|
|
Versão em PDF |
Consultar versão completa em PDF
Sumário:
I – Compete à Autoridade Tributária e Aduaneira fundamentar a decisão de emitir uma liquidação adicional de IRC. - II – Não estando demonstrados os factos que suportam a liquidação adicional de IRC ou mesmo havendo dúvidas fundadas quanto à realidade dos mesmos, a liquidação deverá ser anulado nos termos do artigo 100º, do CPPT.
DECISÃO ARBITRAL
Acordam em Tribunal Arbitral:
I. Relatório
-
Em 11 de Julho de 2024, a sociedade A..., SL, SUCURSAL EM PORTUGAL [...], com local de representação permanente em Portugal, na Rua ..., ..., ...– ...-... ..., veio requerer a constituição de Tribunal Arbitral, pedindo a declaração de ilegalidade e a consequente anulação do ato de liquidação tributária, em sede de liquidação adicional de IRC relativa ao ano de 2019, tendo por objeto a “demonstração de acerto de contas”, num total de 95 436,00 €, assim discriminado:
-
Requer, a final, que seja ressarcida dos montantes de IRC e juros, indevidamente pagos, acrescidos dos juros indemnizatórios legais.
-
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite e, em 24 de Setembro de 2024, foi constituído o Tribunal Arbitral.
-
Na sua petição, a requerente alega;
-
que é uma sociedade de direito espanhol com domicílio fiscal em ... (León), ..., ...,. ..– León, com estabelecimento estável, em Portugal, enquanto sucursal, sob a jurisdição tributária do Serviço de Finanças de ..., desde 22 de Janeiro de 2013, onde exerce a atividade avícola de “multiplicação avícola”, que consiste na produção de ovos de incubação – CAE 1470 – Avicultura.
-
Contabilisticamente, a Requerente aplica a Norma Contabilística e de Relato Financeiro para as Pequenas Entidades – NCRF-PE e a NCRF-17 – Agricultura que, no seu nº. 37, distingue os ativos biológicos consumíveis dos ativos biológicos de produção, considerados estes como não sendo produto agrícola, mas, antes, de regeneração própria, aliás, também, no entendimento técnico-contabilístico, quanto às galinhas poedeiras, que as considera como tal, porquanto o seu principal destino e função consiste na produção de ovos – até ao máximo de 60-64 semanas, sendo que terminada a fase de postura, as galinhas são para abate -,presumindo-se, deste modo, que a venda das galinhas apenas se verifica após esgotada a respetiva vida útil, na função para a qual foram adquiridas – a produção de ovos -, afastando-se, assim, a hipótese de serem classificadas como ativos biológicos consumíveis.
-
A Requerente utiliza como critério de mensuração desses ativos biológicos de produção o custo de aquisição, que mantém, desde a sua constituição, porque não é possível determinar com fiabilidade o “justo valor” desses ativos biológicos, no que a Requerida AT concorda e aceita. Com efeito, a página 82 do RIT [Processo Administrativo], a requerida AT considera que a mensuração dos activos biológicos de produção deve ser feita pelo custo, como se transcreve:
-
Há, pois, no que respeita ao critério de mensuração pelo custo de aquisição, a confirmação do princípio da continuidade e da consistência, o mesmo se dizendo da verificação do princípio da periodização económica consignado no nº. 1 do artigo 18º do CIRC, e da observância do princípio da indispensabilidade dos gastos, no âmbito do escopo societário da Requerente.
-
Mais desenvolvida e especificamente alega a. Requerente A... que é uma sucursal permanente, devidamente constituída e registada em Portugal, da sociedade de direito espanhol “B...; S.L.”, com domicílio social em ... (León), ..., ... ...– León.
-
A Requerente A... (enquanto sucursal em Portugal) é um estabelecimento estável da referida sociedade de direito espanhol, coletada no Serviço de Finanças de ... (2704) desde 22 de janeiro de 2013.
-
A atividade económica da A... (ora Requerente) insere-se no setor avícola, enquanto incubadora, produtora e comercializadora de pintos.
-
A atividade da Requerente A... é comummente denominada no setor avícola como de “multiplicação avícola” e consiste resumidamente na produção de ovos de incubação.
-
Trata-se de uma atividade integrada verticalmente:
-
A... compra pintos (galinhas de um dia) e aloja-os nos aviários/granjas da C... e da D..., que procedem à sua RECRIA até à semana 20-21 de vida, sendo recolhidos pela A...;
-
as galinhas recriadas podem ficar em Portugal para iniciarem aqui a fase de POSTURA ou serem vendidas à casa-mãe B... em Espanha para aí iniciarem a fase da POSTURA;
-
em Portugal, A... aloja as galinhas poedeiras nos pavilhões/aviários predominantemente da D..., para aí desenvolverem a fase da POSTURA a partir da 24ª semana de vida; a D... presta os serviços de manutenção do bando e entrega à A... os ovos (ovos incubáveis);
-
estes ovos incubáveis podem ter 2 (dois) destinos:
-
venda à E... (Espanha) ou D...;
-
incubação, no centro de incubação da D..., que presta e fatura este serviço.
-
os pintos resultantes deste processo de incubação são vendidos à E... (Espanha) e à D...;
-
o período de postura das galinhas poedeiras referidas é de cerca de 36 a 40 semanas, determinando uma vida útil de 60-62 semanas;
-
findo o qual o bando de galinhas é vendido como subproduto ou como carne, por um valor residual.
-
A Requerente A... está classificada na Classificação Portuguesa das Atividades Económicas, como CAE Principal: Código 1470 – Avicultura.
-
Do ponto de vista contabilístico, a Requerente A... aplica a Norma Contabilística e de Relato Financeiro para Pequenas Entidades (NCRF – PE).
-
A Administração Tributária ao cuidado da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), por ter ficado negativamente impressionada com a redução acentuada durante o exercício de 2019 dos resultados tributáveis, desencadeou uma Ação Inspetiva com início em 28 de julho de 2022, tendo dado causa ao Projeto de Relatório de Inspeção de 11 de abril de 2023.
-
Sobre o qual a Requerente A... se pronunciou em 28 de abril de 2023, em sede de audiência de interessada.
-
A Requerente A... foi posteriormente notificada, em 30 de maio de 2023, do Relatório Final da Inspeção Tributária.
-
Como se observa das conclusões deste Relatório Final da Inspeção Tributária, a via encontrada pela AT para alcançar a almejada coleta tributária adicional foi a de alterar o método da valorização das galinhas poedeiras enquanto ativos biológicos de produção.
-
As galinhas poedeiras em referência no relatório são qualificadas aí – e bem – como “ativos biológicos de produção” (animais), com capacidade de transformação biológica (com processos de crescimento natural, degeneração, produção e procriação que causam alterações qualitativas e quantitativas no ativo biológico), dos quais fluirão benefícios económicos para a entidade sua detentora e cujo custo (valor de mercado) não pode, no entanto, ser fiavelmente mensurado.
-
As galinhas poedeiras, adquiridas com um (1) dia e cuja vida útil perdura até às 60 semanas, são ativos biológicos de produção (diferenciando-se dos ativos biológicos consumíveis), em conformidade com a segunda parte do § 40. da Norma Contabilística de Relato Financeiro – 17 – Agricultura (NCRF-17-Agricultura).
-
O reconhecimento e a mensuração destes ativos biológicos de produção encontram-se igualmente previstos na NCRF-17-Agricultura.O projeto de relatório de inspeção refere – e bem – que a A... utiliza o normativo da Norma Contabilística e de Relato Financeiro para Pequenas Empresas (NCRF-PE) homologado em Portugal pelo Despacho nº 263/2015 – XIX do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, de 16 de julho de 2015 (DR., 2ª Série – nº 146 – 29/07/2015).
-
Não é, no entanto, verdade que, em matéria de valorização de ativos biológicos de produção como “os aspetos contabilísticos ou relato financeiro de transações não se encontra expressamente contemplado na NCRF-PE aplica-se (supletivamente) o disposto na NCRF”.
-
Ao contrário do que o relatório refere no início do Capítulo V.1.2.1. “Enquadramento Contabilístico”, o Capítulo 20. da NCRF-PE trata de forma expressa, para além do mais, dos critérios de reconhecimento (20.3) e mensuração (20.4 e 20.6) dos ativos biológicos e da valorização dos ativos biológicos de produção.
-
Não havendo aqui necessidade – ao contrário do que o relatório refere – de aplicar supletivamente a NCRF-17, se bem que daí não resulta qualquer alteração substancial quanto à valorização dos ativos biológicos de produção em referência.
-
Esta errada interpretação da Norma aplicável conduz inevitavelmente à inviabilidade das conclusões do relatório.
-
O certo é que, depois de tecer considerações muito vagas e incompletas sobre o enquadramento contabilístico da questão e de cometer os erros suprarreferidos quanto ao Enquadramento Normativo, o autor do relatório concluiu no final do Cap. V.1.2.1. que:
“Não se mostrando possível a determinar do justo valor, com fiabilidade, a mensuração deveria ser efetuada pelo custo, menos qualquer depreciação acumulada e qualquer perda por imparidade acumulada” (SIC).
-
Nada a obstar a esta conclusão que se mostra verdadeira.
-
Efetivamente a regra geral da mensuração dos ativos biológicos de produção, no reconhecimento inicial e em cada data do balanço, é o seu justo valor, menos custo de alienação; exceto no caso de o justo valor não poder ser fiavelmente mensurado – cfr. paragrafo 20.4 da NCRF-PE;
-
E, considera-se como justo valor fiavelmente mensurável as cotações oficiais de mercado, designadamente, as disponibilizadas pelo Sistema de Informação de Mercados Agrícolas (SIMA) - cfr. paragrafo 20.6 da NCRF-PE.
-
Sob a epigrafe “Incapacidade de Mensurar Fiavelmente o Justo Valor” o § 20.10 da NCRF-PE indica que o ativo biológico deve ser mensurado pelo custo menos qualquer depreciação acumulada e qualquer perda por imparidade acumulada.
-
Ao determinar o custo, a depreciação acumulada e as perdas por imparidade acumuladas, tem de se ter em consideração os Capítulos 7 e 11 desta NCRF-PE, bem como, se for o caso, a NCRF-12 – Imparidade de Ativos (§ 20.11 da NCRF-PE).
-
A remissão para o Capítulo 7 da NCRF-PE remete para o reconhecimento, mensuração e depreciação dos Ativos Fixos Tangíveis.
