Processo n.º 616/2014-T
Decisão Arbitral
CAAD: Arbitragem Tributária
Processo n.º 616/2014 – T
Tema: IUC (Imposto Único de Circulação), Incidência subjetiva, presunção legal, meios de prova, valor probatório de facturas
O Tribunal Arbitral Colectivo, presidido pelo Exmo. Senhor Doutor Juiz José Poças Falcão, e pelos árbitros Exmo. Senhor Professor Doutor Miguel Patrício e pelo Exmo. Senhor Dr. Paulino Brilhante Santos, designados pelo Exmo. Senhor Presidente do Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) e constituído em 09 de Outubro de 2014 (despacho do Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD de 09 de Outubro de 2014), transmite o seguinte:
RELATÓRIO
1. A... – ...– Sociedade Aberta (A...), pessoa colectiva e contribuinte com o n.º ..., com sede na Avenida ... Lisboa (doravante designada por Requerente), tendo sido notificada das liquidações de Imposto Único de Circulação (“IUC”), referentes aos anos de 2009 a 2012 e respectivos juros compensatórios, no valor global de €104.597,19, apresentou, em 08 de Agosto de 2014, pedido de constituição de tribunal arbitral e de pronúncia arbitral, nos termos do disposto no n.º 2 do art. 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, daqui em diante designado por “RJAT”).
2. No pedido de constituição do Tribunal Arbitral, a Requerente pretende que o referido Tribunal Arbitral aprecie a pretensão de declaração de ilegalidade de identificados actos tributários de liquidação, relativamente a 2009, 2010, 2011 e 2012, do Imposto Único de Circulação (IUC) e respectivos juros compensatórios efectuados pela Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante identificada como Autoridade Requerida).
3. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral Singular foi aceite pelo Excelentíssimo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, tendo as Partes sido notificadas em 11 de Agosto de 2014.
4. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º2 do artigo 6.º e na alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT com a redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, os signatários foram designados pelo Excelentíssimo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD para integrar o presente Tribunal Arbitral Colectivo, tendo a nomeação sido aceite nos termos legalmente previstos e as Partes notificadas dessa designação em 29 de Setembro de 2014.
5. Em 10 de Outubro de 2014, a Autoridade Requerida apresentou a sua Resposta.
6. Tendo as Partes sido notificadas do despacho arbitral proferido de acordo com o disposto no artigo 18º do RJAT, por entenderem que se encontravam juntos aos autos todos os elementos necessários para se decidir de facto e de direito, as Partes optaram por dispensar a primeira reunião, bem como prescindiram de realizar alegações orais.
7. A Requerente sustentou, em síntese, o seu pedido da seguinte forma:
7.1 A ora Requerente é a concessionária do serviço postal universal, precisando, para o desempenho da sua actividade, de manter ao seu serviço uma frota de veículos automóveis sujeita a renovação periódica;
7.2 Os actos tributários de liquidação de IUC e respectivos juros compensatórios, ora em causa, respeitam aos anos de 2009 a 2012 e incidem sobre viaturas automóveis que tinham sido propriedade da Requerente, mas que foram vendidas em datas anteriores à da exigibilidade do imposto;
7.3 Dado que a presente acção tem por objecto várias centenas de veículos automóveis e de liquidações tributárias reclamadas referentes a quatro anos, a Requerente elaborou para efeitos deste processo, um quadro com uma listagem das matrículas de todas as viaturas em questão, números de facturas e IUC’s correspondentes, entregue com a sua petição inicial, como Documento 1, para o qual a presente Decisão remete;
7.4 Declara a ora Requerente que vendeu à B... – Locação ..., S.A., os veículos com os números de ordem 1 a 719 do referido quadro antes do início de 2009;
7.5 Declara igualmente a Requerente ter vendido à C..., ..., Lda. os veículos com os números de ordem 720 a 767 do referido quadro no ponto 1.3 antes do início de 2009;
7.6 E declara ter vendido as restantes viaturas, referidas no quadro entregue na sua Petição Inicial como Doc.1, com os números de ordem 768 a 800, a outras entidades;
7.7 Concluindo que “todas as referidas vendas concretizaram-se com a A... a entregar efectiva e imediatamente os veículos automóveis e respectiva documentação, a emitir as facturas, a receber os preços correspondentes e a dar quitação, cumprindo todas as obrigações fiscais, tendo, na sequência destas vendas, os veículos automóveis vendidos sido abatidos ao imobilizado do activo fixo tangível da A..., com o devido registo e documentação contabilísticos para efeitos fiscais”;
7.8 Sublinha a Requerente que “estão em causa na presente acção arbitral liquidações de IUC referentes aos anos de 2009, 2010, 2011 e 2012, sendo que, como demonstrado, a Requerente, concluíra os contratos de venda de todos os veículos automóveis que deram causa a tais liquidações bem antes do início do ano de 2009”;
7.9 Razão pela qual a Requerente, não sendo proprietária de tais viaturas automóveis naqueles anos a que respeitaram as referidas liquidações, já não era então sujeito passivo de IUC, conforme o citado art. 3.º, n.º 1, do Código do Imposto Único de Circulação”;
7.10 Alega a Requerente que o disposto neste art. 3.º, n.º 1, do Código do Imposto Único de Circulação constitui-se numa mera presunção legal ilidível, mediante prova em contrário, de que a informação do registo automóvel corresponde ao efectivo proprietário do veículo automóvel”;
7.11 Referindo que, em consonância com o artº 350º, nº 2, do Código Civil, o artº 73º da Lei Geral Tributária estatui que “As presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário”;
7.12 E referindo ainda que, em matéria de incidência tributária, vigoram as regras e princípios gerais da interpretação e aplicação das leis, conforme o artº 11º, nº 1, da Lei Geral Tributária;
7.13 Para além do referido elemento literal, a Requerente refere o elemento histórico do “imposto sobre veículos” alegando que este elemento “sempre revelou uma presunção de tributação dos efectivos proprietários e o elemento racional/teleológico inerente ao princípio da equivalência – consagrado logo no artº 1º do Código do Imposto Único de Circulação – só com tal presunção de propriedade é compatível”;
7.14 E, em termos sistemáticos, é inequívoco no Direito que a transmissão da propriedade se opera por mero efeito da conclusão do contrato, sem prejuízo dos requisitos de forma em cada caso exigidos ou dispensados;
7.15 Considera a Requerente que o registo obrigatório, como acontece com o direito de propriedade dos veículos automóveis, tem efeitos meramente declarativos, isto é, não tem efeitos constitutivos do direito de propriedade;
