Decisão Arbitral
I. RELATÓRIO
A... (de ora em diante designado apenas por "Requerente"), casado, portador do Cartão de Cidadão nº …, válido até …, com o número de identificação fiscal …, residente na Rua de Campolide nº …, 2º Esq.o, em Lisboa, apresentou um pedido de constituição de tribunal arbitral singular, ao abrigo do disposto na alínea a) do n° 1 do artigo 2º e do artigo 10.0, ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributaria, doravante apenas designado por RJAT), com vista à declaração da ilegalidade dos actos de liquidação de Imposto do Selo ("IS"), emitidos pela Autoridade Tributária e Aduaneira ("AT"), com fundamento na verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo ("TGIS"), com data de 17 de Março de 2014 e relativos ao ano de 2013 que constam dos documentos de cobrança nºs 2014..., 2014 …, 2014 …, 2014…, 2014 …, 2014 …, 2014 …, 2014…, 2014 …, 2014 …, 2014 …, 2014 …, juntos com o pedido de pronúncia arbitral como docs. 1 a 12, na importância de € 4.201,79 (correspondente à primeira prestação do imposto liquidado) e consequente anulação daqueles actos.
Para o efeito, alega, em síntese, que:
1) É titular de um prédio urbano em propriedade vertical, composto por 5 pisos e 12 divisões de utilização independente todas destinadas a habitação e outras três afectas ao comércio, sito na Rua de …, n° … a …, e, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Campolide, em Lisboa, com o valor patrimonial global de € 1.244.948,15.
2) As liquidações do IS incidiram à taxa de 1% sobre a soma dos valores patrimoniais correspondentes aos andares ou divisões de utilizações independentes entre si, não obstante cada uma daquelas habitações ter um valor patrimonial tributável inferior a € 1.000.000, entendendo que a AT interpreta erradamente a norma constante da verba 28 da TGIS, na medida em que quer o prédio esteja inscrito em propriedade horizontal quer em propriedade vertical, a base tributável sujeita a IMI foi e é sempre o valor patrimonial de cada uma das divisões susceptíveis de utilização e arrendamento em separado, tal como o determina o nº 3 do art. 12.º do CIMI, não se aceitando que, para efeitos do Imposto do Selo, "deixe agora de se respeitar o que sempre foi regra de ouro quanto à autonomia das partes de prédios urbanos susceptíveis de arrendamento em separado";
3) Pois, já assim era no anterior Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola. A referida autonomia dada às partes dos prédios releva igualmente em sede de IRS, ao tributar-se as rendas recebidas das partes arrendadas, nunca se exigindo a constituição formal da propriedade horizontal, tratando o mesmo prédio de forma diferente;
4) Ao actuar como actuou a AT traiu igualmente o princípio da igualdade e da prevalência da verdade material, acabando por dar relevância à forma sobre a substancia;
5) O legislador ao aditar a verba 28º à TGIS, considerou como elemento determinante da capacidade contributiva, os prédios urbanos com afectação habitacional de elevado valor patrimonial, os "fogos de luxo", cujo valor patrimonial tributário ultrapassasse 1.000.000,00 euros, tal como resulta da discussão da lei n° 96/XII na Assembleia da República;
6) Pois se não fosse esse o pensamento do legislador, o de tributar os "fogos de luxo" e de "elevado valor" estaria a desrespeitar não só Princípio de Boa-Fé, como o Princípio da Segurança Jurídica, o Princípio da Confiança e o Princípio da Cooperação;
Se a vontade do legislador tivesse sido a de tributar os prédios que não estivessem no regime de propriedade horizontal, com valor patrimonial tributário ou superior aos € 1.000.000,00, certamente não deixaria de recomendar à AT que notificasse os proprietários dos prédios em propriedade vertical para, querendo, os constituir em propriedade horizontal, reforçando-se a certeza e segurança jurídica que deve existir entre administração e administrados;
8) A AT ao desconsiderar o valor patrimonial tributário de cada uma das habitações autónomas do prédio em causa nos autos, na liquidação da verba 28 da TGIS desrespeitou claramente a "ratio legis" do preceito, o qual só pode prever a incidência do imposto sobre os "fogos de luxo" com valor patrimonial tributário igual ou superior a € 1.000.000;
9) Pois sujeitar tais habitações a Imposto do Selo só pelo facto de inexistir instrumento jurídico que formalizasse a propriedade horizontal é negar totalmente o princípio que vigora me Direito Fiscal da "Prevalência da substância sobre a forma", devendo-se respeitar o estatuído no nº 3 do art. 11.º da LGT e não podendo a AT aplicar aquele princípio quando ele actua a seu favor, liquidando-se impostos e o despreze quando da sua aplicação se afastam incidências tributárias;
10) É inequívoco de que o valor patrimonial tributário, obrigatoriamente discriminado por cada uma das suas partes susceptíveis de arrendamento separado e com total autonomia económica entre si, produz exactamente os mesmos efeitos, seja celebrada ou não escritura de constituição de propriedade horizontal, quer no respeita ao Imposto do Selo de 1%, quer no que respeita ao I M I ou na tributação de cada um das parcelas arrendadas em sede de IRS;
Conclui pela ilegalidade das liquidações impugnadas, por errada interpretação das normas aplicáveis, devendo as mesmas ser anuladas na sua totalidade e consequentemente extintos os processos executivos a que deram causa.
