|
|
Versão em PDF |
Consultar versão completa em PDF
SUMÁRIO:
A revogação parcial da liquidação impugnada, implicou que a instância atinente à apreciação da legalidade do ato tributário de liquidação, se extinga por inutilidade superveniente da lide, tendo sido emitido novo ato de liquidação.
DECISÃO ARBITRAL
A Árbitra Ana Rita do Livramento Chacim, designada pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar o Tribunal Arbitral Singular, constituído em 15.10.2024, decide no seguinte:
-
RELATÓRIO
A..., portador do Cartão de Residência número ..., válido até 06.04.2027, com o número de contribuinte fiscal..., e B..., portadora do Cartão de Cidadão número..., válido até 16.10.2030, com o número de contribuinte fiscal..., ambos com residência fiscal em ..., ...,- ... Silves (doravante designados por “Requerentes” e individualmente “o Requerente” e “a Requerente”), nos termos do disposto do artigo 2.º, n.º 1, alínea a) e do artigo 10.º, , n.º 1, alínea a) do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, adiante abreviadamente designado por “RJAT”), requereu a constituição do Tribunal Arbitral, em que é Requerida a AUTORIDADE TRIBUTARIA E ADUANEIRA (doravante, “Requerida” ou “AT”), peticionando a pronúncia deste Tribunal sobre a liquidação oficiosa n.º 2024..., e correspondentes liquidações de juros compensatórios n.º 2024-... e de juros compensatórios recebimento indevido n.º 2024..., e consequente nota de cobrança n.º 2024..., relativa ao período de rendimentos de 2020, que apurou o montante a pagar no valor de 18.571,68 € (dezoito mil, quinhentos e setenta e um euros e sessenta e oito cêntimos).
-
Do pedido
O Requerente concretiza a final o seu pedido: «Nestes termos e nos demais de direito, deverá V. Exa anular parcialmente a Nota de Liquidação controvertida, nos termos supra expostos, e ordenar a correcção da mesma com a consideração dos rendimentos reais do Requerente, bem como o consequente reembolso dos montantes indevidamente pagos, no montante de 18.571,68 € (dezoito mil, quinhentos e setenta e um euros e sessenta e oito cêntimos) e consequente pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º da LGT. Caso assim não se entenda, V. Exa anular parcialmente a Nota de Liquidação controvertida, nos termos supra expostos, nomeadamente corrigindo os valores de capitais auferidos pelos Requerentes e condenar a Requerida a restituir o montante de 18.306,31 € (dezoito mil, trezentos e seis euros e trinta e um cêntimos).
Para concretização da revogação parcial do ato impugnado, a Requerida indica que foi emitido o ato de liquidação n.º 2025..., referente ao ano de 2020. Na sua Resposta e Alegações, a Requerida pede a este Tribunal que se mantenha na ordem jurídica o (novo) ato tributário de liquidação (n.º 2025...), o qual, não foi remetido a este Tribunal, e sobre o qual a Requerente nada acrescentou. Inexiste igualmente qualquer evidência da respetiva notificação ao sujeito passivo, aqui Requerente, designadamente, nos termos e para os efeitos do artigo 13.º, n.º 2 do RJAT. A Requerente não apresentou requerimento ao Tribunal para efeitos de ampliação da instância (cf. artigo 63.º CPTA), permanecendo inalterado o pedido inicialmente apresentado. Estando o tribunal limitado na sua decisão, ao pedido apresentado pela Autor/Requerente na petição inicial (princípio do pedido), estabelecido no artigo 609.º, n.º 1, do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1 RJAT: “1 - A sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir”, não pode este Tribunal senão entender que a segunda liquidação tem autonomia em relação à liquidação inicial e, por isso, constitui um novo ato de liquidação que não se encontra no âmbito do presente pedido arbitral.
-
Tramitação processual
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD, em 07.08.2024, e em conformidade com o preceituado no artigo 11.º, n.º 1, alínea c), do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66¬B/2012, de 31 de dezembro, tendo sido notificada nessa data a AT.
A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto do artigo 6.º, n.º 1 e do artigo 11.º, n.º 1, alínea b) do RJAT, o Conselho Deontológico, designou a árbitra do Tribunal Singular, aqui signatária, que comunicou a sua aceitação, nos termos legalmente previstos.
