Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 1029/2024-T
Data da decisão: 2025-04-16  IRS  
Valor do pedido: € 82.428,32
Tema: Revogação do acto impugnado. Anulação administrativa. Prosseguimento da acção para apreciar o pedido de juros indemnizatórios.
Versão em PDF

SUMÁRIO:

 

1.  Da revogação, pela AT, dos actos tributários impugnados pelos Requerentes, resulta a impossibilidade da lide, por perda de objecto - artigo 277.º, alínea e), do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAMT.

 

2. Tendo os Requerentes apresentado, cumulativamente com o pedido de anulação das liquidações de IRS, pedido de condenação da Requerida no pagamento de juros indemnizatórios, a não satisfação deste pedido pela decisão administrativa que revogou as liquidações justifica a manutenção do interesse processual quanto ao pedido de juros indemnizatórios.

 

DECISÃO ARBITRAL

 

Os árbitros, José Poças Falcão (Presidente), Susana Cristina Nascimento das Mercês de Carvalho e Martins Alfaro, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formarem o presente Tribunal Arbitral Colectivo, constituído em 13-11-2024, acordam no seguinte:

 

A - RELATÓRIO:

 

A.1 - Requerentes da constituição de tribunal arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, ambos do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAMT):

A…, natural de …, Espanha, de nacionalidade espanhola, titular do documento nacional de identidade …, válido até 7 de julho de 2029, residente na Rua …, Espanha, contribuinte n.º …;

 

B…, natural de …, Espanha, de nacionalidade espanhola, titular do documento nacional de identidade …, válido até 25 de fevereiro de 2032, casado no regime da separação de bens com C…, residente na Rua …, Espanha, contribuinte n.º …, e

 

D… , natural de …, Espanha, de nacionalidade espanhola, titular do documento nacional de identidade …, válido até 12 de junho de 2025, residente na Rua …, Espanha, contribuinte n.º …,

 

A.2 - Requerida: Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

A.3 - Objecto do pedido de pronúncia arbitral:

 

As liquidações de IRS relativas aos anos de 2020 e 2022, quanto aos Primeiro e Segundo Requerentes, e a liquidação de IRS relativa ao ano de 2022 quanto à Terceira Requerente, como segue:

 

 

 

A.4 - Pedido: Os Requerentes formularam os seguintes pedidos:

 

A) Decretar-se a anulação parcial dos actos de liquidação de IRS de 2020 e 2022 por erro nos pressupostos de facto e de direito da tributação;

 

B) Condenar-se a AT ao reembolso dos montantes ilegalmente arrecadados acrescidos de juros indemnizatórios contados nos termos da lei.

 

A.5 - Fundamentação do pedido de pronúncia arbitral:

 

Os Requerentes procederam à venda de dois imóveis em 9 de Junho de 2020 e 4 de Julho de 2022, tendo recebido, cada um deles e em igual proporção, respectivamente, o valor de € 32.222,22 e € 188.870,00, na qualidade de comproprietários em virtude de comunhão hereditária por óbito de seu pai.

 

As declarações modelo 3 de IRS foram apresentadas pelos Requerentes em 25 de Junho de 2021 e em 5 de Junho de 2023, na sequência das quais foram desencadeados os processos de liquidação de IRS, por rendimentos de mais-valias imobiliárias, categoria G de IRS.

Os Requerentes efectuaram o pagamento das liquidações, em simultâneo, em 15 de Novembro de 2021 e em 2 de Agosto de 2023.

 

Em 28 de Dezembro de 2023, os Requerentes, cada um per se, apresentaram no competente serviço de finanças, através do portal da AT, reclamações das liquidações de 2020 e 2022.

 

Os Requerentes respaldaram as reclamações graciosas e agora os seus pedidos arbitrais no teor do acórdão do TJUE, proferido no processo n.º C-184/18, arguindo a ilegalidade das liquidações em crise por violação do artigo 63.º do TFUE, o qual proíbe a discriminação entre residentes no território português e noutros Estados-membros, na esteira dos acórdãos Hollman e Gielen, também prolatados pelo TJUE.

