SUMÁRIO:
1- A impugnação judicial é o meio processual adequado para discutir a legalidade do ato de liquidação, independentemente de ter sido ou não precedida de meio gracioso, e, no caso de assim ter acontecido, independentemente do teor da decisão que sobre ele recaiu, ou seja, de esta ser uma decisão formal ou de mérito
2-O Adicional de Solidariedade sobre o Sector Bancário(ASSB, contido no Anexo VI da Lei n.º 27-A/2020, de 24/7, é um imposto e não uma mera contribuição financeira a favor de uma entidade pública.
3-Não são inconstitucionais, por violação dos princípios da igualdade e do corolário logico da tributação segundo a capacidade contributiva, as normas conjugadas do n.º 2 do art. 1º. ,do art. 2.º e da alínea a) do art 3º do Regime do ASSB , constantes desse Anexo VI .
4- Como o ASSB só foi criado pela Lei nº. 27 A/2020, destinando-se a entrar em vigor, segundo o seu art. 26º, no dia seguinte ao da sua publicação, 25/7/2020, o cálculo da base de incidência do primeiro semestre de 2020, nos termos dos alínea a) do nº 1 do art. 21º dessa Lei , por referência à média dos saldos finais de cada mês desse período; implica tributação retroativa, com a consequente violação do nº 3 do artº. 103º. da CRP.
5- A exigida correspondência entre o saldo médio relativo ao primeiro semestre e os saldos finais de cada mês considerados nas contas anuais não salvaguarda a não retroatividade do imposto, visto que a aprovação das contas referentes a 2020, em atenção ao disposto nºs 1 e 5 do art. 65º do Código das Sociedades Comerciais (CSC), só pode ocorrer após o encerramento de cada exercício anual, e, portanto, após o termo do período de tributação a que o tributo respeita.
6- As regras de determinação da base de incidência da CSB e, por remissão, do SB; não violam a proibição da discriminação em razão da nacionalidade, nem a liberdade de estabelecimento referidas nos arts. 18.º e 49.º do TFUE, por não submeterem a um tratamento menos favorável a base tributária das sucursais financeiras das instituições financeiras não residentes face às homólogas entidades residentes, mas a um tratamento similar.
7-Com a revogação do nº 2 do art. 78º da LGT, operada pela alínea h) do nº 1 do art. 215º da Lei nº 7-A/2016, de 30/3, o prazo excecional da revisão dos atos tributários consagrado no nº 1 dessa norma deixou de ser aplicável à revisão da autoliquidação do ASSB , passando a impugnação desta , nos termos do nº 1 do art. 131º do CPPT, a depender de reclamação necessária a deduzir no prazo normal de dois anos aí previsto, salvo quando, nos termos do nº 3 dessa norma legal, estiver exclusivamente em causa matéria de direito e a autoliquidação -tiver sido efetuada de acordo com orientações genéricas emitidas pela administração tributária.
8-Não existe erro imputável aos serviços para efeitos desse nº 1 do art. 78º se estes se limitam a aplicar , sem qualquer erro de julgamento, norma legal cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade não tenham sido anteriormente declarada com força obrigatória geral por acórdão do Tribunal Constitucional transitado em julgado
DECISÃO ARBITRAL
I-RELATÓRIO
1. Identificação das partes.
1.1 Requerente
A... – SUCURSAL EM PORTUGAL (anteriormente B..., S.A. e C...– SUCURSAL EM PORTUGAL), titular do NIPC/ NIF..., com sede na Rua..., ..., ...-... ..., Portugal
1.2. Requerida
Autoridade Tributária e Aduaneira( AT).
2- Tramitação do processo.
2.1 O pedido de pronúncia arbitral foi apresentado a 18/10/2024 e na mesma data encaminhado automaticamente para a Requerente e para a Requerida, tendo a Requerente optado por não designar árbitro.
2.2. A 4/11/2024, o pedido seria notificado à AT.
2.3. A 15 /11/2024, a Requerida juntaria ao processo despacho de designação do dia anterior dos seus representantes processuais, os juristas ... e ... .
2.4. A 17/12/2024, seria nomeado o Árbitro António Lima Guerreiro, da lista do CAAD, cujo despacho de aceitação data de 22/11/2024.
2.5. A 8/1/2025, despacho do presidente do Conselho Deontológico do CAAD o procederia à constituição do Tribunal Arbitral.
2.6 Na mesma data, o Tribunal Arbitral notificaria a diretora- geral da AT para, no termos do art. 17º do RJAT, no prazo de 30 dias, apresentar Resposta, requerer, se entender necessário, prova adicional, podendo também dentro dessa prazo, revogar total ou parcialmente o ato impugnado e juntar o Processo Administrativo(PA).
2.7. A 11/2/2025, a Requerida juntou a Resposta e o PA.
2.8 A 18/3/2025, o Tribunal Arbitral daria o seguinte despacho
” Por estarem em causa apenas questões de direito, já amplamente apreciadas na jurisprudência dos tribunais arbitrais , dispensa-se a reunião prevista no art. 18º do RJAT, bem como a realização de alegações, devendo em conformidade a Requerente proceder ao pagamento da taxa de justiça subsequente” .Esse despacho foi, na mesma data, notificado à Requerente.
2.9. A 21/3/2025, a Requerente procederia ao pagamento da taxa de justiça subsequente.
2.10.Na mesma data, apresentaria ao CAAD, ao abrigo do princípio da colaboração, exposição em que invoca a favor da sua posição jurisprudência recente do TC e do TJUE .
2.11. Toda essa jurisprudência está publicada e é do conhecimento da Requerida, como resulta da Resposta
PRESSUPOSTOS RELATIVOS AO TRIBUNAL E ÀS PARTES
3.1. O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído.
3.2. As Partes gozam de personalidade e de capacidade judiciárias e encontram-se regularmente representadas.
4. OBJETO DO PROCESSO
O presente pedido de pronúncia arbitral tem por objeto a apreciação da legalidade do expresso indeferimento, a 27 de agosto de 2024, do pedido de revisão oficiosa n.º ...2024..., dirigido a 7 de junho de 2024 pela Requerente ao Diretor de Serviço Central da Unidade dos Grandes Contribuintes (UGC) , das autoliquidações do ASSB apuradas na Declaração modelo 57 dos anos de 2020 e 2021, no montante total de € 39.620,52 , dos quais € 19.430,76 respeitam a 2020 e € 20. 189,76 a 2021.
5. POSIÇÃO DA REQUERENTE
Sustenta a Requerente a impugnabilidade do ato de indeferimento de reclamação graciosa resultar dos nºs 1 e 4 do art,. 78º da LGT, que asseguram ao contribuinte respetivamente o direito à revisão do ato tributário no prazo de 4 anos com fundamento em erro imputável aos serviços na liquidação e o direito à revisão da matéria coletável no prazo de dois anos com fundamento em injustiça grave ou notória não imputável a comportamento negligente do contribuinte , bem como das alíneas c) e d) do 1 do art. 97º ,que garantem a impugnação judicial do indeferimento total ou parcial das reclamações graciosas, assim como dos demais atos administrativos em matéria tributária, quando a impugnação comporte a apreciação da legalidade da liquidação
Por ato tributário deve entender-se para o efeito, não apenas o ato de liquidação em sentido estrito, como a autoliquidação,
Refere também a Requerente , por outro lado, que. na declaração modelo 57, autoliquidou o ASSB de 2020, a 11/11/2020 e o ASSB de 2021 a 13/12/2021, tendo, assim, cumprido os prazos para apresentação dos pedidos de revisão dos atos tributários dos nºs 1 e 4 desse art. 78º.
O princípio do inquisitório e da verdade material fundamenta-se na obrigação de a Administração prosseguir o interesse público (n.º 1 do art 266.º da CRP e art. 55º da LGT), assim como no dever de imparcialidade da atuação administrativa ( n.º 2 desse art. 266º), o que a obrigaria a revogar oficiosamente os atos ilegais.
Assim, segundo a Requerente, tendo a AT conhecimento da ilegalidade da autoliquidação através da jurisdição arbitral e constitucional, . não poderia deixar de oficiosamente a anular, ainda quando estiverem em causa factos contrários aos interesses patrimoniais do credor tributário
De outro modo seria violado o princípio da igualdade, nos termos do nº 2 do art. 13º da CPP, bem como o efeito direto das normas sobre direitos, liberdades e garantias estabelecido no nº 1 do art. 18º da CRP.
O ASSB não é materialmente , por outro lado, um verdadeiro adicional, -na aceção dos acórdãos do TC nºs 365/08 e 539/2015, o que pressuporia que, tal como a chamada CSB, imposto principal, a sua qualificação como contribuição financeira a favor do Estado e não como imposto.
Embora disponha de uma estrutura de incidência (subjetiva e objetiva) semelhante à da CSB, o ASSB não incide (como devem incidir os verdadeiros adicionais…) sobre a coleta da CSB enquanto imposto principal.
A introdução do ASSB não se traduziu na criação de um imposto com a mesma natureza da CSB. Na realidade, integra um regime jurídico-tributário autónomo que, em relação às bases de incidência subjetiva e objetiva, convive com as mesmas regras do ASSB, como esclareceria a Decisão Arbitral nº 104/2023- T.
Para essa Decisão Arbitral, o ASSB é um imposto especial sobre o sector bancário, totalmente autónomo da CSB e ‘completo’ – «(…) pois a Lei que o criou prevê todos os seus elementos essenciais, nomeadamente a incidência subjetiva e objetiva o que acontece é que esta é uma como que uma “duplicação” da CSB, o que mostra bem que o uso do termo “adicional” não obedeceu a qualquer razão técnico-legislativa, mas ao propósito político de atribuir ao ASSB um nome.”.
Como imposto, o ASSB constitui uma prestação pecuniária, unilateral e coativa, exigida pelo Estado às instituições de crédito, filiais e sucursais destas, enquanto sujeitos passivos detentores de capacidade contributiva, sem qualquer sinalagma de atividade.