7.16 Referindo para tal o artº 1º, nº 1, do Decreto-Lei nº 54/75, de 12 de Fevereiro, em consonância com o artº 27º, nº 2, do mesmo diploma, que estatui que “O registo de veículos tem essencialmente por fim dar publicidade à situação jurídica dos veículos a motor e respectivos reboques, tendo em vista a segurança do comércio jurídico”, sendo que o artº 7º do Código do Registo Predial (aplicável ao registo automóvel ex vi do artº 29º daquele diploma), estatui que “(…) o registo definitivo constitui [mera] presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito.”;
7.17 E, embora os factos sujeitos a registo só produzam efeitos contra terceiros depois da data do respectivo registo, conforme o artº 5º, nº 1, do Código do Registo Predial, considera a Requerente que esta disposição não vale para a posição sub judice da Administração Tributária, já que esta não se encontra aqui na situação prevista na disposição do nº 4 daquele mesmo artigo;
7.18 Afirma a Requerente que “todos os referidos contratos pelos quais a A... vendeu os veículos automóveis sub judice são contratos existentes, concluídos, válidos e plenamente eficazes, cuja prova pode ser feita por qualquer meio admitido em Direito; e por mero efeito desses contratos de compra e venda se operou, pois, independentemente do registo de aquisição, a transferência da propriedade de tais veículos para os respectivos adquirentes”;
7.19 E que os referidos adquirentes não actualizaram, como deviam, o registo da sua propriedade, mas que “o não cumprimento de tal obrigação de registo não afecta, de forma alguma, a validade da transmissão da propriedade dos veículos automóveis operada por mero efeito dos contratos de compra e venda concluídos”;
7.20 Neste seguimento, alega a Requerente que “todos os elementos da interpretação jurídica – o literal, o histórico, o racional/teleológico e o sistemático – convergem, pois, inequivocamente, na imposição da argumentação jurídica que conclui por que aquele citado art. 3.º, n.º 1, do Código do Imposto Único de Circulação prevê uma presunção (considerando-se como tais), e uma presunção ilidível (juris tantum) mediante prova em contrário”;
7.21 Para reforçar a sua posição, refere a Requerente as decisões arbitrais de 19 de Julho de 2013, no processo n.º 26/2013-T, de 10 de Setembro de 2013, no processo n.º 27/2013-T, de 15 de Outubro de 2013, no processo n.º 14/2013-T, e de 5 de Dezembro de 2013, no processo n.º 73/2013-T;
7.22 Mais alega a Requerente que todos os documentos probatórios apresentados no presente processo, gozam da presunção de veracidade e de boa-fé que lhes é conferida pelo art. 75.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária e são perfeitamente idóneos e suficientes para ilidir a presunção do art. 3.º, n.º 1, do Código do Imposto Único de Circulação”;
7.23 Concluindo que “nos períodos sobre que incidem as liquidações de IUC sub judice – 2009, 2010, 2011 e 2012 – a ora Requerente já não era comprovadamente a proprietária de todos os veículos automóveis que deram causa a tais liquidações, razão por que já não era sujeito passivo do imposto, nos termos do art. 3.º. n.º 1, do Código do Imposto Único de Circulação, devendo, em consequência, os actos tributários das mesmas liquidações ser declarados ilegais, anulados e revogados, com reembolso das quantias pagas de imposto e de juros compensatórios na decorrência destes actos”;
7.24 Por fim a Requerente peticiona pela anulação e revogação dos identificados actos tributários de liquidação de IUC sub judice, por invalidade dos mesmos resultante da sua ilegalidade, com a consequente anulação e revogação dos indeferimentos das reclamações graciosas interpostas destes actos tributários e pelo reembolso das quantias pagas de imposto e de juros compensatórios na decorrência da prolação desses mesmos actos tributários, no montante global de €104.597,19, deduzido dos juros compensatórios de que a A... se viu dispensada e, por fim, pelo reembolso dos montantes pagos a título de custas e de demais despesas e encargos com o presente processo.
8. Na sua Reposta, a Autoridade Requerida invocou, em síntese, o seguinte:
1. Começa por alegar a Autoridade Requerida que “Do conjunto das liquidações pagas pela Requerente, as liquidações referentes às viaturas com as matrículas; ... foram dispensadas do pagamento dos juros compensatórios nos termos e para os efeitos no disposto no Art.º 2.º n.º 1 do citado diploma legal”;
2. Pelo que, em caso de procedência do pedido da Requerente “no reembolso das quantias não será incluído os juros compensatórios referentes às 30 viaturas mencionadas”;
3. Alega ainda a Autoridade Requerida que existe excepção por cumulação ilegal de pedidos, uma vez que “no caso vertente não se encontra verificada a existência das mesmas circunstâncias de facto”;
8.4 De acordo com a autoridade Requerida, “ainda que se possa alvitrar que os procedimentos factuais possam ser transversais a todas as liquidações, o que é certo é que estamos perante situações fácticas díspares consubstanciadas em veículos diferentes, com datas de venda diferentes, procedimentos diferentes, vendidos a entidades diferentes e por valores totalmente díspares”;
8.5 Concluindo assim que a cumulação efectuada pela Requerente é ilegal;
8.6 A Autoridade Recorrida “não olvida a existência de jurisprudência firmada no centro de Arbitragem Administrativa relativamente à matéria em apreço, todavia não a acompanha”;
8.7 Sendo certo que, também não existe em Portugal a “figura jurídica do precedente jurídico”;
8.8 Pelo que, tais alegações “não podem de todo proceder, porquanto fazem uma interpretação e aplicação das normas legais subsumíveis ao caso sub judice notoriamente errada”;
8.9 De acordo com a Autoridade Requerida, o entendimento propugnado pela Requerente incorre não só de uma enviesada leitura da letra da lei, como da adoção de uma interpretação que não atende ao elemento sistemático, violando a unidade do regime consagrado em todo o IUC e, mais amplamente, em todo o sistema jurídico-fiscal, e decorre ainda de uma interpretação que ignora a ratio do regime consagrado no artigo em apreço e bem assim, em todo o CIUC;
8.10 Desenvolvendo a sua posição, diz a Autoridade Requerida que o legislador tributário ao estabelecer no artigo 3.º, n.º 1 quem são os sujeitos passivos do IUC, estabeleceu expressa e intencionalmente que estes são os proprietários, considerando-se como tais as pessoas em nome das quais os mesmos se encontram registados;
8.11 Em defesa do seu ponto de vista, refere a Autoridade Requerida que o legislador não usou a expressão “presumem-se”, como poderia ter feito e que o normativo fiscal está repleto de previsões análogas à consagrada na parte final do n.º 1 do artigo 3.º, em que o legislador fiscal expressa e intencionalmente consagra o que deve considerar-se legalmente para efeitos de incidência, de rendimento, de isenção, de determinação e de periodização do lucro tributável, para efeitos de residência, de localização, entre muitos outros;
8.12 Como exemplo, entre outros, refere o artigo 2.º do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT) em que o legislador tributário não presume que “há lugar a transmissão onerosa para efeitos do n.º 1 do artigo referido, na outorga de contrato-promessa de aquisição e alienação de bens imóveis em que seja clausulado no contrato ou posteriormente que o promitente adquirente pode ceder a sua posição contratual” a terceiro. Neste caso, o legislador expressa e intencionalmente assimila este contrato a uma transmissão onerosa de bens para efeitos de IMT;