A Requerente optou por não designar árbitro, pelo que foi designado árbitro singular pelo CAAD, de harmonia com o preceituado no n° 1 do artigo 6° e da alínea b) do n° 1 do artigo 11.º do RJAT.
O tribunal arbitral ficou constituído em 22-08-2014, em conformidade com o disposto na alínea c) do nº 1do artigo 11.0 do RJAT.
*
Notificada para o efeito, a Entidade Requerida apresentou resposta, na qual, invoca, em suma:
i. como questões prévias a não apresentação de documentos pelo Requerente susceptíveis de sustentar o pedido de pronúncia arbitral, nos termos da ai. d) do n° 2 do art. 10.º do RJAT, sendo que a sua resposta teve em conta os factos alegados na petição inicial, requerendo ainda que seja fixado o valor da causa em função do valor económico das liquidações de imposto do selo impugnadas, atendendo à discrepância entre a importância de € 4. 210,79, indicados na petição e o valor de € 4.113,16 inscrito no pedido final;
ii. "A verba 28 da TGIS dispõe recair imposto de selo sobre a propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial constante da matriz, nos termos do CIMI, seja igual ou superior a €1.000.000,00";
iii. Segundo a referida verba, em caso de prédios urbanos com afectação habitacional, o imposto recai sobre o valor patrimonial utilizado para efeitos de IMI;
iv. São sujeitos passivos do imposto do selo os sujeitos passivos de IMI, nos termos do art. 8.º do CIMI, sendo que são estes os sujeitos passivos que suportam o encargo do imposto de selo;
v. O facto tributário do imposto de selo da verba 28.1 consiste na propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do CIMI seja igual ou superior a € 1.000.000,00;
vi. "O valor patrimonial relevante para efeitos de incidência do imposto é, assim, o valor patrimonial total do prédio urbano e não o valor patrimonial de cada uma das partes que o componham, ainda quando susceptíveis de utilização independente, não havendo qualquer violação do teor literal da verba 28.1 da TGIS";
vii. O art. 80°, n° 2 do CIMI prevê que, a cada prédio corresponde um único artigo inscrito na matriz, salvo o disposto no art. 84º e 92º do mesmo Código, ou seja, com excepção dos prédios mistos e dos prédios constituídos em regime de propriedade horizontal, pois a cada a edifício em regime de propriedade horizontal corresponde uma só inscrição matricial, apesar de nos termos no n° 4 do a rt. 2.º do CIMI cada fracção autónoma constituir um prédio urbano;
viii. Nos termos do nº 3 do art. 12.º do CIMI, cada andar ou prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina de igual modo o respectivo valor patrimonial tributário, sobre o qual é liquidado o IMI;
ix. A unidade do prédio urbano em propriedade vertical composto por vá rios andares ou divisões não é afectada pelo facto de os mesmos serem susceptíveis de utilização económica e independente, não deixando de ser um único prédio, não podendo assim as suas partes distintas juridicamente serem equiparadas às fracções autónomas de um prédio constituído em propriedade horizonta1 ;
x. O valor patrimonial tributário de que depende a incidência do imposto do selo da verba 28.1 é o valor patrimonial global do prédio e não o de cada uma das suas partes independentes, não afastando esta interpretação o facto de a liquidação do IMI ser calculado em função do valor patrimonial tributário de cada uma dessas partes;
xi. Outra interpretação violaria a letra e o espírito da verba 28.1 da TGIS e o princípio da legalidade dos elementos essenciais do imposto, previsto no art. 103.º, nº2 da CRP, não tendo "seguramente" qualquer expressão na lei;
xii. Sendo inconstitucional a interpretação da referida verba 28.1, por ofensiva do princípio da legalidade tributária, "no sentido de o valor patrimonial de que depende a sua incidência ser apurado globalmente e não andar a andar ou divisão";
xiii. A tributação em causa não violou o princípio da igualdade, pois a propriedade vertical e a propriedade horizontal são institutos jurídicos diferenciados, implicando este último uma mera alteração jurídica, não dando lugar a uma nova avaliação, sendo que o legislador pode submeter a um enquadramento jurídico tributário distinto e discriminatório os prédios em regimes de propriedade horizontal e vertical, "sem que essa discriminação deva ser considerada necessariamente arbitrária"; e,
xiv. Concluí que:
a) A verba 28.1 da TGIS incide sobre os prédios urbanos com afectação habitacional;
b) O valor patrimonial igual ou superior a € 1.000.000,00 de que depende a aplicação dessa norma legal é, como resulta expressamente da sua letra, o valor patrimonial de cada prédio e não das suas partes distintas, ainda que susceptíveis de utilização independente;
c) Nessa medida, o imposto do selo da verba 28 foi correctamente liquidado."