 

As liquidações impugnadas assentam na errada aplicação do artigo 43.º, n.º 2, alínea b), do Código do IRS, com a redacção vigente ao tempo, a qual é incompatível com o Direito Comunitário quando prescreve que o valor dos rendimentos qualificados como mais-valias é o correspondente ao saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias do ano, considerado em apenas 50% do seu valor quando respeitante às transmissões efectuadas por residentes.

 

A.6 - Resposta da Requerida, Autoridade Tributária e Aduaneira:

 

Notificada para o efeito, a Requerida não apresentou resposta.

 

Não obstante, a Requerida juntou aos autos o processo administrativo e, posteriormente, cópia da Informação n.º 481/2024, de 21-11-2024, da Direcção de Serviços do IRS.

 

 

B - SANEAMENTO:

 

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira nos termos regulamentares.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAMT, o Conselho Deontológico do CAAD designou como árbitros do Tribunal Arbitral os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

As partes foram oportuna e devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAMT e dos artigos 6.° e 7.º, do Código Deontológico do CAAD.

 

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAMT, o tribunal arbitral foi regularmente constituído em 13-11-2024.

 

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas.

 

A Requerida juntou aos autos cópia da Informação n.º 481/2024, de 21-11-2024, da Direcção de Serviços do IRS, da qual resulta a revogação das liquidações impugnadas.

 

Notificada da junção da referida informação, a Requerente veio aos autos requerer o prosseguimento do processo «para apreciação da obrigação de pagamento de juros a cargo da Requerida AT».

 

O Tribunal decidiu dispensar a realização da reunião a que alude o artigo 18.º, do RJAMT, sem que as partes se tivessem oposto.

 

Ambas as partes foram notificadas para alegações, tendo apenas a Requerente alegado.

 

O Tribunal Arbitral é materialmente competente, atenta a conformação do objecto do processo e de acordo com o preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, ambos do RJAMT.

 

 

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral é tempestivo e o processo não enferma de nulidades, nem existem excepções de que cumpra conhecer.

 

 

C - MATÉRIA DE FACTO:

 

C.1 - Factos provados: Os factos pertinentes para a decisão da causa que são tidos como assentes são os seguintes:

 

Os Requerentes encontram-se inscritos em Portugal, como residentes no estrangeiro, com residência em Espanha - Facto admitido por acordo.

 

Em 25-06-2021, os Requerentes apresentaram as respectivas declarações de rendimentos, modelo 3 de IRS, respeitantes ao ano de 2020, estando aqui em causa a nº 3514 - 2020 - J2656 - 84, do requerente A... e a nº 3514 - 2020 - J2657 – 14, do requerente B..., com rendimentos declarados no quadro 4 do anexo G:


•4001 - Realização, Ano 2020/06 – 32.222,22€; Aquisição, Ano 2003/09 – 73,57€; Despesas e encargos 1.981,67€ (130811-U-12805, quota parte 11,11%) - Informação n.º 481/2024, de 21-11-2024, da Direcção de Serviços do IRS, notificada aos Requerentes e por estes não impugnada.

 

Assinalaram no quadro 8 B, do rosto dos mod.3 do IRS:

•O campo 4: Não residente;

•O campo 6: País de residência: “724”;

•O campo 7: pretende a tributação pelo regime geral - Informação n.º 481/2024, de 21-11-2024, da Direcção de Serviços do IRS, notificada aos Requerentes e por estes não impugnada.

 

Em 25-06-2021, as referidas declarações modelo 3 de IRS deram origem às liquidações nrs. 2021… e 2021…, respectivamente, com o montante a pagar, cada, no valor de € 8.441,81 - Informação n.º 481/2024, de 21-11-2024, da Direcção de Serviços do IRS, notificada aos Requerentes e por estes não impugnada.

