) terrenos para construção, (ii) elementos do ativo imobilizado das empresas ou bens ou valores por elas mantidos como reserva ou fruição e (iii) do direito de arrendamento de escritórios e consultórios.

Como resulta da matéria de facto provada e elencada supra, à quota-parte de 1/4 do Prédio alienado pela Requerende corresponde a data de aquisição de 14-03-1973, qualificando a esta data como prédio rústico.

Por outras palavras, o Prédio em causa era um prédio rústico à data da respetiva aquisição (i.e., 14-03-1973) e manteve essa mesma qualidade até 2019, passando nesta data a deter a qualidade de terreno para construção.

Assim, a quota-parte do Prédio adquirida, em 14-03-1973, pela Requerente não estava sujeita ao abolido IMV naquele data e também não estava em 01-01-1989, data da entrada em vigor do Código do IRS.

Ou seja, contrariamente ao que defende a Requerida, o critério determinante da aplicação do referido regime transitório é o da qualificação do bem no momento da entrada em vigor do diploma legal e não o da sua posterior transmissão.

Nessa linha de interpretação, o Supremo Tribunal Administrativo (“STA”) tem decidido, reiteradamente, que à luz do disposto no artigo 5.º do DL 445-A/88, não são tributados em sede de IRS os ganhos obtidos com a transmissão onerosa de prédio urbano adquirido como rústico antes da entrada em vigor do Código do IRS e que ainda conservava essa natureza no momento da entrada em vigor deste Código, pese embora tenha, posteriormente, adquirido a natureza de urbano (terreno para construção) e sido alienado como tal.

A título de exemplo, atente-se ao decidido no acórdão do STA, proferido no âmbito do processo n.º 01396/13, de 02-07-2014: «Importa agora analisar se este regime transitório da categoria G, previsto no citado n.° 1 do art.° 5°, do Decreto-Lei n.° 442-A/88, de 30 de Novembro, tem ou não aplicação na situação em apreço.

Sem dúvidas, deve afirmar-se que quando entrou em vigor o CIRS, (01/01/1989) inequivocamente, o prédio em questão não estava, em caso de transmissão, sujeito a imposto, no tocante a mais-valias, pois detinha a qualidade de rústico.

É um facto indiscutível e incontestável.

No caso do tributo ora sindicado, estamos perante um facto tributário de formação sucessiva, integrado por dois momentos: o da aquisição e o da transmissão. No momento da aquisição por via sucessória o prédio tinha a qualidade de rústico a qual se mantinha na data da transmissão que ocorreu após a entrada em vigor do CIRS. Não ocorre sujeição a imposto de mais valias pois que há que considerar a referida norma transitória do artº 5º do CIRS, não podendo aplicar-se retroactivamente a lei.

Neste sentido e por todos, o acórdão de 27 de Janeiro de 2010, do STA, proferido no Proc. nº 969/09, onde se refere, cuja fundamentação se destaca e para a qual se remete “O que é decisivo para a questão da tributação em IRS, dado que para saber se se verificam os pressupostos da tributação, releva a qualidade que o bem detinha no momento da entrada em vigor do CIRS, uma vez que, como se viu, no regime transitório estabelecido para a categoria G de IRS (regime previsto no nº 1 do art. 5º do citado DL 442-A/88), se estabelece que os ganhos que não eram sujeitos ao imposto de mais-valias, só ficam sujeitos ao IRS se a aquisição dos bens ou direitos de cuja transmissão provêm se houver efectuado depois da entrada em vigor deste Código.

Daí que careça de razão a recorrente ao alegar que os ganhos são sujeitos a IRS porque estamos perante a venda de um lote de terreno para construção urbana que já nos termos do disposto no nº 1 do CIMV era tributada (cfr. art. 7º das alegações de recurso). Como se sublinha no acórdão deste STA, de 12/12/06, rec. nº 1100/05, «o que se pretendeu com a mudança de regime de tributação operada a partir de 1989 foi tributar em IRS, categoria G, todas as transmissões onerosas sobre imóveis; todavia, para evitar efeitos retroactivos, estabeleceu-se que para serem tributadas tais transmissões era necessário que os bens abrangidos fossem adquiridos e alienados dentro da vigência da nova lei, com excepção daqueles que já eram antes tributados por força do CIMV, ou seja, os terrenos para construção, os quais passariam agora a ser tributados nos termos do Código do IRS». E também no ac. de 6/6/07, deste mesmo STA, rec. nº 179/07, se escreve, a este propósito, que a não tributação em IRS - a título de mais-valias - dos ganhos obtidos com a transmissão de terrenos que à data da entrada em vigor do CIRS eram qualificados como terrenos agrícolas (citado art. 5º do DL 442-A/88) se compreende «pelo facto de, tendo-se optado pelo cálculo dos ganhos tributáveis a título de mais-valias com base na diferença entre o valor da aquisição e o valor da transmissão, a tributação em IRS da valorização de terrenos agrícolas que haviam sido adquiridos antes da sua entrada em vigor incluiria, parcialmente, a aplicação retroactiva do novo regime de tributação a ganhos obtidos com a valorização dos prédios rústicos, pois forçosamente se iriam tributar, além dos ganhos correspondentes à valorização gerada na vigência do novo Código, também alguns correspondentes à valorização que, como prédios rústicos, pode ter tido ocorrido antes da sua entrada em vigor. Ora, essa aplicação retroactiva de normas de incidência tributária, que, a partir da revisão constitucional de 1997 é absolutamente proibida pela nova redacção dada ao art. 103°, nº 3, da CRP, só era tolerável anteriormente em situações especiais em que estivesse em causa o interesse geral (Essencialmente neste sentido, pode ver-se o acórdão do Tribunal Constitucional nº 216/90, de 20-6-1990, processo nº 203/89, publicado no Boletim do Ministério da Justiça nº 398, página 207), que não se vislumbram em matéria de tributação de mais-valias» (cf. ainda, no mesmo sentido, entre outros, os acs. de 4/2/09, rec. nº 872/08 e de 29/10/08, rec. nº 539/08 e de 13/2/08, rec. nº 763/07).» (sublinhado nosso)