-
De registar a este propósito que os gastos de depreciação em cada período devem ser reconhecidos nos resultados (§ 7.15 da NCRF-PE).
-
A quantia depreciável de um ativo deve ser imputada numa base sistemática durante a sua vida útil. (§ 7.16.)
-
Sendo que a depreciação de um ativo começa quando esteja disponível para uso (§ 7.18.).
-
Na determinação da vida útil de um ativo devem ser considerados todos os fatores enunciados no § 7.19 da NCRF-PE, designadamente o uso esperado do ativo, o qual é avaliado por referência à capacidade ou produção final esperada do ativo - o que, no caso das galinhas poedeiras da bA..., se traduz em 36-40 semanas e até à 60ª semana de vida útil.
-
O método de depreciação deve ser aplicado sistemática e consistentemente ao longo dos períodos - como a A... sempre fez.
-
Por sua vez, a remissão para o Capítulo 11 – Inventários, remete para o Custo dos Inventários e para a sua valorização ou Valor Realizável Líquido.
-
Embora não seja diretamente aplicável (mesmo supletivamente) a NCRF-17 (Agricultura), não diverge esta norma da NCRF-PE nesta matéria.
-
Efetivamente, os § 31 a 34 da NCRF-17 (Agricultura) sob a epigrafe de “Incapacidade de mensurar fiavelmente o justo valor”, explica que:
“(…) Nesse caso, esse ativo biológico deve ser mensurado pelo custo menos qualquer depreciação acumulada e qualquer perda por imparidade acumulada (…)”. E “ao determinar o custo, depreciação acumulada e perdas por imparidade acumulados, deve tomar-se em consideração a NCRF-Inventários, a NCRF-7 Ativos Fixos Intangíveis e a NCRF-12 – Imparidade de Ativos (cfr. § 34. da NCRF-17- Agricultura)
-
A convergência, neste aspeto, entre a NCRF-PE e a NCRF-17- Agricultura é total.
-
É desde já possível concluir que todas estas normas foram cumpridas escrupulosamente pela A... .
-
Todos os gastos com as galinhas desde a aquisição e todos os consumos desde o primeiro dia até às 24 semanas (período de crescimento sem produção) são acumulados.
-
Este custo de cada bando de galinhas poedeiras sofre depreciação ao longo da vida útil do bando, ao longo do período de postura de 36-40 semanas.
-
A vida útil de cada bando calcula-se por referência à capacidade física e à produção esperada.
-
Como método de depreciação, a A... aplica o método das unidades de produção (cfr. § 7.21 do NCRF-PE).
Acerca do enquadramento fiscal – CIRC (cap. V.1.2.2. do Relatório de Inspeção)
-
A portaria nº 2018/2015, de 23 de julho, aprovou o Código de Contas.
-
A conta com o código ou classe 3, prevê: “Classe 3 – Inventário e Ativos Biológicos”
-
Esta classe integra os ativos biológicos, quer consumíveis, quer de produção ou regeneração.
-
As quantias encontradas nas contas desta classe terão em atenção o que em matéria de mensuração se estabelece na NCRF-18 – Inventários, pelo que serão corrigidos de qualquer ajustamento a que haja lugar, e na NCRF-17- Agricultura.
-
Assim, como anteriormente já se referiu, os ativos biológicos de produção e os inventários são classificados e mensurados pela mesma Norma-18-Inventários (alínea c) do §2 desta NCRF-18).
-
Facto que o relatório de inspeção omite.
-
O CIRC, na subsecção II do Capítulo III, trata da mensuração dos Inventários.
-
O nº 1 do art.º 26º - Inventários – determina que para efeitos da determinação do lucro tributável, os rendimentos e gastos dos inventários são os que resultam da aplicação dos critérios da mensuração previstos na normalização contabilística, designadamente na NCRF-PE, que utiliza “custos de aquisição ou produção”.
-
Sendo certo, no entanto que, do ponto de vista fiscal, os ativos biológicos de produção não têm enquadramento no art. 26º do CIRC uma vez que este artigo se refere apenas a inventários (Ativos Correntes). Tem enquadramento neste artigo os ovos em granja – ativos biológicos consumíveis – que são considerados ativos correntes. A valorização dos ovos não foi objeto de correção.
-
Assim, é fiscalmente aceitável a valorização e mensuração dos inventários feitos pela A... em conformidade com a NCRF-PE e NCRF-18–Inventários.
-
Na Subsecção III do mesmo Capítulo III, o CIRC trata de Depreciações, Amortizações e Perdas por Imparidade em Ativos não Correntes.
-
O artº 29 prevê que são aceites como gastos as depreciações e amortizações de elementos do ativo sujeito a deperecimento, considerando-se como tais: (i)Os ativos tangíveis; (ii) Os ativos biológicos não consumíveis.
-
Como se compreende, as galinhas poedeiras da A..., de forma sistemática, ao longo da sua vida útil (que se traduz em 36-40 semanas) sofrem perdas de valor resultante da sua utilização e produção, de forma que se esgotam, fisicamente e em valor, no final do período de postura que coincide com final da sua vida útil (nº 2 do art.º 29 do CIRC).
-
Não se encontrando fixada qualquer taxa de depreciação para os ativos biológicos de produção / galinhas poedeiras de ovos de incubação, nas Tabelas I e II, anexas ao DR 25/2009, importa atender ao disposto no n.º 3 do art.º 5.º do referido decreto regulamentar, o qual determina que, “Relativamente aos elementos para os quais não se encontrem fixadas, nas tabelas referidas no n.º 1, taxas de depreciação ou amortização, são aceites as que pela Direcção-Geral dos Impostos [atual Autoridade Tributária e Aduaneira] sejam consideradas razoáveis, tendo em conta o período de utilidade esperada.”.
-
Tendo em conta que o bando destas galinhas tem capacidade de postura de ovos até ao máximo de 60/64 semanas, sendo que, terminada a fase da postura, a galinha é objeto de abate.
-
Considerando que esse abate ocorre às 60/64 semanas, as quais incluem 24 semanas de período de recria, após o que só então estão aptas a iniciar a postura, tal significa que as galinhas permanecem “em funcionamento” por um período inferior a um ano, ou seja, cerca de 36/40 semanas.
-
Atendendo ao período de utilidade esperada das galinhas poedeiras, considera-se razoável a adoção, relativamente a tais ativos, de uma taxa de depreciação de 100%, da qual se deduz um período de vida útil, para efeitos fiscais, de um ano.
-
O artigo 45º-A do CIRC, fruto da reforma de 2013, prevê que o custo de aquisição dos ativos biológicos não consumíveis (como é o caso vertente) é aceite como gasto para efeitos fiscais, durante o período de vida útil.
-
A administração tributária (AT) tem correntemente entendido que esta depreciação prevista no nº 3 do art.º 45-A do CIRC foi aditada porque se entendeu que “(…) era justificado atribuir as mesmas consequências jurídico-fiscais, independentemente de estes [ativos] se encontrarem subsequentemente mensurados pelo modelo do justo valor ou pelo método do custo. Assim, sempre que estes ativos se encontrem subsequentemente contabilizados pelo modelo do justo valor, e de forma a neutralizar a circunstância de, nesse caso, não serem realizadas amortizações (…)” (Fonte: Relatório final da Comissão para a Reforma do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas – 2013), passou a permitir-se uma dedução fiscal no apuramento do lucro tributável.
-
Duvidas nunca existiram, no entanto, quanto à valorização das depreciações dos ativos biológicos de produção mensurados com base no custo de aquisição.
-
Surpreende-se do Relatório Final da Inspeção Tributária a errada – e abandonada – ideia de que as eventuais depreciações que foram efetuadas ao abrigo do §31 da NCRF-17 não concorriam para a formação do lucro tributável, dado que esses ativos biológicos de produção não constituíam elementos fiscalmente depreciáveis.
-
Mas isto era assim entendido, antes da Reforma de 2013 e na antiga redação do artº. 29º do CIRC.
-
Presentemente, para efeitos de determinação do custo, no reconhecimento inicial, relativamente ao qual os preços ou valores determinados pelo mercado não estejam disponíveis ou sejam pouco fiáveis, a mensuração é efetuada através do método do custo, ou seja, o ativo biológico é mensurado pelo custo menos qualquer depreciação acumulada e qualquer perda por imparidade acumulada. Ao determinar o custo, a depreciação acumulada e as perdas por imparidade acumuladas, a entidade deverá orientar-se pela NCRF 18 – Inventários, a NCRF 7 – Ativos Fixos Tangíveis e a NCRF 12 - Imparidade de Ativos.
Observando agora mais de perto o modus operandi da Requerente A... quanto à valorização dos seus ativos biológicos de produção
-
A Requerente A... mantém ao longo dos últimos exercícios (desde a sua constituição, mas com especial relevância nos exercícios de 2017, 2018, 2019 e 2020) precisamente o mesmo método de mensuração dos seus ativos biológicos de produção (bandos de galinhas poedeiras), pelo modelo do custo.
-
A AT, no caso vertente, aceita expressamente a aplicação do modelo do custo.
-
A AT aceita e reconhece que a Requerente A..., do ponto de vista contabilístico, aplica a Norma Contabilística e de Relato Financeiro para Pequenas Entidades (NCRF-PE).
-
Como a Requerente A... procurou demonstrar em sede de Reclamação Graciosa, aquando da compra dos pintos, os mesmos são registados, pelo respetivo custo, na conta 3132 – Compras – Ativos biológicos – De produção, por contrapartida de uma conta de Terceiros/Disponibilidades
-
Os gastos relativos a ração e medicamentos são registados na conta 312 – Compras – Matérias-Primas, subsidiárias e de consumo.
-
No final do ano é feita a inventariação: (i) Dos ovos; (ii)Das galinhas.
-
Nos termos do ponto 20.5 da NCRF-PE, os ovos são valorizados pelo valor realizável líquido (considerando o preço de venda a terceiros, designadamente à D...). Os movimentos são feitos nas contas: 3711 – Ativos biológicos consumíveis (por estarem em incubação) / 734 – Variação da produção.
-
Quanto às galinhas, distinguem-se: (a) As galinhas que ainda não iniciaram a postura (até às cerca de 24-27 semanas); (b) As galinhas que já iniciaram a postura (desde as 24-27 semanas até às 60 semanas).