8.13 Refere também o artigo 17.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC) em que o legislador também não estabelece que os excedentes líquidos das cooperativas se presumem como resultado líquido do período, mas sim que estes se consideram como tal;
8.14 Acrescenta que grande parte das normas de incidência em sede de IRC, têm como ratio subjacente, determinar o que deve ser considerado como rendimento para efeitos deste imposto, pelo que, se se entendesse que ao usar a expressão “considera-se” o legislador fiscal teria consagrado uma presunção, praticamente todas as normas de incidência em sede de IRC seriam afastadas porque a contabilidade prescreve soluções diferentes das do CIRC, sendo exatamente o fim do legislador afastar as regras contabilísticas;
8.15 Em sequência, conclui a Autoridade Requerida que no caso dos presentes autos de pronúncia arbitral, o legislador estabeleceu expressa e intencionalmente que se consideram como proprietários, ou nas situações previstas no n.º 2, as pessoas em nome dos quais os veículos se encontram registados por ser a interpretação que preserva a unidade do sistema jurídico-fiscal. Pelo que entender que o legislador consagrou aí uma presunção seria efetuar uma interpretação contra legem;
8.16 Refere a Autoridade Requerida que esse é o entendimento da jurisprudência fazendo menção a uma decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel que acolheu a posição sufragada pela Autoridade Tributária, determinando que o sujeito passivo do imposto é o proprietário do veículo, considerando-se como tal a pessoa singular ou coletiva em nome da qual o mesmo se encontra registado. A propriedade e a posse efetiva é irrelevante para a verificação da incidência subjectiva e objectiva e do facto gerador do imposto. A falta de registo em nome do novo adquirente faz com que a incidência subjetiva do IUC se mantenha no titular do direito de propriedade inscrito na Conservatória do Registo Automóvel e seja o responsável pela liquidação e pagamento do IUC, independentemente da sua alienação efetiva;
8.17 Refere ainda que, se a Requerente pretende reagir contra a presunção de propriedade que lhe é atribuída, então forçosamente terá de reagir pelos meios próprios previstos no Regulamento do Registo Automóvel e nas leis registais subsidiariamente aplicáveis e contra o próprio teor do registo automóvel, mas não é pela impugnação das liquidações de IUC que se ilide a informação registal;
8.18 Por outro lado, apelando ao elemento sistemático, entende a Autoridade Requerida que a solução propugnada pela Requerente é intolerável não encontrando qualquer apoio na lei. Isto porque, no mesmo sentido do que dispõe o n.º 1 do artigo 3.º do CIUC, estabelece o artigo 6.º do CIUC, sob a epígrafe “Facto Gerador e Exigibilidade”, no seu n.º 1, que “O facto gerador do imposto é constituído pela propriedade do veículo, tal como atestada pela matrícula ou registo em território nacional”;
8.19 Ou seja, o momento a partir do qual se constituí a obrigação de imposto, apresenta uma relação direta com a emissão do certificado de matrícula, no qual devem constar os factos sujeitos a registo (artigos 4.º, n.º 2 e 6.º n.º 3, ambos do CIUC, artigo 10.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 54/75, de 12 de Fevereiro e artigo 42.º do Regulamento do Registo de Automóveis). No mesmo sentido, milita a solução legislativa adoptada pelo legislador fiscal no n.º 2 do artigo 3.º do CIUC, ao fazer coincidir as equiparações aí consagradas com as situações em que o registo automóvel obriga ao respectivo registo;
8.20 Sustenta ainda a Autoridade Requerida que tal posição está patente na circunstância de o Registo Automóvel a que a Administração Tributária tem ou pode ter acesso, e o certificado no qual devem constar os actos sujeitos a registo, cuja exibição poderá ser exigida pela mesma Administração ao interessado, conterem todos os elementos destinados à determinação do sujeito passivo, sem necessidade de acesso aos contratos de natureza particular que conferem tais direitos, enunciados pelo CIUC como constitutivos da situação jurídica de sujeito passivo deste imposto;
8.21 Alega que na falta de tal registo, terá de ser o proprietário notificado para cumprir a correspondente obrigação fiscal, pois a Autoridade Tributária, tendo em conta a actual configuração do Sistema Jurídico, não terá de proceder à liquidação do Imposto com base em elementos que não constem de registos e documentos públicos e, como tal, autênticos. Assim sendo, a não actualização do registo, nos termos do artigo 42.º do Regulamento do Registo de Automóveis, será imputável na esfera jurídica do Sujeito Passivo do IUC e não na do Estado, enquanto sujeito activo deste imposto;
8.22 Concluí a Autoridade Requerida alegando que o CIUC procedeu a uma reforma do regime de tributação dos veículos em Portugal, alterando de forma substancial o regime de tributação automóvel, passando os sujeitos passivos do imposto a ser os proprietários constantes do registo de propriedade, independentemente da circulação dos veículos na via pública. Ou seja, apesar de uma das ratio subjacentes à reforma da tributação automóvel ser a preocupação ambiental, o legislador pretendeu criar um IUC assente na tributação do proprietário, independentemente da circulação dos veículos;
8.23 Neste seguimento, alega a Autoridade Requerida que os actos tributários em crise não enfermam de qualquer vício de violação de lei, na medida em que, à luz do artigo 3.º, n.ºs 1 e 2, do CIUC e do artigo 6.º do mesmo Código, era a Requerente, na qualidade de proprietária, o sujeito passivo do IUC;
8.24 Para além da fundamentação exposta, considera a Autoridade Requerida ser de referir que a interpretação veiculada pela Requerente se mostra contrária à Constituição, defendendo que o propalado princípio da capacidade contributiva não é o único nem o principal principio fundamental que enforma o sistema fiscal e que ao lado deste princípio encontramos outros com a mesma dignidade constitucional, como sejam o princípio da confiança e segurança jurídica, o princípio da eficiência do sistema tributário e o princípio da proporcionalidade;
8.25 Considera a Autoridade Requerida que se impõe, por isso, que na interpretação do artigo 3.º do CIUC o princípio da capacidade contributiva seja articulado ou temperado com aqueles princípios;
8.26 Concluindo que “a interpretação proposta pela Requerente, uma interpretação que no fundo desvaloriza a realidade registal em detrimento de uma “realidade informal” e insusceptível de um controlo mínimo por parte da Requerida, é ofensiva do basilar princípio de confiança e segurança jurídica que deve enformar qualquer relação jurídica, aqui se incluindo a relação tributária”;
