DECISÃO ARBITRAL
I. Relatório
1. A, S.A., sociedade anónima com o NIPC … e sede na Avenida … Lisboa, a que corresponde o serviço periférico local de finanças de Lisboa 1, sito na..., veio, ao abrigo do disposto pelo artigo 99º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e artigos 2.º, n.º 1, al. a) e 10.º, n.º 1, al. a) e n.º 2, do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária – RJAT), requerer a constituição de Tribunal Arbitral Singular e de pronúncia arbitral.
2. É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira.
3. A Requerente pretende a anulação dos atos de liquidação da primeira prestação de Imposto do Selo (verba n.º 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo), e respetivas guias de pagamento, relativos ao ano de 2013, titulados pelos seguintes documentos:
a) Doc. nº 2014 … – …-RCD – Valor Patrimonial € 66.820,00;
b) Doc. nº 2014 … – …-RCE – Valor Patrimonial € 66.820,00;
c) Doc. nº 2014 … – …-1D – Valor Patrimonial € 68.770,00;
d) Doc. nº 2014 … – …-1E – Valor Patrimonial € 68.770,00;
e) Doc. nº 2014 … – …-2D – Valor Patrimonial € 68.770,00;
f) Doc. nº 2014 … – …-2E – Valor Patrimonial € 68.770,00;
g) Doc. nº 2014 … – …-3D – Valor Patrimonial € 69.460,00;
h) Doc. nº 2014 … – …-3E – Valor Patrimonial € 69.460,00;
i) Doc. nº 2014 … – …-4D – Valor Patrimonial € 69.460,00;
j) Doc. nº 2014 … – …-4E – Valor Patrimonial € 69.460,00;
k) Doc. nº 2014 … – …-5D – Valor Patrimonial € 112.190,00;
l) Doc. nº 2014 … – …-5E – Valor Patrimonial € 112.190,00;
m) Doc. nº 2014 … – …-6D – Valor Patrimonial € 112.190,00;
n) Doc. nº 2014 … – …-6E – Valor Patrimonial € 112.190,00;
o) Doc. nº 2014 … – …-7D – Valor Patrimonial € 99.920,00;
p) Doc. nº 2014 … – …-7E – Valor Patrimonial € 99.920,00;
q) Doc. nº 2014 … – …-8E – Valor Patrimonial € 49.430,00.
4. A Requerente pretende igualmente a anulação dos atos de liquidação da segunda prestação de Imposto do Selo (verba n.º 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo), e respetivas guias de pagamento, relativos ao ano de 2013, titulados pelos seguintes documentos:
a) Doc. nº 2014 … – …-RCD – Valor Patrimonial € 66.820,00;
b) Doc. nº 2014 … – …-RCE – Valor Patrimonial € 66.820,00;
c) Doc. nº 2014 … – …-1D – Valor Patrimonial € 68.770,00;
d) Doc. nº 2014 … – …-1E – Valor Patrimonial € 68.770,00;
e) Doc. nº 2014 … – …-2D – Valor Patrimonial € 68.770,00;
f) Doc. nº 2014 … – …-2E – Valor Patrimonial € 68.770,00;
g) Doc. nº 2014 … – …-3D – Valor Patrimonial € 69.460,00;
h) Doc. nº 2014 … – …-3E – Valor Patrimonial € 69.460,00;
i) Doc. nº 2014 … – …-4D – Valor Patrimonial € 69.460,00;
j) Doc. nº 2014 … – …-4E – Valor Patrimonial € 69.460,00;
k) Doc. nº 2014 … – …-5D – Valor Patrimonial € 112.190,00;
l) Doc. nº 2014 … – …-5E – Valor Patrimonial € 112.190,00;
m) Doc. nº 2014 … – …-6D – Valor Patrimonial € 112.190,00;
n) Doc. nº 2014 … – …-6E – Valor Patrimonial € 112.190,00;
o) Doc. nº 2014 … – …-7D – Valor Patrimonial € 99.920,00;
p) Doc. nº 2014 … – …-7E – Valor Patrimonial € 99.920,00.