Não o carateriza qualquer contrapartida administrativa, nem específica nem genérica, provocada ou aproveitada pela generalidade dos sujeitos passivos (ou pelo setor em que estes se inserem, o setor bancário).
Aliás, o pagamento do ASSB apenas é exigível às instituições de crédito que manifestem uma determinada capacidade contributiva, característica que é própria dos impostos.
No caso do ASSB, não se verifica qualquer caráter de bilateralidade, no sentido de que: (i) Não se constata a presença de qualquer tipo de serviço público prestado ou liminarmente aproveitado pelos sujeitos passivos, não se encontrando uma qualquer lógica de equivalência de custo; (ii)Não existe uso privativo do domínio público, nem se constata o aproveitamento de um bem do domínio público que exclui ou, pelo menos, limita o aproveitamento por outrem; e (iii) Não está em causa a remoção de um qualquer obstáculo jurídico à atividade dos respetivos sujeitos passivos, suscetível de legitimar a imposição de um tributo pela sua hipotética remoção, nem se demonstra a existência de um custo do qual resultem benefícios individualmente imputáveis aos sujeitos passivos.
De facto, o ASSB não teria, para a Requerente, qualquer nexo de correspetividade com a atividade dos seus sujeitos passivos, sendo criado com objetivos alheios à compensação de prestações públicas aproveitadas pelas instituições de crédito.
Na verdade, o n.º 2 do art. 1.º do Regime da ASSB afirma perentoriamente: ▪ «[T]em por objetivo reforçar os mecanismos de financiamento do sistema de segurança social, como forma de compensação pela isenção de imposto sobre o valor acrescentado (IVA) aplicável à generalidade dos serviços e operações financeiras, aproximando a carga fiscal suportada pelo setor financeiro à que onera os demais setores»
O regime que cria o ASSB padeceria, para a Requerente, das seguintes ilegalidades e inconstitucionalidades:
i) Violação do princípio da não retroatividade da lei fiscal, previsto no n.º 3 do art. 103.º da CRP , relativamente às autoliquidações que tiveram por base o 1.º semestre de 2020;
ii)Violação do princípio constitucional da igualdade, previsto no art. 13.º da CRP , nas suas vertentes de generalidade e universalidade dos impostos e de proibição do arbítrio;
iii) Violação do princípio da capacidade contributiva, previsto nos arts. 13.º, 103.º e 104.º da CRP , enquanto corolário do princípio da igualdade tributária;
iv). Violação do princípio da proporcionalidade legislativa (sic), previsto no n.º 2 do art. 18.º e no n.º 4 do art. 104.º, da CRP , na sua dimensão de proibição do excesso e por ser uma medida desadequada e desnecessária aos objetivos a prosseguir com a criação do imposto.
v)Violação do Direito da União Europeia, designadamente da liberdade de estabelecimento, prevista no art. 49.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia(TFUE) , bem como a violação da Diretiva 2014/59/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15/5, que estabelece as medidas que integram o mecanismo único de resolução das instituições de crédito que atuam no âmbito da UE. , *dado que, segundo o -acórdão do TJUE no proc. C -342, a liberdade de estabelecimento garantida nos artigos 49.° e 54.° TFUE deve ser interpretada no sentido de que se opõe a uma regulamentação de um Estado‑Membro que cria um imposto cuja base de incidência é constituída pelo passivo das instituições de crédito com sede situada no território desse Estado‑Membro, das filiais e das sucursais das instituições de crédito cuja sede se situa no território de outro Estado‑Membro, quando a referida regulamentação permita deduzir capitais próprios e instrumentos de dívida equiparáveis a capitais próprios, que não podem ser emitidos por entidades sem personalidade jurídica, como são essas sucursais
6-POSIÇÂO DA REQUERIDA
Para a Requerida, o indeferimento liminar do pedido de revisão oficiosa constitui um ato administrativo em matéria tributária, por não implicar a apreciação da legalidade de um ato de liquidação, e não um ato tributário “stricto sensu”.
Nessa medida, somente a ação administrativa e não a impugnação judicial constitui o meio processual adequado para impugnar a decisão de rejeição liminar sub judice, nos termos da alínea p) do nº 1 do art. 97º do CPPT.
À data da apresentação do pedido de revisão oficiosa já, há muito, se encontravam consolidadas na ordem jurídica as autoliquidações que a Requerente contesta.
É facto que a Requerente fundamentou o pedido de revisão oficiosa no n.º 4 do art. 78.º da LGT e no prazo excecional de 3 anos aí previsto para revisão da matéria tributável apurada com fundamento em injustiça grave ou notória.
Não está em causa , no entanto, qualquer injustiça grave ou notória, ou outro erro imputável aos serviços na liquidação, mas uma pretensa inconstitucionalidade da norma em que se liquidação se baseou.
É, assim, forçoso concluir pela inimpugnabilidade do ato autoliquidação de ASSB em crise por falta de precedência de impugnação administrativa necessária dentro do prazo legalmente previsto.
A Requerida, por outro lado, recusa que a aplicação do ASSB ao primeiro semestre de 2020, , por remissão expressa da alínea a) do art. 21.º da Lei nº. 27-A/2020, envolva qualquer tipo de retroatividade constitucionalmente proibida.
O ASSB do primeiro semestre de 2020 incide, como o dos períodos de tributação subsequentes, sobre «os passivos apurados e aprovados» pelo sujeito passivo [deduzidos dos fundos próprios de base (Tir 1), dos complementares (Tier 2) e dos depósitos abrangidos do Fundo de Garantia de Depósitos].
Para a formação do facto tributário do ASSB relativo ao primeiro semestre de 2020, concorrem as complexas operações de avaliação desses elementos e os ajustamentos posteriores à data de balanço, ainda quando apurados posteriormente ao termo desse semestre , mas refletidos no exercício anual.
A disposição transitória da alínea a) do art. 21.º da Lei nº. 27-A/2020 regula a determinação da base de incidência do ASSB, feita com referência à média semestral dos saldos finais de cada mês que tenham correspondência nas contas relativas ao primeiro semestre de 2020, tal como publicadas em cumprimento da obrigação estabelecida no Aviso do Banco de Portugal n.º 1/2019, de 31/1, que atualiza o enquadramento normativo do Banco de Portugal sobre os elementos de prestação de contas.
Do Aviso do Banco de Portugal n.º 1/2019 resultam obrigações de prestação de contas intercalares que impendem sobre os sujeitos passivos do ASSB, cujos relatórios são objeto de divulgação pública e necessariamente são objeto de operações de apuramento e aprovação em termos equivalentes às contas anuais.
Por outro lado, é facto que o balanço de final de cada período (quer seja anual ou trimestral) só fica fechado com a divulgação de contas, o que implica que possa haver (e há por norma) ajustamentos com base em análises mais aprofundadas feitas às contas (e.g. imparidades), que mudem o valor do balanço ou dos resultados face à fotografia inicial.
Deste modo, o legislador remete expressamente o cálculo da base de incidência do ASSB do primeiro semestre de 2020 para uma obrigação de prestação e divulgação de contas que vincula legalmente as instituições financeiras sujeitas ao ASSB que pode ser cumprida após o termo desse período., embora dentro do exercício anual.
Tal obrigação de prestação e divulgação de contas, através dos chamados relatórios intercalares aprovados , é cumprida pelos órgãos competentes do sujeito passivo.
Trata-se de uma evidência, que pode ser constatada em qualquer relatório intercalar de instituições financeiras publicados online, nos quais, em todos eles sem exceção, é referida a aprovação das contas com referência a 30 de junho do mesmo ano pelas respetivas assembleias gerais.
Para a Requerida “[…] o que releva na formação do facto tributário sujeito a ASSB é o momento do apuramento e aprovação das contas e não o «facto material de contabilisticamente ser apurada a existência de poder passivo»”. A formação do facto tributário no ASSB, que não seria o resultado contabilístico propriamente dito, mas o seu reflexo nas contas anuais, só se verificaria com a conclusão do processo das contas anuais, ainda não encerrado a quando da entrada em vigor da Lei nº 27-A/2020, motivo pelo qual a tributação do ASSB não poder ser considerada como tendo efeitos retroativos.
A proibição do arbítrio, ao contrário do que sustenta a Requerente, constitui por outro lado, um limite externo da liberdade de conformação ou de decisão dos poderes públicos, servindo o princípio da igualdade como princípio negativo de controlo: nem aquilo que é fundamentalmente igual deve ser tratado arbitrariamente corno desigual, nem aquilo que é essencialmente desigual deve ser arbitrariamente tratado como igual.
Nesta perspetiva, o princípio da igualdade exige positivamente um tratamento igual de situações de facto iguais e um tratamento diverso de situações de facto diferentes.
Porém, a vinculação jurídico-material do legislador ao princípio da igualdade não elimina a liberdade de conformação legislativa, pois a ele pertence, dentro dos limites constitucionais, definir ou qualificar as situações de facto ou as relações da vida que hão-de funcionar como elementos de referência a tratar igual ou desigualmente.
Só quando os limites externos da discricionariedade legislativa forem violados, isto é, quando a medida legislativa não tem adequado suporte material, é que existe uma infração do princípio da igualdade enquanto proibição do arbítrio”.
No mesmo sentido, o TC tem reiteradamente reconhecido, em vasta jurisprudência sobre esta matéria, que o princípio da igualdade, na dimensão da proibição do arbítrio, atua como um princípio negativo de controlo da atividade do legislador: não proíbe o legislador da realização de todas e quaisquer distinções, mas apresenta-se aqui, como consequente do nº 1 do art. 13º da CRP, como limite objetivo da discricionariedade legislativa, proibindo o arbítrio.
