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SUMÁRIO:
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Os bens dados em locação em contratos qualificados como de locação financeira não integram o ativo da entidade locadora, não sendo as depreciações praticadas sobre os mesmos um gasto fiscalmente dedutível na sua esfera, mas sim do locatário.
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Dos elementos dos autos não emerge qualquer dúvida objetivamente fundada de que as serviços em causa não se tenham realizado pelo que, ainda que existisse qualquer incumprimento formal de algumas das alíneas do n.º 4 do artigo 23.º do CIRC, que a Requerida, como vimos, não indica, ainda assim, por estarem identificados todos os elementos necessários ao controlo das operações económicas em causa, sempre havia que considerar não haver violação dos nº 3º e 4º do artigo 23º do CIRC, sendo, consequentemente, inaplicável o artigo 23º-A, nº 1, al. c), do CIRC.
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Ocorre duplicação de coleta quando, estando pago por inteiro um tributo, se exigir da mesma ou diferente pessoa um outro de igual natureza, referente ao mesmo facto tributário e ao mesmo período de tempo», o que significa que a duplicação de coleta exige a verificação cumulativa dos seguintes requisitos: i) o facto tributário ser o mesmo, ii) ser idêntica a natureza do imposto já pago e o que, de novo, se exige, iii) referirem-se ambos os impostos ao mesmo período temporal.
DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros Regina de Almeida Monteiro (Presidente), José Manuel Parada Ramos e Sofia Quental (Adjuntos), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral Coletivo, constituído em 14 de junho de 2024, acordam no seguinte:
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Relatório
A..., UNIPESSOAL, LDA, NIPC ..., com sede na Rua ..., n.º ..., ..., ...-... ..., concelho do Montijo, com o capital social de 125.000,00 € (cento e vinte e cinco mil euros), tendo sido notificada das liquidações adicionais de IRC e IVA, abaixo identificadas, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 dos artigos 2.° e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, apresentou pedido de constituição do Tribunal Arbitral, pedindo a declaração de ilegalidade das liquidações adicionais de IRC e IVA, no valor de € 60.779,47, objeto do presente pedido de arbitral e, consequentemente, a sua anulação com todos os efeitos legais.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante também identificada por “AT” ou simplesmente “Administração Tributária”).
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Do pedido
Atos impugnados:
(parcialmente) - Liquidação de IRC n.º 2023..., de 20-11-2023, (cfr. Identificação do Acerto de Contas º 2023...), Compensação n.º 2023...) no montante de 30.156,47 €, referente a 2019, incluindo juros compensatórios no montante de 3.479,03 €, valor que se encontra parcialmente regularizado (pagamento em prestações).
Liquidações adicionais de IVA n.ºs:
-2023... no montante de 5 566,00 €
- 2023... no montante de 8 349,00 €
- 2023...no montante de 8 264,59 €
- 2023... no montante de 8 443,41 €,
A Requerente peticiona:
“Nestes termos, a Requerente pede que o Tribunal declare a ilegalidade das liquidações adicionais de IRC e IVA, que são objeto do presente pedido de Decisão Arbitral e, consequentemente determine a sua anulação com todos os efeitos legais”.
1.2. Tramitação processual
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi apresentado em 01-04-2024 e aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD em 03-04-2024 e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira.
A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 2, alínea a) e do artigo 11.º, n.º 1, alínea a), ambos do RJAT, e em 23-05-2024 o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, designou como árbitros do Tribunal Arbitral coletivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável. As partes foram notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.
Em conformidade com o disposto no artigo 11.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, o Tribunal Arbitral coletivo ficou constituído em 14 de junho de 2024, e no dia 21-06-2024 a Requerida foi notificada para apresentar Resposta e juntar o Processo Administrativo (PA).
Em 10-09-2024, a Requerida apresentou requerimento pedindo a prorrogação do prazo para apresentar a Resposta, o qual foi deferido por despacho proferido e notificado no mesmo dia.
A Requerida juntou o PA em 24-09-2024 e apresentou a Resposta, em que se defendeu por impugnação e exceção, invocando a inutilidade superveniente da lide, tendo junto o despacho de anulação parcial do ato em causa.
Por despacho de 01-10-2024, notificado às Partes em 03-10-2024, o Tribunal Arbitral dispensou a realização da reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, ao abrigo dos princípios da autonomia do Tribunal arbitral na condução do processo, da celeridade, simplificação e informalidade processuais previstos nos artigos 19.º, n.º 2 e 29.º, n.º 2, todos do RJAT.
Foi concedido prazo à Requerente para apresentar a defesa às exceções alegadas pela Requerida.
A 18-10-2024 a Requerente e 25-10-2024 a Requerida apresentaram alegações escritas tendo a Requerente respondido à exceção.
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Saneamento
O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, como se dispõe no artigo 2.º, n.º 1, al. a) e 4.º, ambos do RJAT.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas (artigos n.º 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º a 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
O processo não enferma de nulidades.
Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação da causa.
3. Matéria de facto
3.1. Factos provados
O Tribunal Arbitral considera provados os seguintes factos com relevo para a decisão:
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A Requerente está inscrita como sujeito passivo em sede de IRC, está enquadrada no regime geral de tributação e IVA, desde 2018-11-19, com enquadramento no regime normal trimestral; (facto não contravertido).
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A Requerente encontra-se inscrita desde 12.09.2018, para o exercício da atividade principal de “Transportes rodoviários de mercadorias”, CAE 49410, e das atividades secundárias de “Manutenção e reparação de veículos automóveis”, CAE 45200, “Aluguer de veículos automóveis ligeiros”, CAE 77110, e “Aluguer de veículos automóveis pesados”, CAE 77120; (cfr. PPA e PA).
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A Requerente foi objeto de uma ação de inspeção externa determinada pela Ordem de serviço n.º ... de 07-11-2023, emitida pela Direção de Finanças de Setúbal; (cfr. PPA e RIT).
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O processo de inspeção teve início em 04-04-2024; (cfr. RIT).
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Na sequência dessa ação de inspeção foram emitidas as seguintes liquidações adicionais.
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Liquidações que tinham como data limite de pagamento: IRC - 10-01-2024 e IVA 03-01-2024; (cfr. PPA, Resposta e PA – facto não controvertido).
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As referidas liquidações resultaram das seguintes correções que constam do RIT:
“1. Em sede de IRC
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Omissão de réditos pela prestação de serviços de locação financeira
“Em 2019 a Requerente registou na sua contabilidade, na conta SNC 433, a aquisição de diversas viaturas pelo montante líquido de 294.312,00 euros.
De acordo com os elementos constantes do registo de propriedade e IMT, estas viaturas foram registadas em nome da A... Unipessoal, Lda. no início do ano de 2019, tendo sido na mesma data, registada a locação a favor da sociedade B..., Lda.
Na contabilidade da A... apenas se encontra registado o rédito referente à fatura 4 4/1 emitida em 29.11.2019, pelo montante de 12.200,00 euros acrescido de IVA no montante de 2.806,00 euros, com a descrição “Locação de viaturas conforme anexo referente a Janeiro/2019”. Face à inexistência de outros réditos registados na contabilidade, procedeu-se à notificação do sujeito, bem como da B..., Lda., para apresentação dos contratos de locação das viaturas em causa.
Face à notificação enviada, veio a B... Lda. apresentar os referidos contratos de locação e/ou contratos de compra e venda a prestações, de acordo com os quais se conclui que efetivamente, pela prestação de serviços de locação financeira, foramomitidos réditos no montante de 133.100,00 euros, a serem acrescido ao resultado fiscal declarado em 2019, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 20.º e artigo 17.º, ambos do CIRC.”
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Depreciações não aceites fiscalmente
“No período 2019, o sujeito passivo registou a débito da conta SNC 6423, o montante de € 55.184,50, referente ao reconhecimento do gasto com depreciações das viaturas mencionadas anteriormente.
