Sumário
-
A Contribuição de Serviço Rodoviário reveste a natureza de um imposto sobre combustíveis, pelo que sob essa qualificação os tribunais arbitrais têm competência para apreciar os correspondentes atos de liquidação.
-
A Requerente não é o sujeito passivo da CSR, nem repercutido legal deste imposto. Assim, a sua legitimidade é aferida pela qualidade de mera repercutida de facto, circunstância em que sobre si recai o ónus de demonstrar um interesse legalmente protegido, como se extrai do cotejo dos artigos 9.º, n.º 1 do CPPT, 18.º, n.º 4, alínea a) e 65.º da LGT.
-
Esse interesse há-de corresponder à circunstância de ter suportado, do ponto de vista económico, o imposto [CSR] liquidado, pela AT, ao sujeito passivo fornecedor dos combustíveis.
-
Não tendo ficado provado que a Requerente foi repercutida, falece-lhe legitimidade para pedir a anulação das respetivas liquidações e o reembolso do imposto.
-
Não se suscitam questões de interpretação do direito da União Europeia, pois a conclusão da ilegitimidade processual por falta de demonstração do atributo subjetivo necessário para estar em juízo – ser sujeito da relação de direito tributário controvertida – retira-se das normas processuais, cuja conformação se insere na esfera de competência dos Estados-Membros. Por outro lado, não se constata que este regime viole os princípios da efetividade e da equivalência, pois não se verifica a denegação de um direito decorrente do efeito direto do artigo 1.º, n.º 2 da Diretiva 2008/118/CE (ou da dificuldade da sua efetivação), mas a falta de demonstração da necessária relação subjetiva da Requerente com (a titularidade d)esse direito.
-
A solução preconizada enquadra-se numa interpretação conforme à Constituição (v. artigos 20.º, n.º 1 e 268.º, n.º 4), porquanto o direito à impugnação dos atos lesivos não pode deixar de reportar-se aos sujeitos cuja esfera jurídico-patrimonial sofreu a lesão (os lesados) e não a outros, que não dispõem, nesse âmbito, de um direito legalmente protegido.
DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros designados para formarem o Tribunal Arbitral Coletivo, constituído em 14 de outubro de 2024, Alexandra Coelho Martins (presidente), Maria do Rosário Anjos e Pedro Miguel Bastos Rosado, acordam no seguinte:
-
Relatório
A..., Unipessoal, Lda., adiante “Requerente”, com o número de matrícula e de pessoa coletiva ... e sede na Rua ..., n.º ... e ..., ...-... ..., Oeiras, na sequência da formação da presunção de indeferimento do pedido de revisão oficiosa relativo a liquidações de Contribuição de Serviço Rodoviário (“CSR”), apresentou, em 2 de agosto de 2024, pedido de constituição de Tribunal Arbitral e de pronúncia arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 3.º-A, n.º 2 e 10.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, todos do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro.
É demandada a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante identificada por “AT” ou Requerida.
A Requerente peticiona a declaração de “ilegalidade dos atos de repercussão da CSR consubstanciados nas faturas referentes ao gasóleo rodoviário, à gasolina e ao GPL auto adquiridos pela Requerente no decurso do período compreendido entre dezembro de 2019 e dezembro de 2022, e, bem assim, das correspondentes liquidações de CSR praticadas pela Administração Tributária e Aduaneira”, com o consequente reembolso das quantias suportadas a esse título, de € 318.272,83, acrescidas de juros indemnizatórios contados desde a data dos pagamentos indevidos, nos termos previstos no artigo 43.º, n.º 3, alínea d) da Lei Geral Tributária (“LGT”).
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite em 6 de agosto de 2024 e, de seguida, notificado à AT.
Por requerimento de 27 de agosto de 2024, a Requerida veio solicitar a identificação dos atos de liquidação objeto do pedido de pronúncia arbitral (“PPA”).
Após nomeação de todos os árbitros, os mesmos comunicaram, em prazo, a aceitação do encargo. O Exmo. Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD informou as Partes, por notificação eletrónica registada no sistema de gestão processual em 24 de setembro de 2024, não tendo sido manifestada oposição.
O Tribunal Arbitral Coletivo ficou constituído em 14 de outubro de 2024.
Em 18 de novembro de 2024, a Requerida apresentou a sua Resposta, com defesa por exceção e por impugnação, e juntou o processo administrativo (“PA”).
Em 5 de dezembro de 2024, a Requerente pronunciou-se por escrito sobre a matéria de exceção suscitada pela Requerida.
Por despacho de 9 de dezembro de 2024, foi dispensada a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, ao abrigo dos princípios da autonomia do Tribunal Arbitral na condução do processo e da celeridade, simplificação e informalidade processuais (v. artigos 16.º, alínea c) e 29.º, n.º 2 do RJAT). As Partes foram notificadas para, querendo, apresentarem alegações simultâneas e para pagarem a taxa arbitral subsequente, tendo sido fixado o prazo para a decisão até à data-limite prevista no artigo 21.º, n.º 1 do RJAT.
Ambas as Partes apresentaram alegações a 9 de janeiro de 2025, nas quais mantiveram as respetivas posições.
Posição da Requerente
A Requerente começa por invocar a desconformidade da CSR, instituída pela Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, ao direito da União Europeia, em concreto à Diretiva 2008/118/CE, de 16 de dezembro de 2008, que fixa o regime geral dos impostos especiais de consumo (“IEC”), pois a criação de IEC não harmonizados, como a CSR, depende da existência de um “motivo específico” válido, condição que, segundo a Requerente, não se encontra preenchida, como foi já declarado pelo Tribunal de Justiça no processo C-460/21, Vapo Atlantic, por Despacho de 7 de fevereiro de 2022, na sequência de reenvio no âmbito do processo arbitral n.º 564/2020-T, ao abrigo do artigo 267.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (“TFUE”).
Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, a afetação do produto da CSR ao financiamento das competências gerais atribuídas à concessionária da rede rodoviária nacional não constitui requisito suficiente para que se identifique a existência de um “motivo específico”, na aceção do artigo 1.º, n.º 2 da citada Diretiva 2008/118.
Para tal, a CSR deveria destinar-se, por si só, a assegurar os objetivos de redução da sinistralidade e de sustentabilidade ambiental.
Acresce que a CSR não se destina exclusivamente ao financiamento de operações que supostamente concorrem para a realização dos dois objetivos mencionados, destina-se, mais amplamente, a assegurar o financiamento da atividade de conceção, projeto, construção, conservação, exploração, requalificação e alargamento da rede rodoviária nacional.
Por outro lado, o legislador português não fixou uma afetação da receita da CSR que comprove que esta tenha sido criada com vista a desmotivar a utilização da rede rodoviária nacional ou dos principais combustíveis rodoviários, nem a sua estrutura foi concebida de modo a dissuadir a utilização daquela rede e a promover comportamentos menos nocivos para o ambiente ou a reduzir os acidentes.
Partindo da antinomia entre a CSR e a Diretiva 2008/118, a Requerente invoca o artigo 8.º, n.º 4 da Constituição e o primado do direito da União Europeia para concluir pela necessária desaplicação do regime da CSR pelos órgãos nacionais, incluindo a AT, a qual retira, de igual modo, do princípio da legalidade e do princípio da cooperação leal dos Estados-Membros com as instituições europeias.
Pugna ainda pela tempestividade do pedido de revisão oficiosa, por entender estar em causa a existência de erro imputável aos serviços, por violação das normas de direito da União Europeia e por vício de inconstitucionalidade, que justifica a aplicação do prazo de 4 anos previsto no artigo 78.º, n.º 1 da LGT, pelo que o pedido de revisão oficiosa e, bem assim, a ação arbitral, são tempestivos.
Em consequência, sustenta serem devidos juros indemnizatórios, ao abrigo do disposto na alínea d) do n.º 3 do artigo 43.º, n.º 1 da LGT e não na alínea c) do mesmo preceito, por se tratar de ilegalidade abstrata dos atos de liquidação, reveladora de um acentuado grau de censura imputável à atuação do Estado, o que ocorre quando a cobrança da prestação tributária se funda em normas declaradas judicialmente inconstitucionais ou ilegais.
Compulsa a este respeito a jurisprudência assente do Tribunal de Justiça, segundo a qual quando um Estado-Membro tenha cobrado impostos em violação do direito da União, os contribuintes têm direito ao reembolso, não apenas do imposto indevidamente cobrado, mas igualmente das quantias pagas a esse Estado ou por este retidas em relação direta com esse imposto. Isso inclui igualmente o prejuízo decorrente da indisponibilidade de quantias de dinheiro, devido à exigibilidade prematura do imposto. Compete a cada Estado-Membro prever as condições em que os juros devem ser pagos. Porém, estas devem respeitar os princípios da equivalência e da efetividade, isto é, não devem ser menos favoráveis do que as condições relativas a reclamações semelhantes baseadas em disposições de direito interno e não podem tornar impossível ou excessivamente difícil a efetivação de um direito decorrente da ordem jurídica europeia.
Posição da Requerida
Por exceção, a Requerida começa por suscitar a incompetência do Tribunal Arbitral em razão da matéria, qualificando a CSR como uma contribuição financeira, enquadrável como uma das “demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas” a que aludem os artigos 165.º, n.º 1, alínea i) da Constituição e 3.º, n.º 2 da LGT, e não como um imposto, concluindo que o seu conhecimento está excluído da arbitragem tributária, pois a vinculação da AT à jurisdição arbitral, operada pela Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, circunscreve-se à apreciação de pretensões relativas a impostos (artigo 2.º da Portaria), não abrangendo outros tributos, como se decidiu em diversos processos arbitrais.
Sustenta ainda não ser necessário discutir a natureza jurídica dos atos de repercussão de CSR, pois estes não estão contemplados na única norma atributiva de competência que consta do artigo 2.º, n.º 1, alínea a) do RJAT. Deste modo, mesmo que se considerasse existir competência para a apreciação da ilegalidade dos atos de liquidação de CSR, nunca poderia este Tribunal pronunciar-se sobre atos de repercussão da CSR, subsequentes e autónomos dos atos de liquidação de CSR, que não são atos tributários e nem sequer correspondem a uma repercussão legal, mas meramente económica ou de facto.
Suscita também a incompetência material deste Tribunal, por entender que a Requerente pretende a apreciação da legalidade, no seu todo, do regime da CSR, fundando-a na alegada desconformidade com o direito da União Europeia, com o intuito de fazer suspender a eficácia desse ato legislativo, o que corresponde à fiscalização da legalidade de normas em abstrato, emanadas da função político-legislativa do Estado, para a qual o Tribunal Arbitral não tem competência, por se inscrever num contencioso de mera anulação. Bem como defende que não pode o Tribunal pronunciar-se sobre a restituição de valores por conta da declaração de ilegalidade e anulação de atos de liquidação, o que só pode ser determinado em sede de execução da decisão (v. artigo 2.º do RJAT).
Afigura-se inconstitucional à Requerida uma interpretação do artigo 2.º do RJAT que nele inclua a apreciação dos pedidos formulados pela Requerente.
De onde conclui que se verifica a exceção dilatória de incompetência do tribunal em razão da matéria, que prejudica o conhecimento do mérito, nos termos vertidos nos artigos 576.º, n.ºs 1 e 2 e 577.º, alínea a) do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicável por via do artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT, com a consequente absolvição da Requerida da instância.
Ainda no domínio das questões prévias, a Requerida invoca diversas exceções, infra enumeradas: ilegitimidade processual e substantiva da Requerente, ineptidão da petição inicial por falta de objeto e por ininteligibilidade do pedido e contradição entre este e a causa de pedir e, por fim, a caducidade do direito de ação.