-
As galinhas identificadas em a) são valorizadas ao custo (não ao justo valor, pois não há cotação para estas galinhas no Sistema de Informação de Mercados Agrícolas – SIMA).
-
As galinhas identificadas em b) são valorizadas ao custo depreciado, pelo índice teórico de produção.
-
As correções da AT decorrem da discordância em relação ao modelo de valorização das galinhas poedeiras referidas na alínea b) (i.e., na fase da postura).
-
Em primeiro lugar, importa referir que, contrariamente ao que é indicado pela AT no ponto V.1.2.1 do Relatório da Inspeção, não é necessário recorrer supletivamente à NCRF 17 – Agricultura, pois a NCRF-PE tem previsto o tratamento para os ativos biológicos, concretamente no seu capítulo 20.
-
Outro erro que é cometido pela AT, desta feita na interpretação do normativo fiscal, concretamente do n.º 1 do artigo 18.º do Código do IRC, ao dizer: “Assim, para efeitos fiscais, os gastos, resultantes da valorização dos ativos biológicos de produção ao custo, concorrem para a determinação do resultado tributável do período em que forem vendidos ou abatidos, de acordo com o n.º 1 do artigo 18.º do CIRC” (sublinhado da Requerente)
-
Curiosamente, transcrevem a disposição corretamente, mas retiram dela uma conclusão totalmente errada!
-
Diz o n.º 1 do artigo 18.º: “Os rendimentos e os gastos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo com o regime de periodização económica.” (sublinhado da Requerente).
-
Talvez a errada conclusão retirada decorra da evidenciada má interpretação das normas e conceitos contabilísticos.
-
Importa, assim, definir com rigor o “regime da periodização económica”.
-
Tal consta do ponto 2.3 do Anexo I a que se refere o artigo 4.º do Decreto-Lei
n.º 158/2009, de 13 de julho, com a redação dada pelo Decreto-Lei n.º 98/2015, de 2 de Junho:
“2.3 — Regime de acréscimo (periodização económica):
2.3.1 — Uma entidade deve preparar as suas demonstrações financeiras, exceto para informação de fluxos de caixa, utilizando o regime contabilístico de acréscimo (periodização económica).
2.3.2 — Ao ser usado o regime contabilístico de acréscimo (periodização económica), os itens são reconhecidos como ativos, passivos, capital próprio ou fundos patrimoniais, rendimentos e gastos quando satisfaçam as definições e os critérios de reconhecimento para esses elementos contidos na estrutura conceptual.
-
As correções ora em análise respeitam exclusivamente à valorização das galinhas poedeiras.
-
Conforme já explicado, desde o seu nascimento até às 24-26 semanas, as galinhas são registadas como ativos, capitalizando-se os seus gastos.
-
No fundo, é um ativo em curso, que ainda não está apto a funcionar – no caso em concreto, a pôr os ovos.
-
Por via da variação da produção, os gastos com medicamentos e ração – essenciais à “construção” do ativo – vão sendo acrescidos ao seu custo.
-
Até aqui, a AT de nada discordou.
-
Aliás, a AT de forma constante, tem, desde há muito tempo, aceite que as empresas de multiplicação avícola diluam o custo de aquisição dos ativos biológicos de produção, (acrescido de ganhos e perdas verificados) para efeitos fiscais, ainda que na contabilidade não haja registos de qualquer gasto a título de depreciação (cfr. as razões subjacentes à introdução do art.º 45º-A do CIRC pela Lei nº 2/2014, de 16 de janeiro).
-
Às 24-27 semanas, a galinha começa a pôr ovos, isto é, “entra em funcionamento”, deixando de estar em curso.
-
E produz ovos durante aproximadamente mais 35 semanas (até às 60 semanas).
-
Simplificando:
(a) Durante 24-27 semanas as galinhas estão a ser preparadas para poderem pôr ovos, só gerando custos de “construção” do ativo. Neste momento não são gerados rendimentos, apenas se incorrendo num investimento no ativo biológico de produção;
(b) Das 24-27 semanas às 60 semanas as galinhas estão a produzir. É nesta fase que estão a pôr ovos que estão a contribuir para os rendimentos da Requerente;
(c) Às 60 semanas são vendidas por um valor residual, porque já não estão aptas a “produzir”.
-
O procedimento da Requerente A... consiste em considerar a materialização do ativo em gasto durante a “vida útil” das galinhas.
-
A AT pretende considerar o gasto das galinhas (acumulado ao longo da sua existência), apenas no momento da venda das galinhas, com o que despreza completamente o aspeto económico essencial de que o gasto (consumo) das galinhas deve ser considerado no momento da venda dos ovos.
-
É no momento da venda dos ovos que ocorre o impacto do gasto ocorrido na fonte produtora (a galinha), no ganho de realização (o ovo).
-
Transpondo a situação ora em análise para uma situação mais corrente, pense-se no caso de um tear para uma empresa têxtil.
-
O tear (que é um ativo) é imputado a gastos por via da depreciação, durante a respetiva
vida útil, em estrito cumprimento do regime da periodização económica, pois é nesse período que está a contribuir para os rendimentos (produção dos fios).
-
Também no caso das galinhas poedeiras terá de se considerar o gasto no período em que contribui para a postura dos ovos.
-
Pretendendo a AT que o gasto seja imputado ao momento da venda das galinhas, seria o equivalente a não se registar o gasto da depreciação dos teares, refletindo-se o mesmo na perda aquando da venda do mesmo, dando origem a uma menos-valia correspondente ao conjunto de depreciações indevidamente não contabilizadas.
-
Sendo que, como defende a AT, aquando da venda dos ovos, a empresa teria um lucro elevadíssimo e quando vendesse as galinhas um prejuízo de igual monta.
-
Para se compreender mais facilmente, veja-se um exemplo concreto, quantificado, de um lote que iniciou o processo de recria ainda no exercício de 2018, tendo a produção dos ovos e pintos começado em 2019 e terminado no início de 2020, concretamente o lote NT1810R.
-
Compare-se a contribuição para os resultados deste lote seguindo o critério da Inspeção, com o critério usado pela empresa.
-
Neste exemplo, com dados reais, e seguindo a interpretação da AT, caso se mantivessem as galinhas valorizadas ao custo capitalizado até às 24 semanas, os resultados apurados pela empresa seriam os seguintes:
Em 2019
Valorização a 1/1/2019............(22 551 unidades x € 10,8773) …......................€ 245 294
Gastos de 1/1/2019 até 31/12/2019 ..................................................................€ 331 933
Venda de ovos e pintos ….................................................................................€ 618 873
Venda de galinhas …................................................................................................€ 980
Valorização a 31/12/2019............(20 214 unidades x € 10,8773) .....................€ 219 874
Resultado do lote em 2019 .............................................................................€ 262 500
(i.e., Vendas – Gastos – Variação Produção)
Em 2020
Valorização a 1/1/2020............(20 214 unidades x € 10,8773) …......................€ 219 874
Gastos desde 1/1/2020 até à venda das galinhas ...............................................€ 44 678
Venda de ovos e pintos........................................................................................€ 65 428
Venda de galinhas...............................................................................................€ 15 132
Resultado do lote em 2020 …....................................................................... - € 183 992
-
Seguindo o entendimento da AT, no ano de 2019 a empresa geraria um lucro de € 262 500, e em 2020 um prejuízo de € 183 992.
-
Compare-se agora com os resultados obtidos seguindo o entendimento da Requerente:
Em 2019
Valorização a 1/1/2019............(22 551 unidades x € 10,8773) .........................€ 245 294
Gastos de 1/1/2019 até 31/12/2019 …...............................................................€ 331 933
Venda de ovos e pintos …..................................................................................€ 618 873
Venda de galinhas …................................................................................................€ 980
Valorização a 31/12/2019............(20 214 unidades x € 1,214603) ……..............€ 24 552
Resultado do lote em 2019 ...............................................................................€ 67 178
Em 2020
Valorização a 01/01/2020............(20 214 unidades x€ 1,214603) ………............€ 24 552
Gastos desde 01/01/2020 até à venda das galinhas ……....................................€ 44 678
Venda de ovos e pintos ........................................................................................€ 65 428
Venda de galinhas …...........................................................................................€ 15 132
Resultado do lote em 2020 …............................................................................€ 11 330
-
Note-se que o resultado global dos 2 anos é o mesmo:
-
Pelo entendimento da AT: € 262 500 - € 183 992 = € 78 508
-
Pelo entendimento da Requerente: € 67 178 + € 11 330 = € 78 508
-
Não há dúvidas de que os gastos devem ser imputados ao ano do rendimento, pelo que apenas o procedimento da Requerente A... cumpre com o princípio da periodização económica.
-
A AT converte um procedimento correto e lógico num procedimento absurdo.
-
Torna um lucro compreensível em dois anos num lucro num ano e num prejuízo no outro, sem razão nenhuma que o justifique.
-
E pasme-se: não corrige os resultados dos dois anos, mas somente o ano em que aumenta o lucro!!
-
Tal procedimento viola o disposto no artigo 18.º do Código do IRC e os mais elementares princípios contabilísticos, de balanceamento de gastos e rendimentos, bem como a prática contabilística do setor.
Sem prescindir,
-
Se a AT corrigiu o valor dos ativos biológicos por referência a 31/12/2019, por discordar das regras de valorização dos mesmos, então, e porque a ação inspetiva incidiu sobre o exercício económico de 2019, também teria de corrigir o valor a 1/1/2019.
-
Esqueceu-se a AT que a sua missão não é fazer correções que prejudiquem os contribuintes, mas sim repor a legalidade.
-
A existir erro na valorização – que, reitera a Requerente A..., não existiu – então teria de se corrigir o erro na sua plenitude.
-
Exigia-se, assim, à AT, que levasse em conta o valor dos ativos biológicos de produção inicial (1/1/2019), reavaliados à luz do mesmo critério empregue no saldo final. É essa, aliás, a essência dos princípios da especialização dos exercícios e da continuidade.
-
O princípio da continuidade impõe a consideração de que uma empresa labora de forma continuada, com duração ilimitada; e que a empresa mantem as mesmas práticas contabilísticas e os mesmos modelos de avaliação e de cálculo, de um exercício económico para outro, impedindo, portanto, que em cada um dos exercícios sejam aplicadas, quer pelos sujeitos passivos, quer pela AT, práticas que, em cada momento (oportunisticamente), se revelem mais vantajosas para os interesses de cada uma das Partes (princípio de consistência).