Da análise do teor dos contratos realizados entre as duas sociedades, e contrariamente à designação que é dada em cada um dos contratos, conclui-se tratar-se de uma locação financeira, de acordo com os parágrafos 4, 7 e 11 da NCRF 9.
Contribuem para essa conclusão, a opção de compra facultada ao locatário no final do contrato, bem como a assunção dos riscos e vantagens inerentes à propriedade da viatura associada ao locatário.
Tratando-se de uma efetiva locação financeira, determina o n.º 1 do artigo 13.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, as depreciações dos bens objeto desses contratos, são gastos do período dos respetivos locatários, e não do locador. Pelo que, ao abrigo deste normativo, conjugado com a alínea g) do n.º 2 do artigo 23.º do CIRC, o montante de 55.184,50 euros não concorre para o apuramento do Lucro Tributável do sujeito passivo.”
1.3. Gastos com serviços de consultoria
“O sujeito passivo reconheceu como gasto na conta SNC 6221, o montante de 4.500,00 euros, referente a serviços de consultoria, gestão e administração, faturados pela sociedade espanhola C... S.L. VAT ... . Notificado para apresentar elementos que comprovassem a realização dos serviços mencionados nas faturas, o sujeito passivo veio afirmar que os serviços foram prestados por D..., que à data trabalhava para a sociedade espanhola, não tendo no entanto apresentado quaisquer elementos que comprovem a realização de quaisquer serviços, e não sendo possível aferir da sua indispensabilidade para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto, não pode o gasto ser fiscalmente aceite nos termos dos n.º 1 e das alíneas c) e e) do n.º 4, ambos do artigo 23.º do CIRC, procedendo-se ao seu acréscimo ao LT declarado em 2019.”
1.4. Gastos não documentados (*)
“O sujeito passivo reconheceu como gasto na conta SNC 6888, o montante de 5.388,69 euros, através do documento n.º 4000001 de 30.04.2019, cuja descrição consta como “Constituição do Plano”, e cujo documento de suporte não se encontra arquivado nas pastas da contabilidade. Apesar de notificado para apresentar os documentos de suporte ao gasto reconhecido, não tendo o sujeito apresentado até à presente data quaisquer elementos, não pode aferir-se da dedutibilidade fiscal do gasto suportado, nem da sua efetividade, pelo que vai o mesmo ser acrescido ao LT declarado em 2019, ao abrigo do disposto nos n.º 3 e 4 do artigo 23.º do CIRC.”
(*) Correção esta não incluída pela Requerente no PPA
“Face às correções apuradas nos pontos anteriores, o Prejuízo Fiscal declarado pelo sujeito passivo em 2019, vai ser corrigido no montante de 198.173,19 euros:
Prejuízo Fiscal declarado - 68.280,61 euros
Correção 198.173,19 euros
Lucro Tributável corrigido 129.892,58 euros.”
2. Em sede de IVA
2.1. Falta de liquidação de IVA em prestação de serviços de locação financeira
“Tal como mencionado no ponto 1.1. deste parecer, verificou-se que em 2019, com base nos contratos de locação apresentados, e de acordo com o registo efetuado no cadastro de veículos automóveis, o sujeito passivo prestou serviços de locação financeira à sociedade B..., Lda., com data de início de 01.01.2019.
Tratando-se de uma prestação de serviços, é sujeita a IVA nos termos do n.º 1 do artigo 4.º e alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º, ambos do CIVA, sendo o imposto exigível no momento da sua realização, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 7.º do CIVA, e de acordo com a alínea b) do n.º 1 do artigo 8.º do CIVA, no términus do prazo previsto para a emissão da fatura.
O seu valor tributável corresponde ao valor da contraprestação, constante do contrato, nos termos do n.º 1 do artigo 16.º do CIVA, sujeito a imposto à taxa normal a que se refere a alínea c) do n.º 1 do artigo 18.º do CIVA.
Por aplicação da taxa de 23% aos valores mensais constantes dos contratos, foi calculado IVA em falta no montante global de 30.613,00 euros, distribuído por período de imposto, nos seguintes valores:
2019-03T: 5.566,00 euros
2019-06T: 8.349,00 euros
2019-09T: 8.349,00 euros
2019-12T: 8.349,00 euros”
Da documentação constante do processo, o Tribunal considera igualmente provados os seguintes factos:
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No período 2019, a Requerente registou a débito da conta SNC 6423 – Gastos de depreciação e de amortização – Ativos Fixos tangíveis – Equipamento básico, o montante de 55.184,50 €, referente ao reconhecimento do gasto com depreciações de viaturas que se encontram reconhecidas na sua contabilidade pelo montante de 294.312,00 € e que foram objeto, nesse mesmo ano, de 34 contratos celebrados com B... Lda., 16 dos quais denominados “contrato de compra e venda a prestações de veículo automóvel” e os outros 18 denominados “contrato de aluguer operacional de veículo automóvel” (ou de “contrato de aluguer operacional de semi-reboque”).
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O valor atribuído àquelas viaturas nos referidos contratos totaliza € 556.600,00 (valor correspondente ao somatório do preço estabelecido para cada uma das viaturas nos 34 Contratos celebrados entre a A... e a B... que consta do quadro 9 do RIT).
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A propriedade das viaturas objeto dos contratos denominados de “contrato de compra e venda a prestações”, permaneceu registada na Conservatória do registo Automóvel em nome da Requerente, não tendo, portanto, o respetivo título de propriedade sido transferido para a B... Lda..
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Esses contratos preveem o pagamento do preço global do contrato em 36 prestações mensais de igual montante, que totalizam 78,26% do valor do contrato, acrescidas de uma prestação final de importância equivalente a 21,74% daquele mesmo valor.
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Os contratos denominados de “contrato de aluguer operacional” preveem o pagamento de 36 prestações mensais de igual montante, que perfazem 78,26% do valor do contrato, e de uma última prestação de importância equivalente a 21,74% daquele mesmo valor, a título de valor residual se a B... optar pela sua compra.
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Em ambas as tipologias de contrato, os riscos de perda, deterioração, defeito de funcionamento e imobilização do veículo correm por conta da B... Lda.
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Caso a B... pretenda revogar o contrato designado por “contrato de compra e venda a prestações de veículo automóvel”, fica obrigada ao pagamento de um montante compensatório a fixar pela Requerente.
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Caso a B... pretenda revogar o contrato designado por “contrato de aluguer operacional”, fica obrigada ao pagamento de um montante compensatório a fixar pela Requerente de valor não inferior a 50% do valor dos alugueres vincendos.
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As matrículas das viaturas que constam do Quadro 9 do RIT revelam que as viaturas em causa foram adquiridas pela requerente em estado de uso, a maioria delas contando com mais de 10 anos desde a primeira matrícula.
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Em 2019 a Requerente não emitiu faturas relativamente aos bens por ela locados à B... Lda. nos meses de fevereiro a dezembro desse ano.
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O valor da base tributável dessas prestações de serviços é de € 133.100,00, tendo ficado por liquidar IVA na importância de € 30.613,00 messe ano de 2019.
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Nas declarações periódicas de IVA referentes aos períodos 2020-03T a 2020-12T e 2021-12T, a Requerente incluiu o valor do IVA relativo aos meses de fevereiro a dezembro de 2019; (cfr. RIT).
