Sumário:
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Estando em causa liquidações de IMI, na sequência da inscrição de prédio à respetiva matriz, é aplicável o regime previsto no n.º 3 do artigo 113º do CIMI e não o decorrente do n.º 1 do versado preceito.
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Tendo o retardamento das liquidações de IMI por base uma avaliação efetuada por iniciativa da AT, sem que a contribuinte em nada tenha contribuído para o atraso, é ilegal a liquidação de juros compensatórios.
DECISÃO ARBITRAL
I. RELATÓRIO
I.1
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Em 29 de agosto de 2024 a contribuinte A... (SUCURSAL EM PORTUGAL) (doravante Requerente), com o NIPC..., com sede no ..., ..., ..., ..., ...- ... ... - ..., Cascais, requereu, nos termos e para os efeitos do disposto do artigo 2.º e no artigo 10.º, ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, a constituição de Tribunal Arbitral com designação do árbitro singular pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 6.º do referido diploma.
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O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e foi notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira (de ora em diante designada por AT ou “Requerida”) no dia 06 de setembro de 2024.
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A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 5.º, n.º 2, alínea b) e artigo 6.º, n. º1, do RJAT, o signatário foi designado pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD para integrar o presente Tribunal Arbitral singular, tendo aceitado nos termos legalmente previstos.
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O Tribunal Arbitral foi constituído em 11.11.2024.
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No dia 11.11.2024 o Tribunal proferiu um despacho a ordenar a notificação da Requerida para apresentar a sua resposta.
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Após prorrogação do prazo, a AT apresentou a sua resposta em 08 de janeiro de 2025.
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Por despacho de 09.01.2025 foi dispensada a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e as partes foram notificadas para, querendo, apresentarem as suas alegações.
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A Requerente apresentou as suas alegações em 24.01.2025.
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A Requerida apresentou as suas alegações em 27.01.2025.
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Pretende a Requerente que o Tribunal Arbitral declare a ilegalidade dos atos de liquidação de IMI referentes ao período de tributação de 2019 (liquidação n.º 2022 ...), 2020 (liquidação n.º 2022...) e 2021(liquidação n.º 2021 2022...), a restituição da quantia paga, acrescida de juros indemnizatórios e a condenação da Requerida nas custas processais.
I.2. A Requerente sustenta o seu pedido, em síntese, nos seguintes termos:
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Em 2023, por iniciativa da AT, foi realizada uma nova avaliação ao parque eólico de ..., que veio alterar o Valor Patrimonial Tributário do prédio em questão, nos termos do artigo 38.º do Código do IMI (doravante CIMI), atribuindo-lhe um VPT de 2.031.180,00 Euros (dois milhões trinta e um mil cento e oitenta euros).
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Na sequência desta avaliação, foram notificadas as liquidações de IMI relativas ao ano de 2019, 2020 e 2021, com os valores apurados a partir do novo VPT.
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A avaliação é posterior ao período de liquidação em causa, violando o disposto no artigo 113.º n.º 1 do CIMI, bem como, o artigo 103.º n.º 3 da Constituição da República Portuguesa.
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É evidente que a quantificação da prestação tributária efetuada nos atos de liquidação em apreço é um atentado quanto à segurança jurídica da Requerente, minando a previsibilidade e a confiança de pagamento de impostos apurados com base no VPT apurado à data dos factos tributários.
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Para além das liquidações do imposto, a AT também liquidou juros compensatórios no valor total de 1.047,74 Euros (mil e quarenta e sete euros e setenta e quatro cêntimos).
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Relativamente ao IMI liquidado relativo ao ano de 2019, este foi alvo de uma revisão oficiosa que determinou o reembolso do valor pago no momento.
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No caso do IMI liquidado em 2020, este foi alvo de uma reclamação graciosa cujo resultado foi o mesmo – o deferimento do pedido e a consequente anulação dos atos de liquidação de IMI referentes a esse ano.
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Em ambos os casos, demonstrando-se a assunção de um erro, não por parte da Requerente, mas imputável à Autoridade Tributária.
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Pelo que não se concede a liquidação – manifestamente ilegal – de juros compensatórios.
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Sendo a presente pronúncia arbitral considerada procedente, deve a Requerente ser reembolsada do montante indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios nos termos do artigo 43.º, n.º 1 e 100.º n.º 1 da LGT.
I.3 Na sua Resposta a AT, invocou, o seguinte:
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Uma vez que os atos tributários de liquidação de IMI são respeitantes a um prédio omisso na matriz, in casu, um parque eólico, o valor patrimonial tributário será necessariamente o que for resultante do procedimento avaliativo despoletado pela AT (cf. n.º 4 do artigo 37.º e n.º 3 do artigo 113.º do Código do IMI) com base nas características do (novo) prédio a avaliar.