Assim, pode o legislador, no âmbito da sua liberdade de conformação, estabelecer diferenciações de tratamento, desde que fundadas racional e objetivamente e ditadas pela razoabilidade. Pode considerar-se não existir censura constitucional, por outras palavras, quando ocorre um fundamento material suficiente que neutralize o arbítrio e afaste a discriminação infundada (cfr., v.g., os Acórdãos do TC nº 335/94, Plenário, ponto III. 2.1., n.º 563/96, Plenário, ponto III. 1.2., n.º 546/2011, 3.ª Secção, ponto 12, n.º 641/2013, Plenário, ponto 10, n.º 93/2014, Plenário, ponto 17 n.º 173/2014, Plenário, ponto 7, e n.º 526/2016, 1.ª Secção, ponto 6).
Como refere o Acórdão do TC n.º 437/2006, 3.ª Secção, ponto 7: «Na verdade, o princípio da igualdade, entendido como limite objetivo da discricionariedade legislativa, não veda à lei a adoção de medidas que estabeleçam distinções. Todavia, proíbe a criação de medidas que estabeleçam distinções discriminatórias, isto é, desigualdades de tratamento materialmente não fundadas ou sem qualquer fundamentação razoável, objetiva e racional. O princípio da igualdade, enquanto princípio vinculativo da lei, traduz-se numa ideia geral de proibição do arbítrio (cfr. por todos, Acórdão n.º 232/2003, (…)». Isto porque, ao legislador ordinário cabe o primado da concretização dos princípios constitucionais e a correspondente liberdade de conformação, a qual, na espécie, assume necessariamente amplitude considerável. Estando-se num domínio reservado à margem de conformação do legislador, há que apenas apreciar se tal diferença de regime legislativo se poderá ter por desrazoável” (acórdão n.º 545/2019).
Segundo o Acórdão do STA n.º 090/21.2BELRS, de 31/5/2023, no seguimento do Acórdão nº 0938/17.6BELRS, de 21/9/2022, as regras de determinação da base de incidência da ASSB , como as do imposto principal, a CSB, dada a total identidade do recorte da base de incidência em ambos os tributos que resulta dos arts. 3.º e 4.º da Portaria 121/2011 e arts. 3.º e 4.º do anexo IV da Lei n.º 27-A/2020),não violam a proibição de discriminação em razão da nacionalidade, nem a liberdade de estabelecimento (arts. 18.º e 49.º do TFUE),
Segundo essa jurisprudência, as sucursais nacionais de instituições financeiras residentes noutros países da União Europeia, não obstante carecerem de personalidade jurídica , podem ter elementos que sejam reconhecidos como capitais próprios afetos pela casa mãe (Tier 1 e 2), pelo menos via rúbrica de “capital afeto”; e nada impede, além disso, que a sociedade mãe aloque à sua sucursal em Portugal uma dotação de capital de base (“elementos do capital próprio”) registado em contas de capital próprio. Caso tenham esses capitais, podem deduzi-lo a base tributável da CSB e do ASSB.
A tese da Requerente basear- se-ia, assim , em uma interpretação errada do direito nacional, assente na ideia de que, por não terem personalidade jurídica , às sucursais nacionais de bancos estrangeiros não poder ser imputado qualquer passivo para efeitos de CSB ou ASSB, ao contrário do que acontece com os bancos residentes, o que não é verdade.
A diversidade de tratamento entre instituições financeiras residentes e não residentes, quando exista, não resulta ,assim, de qualquer diferenciação arbitrária mas da opção pela sede da instituição financeira não residente não afetar contabilisticamente capitais próprios ao exercício da atividade das sucursais . que apenas por esse motivo estas não podem deduzir. O direito a essa opção não é prejudicado pelo estatuto de sucursal da Requerente, já que vem reconhecido expressamente na lei.
7-Fundamentação
7.1 Fundamentação de facto.
7.1.1 Factos Provados
7.1.1.1. A... SUCURSAL EM PORTUGA LCA é a sucursal nacional de banco digital membro do grupo bancário cuja empresa-mãe é a D..., sediada em Itália.
7.1.1.2 A sua casa mãe é uma instituição financeira de crédito, nos termos da alínea d) do art.3º Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, (RGICSF), . aprovado pelo art. 1º do DL nº 298/92, de 31/12, estando a Requerente, como sucursal de banco de direito italiano, registada no Banco de Portugal .
7.1.1.3. Por ser uma sucursal em Portugal de uma instituição de crédito com sede principal e efetiva fora do território português, a Requerente está sujeita ao pagamento do ASSB, o qual incide sobre o passivo apurado e aprovado pelos sujeitos passivos e o valor nocional dos instrumentos financeiros derivados fora do balanço apurado pelos sujeitos passivos.
7.1.1.4 A Requerente procedeu à autoliquidação do ASSB relativo ao ano de 2020 no dia 11 de dezembro de 2020, e ao ano de 2021 no dia 13 de dezembro de 2021, através da submissão das respetivas Declarações Modelo 57.
7.1.1.5 As referidas (auto)liquidações do ASSB nos anos de 2020 e 2021 ascendem ao montante total de € 39.620,52. 38.
7.1.1.6 Foram emitidas as respetivas notas de cobrança relativas aos montantes autoliquidados, que agregadamente figuram como doc. n.º 4, anexo à PI.
7.1.1.7. A 7/6/2024, a Requerente deduziria pedido de revisão oficiosa das autoliquidações de ASSB de 2020 e 2021 e do correspondente reembolso do montante que considera ter pago indevidamente, que recebeu o nº ...2024..., que viria a ser liminarmente indeferido, por manifesta extemporaneidade, a 27/8/2024.
7.1.2 Factos não Provados
Não se consideram não provados quaisquer outros factos relevantes para o conhecimento da causa.
7. 1.3 -Fundamentação da fixação da matéria de facto
O Tribunal Arbitral tem o dever de selecionar os factos pertinentes para a decisão da causa, com base na sua relevância jurídica e tendo em consideração as várias soluções plausíveis das questões de Direito suscitadas pelas partes, bem como o dever de discriminar os factos provados e não provados. Porém, o Tribunal Arbitral não tem um dever de pronúncia quanto a toda a matéria de facto alegada pelas partes, em conformidade com o disposto no nº 2 do 123.º do CPPT e no nº 1 do 596.º, vem como no nº 3 do art. 607º, ambos do CPC, aplicáveis ex alíneas a) e e) do nº 1 do art. 29º do RJAT.
O Tribunal formou a sua íntima e prudente convicção quanto aos factos provados , considerando como provados os factos em que se demonstrou acordo das partes nesse sentido, e também quanto aos não provados .
Essa convicção foi extraída do exame de todos os elementos probatórios carreados aos autos, que foram apreciados e avaliados com base no princípio da livre apreciação dos factos e nas regras da experiência, normalidade e racionalidade, em conformidade com os ditames fixados na alínea e) do art. 16.º, do RJAT e nos nºs 4e 5 do 607.ºdo CPC aplicáveis ex vi alínea e) do nº 1 do art. 9º do referido RJAT.
7.2 Fundamentação de direito.
Segundo a Requerida, é a ação administrativa e não a impugnação judicial do indeferimento de pedido de revisão oficiosa da autoliquidação o meio processual adequado para impugnar a decisão de rejeição liminar da presente pretensão , nos termos da alínea p) do nº 1 do art. 97º do CPPT, pelo que o Tribunal Arbitral seria incompetente para o conhecimento da causa, nos termos do nº 1 do art. 2º do RJAT.
No entanto, a jurisprudência mais recente dos tribunais superiores tem rejeitado essa interpretação da lei , afirmando o meio processual adequado para discutir a legalidade do ato de liquidação ser sempre a impugnação judicial independentemente de esta ter sido ou não precedida de meio gracioso e, no caso de assim ter acontecido, independentemente do teor da decisão que sobre ele recaiu ser formal ou de mérito. Não seria, assim, meio adequado a ação administrativa regulada no Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), o que, nos termos do nº 1 do art. 2º do RJAT, excluiria a presente causa da jurisdição arbitral.
A impugnação judicial de indeferimento de reclamação graciosa tem sempre por objeto imediato a decisão da reclamação e apenas por objeto mediato os vícios imputados ao ato de liquidação(acórdão do STA de 16/9/20, proc. 01438/16.7BELRS).
Assim, os tribunais arbitrais podem apreciar a legalidade do indeferimento da reclamação com fundamentos em intempestividade, o que é, aliás, a solução mais razoável do ângulo da racionalidade processual, já que, de outro modo, a competência para apreciação dos requisitos formais e do mérito da ação pertenceria a tribunais diferentes e o seu conhecimento seguiria meios processuais também diferentes.
Anulado o indeferimento da reclamação por vício procedimental, por a decisão impugnada ter indevidamente considerado intempestiva a reclamação, de acordo com esse critério, cabe ao tribunal conhecer dos restantes vícios imputados ao ato tributário, uma vez que este é competente conhecer em tal impugnação, quer do indeferimento da reclamação, quer dos vício imputados ao ato tributário.
Nesse sentido, militam entre outros, além dos já referidos, os Acórdãos do STA de 11/9/13, no proc. 01138/12, de 18/6/14, no proc. 01942/13, 20/5/2015 , no proc. 01021/14 , de 12/10/16, no proc. 0427/16, de 8/1/2020, no proc. 02546/08.3BEPRT 0192/18, de 18/11/2020, no proc. 0608/13.4BEALM 0245/18, e de 13/11/:2021, , no proc. 0129/18.9BEAVR.
Esse princípio prevalece, assim, na própria circunstância de a administração fiscal, rejeitar liminarmente o pedido de revisão oficiosa com fundamento na sua alegada extemporaneidade, recusando sequer apreciar se houve ou não erro imputável aos serviços na liquidação.