-
Se o tivesse feito, isto é, se tivesse revalorizado os ativos biológicos por referência a 1/1/2019 (que corresponde a 31/12/2018), usando a sua metodologia, o saldo inicial seria o seguinte:
-
De 24-27 semanas a 60 semanas
-
Até 24 semanas
GALLINAS GRANJA PORTUGAL 2019
|
LOTE
|
|
EXISTENCIA A 31/12/2019
|
EXISTENCIA INICIO PUESTA
|
N.º GALLINAS INICIO PUESTA
|
COSTE UNITARIO
|
N.º GALLINAS 31/12/2019
|
EXITENCIA CRITERO AGÊNCIA PORTUGESA
|
NT1808R
|
PUESTA
|
|
377 819 €
|
39 869
|
9,477 €
|
1 785
|
16 915,58 €
|
NT1810R
|
PUESTA
|
|
245 294 €
|
22 551
|
10,877 €
|
20 214
|
219 873,91 €
|
NT1811C
|
PUESTA
|
37 011 €
|
206 122 €
|
18 327
|
11,247 €
|
16 200
|
182 199,69 €
|
NT1902R
|
PUESTA
|
75 321 €
|
|
22 382
|
|
21 073
|
75 320,59 €
|
NT1905R
|
PUESTA
|
146 049 €
|
|
19 844
|
|
19 660
|
146 049,17 €
|
NT1907R
|
PUESTA
|
210 699€
|
|
19 659
|
|
19 659
|
210 699,16 €
|
NT1908C
|
RECRIA
|
150 912€
|
|
|
|
15 623
|
150 912,10 €
|
NT1909R
|
RECRIA
|
254 138 €
|
|
|
|
34 956
|
254 138,06 €
|
NT1910R
|
RECRIA
|
119 409 €
|
|
|
|
17 059
|
119 408,86 €
|
NT1911R
|
RECRIA
|
266 596 €
|
|
|
|
39 808
|
266 596 €
|
NT1912R
|
RECRIA
|
111 203 €
|
|
|
|
18 888
|
111 203 €
|
|
|
1 371 338,66 €
|
|
|
|
|
1 753 316,51 €
|
-
A variação dos inventários de produção, como valor comparativo que é, tem que ter nos dois polos de comparação, realidades da mesma natureza, não podendo comparar “alhos” com “bugalhos”.
-
Se a inspeção tributária amputa ao valor dos ativos biológicos finais (31/12/2019) as depreciações/amortizações que ocorreram, então também teria de ter acrescido ao valor dos ativos biológicos iniciais (01/01/2019) as depreciações/amortizações que subjaziam àqueles valores. O que não fez.
-
E também não levou em conta o impacto do novo valor dos Ativos Biológicos finais (31/12/2019) no montante a considerar nos Ativos Biológicos iniciais, em 01/01/2020.
-
A pretensa variação dos inventários teria necessariamente de se repercutir na correção do valor dos Ativos Biológicos iniciais de 01/01/2020, alterando, para mais, em € 381 977,85, o que se refletiria negativamente no lucro tributável de 2020.
-
Este manifesto erro de método e de cálculo é suficiente para tornar insustentáveis e inválidas as conclusões expressas no relatório de Inspeção Tributária.
-
Ao sobrevalorizar o inventário, a AT provocou um aumento do lucro tributável.
-
Se a AT não concordava com a mensuração do inventário reportado a 31/12/2019 – e corrigiu-o para alcançar acréscimos de receita tributária - então, teria que ter corrigido o valor inicial do inventário a 1/01/2019, bem sabendo que o seu valor tinha sido constituído com base no mesmo método de valorização do custo.
-
O Ponto V.1.3.1. do Relatório da Inspeção é elucidativo, evidenciando que a correção é efetuada na linha da “variação dos inventários de produção”.
-
Importa, a partir deste Capítulo do Relatório analisar e perceber como chegou a AT à correção do valor dos inventários em mais € 381.977,85.
-
Esta rubrica, corresponde à diferença entre o stock final de ativos biológicos de galinhas poedeiras a 31/12/2019 e o stock inicial dos mesmos ativos biológicos de galinhas poedeiras a 01/01/2019.
-
As 38.199 galinhas em causa (1.785 + 20.214 + 16.200), de acordo com o Relatório da AT, existiam tanto a 31/12/2019 como a 01/01/2019.
-
O que de facto a AT efetuou como correção, não foi a correção à variação dos inventários da produção, mas tão só a correção do valor do stock final dos ativos biológicos daqueles três lotes, declarados pelo sujeito passivo, no valor de €37.011,33, passando esse valor para €418.989,18.
-
Esta correção – caso fosse lícita, e não é, como vimos – para ser aceitável, deveria também ser aplicada ao valor do stock inicial das mesmas 38.199 galinhas, dos referidos três lotes e apurado o valor corrigido do stock inicial, pelo que a variação dos inventários de produção, seria dada pela diferença entre o valor de € 418.989,18 do stock final corrigido de ativos biológicos, e o valor que se encontrasse para as mesmas 38.199 galinhas mas reportadas à data de 01/01/2019, apurando-se pois a variação dos inventários de produção corrigida, para mais ou para menos por essa via.
-
Peca assim, o Relatório da AT de este erro capital, dado que a correção deveria incidir sobre os valores declarados pelo sujeito passivo do stock inicial e final dos ativos biológicos e não somente como foi efetuado, a correção do valor do stock final.
-
Encerra assim o Relatório de Inspeção e a correção em que assenta esse Relatório um erro capital uma vez que a pretendida correção – se fosse lícita, e não é, - deveria incidir sobre os valores declarados pela Requerente A... tocante ao stock inicial e final dos ativos biológicos e não somente, como foi feito, a correção do valor do stock final.
-
Para o efeito, a AT teria de andar para trás no tempo, isto é, apurar no exercício de 2018, tal como fez para 2019, os gastos suportados nesse exercício relativos aos mencionados três lotes, alterando o valor inicial de 01/01/2019, para mais, declarado pelo contribuinte no valor de € 424.825,19 (245.907 + 105.274,3 + 73.643,89), apurando aí um custo unitário reportado a essa data e multiplicando pelas 38.199 galinhas, para chegar ao valor inicial corrigido das galinhas.
-
E, apurado esse valor, então, far-se-ia o cálculo da variação dos inventários da produção entre as duas realidades corrigidas.
-
A AT nunca pôs em causa os custos, limitando-se a discordar da sua periodização.
-
E, com isto, faz uma correção ao lucro tributável da Requerente A... de € 381 977,85!!
-
Se fosse possível – e manifestamente não é – proceder-se a uma revalorização de inventários finais, e não também, de inventários iniciais, decerto seríamos conduzidos a resultados absurdos, bastando imaginar uma eventual opção pela realização de inspeções autónomas em relação a cada período de tributação.
-
Estaria encontrado um meio, tão eficaz quanto injusto, de sobretributar um sujeito passivo.
-
E estar-se-ia, ao mesmo tempo, a desrespeitar o princípio da especialização dos exercícios, ao imputar-se a cada um dos períodos de tributação, não apenas o efetivo lucro desse período, como o omitido nos períodos anteriores.
-
Por outro lado, desrespeitar-se-ia igualmente o próprio Código do IRC, que, no n.º 1 do seu artigo 27.º, diz textualmente: “Os critérios adotados para a mensuração dos inventários devem ser uniformemente seguidos nos sucessivos períodos de tributação.”
-
Saliente-se ainda que a propósito de correções efetuadas ao abrigo do n.º 1 do artigo 18.º do Código do IRC, a jurisprudência é muito clara: o princípio da periodização económica (outrora designado por princípio da especialização dos exercícios) deve conformar-se ao princípio da justiça.
-
Conclui pedindo a declaração de ilegalidade dos atos de liquidação identificados no Doc. nº 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, devendo ainda a Requerente A..., S.L., SUCURSAL EM PORTUGAL ser ressarcida dos montantes de IRC e juros indevidamente pagos, acrescidos dos juros indemnizatórios legais.