5. A Requerente pede ainda a anulação das guias de pagamento referentes às terceiras prestações, caso venham a ser emitidas.
6. Os fundamentos da pretensão da Requerente são sintetizados no pedido de pronúncia arbitral, conforme se transcreve de seguida:
“60º
Assim, e em súmula:
a) as liquidações de Imposto de Selo ora impugnadas – consubstanciadas nas 33 notificações de liquidação de Imposto de Selo supra identificadas em 6º e 7º do presente requerimento – são ilegais, por violação da norma de incidência prevista na verba nº 28 da TGIS, conjugada com os artigos 2º, 4º, 6º, nº 1, al. a), 6º, nº 2, e 12º, nº 3, todos do CIMI (aplicáveis por força do nº 2 do artigo 67º do CIS) e, ainda, por violação do disposto no nº 2 do artigo 6º da Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro;
b) a verba nº 28 da TGIS é inconstitucional, por violação dos princípios da igualdade e capacidade contributiva, ínsitos nos artigos 13º e 104º, nº 3 da CRP;
c) a interpretação da AT no sentido de que a liquidação do imposto de selo previsto na verba nº 28 da respectiva Tabela Geral, relativamente ao ano de 2013, possa ser feita sem atender ao valor patrimonial de cada divisão com utilização independente é também inconstitucional, por ofensa dos princípios da igualdade e capacidade contributiva ínsitos nos artigos 13º e 104º, nº 3 da CRP da CRP.
61º
Em face do exposto, deverá ser declarada a ilegalidade e inconstitucionalidade da referida norma de incidência e providenciada a consequente anulação dos actos tributários de liquidação do Imposto do Selo sobre propriedade imobiliária, no valor de € 9.148,29, bem como a anulação das respectivas guias de pagamento referentes às primeiras e segundas prestações, já emitidas, e terceiras prestações, caso venham a ser emitidas.
Termos em que se requer a constituição de Tribunal Arbitral Singular para pronúncia sobre a ilegalidade dos actos de liquidação do Imposto de Selo objecto da presente impugnação e sua consequente anulação, com todas as legais consequências.”
7. A Requerente optou pela não designação de árbitro.
8. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou o árbitro do tribunal arbitral, o qual comunicou a aceitação daa designação no prazo aplicável.
9. As partes foram notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.
10. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral singular foi constituído em 17-09-2014.
11. A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta, na qual defende a improcedência do pedido de pronúncia arbitral, não tendo suscitado qualquer exceção.
12. A Autoridade Tributária e Aduaneira sustenta, em síntese, que:
“6.º
Ora, o que está aqui em causa é uma liquidação que resulta da aplicação directa da norma legal, que se traduz em elementos objectivos, sem qualquer apreciação subjectiva ou discricionária.
7.º
O conceito de prédio encontra-se definido no artigo 2º, n.º 1 do CIMI, estando estatuído no seu n.º 4 que no regime de propriedade horizontal, cada fracção autónoma é havida como constituindo um prédio.
8.º
Decorre da análise do preceito normativo que um «prédio em propriedade total com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente» é, inequivocamente, diverso de um imóvel em regime de propriedade horizontal, constituído por fracções autónomas, ou seja, vários prédios.
9.º
O artigo 12º do CIMI estatui o conceito de matriz predial, sendo que o seu n.º 3 respeita, exclusivamente, à forma de registar os dados matriciais.
10.º
Quanto à liquidação de IMI, tratando-se de um prédio em propriedade total, o VP que serve de base ao seu cálculo, será indiscutivelmente o VP que a ora Requerente define como «valor global do prédio».
[…]
21.º
Encontrando-se o prédio em regime de propriedade total, não possuindo fracções autónomas, às quais a lei fiscal atribua a qualificação de prédio, porque da noção de prédio do artigo 2º do CIMI, só as fracções autónomas de prédio em regime de propriedade horizontal são tidas como prédios – n.º 4 do citado artigo 2º do CIMI.