O entendimento da Requerida contrário à jurisprudência maioritária do STA , a ser aceite, redundaria na inutilidade do objeto da ação, mais se revelando contrário ao princípio da promoção do acesso à justiça, que deve imperar na interpretação das normas processuais [cf. art. 7.º do CPTA, aplicável ex vi da alínea c) do art. 2.ºdo CPPT].Nesse sentido, também, o acórdão do TC Sul de 26/5/22, proc, 96/17.6BCLSB)
Essa jurisprudência não é obviamente incompatível com o ónus de reclamação necessária do ato de autoliquidação , do cumprimento do qual depende o acesso à jurisdição arbitral, nos termos da parte final da alínea a) do art. 2º da Portaria nº 112-A/2011, de 22/3 (Portaria de Vinculação).
Com efeito, conforme refere a Decisão Arbitral nº 9/2021- T: a tempestividade do pedido de pronúncia arbitral não pode ser justificada a partir do indeferimento de um pedido de revisão de ato tributário quando este se mostre extemporâneo: a questão da tempestividade do pedido de revisão deve ser sempre autonomizada da questão da tempestividade do pedido de pronúncia arbitral.
Sendo o pedido de revisão intempestivo : o pedido de pronúncia arbitral não pode ser considerado tempestivo, o que seria contraditório : nesse sentido, pronunciar-se-ia, a propósito dos atos de autoliquidação e retenção na fonte, em recurso para uniformização de jurisprudência, o acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA de 22/1/2025, proc. 0117/24.6BALSB.
Não está, assim, em causa a sindicabilidade pelos tribunais estaduais ou arbitrais do pedido de anulação do ato de indeferimento, liminar ou não, do pedido de revisão oficiosa da liquidação com fundamento em erro imputável aos serviços, bem como a competência dos tribunais arbitrais para o seu conhecimento, mas a sujeição da utilização desse meio processual ao ónus de reclamação necessária, que apenas fica afastado nas circunstâncias referidas quando estiver exclusivamente em causa matéria de direito e a autoliquidação tiver sido efetuada de acordo com orientações genéricas emitidas pela administração tributária, o que cabe ao Tribunal Arbitral apreciar.
Com efeito, ainda que se atribua ao pedido de revisão oficiosa o mesmo efeito jurídico da reclamação graciosa, essa equivalência apenas pode ser reconhecida quando o pedido de revisão oficiosa tenha sido apresentado dentro do prazo previsto para aquela forma de impugnação administrativa, isto é, dentro do prazo de dois anos do nº 2 do art. 131º do CPPT. Nesse sentido, concorrem as Decisões Arbitrais .ºs 840/2021-T e 778/2023-T . No mesmo sentido, a Decisão Arbitral nº 493/2024/T pronunciar-se-ia no sentido de que “ Ainda que se atribua ao pedido de revisão oficiosa o mesmo efeito jurídico da reclamação graciosa para efeitos do artigo 131.º, n.º 1, do CPPT, essa equivalência apenas pode ser reconhecida quando o pedido de revisão oficiosa tenha sido apresentado dentro do prazo previsto para aquela forma de impugnação administrativa, isto é, dentro do prazo de dois anos.”…
Tal prazo de dois anos foi largamente ultrapassado pela Requerente que apresentou o pedido de revisão oficiosa apenas a 7/6/2024, mais de dois anos após as autoliquidações de ASSB que datam de 11/12/2020n e 13/11/20(Factos Provados 7.1.1.4. e 7.1.1.7.), fora do prazo previsto no nº 1 do art. 131º do CPPT, pelo que não há lugar à convolação prevista no art. 52º deste Código.
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No entanto, a decisão arbitral nº 2015/2024- T pronunciar-se -ia do seguinte modo:
“A competência dos Tribunais arbitrais para se pronunciarem sobre o indeferimento de pedido de revisão de autoliquidação, sem prévia apresentação de reclamação graciosa, há muito está esclarecida por jurisprudência dos nossos tribunais superiores. A este propósito, vide, decisão contida no Acórdão do Tribunal Administrativo Sul de 26-05-2022, no processo nº 96/17.6BCLSB: «O que cumpre aqui aferir é se estão ou não abrangidas, na competência material dos tribunais arbitrais tributários, as situações de reação a indeferimento de pedido de revisão de autoliquidação, em relação à qual não foi apresentada reclamação graciosa. Adiantemos, desde já, que a resposta é afirmativa, como, aliás, tem vindo a ser decidido”.
De acordo com tal jurisprudência, não haveria jamais sujeição da reclamação a um ónus de reclamação necessária., como se o regime do art. 131º não existisse.
O regime do art. 131º do CPPT seria uma mera faculdade do sujeito passivo de IRC poderia exercer ou não, sem que o não exercício tivesse quaisquer consequências.
Essa pronúncia, na medida em que, sem qualquer apoio legal , recusa qualquer tipo de reclamação necessária, só seria compatível com a jurisprudência uniformizada do STA quando estivesse exclusivamente em causa matéria de direito e a autoliquidação tivesse sido efetuada de acordo com orientações genéricas emitidas pela administração tributária , já que só nesses casos a reclamação necessária é dispensada.
Ainda assim, havendo dispensa de reclamação necessária, o prazo de impugnação judicial correria sempre continuadamente, a partir da autoliquidação, e não da reclamação facultativa que o contribuinte entenda apresentar, pelo que se verificaria sempre a caducidade do exercício de tal direito.
A jurisprudência constante do STA tem considerado a CSB como uma mera contribuição financeira a favor do Fundo de Resolução, prevista na alínea a) do nº 1 do art. 153º.F do RGICSF, e não como imposto, com fundamento no carácter comutativo e não unilateral dessa prestação. O conhecimento da legalidade dos atos da sua liquidação e cobrança estaria, assim . fora do âmbito da jurisdição arbitral nos termos do nº 1 do art. 2º, o que não é o caso da conhecimento da legalidade da liquidação e cobrança do ASSB caso este seja considerado imposto, que os contribuintes podem submeter aos tribunais arbitrais.
Segundo a jurisprudência praticamente unânime dos tribunais arbitrais, o ASSB não é materialmente um verdadeiro adicional do CSB, na aceção dos acórdãos do TC nºs 365/08 e 539/2015, com fundamento no caráter unilateral ( não comutativo) dessa prestação. Só seria passível de se considerada um adicional se, como a CSB, tivesse uma natureza bilateral, ainda que imperfeita.
Nessa medida, deveria ser considerada um verdadeiro imposto, sujeito ao princípio da legalidade previsto no nº 2 do art. 103º da CRP.
Segundo a Requerente, a concreta regulamentação desse imposto violaria, no entanto, os princípios da igualdade, da capacidade contributiva e da proporcionalidade.
A aplicação do ASSB aos saldos médios apurados no primeiro semestre de 2020 seria, por outro lado, incompatível com a proibição constitucional da retroatividade dos impostos estabelecida no nº 3 do art. 103º da CRP.
No sentido da inconstitucionalidade com fundamente na violação dos princípios da igualdade, da capacidade contributiva e da proporcionalidade, bem como da irretroatividade dos impostos, militaram entre outras as Decisões Arbitrais nºs 564/2021- 598/2022- T, 599/2022- T, 21/2023- T, 104/2023- T, 105/2023- T, 325/2023-T, 326/2023- T 327/2023- T, 367/2023- T, 347/2024- T, 384/2023- T, 567/2024-T, 568/2024-T, 647/2024- T, 752/2024- T, 761/2024- T , 1015/2024- T e 1070/2024-T. Em sentido da não violação de nenhum dos primeiros três princípios, pronunciou-se a Decisão Arbitral nº 3/2024-T.
Nesse sentido, igualmente se manifestaram os acórdãos do TC nºs 469/2024, 529/2024 e 592/20 24. Dos 13 conselheiros do TC, no entanto, até aqui, em processos distintos , apenas 5 se pronunciaram , dos quais 3 a favor e 2 contra. Tal jurisprudência está ainda longe de poder ser considerar maioritária no TC:
Para além destes Acórdãos, foram também já proferidas Decisões Sumárias n.º 1/2025 10/2025, 436/2024, 458/2024, 460/2024, 549/2024, 551/2024, 618/2024 e 625/2024 em sentido idêntico.
Em virtude da declaração de inconstitucionalidade em três casos concretos, nos termos do nº 3 do art. 281º da CRP, o representante do Ministério Público no TC ficou obrigado a requerer a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral do ASSB, a ser julgada pelo Plenário do TC, o que terá feito, originando o proc. 899/2024.
Não prejudica a qualificação como imposto a consignação integral da
receita ao Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, como prevê o art. 9º do Regime do ASSB, tal como acontece com o AIMI; não obstante as entidades empregadoras retirarem vantagens de facto da existência de um sistema de segurança social. Não obstante lhes permitirem desonerarem-se de riscos que de outro modo correriam por sua conta ( “máxime”, os inerentes à incapacitação do trabalhador), tais vantagens de facto não são suficientes para pôr em causa a unilateralidade desse prestação.
O facto as entidades empregadoras poderem também beneficiar de medidas específicas de segurança social, ou seja, prestações que lhes são diretamente atribuídas, especialmente em situações de crise, como , por exemplo, os apoios financeiros adotados pelo Decreto-Lei n.º 10-G/2020, de 26/3, igualmente não confere ás contribuições da entidade patronal qualquer tipo de bilateralidade ,ainda que difusa.
A qualificação como impostos das contribuições da entidade empregadora é pacífica a partir da revisão constitucional de 1981(acórdão do TC nº 255/2020, ainda que sejam de considerar as reservas contidas na Declaração de Voto da conselheira Mariana Canotilho; ver também acórdão do TCA Sul de 28/8/07, proc. 0210807).
Acórdãos desse Tribunal n.ºs 135/2012 e 399/2017 (a que se podem acrescentar os n.ºs 695/2017 e 770/2017) são , aliás, expressos no sentido de o disposto no nº 3 do art. 103.º da CRP ser aplicável apenas a impostos – mas a todos os impostos, fiscais e extrafiscais, em que se inclui a parcela das contribuições para a segurança social a cargo da entidade patronal.