 

Em 05-06-2023, os Requerentes apresentaram as respectivas declarações de rendimentos, modelo 3 de IRS, respeitantes ao ano de 2022, nº 3085 - 2022 - J3637 - 59 do Requerente A..., nº 3085 - 2022 - J3637 - 62 do Requerente B... e nº 3085 - 2022 - J3637 – 64 da Requerente Cecília, com rendimentos declarados no quadro 4 do anexo G:

 

•4001 - Realização, Ano 2022/07 – 33.330,00€; Aquisição, Ano 2003/10 – 350,94€; Despesas e encargos 5.226,98€ (130811-U- 3891, quota parte 11,11);

•4002 - Realização, Ano 2022/07 – 155.540,00€; Aquisição, Ano 2003/10 – 1.443,23€; Despesas e encargos 5.226,98€ (130811-R-1787, quota parte 11,11) - Informação n.º 481/2024, de 21-11-2024, da Direcção de Serviços do IRS, notificada aos Requerentes e por estes não impugnada.

 

Assinalaram no quadro 8 B, do rosto dos mod.3 do IRS:

•O campo 4: Não residente;

•O campo 5: Representante;

•O campo 6: País de residência: “724”;

•O campo 7: pretende a tributação pelo regime geral - Informação n.º 481/2024, de 21-11-2024, da Direcção de Serviços do IRS, notificada aos Requerentes e por estes não impugnada.

 

Em 14-07-2023, as referidas declarações modelo 3 deram origem às liquidações nºs 2023… e 2023…, 2023…, respectivamente, com o montante a pagar, cada, no valor de € 49.323,50 - Informação n.º 481/2024, de 21-11-2024, da Direcção de Serviços do IRS, notificada aos Requerentes e por estes não impugnada.

 

Em 15-07-2023, foram iniciados procedimentos de divergência, aos três Requerentes, relativamente às declarações de IRS apresentadas quanto do ano de 2022, sendo notificados para vir apresentar comprovativos dos valores declarados - Informação n.º 481/2024, de 21-11-2024, da Direcção de Serviços do IRS, notificada aos Requerentes e por estes não impugnada.

 

Não o tendo feito, foram as declarações corrigidas oficiosamente em 21-02-2024 - Informação n.º 481/2024, de 21-11-2024, da Direcção de Serviços do IRS, notificada aos Requerentes e por estes não impugnada.

 

Em 28-12-2023, foram instauradas 3 reclamações graciosas, interpostas pelos ora Requerentes, relativas ao IRS de 2020 e 2022, solicitando a exclusão dos 50% do saldo das mais valias imobiliárias para efeitos de tributação - Processo Administrativo.

 

Apenas a reclamação graciosa da Requerente Cecília, referente ao ano de 2020, foi convolada em revisão oficiosa e deferido o pedido por decisão da Chefe de Finanças de Lisboa - 3, em 11/01/2024 - Informação n.º 481/2024, de 21-11-2024, da Direcção de Serviços do IRS.

 

As restantes reclamações graciosas não foram objecto de decisão final - Informação n.º 481/2024, de 21-11-2024, da Direcção de Serviços do IRS e processo administrativo.

 

Em 21-02-2024, a AT elaborou declarações oficiosas modelo 3 de IRS, quanto aos três Requerentes, referentes ao ano de 2022, (nº 3085 - 2022 - D0048 – 23) (nº 3085 - 2022 - D0048 – 24) e (nº 3085 - 2022 - D0048 – 25), constando, em relação às declarações apresentadas pelos Requerentes, despesas e encargos sem qualquer valor e no campo 4002 foi corrigido o valor de aquisição que passou a ser de € 92,68 - Informação n.º 481/2024, de 21-11-2024, da Direcção de Serviços do IRS, notificada aos Requerentes e por estes não impugnada.

 

As declarações oficiosas deram origem, em 01-03-2024, às liquidações nº 2024…, nº 2024… e nº 2024… - Informação n.º 481/2024, de 21-11-2024, da Direcção de Serviços do IRS, notificada aos Requerentes e por estes não impugnada.

 

As liquidações antecedentemente referidas não foram notificadas aos Requerentes - Informação n.º 481/2024, de 21-11-2024, da Direcção de Serviços do IRS e processo administrativo.