Em 25.09.2024, as partes foram devidamente notificadas da designação do árbitro, e não manifestaram vontade de a recusar, nos termos do artigo 11.º n.º 1, alínea a) e b), do RJAT e artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Desta forma, o Tribunal Arbitral Singular foi regularmente constituído em 15.10.2024, com base no disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do RJAT, para apreciar e decidir o objeto do presente litígio, e automaticamente notificada a AT, para querendo se pronunciar, conforme consta da respetiva ata.
Em 15.10.2024 foi proferido o despacho previsto no artigo 17.º do RJAT, mandando-se notificar a AT para, no prazo de 30 (trinta) dias, apresentar Resposta, juntar cópia do processo administrativo e, querendo, requerer a produção de prova adicional.
Em 18.11.2024 a Requerida apresentou um requerimento para suspensão da instância, fundamentando que os elementos solicitados às autoridades fiscais alemãs serem imprescindíveis para a análise do ato ora impugnado e para a descoberta da verdade material.
Em 20.11.2024 a Requerente apresentou um requerimento no sentido de se opor à suspensão da instância até à conclusão do procedimento de troca de informações.
Em 21.12.2024, foi proferido despacho com referência ao requerimento para suspensão da instância, determinando-se que, «Considerando os princípios da autonomia e do inquisitório que regem o processo arbitral, defere-se a pretensão da Requerida para efeitos de suspensão da instância, determinando-se o dia 20 de janeiro de 2025 como data para levantamento da suspensão. A Requerida deve promover as melhores diligências ao abrigo do procedimento de troca de informações encetado. Notifiquem-se as Partes.»
Em 02.01.2025 a Requerida apresentou um requerimento, tendo sido junto na mesma data, o despacho proferido pela Senhora Subdiretora Geral da AT, de 30.12.2024, no sentido de proceder à revogação parcial do ato de liquidação de IRS n.º 2024..., relativa ao ano de 2020.
Em 07.01.2025 foi proferido despacho deste Tribunal, determinando-se que: «Tendo em consideração,
i. O despacho deste Tribunal proferido em 21.12.2024, com referência ao requerimento para suspensão da instância apresentado pela Requerida em 18.11.2024, tendo determinado este Tribunal que: «Considerando os princípios da autonomia e do inquisitório que regem o processo arbitral, defere-se a pretensão da Requerida para efeitos de suspensão da instância, determinando-se o dia 20 de janeiro de 2025 como data para levantamento da suspensão. A Requerida deve promover as melhores diligências ao abrigo do procedimento de troca de informações encetado.»;
ii. A suspensão da instância, ao abrigo do disposto do art. 276.º CPC, aplicável subsidiariamente nos termos do art. 29.º do RJAT, foi fundamentada pela necessidade alegada pela AT, de recurso ao procedimento de troca de informações com as autoridades fiscais alemãs, por se considerar que os elementos solicitados são imprescindíveis para a análise do ato ora impugnado e para a descoberta da verdade material;
iii. Que, em 02.01.2025 a Requerida vem informar este Tribunal que, «por despacho da Subdiretora-geral de 2024-12-30, foi revogado parcialmente o ato impugnado», anexando a respetiva informação técnica.
iv. Que, em 03.01.2025, o Requerente, vem apresentar requerimento, indicando que, «notificado da revogação parcial do Ato de Liquidação controvertido, vem informar que pretende o prosseguimento dos Autos».
Entende este Tribunal que, tendo sido recebida a informação solicitada às autoridades fiscais alemãs, que esteve na base da suspensão da instância decretada pelo despacho de 21.12.2024, declara-se cessada essa suspensão, com junção ao processo da respetiva documentação.
Notifique-se a Requerida para, no prazo de 30 dias, apresentar resposta, juntar cópia do processo administrativo e, querendo, requerer a produção de prova adicional. (…)»
Em 06.02.2025 a Requerida apresentou a Resposta.
Por despacho de 10.02.2025, a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT foi dispensada, determinando-se que: «À luz dos princípios da autonomia que regem o processo arbitral (artigo 29.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária- RJAT) e do princípio da livre condução do processo a que se refere o artigo 19.º do RJAT) dispensa-se a reunião do tribunal arbitral a que se refere o artigo 18.º desse Regime e determina-se o prosseguimento do processo mediante a notificação das partes para, querendo, no prazo simultâneo de 15 (quinze) dias, apresentarem alegações finais escritas, formulando expressamente as respetivas conclusões. (…)».
As partes apresentaram as respetivas alegações finais: a Requerente no dia 27.02.2025 e a Requerida no dia 28.02.2025.