Segundo a tal jurisprudência que se passa a sintetizar, esse julgamento de inconstitucionalidade fundar-se-ia, em primeiro lugar, em que a situação particular das instituições de crédito com sede principal e efetiva da administração situada em território português, bem como das filiais, em Portugal, de instituições de crédito que não tenham a sua sede principal e efetiva da administração em território português e as sucursais em Portugal de instituições de crédito com sede principal e efetiva fora do território português , nos termos do nº 1 do art. 2º do Regime do ASSB não justificaria a sujeição a um segundo imposto acrescendo ao. IRC , não sendo suficiente a intenção de reforçar os mecanismos de financiamento do sistema de segurança social, que nenhuma relação aparente tem com a isenção de IVA das operações financeiras consagrada no 27º do art. 9º do CIVA.
Assim a criação do ASSB como um imposto especial incidente sobre o setor bancário, como forma de compensar a isenção de IVA da maioria das operações financeiras, configurar-se -ia como uma diferenciação arbitrária na medida em que o critério utilizado não apresenta um mínimo de coerência nem se encontra materialmente justificado.
Verificar-se-ia em consequência, a violação do princípio da proibição do arbítrio, enquanto exigência de igualdade tributária.
Para justificar a violação do princípio da capacidade contributiva diz Filipe de Vasconcelos Fernandes (O (imposto) adicional de solidariedade sobre o setor bancário, Lisboa, 2020, pp. 106/109), que. no ASSB não está em causa, manifestamente, a tributação do rendimento, “[…] mas tão só a sujeição a imposto de uma parte das componentes do balanço (e fora dele). […] [E] uma vez que os sujeitos passivos do ASSB são igualmente sujeitos passivos de IRC, esta circunstância acaba por suscitar uma compressão do rendimento que, sob a forma de lucro, acabará sujeito a este último imposto, cenário especialmente agravado pela não dedutibilidade do encargo suportado com o pagamento do ASSB ao lucro tributável dos respetivos sujeitos passivos”, nem a tributação de atos de despesa, verificando-se, aliás, “[…] a impossibilidade de reconduzir o ASSB ao arquétipo dos impostos sobre atividades financeiras (‘financial activities taxes’) e, bem assim, dos impostos sobre transações financeiras (‘financial transaction taxes’), em qualquer uma das suas modalidades […]”, nem , por fim, a tributação do património, já que não basta para qualificar o passivo como património a sua inclusão no balanço, nem – acrescente-se – a respetiva natureza autoriza à partida essa qualificação!”.
Sustenta esse autor que, afastada a integração do passivo num dos clássicos indicadores da capacidade contributiva (neste caso apenas o rendimento e o património), a verdade é que as indicações do legislador são, pelas razões atrás explicitadas, inaproveitáveis. Não sobejaria, deste modo, qualquer indicador razoável e objetivo da capacidade contributiva dos sujeitos passivos.
Deste modo, [Ao] mesmo tempo que o ASSB se reveste claramente da natureza de imposto, não se antevê de que forma a respetiva base de incidência objetiva – composta pelo passivo apurado e aprovado (feitas algumas deduções) e ainda pelo valor nocional dos instrumentos financeiros derivados fora do balanço – possa, em alguma medida, refletir ou permitir valorar qualquer tipo de capacidade contributiva inerente à condição dos respetivos sujeitos passivos. e, no caso da CSB, a tributação com base neste elemento pode admitir-se à luz da respetiva conexão ao risco sistémico bancário e, sobretudo, a uma responsabilidade pelo risco típica desta modalidade de contribuições de estabilidade financeira, no caso do ASSB não pode antever-se de que forma a consideração deste elemento pode relevar para uma hipotética responsabilidade dos respetivos sujeitos passivos ao nível do financiamento do FEFSS”.
Essa argumentação não é concludente, de acordo com o que se passa a desenvolver.
Segundo a justificação diretamente assumida pelo legislador, a introdução do ASSB visou imediatamente a compensação da diminuição das receitas da segurança social causada pela epidemia COVID 19. A prorrogação da medida nos anos posteriores, não obstante a cessação da situação epidemiológica que a originou, pode eventualmente indiciar que o legislador pretendeu de facto uma alteração estrutural do modelo de financiamento da segurança social. Aliás, de acordo com o relatório nº13/2020 da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) da Assembleia da República, essa iniciativa legislativa não tem justificação no contexto COVID-19, antes sendo apresentada pelo Governo para contribuir, de modo permanente, para a diversificação das fontes de financiamento das pensões pagas pelo sistema previdencial da Segurança Social pública.
O facto de incidência subjetiva do ASSB abranger apenas as instituições financeiras foi historicamente justificado pela isenção de IVA das principais operações financeiras consagrada no 27º do art. 9º do CIVA, da qual indiretamente resultaria uma diminuição das receitas da Segurança Social, por afetar o chamado IVA social introduzido pela Lei nº 27- B/94, de 27/12. Tal diminuição é, aliás, uma relativamente pequena parcela da receita total do IVA.
O art. 24º da referida Lei nº 39-B/-94 alteraria o art. 1º do DL nº 104- D/86, de 14/6, fixando em 23, 25 % a componente da taxa social única incidente sobre as remunerações por trabalho prestado, que reduziu em 0,75 %.
Em contrapartida , a taxa normal do IVA foi aumentada em um ponto percentual pelo nº 6 do art. 32º dessa Lei, sendo a receita correspondente consignada pelo nº 8 do art. 30º ao sistema previdencial, a fim de compensar a perda de receita resultante da redução da taxa contributiva de 35,5 % para 34,75 %, constante do acordo de concertação social celebrado em 1993.
É a essa percentagem de 1 % da base tributável do IVA consignada à segurança social que se chama hoje de IVA social.
O legislador procurou, assim, responder, ainda que muito parcialmente, à maioria das críticas ao sistema de financiamento da segurança social que o acusavam de pôr em causa a equidade fiscal, discriminar o trabalho intensivo e ser suscetível, a prazo, de reduzir o emprego, inconvenientes que o IVA social poderia em parte minorar.
A ideia do IVA social resulta, aliás, da progressiva implementação da conceção a partir da revisão constitucional de 1982 , como já se referiu, de as contribuições da entidade patronal para a Segurança Social serem verdadeiros impostos, por não constituírem qualquer contrapartida específica de vantagens que a entidade patronal colheria do seu pagamento ,que seriam eventualmente a paz social, a estabilidade das relações laborais ou a própria redução de outros encargos que não fosse o sistema de Segurança Social teria de suportar.
O princípio da diversificação das fontes de financiamento da segurança social, que implica, assim, a ampliação das bases de obtenção de recursos financeiros . tendo em vista designadamente a redução dos custos não salariais de mão de obra, consta hoje, com carácter geral, do art. 88º da Lei nº 4/12007.
O principal inconveniente que lhe é apontado consiste em configurar uma transferência dos encargos da segurança social da entidade patronal para a massa dos consumidores , mas essa conclusão parte do pressuposto da possibilidade da repercussão para trás(os trabalhadores) ou para a frente( os consumidores, através do aumento dos preços) das contribuições da entidade patronal, até hoje não está demonstrada.
O IVA social é hoje especificamente regulado no art. 8ºdo DL nº 365/2007, de 2/11, nos termos seguintes:
“1-É consignada à realização da despesa com prestações sociais, no âmbito do subsistema de proteção familiar, a receita do IVA resultante do aumento da taxa normal operada através do n.º 6 do artigo 32.º da Lei n.º 39-B/94, de 27 /12, relativamente à cobrança efetuada em cada exercício orçamental.
2- Mantém-se ainda consignada à realização das despesas referidas no número anterior a receita do IVA resultante do aumento da taxa normal deste imposto, operada pela Lei n.º 39/2005, de 24 /6, nos termos definidos no seu art. 3.º
3 - O produto da receita d*o IVA referido nos números anteriores é afeto à segurança social anualmente.
4 - A satisfação dos encargos com o subsistema de proteção familiar é garantida pela receita fiscal referida no n.º 1 e, no remanescente, por transferências do Orçamento de Estado”.
É uma evidência que, no quadro legislativo atual, o IVA social onera essencialmente, o setor não financeiro, o que foi oficialmente apresentado como a justificação da criação do ASSB.
Não onera significativamente o setor financeiro, incluindo neste as instituições de crédito e, em geral ,todos os consumidores de serviços financeiros, dada a isenção da maioria das operações financeiras, nos termos do 27º do art. 9º do CIVA, que se reflete no IVA social , a entregar ao Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social,. A base tributável do IVA que recai sobre as operações financeiras é, com efeito, substancialmente inferior à base tributável das operações sujeitas ao regime normal do IVA.
Tal isenção reflete-se num “pro- rata” de dedução mais baixo, muito inferior a 100%.
Assim, é evidente que a isenção do IVA das operações financeiras, porque incompleta, implicando uma tributação oculta, não é necessariamente uma vantagem para os bancos e consumidores dos serviços financeiros, , podendo ser uma desvantagem, dependendo a resposta de fatores que a presente Decisão Arbitral não está condições de apreciar e que são, aliás, irrelevantes para a decisão da presente causa.
O DL n.º 54/2009, de 2/3, determinou a inscrição dos novo trabalhadores ncários no regime geral de segurança social, dando um passo decisivo na concretização da integração no sistema previdencial dos grupos socioprofissionais até então apenas parcialmente abrangidos pelo sistema de segurança social, que repousava em grande parte na contratação coletiva.
Posteriormente o DL nº 1-A/1011,de 3/1, aprofundaria o processo de integração dos trabalhadores do sector bancário no regime geral de segurança social, concretizando o acordo celebrado entre o Governo, através do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, a Associação Portuguesa de Bancos, em representação das instituições de crédito, e a FEBASE - Federação do Sector Financeiro, a 20/10/2010.