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Não será, por conseguinte, aplicável ao presente caso a regra estatuída no n.º 1 do artigo 113.º do Código do IMI, como defende a Requerente, mas sim o regime dos prédios omissos a que alude o n.º 3 do preceito, liquidando-se o imposto que for devido assim que o procedimento de avaliação torne definitivo o valor patrimonial aí apurado.
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Atento o enquadramento normativo supra evidenciado, não será de colher a arguida violação do princípio constitucional da proibição da retroatividade fiscal, enunciada no n.º 3 do artigo 103.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), e replicada em diversos preceitos da lei tributária.
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Vem ainda peticionado o pagamento de juros indemnizatórios nos artigos 55.º a 60.º do ppa, sem que, contudo, lhe assista razão, uma vez que, à data dos factos, a Administração Tributária fez a aplicação da lei, vinculadamente pois como órgão executivo está adstrita constitucionalmente.
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Donde necessariamente se conclui que não se verifica nenhum erro imputável aos serviços, não estando assim preenchido o requisito previsto no n.º 1 do artigo 43º da LGT
II. SANEAMENTO
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade nos termos dos artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e do artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março e encontram-se legalmente representadas.
O Tribunal é competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º e 6.º, todos do RJAT.
O processo é o próprio.
Inexistem questões prévias que cumpra apreciar nem vícios que invalidem o processo.
Impõe-se agora, pois, apreciar o mérito do pedido.
III. – MATÉRIA DE FACTO
III.1. Factos provados
Antes de entrar na apreciação das questões, cumpre apresentar a matéria factual relevante para a respetiva compreensão e decisão, a qual, examinada a prova documental e tendo em conta os factos alegados, se fixa como segue:
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A atividade da requerente consiste no planeamento e construção de parques eólicos em Portugal, assim como a produção de energia eólica.
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A Requerente detém uma licença de exploração para o parque eólico de ..., sito na freguesia de..., conselho de ... .
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Este parque eólico é constituído por nove aerogeradores.
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A Requerente apresentou em 11.01.2022, um requerimento de revisão oficiosa das liquidações de IMI relativas aos anos de 2013 a 2018 relativamente a 9 prédios urbanos inscritos na matriz com os números ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ... da União de Freguesias de ... e ..., do Concelho de ... .
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A revisão oficiosa (proc, n.º ...2022...) foi julgada (decisão datada de 24.11.2022) parcialmente procedente, sendo anuladas as liquidações de 2017 e 2018 e mantidas as demais.
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Em resultado da revisão oficiosa foram eliminados da matriz aqueles prédios e o parque eólico ficou omisso.
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O parque eólico foi inscrito na matriz, tendo dado origem ao prédio inscrito na matriz predial urbana sob o n.º ... da União de freguesias de ... e ..., concelho de... .
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Em 2023, por iniciativa da AT, foi realizada uma nova avaliação ao parque eólico de ..., atribuindo-lhe um VPT de 2.031.180,00 Euros (dois milhões trinta e um mil cento e oitenta euros).
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Na sequência desta avaliação, a AT efetuou (22.03.2024) e notificou a Requerente das liquidações de IMI relativas ao ano de 2019, 2020 e 2021, com os valores apurados a partir do novo VPT, incluindo juros compensatórios (€554,26, €368,61 e €124,87).
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As liquidações foram todas pagas em 21.05.2024.
III.2. Factos não provados
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O IMI liquidado relativo ao ano de 2019 foi alvo de uma revisão oficiosa que determinou o reembolso do valor pago. (art. 51º do ppa)
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O IMI liquidado em 2020 foi alvo de uma reclamação graciosa cujo resultado foi o deferimento do pedido e a consequente anulação dos atos de liquidação de IMI referentes a esse ano (art. 52º do ppa).
III.3. Motivação da matéria de facto
Os factos provados integram matéria não contestada e documentalmente demonstrada nos autos.
Os factos que constam dos números 1 a 10 são dados como assentes pela análise dos documentos 1 a 5 juntos pela Requerente, com o pedido de pronúncia arbitral (doravante apenas ppa.) e pela posição assumida pelas partes.
Quanto aos factos dados como não provados, começando pelo primeiro facto, o pedido de revisão oficioso junto no ppa como documento n.º 4 é referente apenas aos anos de 2013 a 2018 e não é relativo a 2019. Por conseguinte, não havendo mais elementos de prova, foi dado como não provado que a Requerente tenha pedido a revisão oficiosa do IMI de 2019.