Em 31.03.2025 foi proferido despacho deste Tribunal, determinando-se a notificação à Requerente para, «(…) para, perante a revogação parcial do ato, informar, no prazo de 5 dias, se mantém interesse em prosseguir com a presente impugnação.».
Em 09.04.2025 foi apresentado respetivo requerimento pela Requerente.
-
POSIÇÃO DAS PARTES
-
Pedido inicial do Requerente
A fundamentar o seu pedido de pronúncia arbitral, o Requerente alegou, com vista à declaração de anulação do ato de liquidação de IRS identificado, o seguinte:
-
Foi notificado no dia 15.06.2023, do Ofício da Requerida n.º ..., pela falta de declaração de rendimentos obtidos na Alemanha, durante o ano de 2020. Em concreto:
€ 27.347,71 referentes a rendimentos de pensões e € 27.364,97, referentes a rendimentos de capitais.
-
Foi assim emitida nova nota de liquidação (número 2024...), com um montante de imposto no valor de € 12.885,50, acrescido de juros compensatórios no valor de
€ 1.814,11(total a pagar no valor € 14.699,61).
-
O Requerente procedeu ao respetivo pagamento, tendo restituído o reembolso de imposto pago anteriormente, no valor de € 3.872,07, acrescido de juros compensatórios por recebimento, alegadamente, indevido, no valor de € 421,78.
-
Alega o Requerente que, competia à AT provar que o Requerente, de facto, auferiu na Alemanha os rendimentos que lhe imputa.
-
Acrescenta que os factos considerados como pressuposto e condição do ato impugnado não constam de qualquer documento, não bastando à AT informar o contribuinte de que existe uma comunicação de valores, com uma consequente qualificação de rendimentos, obtidos noutro país para que automaticamente possa ser erigido um ato de liquidação adicional com base única e exclusivamente nessa informação.
-
Entende que as informações prestadas pelas autoridades tributárias estrangeiras apenas fazem fé quando fundamentadas, e baseadas em critérios objetivos nos termos da lei (cf. artigo 76.º. n.º 1 e 4 da LGT). Cabe à AT atestar a realidade material que se lhes encontra subjacente, designadamente face aos elementos apresentados pelo próprio contribuinte para o procedimento tributário.
-
Considera que o ato tributário é ilegal, por vício de violação da lei, consubstanciado em erro sobre os pressupostos de facto e em violação do disposto nos artigos 74.º e 76.º da LGT, quanto às regras do ónus da prova no procedimento tributário, pelo que a liquidação ora impugnada ser anulada.
-
Nestes termos, entende que a nota de liquidação ora controvertida deverá ser parcialmente anulada, bem como a Requerida ser condenada a restituir os montantes indevidamente pagos, tanto a título de IRS, no valor 14.699,61 € (catorze mil, seiscentos e noventa e nove euros e sessenta e um cêntimos), acrescido dos valores que indevidamente restituiu à Requerida, no montante de €3.872,07. Vem ainda requerer o pagamento de juros indemnizatórios sobre os montantes indevidamente pagos.
-
Sem prescindir, alega ainda que, não auferiu os rendimentos que as Autoridades Tributárias Portuguesas e Alemãs lhe imputam, argumentando com uma possível situação de erro na informação prestada, como terá acontecido em 2017. Afirma assim que apenas recebeu no decurso do ano de 2020, os valores de €23.934,96, em virtude do contrato de Seguro de Pensão de Velhice, celebrado em 2010 com C... AG e D... AG.
-
O referido montante (€ 23.934,96) corresponde à soma entre um valor anual de
€ 22.987,20 recebido a título de (12) prestações mensais de € 1.915,60, acrescido de
€ 947,76 decorrentes de juros de capitais, dividendos e demais rendimentos capitais.
-
A respeito do referido contrato, esclarece o Requerente que as prestações mensais que recebe advêm de um depósito efetuado por este junto das Entidades Seguradoras referidas, e, deste dinheiro, recebe, ocasionalmente, quando os há, juros sobre a aplicação do seu dinheiro.
-
Desta forma, o contrato de pensão privada em questão, assemelha-se a um contrato de depósito junto de um banco, recebendo rendimento de capitais (no caso da pensão privada, dividendos e lucros, e no depósito bancário, juros). Alega que este é o único rendimento tributável, pelos quais deveria ser tributado à taxa prevista no artigo 72.º do CIRS (imposto a pagar no valor de €265,37).