Os trabalhadores bancários de sucursais nacionais de bancos estrangeiros , beneficiam, assim, da segurança social nos mesmos termos dos trabalhadores bancários dos bancos nacionais, pelo que tem justificação ambos os tipos de instituições de crédito contribuírem para o seu financiamento em termos equivalentes sem que o facto viole o princípio da capacidade contributiva.
É certo que abstratamente haveria outros meios de compensação do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social do IVA social que, dada a isenção do 27º do art. 9º do CIVA, não é autoliquidado pelas instituições de crédito, porventura mais adequados, como a consignação de uma parcela das receitas do imposto de selo ao Fundo de Estabilização da Segurança Social. A construção dessas opções não é, no entanto, da competência dos tribunais, mas do legislador e depende de estudos prévios complexos sobre a sustentabilidade do sistema de segurança social, aliás, ainda em curso.
Uma mera divergência de opções políticas que se admite existir não é suficiente para a formação de um juízo de inconstitucionalidade.
Admite-se que a criação do ASSB pelo art. 18º da Lei nº 27-A/2020 para aprovou o seu Anexo VI teve certamente por fundamento razões de praticabilidade que não cabe ao Tribunal Arbitral discutir e que apenas poderiam ser postas em causa caso o encargo do ASSB fosse manifestamente desproporcionado relativamente ao encargo do IVA social que seria cobrado se a generalidade das operações financeiras não estivessem isentas de IVA, o que não ficou demonstrado.
A medida da criação do ASSB é discutível e certamente não soluciona as eventuais distorções causadas por um universo muito amplo de operações isentas de IVA sem direito ``a dedução.
Não é esse, no entanto, o seu objetivo, mas apenas reforçar o financiamento da segurança social, em termos que não se demonstrou serem desproporcionais.
Face a este quadro , como procurei sublinhar em Declaração de Voto anexa à Decisão Arbitral no proc. nº 104/2023- T, está longe de ser evidente é que, com o ASSB, o setor financeiro tivesse ficado sujeito a um ónus acrescido de financiamento da segurança social.
É facto que o IVA social é obrigatoriamente repercutido aos consumidores pela entidade empregadora, nos termos do art. 37º do CIVA.
Já o ASSB é também um imposto sobre o consumo das empresas bancárias , revelado pela utilização de passivos correspondentes a depósitos e outros instrumentos financeiros, que são em geral recursos de terceiros (Decisão Arbitral nº 3/2024- T), assente na autoliquidação, sem repercussão legal.
A capacidade contributiva dos sujeitos passivos do ASSB é relevada pela utilização desses elementos que compõem o passivo dos bancos no exercício da sua atividade principal.
Como chama a atenção a Declaração de Voto do juiz Guerra da Fonseca no proc. 529 72024 do TC , “Tais elementos componentes do passivo que compõe a base tributável do ASSB, são utilizados pelas entidades do setor bancário para criação de valor, para si e para os seus clientes, através de operações financeiras. A mera existência daqueles elementos no passivo bancário “ faz presumir uma certa aptidão para criação de valor, que, ainda que estática, o legislador considera reveladora de capacidade contributiva, ou, se se quiser, uma capacidade de gastar, para utilizar a terminologia do Acórdão do TC, no proc. nº 217/2015”.
Tal não significa qualquer discriminação negativa das instituições financeiras.
Segundo ainda essa Declaração de Voto , ao contrário da tese do Acórdão nº 529 72024 do TC, a tributação fiscal das empresas, nos termos do nº 1 do art- 104º da CRP, não tem necessariamente de ser efetuada ao abrigo de um único imposto, contrariamente à tributação sobre o rendimento pessoal através do IRS, relativamente à qual a CRP impõe a unicidade.
O legislador não está, portanto, impedido de criar outros impostos (além do IRC) que tenham empresas como sujeitos passivos, nomeadamente para compensar a insuficiência da receita proporcionada por outros- o financiamento da segurança social pode, assim, ser assegurado, sem quebra de qualquer princípio constitucional relevante, através de mais de um imposto, sem que , por isso , seja necessariamente discriminatório.
Por outro lado, a inexistência de repercussão legal não impede os bancos de repercutirem de facto a CSB e o ASSB.
+
Nenhum obstáculo existe , com efeito, que as instituições financeiras possam refletir nos juros dos depósitos bancários, bem como em outras remunerações de idêntica natureza que constituíam a contraprestação pela utilização dos recursos de terceiros integram o seu passivo, a CSB e o ASSB suportados, transferindo de facto para os clientes (depositantes ou detentores de instrumentos financeiros) o encargo do imposto que de outro modo suportariam, o que não é incompatível com a CSB e o ASSB não serem custo do IRC, , nos termos da alínea p) do nº 1 do art. 23º- A do CIRC e do art. 10º do Regime do ASSB.
Não se nos afigura aqui existir qualquer diferença de tratamento suscetível de afetar o princípio da igualdade.
É certo o art. .9 º do CIVA comportar uma multiplicidade de isenções objetivas do imposto, como as que abrangem a prestação de serviços de seguros, educação ou saúde, abstratamente suscetíveis de se refletiram na receita da segurança da segurança social, sem que se lhes aplique a tributação compensatória do tipo do ASSB.
Tal não significa necessariamente que. ao não tributar esses serviços, o ASSB viole o princípio da igualdade.
-A jurisprudência do TC (acórdão nº 497/97 )tem entendido o sentido constitucional da igualdade a partir da exigência de que se trate como igual o que for essencialmente igual e como diferente o que for diferente.
Ou seja, a diferenciação de tratamento, por si só , não implica necessariamente violação do princípio da igualdade, pois a igualdade relevante não é a meramente formal mas também a material, impedindo-se, assim, a discriminação arbitrária e irrazoável, sem justificação e fundamento material bastante.
Assim, por exemplo, a tributação de alguém, no caso os trabalhadores dos casinos , cujas gorjetas a administração fiscal podia conhecer, quando outrem, em situação igual, não é tributado, por ausência de elementos para o fazer, não é suficiente para fundamentar um julgamento de violação do princípio da igualdade.
Dificuldades técnicas de difícil superação na aplicação à atividade seguradora de um modelo de tributação direta idêntico à CSB ou ao ASSB ou opções de carácter social como as que fundamentam a isenção de prestações de serviços de educação e saúde - podem justificar legitimamente a não tributação.
Assim, dificilmente, à ,luz desse critério, a criação do ASSB pode ser entendida como uma medida arbitrária, a não ser para quem defenda um modelo de financiamento da segurança social baseado exclusivamente em dotações diretas do Estado e em cotizações dos trabalhadores, caso em que ,por natureza, a questão suscitada não se coloca.
Ainda que não arbitrária, a tributação dos saldos de 2020 é retroativa e, por isso, incompatível com o nº 3 do art. 103º da CRP (acórdãos do TC nºs 49/2024, 469/2024, 529/2024) .
Com efeito, nos termos do nº 1 do art. 21º da Lei nº 27-A/2020, em 2020 e 2021, a liquidação e o pagamento do adicional de solidariedade sobre o setor bancário previsto no regime que consta do anexo VI efetuava-se de acordo com as seguintes regras:
a) A base de incidência apurada nos termos dos arts. 3.º e 4.º do Regime era calculada por referência à média semestral dos saldos finais de cada mês, que tivessem correspondência nas contas relativas ao primeiro semestre de 2020, no caso do ASSB devido em 2020, e nas contas relativas ao segundo semestre de 2020, no caso do ASSB devido em 2021, publicadas em cumprimento da obrigação estabelecida no Aviso do Banco de Portugal n.º 1/2019, de 31/1, que atualizou o enquadramento normativo do Banco de Portugal sobre os elementos de prestação de contas;
b) A liquidação era efetuada pelo próprio sujeito passivo, através de declaração de modelo oficial aprovada por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, que deve ser enviada até ao dia 15 de dezembro de 2020 e 2021, respetivamente;
c) O ASSB devia ser pago até ao último dia do prazo estabelecido na alínea anterior, nos termos previstos no n.º 1 do art. 40.º da LGT
Segundo o nº 2 desse art. 21º , na ausência da publicação das contas relativas ao primeiro e segundo semestres de 2020, conforme referido na alínea a ) do nº anterior, a base de incidência era calculada por referência à média semestral dos saldos finais de cada mês, que tivessem correspondência nas contas relativas ao primeiro semestre de 2020, no caso do ASSB devido em 2020, e nas contas relativas ao segundo semestre de 2020, no caso do ASSB devido em 2021, a comunicar pelo sujeito passivo à AT até ao dia 15 de dezembro de 2020 e 2021, respetivamente.
Segundo o nº 3, na falta de liquidação do ASSB nos termos da alínea b) do n.º 1, a mesma tinha por base os elementos de que a administração fiscal dispusesse.
Na falta de contas publicadas, o ASSB era calculado, com efeito, com base numa média relativa ao primeiro semestre de 2020
Embora devesse haver correspondência entre os saldos de cada mês, nesse semestre, e os saldos que constassem das contas anuais relativas ao mesmo semestre, eventual divergência entre o saldo médio que serviu de base à liquidação do imposto e os saldos mensais aprovados nas contas anuais do exercício apenas podia justificar a correção aritmética pela administração fiscal com base na verificação de erros ou omissões que determinaram a exigência de um valor do adicional superior ao liquidado.
A tributação por um novo imposto após o termo do primeiro semestre de 2020 dos saldos apurados durante esse período não pode, assim, deixar de ser considerada retroativa (Acórdão nº 188/2025 do TC), já que no momento em que o imposto foi criado já o facto tributário se tinha consumado.
Ao contrário do que a Requerida pretende, a exigência de uma correspondência entre o saldo médio relativo ao primeiro semestre e os saldos finais de cada mês considerados nas contas anuais não salvaguarda a retroatividade do imposto.
Na verdade, a aprovação das contas referentes a 2020, incluindo as do primeiro semestre, em atenção ao disposto nos nºs 1 e 5 do art. 65º do Código das Sociedades Comerciais (CSC), só pode ocorrer após o encerramento de cada exercício anual, e, portanto, após o período de tributação a que respeita o imposto .