*
Por se tratar de uma questão estritamente de direito, o tribunal arbitral decidiu dispensar a realização da reunião prevista no artigo 18.0 do RJAT, bem como em prescindir da apresentação de alegações, por proposta da entidade requerida e com o consentimento do requerente, por não se ter pronunciado em sentido contrário.
*
O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, de acordo com o disposto no a rt. 2.º, nº 1, ai. a) do RJAT.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciária, são legítimas e encontram-se regularmente representadas, conforme o disposto nos arts. 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e art. 1.º da Portaria n.0 112-A/2011, de 22 de Março.
O processo não enferma de nulidades e inexistem excepções de que cumpra conhecer ou que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
A Entidade Requerida vem suscitar como questões prévias a não apresentação de documentos pelo Requerente susceptíveis de sustentar o pedido de pronúncia arbitral, nos termos da ai. d) do nº 2 do a rt. 10.º do RJAT, sendo que a sua resposta teve em conta os factos alegados na petição inicial, requerendo ainda que seja fixado o valor da causa em função do valor económico das liquidações de imposto do selo impugnadas, atendendo à discrepância entre a importância de € 4.210,79, indicados na petição e o valor de € 4.113,16 inscrito no pedido final.
Vejamos.
Em relação à não apresentação de documentos, o Requerente indicou 13 documentos na sua petição inicial, tendo junto com o seu pedido de pronúncia arbitral as liquidações do Imposto do Selo constantes dos documentos de cobrança da primeira prestação daquela liquidação, designados sob os documentos nºs 1 a 12 e, por lapso, não juntou logo o documento assinalado sob o nº 13, relativo à caderneta predial do mencionado prédio em propriedade total, só o tendo o feito assim que foi notificado.
Os referidos documentos, incluindo o designado sob o nº 13 constituem documentos oficiais, emitidos pela própria AT, constantes no seu sistema informático, aos quais a Entidade Requerente tem naturalmente acesso, conhecendo perfeitamente o seu teor, não sendo por isso que deixou de apresentar resposta e até como a própria alega, por estar em causa, uma questão estritamente jurídica, o que a levou a requerer a dispensa da reunião arbitral prevista no art. 18.º do RJAT e da apresentação de alegações.
No que concerne ao valor da causa, atenta a petição do Requerente, bem como o teor dos documentos de cobrança que juntou sob os nºs 1 a 12 e dado que vem pedir a declaração de ilegalidade dos actos de liquidação relativos ao ano de 2013, constantes daqueles documentos e consequente anulação, muito embora peticione a parte respeitante à primeira prestação do imposto que lhe foi liquidado, na importância de 4.210,79 euros, a verdade é que o mesmo impugna os actos de liquidação do imposto do selo, cuja colecta para o ano de 2013 consta dos referidos documentos de cobrança, perfazendo um total de 12.449,49 euros, cuja anulação pretende.
Nestes termos, fixa-se o valor da causa em 12.449,49 euros, atento o disposto no art. 97.º-A do CPPT e nº 1 do art. 306. 0 do CPC, aplicáveis subsidiariamente, por força do disposto na ai. a) e e) do n° 1 do artigo 29.0 do RJAT, dispensando-se o exercício do contraditório, atenta a sua manifesta desnecessidade, nos termos do n° 3 do art. 3.º do CPC, igualmente de aplicação subsidiária, por força do disposto na ai. e) do art. 29.º do RJAT.
*
II. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. De facto
Com base nos elementos constantes do processo e com interesse para decisão, dão-se como provados os factos seguintes:
1. O Requerente é proprietário do prédio em propriedade total (que não constituído em regime de propriedade horizontal) com 7 pisos e 14 andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, sito na Rua de …, nº … a …, freguesia de …, Distrito de Lisboa, inscrito na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artigo …, com um valor patrimonial total de €1.628.211,03.
(cfr. Caderneta predial junta como documento n° 13 ao pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido.)
2. O identificado prédio em propriedade total apresenta a seguinte descrição: é composto de Cave, Loja, casa da porteira e quatro andares. Tem vãos por andar, sendo LOJA … -B E c- 7 divisões, 2 c.b, 2 ret, e cave; 1° Dtº - 9 divisões; 1º Esqº - 9 divisões; 2º Dtº - 9 divisões; 3 Dtº - 9 divisões; 3º Esq.º- 9 divisões; 40 Dtº- 9 divisões; 4º Esq.º 9 divisões; 5° - 2 divisões.
(cfr. Caderneta predial junta como documento nº 13 ao pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido.)