8.27 Não obstante a Autoridade Tributária considerar que o artigo 3.º do CIUC não estabelece qualquer presunção, a Autoridade Requerida alega que a Requerente pretende contrariar a prova legal plena constituída pelo registo mediante a apresentação de facturas que são documentos que não são aptos a comprovar a celebração de um contrato sinalagmático, como a compra e venda, uma vez que não comprovam a aceitação por parte do adquirente;
8.28 Alega a Autoridade Requerida que existem muitos casos de emissão de facturas referentes a transmissões de bens e/ou prestações de serviços que nunca ocorreram;
8.29 Defende que uma factura unilateralmente emitida pela Requerente não pode substituir o requerimento de registo automóvel, documento este aprovado por modelo oficial;
8.30 No entendimento da Autoridade Requerida, a Requerente deveria ter apresentado cópias do referido modelo oficial para registo de propriedade automóvel pois trata-se de documento assinado por ambas as partes intervenientes;
8.31 Neste sentido, a Autoridade Requerida apoia-se em várias decisões arbitrais (Processos n.ºs 63/2014-T, 150/2014-T e 220/2014-T) que consideram as facturas documentos particulares unilaterais e internos, com um valor probatório muito limitado insuficiente para ilidir a presunção sobre a titularidade da propriedade de veículos;
8.32 Por último, e fazendo referência à responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais e do pagamento de juros indemnizatórios, refere a Autoridade Requerida que o IUC visa tributar o proprietário do automóvel revelado através do seu registo;
8.33 Afirma a Autoridade Requerida que o Requerente não procedeu com o zelo que lhe era exigível relativamente à actualização do registo automóvel, como podia e competia nos termos do artigo 5.º, n.º 1 do Decreto-Lei 54/75, de 12 de Fevereiro e artigo 118º, n.º 4 do Código da Estrada, e não tendo mandado cancelar as matrículas dos veículos em questão em momento muito anterior àquele em que o fez;
8.34 Afirma ainda que a Autoridade Requerida limitou-se a dar cumprimento às obrigações legais a que está adstrita e a seguir a informação registal que lhe foi fornecida por quem de direito;
8.35 Considerando assim a Autoridade Requerida que foi a Requerente que deu azo à dedução do pedido de pronúncia arbitral, pelo que “Consequentemente, deverá a Requerente ser condenada ao pagamento das custas arbitrais decorrentes do presente pedido de pronúncia arbitral, nos termos do artigo 527.º/1 do Novo Código de Processo Civil ex vi do artigo 29.º/1-e) do RJAT, em linha, aliás, com questão similar decidida no âmbito processo que, sob o n.º 72/2013-T, correu termos neste centro de arbitragem”;
8.36 A Requerida requereu, por último, “a dispensa da produção de prova testemunhal, porquanto a inquirição de testemunhas constituirá um ato manifestamente inútil, quer em face da prova produzida nos autos, quer ainda em face da jurisprudência arbitral firmada sobre a temática em apreço por esse Centro Arbitral”;
8.37 Conclui, assim, a AT que “a excepção invocada [deverá] proceder, absolvendo-se a Requerida da instância [e,] caso assim não se entenda, deverá ser julgado improcedente o presente pedido de pronúncia arbitral, mantendo-se na ordem jurídica os actos tributários de liquidação impugnados e absolvendo-se em conformidade a entidade Requerida do pedido.”
SANEADOR
O Tribunal é competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º e 6.º, todos do RJAT.
As Partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e do artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.
Não se verificam nulidades que atinjam todo o processo, pelo que se impõe agora, conhecer do mérito do pedido, tanto mais que ambas as partes prescindiram por escrito da primeira reunião do Tribunal Arbitral e também de ulteriores alegações orais.
Importa apenas conhecer da questão prévia suscitada pela Autoridade Requerida relativamente à alegadamente ilegal cumulação de pedidos pela Requerente.
Questão prévia suscitada pela AT: Cumulação (i)legal de pedidos
A este respeito, o Tribunal considera que a cumulação de pedidos não é, ao invés do que alegou a AT, ilegal, dado que, à luz do artigo 3.º, n.º 1, do RJAT, a cumulação é admissível quando a procedência dos pedidos dependa, essencialmente, da apreciação das mesmas circunstâncias de facto e da interpretação e aplicação das mesmas regras ou princípios de direito – mesmo que os pedidos digam respeito a “diferentes atos”.
A identidade, quanto ao circunstancialismo de facto e de direito, entre os vários pedidos, é evidente – o que é, indiretamente, admitido pela própria AT, no ponto 10.º da sua resposta. Contudo, a AT alega que, embora os “procedimentos factuais [possam ser] transversais a todas as liquidações”, estaríamos “perante situações fácticas díspares consubstanciadas em veículos diferentes, com datas de venda diferentes, procedimentos diferentes, vendidos a entidades diferentes e por valores díspares”. E estas seriam as razões pelas quais a cumulação não deveria ser atendida.
Verifica-se, contudo, que as razões invocadas não procedem, dado que, como se pode observar pela jurisprudência arbitral tributária do CAAD para casos idênticos, não é pelo facto de os “veículos [serem] diferentes”, ou terem “datas de venda diferentes”, ou serem “vendidos a entidades diferentes e por valores díspares”, que a mencionada identidade deixa de se verificar.
Acresce que, a entender-se de outro modo, tal impediria, nestes casos e de forma quase automática, a cumulação prevista no referido art. 3.º, n.º 1, do RJAT, dada a (mais que) provável possibilidade – que também se confirma no caso em análise –, de, perante o mesmo circunstancialismo de facto e de direito, os veículos dos vários pedidos serem “diferentes”, terem “datas de venda diferentes” e serem “vendidos a entidades diferentes e por valores díspares [até porque são veículos «diferentes»]”.
Pelo supra exposto, conclui-se que, atendendo à identidade dos factos tributários, do tribunal competente para a decisão e dos fundamentos de facto e de direito invocados para a apreciação e decisão, nada obsta, face ao disposto no art. 104.º do CPPT e no art. 3.º, n.º 1, do RJAT, à cumulação em causa.
Considerando o elevado número de viaturas, bem como o volume de documentação necessário para comprovar os factos alegados, a Requerente, invocando o princípio da economia processual, requereu a apreciação conjunta dos actos tributários em causa.
Considerada a identidade do facto tributário, do tribunal arbitral competente para a decisão e dos fundamentos de facto e de direito invocados, nada obsta, face ao disposto nos artigos 104.º do CPPT e 3.º do RJAT à pretendida cumulação de pedidos.
OBJECTO DA PRONÚNCIA ARBITRAL
Vêm colocadas ao Tribunal as seguintes questões nos termos atrás descritos:
.1. A norma de incidência subjetiva constante do artigo 3.º do CIUC consagra uma presunção de propriedade ilidível?
.2. Entendendo que a referida norma consagra uma presunção ilidível, os documentos apresentados pela Requerente constituem elementos de prova bastantes para ilidir a supra mencionada presunção legal?