Devendo o sujeito passivo ter liquidado imposto até 15/12/20 prazo esse que respeitou, não lhe seria possível nessa data certificar os saldos apurados através de contas anuais que então ainda não existiam por o exercício não ter terminado.
Assim, não há qualquer dúvida que o facto tributário que originou o imposto, foi o mero apuramento contabilístico da média dos saldos do passivo relativamente ao primeiro semestre e não as contas aprovadas e que a obrigação do pagamento do imposto só foi criada após o final do primeiro semestre de 2020.
Esse facto material da verificação de existência do passivo na contabilidade, ocorreu ainda antes da entrada em vigor da Lei nº27-A/2020, por estar em causa o primeiro semestre de 2020.
Verificou-se, assim, uma tributação retroativa constitucionalmente proibida.
As regras de determinação da base de incidência da CSB e, por remissão, do ASSB; não violam, por outro lado, como pretende a Requerente, a proibição da discriminação em razão da nacionalidade, nem a liberdade de estabelecimento referidas nos arts. 18.º e 49.º do TFUE, por não submeterem a um tratamento menos favorável a base tributária das sucursais financeiras das instituições financeiras não residentes face às homólogas entidades residentes.
Nos termos do nº 1 do art. 2º do Regime , são sujeitos passivos do ASSB:
a) As instituições de crédito com sede principal e efetiva da administração situada em território português;
b) As filiais, em Portugal, de instituições de crédito que não tenham a sua sede principal e efetiva da administração em território português;
c) As sucursais em Portugal de instituições de crédito com sede principal e efetiva fora do território português.
Para efeitos do disposto no nº anterior, segundo o nº 2 dessa norma, consideram-se instituições de crédito, filiais e sucursais as definidas, respetivamente, nas alíneas u), w) e ll) do art. 12.º-A do RGICSF.
O ASSB incide, de acordo com o art. 3º do Regime, sobre:
a) O passivo apurado e aprovado pelos sujeitos passivos deduzido, quando aplicável, dos elementos do passivo que integram os fundos próprios, dos depósitos abrangidos pela garantia do Fundo de Garantia de Depósitos, pelo Fundo de Garantia do Crédito Agrícola Mútuo ou por um sistema de garantia de depósitos oficialmente reconhecido nos termos do art. 4.º da Diretiva 2014/49/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16/4/2014, relativa aos sistemas de garantia de depósitos ou considerado equivalente nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do art, 156.º do RGICSF , dentro dos limites previstos nas legislações aplicáveis, e dos depósitos na Caixa Central constituídos por caixas de crédito agrícola mútuo pertencentes ao sistema integrado do crédito agrícola mútuo, ao abrigo do art, 72.º do Regime Jurídico do Crédito Agrícola Mútuo e das Cooperativas de Crédito Agrícola (RJCAMCCR), anexo ao DL n.º 24/91, de 11/1;
b) O valor nocional dos instrumentos financeiros derivados fora do balanço apurado pelos sujeitos passivos.
De acordo com o art. 4º do Regime do ASSB, para efeitos do disposto na alínea a) do art. 3º, entende-se por passivo o conjunto dos elementos reconhecidos em balanço que, independentemente da sua forma ou modalidade, representem uma dívida para com terceiros, com exceção dos seguintes:
a) Elementos que, segundo as normas de contabilidade aplicáveis, sejam reconhecidos como capitais próprios;
b) Passivos associados ao reconhecimento de responsabilidades por planos de benefício definido;
c) Os depósitos abrangidos pelo Fundo de Garantia de Depósitos e pelo Fundo de Garantia do Crédito Agrícola Mútuo relevam apenas na medida do montante efetivamente coberto por esses Fundos.
d) Passivos resultantes da reavaliação de instrumentos financeiros derivados;
e) Receitas com rendimento diferido, sem consideração das referentes a operações passivas;
f) Passivos por ativos não desreconhecidos em operações de titularização.
Segundo o nº 2 desse art. 4º do Regime , para efeitos do disposto na alínea a) do art. 3º observam-se as regras seguintes:
a) O valor dos fundos próprios, incluindo os fundos próprios de nível 1 e os fundos próprios de nível 2, compreende os elementos positivos que contam para o seu cálculo de acordo com o disposto na parte II do Regulamento (UE) 575/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26/6/2013, relativo aos requisitos prudenciais para as instituições de crédito e para as empresas de investimento e que altera o Regulamento (UE) n.º 648/2012, tendo em consideração as disposições transitórias previstas na parte X do mesmo Regulamento que, simultaneamente, se enquadrem no conceito de passivo tal como definido no nº anterior;
b) Os depósitos abrangidos pela garantia do Fundo de Garantia de Depósitos, pelo Fundo de Garantia do Crédito Agrícola Mútuo ou por um sistema de garantia de depósitos oficialmente reconhecido nos termos do art. 4.º da Diretiva 2014/49/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, ou considerado equivalente nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do art. 156.º do RGICSF , dentro dos limites previstos nas legislações aplicáveis relevam apenas na medida do montante efetivamente coberto por esses Fundos.
De acordo com o nº 3 desse art. 4º , para efeitos do disposto na alínea b) do art. 3º, entende-se por instrumento financeiro derivado o que seja qualificado como tal pelas normas de contabilidade aplicáveis, com exceção dos instrumentos financeiros derivados de cobertura ou cujas posições em risco se compensem mutuamente.
Conclui o nº 4 desse art. 4º dizendo que a base de incidência apurada nos termos do art. 3.º e dos nº s anteriores é calculada por referência à média anual dos saldos finais de cada mês, que tenham correspondência nas contas anuais do próprio ano a que respeita o ASSB , tal como aprovadas no ano seguinte.
Segundo o nº 1 do art. 5º. a taxa aplicável à base de incidência definida pela alínea a) do artigo 3.º é de 0,02 % sobre o valor apurado e, de acordo com o nº 2 desse art. a taxa aplicável à base de incidência definida pela alínea b) do art. 3.º é de 0,00005 % sobre o valor apurado.
Os arts, 2º, 3º e 4º do Regime do ASSB correspondem ,com diferenças de pormenor, aos arts. 2º, 3º e 4º do Regime da Contribuição para o Sector Bancário (RCSB, aprovado pelo art. 141º da Lei nº n 55-A/2010, de 31/12).
O art, 185º da Lei nº 7-A/2016, de 30/3, ampliaria a incidência subjetiva da CSB sobre as sucursais nacionais de bancos estrangeiros, sediados na União Europeia ou fora dela.
A base tributável do CSB que recai sobre as sucursais nacionais de bancos estrangeiros e os bancos nacionais ,incluindo as suas sucursais no estrangeiro, é a mesma.
É o passivo entendido como o montante correspondente à média anual do valor dos elementos reconhecidos em balanço que, independentemente da sua forma ou modalidade, representem uma dívida para com terceiros reportado ao final de cada mês, constante dos respetivos Balanços elaborados em conformidade com as normas e o Plano de Contas para o sector.
A CSB não recai, no entanto, sobre todo o passivo constante do balanço , mas sobre o passivo deduzido dos elementos referidos na alínea a) do nº 3 do art. 3º do RCSB e respetivas portarias de aplicação, tal com acontece no ASSB, de acordo com o nº 2 do art. 4º do Regime do ASSB.
Essa base de incidência da CSB(passivo deduzido do valor dos fundos próprios e depósitos anteriormente identificados, também se aplica aos bancos residentes. É comum a todos os sujeitos passivos da CSSB e do ASSB, não tendo, assim, qualquer natureza discriminatória.
Em conformidade, o Campo 5 do Quadro 1 das Instruções de Preenchimento da Declaração modelo 26 na qual é liquidado o ASSB esclarece que, no caso das sucursais, em Portugal, de instituições de crédito com sede principal e efetiva fora de território nacional, de acordo com as regras contabilísticas, o respetivo passivo inclui as dívidas para com a sede (principal e efetiva fora de território nacional) e/ou outras sucursais desta, as quais são, assim, consideradas dívidas para com terceiros, reiterando, assim, que tais sucursais são tratadas da mesma forma que as sucursais nacionais dos bancos portugueses no estrangeiro, o que é suficiente para justificar a ausência de qualquer diferenciação arbitrária na solução encontrada .
Em seu benefício, a Requerente invoca, no entanto, o Acórdão do TJUE proc. C4- 340/22, proferido em reenvio prejudicial de processo do CAAD, em foi colocada a questão de a liberdade de estabelecimento prevista no artigo 49.o do TFUE se opor a uma legislação nacional, como a que está em causa no regime doméstico português do [ASSB], que permite deduzir ao passivo apurado e aprovado certos elementos do passivo que contam para o cálculo dos [capitais] próprios de nível 1 e os [capitais] próprios de nível 2, de acordo com o disposto na parte II do [Regulamento n.o 575/2013], tendo em consideração as disposições transitórias previstas na parte IX do mesmo Regulamento, que apenas podem ser emitidos por entidades com personalidade jurídica, isto é, que não podem ser emitidos por sucursais de instituições de créditos não residentes e que viria a receber uma resposta positiva.
Entendeu o TJUE que, por ser meramente hipotética, essa questão não deveria obstar ao reenvio prejudicial que deve ter lugar nos termos em que as questões foram apresentadas pelo órgão de reenvio presumivelmente pertinentes: ou seja, se às sucursais é vedado disporem de capitais próprios, dedutíveis para efeitos de CSB ou ASSB, cabendo aos tribunais nacionais apreciar se essa proibição é, ou não, imposta pela legislação portuguesa.
O TJUE aceitou pronunciar-se , como aliás, lhe é habitual .sobre os fatos submetidos sem se pronunciar sobre sua exatidão ou relevância : se, para efeitos do ASSB, as sucursais não podem deduzir os valores (a) capitais próprios e (b) instrumentos de dívida equiparáveis a capitais próprios por não terem personalidade jurídica (nem capital social).