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Juntas às suas alegações, a Requerente apresentou cópia das seguintes faturas por ela emitidas entre 14 de fevereiro de 20 e 28 de dezembro de 2021: (*)
Nº fatura
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Data
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Descrição
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Valor Tributável (€)
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IVA (€)
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1 2020/1
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14/02/2020
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Locação de viaturas anexo referente a fevereiro 2019
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12 200,00
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2 806,00
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1 2020/2
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15/05/2020
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Locação de viaturas anexo referente a março 2019
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12 200,00
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2 806,00
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1 2020/5
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14/09/2020
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Locação de viaturas anexo referente a abril 2019
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12 200,00
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2 806,00
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1 2020/6
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24/11/2020
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Locação de viaturas anexo referente a maio 2019
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12 200,00
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2 806,00
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1 2020/7
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05/12/2020
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Locação de viaturas anexo referente a junho 2019
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12 200,00
|
2 806,00
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1 2020/8
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05/12/2020
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Locação de viaturas anexo referente a julho 2019
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12 200,00
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2 806,00
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1 2020/9
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28/12/2020
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Locação de viaturas anexo referente a agosto 2019
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12 200,00
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2 806,00
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1 2020/10
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30/12/2020
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Locação de viaturas anexo referente a setembro 2019
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12 200,00
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2 806,00
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1 2021/5
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28/12/2021
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Locação de viaturas anexo referente a outubro 2019
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12 200,00
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2 806,00
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1 2021/6
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28/12/2021
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Locação de viaturas anexo referente a novembro 2019
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12 200,00
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2 806,00
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1 2021/7
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28/12/2021
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Locação de viaturas anexo referente a dezembro 2019
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12 200,00
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2 806,00
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134 200,00
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30 866,00
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(*) conforme consta do relatório da inspeção tributária, a divergência entre os totais que constam deste quadro e os referidos no ponto (xi) acima, diz respeito à viatura..., cuja prestação mensal constante no “Contrato de Compra e Venda a Prestações” é de € 600,00, mas faturada mensalmente por € 700,00. (cfr. RIT)
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A Requerente pagou o IVA liquidado nessas DP no ano de 2020 e 2021e as faturas em causa foram emitidas em 2020 e em 2021, comunicadas à AT, o IVA foi liquidado e entregue nos Cofres do Estado; (cfr. Quadro do ponto 14. do PPA e Doc. 2 a ele anexo).
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Por despacho de 31-07-24 da Subdiretora-Geral do IR, por delegação de competências) foi parcialmente anulado o ato de liquidação adicional em causa nestes autos relativo à liquidação de IRC:
“Após apreciação do pedido de pronúncia arbitral, afigura-se-nos que o ato de liquidação PARCIALMENTE contestado e objeto do pedido arbitral, liquidação adicional de IRC n.º 2023..., de 20.11.2023, referente ao período de tributação de 2019, de que resultou um total a pagar de 30.156,47 €, valor que se encontra parcialmente regularizado (pagamento em prestações), deve ser parcialmente anulado em resultado do exposto no ponto 4.2.1 desta informação (Omissão de réditos pela prestação de serviços de locação financeira - 133.100,00 €), com as demais consequências legais mormente em sede de juros compensatórios e de juros indemnizatórios”; (cfr. doc. único junto com a Resposta).
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Refere essa informação no ponto 4.2.1. “Omissão de réditos pela prestação de serviços de locação financeira (133.100,00 €):
“(...) Assim e face ao exposto anteriormente, tendo presente que os normativos contabilísticos mencionados têm relevância para efeitos de apuramento do resultado fiscal, e porque não pode a DSIRC, nesta fase do processo de pronúncia arbitral praticar atos de substituição, com base em fundamentação suscitada à posteriori, nada mais nos resta do que anular a correção promovida pelos serviços de inspeção que se consubstanciou num acréscimo ao resultado tributável de €133.100,00.”
2.2. Factos não provados
Não existem quaisquer factos não provados relevantes para a decisão da causa.
2.3. Fundamentação da matéria de facto
O Tribunal Arbitral tem o dever de selecionar os factos relevantes para a decisão da causa e discriminar os factos provados e não provados. Não tem de se pronunciar sobre todos os elementos da matéria de facto alegados pelas partes, conforme previsto no artigo 123.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e no artigo 607.º, n.º 3, do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT.
Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram selecionados em função da sua relevância jurídica, determinada com base nas posições assumidas pelas partes e nas várias soluções plausíveis das questões de direito para o objeto do litígio, conforme decorre do artigo 596.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.
Os factos considerados provados resultaram da análise da prova documental apresentada pela Requerente, a qual foi avaliada pelo Tribunal Arbitral de acordo com o princípio da livre apreciação dos factos, tendo em conta a ausência de contestação especificada pelas partes. Este procedimento está conforme o artigo 16.º, alínea e), do RJAT, e o artigo 607.º, n.ºs 4 e 5, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.
3. Revogação parcial da liquidação pela AT e o prosseguimento do processo quanto aos valores não anulados
A liquidação adicional de IRC e respetivos juros compensatórios foi parcialmente anulada pela AT ao abrigo do disposto no artigo 13.º do RJAT.
A Requerente nas Alegações refere-se expressamente a esta revogação parcial da liquidação adicional de IRC e não se opôs à continuação do processo e pedindo a sua continuação quanto ao valor de IRC do pedido arbitral não incluído no ato de revogação parcial suprarreferido e à liquidação adicional de IVA
Considerando a revogação parcial da liquidação adicional de IRC pela Autoridade Tributária e o pedido da Requerente para a continuação do processo quanto à parte não anulada, decide-se o seguinte:
Confirma-se a revogação parcial da liquidação adicional de IRC que inclui a liquidação adicional de juros compensatórios, conforme comunicado nos autos.
Consequentemente, no que se refere à parte da presente ação arbitral que se baseia na causa de pedir mencionada, e que foi revogada, este Tribunal Arbitral declara a extinção da instância processual. Isso porque o objetivo da ação já foi alcançado por outros meios, conforme disposto nos artigos 277.º, alínea e), e 611.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT).
Dada a extinção parcial da lide, a ação continuará em relação à apreciação das liquidações adicionais de IRC e respetivos juros compensatórios e de IVA não abrangidas pelo despacho de anulação.
4. Matéria de direito
Estando em causa três situações tributárias diferentes, optou-se por tratá-las separadamente, com a descrição das posições que as partes oferecem relativamente a cada uma delas e respetiva apreciação por parte do Tribunal.
4.1 - Depreciações não aceites fiscalmente (€ 55.184,50)
4.1.1 Questão decidenda
A matéria a decidir é se as viaturas locadas pela Requerente à B... Lda. se encontravam corretamente contabilizadas como ativos fixos tangíveis na sua contabilidade e se as respetivas depreciações registadas como gasto em 2019 se mostravam, consequentemente, devidas, o que apenas se verificará se os contratos não forem qualificados como de locação financeira.
4.1.2 Posição da Requerente
Está em causa a qualificação dos contratos como de locação financeira ou de aluguer operacional, defendendo a Requerente que:
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A locação financeira está reservada a determinadas pessoas jurídicas do sistema financeiro, sendo a Requerente uma micro entidade e não uma instituição financeira.
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Ao qualificar os contratos como sendo de locação financeira, a inspeção aponta apenas como indicadores a opção facultada ao locatário no final do contrato, bem como a assunção dos riscos e vantagens inerentes à propriedade da viatura associada ao locatário. (artigo 43 do PPA)
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Uma locação operacional pode conter uma opção de compra, como resulta do parágrafo 31 da NCRF 9.
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Para que a opção de compra seja um indicador de um contrato de locação financeira, é preciso que a opção possa ser feita por um preço que se espera que seja suficientemente mais baixo do que o justo valor à data em que a opção se torne exercível de forma que, no início da locação, seja razoavelmente certo que a opção será exercida.
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A inspeção, perante os contratos, nada fundamenta, não identificando qual é o justo valor à data em que o locatário pode exercer a opção de compra, para se saber se é ou não inferior ao valor residual e considera que o prazo da locação abrange a maior parte da vida económica do Ativo Fixo Tangível, considerando como tal o período de vida útil previsto no Decreto-Regulamentar n.º 25/2009.
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Ora, o período de vida útil para efeitos da aplicação do regime de reintegrações e vida económica para efeitos da NCRF 9 não são a mesma coisa.