MATÉRIA DE FACTO
Para provar os factos alegados, a Requerente apresentou os seguintes documentos:
15.1 Quadro com uma listagem das matrículas de todas as viaturas em questão, números de facturas e IUC’s correspondentes (Doc. 1);
15.2 Reclamação Graciosa datada de 06 de Março de 2014 (Doc. 2);
15.3 Reclamação Graciosa datada de 07 de Março de 2014 (Doc. 3);
15.4 Despacho do Serviço de Finanças de Lisboa … datado de 12 de Março de 2014 (Doc. 4);
15.5 Despachos do Serviço de Finanças de Lisboa … a indeferir as reclamações graciosas (Docs. 5 a 17);
15.6 Contrato de compra e venda, aluguer, manutenção e administração de automóveis celebrado entre a Requerente e a B... – Locação …, S.A. (Doc. 18);
15.7 Fotocópias de facturas relativas aos veículos automóveis vendidos à B... – …, S.A. (Docs. 19 a 30);
15.8 Fotocópias de facturas relativas aos veículos automóveis vendidos à C... – …, Lda (Docs. 31 a 58);
15.9 Documentos vários referentes à compra e venda das viaturas entre a Requerente e a C... – …, Lda (Docs. 59 a 88);
15.10 Fotocópias de facturas relativas aos veículos vendidos a outras entidades (Docs. 89 a 109);
15.11 Fotocópias de recibos relativos aos veículos automóveis vendidos à B... – …, S.A. (Docs. 110 a 117);
15.12 Fotocópias de recibos relativos aos veículos automóveis vendidos à C... – …, Lda (Docs. 118 a 145);
15.13 Fotocópias de recibos relativos aos veículos vendidos a outras entidades (Docs. 146 a 166);
15.14 Fotocópias das notas de liquidação objecto do presente pedido (Docs. 167 a 966).
A Autoridade Recorrida não juntou qualquer prova.
Consideram-se provados os seguintes factos com relevância para a decisão arbitral a proferir, com base na prova documental junta aos autos:
.1. A Requerente é a concessionária do serviço postal universal, precisando, para o desempenho da sua actividade, de manter ao seu serviço uma frota de veículos automóveis sujeita a renovação periódica;
.2. Os actos tributários de liquidação de IUC e respectivos juros compensatórios, ora em causa, respeitam aos anos de 2009 a 2012 e incidem sobre viaturas automóveis que tinham sido propriedade da Requerente (Doc. 1), mas que foram vendidas em data anterior ao início do ano de 2009, com excepção da viatura identificada com o número de ordem 800 (Doc. 1), a qual foi vendida em 8/3/2010, data também anterior à da exigibilidade do imposto.
.3. A Requerente vendeu à B... –, S.A.:
· os veículos com os números de ordem 1 a 257, como se comprova pela factura n.º …, de 30.11.2005 (doc. 19);
· os veículos com os números de ordem 258 a 287, como se comprova pela factura n.º …, de 15.12.2005 (doc. 20);
· os veículos com os números de ordem 288 a 446, como se comprova pela factura n.º …, de 31.12.2005 (doc. 21);
· os veículos com os números de ordem 447 a 558, como se comprova pela factura n.º …, de 28.01.2006 (doc. 22);
· os veículos com os números de ordem 559 a 569, como se comprova pela factura n.º …, de 31.07.2006 (doc. 23);
· o veículo com o número de ordem 570, como se comprova pela factura n.º …, de 16.08.2006 (doc. 24);
· os veículos com os números de ordem 571 e 572, como se comprova pela factura n.º …, de 30.04.2007 (doc. 25);
· os veículos com os números de ordem 573 a 575, como se comprova pela factura n.º …, de 30.04.2007 (doc. 26);
· os veículos com os números de ordem 576 a 682, como se comprova pela factura n.º …, de 31.05.2007 (doc. 27);
· os veículos com os números de ordem 683 a 687, como se comprova pela factura n.º …, de 15.10.2007 (doc. 28);
· os veículos com os números de ordem 688 a 718, como se comprova pela factura n.º …, de 31.12.2007 (doc. 29);
· o veículo com o número de ordem 719, como se comprova pela factura n.º …, de 13.11.2008 (doc. 30)
.4. A Requerente vendeu à C..., , Lda.:
· os veículos com os números de ordem 720 a 723, como se comprova pela factura n.º …, de 23.06.2005 (doc. 31);
· o veículo com o número de ordem 724, como se comprova pela factura n.º …, de 11.07.2005 (doc. 32);
· os veículos com os números de ordem 725 e 726, como se comprova pela factura n.º …, de 27.07.2005 (doc. 33);
· os veículos com os números de ordem 727 a 729, como se comprova pela factura n.º …, de 12/12/2006 (doc. 34);
· os veículos com os números de ordem 730 a 733, como se comprova pela factura n.º …, de 29.12.2005 (doc. 35);
· o veículo com o número de ordem 734, como se comprova pela factura n.º …, de 31.12.2005 (doc. 36);
· os veículos com os números de ordem 735 e 736, como se comprova pela factura n.º …, de 10.03.2006 (doc. 37);
· o veículo com o número de ordem 737, como se comprova pela factura n.º …, de 21.03.2006 (doc. 38);
· o veículo com o número de ordem 738, como se comprova pela factura n.º …, de 22.05.2006 (doc. 39);
· o veículo com o número de ordem 739, como se comprova pela factura n.º …, de 19.10.2006 (doc. 40);
· o veículo com o número de ordem 740, como se comprova pela factura n.º …, de 13.12.2006 (doc. 41);
· o veículo com o número de ordem 741, como se comprova pela factura n.º …, de 13.12.2006 (doc. 42);
· os veículos com os números de ordem 742 e 743, como se comprova pela factura n.º …, de 29.12.2006 (doc. 43);
· os veículos com os números de ordem 744 e 745, como se comprova pela factura n.º …, de 31.12.2007 (doc. 44);
· o veículo com o número de ordem 746, como se comprova pela factura n.º …, de 12.07.2007 (doc. 45);
· os veículos com os números de ordem 747 e 748, como se comprova pela factura n.º …, de 31.07.2007 (doc. 46);
· o veículo com o número de ordem 749, como se comprova pela factura n.º …, de 31.07.2007 (doc. 47);
· o veículo com o número de ordem 750, como se comprova pela factura n.º …, de 31.07.2007 (doc. 48);
· os veículos com os números de ordem 751 e 752, como se comprova pela factura n.º …, de 31.07.2007 (doc. 49);
· os veículos com os números de ordem 753 a 756, como se comprova pela factura n.º …, de 13.09.2007 (doc. 50);
· os veículos com os números de ordem 757 e 758, como se comprova pela factura n.º …, de 14.09.2007 (doc. 51);
· o veículo com o número de ordem 759, como se comprova pela factura n.º …, de 14.09.2007 (doc. 52);
· o veículo com o número de ordem 760, como se comprova pela factura n.º …, de 25.09.2007 (doc. 53);
· os veículos com os números de ordem 761 e 762, como se comprova pela factura n.º …, de 25.09.2007 (doc. 54);
· o veículo com o número de ordem 763, como se comprova pela factura n.º …, de 22.10.2007 (doc. 55);
· o veículo com o número de ordem 764, como se comprova pela factura n.º …, de 30.10.2007 (doc. 56);
· os veículos com os números de ordem 765 e 766, como se comprova pela factura n.º …, de 30.10.2007 (doc. 57);
· o veículo com o número de ordem 767, como se comprova pela factura n.º …, de 23.11.2007 (doc. 58).