22.º
Do exposto, deve o vício de violação de lei por erro quanto aos pressupostos de direito ser julgado improcedente, mantendo-se na ordem jurídica as liquidações impugnadas por configurarem uma correcta aplicação da lei aos factos.
[…]
24.º
Não se vislumbra como é que a tributação em causa possa ter violado o princípio da igualdade.
25.º
Sobre a violação deste princípio, a AT entende que a previsão da verba 28.1 da TGIS não consubstancia qualquer violação ao princípio da igualdade, inexistindo qualquer discriminação na tributação de prédios constituídos em propriedade horizontal e prédios em propriedade total com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, ou entre prédios com afectação habitacional e prédios com outras afectações.
[…]
43.º
Tudo o que está agora a ser defendido nesta sede arbitral já foi objecto de informação vinculativa por parte da AT, com despacho de concordância de 11.2.2013 do Substituto Legal do Director-Geral da Autoridade Tributária.
44.º
Pelo que, temos, necessariamente concluir que os actos tributários em causa não violaram qualquer princípio legal ou constitucional, devendo, assim ser mantidos.
45.º
Pelo que, se mantêm integralmente válidas e legais as liquidações ora impugnadas e devidamente fundamentadas no processo administrativo, concluindo-se pela legalidade das mesmas.
Nos termos supra expostos, e nos demais de Direito que V.ª Exa. doutamente suprirá, deve o presente pedido de pronúncia arbitral ser julgado improcedente, absolvendo-se a entidade Requerida do pedido.”
13. Por despacho de 29/10/2014, o Tribunal decidiu dispensar a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, bem como dispensar a produção de alegações.
14. O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído.
15. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
16. Não se vislumbra qualquer nulidade.
II. Matéria de facto
a. Factos provados
17. Consideram-se provados os seguintes factos:
17.1.A Requerente é proprietária do prédio urbano sito na Av. … concelho de Lisboa, inscrito na matriz predial urbana daquela freguesia sob o artigo …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob a ficha n.º … da extinta freguesia de …;
17.2.O imóvel identificado supra encontra-se inscrito na caderneta predial urbana em propriedade total, com 19 andares ou divisões suscetíveis de utilização independente, com o Valor Patrimonial Total (VPT) de € 1.754.280,00;
17.3.Os 19 andares ou divisões suscetíveis de utilização independente (17 afetas a habitação e 2 afetas a comércio) têm os seguintes valores patrimoniais tributários (VPT), determinados nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI):
a) CVD (LJ…), com afetação comercial, com o VPT de € 84.160,00;
b) LJ…, com afetação comercial, com o VPT de € 285.530,00;
c) RCD, com afetação habitacional, com o VPT de € 66.820,00;
d) RCE, com afetação habitacional, com o VPT de € 66.820,00;
e) 1D, com afetação habitacional, com o VPT de € 68.770,00;
f) 1E, com afetação habitacional, com o VPT de € 68.770,00;
g) 2D, com afetação habitacional, com o VPT de € 68.770,00;
h) 2E, com afetação habitacional, com o VPT de € 68.770,00;
i) 3D, com afetação habitacional, com o VPT de € 69.460,00;
j) 3E, com afetação habitacional, com o VPT de € 69.460,00;
k) 4D, com afetação habitacional, com o VPT de € 69.460,00;
l) 4E, com afetação habitacional, com o VPT de € 69.460,00;
m) 5D, com afetação habitacional, com o VPT de € 112.190,00;
n) 5E, com afetação habitacional, com o VPT de € 112.190,00;
o) 6D, com afetação habitacional, com o VPT de € 112.190,00;
p) 6E, com afetação habitacional, com o VPT de € 112.190,00;
q) 7D, com afetação habitacional, com o VPT de € 99.920,00;
r) 7E, com afetação habitacional, com o VPT de € 99.920,00;
s) 8E, com afetação habitacional, com o VPT de € 49.430,00;
17.4.Nenhum dos andares ou divisões descritos tem, portanto, um valor patrimonial tributário de valor superior a € 1.000.000,00;
17.5.Para efeitos da Verba n.º 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS) a Autoridade Tributária e Aduaneira considerou o somatório do VPT dos diversos andares ou divisões com afetação habitacional, correspondente ao valor total de € 1.384.590,00;
17.6.Com base neste valor, a Autoridade Tributária e Aduaneira procedeu às liquidações de Imposto do Selo da verba 28.1 da TGIS, ora contestadas pela Requerente, à taxa de 1%.