-
Nestes termos, entende que deverá ser parcialmente anulada a Nota de Liquidação ora controvertida, bem como a Requerida ser condenada a restituir os montantes indevidamente pagos, tanto a título de IRS, no valor de €14.434,24, acrescido dos valores que o Requerente indevidamente restituiu à Requerida, no montante de € 3.872,07, (num total de €18.571,68), bem como juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º da LGT, sobre os montantes indevidamente pagos.
-
Resposta da Requerida
A Requerida, devidamente notificada para o efeito na sequência da obtenção das informações prestadas pelas autoridades fiscais alemãs, apresentou tempestivamente a sua Resposta, alegando, em síntese, o seguinte.
-
Começa por indicar, como ponto prévio, que por despacho da Senhora Subdiretora-geral da AT, de 30.12.2024, foi revogado parcialmente o ato impugnado, conforme comunicado ao tribunal arbitral em 02.01.2025, pelo que já não está em causa, no presente pedido de pronuncia arbitral, o ato de liquidação n.º 2024 ... do ano de 2020. Na sequência do referido despacho e para concretização do mesmo, foi emitido o ato de liquidação n.º 2025..., referente ao ano de 2020.
-
Conclui que, no ano de 2020, o Requerente auferiu rendimentos de pensões no valor total de €26.065,26 (pagos a título de reembolso de capital investido), e rendimentos de capitais no total de 1.403,27€.
-
Relativamente às rendas abrangidas pela al. d) do n.º 1 do artigo 11.º do Código de IRS e atendendo ao n.º 1 do artigo 54.º do Código o IRS, as importâncias pagas ao Requerente a título de reembolso de capital no valor de 26.065,26€ não são tributáveis em sede de IRS, e o montante de 1.403,27€ é tributável em IRS constituindo rendimentos de capitais.
-
Face ao exposto, deve passar a constar do Anexo J da declaração de rendimentos do ano de 2020, sendo somente rendimentos de capitais de fonte alemã no valor de 1.403,27€.
-
Desta forma, entende que deve ser julgado improcedente o presente pedido de pronuncia arbitral, por não provado, mantendo-se na ordem jurídica o ato tributário de liquidação n.º 2025..., referente ao ano de 2020 e absolvendo-se, em conformidade, a entidade requerida do pedido.
-
ALEGAÇÕES FINAIS
As Partes pronunciaram-se no prazo concedido para a apresentação das alegações finais escritas, reiterando os entendimentos apresentados.
-
SANEAMENTO
O Tribunal foi regularmente constituído, é competente, tendo em vista as disposições contidas no artigo 2.º, n.º 1 e artigo 5.º, nºs. 1 e 3 ambos do RJAT.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas, estando ambas regularmente representadas, de harmonia com os artigos 4.º e 10.º, nº 2, ambos do RJAT.
O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT.
O processo não enferma de nulidades.
Cumpre apreciar e decidir.
-
MATÉRIA DE FACTO
-
Factos provados
Para a decisão da causa submetida à apreciação do Tribunal, cumpre atender aos seguintes factos que se julgam provados:
-
O Requerente é residente para efeitos fiscais em Portugal - facto não controvertido;
-
O Requerente celebrou um contrato de seguro de pensão [R...], com data de início da Apólice 01.08.2010. - cf. cópia junta aos autos, com respetiva tradução certificada;
-
Emissão da liquidação oficiosa liquidação de IRS n.º 2024..., e correspondentes liquidações de Juros Compensatórios n.º 2024-... e Juros Compensatórios por Recebimento Indevido n.º 2024-..., que originaram a Nota de Cobrança n.º 2024.... de valor a pagar no montante de €18.571,68, com referência ao ano de 2020. – cf . cópias juntas aos autos como “Doc.1” e “Doc.2”
-
Pedido de troca de informação em matéria fiscal entre a AT e as autoridades da República Federal da Alemanha – cf. cópia do pedido junto ao PA;
-
Em 30.12.2024 foi proferido despacho pela Senhora Subdiretora Geral da AT, no sentido de proceder à revogação parcial do ato de liquidação de IRS n.º 2024..., referente ao período de tributação de 2020 - cf. cópia junta aos autos como “revogação parcial”, em 24.07.2024, com a Resposta da Requerida.