.5. A Requerente vendeu a outras entidades os veículos que surgem mencionados nas alíneas a) a u) do ponto 19.º da petição da requerente (e que, dada a sua extensão, aqui se consideram reproduzidas), estando tais vendas documentadas por facturas datadas que constam do doc. 1 apenso aos autos, com os números de ordem 768 a 800 (Docs. 89 a 109).
.6. Todos os veículos foram vendidos em data anterior à da exigibilidade do imposto (Docs. 1 e 19 a 58 e 89 a 109).
.7. A requerente reclamou dos supra referidos actos tributários em duas reclamações cumulando dois grupos de pedidos (Docs. 2 e 3).
.8. As referidas reclamações foram subdivididas, por razões de ordem informática pela AT em 13 processos de reclamação (Doc. 4).
.9. Todos os processos de reclamação foram indeferidos pela AT (Docs. 5 a 17).
.10.A Requerente procedeu ao pagamento do imposto e juros compensatórios em causa (com excepção dos juros em 30 casos - identificados a cor de laranja - no doc. 1, ao abrigo do regime excepcional de regularização de dívidas fiscais aprovado pelo Decreto-Lei n.º 151-A/2013, de 31/10) (Docs. 167 a 966).
Entende o Tribunal Arbitral que as facturas emitidas de acordo com a legislação comercial e fiscal, constituem meio de prova com força bastante para ilidir a presunção do artigo 3.º do CIUC.
Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afetar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importa registar como não provados.
O DIREITO
A questão essencial decidenda traduz-se, em síntese em saber se, na data da ocorrência dos factos geradores do imposto [artigo 3º-1, do CIUC[1]], os proprietários dos veículos não forem os que constam do registo, serão apesar disso estes (os que constam do registo) que serão sempre considerados os sujeitos passivos do IUC, não sendo por consequência ilidível a presunção de titularidade revelada pelo registo OU, dito doutro modo, se a norma de incidência subjetiva constante do artigo 3º nº 1 do CIUC, estabelece ou não uma presunção.
Estas questões foram já, no essencial, abordadas em diversas decisões do CAAD, algums delas já publicadas em www.caad.org.pt e outras em vias de publicação [Cfr., v. g., decisões proferidas nos processos nºs 14/2013, 26/2013, 27/2013, 73/2013, 170/2013, 294/2013 e 154/2014] e não se antolham razões para inverter o alterar o sentido essencial desta Jurisprudência.
Vejamos então:
Dispõe o artigo 3º do CIUC (Código do Imposto único de Circulação):
“Artigo 3º
Incidência subjetiva
1 – São sujeitos passivos do imposto os proprietários dos veículos, considerando-se como tais as pessoas singulares ou colectivas, de direito público ou privado, em nome das quais os mesmos se encontrem registados.
2 – São equiparados a proprietários os locatários financeiros, os adquirentes com reserva de propriedade, bem como outros titulares de direitos de opção de compra por força do contrato de locação”.
Estabelece, por seu lado, o nº1 do artigo 11º da LGT que “na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam, são observadas as regras e princípios gerais da interpretação e aplicação das leis”.
Resolver as dúvidas que se suscitem na aplicação de normas jurídicas pressupõe a realização de uma atividade interpretativa.
Há assim que ponderar qual a melhor interpretação[2] do art. 3º, nº 1 do CIUC, à luz, em primeiro lugar, do elemento literal, ou seja aquele em que se visa detetar o pensamento legislativo que se encontra objetivado na norma, para se verificar se a mesma contempla uma presunção, ou se determina, em definitivo, que o sujeito passivo do imposto é o proprietário que figura no registo.
A questão que se coloca é, no caso sub juditio, a de saber se a expressão “considerando-se” utilizada pelo legislador no CIUC, em vez da expressão “presumindo-se”, que era a que constava nos diplomas que antecederam o CIUC, terá retirado a natureza de presunção ao dispositivo legal em apreço.
A nosso ver e ao contrário do que defende doutamente a AT, a resposta tem necessariamente de ser negativa, uma vez que da análise do nosso ordenamento jurídico se retira de forma clara que as duas expressões têm sido utilizadas pelo legislador com sentido equivalente, seja ao nível de presunções ilidíveis, seja no quadro das presunções inilidíveis, pelo que nada habilita a extrair a conclusão pretendida pela Autoridade Tributária por uma mera razão semântica.
Na verdade, assim acontece em variadas normas legais que consagram presunções utilizando o verbo “considerar”, de que se indicam, meramente a título de exemplo, as seguintes:
~ no âmbito do direito civil - o nº 3 do art. 243º do Código Civil, quando estabelece que “considera-se sempre de má-fé o terceiro que adquiriu o direito posteriormente ao registo da ação de simulação, quando a este haja lugar”;
~ também no âmbito do direito da propriedade industrial o mesmo se passa, quando o art. 59º, nº 1 do Código da Propriedade Industrial dispõe que “(…)as invenções cuja patente tenha sido pedida durante o ano seguinte à data em que o inventor deixar a empresa, consideram-se feitas durante a execução do contrato de trabalho (…)”;
~ e, por último, no âmbito do direito tributário, quando os nºs 3 e 4 do art. 89-A da LGT dispõem que incumbe ao contribuinte o ónus da prova que os rendimentos declarados correspondem à realidade e que, não sendo feita essa prova, presume-se (“considera-se” na letra da Lei) que os rendimentos são os que resultam da tabela que consta no nº 4 do referido artigo.
Esta conclusão de haver total equivalência de significados entre as duas expressões, que o legislador utiliza indiferentemente, satisfaz a condição estabelecida no art. 9º, nº 2 do Código Civil, uma vez que se encontra assegurado o mínimo de correspondência verbal para efeitos da determinação do pensamento legislativo.
Importa, de seguida, submeter a norma em apreço aos demais elementos de interpretação lógica, designadamente, o elemento histórico, o racional ou teleológico e o de ordem sistemática.
Dissertando sobre a atividade interpretativa diz FRANCESCO FERRARA que esta “é a operação mais difícil e delicada a que o jurista pode dedicar-se, e reclama fino trato, senso apurado, intuição feliz, muita experiência e domínio perfeito não só do material positivo, como também do espírito de uma certa legislação. (…) A interpretação deve ser objetiva, equilibrada, sem paixão, arrojada por vezes, mas não revolucionária, aguda, mas sempre respeitadora da lei” (Cfr. Ensaio sobre a Teoria da Interpretação das Leis, tradução de MANUEL DE ANDRADE, (2ª ed.), Arménio Amado, Editor, Coimbra, 1963, p. 129).
Como refere BAPTISTA MACHADO “a disposição legal apresenta-se ao jurista como um enunciado linguístico, como um conjunto de palavras que constituem um texto. Interpretar consiste evidentemente em retirar desse texto um determinado sentido ou conteúdo de pensamento.