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Relativamente à assunção dos riscos e vantagens inerentes à propriedade da viatura, a Inspeção limita-se a remeter para as cláusulas 7.ª, 8.ª, 9.ª e 10.ª, que constam de qualquer contrato de aluguer operacional, sendo que a AT deveria ter fundamentado, sem se limitar a citar princípios genéricos, por que motivo os bens em causa não deviam estar no ativo do seu proprietário.
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Para efeitos fiscais, a questão encontra-se clarificada por força do Despacho do SEAF n.º 16368/2013, de 9.12.2013 (DR II Série, de 18.12.2013) que determina, para efeitos fiscais que: “1 - Face às alterações das regras contabilísticas em matéria de classificação das operações de locação, revoga-se o Despacho n.º 503/2004-W, de 27 de fevereiro, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, publicado no Diário da República de 25 de março de 2004 sob o n.º 5851/2004 (2.ª série), relativamente aos períodos de tributação iniciados em ou após 1 de janeiro de 2010. 2 - Por forma a garantir a consistência da classificação das operações de locação por locador e locatário, mantém-se a obrigatoriedade de menção expressa da respetiva classificação no contrato de locação, sob pena de a classificação atribuída pelas partes no plano contabilístico não ser relevante para efeitos fiscais, nomeadamente em matéria de aplicação do regime de reinvestimento dos valores de realização atualmente previsto no artigo 48.º do Código do IRC”.
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Para efeitos fiscais, a eventual qualificação do contrato como de locação financeira não releva se não constar menção expressa da respetiva classificação no contrato de locação, isto é, à luz do citado Despacho, a inspeção não pode agora requalificar o contrato como de locação financeira e decidir que as viaturas não deviam constar do ativo fixo tangível do locador, pelo que entende que a correção está ferida de ilegalidade.
4.1.3 Posição da Requerida
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De acordo com o §9.2 da NC-ME e §10 da NCRF 9, verificando-se a transferência da propriedade do ativo para o locatário no fim do prazo da locação (alínea a) ou, quando este tem a opção de comprar o ativo por um preço que se espera que seja suficientemente mais baixo do que o justo valor à data em que a opção se torne exercível tal que, no início da locação, seja razoavelmente certo que a opção será exercida (alínea b), estamos perante uma locação financeira, que é o que acontece no presente caso, uma vez que os contratos preveem, a transferência da propriedade ou a opção de compra dos veículos pelo valor residual, no final do prazo de vigência dos contratos.
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Embora seja verdade que a Requerente não tem autorização para a atividade de locação financeira, tal facto não obsta a que, contabilística e fiscalmente sejam considerados e relevados os efeitos da realidade económica subjacente a estas transações em detrimento da sua forma.
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Associada à opção de compra das viaturas, que como bem sabe a requerente, são viaturas com largos anos de uso, algumas das quais com mais de 20 anos desde a 1ª matrícula, sendo que a maioria ronda os 10 anos, acresce o facto de a globalidade de os riscos e vantagens inerentes à sua posse passarem a ser assumidos pela empresa B... Lda., a operação efetivamente subjacente a estes contratos de locação é também uma locação financeira.
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Como consta do RIT, as viaturas usadas objeto de locação foram adquiridos à sociedade C..., S.L. em 2019, encontrando-se reconhecidas na contabilidade pelo seu custo de aquisição de 294.312,00 €, e no caso em apreço estamos perante a celebração de 34 contratos de locação financeira tendo a Requerente a qualidade de locador, cujo valor atribuído àquelas viaturas locadas ascende ao montante de 556.600,00 € (somatório do preço estabelecido para cada uma das viaturas nos 34 Contratos celebrados entre a A... e a B... no quadro 9 do RIT).
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O n.º 1 do artigo 13.º do Decreto-Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, dispõe que “as depreciações ou amortizações dos bens objecto de locação financeira são gastos do período de tributação dos respectivos locatários. (…)”.
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Pelo que, conjugando este normativo com a alínea g) do n.º 2 do artigo 23.º do Código do IRC, o montante de 55.184,50 €, referente às depreciações de viaturas objeto de locação financeira praticadas pela Requerente não são gastos aceites para efeitos fiscais na esfera da A..., devendo ser mantida a correção ao Lucro Tributável efetuada pela IT. (artigo 89.º da Resposta).
4.1.4 Apreciação
Qualificação dos contratos de locação
No caso concreto, a questão deve ser analisada à luz da NCRF 9 – Locações, que prescreve, para locatários e locadores (não subordinados às normas internacionais de relato financeiro), as políticas contabilísticas apropriadas a aplicar em relação a locações financeiras e operacionais e que determina que a classificação de locações baseia -se na extensão até à qual os riscos e vantagens inerentes à posse de um ativo locado permanecem no locador ou no locatário.
Os riscos incluem as possibilidades de perdas devidas a inatividade, obsolescência tecnológica e variações no retorno devidas a alterações nas condições económicas. As vantagens podem ser representadas pela expectativa de funcionamento lucrativo durante a vida económica do ativo e de ganhos derivados de aumentos de valor ou de realização de um valor residual.
A referida norma contabilística baseia a classificação de uma locação como financeira ou operacional com base na substância da transação e não da forma do contrato, enunciando os seguintes exemplos de situações que podem normalmente conduzir a que uma locação seja classificada como uma locação financeira:
a) A locação transfere a propriedade do ativo para o locatário no fim do prazo da locação;
b) O locatário tem a opção de comprar o ativo por um preço que se espera que seja suficientemente mais baixo do que o justo valor à data em que a opção se torne exercível tal que, no início da locação, seja razoavelmente certo que a opção será exercida;
c) O prazo da locação abrange a maior parte da vida económica do ativo ainda que o título de propriedade não seja transferido;
d) No início da locação o valor presente dos pagamentos mínimos da locação ascende a pelo menos, substancialmente, todo o justo valor do ativo locado;
e) Os ativos locados são de uma tal natureza especializada que apenas o locatário os pode usar sem que sejam feitas grandes modificações.
Outros indicadores de situações que individualmente ou em combinação podem também conduzir a que uma locação seja classificada como financeira são:
a) Se o locatário puder cancelar a locação, as perdas do locador associadas ao cancelamento são suportadas pelo locatário;
b) Os ganhos ou as perdas da flutuação no justo valor do residual serem do locatário (por exemplo sob a forma de um abatimento na renda que iguale a maior parte dos proventos das vendas no fim da locação); e
c) O locatário tem a capacidade de continuar a locação por um segundo período com uma renda que seja substancialmente inferior à renda do mercado.
Dos contratos celebrados entre a Requerente e a B... Lda.
À luz dos factos provados e demais informação que consta dos autos, a convicção do Tribunal é que os contratos merecem ser qualificados como de locação financeira, na medida em que se verificam os seguintes indícios de que os riscos e vantagens inerentes à sua posse permanecem no locatário, a B... Lda.:
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Os contratos denominados de contratos de compra e venda a prestações de veículo automóvel, preveem o pagamento de 36 prestações mensais, adicionadas de uma prestação final de importância a 21,74% do valor atribuído à viatura objeto do contrato, confirmando-se que no início da locação o valor presente dos pagamentos mínimos da locação ascende a todo o justo valor do ativo locado;
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Os contratos designados por contratos de aluguer operacional preveem a locação da viatura por um período de 36 meses, com opção do locatário pela aquisição da viatura no final desse período, por um valor residual de 21,74% do valor do contrato, concluindo-se que o valor presente dos pagamentos mínimos da locação ascende substancialmente a todo o justo valor do ativo locado.
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Acresce que este último tipo de contratos contém uma cláusula (14.ª), que sujeita a revogação do contrato por iniciativa do locatário – mediante devolução do veículo em perfeito estado de conservação – à aceitação expressa da Requerente e ao pagamento pela B... Lda. de um montante compensatório a ser por aquela fixado, de montante não inferior a 50% do valor dos alugueres vincendos à data da aceitação da revogação pretendida.