 

Por despacho da Direcção de Serviços do IRS, de 16-12-2024, foram revogados os «atos de liquidação de IRS respeitantes ao período de tributação de 2020 nºs 2021, 2021…» - Informação n.º 481/2024, de 21-11-2024, da Direcção de Serviços do IRS.

 

E no que se refere aos juros indemnizatórios, o mesmo despacho refere «o pagamento dos respetivos juros indemnizatórios, neste caso apenas no que respeita ao ano de 2020».

 

As liquidações de IRS em causa nos presentes autos, relativas aos anos de 2020 e 2022, nos montantes infra indicados, quanto aos Primeiro e Segundo Requerentes, e a liquidação de IRS relativa ao ano de 2022 quanto à Terceira Requerente, são as seguintes - Petição inicial e Informação n.º 481/2024, de 21-11-2024, da Direcção de Serviços do IRS:

 

 

 

A Requerente apresentou o pedido de constituição do Tribunal Arbitral em 16-08-2024 - Sistema de Gestão Processual do CAAD.

 

C.2 - Factos dados como não provados;

 

Não se encontra provado nos autos que os Requerentes tenham pago o imposto relativo às liquidações objecto do pedido de pronúncia arbitral, sendo certo que a prova do pagamento é necessariamente documental e esta inexiste nos autos.

 

Para além deste facto, não há outros factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado.

 

C.3 - Motivação quanto à matéria de facto:

 

Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram seleccionados em função da sua relevância jurídica, face às soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2, do CPPT, 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3, do CPC, aplicáveis ex vi o artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAMT.

 

Com efeito, o Tribunal não está obrigado a pronunciar-se sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, tomando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamentam o pedido formulado pelo autor (cfr. artigos 596.º, n.º 1 e 607.º, n.ºs 2 a 4, do Código do Processo Civil) e consignar se a considera provada ou não provada (cf. ainda o artigo 123.º, n.º 2, do Código do Processo e Procedimento Tributário, ex vi o artigo 29º, do RJAMT).

 

Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação à prova produzida, na sua convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas - artigo 607.º, n.º 5 do CPC.

 

Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g. força probatória plena dos documentos autênticos - artigo 371.º, do CPC), é que não prevalece, na apreciação da prova produzida, o princípio da livre apreciação.

 

Por outro lado, nos termos do artigo 16.º, alínea e), do RJAMT, vigora no processo arbitral tributário o princípio da livre apreciação dos factos, de acordo com as regras da experiência e a livre convicção dos árbitros.

 

A matéria de facto dada como provada tem génese no processo administrativo e nos documentos juntos pela Requerente e pela Requerida, nenhuns dele impugnados e os quais, analisados de forma crítica, constituíram a base da convicção do Tribunal, quanto à realidade dos factos descrita supra.

 

A convicção do Tribunal fundou-se igualmente nos factos articulados pelas partes; o acervo probatório carreado para os autos foi objecto de uma análise crítica e de adequada ponderação, à luz das regras da racionalidade, da lógica e da experiência comum e segundo juízos de normalidade e de razoabilidade.

 

 

D - O DIREITO:

 

D.1. - Inutilidade superveniente da lide quanto aos pedidos de anulação das liquidações de IRS:

 

Como resulta da matéria de facto dada como provada, as liquidações de IRS impugnadas, relativas ao ano de 2020, foram revogadas expressamente por despacho de 29-11-2024 e as liquidações de IRS impugnadas, relativas ao ano de 2022, foram revogadas por substituição.

 

Com a integral revogação dos actos tributários impugnados, a presente lide arbitral perdeu o respectivo objecto, uma vez que a revogação dos actos administrativos determina a cessação dos respectivos efeitos - artigo 165.°, n.º 1, do CPA (aplicável ex vi artigo 29.°, n.° 1, alínea d), do RJAMT).

 

Tal circunstância conduz à impossibilidade do prosseguimento do processo arbitral.