Resposta da AT
-
A Requerida, na sua resposta, defende que:
-
A discordância relativa à (i)legalidade da correção efetuada pelos SIT (Serviços de Inspeção Tributária) do valor declarado pela Requerente, relativamente a ativos biológico de produção (galinhas poedeiras) em 31-12-2019 - € 37011,33, para €418.989,18, com os consequentes efeitos em sede de apuramento do resultado tributável [fundamentação expressa no RIT (Relatório da Inspeção Tributária]];
-
A matéria em apreço (segundo a AT) está prevista no § 20 da NCRF-PE-Agricultura, mais concretamente nos §§ 20.4 a 20.11;
-
Esta norma prevê no seu § 2.3 que “(...) sempre que esta norma nã responda a aspetos particulares que se coloquem a dada entidade em matéria de contabilização ou relato financeiro de transações ou situações e a lacuna seja de tal modo relevante que o seu não preenchimento impeça o objetivo de ser prestada informação que, de forma verdadeira e apropriada, traduza a posição financeira numa certa data e o desempenho para o período abrangido, a entidade deverá recorrer, tendo em vista tão somente a superação dessa lacuna, supletivamente e pela ordem indicada, às: a) NCRF e Normas interpretativa (NI), (...)”;
-
Sendo a NCRF-PE menos exigente na divulgação/simplificação do alguns critérios de reconhecimento e mensuração, em matéria de valorização de ativos biológicos de produção e porque alguns dos aspetos contabilísticos ou de relato financeiro de transações não se encontra expressamente contemplada na NCRF-PE, aplicar-se-á (supletivamente) o disposta nas NCRF;
-
Ou seja: concluída que seja a insuficiência de tais critérios, è admissível e expressamente prevista a aplicação do previsto nas NCRF;
-
Sendo esta a situação no caso dos autos;
-
Não se mostrando possível a determinação do justo valor, com fiabilidade, a mensuração deverá ser efetuada pelo custo, menos qualquer depreciação acumulada e qualquer perda por imparidade igualmente acumulada;
-
No âmbito fiscal, o CIRC não aceita, todavia, o modelo de mensuração assente no justo valor para os ativos biológicos não consumíveis (nos quais se incluem os ativos biológicos de produção);
-
Ao invés, é aplicável o estipulado no artigo 18º, nº 9, do CIRC (os ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor não concorrem para a formação do lucro tributável, sendo imputados como rendimentos ou gastos no período de tributação em que os elementos ou direitos que lhes deram origem sejam alienados, exercidos, extintos ou liquidados:
-
Vigora assim o princípio da realização;
-
Donde se conclui que os ganhos e perdas provenientes da mensuração inicial e das alterações subsequentes de justo valor, incluídas no resultado contabilístico do período, não concorrem para a formação do lucro tributável. Devendo em cada período, ser objeto de correção no Quadro 07 da declaração modelo 22 do IRC;
-
Ainda para efeitos fiscais, os ativos biológicos de produção devem ser mantidos ao preço de custo (custo de produção), sendo este o valor que releva para apuramento do. Resultado tributável, estando sujeito, aquando da ocorrência de algum evento de realização, ao. regime de mais valias e menos valias, previsto no artigo 46º, do CIRC;
-
Determina assim a citada norma legal a aplicação do regime de mais valias aos eventos de realização (transmissão onerosa, sinistros, afetação permanente a fins alheios à atividade exercida, etc.) ocorridos nos ativos biológicos não consumíveis;
-
A Requerente alega que cumpre e sempre cumpriu o disposto no capítulo 20. Da NCRF-PE-Agricultura e que, perante a incapacidade de mensurar fiavelmente ao justo valor, os ativos biológicos são contabilizados pelo custo menos depreciação e imparidades;
-
E acrescenta que as galinhas poedeiras estão sujeitas a depreciação nos termos previstos na NCRF-PE-7 Ativos Fixos Tangíveis, frisando que “(...) os gastos de depreciação em cada período devem ser reconhecidos nos resultados(...)”, conforme disposto no § 7.15 da NCRF-PE;
-
Todavia, segundo a AT, não foram relevadas quaisquer depreciações daqueles ativos biológicos de produção, utilizando a Requerente um outro qualquer modelo de mensuração desconhecido da AT;
-
O que a análise da contabilidade da Requerente reflete é que, na mensuração efetuada aplicada às quantidades de ativos biológicos de produção (por lotes) declarados à data de 31-12-2019, que totalizou € 37.011,31, valor que teve efeitos no apuramento do resultado líquido e fiscal de 2019, não foi utilizado o método do custo, mas antes um outro método, cujos efeitos não são fiscalmente aceites;
-
Razão porque a Requerente deveria ter efetuado a competente correção no quadro 07, da declaração modelo 22 , de IRC;
-
Assim é que, os SIT, socorrendo-se dos dados da Requerente relativos aos gastos totais suportados respeitantes aos ativos biológicos de produção até ao início da produção (início da postura) e que constavam no ativo da empresa em 31-12-2019, e considerando que não tinham sido contabilizadas quaisquer depreciações sobre esses ativos, concluíram que o valor desses ativos, pelo método do custo, ascendia a € 418.989,18 e nã ao valor declarado de €37.011,33;
-
Conclui a Requerida, depois de ilações e considerações várias, que a razão está do seu lado e não nos argumentos apresentados pela Requerente.
II – Saneamento
-
O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria, atenta a conformação do objeto do processo (cf. artigos 2, n.º 1, a) e 5 do RJAT).
-
O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo previsto no artigo 10, n.º 1, al. a), do RJAT. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas (cf. artigos 4 e 10, n.º 2 do RJAT e artigo 1 da Portaria n.º 112- A/2011, de 22 de março, na redação da Portaria n.º 287/2019, de 3 de setembro).
-
O processo não enferma de nulidades.
Cumpre, pois, apreciar e decidir.
III – FUNDAMENTAÇÃO
Matéria de facto
A - Factos provados
-
Com relevo para a decisão, consideram-se provados os seguintes factos
-
A Requerente é uma sociedade de direito espanhol com domicílio fiscal em ... (León), ..., ...– León, com estabelecimento estável, em Portugal, enquanto sucursal, sob a jurisdição tributária do Serviço de Finanças de..., desde 22 de Janeiro de 2013, onde exerce a atividade avícola de “multiplicação avícola”, que consiste na produção de ovos de incubação – CAE 1470 – Avicultura...
-
A Requerente está classificada na Classificação Portuguesa das Atividades Económicas, como CAE Principal: Código 1470 – Avicultura...
-
...que aplica a Norma Contabilística e de Relato Financeiro para as Pequenas Entidades – NCRF-PE e a NCRF-17 – Agricultura (que, no seu nº. 37, distingue os ativos biológicos consumíveis dos ativos biológicos de produção, considerados estes como não sendo produto agrícola, mas, antes, de regeneração própria, aliás, também, no entendimento técnico-contabilístico, quanto às galinhas poedeiras, que as considera como tal, porquanto o seu principal destino e função consiste na produção de ovos – até ao máximo de 60-64 semanas, sendo que terminada a fase de postura, as galinhas são para abate -,presumindo-se, deste modo, que a venda das galinhas apenas se verifica após esgotada a respetiva vida útil, na função para a qual foram adquiridas – a produção de ovos -, afastando-se, assim, a hipótese de serem classificadas como ativos biológicos consumíveis.
-
A Requerente utiliza como critério de mensuração desses ativos biológicos de produção, o custo de aquisição, que mantém, desde a sua constituição em 2011, porque não é possível determinar com fiabilidade o “justo valor” desses ativos biológicos (no que a Requerida AT concorda e aceita. Com efeito, a página 82 do RIT [Processo Administrativo], a requerida AT considera que a mensuração dos activos biológicos de produção deve ser feita pelo custo, como se transcreve:
-
A atividade económica da Requerente insere-se no setor avícola, enquanto incubadora, produtora e comercializadora de pintos...
-
...atividade que é comummente denominada no setor avícola como de “multiplicação avícola” e consiste resumidamente na produção de ovos de incubação.
-
A A... compra pintos (galinhas de um dia) e aloja-os nos aviários/granjas da C... e da D..., que procedem à sua RECRIA até à semana 20-21 de vida, sendo recolhidos pela A...;
-
As galinhas recriadas podem ficar em Portugal para iniciarem aqui a fase de postura ou serem vendidas à casa-mãe B... em Espanha para aí iniciarem a fase da postura;
-
Em Portugal, a A... aloja as galinhas poedeiras nos pavilhões/aviários predominantemente da D..., para aí desenvolverem a fase da POSTURA a partir da 24ª semana de vida,
-
...e a D... presta os serviços de manutenção do bando e entrega à A... os ovos (ovos incubáveis);
-
Estes ovos incubáveis podem ter 2 (dois) destinos:
-
venda à E... (Espanha) ou D...;
-
incubação, no centro de incubação da D..., que presta e fatura este serviço.
-
Os pintos resultantes deste processo de incubação são vendidos à E... (Espanha) e à D...;
-
O período de postura das galinhas poedeiras referidas é de cerca de 36 a 40 semanas, determinando uma vida útil de 60-62 semanas...
-
.....findo o qual o bando de galinhas é vendido como subproduto ou como carne, por um valor residual;
-
A Administração Tributária desencadeou uma ação inspetiva com início em 28 de julho de 2022, tendo dado causa ao Projeto de Relatório de Inspeção de 11 de abril de 2023...
-
... sobre o qual a Requerente se pronunciou em 28 de abril de 2023, em sede de audiência de interessada...
-
... tendo sido posteriormente notificada, em 30 de maio de 2023, do Relatório Final da Inspeção Tributária (Cfr Relatório no Proc Administrativo instrutor junto aos autos);
-
As conclusões do citado Relatório deram origem à emissão dos atos de liquidação adicionais de IRC identificadas no quadro seguinte: respeitantes ao período de tributação do ano de 2019 (e respetivos juros compensatórios), de que resultou um total a pagar pela Requerente no valor de €95.436,00 (€85945,02 de imposto e €9.490,98, de juros compensatórios) [cfr demonstração de acerto de contas nº 2023..., junto com o PPA];
-
O pagamento dessa importância foi efetuado em 19-9-2023 (Doc 2, com o PPA);
-
A Requerente apresentou Reclamação Graciosa na Direção de Finanças de ... (nº ...2024...) tendo como objeto alegada ilegalidade desse ato de liquidação adicional de IRC [nº 2023..., de 4-8-2023 respeitante ao período de tributação do ano de 2019, e respetivos juros compensatórios, de que resultou um total a pagar pela Requerente no valor de €95.436,00 (€85945,02 de imposto e €9.490,98, de juros compensatórios) [cfr demonstração de acerto de constas nº 2023..., junto com o PPA] (cfr Docs 3, junto com o PPA);
-
A mencionada Reclamação foi indeferida por despacho de 16-4-2024 após exercício do direito de audição da Requerente, que não alterou o sentido da proposta vertida no respetivo projeto (cfr PA e Doc 6, junto com o PPA);
-
O despacho de indeferimento da reclamação fundou-se em informação/parecer, de que se retira o seguinte:
(...)
III. MATERIA DE FACTO
III.1. A reclamante é um estabelecimento estável da sociedade de direito espanhol B...
, SL, NIF ..., com domicilio fiscal em ..., ... ... - Leon. Encontra-se coletada no Serviço de Finanças de ..., para o exercício da atividade com o CAE 01470 - Avicultura, tendo iniciado a sua atividade em 2011-12-22.
III.2. Dispõe de contabilidade organizada por exigência legal informatizada e, em sede de IRC, é
tributada pelo regime geral, estando, como tal, sujeita ao cumprimento das obrigações declarativas constantes do Artigo 117° do CIRC. Para efeitos de IVA, trata-se de um sujeito passivo enquadrado no regime normal mensal, nos termos alínea a) do n° 1 do artigo 2° do Código do Imposto Sobre o ValorAcrescentado (CIVA) e da alínea a) do n° 1 do artigo 41° do CIVA.
III.3. A coberto da Ordem de Serviço n.º ..., a ora reclamante foi alvo de um procedimento
inspetivo, de âmbito geral, ao período de 2019. Em resultado da ação de inspeção levada a cabo pelos Serviços de Inspeção Tributária (SIT) da Direção de Finanças de ..., foram efetuadas correções em sede de IRC, mais especificamente, correção ao resultado tributável declarado pela reclamante e consequentemente ao lucro tributável apurado, resultante do facto de a valorização dos ativos biológicos de produção utilizada, com efeito no reconhecimento de gastos em 2019 no ano em análise, não se encontrar a ser corretamente efetuada e de acordo com os preceitos legais do CIRC sobre a matéria.