Após o julgamento dessa questão, caber ia ao Tribunal Arbitral, órgão de reenvio, e não ao TJUE, verificar, à luz do direito nacional que lhe cabe exclusivamente aplicar, se existe diferença discriminatória de tratamento entre o regime legal atribuído às sucursais financeiras face às demais instituições financeiras – nº 44 do Ac. TJUE C-340/22.
Como mostraria o Acórdão do STA de 12/10/22, nº 08.50/17.9BELRS, respondendo ao argumento de, por não emitirem instrumentos de dívida, não poderem deduzir ao passivo elementos que contam para o cálculo do capital próprio dos bancos nacionais:
“As sucursais têm elementos que podem ser reconhecidos como capitais próprios, uma vez que são criadas e movimentadas contas de capital próprio, pelo menos o “capital afecto” (se existir) e os resultados transitados, nada impedindo que a sociedade-mãe aloque à sua sucursal em Portugal uma dotação de capital de base (“elementos do capital próprio”) registado em contas de capital próprio, caso em que tudo se assemelha às entradas feitas pelos sócios às empresas e que não são remuneradas, o que significa que, tal como o capital próprio dos bancos residentes é excluído da base de incidência da CSB, o mesmo sucede ao “capital afecto” às sucursais, quando contabilizado como tal. …”.
O facto de as sucursais portuguesas de bancos estrangeiros disporem de elementos que podem ser reconhecidos como capitais próprios não lhes garante, deste modo, qualquer dedução, nem representa qualquer discriminação.
Como afirma o citado acórdão do STA , “ São de expurgar ao valor total do passivo apenas os elementos que o integram, de acordo com as normas de contabilidade aplicáveis, se esse passivo, apurado pelos sujeitos passivos, não integrar quaisquer elementos que possam ser considerados como “elementos dos fundos próprios” nenhuma importância será deduzida a esse título, independentemente de estarem emcausa sucursais de entidades não residentes ou sucursais de sociedades residentes como resulta, desde logo, do facto de o legislador ter cuidado de utilizar a expressão «passivo apurado e aprovado pelos sujeitos passivos deduzido, quando aplicável”.
A pretensa discriminação não resulta da lei, mas da opção do banco da sede não afetar fundos próprios às suas sucursais em Portugal, o que lhe caberia provar.
Tais questões apenas poderiam ser apreciadas no presente processo arbitral, como pertinentemente chama a atenção a Requerida, se as autoliquidações de ASSB fossem impugnáveis.
A Requerente auto- liquidou o ASSB a 11/12/2020 e 13/12/2021, mas apenas veio a reclamar a 7/6/2024 muito após o termo do prazo de reclamação necessária previsto no nº 1 do art. 131º do CPPT.
Ainda que se tivesse verificado qualquer causa de dispensa de reclamação necessária das referidas no nº3 daquele art. 131º, ela não afetaria a contagem dos prazos normais de reclamação graciosa ou impugnação, de 120 ou 90 dias, referidos respetivamente no nº 1 do art. 70º e nº 1 do art. 102º, que correram continuadamente e já se esgotaram.
Do mesmo modo, não se consideram aplicáveis os nºs 4 e 5 do art. 78º da LGT,de acordo com os quais respetivamente o dirigente máximo do serviço pode autorizar, +excecionalmente, nos três anos posteriores ao do ato tributário a revisão da matéria tributável apurada com fundamento em injustiça grave ou notória, desde que o erro não seja imputável a comportamento negligente do contribuinte e para efeitos do nº, anterior, apenas se considera notória a injustiça ostensiva e inequívoca e grave a resultante de tributação manifestamente exagerada e desproporcionada com a realidade ou de que tenha resultado elevado prejuízo para a Fazenda Nacional.
Tal meio , no entanto, apenas , visa apenas a revisão da matéria coletável com fundamento particular, a injustiça grave ou notória e não, como é o caso, a revisão do ato tributário com fundamento em ilegalidade
Aplicando por analogia a doutrina do Acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Pleno do STA, de 22/11/2023 Proc. nº 0115/23.7BALSB, tal meio só é possível, como resulta da parte final do nº 4 , que ressalva os casos em que o erro na liquidação resulte de comportamento negligente do contribuinte, quando a inércia do contribuinte em utilizar os meios procedimentais ou processuais ao seu alcance, tiver conduzido à consolidação do ato na ordem jurídica, o que no presente caso, de acordo com a fundamentação do indeferimento liminar, aconteceu: a Requerente não exerceu voluntariamente o direito de reclamação nos dois anos posteriores à autoliquidação, incumprindo, assim, o ónus de reclamação necessária do nº 1 do art. 131º do CIRC.
Assim, a impugnabilidade do ato, da qual a Requerida discorda, apenas poderia ter por fundamento erro imputável aos serviços, em virtude da aplicação de norma que a a Requerente considera inconstitucional.
No entanto, para que a liquidação fosse imputável aos serviços, estesn teriam de ter o poder de desaplicação das normas inconstitucionais.
No entanto, o legislador nacional não conferiu quaisquer poderes de controlo de constitucionalidade das normas aos órgãos da administração pública, salvo das que respeitam a direitos, liberdades e garantias, abrangidas pelo efeito direto previsto no nº 1 do art. 18º da CRP, que vinculam todas as entidades públicas e privadas.
Fora desse caso, não só não exigível como não é permitido, sob pena de responsabilidade funcional, civil e disciplinar , que a administração fiscal desaplique “de motu proprio” qualquer norma legal com fundamento na inconstitucionalidade, já que, nos termos do nº 2 do art. 266º da CRP, nº 1 do art. 3º do Código do Procedimento Administrativo(CPA) e 55º da LGT, está sujeita à lei e ao direito.
Assim, segundo o acórdão do STA de 15/1/2025, proc. 0980/12.3BEAVR:
“ (i) Essa sujeição à lei e ao direito implica que a verificação do facto tributário determina a tributação; e
(i) A emissão de um juízo de inconstitucionalidade de norma legal aplicável por parte da Administração pressupõe a indiscutibilidade do juízo, de forma que a Administração Tributária não corra o risco de praticar acto tributário ilegal, passível de anulação nos termos gerais a
Refira-se, ainda, que, “no Acórdão de 21/01/2015, P. 0703/14, o STA afirmou que: «[u]ma vez que a AT está sujeita ao princípio da legalidade (cfr. Nº 2 do artº. 266. da CRP e artº. 55.º da LGT), não pode deixar de aplicar uma norma com fundamento em inconstitucionalidade, a menos que o TC já tenha declarado a inconstitucionalidade da mesma com força obrigatória geral (cfr. artº. 281.º da CRP) ou se esteja perante o desrespeito por normas constitucionais diretamente aplicáveis e vinculativas, como as que se referem a direitos, liberdades e garantias (cfr. artº. 18.º, n.º 1, da CRP), o que não é o caso». (Acórdão do STA, de 21/01/2015, P. 0703/14; No mesmo sentido, v. Acórdãos do STA, de 21/01/2015, P. 0470/14 de 04/03/2015, P. 01529/14)”.
A 7/6/2024, data do indeferimento liminar do pedido de revisão oficiosa, o TC apenas tinha declarado em um único processo, o nº 149/2024, a 27/2/2024, a inconstitucionalidade do regime do ASB.
Tal inconstitucionalidade não tinha sido, e ainda não foi, declarada com força obrigatória geral.
É possível que o venha a ser, caso em que a essa declaração é aplicável o regime do art. 282º da CRP, com ressalva, segundo o nº 3 , dos casos julgados.
Não cabe, no entanto, ao Tribunal Arbitral julgar como se essa declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral já tivesse acontecido.
É facto que se considera imputável aos serviços só o erro de facto, como também o erro de direito, e que essa imputabilidade é independente da demonstração da culpa dos funcionários envolvidos na liquidação afetada pelo erro (ver entre outros, os seguintes Acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do STA de 12/2/2001, proc nº 26.233, de 11/05/2005, proc. nº 0319/05, de 26/04/2007, proc. nº 39/07, de 14/03/2012, recurso 01007/11 e de 18/11/2015, proc. nº 1509/13).
Com efeito, os “ funcionários envolvidos na liquidação afetada pelo erro , ou seja, associados à autoria material da liquidação , estão vinculados por instruções administrativas e automatismos que, sob pena de responsabilidade disciplinar ou outra , não podem deixar de seguir, não sendo, assim, razoável associar necessariamente o direito a juros indemnizatórios a uma conduta concreta dos funcionários envolvidos na liquidação.
Coisa distinta é considerar “serviço” o legislador, através de uma interpretação analógica do nº 1 do art. 78º da LGT.
DECISÃO
Termos em que se decide ;
a) Manter o indeferimento liminar do pedido de revisão oficiosa n.º ...2024..., dirigido pela Requerente ao Diretor de Serviço Central da Unidade dos Grandes Contribuintes (UGC) , das autoliquidações do ASSB apuradas na Declaração modelo 57 dos anos de 2020 e 2021, no montante total de € 39.620,52 , dos quais € 19.430,76 respeitam a 2020 e € 20. 189,76 a 2021.
b)Condenar a Requerente no pagamento das custas do processo.
VI. VALOR DO PROCESSO
Atendendo ao disposto no art, 97.º-A do CPPT, aplicável ex vi alínea a) do nº 1 do art. 29.ºdo RJAT, e do nº 2 do art. 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 39.620,52 .
VII. CUSTAS
Nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, as custas são no valor de € 1.836,00 a suportar pela Requerente, conforme ao disposto no nº 2 do art. 12.º e do nº 4 do art. 22º do RJAT,nos termos do art. 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem.
Notifique-se.
Lisboa, 4 de Abril de 2025
O Árbitro Singular
(António Barros Lima Guerreiro)