3. As divisões com utilização independente Casa da Porteira; 1º Dtº ; 1° Esq.º ; 2° Dtº; 2º Esq.º; 30 Dtº; 30 Esq.o; 4.º Dtº; 40 Esq.o; 50 Esq.o; 50 Pl e 50 P2 do sobredito prédio em propriedade total estão afectas a habitação, cujos valores patrimoniais tributários são, respectivamente de € 36.520,00; € 133.495,13; € 122.591,00; € 132.675,50; € 121.771,38; € 132.675,50; € 121.771,38; €132.675,50; € 121.771,38; 71.452,63; € 57.662,75 e € 59.926,00.
(cfr. Documentos de cobrança juntos cornos documentos nºs 1 a 12 e Caderneta predial junta como documento nº 13 ao pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido.)
4. O Requerente foi notificado da liquidação do I mposto do Selo do ano de 2013, com data de liquidação em 2014-03-17, constante dos documentos de cobrança para pagamento relativos à primeira prestação do imposto liquidado por cada andar ou divisão com utilização independente afecto a habitação, com a data limite de pagamento em Abril de 2013, nos termos a seguir discriminados:
2014 004209063
|
28.1
|
|
1.334,95
|
444,99
|
2
|
2014 004209066
|
28.1
|
|
1.225,91
|
408,65
|
3
|
2014 004209069
|
28.1
|
132.675,50
|
1.326,76
|
442,26
|
4
|
2014 004209072
|
28.1
|
121.771,38
|
1.217,71
|
405,91
|
5
|
2014 004209075
|
28.1
|
132.675,50
|
1.326,76
|
442,26
|
6
|
2014 004209078
|
28.1
|
121.771,38
|
1.217,71
|
405,91
|
7
|
2014 004209081
|
28.1
|
132.675,50
|
1.326,76
|
442,26
|
8
|
2014 004209084
|
28.1
|
121.771,38
|
1.217,71
|
405,91
|
9
|
2014 004209087
|
28.1
|
71.452,63
|
714,5
|
238,19
|
10
|
2014 004209090
|
28.1
|
57.622,75
|
576,23
|
192,09
|
11
|
2014 004209093
|
28.1
|
59.926,00
|
599,26
|
199,76
|
12
|
(cfr. Documentos de cobrança juntos cornos documentos n°s 1 a 12 ao pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido.)
5. Nos 12 documentos de cobrança do Imposto do Selo consta como Valor Patrimonial do Prédio - total sujeito a Imposto: 1.244.948,15.
(cfr. Documentos de cobrança juntos cornos documentos n°s 1 a 12 ao pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido)
6. As liquidações doIS supra foram efectuadas com fundamento na verba 28.1 da TGIS.
(cfr. Documentos de cobrança juntos cornos documentos n°s 1 a 12 ao pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido)
7. Foi apurado uma colecta de Imposto do Selo relativo ao ano de 2013, no montante total de 12.449,49 euros, sendo que a primeira prestação deste imposto liquidado perfaz a quantia de 4.210,79 euros.
(cfr. Documentos de cobrança juntos cornos documentos nºs 1 a 12 ao pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido).
7. Em 2014.06.16, a Requerente apresentou pedido de constituição do presente tribunal arbitral.
(cfr. Requerimento electrónico enviado ao CAAD)
Atentas as posições assumidas pelas partes e dado que a questão a dirimir por este tribunal arbitral é estritamente jurídica (adiante identificada), a factualidade provada teve por base o pedido de pronúncia arbitral, a resposta apresentada pela Requerida e os documentos oficiais, assinalados em cada um dos pontos da matéria de facto, os quais não foram impugnados.
Não existem outros factos não provados com interesse para a decisão da causa.
*
De Direito
A questão a decidir nos presentes autos arbitrais consiste em saber se os actos tributários de liquidação de Imposto do Selo são ilegais, por errónea interpretação da verba n° 28.1 da TGIS, aditada pela Lei n° 55-A/2012, de 29 de Outubro, ao se considera r que o valor patrimonial tributário ("VPT") de um prédio urbano em propriedade total (que não constituído em regime de propriedade horizontal), com andares ou divisões de utilização independente afectos a habitação, que releva para efeitos de incidência daquela verba é constituído pelo somatório do VPT imputado a cada um daqueles andares ou divisões.
Sobre a questão objecto dos presentes autos já se pronunciou o presente Tribunal Arbitral, nomeadamente nas decisões proferidas nos processos nºs 50/2013- T; 132/2013-T e 194/2014-T, cuja jurisprudência arbitral acompanhamos.
Conforme resulta da factualidade assente, os serviços da AT liquidaram IS ao Requerente, à taxa de 1%, por considerar que o VPT do prédio em propriedade total, do qual é titular, é superior a € 1.000.000, atendendo ao somatório do VPT das 12 divisões com utilização independente afectas a habitação, que compõem aquele prédio, enquadrando-o no na verba 28.1., utilizando para o efeito o VPT de cada uma daquelas divisões.