O texto comporta múltiplos sentidos (polissemia do texto) e contém com frequência expressões ambíguas ou obscuras. Mesmo quando aparentemente claro à primeira leitura, a sua aplicação aos casos concretos da vida faz muitas vezes surgir dificuldades de interpretação insuspeitadas e imprevisíveis. Além de que, embora aparentemente claro na sua expressão verbal e portador de um só sentido, há ainda que contar com a possibilidade de a expressão verbal ter atraiçoado o pensamento legislativo – fenómeno mais frequente do que parecerá à primeira vista “ (Cfr. Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, pp.175/176).
“A finalidade da interpretação é determinar o sentido objetivo da lei, a vis potestas legis.(…) A lei não é o que o legislador quis ou quis exprimir, mas tão somente aquilo que ele exprimiu em forma de lei. (…) Por outro lado, o comando legal tem um valor autónomo que pode não coincidir com a vontade dos artífices e redatores da lei, e pode levar a consequências inesperadas e imprevistas para os legisladores. (…) O intérprete deve buscar não aquilo que o legislador quis, mas aquilo que na lei aparece objetivamente querido: a mens legis e não a mens legislatoris (Cfr. FRANCESCO FERRARA,Ensaio, pp. 134/135).
Entender uma lei “não é somente aferrar de modo mecânico o sentido aparente e imediato que resulta da conexão verbal; é indagar com profundeza o pensamento legislativo, descer da superfície verbal ao conceito íntimo que o texto encerra e desenvolvê-lo em todas as suas direções possíveis”(loc. cit., p.128).
Com o objetivo de desvendar o verdadeiro sentido e alcance dos textos legais, o intérprete lança mão dos fatores interpretativos que são essencialmente o elemento gramatical (o texto, ou a “letra da lei”) e o elemento lógico, o qual, por sua vez, se subdivide em elemento racional (ou teleológico), elemento sistemático e elemento histórico. (Cfr. BAPTISTA MACHADO, loc. Cit., p. 181; J.OLIVEIRA ASCENSÃO, O Direito – Introdução e Teoria Geral 2ª Ed., Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, p.361).
Entre nós, é o artigo 9º do Código Civil (CC) que fornece as regras e os elementos fundamentais à interpretação correta e adequada das normas.
O texto do nº 1 do artigo 9º do CC começa por dizer que a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dela o “pensamento legislativo”.
Sobre a expressão “pensamento legislativo” diz-nos BAPTISTA MACHADO que o artigo 9º do CC “não tomou posição na controvérsia entre a doutrina subjetivista e a doutrina objetivista. Comprova-o o facto de se não referir, nem à “vontade do legislador” nem à “vontade da lei”, mas apontar antes como escopo da atividade interpretativa a descoberta do “pensamento legislativo” (artº. 9º, 1º). Esta expressão, propositadamente incolor, significa exatamente que o legislador não se quis comprometer” (loc. cit., p. 188).
No mesmo sentido se pronunciam PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA em anotação ao artigo 9º do CC (Cfr. Código Civil Anotado – vol. I, Coimbra ed., 1967, p. 16).
E sobre o nº 3 do artigo 9º do CC refere aquele autor: “ este nº 3 propõe-nos, portanto, um modelo de legislador ideal que consagrou as soluções mais acertadas (mais corretas, justas ou razoáveis) e sabe exprimir-se por forma correta. Este modelo reveste-se claramente de características objetivistas, pois não se toma para ponto de referência o legislador concreto (tantas vezes incorreto, precipitado, infeliz) mas um legislador abstrato: sábio, previdente, racional e justo” (loc. cit. p. 189/190).
Logo a seguir este insigne Professor chama a atenção de que o nº 1 do artigo 9º, refere mais três elementos de interpretação a “ unidade do sistema jurídico”, as “circunstâncias em que a lei foi elaborada” e as “condições específicas do tempo em que é aplicada” (loc. cit, p. 190).
Quanto às “circunstâncias do tempo em que a lei foi elaborada”, explica BAPTISTA MACHADO que esta expressão “representa aquilo a que tradicionalmente se chama a occasio legis: os fatores conjunturais de ordem política, social e económica que determinaram ou motivaram a medida legislativa em causa” (loc. cit., p.190).
Relativamente às “condições específicas do tempo em que é aplicada” diz este autor que este elemento de interpretação “tem decididamente uma conotação atualista (loc. cit., p. 190) no que coincide com a opinião expressa por PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA nas anotações ao artigo 9º do CC.
No que respeita à “unidade do sistema jurídico” BAPTISTA MACHADO considera este o fator interpretativo mais importante: “a sua consideração como fator decisivo ser-nos-ia sempre imposta pelo princípio da coerência valorativa ou axiológica da ordem jurídica” (loc. cit., p. 191).
É também este autor que nos diz, relativamente ao elemento literal ou gramatical (texto ou “letra da lei”) que este “é o ponto de partida da interpretação. Como tal, cabe-lhe desde logo uma função negativa: a de eliminar aqueles sentidos que não tenham qualquer apoio, ou pelo menos uma qualquer correspondência ou ressonância nas palavras da lei.
Mas cabe-lhe igualmente uma função positiva, nos seguintes termos: se o texto comporta apenas um sentido, é esse o sentido da norma – com a ressalva, porém, de se poder concluir com base noutras normas que a redação do texto atraiçoou o pensamento do legislador” (loc. cit., p. 182).
Referindo-se ao elemento racional ou teleológico, diz este autor que ele consiste “na razão de ser da lei (ratio legis), no fim visado pelo legislador ao elaborar a norma. O conhecimento deste fim, sobretudo quando acompanhado do conhecimento das circunstâncias (políticas, sociais, económicas, morais, etc.,) em que a norma foi elaborada ou da conjuntura política-económica-social que motivou a decisão legislativa (occasio legis) constitui um subsídio da maior importância para determinar o sentido da norma. Basta lembrar que o esclarecimento da ratio legis nos revela a valoração ou ponderação dos diversos interesses que a norma regula e, portanto, o peso relativo desses interesses, a opção entre eles traduzida pela solução que a norma exprime” (loc. cit., pp. 182/183).
É ainda BAPTISTA MACHADO que nos diz, agora no que respeita ao elemento sistemático (contexto da lei e lugares paralelos) que “este elemento compreende a consideração das outras disposições que formam o complexo normativo do instituto em que se integra a norma interpretanda, isto é, que regulam a mesma matéria (contexto da lei), assim como a consideração de disposições legais que regulam problemas normativos paralelos ou institutos afins (lugares paralelos).Compreende ainda o lugar sistemático que compete à norma interpretanda no ordenamento global, assim como a sua consonância com o espírito ou unidade intrínseca de todo o ordenamento jurídico.
Baseia-se este subsídio interpretativo no postulado da coerência intrínseca do ordenamento, designadamente no facto de que as normas contidas numa codificação obedecem por princípio a um pensamento unitário” (loc.cit., p. 183).