E, ainda, ao acórdão do STA, proferido no âmbito do processo n.º 0834/09.0BELRS, de 11-10-2023, quando aí se refere que «(…) como o Supremo Tribunal Administrativo vem decidindo em jurisprudência constante, o que releva para a aplicação deste regime transitório é a qualidade que o bem detinha no momento da entrada em vigor do novo Código – ver, por todos, o acórdão de 8 de julho de 2015, no Recurso n.º 0584/15 e jurisprudência aí citada.

Assim, tratando-se de bem imóvel adquirido ainda na vigência do Código do Imposto de Mais-Valias, os ganhos provenientes da sua alienação só estarão sujeitos a imposto se, à data da entrada em vigor do novo Código, já pudesse ser qualificado como terreno para construção.

Está assente nos autos que o ganho em causa provém de uma parcela destacada de um logradouro adquirido em 1983.

No entanto, a operação de destaque só ocorreu em 2004, pelo que, à data da entrada em vigor do Código do IRS, o terreno era parte integrante do edifício de que foi, ulteriormente, destacado – ver o artigo 204.º, n.º 2, do Código Civil.

Assim, à data da entrada em vigor do Código de IRS, o terreno em causa ainda não tinha a natureza de terreno para construção. Porque as partes integrantes dos edifícios têm a mesma natureza dos edifícios a que estão ligados.

A natureza que tinha à data da alienação e em resultado da operação de destaque não releva para este efeito.» (sublinhado nosso)

Voltando ao caso em análise, constata-se que uma quota-parte (13%) do Prédio foi adquirido em 1973 enquanto prédio rústico, pelo que os ganhos resultantes da sua alienação não estavam sujeitos a IMV.

Na data da entrada em vigor do Código do IRS, em 01-01-1989, o Prédio mantinha a qualidade de prédio rústico. A alteração qualitativa do Prédio de rústico para terreno para construção ocorreu já na vigência do Código do IRS, isto é, após 01-01-1989.

Deste modo, é forçoso concluir que se encontravam preenchidos os critérios previstos no regime transitório previsto no artigo 5.º do DL 445-A/88 para excluir de tributação, em sede de IRS, os ganhos resultantes da alienação da quota-parte do Prédio com data de aquisição de 14-03-1973.

Face a todo o exposto, julga-se procedente o pedido formulado pela Requerente, impondo-se a anulação do despacho que indeferiu a reclamação graciosa com o n.º ...2022..., ofício..., do Serviço de Finanças de ..., notificado à Requerente em 31-05-2024.

Nessa medida, fica prejudicado, por ser inútil, o conhecimento das restantes questões colocadas pela Requerente.

B.     {C}{C}Dos juros indemnizatórios

A Requerente pede, ainda, a condenação da Requerida no pagamento de juros indemnizatórios, com fundamento em erro imputável aos serviços, nos termos do artigo 43.º da LGT.

Nos termos do artigo 43.º, n.º 1, da LGT, na parte aqui aplicável, «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido». 

No caso em apreço, concluiu-se, nos termos acima expostos, que o despacho que indeferiu a reclamação graciosa com o n.º ...2022..., ofício ..., do Serviço de Finanças de ..., notificado à Requerente em 31-05-2024, padece do vício de violação de lei que lhe são imputados no pedido de pronúncia arbitral apresentado pela Requerente, havendo lugar ao pagamento de juros indemnizatórios, pois a ilegalidade daquele ato é imputável à Requerida, que, por sua iniciativa, o praticou sem suporte legal.

Consequentemente, tem a Requerente direito a juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º, n.º 1, da LGT e do artigo 61.º do CPPT, calculados sobre a quantia que pagou indevidamente, à taxa dos juros legais prevista no artigo 559.º do Código Civil e, atualmente, na Portaria n.º 291/2003, de 8 de abril (artigos 43.º, n.º 4, e 35.º, n.º 10, da LGT).

V.         {C}{C}Decisão

Nestes termos, e com os fundamentos expostos, decide o presente Tribunal Arbitral: 

a)     {C}{C}Julgar totalmente procedente o pedido de pronúncia arbitral, anulando-se a decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada pela Requerente;

 

b)     {C}{C}Condenar a Requerida ao pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º da LGT.

 

VI.        {C}{C}Valor do processo

Fixa-se ao processo o valor de € 27.251,33, em conformidade com o disposto no artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT, aplicável por remissão do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”).

VII.        {C}{C}Custas arbitrais

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante de custas arbitrais em € 1.530,00, de acordo com a Tabela I anexa ao RCPAT, a cargo da Requerida.

Notifique-se.

Lisboa, 8 de maio de 2025

 

O Tribunal Arbitral,

 

Sérgio Santos Pereira