Alega o Requerente que a AT está a interpretar erradamente a verba 28 da TGIS, pois, quer o prédio esteja inscrito na matriz predial em propriedade horizontal, quer em propriedade vertical, a base tributável sujeita a IMI foi e é sempre o valor patrimonial de cada de uma das referidas divisões com utilização independente, tanto mais que, para efeito desde último imposto, a colecta sempre foram calculadas sobre o valor patrimonial de cada uma daquelas divisões, como se o prédio em questão estivesse inscrito na matriz predial em regime de propriedade horizontal e não o VPT global do prédio urbano.
Por sua vez, a Requerida sustenta, em síntese que, o VPT que releva para efeitos de incidência da verba 28.1 da TGIS é o VPT total do prédio urbano e não o VPT de cada umas das partes que compõem o prédio em propriedade vertical, ainda que susceptíveis de utilização independente.
Vejamos.
O art. 4.º da Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro veio aditar à TGIS a verba n° 28, com a redacção seguinte:
"28 - Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1 000 000 - sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:
28.1 - Por prédio com afetação habitacional - 1 %;
28.2 - Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças - 7,5 %."
(itálico nosso)
Dispondo o art. 6.º da supra citada Lei quanto ao ano de 2013 que, "a liquidação do imposto do selo previsto na verba n. 0 28 da respetiva Tabela Geral deve incidir sobre o mesmo valor patrimonial tributário utilizado para efeitos de liquidação de imposto municipal sobre imóveis a efetuar nesse ano."
À data dos factos, são assim pressupostos de incidência da verba 28. 1da TGIS os prédios urbanos, com afectação habitacional, cujo VPT constante da matriz, nos termos do CIMI, seja igual ou superior a 1.000,000,00 euros.
No que toca à verba nº 28 aditada pela Lei em referência, esta veio ainda estabelecer várias alterações ao CIS, nomeadamente quanto à sua liquidação e pagamento, remetendo expressamente para as regras previstas no CIMI (cfr. art. 23º, nº 7, art. 44°, n° 5, art. 46°, n° 5, art. 49. 0 , n° 3 do CIS) com as devidas adaptações, prevendo-se que, no o 2 do art. 67.0 do CIS, na redacção alterada por aquela Lei, "Às matérias não reguladas no presente Código respeitantes à verba n.º 28 da Tabela Geral aplica-se, subsidiariamente, o disposto no CIMI."
Das referidas normas, constata-se que o conceito de "prédio com afectação habitacional" previsto na sobredita verba n° 28, nº 1 não se encontra definido no CIS, nem na citada Lei, nem no CIMI, cujas normas são de aplicação subsidiária, conforme disposto no nº 2 do art. 67.º do CIS.
Na interpretação da verba 28.1 da TGIS haverá assim que atender ao disposto no art. 9.º do Código Civil, aplicável por força do disposto do nº 1 do art. 11.º da LGT. Sobre esta questão, já se pronunciou este Tribunal Arbitral na decisão proferida no processo n° 53/2013-T, que aqui acompanhamos, ao entender-se que um "prédio com afectação habitacional" terá «de ser um prédio que já tenha efectiva afectação a esse fim».
É inequívoco que um prédio em propriedade total ou em regime de propriedade vertical constitui um prédio urbano, nos termos do disposto nos artigos. 2º e 4º do CIMI, aplicáveis subsidiariamente por força do disposto no art. 67.º do CIS, sendo certo também que, quer para efeitos de incidência da verba 28. 1 da TGIS, quer para efeitos de classificação de prédios urbanos, nos termos do disposto do art. 6.º do CIMI (também de aplicação subsidiária), o legislador não faz distinção entre prédios constituídos entre propriedade vertical e em regime de propriedade horizontal (tal como mencionado nas decisões arbitrais proferidas nos processos n°s 50/2013-T e 132/2013-T), sendo pressuposto tributário da verba 28.1 os prédios urbanos que efectivamente já estão afectos a habitação.
Qual será então o valor patrimonial tributário relevante no caso de prédios em propriedade total composto por andares ou divisões susceptíveis de utilização independente com "afectação habitacional", para efeitos de incidência da verba 28.1?
O valor patrimonial tributário de cada prédio é determinado nos termos do art.38.º e seguintes do CIMI. No caso de um prédio em regime d.e propriedade total ou vertical, cada andar ou divisão com utilização independente que o integra é igualmente sujeito a avaliação, em conformidade com o disposto nos artigos 12.o, 38.0 e seguintes daquele normativo, sendo atribuído um valor patrimonial tributário a cada uma daquelas divisões com utilização independente.