 

Com efeito, «a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide dá-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo, ou encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida. Num e noutro caso, a solução do litígio deixa de interessar, além, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por já ter sido atingido por outro meio».[1]

 

Da impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide resulta a extinção da instância arbitral, nos termos do artigo 277.°, alínea e), do CPC, aplicável ex vi artigo 29.°, n.° 1, alínea e), do RJAMT.

 

Deste modo, irá decidir-se, na parte dispositiva, pela extinção da instância arbitral, por inutilidade superveniente da lide.

 

D.2. - Apreciação do pedido de juros indemnizatórios:

 

Os Requerentes deduziram, cumulativamente com o pedido de anulação das liquidações de IRS, um pedido de condenação da Requerida no pagamento de juros indemnizatórios.

 

Quanto às liquidações relativas ao ano de 2020, a decisão de revogação refere expressamente «o pagamento de juros indemnizatórios, neste caso apenas no que respeita ao ano de 2020».

 

Em consequência, verifica-se, quanto a este ano, a inutilidade superveniente da lide.

Já não assim no que toca ao ano de 2022, pelo que se justifica a manutenção do interesse processual quanto ao pedido de juros indemnizatórios relativamente às liquidações respeitantes a este ano, pelo que o Tribunal conhecerá do pedido de juros indemnizatórios.

 

Vejamos então:

 

Peticionam os Requerentes que a Requerida seja condenada no pagamento de juros indemnizatórios, calculados nos termos constantes do artigo 43.º, n.º 1, da LGT.

 

Esta norma estatui o seguinte:

 

São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

 

Pressuposto essencial dos juros indemnizatórios é, assim, que tenha ocorrido pagamento da dívida tributária.

 

Ora, como consta supra, à míngua de prova documental bastante, o pagamento do imposto resultante das liquidações de IRS objecto do pedido de pronúncia arbitral não se encontra provado.

 

Falta assim um pressuposto necessário à condenação da Requerida em juros indemnizatórios, pelo que considera o Tribunal que o pedido dos Requerentes não preenche os pressupostos plasmados no artigo 43.º, n.º 1, da LGT, assim improcedendo o pedido de pronúncia arbitral nesta parte, bem como, por maioria de razão, o pedido de reembolso do imposto.

 

 

 

 

E - DECISÃO:

 

Este Tribunal Arbitral:

 

  1. Declara extinta a instância arbitral, por impossibilidade superveniente da lide, nos termos do disposto no artigo 277.°, alínea e), do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 29.°, n.° 1, alínea e), do RJAMT, no que se refere aos pedidos de anulação de todas as liquidações de IRS impugnadas e ao pedido de condenação da Requerida em juros indemnizatórios, quanto ao ano de 2020.

 

  1. Julga improcedente o pedido de condenação da Requerida em juros indemnizatórios, quanto ao ano de 2022, bem como o pedido de reembolso do imposto.

 

 

F - VALOR DA CAUSA:

 

Os Requerentes indicaram como valor da causa o montante de € 82.428,32, o qual não foi impugnado, pelo que se fixa à presente causa o valor de € 82.428,32.

 

 

 

G - CUSTAS:

 

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAMT, e da Tabela I, anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em € 2.754,00, indo a Requerida condenada nas custas do processo, uma vez que a revogação das liquidações impugnadas relativas ao ano de 2020 ocorreu em data posterior à constituição do Tribunal e a revogação das liquidações impugnadas relativas ao ano de 2022, embora tenha ocorrido em data anterior à constituição do Tribunal, nunca foi notificada aos sujeitos passivos, pelo que a impugnação dos actos tributário objecto do pedido de pronúncia arbitral - no sentido de que teriam impugnado actos que inexistiam na ordem jurídica -, não lhes é imputável.

Notifique.

 

Lisboa, em 16-04-2025.

 

Os Árbitros,

 

 

José Poças Falcão (Presidente)

 

 

Susana Cristina Nascimento das Mercês de Carvalho

 

 

Martins Alfaro



[1] JOSÉ LEBRE DE FREITAS, RUI PINTO e JOÃO REDINHA, Código de Processo Civil Anotado,
Volume 1.°, 2.a edição, Coimbra Editora - Coimbra, 2008, pág. 555.