No tocante à ilegitimidade processual (ativa), salienta que, ao abrigo do disposto no artigo 15.º, n.º 2 do Código dos IEC, aplicável por remissão do artigo 5.º, n.º 1 da Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, que criou a CSR, tal pressuposto apenas assiste aos sujeitos passivos que tenham procedido à introdução no consumo dos produtos em território nacional e provem o pagamento do tributo. Só estes podem solicitar o reembolso do valor pago e pedir a revisão dos atos de liquidação (v. artigos 15.º e 16.º do Código dos IEC).
Para a Requerida, as normas dos artigos 15.º a 20.º do Código dos IEC constituem disposições especiais que, como tal, prevalecem sobre as regras gerais previstas na LGT e no CPPT. A Requerente, na qualidade de adquirente dos produtos, não tem legitimidade para solicitar a revisão do ato tributário e o reembolso da CSR, nem, consequentemente, o pedido arbitral, pois não integra a relação tributária de direito público relativa à liquidação originada pela Declaração de Introdução no Consumo (“DIC”).
Acresce, mesmo que assim não se entendesse, que a Requerente carece igualmente de legitimidade por se encontrar fora do âmbito de aplicação do artigo 18.º, n.º 4, alínea a) da LGT, pois não é “sujeito passivo que suporte o encargo por repercussão legal”, porquanto a repercussão da CSR tem natureza meramente económica ou de facto. Sublinha que o diploma que institui a CSR [a Lei n.º 55/2007] não contempla qualquer mecanismo de repercussão legal.
As faturas exibidas pela Requerente não corporizam atos de repercussão de CSR, apenas titulam operações de compra e venda de combustíveis, que não demonstram que os fornecedores repercutiram à Requerente aquele imposto. Aliás, essas faturas não identificam qualquer montante relativo a CSR, apenas contêm referência ao IVA.
Por outro lado, ainda que a CSR, ou parte dela, tenha sido repassada à Requerente não é esta, necessariamente, quem suporta, a final, o encargo do tributo, pois não é consumidora final e, enquanto operadora económica, em princípio, repassa, no todo ou em parte, os gastos incorridos no preço dos serviços que presta, pelo que as entidades potencialmente lesadas com o encargo da CSR serão os consumidores e não a Requerente.
A Requerida considera também que a declaração junta aos autos subscrita pelo fornecedor de combustíveis, a B..., S.A., não faz prova da repercussão, pois nem sequer discrimina os valores imputados à Requerente, as DIC, ou o momento em que a respetiva liquidação de CSR ocorreu.
Desta forma, conclui que a Requerente não é sujeito passivo de CSR, não integra a relação tributária subjacente à liquidação contestada, não sendo o devedor, nem quem estava obrigado ao seu pagamento ao Estado, está a jusante do sujeito passivo na cadeia económica e, em termos jurídicos, não é um terceiro substituído, não suporta a contribuição por repercussão legal, nem corresponde ao consumidor final.
Assim, carece de legitimidade para apresentar o pedido de revisão oficiosa e, consequentemente, o pedido arbitral (v. artigo 15.º, n.º 2 do Código dos IEC, artigo 9.º, n.º 1 do CPPT e artigo 18.º, n.ºs 3 e 4, alínea a) da LGT), o que consubstancia uma exceção dilatória, nos termos dos artigos 576.º, n.ºs 1 e 2, 577.º, alínea e) e 578.º, todos do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT, que prejudica o conhecimento do mérito da causa e implica a absolvição da Requerida da instância.
Ou, se assim não se entender, deve considerar-se que a Requerente carece de legitimidade substantiva, o que consubstancia uma exceção perentória, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 576.º, n.ºs 1 e 3 e 579.º do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT, devendo a Requerida ser absolvida do pedido.
De seguida, a Requerida argui a ineptidão da petição inicial por duas ordens de razões.
A primeira prende-se com a falta de objeto, em virtude de não terem sido identificados pela Requerente os atos tributários praticados pela AT, nem as DIC submetidas pelo sujeito passivo do imposto. Deste modo, o pedido arbitral não respeita os pressupostos legais de aceitação do requerimento/petição inicial, por violação da alínea b) do n.º 2 do artigo 10.º do RJAT, o que impede que a Requerida exerça em toda a plenitude o contraditório.
Acrescenta que não é possível à AT identificar os atos de liquidação e/ou estabelecer qualquer correlação entre os atos de liquidação praticados pelos sujeitos passivos de CSR, o alegado pela Requerente e os documentos (faturas) juntos aos autos, de onde não constam quaisquer dados que permitam a associação a atos de liquidação. Impossibilidade que não é superável por atuações processuais.
Também defende que nunca seria possível fazer qualquer correspondência entre as quantidades de produtos introduzidos no consumo e as quantidades de produto adquiridas pela Requerente ao seu fornecedor, pois a unidade tributável é de 1000 litros convertidos para a temperatura de referência de 15ºC. Ora, nas vendas subsequentes desses produtos, não é possível fazer tal conversão, o que originará oscilações, em regra quantidades superiores, tendo em conta a temperatura média nacional.
O segundo fundamento de ineptidão respeita à ininteligibilidade do pedido e à contradição entre este e a causa de pedir. Na perspetiva da Requerida, a Requerente formula um pedido de anulação de liquidações que não identifica, através da mera impugnação de alegadas repercussões, sem sequer identificar o nexo entre estas e aquelas. Fá-lo com assento na ideia errada de que vigora para a CSR um regime de repercussão legal e de que, a referida repercussão (meramente económica) pode ser presumida. Daqui decorre uma inultrapassável quebra do nexo causal necessário entre o pedido e a causa de pedir. A causa de pedir é a desconformidade da CSR ao direito da União. Contudo, não podemos inferir da ilegalidade das liquidações a ilegalidade das repercussões.
Pelas razões expostas, considera verificada a exceção de ineptidão do pedido arbitral, por falta de identificação do ato tributário, exigida pelo artigo 10.º, n.º 2, alínea b) do RJAT, e por contradição entre o pedido e a causa de pedir, o que determina a nulidade de todo o processo, conforme disposto nos artigos 186.º, n.º 1 e577.º, alínea b), ambos do CPC, aplicáveis por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.
Por fim, a Requerida invoca a impossibilidade de se aferir em pleno da tempestividade do pedido de revisão oficiosa das liquidações, dada a falta de identificação dos atos de liquidação em causa, uma vez que a contagem do prazo para a apresentação dos pedidos se inicia a partir do termo do prazo de pagamento do imposto, tendo por referência a data do ato de liquidação (global). Todavia, caso assim não se entenda, conclui que, quer o pedido de revisão oficiosa, quer o pedido arbitral, são intempestivos, suscitando a exceção de caducidade do direito de ação.
A este respeito, entende que a Requerente não se pode fazer valer do prazo de 4 anos previsto na segunda parte do artigo 78.º, n.º 1 da LGT, por não se verificar o requisito de erro imputável aos serviços, uma vez que as liquidações de CSR foram efetuadas de acordo com a disciplina legal aplicável e não enfermam de qualquer vício, não tendo sido proferida qualquer decisão que declare com força obrigatória geral o vício de violação de lei comunitária.
Assim, estando em causa aquisições no período compreendido entre dezembro de 2019 e dezembro de 2022, na data de apresentação do pedido de revisão oficiosa, em 27 de dezembro de 2023, há muito estava ultrapassado o prazo de 120 dias para deduzir a reclamação graciosa, previsto na primeira parte do artigo 78.º, n.º 1 da LGT.
Deste modo, conclui que o pedido de revisão oficiosa é extemporâneo e pugna pela intempestividade da ação arbitral deduzida em 2 de agosto de 2024, o que consubstancia uma exceção perentória que determina a absolvição da Requerida do pedido, ou, a título subsidiário, uma exceção dilatória, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 89.º, n.ºs 1, 2 e 4 alínea k) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (“CPTA”), devendo, nessa medida, ser absolvida da instância.
À cautela, alega ainda que, no âmbito dos IEC, os pedidos de reembolso apresentados nas alfândegas devem ser apreciados à luz do disposto nos artigos 15.º a 20.º do Código dos IEC, que prevê o prazo de caducidade de 3 anos. Assim, em 27 de dezembro de 2023, já havia terminado o prazo em relação a todas as aquisições efetuadas pela Requerente em data anterior a 27 de dezembro de 2020.
Por impugnação, a Requerida invoca que a Requerente não provou a alegação de que pagou e suportou integralmente o encargo da CSR por repercussão, ónus que sobre si impendia (v. artigo 74.º da LGT), não se podendo presumir a existência da repercussão económica ou de facto. Por outro lado, exigir que fosse a Requerida a fazer prova de que não houve repercussão (prova de facto negativo) seria inconstitucional por violação dos princípios da proporcionalidade, da tutela jurisdicional efetiva e do processo equitativo, preceituados nos artigos 2.º e 20.º da Constituição, e do direito ao contraditório e à ampla defesa.
Acrescenta que os sujeitos passivos de CSR têm vindo, eles próprios, a impugnar, administrativa e judicialmente, as liquidações de CSR, para o que têm apresentado as DIC e/ou os DUC e/ou comprovativo do pagamento do ISP. Portanto, a admitir-se a condenação da AT à restituição dos montantes que a Requerente alegadamente suportou, a título de CSR, sem a exata identificação dos atos tributários em causa, poderia conduzir ao absurdo de a AT vir a ser, sucessivamente, condenada a pagar os mesmos montantes de CSR, mais de uma vez, a todos os intervenientes no circuito económico, que se veriam indevidamente enriquecidos em claro prejuízo do erário público.
Em relação ao Despacho do Tribunal de Justiça no processo C-460/21, a Requerida sustenta que em momento algum este considera ilegal a CSR.
Afirma que existe um vínculo intrínseco entre o destino da CSR e o motivo específico que levou à sua criação, que se prende com a redução da sinistralidade rodoviária e a sustentabilidade ambiental, ambos distintos de uma finalidade orçamental. Deste modo, a CSR é conforme ao direito da União Europeia, não se constatando erro imputável aos serviços.
Por outro lado, ainda que a repercussão económica viesse a ser provada, de acordo com o Tribunal de Justiça, um Estado-Membro pode opor-se a um pedido de reembolso de um imposto indevido, apresentado pelo comprador sobre quem esse imposto tenha sido repercutido, com o fundamento de não ter sido esse comprador que o pagou às autoridades fiscais, desde que, nos termos do direito interno, esse comprador possa exercer uma ação civil de repetição do indevido.
Em relação ao pedido de juros indemnizatórios, tendo sido apresentado pedido de revisão da liquidação, caso a ação fosse procedente, estes só seriam devidos depois de decorrido um ano após a apresentação do pedido de revisão oficiosa, em conformidade com o disposto no artigo 43.º, n.º 3, alínea c) da LGT.
Conclui pela extinção e absolvição da instância por incompetência do Tribunal Arbitral, e/ou ilegitimidade processual e/ou ineptidão do pedido arbitral, ou, se assim não se entender, pela absolvição do pedido, por verificação da exceção de caducidade do direito de ação, e/ou da exceção de falta de legitimidade substantiva; ou, por fim, caso assim não se entenda, pela improcedência total do pedido, por infundado e não provado.
Posição da Requerente Quanto às Exceções Suscitadas
Relativamente à incompetência, a Requerente pronuncia-se no sentido de que a CSR é um imposto, pelo que cabe na competência material do Tribunal Arbitral.