Com efeito, o n.º 1 do art. 12.º do CIMI estabelece que "as matrizes prediais são registos de que constam, designadamente, a caracterização dos prédios, a localização e o seu valor patrimonial tributário, a identificação dos proprietários (...)", preceituando o seu n° 3 que 12.º do CIMI, "Cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respectivo valor patrimonial tributário", e, em conformidade com o disposto no nº 1 do art. 119.º do CIMI, é sobre aquele valor patrimonial separadamente considerado que será apurado e liquidado o IMI em relação a cada andar ou parte com utilização independente que integram um prédio urbano em regime de propriedade vertical ou total, atenta a autonomia de cada uma daquelas partes.
Como escrevem Silvério Mateus e Freitas Corvelo (in "os Impostos sobre o Património Imobiliário e O Imposto do Selo, Comentados e Anotados", 1ª Edição, Engifisco, págs. 159 e 160)," Um outro aspecto que deve ser evidenciado na matriz tem a ver com a necessidade de fazer relevar a autonomia que, dentro do mesmo prédio, pode ser atribuído a cada uma das suas partes, funciona/ e economicamente independentes. Nestes casos, a inscrição matricial não só deve fazer a referência a cada uma destas partes como deve fazer referência expressa ao valor patrimonial correspondente a cada uma delas.
Um exemplo que pode ilustrar esta situação é o caso de um prédio urbano, não constituído em regime de propriedade horizontal e que seja composto por vários andares. (...) Porém, como cada uma destas unidades pode ser objecto de arrendamento ou de outra qualquer utilização por parte do respectivo titular, a matriz deve evidenciar essas unidades e deve ser atribuído valor patrimonial a cada uma delas."
Tal como evidenciado no Acórdão arbitral proferido no processo nº 194/2014-T, que aqui acompanhamos, "o Código do !MI consagra, quer quanto à inscrição matricial e discriminação do respectivo valor patrimonial tributário, quer quanto à liquidação do imposto, a autonomização das partes de prédio urbano susceptíveis de utilização independente e a segregação/ individualização do VPT relativo a cada andar ou parte de prédio susceptíve/ de utilização independente.
Assim a cada prédio, nos termos conceptualmente definidos pelo artigo 2.o do CIMI, corresponde um único artigo na matriz (nº 2 do artigo 82.0 do CIMI) mas, segundo o nº 3 do art. 12.0 do mesmo Código, referente ao conceito de matriz predial (...), "cada andar ou andar ou parte de prédio susceptíve/ de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respectivo valor patrimonial tributário (...).
Quanto à liquidação do IMI - aplicação da taxa à base tributável - o art. 119.0, n. o 1 dispõe que "o competente documento de cobrança" contém a "discriminação dos prédios, suas partes susceptíveis de utilização independente, respectivo valor patrimonial tributário e da colecta (...)".
Ou seja, a regra é a autonomização, a caracterização como "prédio" de cada parte de um edifício, desde que funciona/ e economicamente independente, susceptível de utilização independente, de acordo com o conceito de prédio definido logo no n° 1 do artigo 2° do CIMI: prédio é toda a fracção (de território, abrangendo águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência) desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica."
Assim, quando o n° 4 do artigo 2º dispõe que "Para efeitos deste imposto, cada fracção autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio", não consagra propriamente um regime excepcional ou especial para os prédios em propriedade horizontal.
Afinal, cada edifício em propriedade horizontal (artigo 92º do CIMI) tem apenas uma só inscrição matricial (nº 1), descrevendo-se genericamente o edifício e mencionando se o facto de ele se encontrar em regime de propriedade horizontal (nº 2) e a autonomia matricial concretiza-se na atribuição a cada uma das fracções autónomas, pormenorizadamente descrita e individualizada, de uma letra maiúscula, segundo a ordem alfabética (nº 3). Esta parece ser a especificidade dos edifícios em propriedade horizontal; nos outros casos, de prédios em propriedade vertical ou total, as divisões ou andares com autonomia mas sem o estatuto de propriedade horizontal, a matriz consagra também a autonomia mas evidenciando as unidades com indicação do tipo de piso/andar."
(itálico nosso)
Com efeito, quando um prédio urbano constituído em propriedade total passa ao regime de propriedade horizontal mantém o mesmo número de artigo matricial, mantendo-se de igual modo o valor patrimonial tributário que foi atribuído a cada uma das suas partes autónomas ou andares, passando aquelas fracções a serem identificadas por letras do alfabeto, uma vez que não há lugar a uma nova avaliação, verificando-se apenas uma alteração meramente jurídica do regime do prédio.
Considerando assim que à luz do CIMI as regras e princípios são os mesmos, quer para os prédios constituídos em propriedade horizontal, quer para os prédios constituídos em propriedade total ou vertical, nomeadamente no que se dispõe quanto à avaliação e determinação do VPT, inscrição na matriz e liquidação de IMI, sendo que cada andar ou divisão com utilização independente é tratada da mesma forma que uma "fracção autónoma", necessariamente, as regras terão de ser as mesmas em sede de Imposto do Selo, por aplicação subsidiária, como impõe o nº 2 do art. 67.0 do CI.