b. Factos não provados
18. Dos factos com interesse para a decisão da causa, não se provaram os que não constam da factualidade descrita supra.
c. Fundamentação da decisão da matéria de facto
19. Os factos foram dados como provados com base na prova documental.
III. Matéria de direito
20. Fixada a factualidade relevante, verifica-se estar em causa no presente processo exclusivamente matéria direito.
21. A questão a decidir pelo Tribunal é a que se prende com saber se o valor patrimonial tributário (VPT) a considerar para efeito de aplicação da Verba 28 da TGIS, estando em causa prédio não constituído em regime de propriedade horizontal, é o VPT atribuído a cada andar ou divisão com utilização independente e com afetação habitacional, ou se é o VPT global, correspondente ao somatório dos VPT de cada andar ou divisão suscetível de utilização independente e com afetação habitacional.
22. A Verba 28 da TGIS, ora em apreciação, foi aditada pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro, com o seguinte teor:
“28 – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000,00 – sobre o valor patrimonial tributário para efeito de IMI:
28.1 – Por prédio com afetação habitacional – 1%
28.2 – Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças – 7,5%.”
23. O Código do Imposto do Selo (CIS) e a respetiva Tabela Geral, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro, não esclarece qual o sentido da expressão “prédio com afetação habitacional”.
24. O art. 68.º, n.º 2 do CIS, aditado pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro, prevê que “[à]s matérias não reguladas no presente Código respeitantes à verba n.º 28 da Tabela Geral aplica-se, subsidiariamente, o disposto no CIMI.”.
25. O legislador, no n.º 1 do art. 2.º do CIMI, adota o seguinte conceito de prédio:
“Para efeitos do presente Código, prédio é toda a fracção de território, abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial.”
26. Conforme observam SILVÉRIO MATEUS e CURVELO DE FREITAS, “o n.º 1 deste artigo [do artigo 2.º] prevê a existência de três requisitos necessários para que se possa estar perante o conceito de prédio, a saber, a estrutura física, a patrimonialidade e o valor económico” (Os Impostos sobre o Património Imobiliário. O Imposto do Selo, Lisboa, Engifisco, 2005, p. 101, anotação n.º 1.1).
27. Deste modo, não ficam excluídas do conceito de prédio, relevante para efeitos de CIMI e de CIS, os andares ou divisões de utilização independente de imóvel inscrito na caderneta predial urbana em propriedade total.
28. O n.º 4 do artigo 2.º do CIMI prevê ainda que:
“para efeitos deste imposto [IMI], cada fracção autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio”.
29. Mais uma vez, deste preceito não resulta a exclusão do conceito de prédio, dos andares ou divisões de utilização independente de imóvel em propriedade total.
30. No n.º 4 do art. 2.º do CIMI o legislador esclarece, de forma inequívoca, que as frações autónomas de imóveis inscritos em propriedade horizontal são consideradas prédios, para efeitos de IMI.
31. Mas tal não legitima o intérprete a fazer uma interpretação a contrario, no sentido de excluir do conceito de prédio as unidades de utilização independente de imóveis inscritos em propriedade total.
32. Parece, na verdade, que a ratio, do n.º 2 do art. 4.º é precisamente a de permitir uma interpretação extensiva do disposto no n.º 1 do art. 2.º, de modo a incluir no conceito de prédio as unidades (frações, andares ou divisões) de utilização independente.
33. Este sentido parece, aliás, ser confirmado pelo disposto no n.º 3 do artigo 12.º do CIMI, que a seguir se transcreve:
“Cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respectivo valor patrimonial tributário.”
34. Donde resulta que as unidades de utilização independente de imóveis inscritos em propriedade total são objeto de avaliação com base nos critérios previstos no artigo 38.º do CIMI.