Sobre a exceção de ilegitimidade, considera inaplicável, por ausência de remissão legal do regime da CSR, o disposto nos artigos 15.º e 16.º do Código dos IEC e propugna o enquadramento da situação em apreço na norma do artigo 18.º, n.º 4, alínea a) da LGT, que reconhece a legitimidade do repercutido legal, categoria na qual se considera abrangida. Interpretação que afirma ter saído reforçada pelo artigo 6.º da Lei n.º 24-E/2022, de 30 de dezembro, que determinou a repercussão no artigo 2.º do Código dos IEC. Aduz que essa legitimidade é também reconhecida pela regra geral do artigo 9.º, n.º 1 do CPPT, segundo o qual a têm quaisquer pessoas que provem interesse legalmente protegido, e resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça.
Sustenta não ser possível obter a restituição da CSR junto as entidades repercutentes por via de uma ação para repetição do indevido e que não ocorre a suscetibilidade de duplicação de reembolsos invocada pela Requerida.
Sobre a matéria da ineptidão, a Requerente afirma que o objeto da ação arbitral são, a título primordial, os atos de repercussão de CSR, tendo, quanto a estes procedido à sua identificação. Quanto às liquidações, também considera tê-las identificado, com os elementos de que dispunha, não lhe sendo exigível outros elementos aos quais não tem qualquer acesso. De outra forma, resultaria violado o princípio da efetividade. Se o Tribunal Arbitral tiver dúvidas a este respeito, deve promover o reenvio prejudicial, nos termos previstos no artigo 267.º do TFUE.
Mais refere que o pedido foi formulado com precisão e clareza e que inexiste contradição entre a causa de pedir e o pedido, pelo que improcede a exceção de ineptidão do pedido arbitral deduzida pela AT.
Sobre a caducidade, reitera a posição do pedido arbitral, no sentido de que é aplicável o prazo de quatro anos, previsto na II parte do n.º 1 do artigo 78.º da LGT, por estarmos perante uma situação de erro imputável aos serviços, e rejeita a aplicação do regime especial vertido nos artigos 15.º e 16.º do Código dos IEC, pelo que considera a ação tempestiva. Caso subsistam dúvidas, reitera o pedido de reenvio prejudicial ao Tribunal de Justiça.
III. Questões a Apreciar
A questão de mérito a decidir respeita à compatibilidade do regime da CSR subjacente aos atos tributários impugnados com o direito da União Europeia, em concreto, com o disposto no artigo 1.º, n.º 2 da Diretiva 2008/118/CE.
No entanto, a Requerida invocou múltiplas exceções, quer dilatórias, quer perentórias, de que o Tribunal deve conhecer a título prévio, logo após a fixação da matéria de facto, a começar pelas dilatórias, pois a sua procedência impede a apreciação do mérito da causa.
-
Fundamentação de Facto
-
Factos Provados
Com relevo para a decisão, importa atender aos seguintes factos:
-
A..., Unipessoal, Lda., aqui Requerente, é uma sociedade com sede e direção efetiva em Portugal – cf. provado por acordo.
-
A B..., S.A. é uma empresa que comercializa combustíveis – cf. faturas juntas como Documento 2.
-
Entre dezembro de 2019 e dezembro de 2022, a Requerente adquiriu à B..., S.A. 2.791.775,48 litros de gasóleo rodoviário, 96.298,47 litros de gasolina e 63,27 kgs de GPL auto – cf. faturas juntas como Documento 2.
-
As faturas que titulam a aquisição do combustível da Requerente à B..., S.A. no período de dezembro de 2019 a dezembro de 2022 não contêm qualquer menção à CSR – cf. faturas juntas como Documento 2.
-
Em 27 de dezembro de 2023, a Requerente apresentou pedido de revisão oficiosa da CSR que alega ter suportado, no montante de € 318.272,83, no período compreendido entre dezembro de 2019 e dezembro de 2022, tendo em vista a anulação das liquidações de CSR e dos consequentes atos de repercussão consubstanciados nas faturas emitidas pela B..., S.A. – cf. Documento 4.
-
Até ao momento, a Requerente não foi notificada de qualquer decisão da AT sobre o referido pedido de revisão oficiosa – provado por acordo.
-
A B..., S.A. emitiu uma declaração nos seguintes termos:
-
“ B..., S.A. […] declara, para os devidos efeitos, que a Contribuição de Serviço Rodoviário por si entregue, na qualidade de sujeito passivo, junto dos cofres do Estado, por referência ao combustível rodoviário fornecido à empresa A... UNIPESSOAL, LDA (NIF:...), nos anos de 2019 a 2022, foi por si integralmente repercutida na esfera da referida empresa.
Pela B..., S.A.
[assinatura manual]...” [sem data] – cf. Documento 3.
-
Em 2 de agosto de 2024, a Requerente apresentou o pedido de constituição do Tribunal Arbitral e de pronúncia arbitral que deu origem à presente ação – cf. registo de entrada do pedido de pronúncia arbitral (“ppa”) no SGP do CAAD.
-
Factos não Provados
Não se provou que a B..., S.A. entregou ao Estado a CSR impugnada nos autos e que repercutiu esse imposto integralmente nas faturas emitidas à Requerente entre dezembro de 2019 e dezembro de 2022, nem que a Requerente suportou a quantia global de € 318.272,83 a título de CSR (v. artigos 4.º, 5.º e 6.º do ppa).
Com relevo para a decisão não existem outros factos que devam considerar-se não provados.
-
Motivação da Decisão da Matéria de Facto
Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, em face das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2 do CPPT, 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT, não tendo o Tribunal que se pronunciar sobre todas as alegações das Partes, mas apenas sobre as questões de facto necessárias para a decisão.
No que se refere aos factos provados, a convicção dos árbitros fundou-se na análise crítica da prova documental junta aos autos, consubstanciada nas faturas de fornecimento de combustível da B..., S.A. à Requerente.
Quanto aos factos não provados, regista-se que não foi carreada qualquer prova documental de que a B..., S.A. pagou a CSR objeto dos autos, quando da introdução no consumo dos respetivos combustíveis, em dado(s) período(s) e montante(s), nomeadamente das correspondentes declarações de introdução no consumo e atos de liquidação.
Nem, de igual modo, foi junto qualquer meio prova (documental ou outro) relativo à alegada repercussão da CSR pela B..., S.A. à Requerente, limitando-se esta a exibir faturas do fornecedor de combustíveis, que não contêm qualquer menção à CSR. Note-se que a declaração genérica daquele fornecedor de combustíveis está longe de conter elementos concretos indispensáveis a esta comprovação. E é o fornecedor de combustíveis que está na posse dos elementos de facto que permitem alcançar quais as DIC que apresentou (números e data) e qual o valor de CSR que delas consta em correspondência com as faturas emitidas ao seu cliente, a aqui Requerente. Também só com estes elementos se poderia exigir à AT que identificasse os atos de liquidação, que deles dependem.
A Requerente procura provar a repercussão através da declaração do fornecedor junta aos autos, onde aquele se limita a afirmar de forma genérica e abstrata que repercutiu o encargo da CSR. Declaração que não está datada, não menciona a qualidade em que atua o signatário e com que poderes de representação, além de não versar sobre as concretas transações realizadas entre o fornecedor de combustíveis e a Requerente; não fazer a correspondência entre as operações praticadas e as DIC dos combustíveis transacionados; não estabelecer a relação entre as transações e as DIC com as correspondentes liquidações emitidas pela AT e, finalmente, não demonstrar a incorporação do encargo da CSR nas faturas de venda de gasóleo rodoviário à Requerente, nem tão pouco em que grau e/ou medida tal incorporação se processou, não se podendo presumir a repercussão da CSR.
Por outro lado, mesmo que se soubesse o concreto valor de CSR repercutido à Requerente, do adquirido processual não se retira, de igual modo, que tenha sido a Requerente, a final, a suportar economicamente o imposto em causa e que o encargo da CSR se cristalizou na sua esfera, como entidade que, em última instância, foi onerada com o tributo em causa. Tal asserção exige como premissa que o encargo com a CSR não estivesse compreendido no preço/tarifa dos serviços prestados aos clientes da Requerente (e/ou na medida em que não estava).
Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas Partes e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja validade terá de ser aferida em relação à concreta matéria de facto consolidada.
-
Do Direito
Questões Prévias
-
Da Competência Material do Tribunal Arbitral
A Requerida qualifica a CSR como contribuição financeira e não como imposto, daí retirando a consequente exclusão do âmbito da jurisdição arbitral por falta de vinculação da AT (v. artigo 4.º, n.º 1 do RJAT[1]). Isto porque a Portaria de Vinculação[2], no corpo do seu artigo 2.º, delimita o respetivo âmbito à “apreciação das pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida [à AT]”, sem prever outros tributos. (sublinhado nosso)
A questão releva do ponto de vista da competência “relativa” do Tribunal Arbitral e não “absoluta”, em razão da matéria, já que a norma que rege a competência, o artigo 2.º, n.º 1 do RJAT, faz referência a “atos de liquidação de tributos”, categoria ampla que compreende a tripartição clássica refletida no artigo 165.º, n.º 1, alínea i) da Constituição e no artigo 3.º, n.º 2 da LGT – impostos, taxas e contribuições financeiras –, pelo que aí tem claro enquadramento a CSR.
Porém, mesmo na perspetiva da competência “relativa” não assiste razão à Requerida, porquanto, apesar de o artigo 2.º da citada Portaria parecer limitar o âmbito da vinculação da AT à jurisdição arbitral aos “impostos” e de o nomen juris da CSR sugerir que estamos perante uma contribuição financeira, a sua natureza é, na realidade, a de um imposto administrado pela AT, ainda que de receita consignada, não sendo a denominação determinante.
A Requerida cita diversas decisões arbitrais para reforçar o seu argumento[3], mas omite a existência de múltiplas outras decisões em sentido distinto, nomeadamente a do processo arbitral 304/2022-T, de 5 de janeiro de 2023[4], que se acompanha nesta matéria, e que, com suporte na jurisprudência dos Tribunais superiores, incluindo o Tribunal Constitucional, conclui que a CSR é um imposto.
Desde logo, a designação de contribuição não vincula o aplicador do direito e não é o facto de o tributo ter a receita consignada que o qualifica como contribuição financeira (v. Acórdãos do Tribunal Constitucional n.ºs 539/2015; 369/99 e 232/2022, respetivamente), existindo vários impostos que têm a sua receita consignada (ainda que ao arrepio do princípio da não consignação da receita dos impostos).
O elemento decisivo para a qualificação da CSR como contribuição financeira é a existência de uma estrutura paracomutativa[5], ou dito de outra forma, de um nexo de bilateralidade/causalidade que se estabelece entre o ente beneficiário da receita [Estado] e os sujeitos passivos do tributo. A prestação deve destinar-se a compensar prestações administrativas aproveitadas (bilateralidade) ou provocadas (causalidade) pelos respetivos sujeitos passivos, “(...) acabando por se reconduzir à categoria de impostos de receita consignada as prestações pecuniárias coativas cobradas com o intuito de financiar despesa pública – mesmo que se trate de despesa pública concretamente identificada no âmbito da consignação das receitas – sempre que essa despesa se não possa reconduzir ao suporte financeiro de medidas ou atividades administrativas provocadas pelos sujeitos passivos ou de que estes sejam beneficiários” (v. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 232/2022, citado na decisão arbitral 304/2022-T).
No caso da CSR, constata-se que a mesma não tem por finalidade compensar prestações administrativas realizadas de que o sujeito passivo seja presumidamente beneficiário e também não se identificam prestações administrativas a que o sujeito passivo tenha dado causa.