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Tendo em conta a disparidade entre o valor atribuído às viaturas no início do contrato (556.600,00 €) e o montante pelo qual foram adquiridas pela Requerente (294.312,00 €), o acionamento desta cláusula compensatória (de valor a determinar pela locadora e nunca inferior a 50% das rendas vincendas) confirma que o valor presente dos pagamentos mínimos dos contratos de aluguer operacional ascende substancialmente a todo o justo valor do ativo locado.
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Relativamente à assunção dos riscos de funcionamento e deterioração das viaturas objeto dos contratos em análise, mesmo que, como alega a Requerente, as cláusulas 7.ª a 9.ª dos contratos sejam “cláusulas tipo” que constam de qualquer contrato de aluguer operacional, convém lembrar que a maioria dessas viaturas contam com mais de 10 anos desde a primeira matrícula – e algumas mais de 15 – como se poderá verificar através das matrículas listadas no Quadro 9 do RIT.
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Ora, não se afigura plausível que numa locação operacional de viaturas com esse número de anos de matrícula, o locatário esteja disposto a assumir “os riscos de perda, deterioração, defeito de funcionamento e imobilização do veículo”, o que aponta para que os riscos associados às viaturas locadas permanecem na B... .
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A convicção de que os riscos e vantagens associados às viaturas locadas permanecem no locatário, a B... Lda., é reforçada pelo facto de a mesma ter continuado a beneficiar das vantagens inerentes à posse dos bens locados apesar dos atrasos verificados no pagamento das prestações devidas à Requerente.
Paralelamente aos considerandos contabilísticos relevantes, a Requerente afirma que a locação financeira está reservada a determinadas pessoas jurídicas do sistema financeiro, e que o locador financeiro tem que ser um banco ou uma sociedade de locação financeira constituída nos termos do Decreto-Lei n.º 72/95, sendo a Requerente uma micro entidade e não uma instituição financeira.
Sucede que a questão a decidir não é se a Requerente está, ou não, legalmente habilitada a desenvolver uma atividade financeira, mas sim se os contratos por ela celebrados com a B... devem ser qualificados, à luz do normativo contabilístico e fiscal, como de locação financeira.
Assim, o facto de uma determinada entidade não estar legalmente habilitada a exercer a atividade de locação financeira, não pode obstar à legitimidade da tributação que deva ter lugar quando tal se verifique.
A Requerente remete, ainda, para o Despacho do SEAF n.º 16368/2013, de 9.12.2013 (DR II Série, de 18.12.2013) que revoga o Despacho n.º 503/2004-XV (2.ª série) e mantém a obrigatoriedade de menção expressa da respetiva classificação no contrato de locação, sob pena de a classificação atribuída pelas partes no plano contabilístico não ser relevante para efeitos fiscais, nomeadamente em matéria de aplicação do regime de reinvestimento dos valores de realização atualmente previsto no artigo 48.º do Código do IRC".
Conclui então a Requerente que, para efeitos fiscais, a eventual qualificação do contrato como de locação financeira não releva se não constar menção expressa da respetiva classificação no contrato de locação, isto é, em face do Despacho, a inspeção não pode agora requalificar o contrato como de locação financeira e decidir que as viaturas não deviam constar do ativo fixo tangível do locador, pelo que entende que a correção está ferida de ilegalidade.
Também nas suas alegações a Requerente vem alegar que “a eventual qualificação do contrato como de locação financeira não releva se não constar menção expressa da respetiva classificação no contrato de locação, para que o locatário possa saber que deve considerar o bem no seu ativo fixo tangível.”
Não se subscreve as consequências que a Requerente retira do referido Despacho do SEAF n.º 16368/2013:
Esse Despacho mantém uma obrigação já prevista naquele que veio revogar (503/2004-XV, de 25 de março), o qual já determinava essa mesma menção da tipologia do contrato “sob pena de a classificação contabilística poder não ser relevante para efeitos fiscais e de se perderem os benefícios associados a essa classificação, designadamente o regime de reinvestimento previsto pelo artigo 45.º do Código do IRC.”
Nessa esteira, no Despacho citado pela Requerente “mantém-se a obrigatoriedade de menção expressa da respetiva classificação no contrato de locação, sob pena de a classificação atribuída pelas partes no plano contabilístico não ser relevante para efeitos fiscais, nomeadamente em matéria de aplicação do regime de reinvestimento dos valores de realização atualmente previsto no artigo 48.º do Código do IRC.”
Apesar de ser verdade que ambos os Despachos visam assegurar a consistência do tratamento contabilístico entre locador e locatário, a consequência que ambos retiram do incumprimento quanto à menção da classificação do contrato de locação – como de locação operacional ou financeira - é a de sonegar o regime de reinvestimento contemplado no Código do IRC. Não significa isso, contudo, que uma incorreta denominação de um contrato possa prevalecer sobre a sua substância legal e económica, não assistindo razão à Requerente quando entende o contrário.
Face ao exposto:
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Os contratos devem ser qualificados como de locação financeira, porquanto conclui-se que os riscos e vantagens a eles inerentes estão do lado do locatário;
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Consequentemente, os bens locados não devem integrar a ativo da Requerente;
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De acordo com ao n.º 1 do art.º 13.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, as depreciações ou amortizações dos bens objeto de locação financeira são gastos do período de tributação dos respetivos locatários.
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Pelo que a correção promovida pelos Serviços da Inspeção Tributária quanto às depreciações praticadas pela Requerente se mostra devida, indeferindo-se o pedido da Requerente.
4.2 Gastos com serviços de consultoria (4,500,00 €)
4.2.1 Questão decidenda
A matéria a decidir é se os gastos registados pela Requerente a título de trabalhos especializados (conta SNC 6221), suportados por três faturas que totalizam € 4.500,00, contendo a menção “SERVICIOS DE CONSULTORIA; GSTION Y ADMINISTRACION”, devem, ou não, ser fiscalmente aceite nos termos dos n.º 1 e das alíneas c) e e) do n.º 4, ambos do artigo 23.º do CIRC.
4.2.2 Posição da Requerente
Relativamente aos gastos com serviços de consultoria, no montante de 4.500,00€, a Requerente alega que:
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A prestação de serviços em causa está suportada por faturas passadas na forma legal.
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A Requerente explicou que “foi a empresa espanhola representada pelo Sr. D... quem tratou do alvará para o transporte de mercadorias, obtenção do alvará para a exploração da atividade de rent-a-car e rent cargo (que se concluiu depois não ter condições para obtenção) e ainda foi o responsável pels estruturação do projeto de aquisição de veículos para o aluguer de transportes.
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Aparentemente, por falta de apresentação do Alvará em causa, ora junto pela Requerente ao PPA como Doc. 3, a inspeção não considerou dedutível o mencionado gasto.
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Apresentando-se o Alvará cuja obtenção foi objeto da mencionada prestação de serviços, deve o gasto ser dedutível.
4.2.3 Posição da Requerida
A requerida defende que:
“Relativamente ao montante de 4.500,00 € que a Requerente reconheceu como gasto a débito da conta SNC 6221 – “Trabalhos especializados“, referente a SERVIÇOS DE CONSULTADORIA, GESTÃO E ADMINISTRAÇÃO, faturados pela sociedade espanhola C..., S.L., NIF..., e que a IT acresceu ao Lucro Tributável, porque a documentação apresentada é insuficiente, nomeadamente OS ELEMENTOS QUE CONSTAM NAS FATURAS NÃO PREENCHEM OS REQUISITOS MÍNIMOS PARA PERMITIR A DEDUÇÃO DESSES GASTOS NA INTERPRETAÇÃO QUE FAZEM DO N.º 4 DO ARTIGO 23.º DO CÓDIGO DO IRC NOMEADAMENTE POR FALTA DOS ELEMENTOS LEGALMENTE EXIGÍVEIS NAS ALÍNEAS C) E E) DO N.º 4 DO ARTIGO 23.º DO CIRC, CONJUGADO COM O N.º 3 E O N.º 6 DO MESMO NORMATIVO LEGAL, vem a Requerente, em sede de PPA, apresentar em anexo cópia do “Alvará/ Licença para o transporte rodoviário internacional de mercadorias por conta de outrem” alegando que a Inspeção não considerou aquele gasto dedutível por falta de apresentação do mesmo.