-
Da concretização da revogação parcial do ato impugnado, foi emitido o ato de liquidação n.º 2025..., referente ao ano de 2020 – facto não controvertido;
-
Demostração de Compensação contendo a indicação do Valor Regularizado (- 18.571.68€) e do Valor em Dívida € 0,00 - cf. documento junto ao PA “IRS 2020 - Liquidação 2024 ... - Regularizada.pdf;
-
O pedido de pronúncia arbitral foi efetuado no dia 05.08.2024 e aceite em 07.08.2024.
-
Factos não provados
Com interesse para a decisão da causa, inexistem factos não provados.
-
Motivação da decisão da matéria de facto
O Tribunal não tem de se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe apenas selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada e com relevância para a decisão – cf. n.º 2, do art.º 123.º do CPPT e n.º 3 do art.º 607.º do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicável ex vi al. a) e e) do n.º 1, do art. 29.º do RJAT.
A convicção do Tribunal quanto à matéria de facto dada como provada, para além do reconhecimento de factos não controvertidos pelas partes, resultou da análise crítica dos documentos juntos aos autos com o pedido de pronúncia arbitral, da resposta da Requerida e dos demais documentos juntos e constantes do processo, como indicado em relação a cada facto julgado provado.
-
MATÉRIA DE DIREITO
-
Considerada a matéria controvertida, e as posições apresentadas pelas Partes, refere-se que, pelo presente pedido de pronúncia arbitral, a Requerente pretendeu a anulação parcial da nota de liquidação n.º 2024..., bem como a Requerida ser condenada a restituir os montantes indevidamente pagos, tanto a título de IRS, no valor de €14.434,24, acrescido dos valores que o Requerente indevidamente restituiu à Requerida, no montante de € 3.872,07, (num total de €18.571,68), e juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º da LGT, sobre os montantes indevidamente pagos.
-
A AT não demonstrou a regular tramitação do procedimento, nomeadamente, a notificação ao sujeito passivo para se pronunciar em sede de audiência prévia, para efeitos de participação do contribuinte na formação da decisão.
-
Com a Resposta apresentada pela Requerida em 06.02.2024, esta veio informar o Tribunal Arbitral do despacho da Senhora Subdiretora-geral, de 30.12.2024, que revogou parcialmente o ato impugnado (ato de liquidação n.º 2024...). Alega a AT que, na sequência do referido despacho de revogação e para concretização do mesmo, foi emitido um (novo) ato tributário de liquidação, identificado com o n.º 2025..., referente ao ano de 2020, o qual não é objeto do presente pedido arbitral, conforme já aqui explanado.
-
Na sequência do referido despacho, a Requerente nada acrescentou ou requereu, demonstrando, fundamentalmente, interesse na prossecução dos autos.
-
Foi aceite pela AT, que as importâncias pagas ao requerente a título de reembolso de capital no valor de €26.065,26 não são tributáveis em sede de IRS (cf. artigo 11.º, n.º 1, al. d) do Código de IRS), sendo que este montante corresponde à soma entre €22.987,20 (€1915,60*12 mensalidades) e €3.078,06. Mantém-se sujeito a IRS o montante de €1.403,27 (€947,76+€455,51) por constituir rendimento de capitais (cf. artigo 54.º, nº1 do Código do IRS). Enquadramento com o qual concorda este Tribunal, mantendo-se apenas sujeito a IRS os montantes pagos a título de reembolso não garantido, por constituir rendimento de capitais (cf. artigo 54.º, n.º1, do Código do IRS). Em conformidade, e como resultaria fundamentado pela AT, mostra-se verificado o direito à devolução do correspondente montante de imposto incidente sobre as importâncias recebidas a título de reembolso de capital investido, e respetivos juros indemnizatórios (cf. entendimento constante do despacho que fundamenta a revogação parcial do ato de liquidação de IRS n.º 2024..., referente ao período de tributação de 2020 - ponto 5. da matéria de facto).
-
Entendimento este que deverá beneficiar a análise da AT, obviando à reincidência de enquadramento tributário diferenciado perante a mesma factualidade.
-
Pelo benefício que oferece à matéria subjacente ao presente processo, refere-se o enquadramento efetuado na decisão prolatada no Processo n.º 84/2024-T, determinando--se a natureza do tipo de “produto” que está na origem da obtenção dos rendimentos pelo Requerente vs determinação do rendimento tributável.