III.4. Não concordando com as correções propostas, a reclamante apresentou reclamação graciosa, a l e g a n d o que:
-
as correções levadas a cabo pelos SIT decorrem da discordância em relação ao modelo devalorização d a s galinhas poedeiras, na fase da postura. Refere, quanto a isso, que, contrariamente ao que é referido pelos SIT, não é necessário recorrer à NCRF 17 por si adotado, tem previsto o tratamento para os ativos biológicos, concretamente no seu capitulo 20.
-
Discorda da correção efetuada, que respeita exclusivamente à valorização das galinhas poedeiras, através da qual, pretende a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), considerar o gasto (consumo) das galinhas no momento da venda
-
Já o procedimento da reclamante, consiste em considerar a materialização do ativo em gasto durante a "vida útil" das galinhas, alegando que, a AT de forma constante, tem, desde há muito tempo, aceite que as empresas de multiplicação avícola, como é o caso da reclamante, diluam o custo de aquisição dos ativos biológicos de produção (acrescido de ganhos e perdas verificados) para efeitos fiscais, ainda que na contabilidade não haja registos de qualquer gasto a título de depreciação (cfr. as razões subjacentes à introdução do artigo 45°-A do CIRC pela Lei n° 2/2014, de 16 de janeiro).
-
Alega, pois, perante isso, que o gasto para a "construção do ativo", galinhas poedeiras, deverá ser considerado no seu período de vida útil, que no caso das galinhas poedeiras, será o período em que contribui para a postura dos ovos.
-
Ou seja, no caso de, como pretende a AT, o gasto ser imputado ao momento da venda das galinhas,será o mesmo que não registar o gasto da depreciação das mesmas, refletindo-se, tal situação, numa perda elevada no momento da venda e um lucro elevadíssimo aquando da venda dos ovos, durante a produção.
-
Defende, assim, não haver dúvidas de que os gastos devem ser imputados ao ano de rendimentos em cumprimento do principio da periodização económica, alegando que a AT converte um procedimento correto e lógico num procedimento absurdo, tornando um lucro compreensível em dois anos, num lucro num ano e num prejuízo no outro, sem qualquer razão que o justifique e além disso, não corrige os dois anos, mas apenas o ano que aumenta o lucro.
-
Alega, que tal procedimento viola o disposto no artigo 18° do CIRC e os mais elementares princípios
-
contabilísticos, de balanceamento de gastos e rendimentos, bem como a prática contabilística do setor.
-
Alega ainda que se a AT corrigiu o valor dos ativos biológicos por referência a 31-12-2019, por discordar das regras de valorização dos mesmos, então também teria que corrigir o valor a 01-01-2019, pois a haver erro na valorização, o que reitera, não ter existido, então teria que ser corrigido na sua plenitude, em reposição da legalidade e não em prejuízo da reclamante.
-
Alega ainda que tal procedimento desrespeita o principio da especialização dos exercícios, pois imputa
àquele exercício, não apenas o lucro efetivo desse período, como o omitido nos períodos anteriores.
-
Desrespeita ainda o próprio CIRC, nomeadamente o previsto no n° 1 do seu artigo 27°, "Os critérios
adotados para a mensuração dos inventários devem ser uniformemente seguidos nos sucessivos
-
períodos de tributação."
-
Alega ainda que a AT também não levou em conta o impacto do novo valor dos ativos biológicos
finais (31-12-2019) no montante a considerar nos ativos biológicos iniciais, em 01-01-2020. Aquela
pretensa variação dos inventários teria que ser repercutida na correção do valor dos ativos biológicos
iniciais de 01-01-2020, alterando, para mais, no valor da correção efetuada, o que se refletiria
negativamente no lucro tributável de 2020.
-
Alega que este manifesto erro de método e de cálculo é suficiente para tornar insustentáveis e
consequências legais.
-
A Reclamante foi notificada, no âmbito do procedimento inspetivo, para o exercício do direito de
audição, nos termos da alinea a) do n° 1 do artigo 60° da LGT e n° 2 do artigo 60° do RCPITA, tendo
exercido aquele direito, através da remessa do mesmo, em 2023-04-28, por correio registado e por
F...- Sociedade de Advogados, SP, RL.
-
As alegações apresentadas pela ora reclamante em sede de audição prévia, não diferem dos
argumentos apresentados em sede do presente procedimento, tendo sido devidamente analisados,
sendo que da análise dos quesitos apresentados, os serviços de inspeção concluíram que: " Pelo
exposto no capítulo V deste relatório, conjugado pela análise do direito de audição aqui efetuada,
propomos a manutenção das propostas de correção do projeto de relatório de inspeção, que estão
reproduzidas nos capítulos anteriores, com os fundamentos neles constantes.", pelo que, foi elaborado
o respetivo DC em sede de IRC que deu origem à liquidação ora reclamada.
IV. PARECER
IV.1. A presente reclamação graciosa é indissociável dos factos dissecados no relatório de Inspeção
tributária (RIT) e provas de auditoria anexas, pelo que se entende corroborar integralmente o teor do
relatório, dando-se aqui por reproduzidos todos os fundamentos de facto e de direito, nele vertidos.
IV.2. No que concerne às questões apresentadas pela reclamante, conclui-se que as mesmas não
podem obter provimento. Senão vejamos:
1. Da análise à fundamentação expressa no RIT, verifica-se que a liquidação ora reclamada, tem na sua base a mensuração utilizada pela reclamante, relativamente aos ativos biológicos, sendo as correções ali propostas circunscritas àquela matéria, referentes ao critério de mensuração utilizado pela reclamante e à sua relevância contabilística e fiscal
2. Durante a ação de inspeção verificaram os SIT que, comparando, quer com o período anterior quer com períodos posteriores, decorre do declarado pela ora reclamante que, no período em análise de 2019, e no que respeita a margens ou a rentabilidades, a mesma registou quedas acentuadas, de acordo com a informação retirada do dossier fiscal.
3. Questionada sobre o verificado decréscimo, vem a mesma prestar várias informações, sendo que, da análise efetuada pelos SIT aos diversos elementos fornecidos, se conclui que as incongruências entretanto encontradas, se encontram justificadas pelo critério de valorização dos ativos biológicos de produção, utilizado pela reclamante, pelo que lhe foi solicitado a clarificação do critério de valorização utilizado e seu enquadramento contabilístico.
4. Resultou dos esclarecimentos prestados que, a reclamante, em alternativa à mensuração dos ativos biológicos de produção, pelo justo valor - por segundo a mesma não ser possível determiná-lo com fiabilidade, o sistema de valorização utilizado consiste na amortização dos gastos totais incorridos até à altura em que as galinhas poedeiras comecem a "pôr" o primeiro ovo, com base em posturas standard desde a s 24 semanas às 60 semanas, conforme estabelecido no paragrafo 20 da NCRF-PE - Agricultura, adotada pela reclamante, de acordo com o relatado na IES, bem como em resposta às solicitações efetuadas pelos SIT, no âmbito da ação inspetiva.
5. Define, no entanto, aquela norma, à semelhança do definido na NCRF 17, o justo valor menos custos estimados no ponto de venda, como critério de mensuração preferencial dos ativos biológicos, apenas devendo recorrer à mensuração dos ativos biológicos pelo custo (sujeitos a depreciações e
imparidades), com caráter excecional, quando o justo valor seja de todo impraticável ou com uma
determinação pouco fiável.
6. Ora, no caso em análise, a reclamante considerou ser o justo valor pouco fiável e como tal
impraticável, tento adotado como critério de mensuração dos seus ativos biológicos, pelo custo. Sendo
a mensuração do ativo efetuada ao custo, aquele é determinado em função dos critérios previstos para
a mensuração inicial dos inventários e ativos fixos tangíveis, conforme parágrafo 20.11 da NCRF-PE.
7. Como tal, o custo do ativo biológico é, então, o somatório de todos os custos necessários à sua aquisição e colocação em condições e no local pronto a ser usado. De referir, que se devem apenas
incorporar no custo do ativo os dispêndios com bens e serviços até que o ativo biológico esteja
colocado no local e pronto a ser usado na atividade agrícola, no caso concreto das galinhas poedeiras
aqui em causa, até ao inicio da postura.
8. Há a referir que, não tendo o sujeito passivo utilizado o justo valor, de acordo com o normativo contabilístico, deveria ter utilizado o custo, o qual também não utilizou, tendo em conta os valores atribuídos aos lotes transitados de 2018 para 2019, os quais, tendo em conta o tempo de vida dos mesmos, inferiores às 24 semanas, apenas ficaram prontos para ser usados na atividade agrícola a que se destinavam (postura), entre março e junho.
9. Como tal, tendo em conta o anteriormente referido, que o custo do ativo é o somatório de todos os custos necessários à sua aquisição e colocação em condições e no local pronto a ser usado, bem como o previsto no n° 1 do artigo 18° do CIRC, "Os rendimentos e os gastos, assim como as outras
componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao período de tributação em
que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo
com o regime de periodização económica.", deverão os custos suportados com cada um dos bandos,
até a sua entrada em funcionamento, ou seja, até à data do inicio da postura dos ovos, ser tidos em
conta na valorização dos mesmos. Foi nesse sentido que foi efetuada a correção em causa no presente
processo com base nos documentos solicitados à ora reclamante para o efeito, conforme devidamente explicitado e fundamentado no RIT
10. Face ao exposto, verifica-se que a correção não decorre da discordância em relação ao modelo de valorização das galinhas poedeiras, na fase da postura, mas sim ao modelo de valorização inicial das galinhas poedeiras, tendo sido aceites todos os custos suportados após a data de inicio da postura, como também é referido no RIT.
11. Há ainda a referir que, ao contrário do que alega a reclamante a correção efetuada não dá,
necessariamente, origem, a lucro excessivo num ano e prejuízo elevado no período seguinte, uma vez
que, tendo em conta o critério de valorização adotado pela reclamante, os encargos com os ativos
biológicos de produção, irão relevar como gastos (custo de aquisição), no momento em que existir o
evento de realização, nos termos da alínea a) do n° 1 do artigo 46° do CIRC, podendo ser apurada uma
mais ou uma menos valia, ou um resultado nulo.