Quanto ao segundo facto dado como não provado, o documento n.º 7 do ppa é um procedimento de reclamação graciosa. Contudo, não é da Requerente nem é relativo aos prédios em causa. Deste modo, foi dado como não provado que a requerente tivesse apresentado uma reclamação graciosa contra as liquidações de IMI de 2020.
IV. Do Direito
Norma habilitante
A questão a decidir no presente processo consiste em saber se uma avaliação feita pela AT (apuramento do VPT de um prédio) em 2023 pode, ou não, ser utilizada para efetuar as liquidações de IMI dos anos de 2019, 2020 e 2021.
Importa começar por referir que, estando em 2023 o prédio em causa omisso, o art. 113º, n.º3 do CIMI determina que logo que a avaliação de prédio omisso, se torne definitiva, liquida-se o imposto a que houver lugar, com observância do disposto no n.º 1 do artigo 116.º.
A norma habilitante que permite o direito à liquidação é a prevista no art. 113º, n.º3 do CIMI.
Por sua vez o art. 116º, n.º1 do CIMI limita o direito à liquidação ao prazo de caducidade previstos nos arts. 45º e 46º da LGT. “A liquidação quanto aos prédios referidos, no paragrafo anterior [prédios omissos], apenas é possível de ser efetuada dentro do prazo de caducidade. (…)” In Tributação do Património, António Santos Rocha e outros, 3ª edº, Almedina, 2022, pág. 369
O art. 45º, n.º1 da LGT prevê que o prazo de caducidade é de quatro anos.
Subsumindo ao caso em apreço, tendo as notificações das liquidações sido efetuadas em 2023 e sendo referentes a 2019, 2020 e 2021 não caducou o direito à liquidação.
Porquanto, improcede a alegação de erro de direito.
Retroatividade
A Requerente alega também a violação da proibição da retroatividade fiscal (art. 103º, nº3 da CRP). Esta norma constitucional dispõe que «Ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não hajam sido criados nos termos da Constituição, que tenham natureza retroativa ou cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei».
Assim, para que o Estado possa cobrar um imposto ele terá que ser previamente aprovado pelos representantes do povo e terá que estar determinado em lei geral e abstrata.
A proibição da aplicação retroativa da lei fiscal em Portugal aplica-se especificamente à criação de impostos ou normas fiscais desfavoráveis, conforme estabelecido no artigo 103.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa. Portanto, a proibição de retroatividade aplica-se à criação de obrigações fiscais novas ou mais gravosas.
Importa começar por referir que sufragamos o entendimento do Tribunal Constitucional expresso no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º175/2018 de 02.04.2018 que passamos a citar:
“O Tribunal Constitucional tem vindo a seguir o entendimento que esta proibição da retroatividade, no domínio da lei fiscal, apenas se dirige à retroatividade autêntica, abrangendo apenas os casos em que o facto tributário que a lei nova pretende regular já tenha produzido todos os seus efeitos ao abrigo da lei antiga, excluindo do seu âmbito aplicativo as situações de retrospetividade ou de retroatividade imprópria, ou seja, aquelas situações em que a lei é aplicada a factos passados mas cujos efeitos ainda perduram no presente, como sucede quando as normas fiscais que produziram um agravamento da posição fiscal dos contribuintes em relação a factos tributários que não ocorreram totalmente no domínio da lei antiga e continuam a formar-se, ainda no decurso do mesmo ano fiscal, na vigência da nova lei (v.g. acórdãos n.º 128/2009, 85/2010 e 399/2010, todos acessíveis em www.tribunalconstitucional.pt)».”
No caso sub judice as normas do CIMI que conduziram ao apuramento do VPT (arts. 38º, nº1 e 113º, n.º3 e 116º, n.º1) entraram em vigor em data anterior a 2019, concretamente em 01.12.2003 (Art. 32º, n.º1 do DL n.º 287/2003 de 12 de novembro). Pelo que, não se nos afigura violada a proibição da retroatividade fiscal. A criação de novos impostos e os elementos essenciais do imposto, incluindo a incidência, a determinação do valor patrimonial tributário e as regras de liquidação já existiam e estavam previstas no CIMI. Destarte, não se vislumbra existir qualquer aplicação retroativa da norma tributária, nem sequer retrospetividade, na medida em que as disposições legais entraram em vigor logo em 2003, isto é, foi temporalmente anterior ao início do período do imposto a que se reporta o ato tributário ora arbitralmente sindicado, não se mostrando violado, em consequência, o disposto no n.º 3 do artigo 103º da CRP.