35. Já o art. 6.º do CIMI enuncia as espécies de prédios urbanos, e prevê que “[h]abitacionais, comerciais, industriais ou para serviços são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins”.
36. Conforme é afirmado na Decisão Arbitral proferida no Processo n.º 50/2013,
“Daqui podemos concluir que, na ótica do legislador, não importa o rigor jurídico-formal da situação concreta do prédio mas sim a sua utilização normal, o fim a que se destina o prédio. Concluímos ainda que para o legislador a situação do prédio em propriedade vertical ou em propriedade horizontal não relevou, pois que nenhuma referência ou distinção é efetuada entre uns e outros. O que releva é a verdade material subjacente à sua existência enquanto prédio urbano e à sua utilização.”
37. Ao considerarmos o elemento literal da interpretação constatamos que, na parte final do preceito contido na verba 28.1 da TGIS, se determina que o valor tributável corresponde ao “valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI”.
38. A Autoridade Tributária e Aduaneira considera como VPT relevante para efeito de aplicação da verba 28.1 da TGIS o VPT global do imóvel inscrito em propriedade total, em manifesta contradição com a prática de uma pluralidade de atos de liquidação, relativos aos vários andares suscetíveis de utilização independente.
39. Do elemento literal da interpretação, em conjugação com os elementos sistemático e teleológico, resulta que o valor patrimonial tributário a considerar para efeitos da aplicação da verba 28.1 do CIS é o correspondente a cada uma das unidades suscetíveis de utilização independente.
40. E afigura-se-nos ser este também o entendimento mais conforme com o princípio da prevalência da substância sobre a forma.
41. Para além disso, este é o sentido mais conforme com o princípio constitucional da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa.
42. A Autoridade Tributária e Aduaneira, ao aplicar de modo diferenciado a verba 28.1 da TGIS consoante a unidade habitacional esteja inserida em imóvel inscrito em propriedade horizontal ou em propriedade total está a fazer prevalecer um critério formal de diferenciação, em detrimento da igualdade material exigida pela Lei Fundamental.
43. Do ponto de vista da capacidade contributiva, enquanto critério operativo do princípio da igualdade, que postula uma igualdade material, é irrelevante que o prédio esteja em propriedade vertical ou em propriedade horizontal – a capacidade contributiva evidenciada é a mesma, devendo a aplicação da verba 28.1 da TGIS ser feita nos mesmos termos.
44. Sendo possível interpretar a verba 28.1 da TGIS em conformidade com a Constituição, é de afastar o julgamento da inconstitucionalidade da norma nela contida.
45. Assim, relativamente a imóveis inscritos em propriedade total, apenas está sujeito a Imposto do Selo, por aplicação da verba 28.1 da TGIS, o andar ou divisão suscetível de utilização independente com afetação habitacional cujo VPT seja igual ou superior € 1.000.000,00.
46. Atendendo a que, no presente processo, nenhum dos andares relativamente aos quais foi liquidado Imposto do Selo por aplicação da Verba 28.1 da TGIS tem um VPT igual ou superior € 1.000.000,00, conclui-se pela ilegalidade dos respetivos atos de liquidação.
47. O facto de os argumentos apresentados pela Autoridade Tributária e Aduaneira se escorarem numa informação vinculativa, com despacho de concordância do Substituto Legal do Diretor-Geral da Autoridade Tributária de 11-02-2013, não releva para a decisão a tomar por este Tribunal, uma vez que esta se alicerça necessariamente em critérios de legalidade e não em interpretações previamente adotadas pela administração fiscal, designadamente em informações vinculativas prestadas.
IV. Decisão
Nestes termos, e com os fundamentos expostos, o Tribunal Arbitral decide julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, com a consequente anulação, com todos os efeitos legais, dos atos de liquidação impugnados.
V. Valor do processo
O valor do processo é fixado em € 9.148,29, conforme o disposto no artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento e Processo Tributário e no artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
VI. Custas
Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 918,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida.
Lisboa, 17 de dezembro de 2014
O Árbitro,
Paulo Nogueira da Costa