Em conformidade, e, no pressuposto que o legislador em causa «consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados» (de acordo com o preceituado no n° 3 do art. 9.° CCv, por remissão do art. 11.º da LGT), só estão abrangidas pela norma de incidência da verba 28.1 da TGIS os andares, partes ou divisões com utilização independente com afectação habitacional, cujo VPT constante da matriz, seja igual ou superior a € 1.000.000,00.
Tal como salientado na decisão arbitral proferida no processo nº 132/2013-T, "O critério uniforme que se impõe é, assim, o que determina que a incidência da norma em causa apenas tenha lugar quando alguma das partes, andares ou divisões com utilização independente de prédio em propriedade horizontal ou total com afectação habitacional, possua um VPT superior a €1.000.000,00" (sublinhado nosso) e não quando este VPT resulta do somatório do VPT imputado a cada andar ou divisão com utilização independente.
Conforme também mencionado na decisão arbitral proferida no processo n.º 50/2013-T "O critério pretendido pela AT, de considerar o valor do somatório dos VPT atribuídos às partes, andares ou divisões com utilização independente, com o argumento do prédio não se encontrar constituído em regime de propriedade horizontal, não encontra sustentação legal e é contrário ao critério que resulta aplicável em sede de CIMI e, por remissão, em sede de IS.
Ao que acresce o facto da própria lei estabelecer expressamente, na parte final da verba 28 da TGIS, que o IS a incidir sobre os prédios urbanos de valor igual ou superior a €1.000.000,00 - "sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI."
Assim, a adoção do critério defendido pela AT viola os princípios da legalidade e da igualdade fiscal, bem assim como, o da prevalência da verdade material sobre a realidade jurídico-formal."
(itálico nosso)
Em face do antedito, não podemos concordar com a Entidade Requerida ao afirmar que a interpretação aqui acolhida e defendida pelo Requerente viola o princípio da legalidade tributária, previsto no n° 2 do art. 103.º da CRP, por alegadamente ofender a letra e o espírito da verba 28.1. da TGIS. Bem, pelo contrário, a ATA é que viola o princípio da legalidade tributária, pondo em causa o princípio da segurança jurídica e da protecção da confiança.
A própria Requerida ao fazer um breve périplo pelas normas do anterior Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola, Contribuição Autárquica e das normas constantes do C.l.M.I. reconhece a relevância da autonomia que "dentro do mesmo prédio, pode ser atribuída a cada uma das suas partes, económica e funcionalmente independentes", para efeitos de inscrição na matriz predial.
Tanto assim é que, a AT para liquidar a verba 28.1 da TGIS, aqui em causa, parte de cada um daqueles andares ou divisões com utilização independente, fazendo incindir a taxa de 1% sobre o valor patrimonial tributário atribuído a cada uma daquelas divisões com afectação habitacional, de acordo com as normas do CIMI, à semelhança do que acontece com as "fracções autónomas", para depois somar aquele valor patrimonial tributário, descurando que o prédio em questão é composto por mais divisões com utilização independente afectas a fins comerciais e serviços.
A interpretação no sentido de que o que releva na norma de incidência da verba 28.1 da TGIS é o VPT imputado a cada das partes autónomas ou divisões com utilização independente com afectação habitacional e não o valor resultante da soma daqueles VPT's é a que resulta igualmente da sua ratio legis, conforme impõe o nº 1 do art. 9.0 do CCv, aplicável por força do disposto no art. 11.º da LGT.
A este propósito, acompanhamos a decisão arbitral proferida no processo nº 50/2013-T ao referir que "O legislador ao introduzir esta inovação legislativa considerou como elemento determinante da capacidade contributiva os prédios urbanos, com afetação habitacional, de elevado valor (de luxo), mais rigorosamente, de valor igual ou superior a €1.000.000,00, sobre os quais passou a incidir uma taxa especial de imposto de selo, pretendendo introduzir um princípio de tributação sobre a riqueza exteriorizada na propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos de luxo com afetação habitacional. Por isso, o critério foi de aplicação da nova taxa aos prédios urbanos com afetação habitacional, cujo VPT seja igual ou superior a €1.000.000,00.
Isso mesmo se concluí da análise da discussão da proposta de lei n° 96/XII na Assembleia da República, disponível para consulta no Diário da Assembleia da República, I série, n° 9/XII/2, de 11 de outubro de 2012.
A fundamentação da medida designada por "taxa especial sobre os prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor" assenta na invocação dos princípios da equidade social e da justiça fiscal, chamando a contribuir de uma forma mais intensa os titulares de propriedades de elevado valor destinadas a habitação, fazendo incidir a nova taxa especial sobre as "casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros."
Claramente o legislador entendeu que este valor, quando imputado a uma habitação (casa, fração autónoma ou andar com utilização independente) traduz uma capacidade contributiva acima da média e, enquanto tal, suscetível de determinar um contributo especial para garantir a justa repartição do esforço fiscal."