Conforme explicita a decisão arbitral 304/2022-T:
“Desde logo, a CSR não tem como pressuposto uma prestação, a favor de um grupo de sujeitos passivos, por parte de uma pessoa coletiva. A contribuição é estabelecida a favor da EP — Estradas de Portugal, E. P. E. (art. 3º, nº 2 da Lei n.º 55/2007), sendo essa mesma entidade a titular da receita correspondente (art.º 6º). No entanto, os sujeitos passivos da contribuição (as empresas comercializadoras de produtos combustíveis rodoviários) não são os destinatários da atividade da EP — Estradas de Portugal, E. P. E., a qual consiste na “conceção, projeto, construção, conservação, exploração, requalificação e alargamento” da rede de estradas (art. 3º, nº 2 da Lei n.º 55/2007).
Em segundo lugar, também não se encontra base legal alguma para afirmar que a responsabilidade pelo financiamento da tarefa administrativa em causa – que no caso será a “conceção, projeto, construção, conservação, exploração, requalificação e alargamento da rede de estradas” – é imputável aos sujeitos passivos da contribuição, que são as empresas comercializadoras de combustíveis rodoviários. Pelo contrário, o art.º 2.º da Lei n.º 55/2007 diz expressamente que o “financiamento da rede rodoviária nacional a cargo da EP - Estradas de Portugal, E.P. E., (...), é assegurado pelos respetivos utilizadores e, subsidiariamente, pelo Estado, nos termos da lei e do contrato de concessão aplicável.”
Portanto, apesar de ser visível, de forma clara, o elemento de afetação da contribuição para financiar a atividade de uma entidade pública não territorial – a EP - Estradas de Portugal, E. P. E. – não é de modo algum evidente a existência, pelo contrário, afigura-se inexistir um “nexo de comutatividade coletiva” entre os sujeitos passivos e a responsabilidade pelo financiamento da respetiva atividade, ou entre os sujeitos passivos e os benefícios retirados dessa atividade.
A Contribuição de Serviço Rodoviário visa financiar a rede rodoviária nacional a cargo da EP — Estradas de Portugal, E. P. E. (art.º 1º da Lei 55/2007). O financiamento da rede rodoviária nacional a cargo da EP — Estradas de Portugal, E. P. E., é assegurado pelos respetivos utilizadores (art.º 2º). São, estes, como se conclui, os sujeitos que têm um vínculo com a atividade da entidade titular da contribuição e com a atividade pública financiada pelo tributo; são eles os beneficiários, e são eles os responsáveis pelo seu financiamento.
No entanto, a contribuição de serviço rodoviário é devida pelos sujeitos passivos do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos, que, nos termos do art.º 4º n.º 1, al. a) do CIEC, são os “depositários autorizados” e os “destinatários registados”, não existindo qualquer nexo específico entre o benefício emanado da atividade da entidade pública titular da contribuição e o grupo dos respetivos sujeitos passivos.
Embora a Autoridade Tributária afirme que a posição dos revendedores de produtos petrolíferos é a de uma “espécie de substituição tributária”, não entendemos assim, pois tal entendimento não tem apoio na lei.
[…]
Ainda poderia acrescentar-se que o universo de entidades que beneficiam ou dão causa à atividade financiada pela CSR não é um grupo delimitado de pessoas, mas é toda a população de um modo geral. E que o efetivo sacrifício fiscal, suportado através de uma repercussão meramente económica, não é suportado apenas pelos que efetivamente utilizam a rede de estradas a cargo da Infraestruturas de Portugal S.A., mas também pelos que utilizam vias rodoviárias que não se incluem nessa rede.
Por conseguinte, conclui também este tribunal que a Contribuição de Serviço Rodoviário, apesar do seu nomen juris e de a sua receita se destinar a financiar uma atividade pública específica, não tem o caráter de comutatividade, bilateralidade ou sinalagmaticidade grupal ou coletiva que é necessária à contribuição financeira.”
No mesmo sentido, salienta a decisão arbitral 629/2021-T, de 3 de agosto de 2022, que “o nexo grupal – que faria das contribuições financeiras uma espécie de taxas coletivas – não se estabelece com os sujeitos passivos da CSR, mas sim com terceiros não participantes na relação tributária.”.
A qualificação da CSR como um imposto foi também a seguida pelo Tribunal de Contas, na Conta Geral do Estado de 2008, e resulta da análise da sua génese. Interessa a este respeito notar que a Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, criou a CSR por desdobramento do ISP, em relação ao qual é indiscutível a sua qualificação como imposto. Esta relação umbilical merece destaque na decisão arbitral 332/2023-T: “A CSR, durante algum tempo legalmente autonomizada do ISP, a partir do qual nasceu e ao qual voltou, constituiu sempre um pseudónimo deste – e, portanto, sempre foi um imposto”.
Em síntese, a CSR é enquadrável como imposto, uma vez que não reúne as características de bilateralidade difusa e de responsabilidade de grupo inerente às contribuições, estando, deste modo, abrangida pela autovinculação da AT à jurisdição arbitral, nos termos da citada Portaria n.º 112-A/2011, sendo este Tribunal competente para proceder à sua apreciação.
A Requerida suscita ainda a incompetência material deste Tribunal, por entender que a Requerente visa a apreciação da legalidade de todo o regime da CSR, pretendendo, em rigor, suspender a eficácia de atos legislativos.
Contudo, não tem razão. O pedido formulado pela Requerente é especificamente dirigido à anulação dos atos de repercussão, dos atos tributários e da decisão silente de segundo grau que os manteve, não tendo sido peticionada a ilegalidade ou ineficácia da Lei n.º 55/2007 ou de alguma(s) das suas normas. E a pronúncia jurisdicional será, se a ação for procedente, meramente anulatória (constitutiva) dos atos impugnados, não consubstanciando uma declaração de ilegalidade do (ou dirigida ao) regime da CSR em bloco.
Quer do ponto de vista formal, quer numa perspetiva material, a Requerente não pretende, nem do seu articulado se infere, a “fiscalização da legalidade de normas em abstrato”. O que está em causa nos autos é a apreciação de atos individuais e concretos – de repercussão e de liquidação de CSR – em relação aos quais foi suscitada a questão da respetiva ilegalidade por erro de direito. A alegada ilegalidade do regime da CSR por violação do direito da União Europeia é causa de invalidade dos atos, mas não o objeto da pronúncia jurisdicional. A pretendida decisão anulatória de atos individuais e concretos com fundamento da desconformidade da disciplina da CSR com o direito europeu, mais não é do que a expressão do princípio do primado do direito da União Europeia, sem paralelo com uma alegada declaração de ilegalidade do próprio regime.
A Requerida invoca ainda a falta de competência material do Tribunal Arbitral para se pronunciar sobre a legalidade dos atos de repercussão de CSR.
Como descreve Sérgio Vasques “Os atos de repercussão materializam “um fenómeno que consiste na transferência do peso económico de um tributo para pessoa diferente do sujeito passivo e com quem este está em relação, através da sua integração no preço de um qualquer bem”[6].
Independentemente da posição que se adote sobre a natureza jurídica dos atos de repercussão, quanto a saber se são atos que integram uma relação jurídico-tributária complexa, ou se são um fenómeno económico de natureza estritamente privada, certo é que aqueles não são atos tributários em sentido lato, porque não envolvem o apuramento da matéria coletável/tributável através da aplicação de uma norma tributária substantiva a um caso concreto e muito menos atos tributários de liquidação stricto sensu, que tornam certa, líquida e exigível a obrigação tributária através da operação aritmética de aplicação da taxa legal à matéria tributável previamente determinada (v. neste sentido Serena Cabrita Neto e Carla Castelo Trindade, Contencioso Tributário, vol. I, Almedina, 2017, p. 278).
Efetivamente, os atos de repercussão não se subsumem a nenhuma das realidades visadas pelo artigo 2.º do RJAT, pelo que os Tribunais Arbitrais não são competentes para os apreciar, pelo que em relação ao segmento do petitório que se prende com a anulação dos atos de repercussão de CSR, não pode este Tribunal do mesmo conhecer, absolvendo-se a Requerida da instância.
Porém, a Requerente não solicita apenas a apreciação da legalidade dos atos de repercussão e dirige ainda o seu pedido anulatório aos atos de liquidação de CSR emanados da AT, do qual, como acima dito, o Tribunal pode conhecer.
Por fim, no tocante à incompetência do Tribunal Arbitral para decidir o pedido de restituição de valores que, segundo a Requerida, só pode ser apreciado em execução do julgado, tal só se verifica se a determinação do valor da liquidação a anular estiver dependente de operações que envolvam o exercício da atividade administrativa, não havendo necessidade de remeter tal fixação para a fase de execução da decisão se a quantificação do valor anulado não oferecer dúvidas e resultar de um cálculo aritmético simples, sem margem de livre apreciação e/ou discricionariedade administrativa (v. artigo 609.º, n.º 2 do CPC (a contrario), por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT).
Assim, por oposição ao que a Requerida preconiza, não estão em juízo matérias às quais a AT não se tenha vinculado, nem pedidos de que o Tribunal Arbitral não possa conhecer, inexistindo qualquer alargamento do âmbito do artigo 2.º, n.º 1 do RJAT cuja inconstitucionalidade possa ser arguida.
Acresce referir que, por acórdão de 24 de outubro de 2024 proferido no processo 128/23.9BCLSB, o Tribunal Central Administrativo Sul pronunciou-se pela competência, em razão da matéria, dos tribunais arbitrais, para conhecer de pedidos de anulação de liquidações de Contribuição de Serviço Rodoviário, bem como dos pedidos restituitórios e indemnizatórios que lhes são acessórios.
À face do exposto, julga-se procedente a exceção de incompetência material do Tribunal Arbitral relativamente ao pedido de anulação dos atos de repercussão de CSR, sendo improcedente em relação aos atos de liquidação de CSR. Neste último caso, a AT está vinculada à jurisdição arbitral, por estar em causa um pedido de anulação de atos de liquidação de imposto, a CSR (v. artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 5.º do RJAT e artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
-
Sobre a Ineptidão do Pedido de Pronúncia Arbitral
A AT defende que o pedido de pronúncia arbitral é inepto, quer porque a Requerente não identifica os atos que são objeto do pedido arbitral, como exige o artigo 10.º, n.º 2, alínea b) do RJAT, quer porque o pedido está em contradição com a causa de pedir. A Requerente declina esta argumentação e sustenta que identificou os atos primordialmente impugnados – atos de repercussão consubstanciados nas faturas carreadas – e que, em relação aos atos de liquidação, identificou os elementos de que dispunha, mais não lhe podendo ser exigido.
O artigo 98.º, n.º 1, alínea a) do CPPT, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c) do RJAT indica como nulidade insanável do processo judicial tributário, a ineptidão da petição inicial, sem contudo esclarecer as situações que configuram essa ineptidão. Desta forma, deve aplicar-se, a título subsidiário (v. artigos 2.º, alínea e) do CPPT e 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT), o disposto no compêndio processual civil que, no artigo 186.º, rege esta matéria (v. neste sentido a decisão do processo arbitral n.º 410/2024-T, de 13 de novembro de 2023, que a seguir se acompanha).
No artigo 186.º, n.º 1 do CPC, indicam-se as seguintes situações de ineptidão da petição inicial:
a) Quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir;
b) Quando o pedido esteja em contradição com a causa de pedir;
c) Quando se cumulem causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis.
O n.º 3 do mesmo artigo determina que “se o réu contestar, apesar de arguir a ineptidão com fundamento na alínea a) do número anterior, a arguição não é julgada procedente quando, ouvido o autor, se verificar que o réu interpretou convenientemente a petição inicial”.