91. Ora, importa salientar que em parte alguma do RIT é referido que a não aceitação fiscal daqueles gastos se ficava a dever à falta de apresentação do Alvará.
92. Ora, as 3 faturas em apreço (S01/19, S02/19 e S03/19), emitidas em 31-03-2019 pela sociedade C..., S.L., NIF ..., apenas contendo a descrição “SERVICIOS DE CONSULTORIA, GESTION Y ADMINISTRACION”
93. Ou seja, não satisfazem os requisitos mínimos previstos no n.º 4 do artigo 23.º, CUJA DEDUTIBILIDADE FISCAL ESTÁ EXPRESSAMENTE VEDADA POR AQUELA NORMA E QUE TEM EM VISTA IMPOR AOS SUJEITOS PASSIVOS OS DEVERES DE DOCUMENTAÇÃO DE ENCARGOS
94. Neste sentido veja-se, entre outros o Acórdão de 19.12.2023 do Tribunal Central Administrativo Sul no âmbito do processo n.º 1357/16.7 BELRA, quando e entre diversos gastos desconsiderados pela AT nos termos do n.º 4 do art.º 23.º do CIRC refere:
“No tocante a esta parte da fatura, a AT refere não terem sido cumpridos os requisitos das alíneas c), d) e e) do n.º 4 do art.º 23.º do CIRC. Com efeito, concorda-se com este entendimento, na medida em que há vários serviços aqui incluídos sem um nível de detalhe exigível (quantos logotipos, quantas impressões de economato). O valor surge em bloco, não sendo percetível que valor respeita a cada componente dos serviços, inexistindo igualmente a menção temporal exigida.
Portanto, aqui concorda-se com a AT ao referir que os requisitos constantes das als. c) a e) do n.º 4 do art.º 23.º do CIRC não estão cabalmente cumpridos.”
95. In casu, verificamos que as faturas em causa que totalizam 4.500,00 €, por si só, contendo simplesmente a menção “SERVICIOS DE CONSULTORIA, GESTION Y ADMINISTRACION” não cumprem os requisitos de dedutibilidade fiscal, pelo que a Requerente devia apresentar elementos de prova capazes de colmatar essas faltas, nomeadamente e entre outros contrato firmado entre si e o prestador dos serviços, que identifique qual o serviço prestado, quando, quantas horas de mão de obra, preço unitário, e total dos honorários, os prazos acordados, elementos de prova capazes de preencher os requisitos mínimos previstos no n.º 4 do artigo 23.º do CIRC, e que a cópia do Alvará enviada pelo Requerente não logra colmatar.
Aqui chegados, afigura-se-nos, que não poderá ser atendida a pretensão da Requerente e que a correção proposta no montante de € 4.500,00 deverá ser mantida.”
4.2.4 Apreciação
Dispõe o artigo 23.º n.º 4 e 6 do CIRC:
“4 - No caso de gastos incorridos ou suportados pelo sujeito passivo com a aquisição de bens ou serviços, o documento comprovativo a que se refere o número anterior deve conter, pelo menos, os seguintes elementos:
a) Nome ou denominação social do fornecedor dos bens ou prestador dos serviços e do adquirente ou destinatário;
b) Números de identificação fiscal do fornecedor dos bens ou prestador dos serviços e do adquirente ou destinatário, sempre que se tratem de entidades com residência ou estabelecimento estável no território nacional;
c) Quantidade e denominação usual dos bens adquiridos ou dos serviços prestados;
d) Valor da contraprestação, designadamente o preço;
e) Data em que os bens foram adquiridos ou em que os serviços foram realizados.
6 - Quando o fornecedor dos bens ou prestador dos serviços esteja obrigado à emissão de fatura ou documento legalmente equiparado nos termos do Código do IVA, o documento comprovativo das aquisições de bens ou serviços previsto no n.º 4 deve obrigatoriamente assumir essa forma.”
Considerando que informação prestada pela Requerente aos SIT, no processo de inspeção está em harmonia com o Alvará emitido após a prestação desses serviços de consultoria, gestão e administração.
Como decorre da remissão que no n.º 6 do artigo 23.º do CIRC é feita para os requisitos formais previstos no CIVA, quando os o fornecedor de bens e serviços estiver obrigado à emissão de fatura ou documento equivalente nos termos deste Código, as exigências de documentação aplicáveis em matéria de IVA devem ser aplicadas em sede de IRC, por força do princípio da coerência valorativa do sistema jurídico (artigo 9.º, n.º 1, do Código Civil) e da regra da primazia do Direito da União Europeia sobre o Direito Nacional (artigo 8.º, n.º 4, da CRP), designadamente com o alcance que não se justificam em sede de IRC exigências de documentação superiores às que são exigidas pelo TJUE para exercício do direito à dedução. Por isso, o decidido pelo TJUE quanto à possibilidade de serem supridas deficiências formais das faturas deverá se aplicado tanto em sede de IVA como de IRC.
Como o TJUE entendeu, entre outros, no acórdão de 15-09-2016, proferido no processo n.º C-516/14, o artigo 178.º, alínea a), da Diretiva 2006/112, do Conselho, de 28-11-2006, opõe-se a que "as autoridades tributárias nacionais possam recusar o direito à dedução do imposto sobre o valor acrescentado pelo simples facto de o sujeito passivo possuir uma fatura que não cumpre os requisitos exigidos pelo artigo 226.º, n.ºs 6 e 7, desta diretiva, quando essas autoridades dispõem de todas as informações necessárias para verificar se os requisitos substantivos relativos ao exercício desse direito se encontram satisfeitos".
Para além disso, como resultou manifestamente da prova produzida, designadamente da informação prestada pela Requerente e do Alvará apresentada neste processo, a prestadora de serviços os prestou efetivamente e que resultou na obtenção do mencionado alvará que, só por si, afasta que se possa recusar a dedutibilidade total como gasto em sede de IRC bem como recusar, na totalidade, o direito à dedução.
Assim, não subsiste qualquer dúvida razoável de que a Requerente contratou serviços externos, que foram prestados pela empresa que emitiu as faturas que não foram aceites pela Autoridade Tributária e Aduaneira para efeitos de determinação do lucro tributável de IRC.
Atendendo à solução prevista na lei para situações em que da “insuficiência de elementos de contabilidade” (como é o caso das faturas de suporte dos lançamentos contabilísticos) resulte “impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável de qualquer imposto” é a utilização de métodos indiretos (artigos 87.º, n.º 1, alínea b), e 88.º, alínea a), da LGT, 57.º do CIRC e 90.º do CIVA), e não a total irrelevância fiscal dessas faturas, quando há a certeza de que, pelo menos, parcialmente correspondem a operações efetivamente realizadas, o que não se compagina com os princípios constitucionais da proporcionalidade e da justiça (artigo 266.º, n.º 2, da CRP) e com o princípio da neutralidade do IVA que proíbe que se possa recusar completamente o direito à dedução do IVA suportado a montante quando há a certeza que as faturas têm subjacentes operações efetivamente efetuadas.
Por outro lado, dos elementos dos autos não emerge qualquer dúvida objetivamente fundada de que as operações em causa não se tenham realizado pelo que, ainda que existisse qualquer incumprimento formal de algumas das alíneas do n.º 4 do artigo 23.º do CIRC, que a Requerida, como vimos, não indica, ainda assim, por estarem identificados todos os elementos necessários ao controlo das operações económicas em causa, sempre havia que considerar não haver violação dos nº 3º e 4º do artigo 23º do CIRC, sendo, consequentemente, inaplicável o artigo 23º-A, nº 1, al. c), do CIRC.