(itálico nosso)
De acordo com a factualidade assente, o VPT de cada um dos dozes andares ou divisões com utilização independente afectos a habitação, que integram o prédio em propriedade total do qual o Requerente é titular, e, que foi determinado segundo as regras do CIMI, não ultrapassa € 1.000.000,00, pelo que, não estão assim reunidos os pressupostos de tributação da verba 28.1 da TGIS.
Com efeito, tal como alega e bem o Requerente, se este tivesse optado por constituir o prédio supra em regime de propriedade horizontal, a verdade é que as 12 partes ou fracções autónomas não estariam cada uma delas sujeitas à verba 28. 1 da TGIS, não havendo assim lugar à liquidação do Imposto do Selo.
Não pode assim a AT, ao contrário do que defende, vir arbitrariamente e de forma discriminatória somar os VPT de cada umas partes ou divisões com utilização independente que compõem o prédio em propriedade total com afectação habitacional, quando o próprio legislador não faz distinção entre prédios constituídos em propriedade total e constituídos em regime de propriedade horizontal, nem aquele determina a obrigatoriedade da constituição de propriedade horizontal, sob pena de se violar o princípio da igualdade fiscal. Pelo que, não assiste razão à entidade requerida quando alega que a tributação operada pela AT não viola o princípio da igualdade tributária, defendendo que, o legislador pode submeter a um enquadramento jurídico tributário distinto os prédios em regime de propriedade horizontal e vertical, sem que essa discriminação seja arbitrária, pois, ao proceder como procedeu, acaba por diferenciar e discriminar negativamente o Requerente em função da situação jurídica do prédio, pois se este estivesse constituído em regime de propriedade horizontal não haveria lugar a liquidação do Imposto do Selo, apesar de se tratar da mesma rea 1 idade física.
Aliás, a própria entidade requerida admite que o regime de constituição em propriedade horizontal consubstancia apenas uma mera alteração jurídica do prédio, uma vez que não há lugar a uma nova avaliação, não se alterando assim o valor patrimonial tributário das partes autónomas que o integram.
Tanto mais que, o prédio em questão é composto por outros andares ou divisões com utilizações independentes afectos a outros fins, como comerciais e serviços, não podendo a entidade requerida, de forma arbitrária, repita-se, somar apenas o VPT das divisões independentes com afectação habitacional, para atingir um valor patrimonial tributário igual ou superior a € 1.000.000,00. Pois, seguindo o raciocínio da AT, ao defender que é pressuposto de incidência da verba 28. 1 da TGIS o valor patrimonial global do prédio e não e de cada uma das suas partes, então não pode aquela vir tributar o imposto, dado que o prédio do qual o Requerente é titular é composto por andares ou divisões com utilização independente que estão afectos a habitação, a comércio e a serviços, perfazendo um valor patrimonial tributário total de € 1.628.211,03, não estando assim reunidos os pressupostos de facto e de direito da incidência da verba 28.1 da TGIS, uma vez que os seus andares não estão só afectos a habitação.
Em face do exposto, atenta a matéria de facto dada por provada, como o valor patrimonial tributário de cada um dos andares ou divisões com utilização independente do prédio, afectos a habitação, é inferior a 1.000.000,00 euros, as mesmas não se subsumem na verba 28.1 da TGIS.
Pelo que, os actos de liquidação de IS, objecto do presente processo de pronúncia arbitral, padecem do vício de violação do disposto na verba 28.1 da TGIS, por erro sobre os seus pressupostos de direito, declarando-se assim a ilegalidade daqueles actos de liquidação, com a consequente anulação dos mesmos.
Fica assim prejudicada a apreciação das demais questões suscitadas pelo Requerente, por ter sido declarada a ilegalidade das liquidações supra, por vício que impede a renovação dos actos, de harmonia com o preceituado no art. 124.º do CPPT, subsidiariamente aplicável por força do disposto no nº1 do art. 29.º do RJAT.
III. DECISÃO
Nestes termos e na fundamentação exposta, o presente Tribunal Arbitral decide julgar procedente o pedido de declaração de ilegalidade dos actos de liquidação de Imposto do Selo, constante dos documentos de cobrança nº 2014 …, 2014 …, 2014 …, 2014 …, 2014 …, 2014…, 2014…, 2014…, 2014…, 2014…, 2014 …, 2014 …, com a consequente anulação dos mesmos.
Fixa-se o valor do processo em € 12.449,49, em conformidade com o disposto na ai. a) do nº 1 do art. 970-A do CPPT e nº 2 do art. 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, bem como do art. 306.º do CPC.
Custas a cargo da Entidade Requerida, no montante de € 918,00, em conformidade com o disposto no nº 4 do art. 22.º do RJAT e do nº 4 do artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e da Tabela I anexa ao mesmo Regulamento.
Notifique.
Lisboa, 20 de Fevereiro de 2015.
A árbitro,
(Conceição Pinto Rosa)