Em relação à identificação dos atos tributários, não tendo a Requerente a qualidade de sujeito passivo da CSR, não lhe é exigível que disponha das liquidações correspondentes, uma vez que não é o destinatário das mesmas, nem participou na sua emissão. Aliás, tal exigência comprometeria a sindicabilidade dos atos tributários por repercutidos legais, ou, no caso de retenções na fonte, pelos substituídos, com a consequente contração do acesso ao direito, incompatível com o direito a uma tutela jurisdicional efetiva e com o princípio da proporcionalidade (v. artigos 20.º e 268.º, n.º 4 da Constituição).
A não identificação dos atos tributários não impediu o exercício do contraditório pela Requerida, que, pelo teor da extensa e circunstanciada resposta, manifestou compreender o alcance da pretensão da Requerente e os argumentos que a alicerçam. Nem essa identificação é necessária para aferir da legalidade da cobrança de CSR.
O pedido formulado é perfeitamente inteligível (independentemente de ser, no todo ou em parte, adequado à ação arbitral tributária e de ter cabimento na competência dos Tribunais Arbitrais), pois visa a declaração de “ilegalidade dos atos de repercussão da CSR consubstanciados nas faturas […] no decurso do período compreendido entre dezembro de 2019 e dezembro de 2022 e, bem assim, das correspondentes liquidações de CSR praticadas pela Administração Tributária e Aduaneira com base nas DIC submetidas pelo respetivo sujeito passivo, determinando-se, nessa medida, a sua anulação, com as demais consequências legais”.
Em relação à alegada contradição entre o pedido e a causa de pedir esta também não existe, pois a Requerente visa a declaração de ilegalidade e a anulação dos atos de repercussão e das liquidações de CSR subjacentes (bem como a restituição do imposto que alega ter suportado por repercussão) com fundamento na incompatibilidade do regime da CSR com o artigo 1.º, n.º 2 da Diretiva 2008/118 supra citada (v. a este respeito a decisão, de 12 de março de 2024, proferida no processo arbitral n.º 676/2023). Verifica-se, desta forma, o necessário nexo causal do pedido anulatório e do fundamento dessa invalidade, a desconformidade ao direito europeu quanto aos atos de liquidação de CSR, de que este Tribunal pode conhecer.
À face do exposto, improcede a exceção da ineptidão do pedido de pronúncia arbitral, pois não se verifica nenhuma das situações elencadas no artigo 186.º do CPC.
-
Da Ilegitimidade Ativa
O RJAT não contém a regulação do pressuposto processual da legitimidade, como possibilidade de intervenção num processo contencioso, cuja conformação jurídica tem, assim, de proceder do direito subsidiariamente aplicável, por via da aplicação do seu artigo 29.º, n.º 1, que remete para as disposições legais de natureza processual do CPPT, do CPTA e do CPC.
Da regra geral do direito processual, constante do artigo 30.º do CPC, resulta que é parte legítima quem tem “interesse direto” em demandar, sendo considerados titulares do interesse relevante, para este efeito, na falta de indicação da lei em contrário, “os sujeitos da relação controvertida”. A mesma regra é reproduzida no processo administrativo, que confere legitimidade ativa a quem “alegue ser parte na relação material controvertida” (v. artigo 9.º, n.º 1 do CPTA).
A legitimidade no processo é, pois, recortada pelo conceito central de “relação material” que, no âmbito fiscal, há de ser uma relação regida pelo direito tributário, à qual subjaz um ato tributário, cujo sujeito passivo é delimitado no artigo 18.º, n.º 3 da LGT, como “a pessoa singular ou coletiva, o património ou a organização de facto ou de direito que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte direto, substituto ou responsável.”.
Neste domínio, a legitimidade não pode deixar de ser enquadrada no âmbito das relações jurídicas tributárias que se estabelecem entre a administração tributária, agindo como tal, e as pessoas singulares ou coletivas e entidades equiparadas (v. artigo 1.º, n.º 2 da LGT).
O CPPT consagra uma norma específica à legitimidade no processo judicial tributário, atribuindo-a aos “contribuintes, incluindo substitutos e responsáveis, outros obrigados tributários, as partes dos contratos fiscais e quaisquer outras pessoas que provem interesse legalmente protegido” (v. artigo 9.º, n.ºs 1 e 4 do CPPT).
No mesmo sentido, ainda que se refira somente à legitimidade no procedimento, a LGT determina no seu artigo 65.º que “têm legitimidade no procedimento os sujeitos passivos da relação tributária e quaisquer pessoas que provem interesse legalmente protegido.”. E o artigo 78.º da LGT, no âmbito da revisão dos atos tributários, assegura a mesma posição apelando aos conceitos de sujeito passivo e de contribuinte.
Em relação aos sujeitos passivos não originários, o legislador teve a preocupação de justificar, de forma especificada, a razão pela qual lhes é concedida legitimidade processual. Assim, quanto aos responsáveis solidários, a legitimidade processual deriva “da exigência em relação a eles do cumprimento da obrigação tributária ou de quaisquer deveres tributários, ainda que em conjunto com o devedor principal” (v. artigo 9.º, n.º 2 do CPPT). E, relativamente aos responsáveis subsidiários, está associada ao facto “de ter sido contra eles ordenada a reversão da execução fiscal ou requerida qualquer providência cautelar de garantia dos créditos tributários” (v. artigo 9.º, n.º 3 do CPPT). Em ambas as situações constitui-se uma relação jurídico-tributária entre estas categorias de sujeitos passivos derivados e o credor tributário Estado, que encerra prestações – principais (de pagamento da obrigação tributária) e acessórias –, o que sucede igualmente com o substituto.
In casu, a Requerente invoca a qualidade de repercutido legal para deduzir a ação arbitral.
Efetivamente, apesar de o repercutido legal não ser sujeito passivo, a alínea a) do n.º 4 do artigo 18.º da LGT, determina que assiste o “direito de reclamação, recurso, impugnação ou de pedido de pronúncia arbitral nos termos das leis tributárias” a quem “suporte o encargo do imposto por repercussão legal”, estendendo a posição jurídica adjetiva ao repercutido (apesar de não o considerar sujeito passivo), na condição de estarmos perante um caso de “repercussão legal”. A lei implica (ou pressupõe) desta forma que o repercutido legal é titular de um interesse legalmente protegido, condição exigida para que possa intervir em juízo (v. artigo 9.º, n.ºs 1 e 4 do CPPT).
Nesse contexto, assinala Sérgio Vasques que “Se o repercutido estará à margem da relação tributária, não estará por isso à margem do direito”, referindo que a LGT lhe reconhece o direito “à reclamação, recurso, impugnação ou pronúncia arbitral”[7].
Todavia, a CSR não constitui um caso de repercussão legal. A Lei n.º 55/2007, que institui a CSR, não contém qualquer referência sobre quem deve recair o encargo do tributo. Basta atentar, para esta conclusão, no artigo 5.º, n.º 1 da citada lei: “A contribuição de serviço rodoviário é devida pelos sujeitos passivos do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos, sendo aplicável à sua liquidação, cobrança e pagamento o disposto no Código dos Impostos Especiais de Consumo, na lei geral tributária e no Código de Procedimento e Processo Tributário, com as devidas adaptações.”. Assim, o legislador limitou-se a identificar o sujeito passivo da CSR, nada acrescentando sobre a repercussão da mesma, pelo que o artigo 5.º, n.º 1 não remete para o artigo 2.º do Código dos IEC, mas apenas para as normas desse código que regulam a liquidação, cobrança e pagamento do imposto pelo sujeito passivo. Aliás, mesmo o artigo 2.º do Código dos IEC não previa, à data dos factos, a repercussão legal nesses impostos.
A Requerente invoca a nova redação do artigo 2.º do Código dos IEC introduzida pela Lei n.º 24-E/2022, de 30 de dezembro[8], para demonstrar a repercussão, afirmando que o legislador veio esclarecer que a CSR é sempre repercutida nos consumidores.
No entanto este raciocínio apresenta diversos problemas. Desde logo, porque a CSR tem um regime próprio, vertido na Lei n.º 55/2007, não sendo um dos tributos projetados no campo de incidência objetiva do Código dos IEC. A remissão do regime da CSR para o Código dos IEC que consta do artigo 5.º, n.º 1 da Lei n.º 55/2007, restringe-se à componente procedimental da “liquidação, cobrança e pagamento” da CSR, não podendo extrapolar-se uma aplicação generalizada dos princípios e regras dos IEC consagrados nesse compêndio a um tributo que no mesmo não está previsto. Acresce que no mencionado artigo 2.º do Código dos IEC não é feita qualquer referência à CSR que, aliás, foi extinta precisamente pela Lei n.º 24-E/2022 que alterou a sua redação.
Acresce que a alteração legislativa operada no Código dos IEC, cuja redação (do artigo 2.º) passou a conter a referência expressa à repercussão, é posterior à data dos factos sob apreciação, pelo que, se fosse de seguir a posição da Requerida, estar-se-ia perante um caso flagrante de aplicação retroativa de normas fiscais. Esta conclusão não resulta afastada pela atribuição de natureza interpretativa pelo legislador[9], pois a retroatividade inerente às leis interpretativas “é necessariamente material e, caso esteja em causa a interpretação legal de normas fiscais, não pode deixar de estar abrangida pela proibição da retroatividade consagrada no artigo 103.º, n.º 3, da Constituição.” (v. acórdão do Tribunal Constitucional n.º 751/2020, de 16 de dezembro de 2020. No mesmo sentido se pronuncia o recente acórdão do mesmo Tribunal, n.º 503/2024, de 25 de junho de 2024).
Em síntese, a Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, que instituiu a CSR não contempla qualquer mecanismo de repercussão legal, nem sequer, adiante-se, de repercussão meramente económica, isto, sem prejuízo de ser um dado que, em princípio, as empresas repassam nos preços praticados os gastos em que incorrem, independentemente da sua natureza (e, portanto, incluindo os gastos tributários), por forma a concretizarem o objetivo lucrativo que preside à sua criação e manutenção (v. artigos 22.º do Código das Sociedades Comerciais e 980.º do Código Civil). E a alteração legislativa do Código dos IEC, ocorrida em dezembro de 2022, que passou a consagrar a repercussão nos IEC, além de não ser subsidiariamente aplicável à CSR, por falta de norma remissiva, mesmo que o fosse, não poderia reger a situação em análise, porque é posterior à data dos factos.
A Requerente baseia a sua intervenção processual na alegação singela de lhe ter sido repercutida a CSR pelas empresas fornecedoras de combustíveis, caracterizando-se como um consumidor de combustíveis que suporta (a final) o encargo daquele tributo.
Contudo, a figura do repercutido não se enquadra na categoria de sujeito passivo, nos termos do citado artigo 18.º, n.º 3 da LGT, pelo que, não sendo parte em contratos fiscais, a legitimidade, neste caso, só pode advir da alegação comprovada de que é titular de um interesse legalmente protegido (v. artigo 9.º, n.ºs 1 e 4 do CPPT).
Como atrás exposto, a repercussão económica não é, por si só, atributo de legitimidade processual, que requer, nos termos da lei, a demonstração de um interesse legalmente protegido, i.e., que mereça a tutela do direito substantivo.
A Requerente não tem a qualidade de consumidor de combustíveis, no sentido de consumidor final sobre o qual recai ou deve recair o encargo do tributo, na lógica da repercussão económica que subjaz nomeadamente aos Impostos Especiais de Consumo (“IEC”). Na verdade, o combustível adquirido é um fator de produção no circuito económico, pelo que se a CSR se destina a ser suportada pelo consumidor, à partida a Requerente não faz parte das entidades potencialmente lesadas, que são os consumidores e não os operadores económicos (v. neste sentido as decisões dos processos arbitrais n.ºs 408/2023-T, de 8 de janeiro de 2024, e 375/2023-T, de 15 de janeiro de 2024).