Assim sendo, também com base nos artigos n.º 3º e 4º. do artigo 23.º e 23.º-A, nº 1, al. c), do CIRC, a correção em causa é ilegal, quer por vício de fundamentação insuficiente, equivalente a falta de fundamentação, quer por vício de violação de lei.
Pelo exposto, a liquidações adicional de IRC, relativa a estas faturas, enferma do vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, que justifica a sua anulação, nas parte impugnada, de harmonia com o disposto no artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.
4.3 Falta de liquidação de IVA (30.613,00 €)
4.3.1 Questão decidenda
A matéria a decidir é se a liquidação de IVA promovida pelos SIT é suscetível de conduzir a uma situação de dupla tributação, devendo por isso ser anulada, ou se a mesma se mostra devida.
4.3.2. Posição da Requerente expressa no PPA
Relativamente à falta de liquidação de IVA, a Requerente alega que a faturas referentes aos meses de fevereiro a dezembro de 2019 e não emitidas dentro do prazo, o foram posteriormente (em 2020 e 2021), nas datas indicadas no quadro que consta do parágrafo 14 do PPA e devidamente comunicadas à AT, não havendo por isso falta de entrega de imposto mas um mero atraso na liquidação do IVA.
Está em causa um mero atraso na liquidação do IVA, tendo as faturas sido emitidas em período não coincidente com a exigibilidade do imposto.
A Inspeção Tributária fez uma correção como se o imposto não tivesse sido liquidado e pago, mas tendo esse IVA sido liquidado e pago pela Requerente, a sua exigência corresponde a uma duplicação de coleta.
4.3.3 Posição da Requerida
Na sua Resposta, a Requerida afirma, nomeadamente:
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que a Requerente não demonstrou que as faturas por ela emitidas e refletidas nas DP submetidas para os anos de 2020 e 2021 titulam operações ocorridas em 2019 (artigo 54.º da Resposta);
-
estranha que a Requerente venha apresentar em sede de PPA cópias das declarações periódicas dos períodos em causa e não as cópias das faturas descritas no artigo 14.º do PPA; e
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por mera cautela de patrocínio, ainda que se comprovasse a duplicação de coleta que vem invocada (o que não se verifica), os atos tributários a rever ou anular (parcialmente) seriam os atos de autoliquidação do ano de 2020 e 2021, não se podendo prescindir dos atos ora contestados que se mostram devidos, nos termos legais descritos no RIT.
Nas Alegações
Nas suas Alegações, a Requerente veio apresentar as faturas que a Requerida considerava estarem por mostrar, emitidas nas datas indicadas no quadro que consta do parágrafo 14 do PPA, com indicação do período a que respeitam (fevereiro a dezembro de 2019).
4.3.4 Apreciação
A matéria a decidir é se a liquidação adicional de IVA promovida pela AT é suscetível de conduzir a uma situação de dupla tributação, devendo por isso ser anulada, ou se a mesma se mostra devida.
A legislação:
Art.º 7.º do CIVA - Facto gerador e exigibilidade do imposto
1 - Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, o imposto é devido e torna-se exigível:
…
b) Nas prestações de serviços, no momento da sua realização;
…
2 - …
3 – Nas transmissões de bens e prestações de serviços de carácter continuado, resultantes de contratos que dêem lugar a pagamentos sucessivos, considera-se que os bens são postos à disposição e as prestações de serviços são realizadas no termo do período a que se refere cada pagamento, sendo o imposto devido e exigível pelo respectivo montante.
…
Art.º 8.º do CIVA – Exigibilidade do imposto em caso de obrigação de emitir fatura
1 - Não obstante o disposto no artigo anterior e sem prejuízo do previsto no artigo 2.º do regime do IVA de caixa, sempre que a transmissão de bens ou a prestação de serviços dê lugar à obrigação de emitir uma fatura nos termos do artigo 29.º, o imposto torna-se exigível:
a) Se o prazo previsto para a emissão da fatura for respeitado, no momento da sua emissão;
b) Se o prazo previsto para a emissão não for respeitado, no momento em que termina;
…
Artigo 29.º do CIVA - Obrigações em geral
1 - Para além da obrigação do pagamento do imposto, os sujeitos passivos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º devem, sem prejuízo do previsto em disposições especiais:
…
b) Emitir obrigatoriamente uma fatura por cada transmissão de bens ou prestação de serviços, tal como vêm definidas nos artigos 3.º e 4.º, independentemente da qualidade do adquirente dos bens ou destinatário dos serviços, ainda que estes não a solicitem, bem como pelos pagamentos que lhes sejam efetuados antes da data da transmissão de bens ou da prestação de serviços;
…
Art.º 36.º do CIVA – Prazo de emissão e formalidades das faturas
1 - A fatura referida na alínea b) do n.º 1 do artigo 29.º deve ser emitida:
a) O mais tardar no 5.º dia útil seguinte ao do momento em que o imposto é devido nos termos do artigo 7.º;
………..
5 - As faturas devem ser datadas, numeradas sequencialmente e conter os seguintes elementos:
a) Os nomes, firmas ou denominações sociais e a sede ou domicílio do fornecedor de bens ou prestador de serviços e do destinatário ou adquirente sujeito passivo do imposto, bem como os correspondentes números de identificação fiscal;
b) A quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável; as embalagens não efetivamente transacionadas devem ser objecto de indicação separada e com menção expressa de que foi acordada a sua devolução;
c) O preço, líquido de imposto, e os outros elementos incluídos no valor tributável;
d) As taxas aplicáveis e o montante de imposto devido;
e) O motivo justificativo da não aplicação do imposto, se for caso disso;
f) A data em que os bens foram colocados à disposição do adquirente, em que os serviços foram realizados ou em que foram efetuados pagamentos anteriores à realização das operações, se essa data não coincidir com a da emissão da fatura.
No caso em apreciação, verifica-se que a Requerente não procedeu à emissão das faturas pela locação das viaturas no período de fevereiro a dezembro de 2019 atempadamente.
No entanto, as faturas trazidas para os autos em sede de alegações permitem concluir que o IVA que se encontrava por liquidar referente aos bens dados em locação pela Requerente nos meses de fevereiro a dezembro de 2019, foi posteriormente liquidado nas datas constantes do mapa incluído nas alegações da Requerente e que se reproduz infra:
Nº fatura
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Data
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Descrição
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Valor Tributável (€)
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IVA (€)
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1 2020/1
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14/02/2020
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Locação de viaturas anexo referente a fevereiro 2019
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12 200,00
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2 806,00
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1 2020/2
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15/05/2020
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Locação de viaturas anexo referente a março 2019
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12 200,00
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2 806,00
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1 2020/5
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14/09/2020
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Locação de viaturas anexo referente a abril 2019
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12 200,00
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2 806,00
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1 2020/6
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24/11/2020
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Locação de viaturas anexo referente a maio 2019
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12 200,00
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2 806,00
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1 2020/7
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05/12/2020
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Locação de viaturas anexo referente a junho 2019
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12 200,00
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2 806,00
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1 2020/8
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05/12/2020
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Locação de viaturas anexo referente a julho 2019
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12 200,00
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2 806,00
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1 2020/9
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28/12/2020
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Locação de viaturas anexo referente a agosto 2019
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12 200,00
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2 806,00
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1 2020/10
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30/12/2020
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Locação de viaturas anexo referente a setembro 2019
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12 200,00
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2 806,00
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1 2021/5
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28/12/2021
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Locação de viaturas anexo referente a outubro 2019
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12 200,00
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2 806,00
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1 2021/6
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28/12/2021
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Locação de viaturas anexo referente a novembro 2019
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12 200,00
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2 806,00
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1 2021/7
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28/12/2021
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Locação de viaturas anexo referente a dezembro 2019
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12 200,00
|
2 806,00
|
|
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134 200,00
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30 866,00
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Da consulta a essas faturas, verifica-se que as mesmas contêm os elementos constantes do n.º 5 do art.º 35.º do CIVA, incluindo a identificação dos serviços e a data a que os mesmos se referem.