12. De facto, para efeitos fiscais, não são aceites os efeitos (imputação dos gastos) no resultado tributável, decorrentes da valorização com base no ciclo de produção, método previsto no artigo 18° do CIRC n° 7, uma vez que, este preceito legal só tem aplicação quando se está perante gastos no
âmbito de explorações silvícolas, o que não é o caso em análise, e daí também não ter enquadramento
naquele normativo.
13. Assim, para efeitos fiscais, os gastos, resultantes da valorização dos ativos biológicos de produção
ao custo, concorrem para a determinação do resultado tributável do período em que forem vendidos
ou abatidos, de acordo com o n° 1 do artigo 18 do CIRC, "Os rendimentos e os gastos, assim como as
outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao período de
tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou
pagamento, de acordo com o regime de periodização económica."
14. Ou seja, no ano em que forem abatidos os lotes, seja pela venda, ou pelo abate nos termos legais,
os custos suportados pela reclamante até ao início da postura das galinhas serão acrescidos ao custo
de aquisição relevando para efeitos de apuramento da mais ou menos valia, conforme previsto no n° 2
do artigo 46° do CIRC.
V.3. Assim, face ao exposto, uma vez que se mantêm os pressupostos legais que estiveram na base dacorreção levada a cabo pelos SIT, as quais resultaram na liquidação adicional ora reclamada, deverá a
mesma ser mantida na ordem jurídica.
V. JUROS INDEMNIZATÓRIOS
Mantendo-se válida e legal a liquidação ora reclamada, não são devidos quaisquer juros
indemnizatórios, nos termos reclamados no presente processo.
VI – CONCLUSÃO
Em face do exposto, propõe-se o INDEFERIMENTO da presente reclamação graciosa, de acordo com os fundamentos da presente informação.
-
As galinhas poedeiras em referência no relatório são qualificadas aí como “ativos biológicos de produção” (animais), com capacidade de transformação biológica (com processos de crescimento natural, degeneração, produção e procriação que causam alterações qualitativas e quantitativas no ativo biológico), dos quais fluirão benefícios económicos para a entidade sua detentora e cujo custo (valor de mercado) não pode, no entanto, ser fiavelmente mensurado.
-
As galinhas poedeiras, adquiridas com um (1) dia e cuja vida útil perdura até às 60 semanas, são ativos biológicos de produção (diferenciando-se dos ativos biológicos consumíveis) [em conformidade com a segunda parte do § 40. da Norma Contabilística de Relato Financeiro – 17 – Agricultura (NCRF-17-Agricultura];
-
O reconhecimento e a mensuração destes ativos biológicos de produção encontram-se igualmente previstos na NCRF-17-Agricultura.
-
O projeto de relatório de inspeção refere que a Requerente utiliza o normativo da Norma Contabilística e de Relato Financeiro para Pequenas Empresas (NCRF-PE) homologado em Portugal pelo Despacho nº 263/2015 – XIX do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, de 16 de julho de 2015 (DR., 2ª Série – nº 146 – 29/07/2015)
-
Todos os gastos com as galinhas desde a aquisição e todos os consumos desde o primeiro dia até às 24 semanas (período de crescimento sem produção) são acumulados;
-
Este custo de cada bando de galinhas poedeiras sofre depreciação ao longo da vida útil do bando, ao longo do período de postura de 36-40 semanas.
-
A vida útil de cada bando calcula-se por referência à capacidade física e à produção esperada.
-
Como método de depreciação, a Requerente aplica o método das unidades de produção (cfr. § 7.21 do NCRF-PE).
-
O bando das sobreditas galinhas tem capacidade de postura de ovos até ao máximo de 60/64 semanas, sendo que, terminada a fase da postura, a galinha é objeto de abate....
-
... abate que ocorre às 60/64 semanas, as quais incluem 24 semanas de período de recria, após o que só então estão aptas a iniciar a postura [tal significa que as galinhas permanecem “em funcionamento” por um período inferior a um ano, ou seja, cerca de 36/40 semanas];
-
A Requerente mantém ao longo dos últimos exercícios (desde a sua constituição, mas com especial relevância nos exercícios de 2017, 2018, 2019 e 2020) o mesmo método de mensuração dos seus ativos biológicos de produção (bandos de galinhas poedeiras), pelo modelo do custo (negrito do Tribunal)
-
... e aplica, do ponto de vista contabilístico, a Norma Contabilística e de Relato Financeiro para Pequenas Entidades (NCRF-PE) (negrito do Tribunal);
-
A análise, que a Requerida AT promoveu, no âmbito da ação de inspeção decidida ao abrigo da Ordem de Serviço OI2022... e consubstanciada no Relatório de Inspeção de 1 de Agosto de 2024, foi dirigida aos lotes NT1808R, NT1909R, NT1810R e NT1811C, com o fundamento de que “(…), no final do período de 2019, os lotes NT1908R e 1810R não apresentam qualquer valorização, o lote NT1809R não consta e a valorização do Lote NT1811C assinala um decréscimo do custo unitário dos activos biológicos de produção”. conforme consta do RIT, a página 228, que se transcreve:
-
Dos esclarecimentos solicitados pela Requerida, o Sujeito Passivo prestou-os, dizendo [citando-se o PA, a página 236 e 237]:
B – Factos não provados
Não se surpreendem outros factos, de entre os alegados, essenciais para o objeto do litígio, provados ou não provados.
C- Motivação
O quadro factual supra é o que foi possível desenhar, considerando o teor dos articulados das partes e os documentos juntos e não impugnados, bem como o processo administrativo instrutor.
Adiante-se que, conforme adiante se assinalará, os factos apurados tornam duvidosa a existência ou prova dos factos tributários ora impugnados.
III - FUNDAMENTAÇÃO (Cont.)
O Direito
Vem pedida a declaração de ilegalidade e a consequente anulação do ato de liquidação tributária, em sede de liquidação adicional de IRC, relativa ao ano de 2019, tendo por objeto a “demonstração de acerto de contas”, num total de 95 436,00 €, assim discriminado:
Assinale-se preliminarmente que, conforme tem sido assinalado pela jurisprudência, [cf, v. g., Acórdão do STA de 14-3-2018, no Proc nº 0716/13/2ª Secção], é entendimento pacífico e corrente que o Tribunal não tem de apreciar ou conhecer todos os argumentos ou considerações que as partes tenham produzido. Isto porque uma coisa são as questões submetidas ao tribunal e outra são os argumentos que se usam na sua defesa. Sendo que só têm dignidade de questões as pretensões processuais formuladas pelas partes ao tribunal e não os argumentos por elas usados em defesa das mesmas, não estando assim o tribunal vinculado a apreciar todos os argumentos utilizados pelas partes
Por outro lado, o contencioso tributário, quer seja no CAAD, quer seja num tribunal estadual tributário, é um contencioso de mera anulação.
O que significa que o Tribunal se limita a declarar a anulação ou não do ato tributário, podendo, por razões de praticabilidade, assumir uma componente condenatória [Neste sentido, leia-se na decisão do STA de 16-12-2020, proferida no âmbito do processo nº 0545/13.2BEVIS: “Tem razão a Recorrente quando afirma a natureza meramente anulatória do processo de impugnação judicial (É certo que o legislador entendeu permitir que, em sede de impugnação judicial, o juiz profira condenação da AT ao pagamento dos juros indemnizatórios [cf. art. 43.º da Lei Geral Tributária (LGT)] e ao pagamento de indemnização por prestação indevida de garantia (cf. art. 53.º da LGT e 171.º do CPPT). No entanto, essa possibilidade – justificada por razões eminentemente pragmáticas – situa-se para além do âmbito da apreciação da validade do ato impugnado].
Ou seja, a impugnação judicial (ou a pronúncia arbitral) visa, para além da declaração de nulidade ou de inexistência, hipóteses de que ora não cuidamos, a anulação, total ou parcial, do ato ou atos impugnados, geralmente de liquidações.
Assim, na procedência da impugnação, os atos de liquidação serão anulados, em parte ou totalmente, na medida em que a ilegalidade que determina essa anulação se repercuta sobre a totalidade ou parte desses atos.
Descendo ao caso destes autos:
Compulsado o PPA, a Resposta e as alegações apresentadas pelas partes, resulta ser essencialmente a seguinte a questão a decidir: se existe fundamento legal válido para, em resultado da ação de inspeção levada a cabo pelos Serviços de Inspeção Tributária (SIT) da Direção de Finanças de ..., terem sido efetuadas correções, em sede de IRC, mais especificamente, a correção ao resultado tributável declarado pela reclamante e consequentemente ao lucro tributável apurado, em resultado de a valorização dos ativos biológicos de produção utilizada, com efeito no reconhecimento de gastos em 2019, não ser corretamente efetuada e de acordo com os preceitos legais do CIRC sobre a matéria.
Vejamos:
Em resultado do que se conseguiu apurar e foi alegado, contabilisticamente, a Requerente aplica a Norma Contabilística e de Relato Financeiro para as Pequenas Entidades – NCRF-PE e a NCRF-17 – Agricultura que, no seu nº. 37, distingue os ativos biológicos consumíveis dos ativos biológicos de produção, considerados estes como não sendo produto agrícola, mas, antes, de regeneração própria, aliás, também, no entendimento técnico-contabilístico, quanto às galinhas poedeiras, que as considera como tal, porquanto o seu principal destino e função consiste na produção de ovos – até ao máximo de 60-64 semanas, sendo que terminada a fase de postura, as galinhas são para abate -,presumindo-se, deste modo, que a venda das galinhas apenas se verifica após esgotada a respetiva vida útil na função para a qual foram adquiridas – a produção de ovos -, afastando-se, assim, a hipótese de serem classificadas como ativos biológicos consumíveis.
Assinala a AT que a liquidação ora reclamada, tem na sua base a mensuração utilizada pela reclamante, relativamente aos ativos biológicos, sendo as correções ali propostas circunscritas àquela matéria, referentes ao critério de mensuração utilizado pela reclamante e à sua relevância contabilística e fiscal, tendo os SIT verificado que, comparando com o período anterior e períodos posteriores a 2019, as margens e/ou rentabilidades registaram quedas acentuadas.
Ora a Requerente, tal como nos exercícios anteriores e posteriores, considerou ser o justo valor pouco fiável e como tal impraticável, tento adotado como critério de mensuração dos seus ativos biológicos o custo, sendo este determinado em função dos critérios previstos para a mensuração inicial dos inventários e ativos fixos tangíveis, conforme parágrafo 20.11 da NCRF-PE.