Ora, como assinalado, não sendo a Requerente o sujeito passivo da CSR, substituto, responsável ou repercutido legal desta contribuição, não lhe assiste legitimidade processual, a menos que, como interessada, alegue e demonstre factos que suportem a aplicação da norma residual atributiva de legitimidade, i.e., que evidencie um interesse direto e legalmente protegido na sua esfera (v. artigo 9.º, n.º 1 in fine do CPPT), passível de justificar a faculdade de demandar a Requerida em juízo, ónus que sobre si impende.
Contudo, o único facto que a Requerente alega para este efeito é o de lhe ter sido repercutida a CSR, cujo encargo económico foi por si suportado. Qualifica esta repercussão, erradamente, como legal, que, a ser “legal”, sempre teria de constar de uma norma com essa natureza, a qual, porém, não existe. Uma das características típicas da repercussão legal, como sucede no IVA e em algumas verbas do Imposto do Selo, é a evidenciação nos documentos de débito – faturas emitidas – do imposto repercutido, que permite o seu controlo por parte do repercutido (v. artigos 36.º, n.º 5, alíneas c) e d) do Código do IVA e 23.º, n.º 6 do Código do Imposto do Selo. Este último refere que “nos documentos e títulos sujeitos a imposto são mencionados o valor do imposto e a data da liquidação, com exceção dos contratos previstos na verba 2 da tabela geral [arrendamento e subarrendamento], cuja liquidação é efetuada nos termos do n.º 8.”). Não é o que sucede na situação vertente, em que os documentos que titulam as vendas de combustível não mencionam a CSR ou o seu quantitativo (na parte repercutida).
Por outro lado, sem prejuízo de a CSR ter sido consagrada como “contrapartida” da utilização da rede rodoviária nacional, a lei não indica ou sequer sugere sobre quem é que deve constituir encargo, contrariamente ao que a Requerente afirma. Na realidade, a Requerente é tão-só um cliente comercial do sujeito passivo que poderá ter declarado e pago a CSR.
Compreende-se que o legislador não tenha adotado um conceito irrestrito de legitimidade ativa, rodeando-se de algumas cautelas, atentas as dificuldades práticas que uma tal abertura suscitaria, quer na ligação entre o ato de liquidação do imposto, a determinação da sua efetiva repercussão (económica) e a determinação do seu quantum; quer ainda no potencial desdobramento/duplicação de devoluções de imposto indevidas: simultaneamente ao sujeito passivo e ao(s) múltiplos repercutido(s) económicos da cadeia de valor. A ser assim, o mesmo imposto poderia ser restituído a diversos intervenientes, de forma dificilmente controlável, com manifesto prejuízo para o Estado, em colisão com os princípios da igualdade e da praticabilidade.
Conforme referido, a Requerente não logrou atestar que suportou a CSR contra a qual reage, ou a medida em que a suportou. Nem sequer juntou qualquer meio de prova com essa finalidade, limitando-se a carrear para os autos faturas de compra de combustível que não contêm qualquer menção à CSR. E esta seria, segundo entendemos, a única forma de lhe poder ser reconhecida a legitimidade residual para a presente ação arbitral, tendo em conta que não é sujeito passivo, nas diversas modalidades que o conceito acomoda, nem repercutido legal da CSR.
Sublinha-se que a presente decisão não representa uma denegação do direito ao reembolso da CSR, mas o reconhecimento de que a demandante, aqui Requerente, não é a Parte com legitimidade para o solicitar ao Estado, por não ter demonstrado os necessários pressupostos do direito adjetivo que alega: ser titular de um direito legalmente protegido, em concreto, ter suportado a CSR cuja restituição reclama.
Não está, pois, em causa uma situação em que as regras nacionais tornem impossível ou excessivamente difícil a efetivação de um direito decorrente da ordem jurídica europeia, nem sobre tal se suscitam dúvidas passíveis de firmar um pedido de reenvio prejudicial ao Tribunal de Justiça.
Na verdade, o direito a reclamar o reembolso da CSR não se encontra na esfera da Requerente, pois esta não demonstrou nenhuma das qualidades que lhe dariam acesso a esse reembolso: ser sujeito passivo da CSR (originário ou derivado), ou repercutido, ou consumidor final que suportou este imposto em definitivo. O ponto não é o da dificuldade em efetivar um direito decorrente do efeito direito do artigo 1.º, n.º 2 da Diretiva 2008/118/CE, mas sim o de não se demonstrar a necessária relação subjetiva da titularidade desse direito na esfera da Requerente, pois esta não substanciou a alegação de ser sujeito da relação material controvertida, pelo que tudo o mais fica prejudicado, pois não lhe diz respeito, mas a outra(s) entidade(s).
Nem a jurisprudência do Tribunal de Justiça que a Requerente invoca, como a do processo C-192/95, Comateb (que é aplicável a sujeitos passivos e não a repercutidos ou a consumidores finais), ou a do processo C-94/10, Danfoss (respeitante a repercutidos), milita em sentido oposto, pois incide sobre situações em que as qualidades de sujeito passivo ou repercutido se verificam nos operadores que suscitaram o reembolso dos impostos em questão, o que não ocorre no caso da Requerente.
Além de que, cabe na esfera de competência dos Estados-Membros e do legislador nacional a conformação dos requisitos processuais e procedimentais, sujeitos apenas ao limite externo (negativo) dos princípios do direito da União Europeia, nomeadamente da proporcionalidade, da efetividade e da equivalência, cuja violação não se constata no caso vertente.
Por outro lado, pretender, como a Requerente pretende, que a fatura de aquisição dos combustíveis, sem qualquer menção à CSR, é apta a provar por via de presunção a repercussão da CSR na sua esfera, não tem qualquer suporte legal, nem constitui matéria que, de novo, possa ser avaliada pelo parâmetro do direito europeu, pois a repartição do ónus probatório constitui matéria da competência dos Estados-Membros, insindicável perante o Tribunal de Justiça, a menos que resultem infringidos algum(uns) dos mencionados princípios, o que, no caso, não se verifica.
Por fim, a Requerente invoca ser inviável a ação de repetição do indevido, a intentar na jurisdição dos Tribunais Judiciais, sem no entanto, apresentar razões válidas para tal conclusão, limitando-se a invocar meros raciocínios jurídicos opinativos que este Tribunal Arbitral não pode acolher.
O entendimento preconizado por este Tribunal Arbitral não é prejudicado pela circunstância de os factos que confeririam legitimidade à Requerente serem, de igual modo, requeridos como condição de procedência da ação, porquanto a qualidade de repercutido de facto é essencial, quer para o juízo de lesividade que preside à titularidade de um direito legalmente protegido (condição de admissibilidade – v. artigo 9.º, n.º 1 do CPPT), quer para o reembolso do imposto a quem o suportou (questão de mérito).
De notar que não se suscitam questões de interpretação do direito da União Europeia em relação à falta de demonstração, pela Requerente, do atributo subjetivo necessário para a alegada qualidade de sujeito da relação tributária controvertida, essencial para intervir em juízo, que constitui o critério decisório da presente ação, no sentido da absolvição da instância por falta de demonstração de um pressuposto processual fundamental.
De acordo com o entendimento do Tribunal de Justiça, a partir do Acórdão Cilfit[10], a obrigação de suscitar a questão prejudicial de interpretação não se verifica se:
-
A questão não for necessária, nem pertinente para o julgamento do litígio principal; ou
-
O Tribunal de Justiça já se tiver pronunciado de forma firme sobre a questão a reenviar, ou quando já exista jurisprudência sua consolidada sobre a mesma; ou
-
O juiz nacional não tenha dúvidas razoáveis quanto à solução a dar à questão de Direito da União, por o sentido da norma em causa ser claro e evidente.
No caso sub judice, verifica-se o preenchimento do requisito previstos na alínea a) supra, pelo que se indefere o pedido de reenvio prejudicial suscitado a título subsidiário pela Requerente.
Assinala-se, ainda, que a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo já entendeu, em relação a um caso de liquidação de Imposto Automóvel (correspondente ao atual Imposto sobre Veículos), que o adquirente não tem legitimidade para impugnar a respetiva liquidação, precisamente por não se tratar de um caso de repercussão legal (v. Acórdão de 1 de outubro de 2003, processo n.º 0956/03).
Em síntese, não tendo ficado provado o valor da CSR repercutido pelos fornecedor de combustíveis à Requerente, nem que esta suportou o encargo económico do imposto, falece-lhe legitimidade para pedir a anulação das respetivas liquidações e o reembolso do imposto, solução que se enquadra numa interpretação conforme à Constituição (v. artigo 268.º, n.º 4), porquanto o direito à impugnação dos atos lesivos não pode deixar de reportar-se aos sujeitos cuja esfera jurídico-patrimonial sofreu a lesão (os lesados) e não a outros.
A conclusão da ilegitimidade da Requerente também se retira da exegese do Código dos IEC, aplicável à CSR na parte referente à liquidação, cobrança e pagamento do imposto (por remissão do artigo 5.º, n.º 1 da Lei n.º 55/2007). Conforme declara o acórdão do CAAD, de 1 de fevereiro de 2024, proferido no âmbito do processo 296/2023-T, “qualquer que seja, em tese geral, a possibilidade de o repercutido invocar a ilegalidade das liquidações que originam a repercussão, no âmbito dos impostos especiais de consumo há uma norma que o veda e que o legislador manteve incólume ao longo das 25 alterações que, em 24 anos, introduziu no CIEC: a do n.º 2 do artigo 15.º (epigrafado “Regras gerais do reembolso”).” (realce nosso)
A referida norma [artigo 15.º, n.º 2, do Código dos IEC] estabelece que “Podem solicitar o reembolso os sujeitos passivos referidos no n.º 1 e na alínea a) do n.º 2 do artigo 4.º que tenham procedido à introdução no consumo dos produtos em território nacional e provem o pagamento do respetivo imposto.”.
Desde a redação inicial destas normas, dada pelo Decreto-Lei n.º 73/2010, de 21 de junho, a única alteração substancial registada foi o aditamento (pela Lei n.º 24-D/2022, de 30 de dezembro) do “destinatário certificado” entre os sujeitos passivos identificados à cabeça da norma sobre “Incidência subjetiva”. Quer dizer que nenhum legislador – nem mesmo o que entendeu atribuir natureza interpretativa à alusão à tipicidade da repercussão dos impostos especiais de consumo – considerou necessário, para o que ora importa, alargar o círculo dos “sujeitos passivos” para lá do “destinatário certificado”.
Quer dizer que só os sujeitos passivos aí identificados (no artigo 4.º), e apenas quando preencham requisitos adicionais, podem suscitar questões sobre, tal como resulta do n.º 1 desse artigo 15.º, “o erro na liquidação”. Ora, esta solução apresenta total cabimento face à impraticabilidade que seria fazer a gestão de um sistema demasiadamente aberto a todo o género e tipo de reembolsos, com uma duvidosa forma de controlo. A esta mesma conclusão chegaram, entre outras, as decisões proferidas nos processos arbitrais n.ºs 296/2023-T, 408/2023-T, 375/2023-T e 633/2023-T.