Como ensina JOSEF KOHLER, citado por MANUEL DE ANDRADE “(…) Em particular havemos de tomar em consideração o encandeamento das diversas leis do país, porque uma exigência fundamental de toda a sã legislação é que as leis se ajustem umas às outras e não redundem em congérie de disposições desconexas (Ensaio, p. 27).
Descendo ao caso dos autos:
Através da análise do elemento histórico, extrai-se a conclusão que, desde a entrada em vigor do Decreto-Lei 59/72, de 30 de Dezembro, o primeiro a regular esta matéria, até ao Decreto-Lei nº 116/94, de 3 de Maio, o último a anteceder o CIUC [cfr Lei nº 22-A/2007, com as alterações da Lei 67-A/2007 e 3-B/2010], foi consagrada a presunção [grifado nosso] dos sujeitos passivos do IUC serem as pessoas em nome das quais os veículos se encontravam matriculados à data da sua liquidação.
Verifica-se, portanto, que a lei fiscal teve, desde sempre, o objetivo de tributar o verdadeiro e efetivo proprietário (ou locatário, em caso de locação financeira e ALD) e utilizador do veículo, afigurando-se indiferente a utilização de uma ou outra expressão que, como vimos, têm na nossa ordem jurídica um sentido coincidente.
O mesmo se diga quando nos socorremos dos elementos de interpretação de natureza racional ou teleológica.
Com efeito, o atual e novo quadro da tributação automóvel consagra princípios que visam sujeitar os proprietários dos veículos a suportarem os prejuízos por danos viários e ambientais causados por estes, como se alcança do teor do art. 1º do CIUC.
Ora a consideração destes princípios, designadamente, o princípio da equivalência, que merecem tutela constitucional e consagração no direito comunitário, e são também reconhecidos em outros ramos do ordenamento jurídico, determina que os aludidos custos sejam suportados pelos reais proprietários, os causadores dos referidos danos, o que afasta, de todo, uma interpretação que visasse impedir os presumíveis proprietários de fazer prova de que já não o são por a propriedade estar na esfera jurídica de outrem[3].
Assim, também, da interpretação efetuada à luz dos elementos de natureza racional e teleológica, atento aquilo que a racionalidade do sistema garante e os fins visados pelo novo CIUC, resulta claro que o nº 1 do art. 3º do CIUC consagra uma presunção legal ilidível.
Em face do exposto, importa concluir que a ratio legis do imposto aponta no sentido de serem tributados os efetivos proprietários-utilizadores dos veículos pelo que a expressão “considerando-se” está usada no normativo em apreço num sentido semelhante a “presumindo-se”, razão pela qual dúvidas não há que está consagrada uma presunção legal.
Por outro lado, estabelece o art. 73º da LGT que “(…) as presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário, pelo que são ilidíveis (…)”.
Assim sendo, consagrando o art. 3º, nº 1 do CIUC uma presunção juris tantum [e, portanto, ilidível], a pessoa que está inscrita no registo como proprietária do veículo e que, por essa razão foi considerada pela Autoridade Tributária como sujeito passivo do imposto, pode apresentar elementos de prova visando demonstrar que o titular da propriedade, na data do facto tributário, é outra pessoa, para quem a propriedade foi transferida.
Analisados os elementos carreados para o processo pela Requerente e os factos provados, extrai-se a conclusão que aquela não era a proprietária dos veículos a que respeitam as liquidações em apreço à data dos respetivos factos tributários, por, entretanto, já ter transferido a propriedade dos mesmos, nos termos da lei civil.
As operações de transmissão de propriedade não foram impugnadas e são oponíveis à Autoridade Tributária e Aduaneira, porquanto, embora os factos sujeitos a registo só produzam efeitos em relação a terceiros quando registados, face ao disposto no art. 5º, nº 1 do Código do Registo Predial [aplicável por remissão do Código do Registo Automóvel], a Autoridade Tributária não é terceiro para efeitos de registo, uma vez que não se encontra na situação prevista no nº 2 do referido art. 5º do Código do Registo Predial, aplicável por força do Código do Registo Automóvel, ou seja: não adquiriu de um autor comum direitos incompatíveis entre si.
Subsumindo:
No caso dos autos, comprovou-se que a requerente não era a real titular do direito de propriedade dos veículos aquando das liquidações.
Ou seja: logrou ilidir a presunção de titularidade e, como tal, não era ou poderia ser o sujeito passivo do imposto.
Nestas circunstâncias, as mencionadas e ora impugnadas liquidações enfermam de ilegalidade e devem ser anuladas e, consequentemente restituídas à Requerente, pela Autoridade Tributária e Aduaneira, as respetivas importâncias assim indevidamente cobradas e retratadas nos mencionados e documentados atos de liquidação, conforme pedido.
III – DECISÃO
De harmonia com o exposto, decide este Tribunal Arbitral, julgar, totalmente procedentes os pedidos de anulação das liquidações de IUC sob impugnação e, em consequência, anula esses atos tributários e condena a Autoridade Tributária e Aduaneira na restituição à requerente dos respetivos valores pagos conforme pedido.
Valor do processo
De harmonia com o disposto no art. 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 104.597,19
Custas
Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 3.060 (três mil e sessenta euros), nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Lisboa e CAAD, 30-3-2015
O Tribunal Arbitral,
José Poças Falcão
(Presidente)
Miguel Patrício
(árbitro vogal)
Paulino Brilhante Santos
(árbitro vogal)
[1] Acrónimo de Código do Imposto Único de Circulação.
[2] A génese da relação jurídica de imposto pressupõe a verificação cumulativa dos três pressupostos necessários ao seu surgimento, a saber: o elemento real, o elemento pessoal e o elemento temporal. (Neste sentido veja-se, entre muitos outros autores, Freitas Pereira, M. H., Fiscalidade, 3ª Edição, Almedina, Coimbra, 2009).
[3] Sob a epígrafe “princípio da equivalência” estabelece o artigo 1º do CIUC: “O imposto único de circulação obedece ao princípio da equivalência, procurando onerar os contribuintes na medida do custo ambiental e viário que estes provocam, em concretização de uma regra geral de igualdade tributária”.
Sobre a noção do princípio da equivalência diz-nos SÉRGIO VASQUES: “Em obediência ao princípio da equivalência, o imposto deve ser conformado em atenção ao benefício que o contribuinte retira da actividade pública, ou em atenção ao custo que imputa à comunidade pela sua própria actividade”(Cfr. Os Impostos Especiais de Consumo, Almedina, 2000, p. 110).
E, mais à frente, explica este Professor, relativamente aos automóveis: “um imposto sobre os automóveis assente numa regra de equivalência será igual apenas se aqueles que provoquem o mesmo desgaste viário e o mesmo custo ambiental paguem o mesmo imposto; e aqueles que provoquem desgaste e custo ambiental diverso, paguem imposto diverso também.