Ou seja e conforme está demonstrado, a Requerente utiliza como critério de mensuração daqueles ativos biológicos de produção o custo de aquisição, que mantém, desde a sua constituição, porque não é possível determinar com fiabilidade o “justo valor” desses ativos biológicos.
A AT aceita ou, pelo menos, não discorda deste critério, conforme se vê no Relatório da Inspeção Tributária (RIT), pág 82, que se transcreve no que ora interessa:
Daqui resulta, no que respeita ao critério de mensuração pelo custo de aquisição, a confirmação dos princípios da continuidade, da consistência e da periodização económica consignado no nº. 1 do artigo 18º do CIRC e ainda da observância do princípio da indispensabilidade dos gastos, no âmbito do escopo societário da Requerente.
Assinale-se que, à luz do disposto no artigo 27º-1, do CIRC, (...) os critérios adotados para a mensuração dos inventários devem ser uniformemente seguidos nos sucessivos períodos de tributação (...)"(sublinhado nosso)
Princípio ou regra que não se evidencia, pelo menos, ter sido respeitada pela Requerida quando indeferindo a reclamação graciosa apresentada pela Requerente, procede às ora sindicadas liquidações adicionais.
Na verdade, parece defender a AT, sem clara fundamentação e sem evidenciar, pelo menos, a não violação da regra prevista no citado artigo 27º, do CIRC, que a correção efetuada pelos seus Serviços de Inspeção, quanto à valorização dos inventários de produção, em 2019, deverá ser corrigida pelo aumento do valor de 381 977,85 €, conforme quadro extraído do RIT, passando, a variação dos inventários de produção de 286 732,58 € para 668 710,43 € [668 710,43 – 286 732,58 = 381 977,85].
Extrai-se do RIT que, à data de 31-12-2018 e de 31-12-2019, o valor dos ativos biológicos a essas datas existentes era de, respetivamente:
-
2018 – 1 202 658,08 €
-
2019 – 1 489 390,66 €,
valores estes que constam do Balanço da Requerente em 31 de Dezembro de 2019 e que a requerida transpôs, em modelo reduzido, para o RIT – Cfr página 10.
A decomposição dos Inventários de Produção, a 31-12-2018 e 31-12-2019 é a seguinte:
de onde resultam os seguintes custos médios ponderados, os quais se mostram consistentes e sem variações que justifiquem qualquer correção, pois um custo médio de 6,15 €, em 2919, só difere do custo médio, em 2018, de apenas – 7,5%, o que pode ter origem em fatores que nada tenham a ver com o critério de valorização dos ativos biológicos, mas antes na maior salubridade dos bandos, por exemplo.
Assim é que, o valor da variação da produção, em 2019, é o dado pelo quadro a seguir, ou seja, 286 732,58 €.
A decomposição dos Inventários de Produção, a 31-12-2018 e 31-12-2019 é a seguinte:
te:
A análise, que a Requerida AT promoveu, no âmbito da ação de inspeção decidida ao abrigo da Ordem de Serviço OI2022... e consubstanciada no Relatório de inspeção de 1 de Agosto de 2024, foi dirigida aos lotes NT1808R, NT1909R, NT1810R e NT1811C, com o fundamento de que “(…), no final do período de 2019, os lotes NT1908R e 1810R não apresentam qualquer valorização, o lote NT1809R não consta e a valorização do Lote NT1811C assinala um decréscimo do custo unitário dos ativos biológicos de produção”. conforme consta do RIT, a página 228, que se transcreve:
Ora desta análise resulta que os serviços tributários verificaram que o bando NT1809R foi totalmente vendido, em 2019, conforme fatura A-889, de 30-4-2019, pelo que deixa de poder constar no inventário dos “Activos Biológicos de Produção”, em 2019.
E, quanto ao Lote 1808R, este foi na sua quase totalidade, também, vendido em 2019, restando dele 1 785 galinhas, que por ultrapassarem o período que as possa considerar como ativos biológicos de produção, não poderão ser contabilizadas no inventário de ativos biológicos e por isso, em conformidade, não podem, como tal, ser valorizadas, ou seja, o seu valor, enquanto ativos biológicos, é 0,00 €.
No que se refere o Lote NT1810R, a Requerente, nos esclarecimentos que prestou, admite que houve um lapso, porquanto, tendo esse lote, a 31-12-2019, 57 semanas deveria ser valorado pela importância de 24 521,11 €, como, aliás, consta da nota de rodapé nº. 3 da página 228 do RIT.
Quanto ao Lote NT1811R, valorado pela Requerente a 2,28 € por unidade, a Requerida, dizendo apenas que regista um decréscimo do custo unitário, não logrou demonstrar ou fundamentar que a valorização desse Lote, seguindo o critério coerente de mensuração utilizado pela Requerente, deveria ser outra.
Assim é que, dos três Lotes em questão, a sua valorização é a que consta do quadro a seguir, pelo que a variação nos inventários de produção, em 2019, apenas terá um acréscimo de 24 521,11 €, dado pela revalorização do Lote NT1810R, já que o Lote NT1811C já estava valorizado – 37 011,00 €.
Por isso é que a correção a que deve proceder-se, na variação dos Activos Biológicos, apenas deverá ser a que consta do quadro a seguir, ou seja, € 311 253,69 €.
O que fará com que o Resultado Líquido da Requerente, em 2019, seja de 94 909,27 €, como se explicita:
|
|
|
|
Por sua vez, no Ponto V.1.2.2 - ENQUADRAMENTO EM TERMOS FISCAIS – CIRC do seu Relatório, a página 84 do RIT [Processo Administrativo], a AT convoca o disposto na alínea a) do nº. 1 e 2 do artigo 46º CIRC, que se refere ao conceito de mais e menos valias.
Ora não se vislumbra, nem a AT o fundamenta, porque importou para o seu Relatório o conceito de mais-valia, pois, no caso presente, não se se compreende que haja qualquer transmissão de ativos biológicos não consumíveis que possam gerar mais-valias ou menos valias, já que as galinhas, depois do seu período de postura, são desconsideradas como ativos biológicos por terem esgotado a sua função de incubação [Postura de Ovos] e são vendidas como sub-produto, como carne, e por um valor residual.
Daqui resulta que o enquadramento que a Requerida AT fez constar no seu Relatório de Inspeção padece de erro, por falta de fundamentação ou pressupostos de facto e de direito, no que respeita aos gastos que levaram à correção do valor da variação nos inventários de produção no montante que a AT corrigiu, id est, 381 977,85 €.
Assinale-se que, de todo o modo, sempre, no limite, se poderia concluir pelas dúvidas sobre as razões de facto e de direito que conduziram a Requerida à correção do lucro tributável da Requerente e às consequentes liquidações adicionais.
O que permite trazer à colação o disposto no artigo 100º, do CPPT, quando dispõe que “(...) sempre que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, deverá o ato impugnado ser anulado (...)”
Ora, tal como se deixou assinalado supra quando se fixou o quadro factual, a matéria de facto apurada não é de molde a que seja retirada uma conclusão segura sobre os fundamentos para a correção determinada em resultado do Relatório da Inspeção Tributária (RIT).
Ou seja: ocorre dúvida relevante sobre a existência e quantificação dos factos tributários que subjazem à correção determinada pela AT e ora objeto de impugnação e, daí, em razão de fundadas dúvidas sobre a existência e/ou quantificação do facto tributário traduzido nas liquidações adicionais sindicadas. Estas deverão ser anuladas.
Ou, noutra perspetiva: podendo concluir-se, com toda a segurança, que o enquadramento que a requerida AT fez constar no seu Relatório de inspeção padece de erro, as suas conclusões e o despacho que nelas se fundamenta, não poderão vingar e, por isso e também pela falta de fundamentação, essas conclusões, no que respeita aos gastos que levaram à correção do valor da variação nos inventários de produção no montante que a AT corrigiu, id est, 381 977,85 €, não poderão ser consideradas, por vicio de erro, quanto aos pressupostos e de falta de fundamentação.
Assim é que, considerando o lapso da Requerente assinalado supra [no que se refere o Lote NT1810R, a Requerente, nos esclarecimentos que prestou, admite que houve um lapso, porquanto, tendo esse lote, a 31-12-2019, 57 semanas deveria ser valorado pela importância de 24 521,11 €, como, aliás, consta da nota de rodapé nº. 3 da página 228 do RIT], traduzir-se-á nas percentagens de decaimento das partes e, concretamente, 8,55%, a Requerente e 91,45%, a Requerida [quociente da variação dos inventários de produção corrigidos e o valor que a Requerente levou à IES, subtraído de 100%, ou seja, [(311 253,69/286 732,58) -1 = 8,55%].
IV – DECISÃO
Termos em que este Tribunal Arbitral Coletivo decide, na procedência do pedido e nos termos expostos supra:
-
Anular parcialmente o ato de indeferimento da reclamação graciosa;
-
Anular parcialmente as liquidações adicionais, no valor total de nºs 2020..., no valor de € 56.223,42; 2023..., no valor de € 29.721,60; 2023..., no valor de € 3.341,84 e 2023..., no valor de € 6149,14 e
-
Condenar ambas as partes no pagamento das custas, na proporção de 8,55% a Requerente e 91,45% a Requerida.
V – Valor do processo
Em conformidade com o disposto no artigo 306, n.º 2 do CPC, no artigo 97-A, n.º 1, al. a) do CPPT [« 1- Os valores atendíveis, para efeitos de custas ou outros previstos na lei, para as ações que decorram nos tribunais tributários, são os seguintes: a) Quando seja impugnada a liquidação, o da importância cuja anulação se pretende (...)]», e no artigo 3, n.º 2 do Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária [«O valor da causa é determinado nos termos do artigo 97.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário»], fixa-se o valor do processo em € 95.436,00, sem contestação pela Autoridade Tributária.
VII – Custas
Nos termos do disposto nos artigos 12, n.º 2 e 22, n.º 4 do RJAT, no artigo 4, n.º 4 e na Tabela I (anexa) do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, o montante de custas é fixado em € 2.754,00, a pagar pelas partes na proporção de 8,55% pela Requerente e 91,45% pela Requerida
Lisboa, 20 de março de 2025
O Tribunal Arbitral Coletivo,
José Poças Falcão
(Presidente do Tribunal Arbitral)
Manuel da Fonseca Benfeito
(Árbitro Adjunto)
Alexandra Iglésias
(Árbitra Adjunta)
|
|