À face do exposto julga-se verificada a exceção de ilegitimidade da Requerente para deduzir o pedido de declaração de ilegalidade e anulação das liquidações de CSR impugnadas, constituindo uma exceção dilatória de conhecimento oficioso que obsta a que o Tribunal conheça a questão de fundo e demais questões suscitadas, com a consequente absolvição da Requerida da instância, nos termos do disposto nos artigos 9.º do CPPT, 65.º da LGT, 55.º, n.º 1, alínea a) e 89.º, n.ºs 2 e 4, alínea e) do CPTA, ex vi artigo 29.º, n.º 1 do RJAT, ficando prejudicados todos os passos seguintes no iter cognoscitivo acima delineado.
-
Questões Prejudicadas
A procedência da questão prévia da ilegitimidade ativa da Requerente, prejudica o conhecimento das exceções de ilegitimidade substantiva e caducidade do direito de ação e impede o conhecimento do mérito da causa (v. artigos 608.º e 130.º do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT). Com referência ao indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa, dado tratar-se de uma mera ficção jurídica destinada a abrir a via contenciosa, servindo, no caso do processo arbitral tributário, para a fixação do dies a quo do prazo para apresentação do pedido arbitral, nos termos do art.º 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT, não tem este Tribunal de se pronunciar sobre a respetiva anulação ou confirmação.
-
Decisão
Atento o exposto, este Tribunal Arbitral Coletivo julga:
-
Procedente a exceção de incompetência material do Tribunal Arbitral para conhecer e decidir o pedido de declaração de ilegalidade e anulação dos atos de repercussão de CSR;
-
Improcedentes as exceções dilatórias de incompetência material do Tribunal Arbitral para apreciar os atos de liquidação de CSR e de ineptidão do pedido de pronúncia arbitral; e
-
Procedente a exceção ilegitimidade ativa da Requerente para deduzir o pedido de declaração de ilegalidade de atos de liquidação de CSR,
com a consequente absolvição da Requerida da instância (alíneas a e c)) e a condenação da Requerente no pagamento das custas do processo.
-
Valor do Processo
Fixa-se ao processo o valor de € 318.272,83 (trezentos e dezoito mil duzentos e setenta e dois euros e oitenta e três cêntimos), que corresponde à importância de CSR cuja anulação a Requerente pretende e não contestado pela Requerida, de harmonia com o disposto nos artigos 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”), 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 306.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, este último ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.
-
Taxa de Arbitragem
Fixam-se as custas no montante de € 5.508,00 (cinco mil quinhentos e oito euros), a suportar pela Requerente por decaimento, de acordo com o disposto nos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4 do RJAT e 4.º do RCPAT e com a Tabela I anexa ao RCPAT.
Notifique-se.
Lisboa, 24 de fevereiro de 2025
Os árbitros,
Alexandra Coelho Martins, relatora
Maria do Rosário Anjos
Pedro Miguel Bastos Rosado
(com declaração de voto vencido)
Declaração de voto de vencido
Votei vencido quanto à questão da procedência da exceção de ilegitimidade, bem como relativamente às considerações feitas sobre a repercussão na CSR e à matéria de fato dada como provada e não provada e sua fundamentação, pelas seguintes razões:
I) Questão da procedência da exceção de ilegitimidade
O regime da CSR, na versão anterior à Lei n.º 24-E/2022, de 30 de Dezembro, foi criado tendo em vista a repercussão nos consumidores das quantias cobradas a esse título pelos sujeitos passivos do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos.
Na verdade, no artigo 2.º da Lei n.º 55/2007, de 31 de Agosto (na redacção da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro, vigente em 2018 e 2019) estabelece-se que «o financiamento da rede rodoviária nacional a cargo da IP, S. A., tendo em conta o disposto no Plano Rodoviário Nacional, é assegurado pelos respetivos utilizadores e, subsidiariamente, pelo Estado, nos termos da lei e do contrato de concessão aplicável» e no n.º 3 do mesmo artigo (na redacção inicial) estabelece-se que «a contribuição de serviço rodoviário constitui a contrapartida pela utilização da rede rodoviária nacional, tal como esta é verificada pelo consumo dos combustíveis».
Resulta destas normas que, na perspectiva legislativa, o destinatário do encargo económico resultante da imposição da CSR é o consumidor de combustíveis, sendo as empresas comercializadoras, que devem efectuar o seu pagamento ao Estado, meras substitutas tributárias. Neste contexto, a repercussão da CSR nos consumidores de combustíveis é uma repercussão legal, já que é pretendida por lei.
A imposição constitucional do reconhecimento do direito de impugnação a quem for lesado por qualquer acto de natureza administrativa, que resulta do artigo 268.º, n.º 4, da CRP, leva a concluir que, tendo havido repercussão do tributo, é o repercutido o único lesado pela liquidação do tributo, quem tem legitimidade para impugnar os actos que afectaram a sua esfera jurídica, no exercício do direito de impugnação de todos os actos lesivos que lhe é constitucionalmente garantido.
Essa legitimidade do substituído para impugnação contenciosa é assegurada pelo artigo 18.º, n.º 4, alínea a), da LGT e pelos n.ºs 1 e 4 do artigo 9.º do CPPT, aplicáveis aos processos arbitrais tributários por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, na medida em que reconhecem legitimidade procedimental e processual aos contribuintes e a todos que forem obrigados tributários e mesmo a quem for titular de um interesse legalmente protegido.
Na pena de CASALTA NABAIS,
«Tanto é contribuinte o contribuinte directo, em relação ao qual o referido desfalque patrimonial ocorre directamente na sua esfera seja ele ou não o devedor do imposto, como o contribuinte indirecto, em relação ao qual o mencionado desfalque patrimonial ocorre na sua esfera através do fenómeno económico da repercussão do imposto».
A este respeito, costumam alguns autores distinguir entre contribuinte de direito e contribuinte de facto, sendo o primeiro a pessoa em relação à qual se verifica o pressuposto de facto do imposto, e o segundo o que, em virtude da repercussão, suporta economicamente o imposto. Todavia, o conceito de contribuinte é um conceito jurídico e a repercussão, quando legalmente prevista como é a regra dos impostos sobre o consumo, convoca o suportador do imposto não apenas em termos económicos, mas também em termos jurídicos, uma vez que, para além de uma obrigação jurídica de repercussão formal, temos uma de obrigação natural de repercussão material.
Por isso mesmo, não admira que a al. a) do n.º 4 do art. 18º da LGT fale de repercussão legal e reconheça legitimidade processual activa ao consumidor final ou adquirente de serviços para impugnar, administrativa ou judicialmente, o correspondente acto tributário. Um reconhecimento que a nossa jurisprudência já vinha aceitando e que, a nosso ver, é mesmo exigido pelo respeito do princípio da capacidade contributiva, uma vez que a capacidade contributiva, que em tais impostos se visa atingir, é efectivamente a do consumidor final ou do adquirente de serviços e não a do sujeito passivo do IVA» ( [11] )
De resto, uma interpretação do artigo 9.º, n.ºs 1 e 4, do CPPT no sentido da ilegitimidade do substituído para impugnar actos de liquidação que lesem a sua esfera jurídica, será materialmente inconstitucional, por incompatibilidade com aquele n.º 4 do artigo 268.º da CRP.
Por isso, mesmo que se possa aventar uma interpretação daquele artigo 9.º, n.ºs 1 e 4, do CPPT no sentido da ilegitimidade, ela seria de rejeitar por haver uma interpretação possível conforme à Constituição, que é a de reconhecer ao substituído o direito de impugnação.
O direito de o substituído impugnar os actos de liquidação subjacentes à repercussão decorre também do regime do artigo 132.º do CPPT, adequadamente interpretado.
Trata-se de um direito à anulação desses actos de liquidação, para obter o reembolso do imposto indevidamente liquidado e não meramente de um direito a indemnização pelo substituto.
Com efeito, embora o artigo 132.º do CPPT se refira expressamente aos casos de substituição com retenção na fonte, esse regime deve aplicar-se a todos os casos de substituição. ( [12] ) Na verdade, como foi esclarecido na redacção do n.º 2 do artigo 20.º da LGT introduzida pela Lei n.º 7/21, de 26 de Fevereiro, ao dizer que «a substituição tributária é efetivada, designadamente, através do mecanismo de retenção na fonte do imposto devido», a retenção na fonte do imposto devido é apenas uma das formas de substituição tributária ( [13] ) e os fundamentos do reconhecimento do direito de impugnação do substituído vale manifestamente para todas as situações de substituição.
A aplicação do regime do artigo 132.º, com as adaptações que eventualmente forem necessárias, a todos os casos de substituição tributária, inclusivamente sem retenção na fonte, decorre desde logo, do teor expresso da epígrafe da SECÇÃO VIII, em que está incluído o art. 132.º: «SECÇÃO VIII Da impugnação dos atos de autoliquidação, substituição tributária, pagamentos por conta e dos atos de liquidação com fundamento em classificação pautal, origem ou valor aduaneiro das mercadorias».
Nesta epígrafe nem se faz referência a «retenção na fonte», mas apenas a «substituição tributária», o que revela uma intenção legislativa, que acabou por ser mal traduzida na letra do artigo 132.º, de estabelecer um regime aplicável a todos os casos de substituição tributária.
A confusão dos conceitos, reduzindo os casos de substituição tributária aos de retenção na fonte, já vem do Código de Processo Tributário de 1991, mas poderá ter sido incentivada pelo infeliz art. 20.º da LGT, na redacção inicial, que dizia que «a substituição tributária é efectivada através do mecanismo da retenção na fonte do imposto devido», embora fosse evidente que havia casos de substituição sem retenção na fonte, como era, ao tempo, o caso de várias taxas, como, por exemplo, a «taxa anual de radiodifusão», prevista no DL 389/76, de 24 de Maio em cujo artigo 2.º, n.º 1, se estabelece que «é instituída uma taxa anual de radiodifusão de âmbito nacional, a cobrar em duodécimos, mensal e indirectamente, por intermédio das distribuidoras de energia eléctrica, a ela ficando sujeitos os consumidores domésticos de iluminação e outros usos». Outro exemplo, é a «taxa de seguração» criada pelo DL n.º 102/91 de 8 de Março, que opera através de um mecanismo de substituição tributária, nos termos do qual a operadora de transporte aéreo substitui o INAC na cobrança da taxa aos passageiros e substitui-se aos passageiros na entrega do seu valor ao INAC, a que se refere o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 06-09-2023, processo n.º 67/09.6BELRS.
A Lei n.º 7/2021, de 26 de Fevereiro, acabou por reconhecer expressamente que há substituição tributária sem retenção na fonte ao dizer que «a substituição tributária é efetivada, designadamente, através do mecanismo de retenção na fonte do imposto devido».
Mas, como se referiu, no citado acórdão do STA de 06-09-2023, acaba por se concluir, embora sem fundamentação explícita, que o artigo 132.º do CPPT, «exprime, no plano processual, um princípio material aplicável a todos os casos de substituição tributária».
Dando alguma solidez hermenêutica a esta conclusão, poderá dizer-se que a regra se aplicará com base numa interpretação extensiva: disse-se «retenção na fonte» no artigo 132.º do CPPT quando pretendia incluir-se na SECÇÃO VIII em que ele se insere o regime da impugnação dos actos praticados no âmbito de substituição tributária, independentemente de se tratar de casos em que ela opera através de retenção na fonte.
Em última análise, se se entendesse inviável uma interpretação extensiva (apesar do seu suporte expresso na epígrafe referida), em face do reconhecimento constitucional do direito de impugnação de todos os actos lesivos, sempre se teria de concluir que se estaria perante uma lacuna de regulamentação, que importaria preencher através da aplicação do regime do artigo 132.º, com as adaptações necessárias, por existir evidente paralelismo de situações de substituição com e sem retenção na fonte , que seria fundamento para a sua aplicação analógica.