-
Conclui a AT que «10. Perante o exposto, é de deferir parcialmente o solicitado pelo requerente devendo passar a constar do Anexo J da declaração de rendimentos do ano de 2020, somente rendimentos de capitais de fonte alemã no valor de 1.403,27€. 11. No que respeita ao direito a juros indemnizatórios, estipula o artigo 43.º, n.º 1, da LGT, que “São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.” 12. Atendendo a que, na presente situação, se verificou que o Requerente efetuou o pagamento da liquidação de IRS e existe erro imputável aos serviços, será de conceder o direito a juros indemnizatórios a favor do contribuinte.»
-
De referir que o despacho de revogação parcial sobre a liquidação n.º 2024..., aqui identificada e objeto do presente PPA, foi comunicado pela AT em 02.01.2025, ou seja, após a data de constituição do Tribunal Arbitral (15.10.2024).
-
Pelo que se refere, cumpre apreciar a utilidade da apreciação do pedido.
-
A respeito da inutilidade superveniente da lide pronunciou-se já o Supremo Tribunal Administrativo no Acórdão de 30 de Julho de 2014, proferido no âmbito do processo n.º 0875/14, no qual referiu que “A inutilidade superveniente da lide (que constitui causa de extinção da instância - al. e) do art. 277o do CPC) verifica-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a solução do litígio deixe de interessar, por o resultado que a parte visava obter ter sido atingido por outro meio”.
-
É também este o sentido que a doutrina tem conferido ao conceito em análise, referindo LEBRE DE FREITAS, RUI PINTO e JOÃO REDINHA, no Código de Processo Civil Anotado, Volume 1.º, 2.ª edição, Coimbra Editora, 2008, p. 555, que “(...) a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide dá-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo, ou encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida. Num e noutro caso, a solução do litígio deixa de interessar – além, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por já ter sido atingido por outro meio”.
-
Ora, resulta da matéria de facto dada como provada nos presentes autos, que o ato tributário impugnado pelo Requerente foi revogado parcialmente pela AT, com base na fundamentação constante da Informação da Direção de Serviços das Relações Internacionais da AT, a qual sofreu o respetivo despacho da Senhora Subdiretora-geral, em 30.12.2024.
-
Significa isto que a liquidação de IRS objeto do pedido arbitral (ato de liquidação n.º 2024 5...) e correspondentes liquidações de juros compensatórios n.º 2024-... e de juros compensatórios recebimento indevido n.º 2024..., e consequente nota de cobrança n.º 2024..., relativa ao período de rendimentos de 2020, sindicada nos presentes autos, foi (parcialmente) revogada, no sentido de serem desconsiderados como rendimentos para efeitos de tributação em sede de IRS, os montantes pagos ao Requerente a título de reembolso de capital investido (cf. entendimento propugnado pela Requerente nos artigos 78.º a 80.º do PPA).
-
Sendo que, afirma a AT que para a concretização do entendimento sobre matéria controvertida, foi emitido um (novo) ato tributário de liquidação (n.º 2025...), referente ao ano de 2020, o qual não foi junto aos autos pela AT, inexistindo igualmente qualquer evidência da respetiva notificação ao sujeito passivo, aqui Requerente, designadamente, nos termos e para os efeitos do artigo 13.º, n.º 2 do RJAT.
-
Em face do exposto entende este Tribunal que se verifica a inutilidade superveniente da lide quanto à apreciação da legalidade sobre a matéria controvertida, objeto do pedido arbitral, e consequente anulação do ato tributário impugnado pelo Requerente, de tal forma que se julga extinta a instância nos termos e para os efeitos previstos no artigo 277.º, alínea e), do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.
-
DECISÃO
Nos termos expostos, este Tribunal Arbitral decide:
-
Declarar extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos do artigo 277.º, alínea e) do CPC, ex vi 29.º do RJAT;
-
Absolver a Requerida da instância;
-
Condenar a Requerida no pagamento das custas do processo.
-
VALOR DO PROCESSO
A Requerente indicou como valor da causa o montante de € 18.571,68 (dezoito mil, quinhentos e setenta e um euros e sessenta e oito cêntimos), que não foi contestado pela Requerida e corresponde ao valor da liquidação a que se pretendia obstar, pelo que se fixa nesse montante o valor da causa, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 97.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
-
CUSTAS
Nos termos do disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, do RJAT e no artigo 4.º, n.º 4, e na Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, o montante das custas é fixado em € 1.224,00 (mil, duzentos e vinte e quatro euros), cujo pagamento fica a cargo da Requerida.
Notifique-se.
Lisboa, 11 de abril de 2025
A Árbitra do Tribunal Arbitral
Ana Rita Chacim
|
|