Os montantes de IVA constantes dessas mesmas faturas são compagináveis com as declarações periódicas apresentadas pela Requerente para os períodos de imposto em que as faturas foram emitidas, conforme quadro seguinte:
Nº fatura
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Data fatura
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Valor Tributável
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IVA
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Declaração Periódica
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1 2020/1
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14/02/2020
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12 200,00 €
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2 806,00 €
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03T 2020
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2 806,00 €
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1 2020/2
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15/05/2020
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12 200,00 €
|
2 806,00 €
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06T 2020
|
2 806,00 €
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1 2020/5
|
14/09/2020
|
12 200,00 €
|
2 806,00 €
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09T 2020
|
2 839,78 €
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1 2020/6
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24/11/2020
|
12 200,00 €
|
2 806,00 €
|
12T 2020
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14 030,00 €
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1 2020/7
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05/12/2020
|
12 200,00 €
|
2 806,00 €
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1 2020/8
|
05/12/2020
|
12 200,00 €
|
2 806,00 €
|
1 2020/9
|
28/12/2020
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12 200,00 €
|
2 806,00 €
|
1 2020/10
|
30/12/2020
|
12 200,00 €
|
2 806,00 €
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1 2021/5
|
28/12/2021
|
12 200,00 €
|
2 806,00 €
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12T 2021
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8 515,19 €
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1 2021/6
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28/12/2021
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12 200,00 €
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2 806,00 €
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1 2021/7
|
28/12/2021
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12 200,00 €
|
2 806,00 €
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Assim, pese embora o atraso verificado na entrega do imposto ao Estado, é convicção deste Tribunal Arbitral que a exigência do mesmo montante de IVA para os mesmos factos tributários, conduziria a uma situação de dupla tributação.
Resta analisar se, como entende a Requerida, comprovada a entrega do imposto por parte da Requerente, os atos tributários a rever ou anular seriam os atos de autoliquidação do ano de 2020 e 2021, não se podendo prescindir dos atos ora contestados que se mostram devidos, nos termos legais descritos no RIT.
A este respeito, a Requerida cita o Acórdão do STA, de 27-02-2013, no processo n.º 01079/12: “a duplicação da colecta, prevista no art. 205º do CPPT, resulta da aplicação do mesmo preceito legal mais do que uma vez ao mesmo facto tributário ou situação tributária concreta, sendo que a não exigência de segundo pagamento, a que a invocação da duplicação de colecta se reconduz, apenas se pode justificar se o primeiro era devido, pois, se não o foi, o que foi pago poderá ser ulteriormente reembolsado, através dos meios adequados de impugnação e revisão do acto tributário e, numa situação desse tipo, não se justifica que se prescinda do segundo pagamento, que é efectivamente devido”.
No caso vertido no citado Acórdão estava em causa a alegada duplicação de coleta resultante da entrega de IVA por duas entidades distintas: (i) primeiro pelo prestador de serviços de construção, ao qual não competia a liquidação do IVA; (ii) segundo pelo adquirente dos Serviços, a quem competiria a autoliquidação do imposto pela regra de inversão do sujeito passivo, tendo o Tribunal considerado que o recurso à recuperação do IVA pago em excesso competiria ao prestador do serviço, que o havia liquidado indevidamente.
Esta situação não é comparável à do caso em apreciação, na qual o sujeito passivo era e foi exclusivamente a Requerente e não uma entidade distinta daquela que tinha liquidado inicialmente o imposto, como se verificava no caso citado pela Requerida.
Conforme esclarece o Acórdão do STA de 23-10-2019, no processo n.º 0492/16.6BELRA 0358/18, citado pela Requerida na sua resposta, “A duplicação de colecta, só ocorre, tal como definida pelo n.º 1 do art. 205.º do CPPT, «quando, estando pago por inteiro um tributo, se exigir da mesma ou diferente pessoa um outro de igual natureza, referente ao mesmo facto tributário e ao mesmo período de tempo», o que significa que a duplicação de coleta exige a verificação cumulativa dos seguintes requisitos: i) o facto tributário ser o mesmo, ii) ser idêntica a natureza do imposto já pago e o que, de novo, se exige, iii) referirem-se ambos os impostos ao mesmo período temporal”.
É o que se verifica no caso vertente, porquanto a liquidação impugnada pela Requerente (i) incide sobre o mesmo facto tributário sobre o qual a Requerente emitiu as faturas apresentadas em sede das suas alegações, (ii) ser o mesmo o imposto já pago pela Requerente e o exigido pela Requerida, (iii) referir-se o imposto ao mesmo período temporal.
Em conclusão, a liquidação promovida pelos serviços da inspeção tributária não deve proceder, sob pena de dupla tributação, sem prejuízo das coimas e juros que se mostrem devidos pelo atraso na entrega do imposto.
6. Decisão
Termos em que se decide:
a) Julgar parcialmente improcedente o pedido de pronuncia arbitral e em consequência declarar a legalidade parcial da liquidação adicional de IRC n.º 2023..., de 20-11-2023, (que inclui a liquidação de juros compensatórios) na parte referente às depreciações não aceites fiscalmente, no montante de 55.183,50 € e a calcular em execução de sentença;
b) Declarar a ilegalidade parcial da liquidação adicional de IRC, na parte que referente os serviços de consultoria no montante de € 4,500,00 € a calcular em execução de sentença;
c) com todos os efeitos legais, a liquidação adicional de IRC n.º 2023..., de 20.11.2023.
d) Declarar ilegal e anular, com todos os efeitos legais, as liquidações adicionais de IVA, com o n.s: 2023... no montante de 5 566,00 €; 2023... no montante de 8 349,00 €; 2023... no montante de 8 264,59 €; 20230... no montante de 8 443,41 €.
e) Condenar a Requerida e a Requerente nas custas do processo a calcular[1] sobre o valor de € 60.779,47, na proporção do respetivo decaimento.
7. Valor do Processo
De acordo com o disposto nos artigos 296.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 60.779,47, indicado pela Requerente e sem oposição da Autoridade Tributária e Aduaneira.
8. Custas
A extinção da instância determinada por inutilidade ou impossibilidade superveniente da lide é imputável, para efeitos de responsabilidade pelas custas processuais, ao autor ou demandante (assim, artigo 536.º, n.º 3, do CPC). Porém, logo neste preceito legal se ressalva a responsabilidade do demandando quando a inutilidade ou impossibilidade superveniente lhe sejam imputáveis, considerando-se como tal, entre outros casos, a inutilidade superveniente que decorra da satisfação voluntária, por parte do demandando, da pretensão do demandante (cfr. doc. único junto com a Resposta).
Nos presentes autos a AT determinou a anulação parcial dos atos de liquidação de IRC e respetivos juros compensatórios, na parte relativa à omissão de réditos pela prestação de serviços de locação financeira (133.100,00 €) pelo que quanto ao IRC e juros compensatórios que tiveram em conta, esse valor se determinou a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, nos termos suprarreferidos a calcular em execução de sentença.
[2]Nos termos dos artigos 12.º e 22.º, n.º 4, do RJAT, e artigos 2.º e 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas, em €2.448,00 nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida no valor de € 1.843,29 (75,30%) e a Requerente no valor de € 604, 71 (24,70%).
Notifique-se
Lisboa, 14 de março de 2025
Os Árbitros
_________________
(Regina de Almeida Monteiro – Presidente)
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(José Manuel Parada Ramos – Adjunto)
_______________
(Sofia Quental- Adjunta)
[1] De acordo com o Despacho de Retificação de 2025-05-12
[2] De acordo com o Despacho de Retificação de 2025-05-12