O direito de reembolso do substituído a quem foi repercutido imposto liquidado com violação do Direito da União Europeia, é também assegurado, na interpretação que dele fez o TJUE no despacho do TJUE de 07-02-2022, processo n.º C-460/21:
«39 A obrigação de reembolsar os impostos cobrados num Estado-Membro em violação das disposições da União conhece apenas uma exceção. Com efeito, sob pena de conduzir a um enriquecimento sem causa dos titulares do direito, a proteção dos direitos garantidos na matéria pela ordem jurídica da União exclui, em princípio, o reembolso dos impostos, direitos e taxas cobrados em violação do direito da União quando seja provado que o sujeito passivo responsável pelo pagamento desses direitos os repercutiu efetivamente noutras pessoas».
«42 Por conseguinte, um Estado-Membro só se pode opor ao reembolso de um imposto indevidamente cobrado à luz do direito da União quando as autoridades nacionais provarem que o imposto foi suportado na íntegra por uma pessoa diferente do sujeito passivo e quando o reembolso do imposto conduzisse, para este sujeito passivo, a um enriquecimento sem causa. Daqui resulta que, se só tiver sido repercutida uma parte do imposto, as autoridades nacionais só estão obrigadas a reembolsar o montante não repercutido».
43 «... a questão da repercussão ou da não repercussão em cada caso de um imposto indireto constitui uma questão de facto que é da competência do órgão jurisdicional nacional, cabendo a este último apreciar livremente os elementos de prova que lhe tenham sido submetidos».
Como decorre desta jurisprudência, há uma obrigação de a Administração Tributária reembolsar os tributos cobrados em violação do Direito de União a quem efectivamente os suportou, pelo que no caso de tributos susceptíveis de repercussão, a titularidade do direito ao reembolso dependerá de ela ter sido ou não concretizada.
É corolário desta jurisprudência do TJUE que, no caso de ter havido repercussão, apenas o repercutido tem legitimidade para impugnar os actos que a concretizem ou os que a antecedam, pois apenas o repercutido é afectado na sua esfera jurídica pelo acto lesivo e o substituto só terá legitimidade na medida em que não tenha repercutido integralmente o tributo que suportou nessa qualidade.
No caso em apreço, entendemos que ocorreu efectivamente repercussão da CSR, pelo que apenas a Requerente é titular do direito ao reembolso.
Assim, não se coloca a questão da plúrima possibilidade de reembolso pela Autoridade Tributária e Aduaneira, pois, no caso de ter havido repercussão, apenas o repercutido tem direito ao reembolso.
De qualquer modo, é manifesto que não há qualquer fundamento legal nem lógico para os direitos económicos e processuais do repercutido, que pagou o tributo indevido, serem prejudicados pelo facto de poder também ser efectuado indevido reembolso do tributo às entidades que o repercutiram.
Pelo exposto, é nosso entendimento que deveria improceder a excepção da ilegitimidade substantiva e processual.
II – Considerações quanto à natureza da repercussão na CSR e à matéria de fato dada como provada e não provada e sua fundamentação
Vejamos a situação da fornecedora da Requerente:
No artigo 13º da Resposta, a Requerida refere que a fornecedora B..., S.A. é titular de estatuto fiscal no âmbito do ISP/CSR e, como tal, está habilitada a introduzir os produtos em causa no consumo e, consequentemente, pelo pagamento da CSR correspondente.
A fornecedora da Requerente declara expressamente que “a Contribuição de Serviço Rodoviário por si entregue, na qualidade de sujeito passivo, junto dos cofres do Estado, por referência ao combustível rodoviário fornecido à empresa A..., LDA (NIF:...), nos anos de 2019 a 2022, foi por si integralmente repercutida na esfera da referida empresa”.
Se o fornecedor não é um sujeito passivo com estatuto fiscal no âmbito do ISP/CSR, há a certeza que ele não pagou a CSR, pelo que teria de se fazer a prova de que houve pagamento por algum sujeito passivo e de que houve repercussão para o fornecedor e deste para o consumidor.
Assim, no caso de revendas em que o revendedor não seja sujeito passivo de CSR/ISP, só se poderia considerar provada a repercussão, se se provasse, mesmo por presunção, o pagamento por um sujeito passivo, que este declara que repercutiu num intermediário, e este declara que repercutiu no consumidor.
Todavia, não é essa a situação dos autos.
Não se provou quais as liquidações de CSR emitidas pela AT quanto ao combustível adquirido pela Requerente.
A Autoridade Tributária e Aduaneira afirma a impossibilidade de estabelecer qualquer correlação/correspondência entre os atos de liquidação praticados pelos sujeitos passivos de ISP/CSR e o alegado pela Requerente no pedido arbitral e os documentos juntos por este aos autos, de onde não constam quaisquer dados que permitam a associação às correspondentes liquidações.
No entanto, se foram emitidas liquidações de CSR, tendo como sujeitos passivos os fornecedores de combustíveis da Requerente, nos períodos a que se referem as facturas juntas aos autos, não se considera provado que a AT não as possa identificar, já que foi ela própria que as emitiu.
Na verdade, a liquidação da CSR era efectuada nos termos do Código dos Impostos Especiais de Consumo (CIEC) (artigo 5.º, n.º 1, da Lei n.º 55/2007, de 31 de Agosto, na redacção vigente em 2018/2019, introduzida pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro), e para os combustíveis em causa no âmbito de um fornecimento nacional, a introdução no consumo devia ser formalizada através da declaração de introdução no consumo (DIC), que deve ser processada até ao final do dia útil seguinte àquele em que ocorra a introdução no consumo (artigo 10.º, n.ºs 1 e 3, do CIEC).
Por isso, conhecidas as datas da introdução no consumo, afigura-se que não será inviável para a AT apurar qual a DIC que corresponde a cada uma das facturas e a liquidação que emitiu com base nessa DIC.
No que concerne às vendas efectuadas pela B..., S.A. à Requerente, afigura-se que, para além da declaração apresentada por esta (ponto G da matéria fixada), deve considerar-se provada por presunção, já que não é contrariada por qualquer meio de prova.
Na ausência de quaisquer elementos que suscitem dúvidas, a existência de repercussão do tributo no consumidor final numa situação em que a lei pretende que ela exista, como sucede com a CSR, tem de se presumir, à face das regras da experiência que os árbitros devem aplicar na fixação da matéria de facto, nos termos da alínea c) do artigo 16.º do RJAT, pois trata-se de uma situação normal, que corresponde ao andamento natural das coisas, quod plerumque accidit.
Neste caso, as dúvidas que pudessem subsistir sobre natureza de repercussão legal da CSR foram dissipadas pelo artigo 2.º do CIEC, na redacção da Lei n.º 24-E/2022, de 30 de Dezembro, que confirma a obrigatoriedade de repercussão em matéria de impostos especiais de consumo, ao dizer que "os impostos especiais de consumo obedecem ao princípio da equivalência, procurando onerar os contribuintes na medida dos custos que estes provocam, designadamente nos domínios do ambiente e da saúde pública, sendo repercutidos nos mesmos, em concretização de uma regra geral de igualdade tributária".
O artigo 6.º da mesma Lei atribui natureza interpretativa à nova redacção, pelo que se impõe a conclusão de que a repercussão é imposta por lei, quanto a todos os impostos especiais de consumo, inclusivamente a CSR, como já resultava anteriormente, quanto a esta dos artigos 2.º e 3.º da Lei n.º 55/2007, de 31 de Agosto.
Neste contexto, deve dizer-se que a presunção de repercussão quando esta está prevista na lei e não há qualquer facto que permita duvidar da correspondência do facto presumido à realidade, não é incompatível com o Direito da União, designadamente à face do Despacho do TJUE de 07-02-2022, proferido no processo C-460/21.
O que aí se refere, relativamente a prova de uma situação de enriquecimento sem causa, que constitui excepção ao direito ao reembolso de quantias cobradas em violação do Direito da União, é que «o direito da União exclui assim que se aplique toda e qualquer presunção ou regra em matéria de prova destinada a fazer recair sobre o operador em causa o ónus de provar que os impostos indevidamente pagos não foram repercutidos noutras pessoas e que visem impedir a apresentação de elementos de prova destinados a contestar uma pretensa repercussão (Acórdão de 21 de setembro de 2000, Michaïlidis, C-441/98 e C-442/98, EU:C:2000:479, n.º 42)».
Isto é, o que o TJUE considera incompatível com o Direito da União é a utilização exclusiva de uma presunção de repercussão para prova de uma situação excepcional de enriquecimento sem causa, derivada de omissão de repercussão, impedindo ao operador que devia fazer a repercussão a apresentação de elementos de prova destinados a demonstrar que não ocorreu.
Mas, no caso em apreço, o que está em causa não é a prova de uma situação de excepção, mas sim a prova da situação normal e não há obstáculos a que seja apresentada prova de que a repercussão não ocorreu. O que sucede, é que nenhuma prova foi apresentada que permita entrever que a repercussão não tenha ocorrido.
Pelo exposto, é nosso entendimento que o Tribunal deveria ter julgado improcedente a excepção da ilegitimidade, considerado provada a matéria de fato acima referida no que respeita ao pagamento e repercussão da CSR e apreciado o mérito do pedido.
Neste sentido, entre outros, os acórdãos proferidos nos processos nº 1015/2023-T e nº 882/2024-T, que subscrevemos.
O Árbitro
Pedro Miguel Bastos Rosado
[1] Dispõe o n.º 1 do artigo 4.º do RJAT o seguinte: “A vinculação da administração tributária à jurisdição dos tribunais constituídos nos termos da presente lei depende de portaria […]”.
[2] V. Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.
[3] V. decisões dos processos arbitrais n.ºs 31/2023-T, 508/2023-T, 520/2023-T e 675/2023-T.
[4] De referir ainda, a título de exemplo, as decisões arbitrais dos processos 564/2020-T, 629/2021-T, 305/2022-T, 644/2022-T, 665/2022-T, 702/2022-T, 24/2023-T, 113/2023-T, 294/2023-T, 332/2023-T e 410/2023-T.
[5] V. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 7/2019.
[6] V. Manual de Direito Fiscal, 2.ª edição, Almedina, 2019, p. 399.
[7] V. Manual de Direito Fiscal, 2.ª ed., p. 401.
[8] O artigo 2.º do Código dos IEC passou a dizer o seguinte: “Os impostos especiais de consumo obedecem ao princípio da equivalência, procurando onerar os contribuintes na medida dos custos que estes provocam, designadamente nos domínios do ambiente e da saúde pública, sendo repercutidos nos mesmos, em concretização de uma regra geral de igualdade tributária”.
[9] V. artigo 6.º da Lei n.º 24-E/2022, de 30 de dezembro.
[10] Acórdão de 6 de outubro de 1982, processo 283/81.
[11] CASALTA NABAIS, Direito Fiscal, 7.ª edição, páginas 243-244.
[12] Como, no essencial, entendeu o Supremo Tribunal Administrativo no acórdão de 06-09-2023, processo n.º 067/09.6BELR, identificando «o princípio segundo o qual tem direito ao reembolso o substituto em caso de entrega em excesso e o substituído em caso de pagamento ou retenção em excesso».
[13] Como já era entendimento doutrinal anterior, como pode ver-se em CASALTA NABAIS, Direito Fiscal, 7.ª edição, 2012, página 255, SÉRGIO VASQUES, Manual de Direito Fiscal, 2011, página 333, e ANA PAULA DOURADO, Direito Fiscal – Lições, 2016, página 73.