Neste mesmo sentido, vejam-se as decisões do CAAD n.º 278/2014- T de 07.11.2024 e n.º279/2024 de 08.11.2024.
Citando a decisão do CAAD no processo n.º278/2024 de 07.11.2024:
“Ante o exposto, não se vislumbra existir qualquer aplicação retroativa da norma tributária, nem sequer retrospetividade, na medida em que as disposições legais convocadas no âmbito do procedimento que levou a liquidação dos tributos são temporalmente anteriores ao início do período do imposto a que se reporta a liquidação mais antiga – 2019.
Em suma, pretendendo a norma constitucional em causa proteger a confiança e as legítimas expetativas dos cidadãos, enquanto pilar do Estado de direito democrático, tais desideratos assentam em assegurar pela proibição de aplicação de normas legais posteriores à ocorrência do facto tributário relevante, na aceção da retroatividade autêntica, conforme decorre da jurisprudência do Tribunal Constitucional supra e que ora se secunda.
Ora, manifestamente que não é esse o caso dos autos, porquanto os comandos legislativos aplicáveis e aplicados quanto ao regime atinente à tributação em sede de IMI de prédio omisso são de vigência temporalmente anterior à ocorrência de qualquer um dos três factos tributários, pelo que não pode tal violação do n.º 3 do artigo 103º da CRP deixar de improceder.”
Destarte, julga-se também improcedente a alegada violação da proibição da aplicação retroativa da lei fiscal.
Mais se refere que não se considera violado o princípio da tutela da segurança jurídica resultante no art. 2º da CRP.
De acordo com a formulação, seguida no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 128/2009, de 12.03.2009, a lesão da confiança constitucionalmente censurável pressupõe, que o Estado (mormente o legislador) tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos destinatários expectativas de continuidade, que essas expectativas sejam legítimas, justificadas e fundadas em boas razões e, por último, que os particulares tenham feito planos de vida tendo em conta a perspetiva de continuidade do “comportamento estadual”, que possam sair frustrados por mutações normativas do ordenamento com que os destinatários das normas não pudessem razoavelmente contar.
No caso em apreço, não ocorreu qualquer mutação da ordem jurídica. O valor patrimonial tributário do prédio obtido em 2023 foi apurado com normas que já estavam em vigor em 2019, 2020 e 2021. Porquanto, os destinatários das normas podiam contar a sua aplicação.
A atuação da AT não violou o princípio da proteção da confiança ínsito na ideia de Estado de direito, nos termos do artigo 2º da CRP.
Juros compensatórios
A Administração Tributária integrou os juros compensatórios nas três liquidações de IMI.
Nos termos do disposto no art. 35° da LGT, são requisitos essenciais para a liquidação de juros compensatórios a demonstração clara e inequívoca do prejuízo do Estado e da sua imputabilidade à atuação culposa do sujeito passivo.
A responsabilidade por juros compensatórios tem a natureza de uma reparação civil e que, por isso, depende do nexo de causalidade adequada entre o atraso na liquidação e a atuação do contribuinte e da possibilidade de formular um juízo de censura à sua atuação (a título de dolo ou negligência). Ou seja, depende, da existência de culpa, a qual consiste na omissão reprovável de um dever de diligência, que é de aferir em abstrato (face à diligência de um bom pai de família) e que, por isso, tem de ser apreciada segundo os deveres gerais de diligência e aptidão de um “bonus pater família”. Sobre a matéria pode ler-se o Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa in “Juros nas relações tributárias”, Problemas Fundamentais do Direito Tributário, pág. 145
No que diz respeito às causas que justificam a elaboração das liquidações e permitem a cobrança dos juros compensatórios, não se nos afigura que exista no caso em apreço um juízo de censurabilidade da impugnante.
Nomeadamente no que diz respeito à utilização do VPT apurado em 2023. Este VPT foi apurado pela AT. A contribuinte em nada contribui para o retardamento da avaliação, não merecendo por isso, na nossa opinião, um juízo de censura que permita a cobrança de juros compensatórios.
Não pode a impugnante ser responsabilizada por um atraso da AT, para o qual nada contribuiu.
Porquanto, somos da opinião que não se cumprem os requisitos exigidos pelo art. 35º, n.º1 da LGT, devendo por isso ser anulados os valores constantes das liquidações a título de juros compensatórios.
Juros Indemnizatórios
A Requerente pede ainda a condenação da Autoridade Tributária no reembolso do imposto indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios.
De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo, cabendo-lhe “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito”. O que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT, aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.
Por efeito da reconstituição da situação jurídica em resultado da anulação do ato tributário, há assim lugar ao reembolso do imposto indevidamente pago.
Ainda nos termos do n.º 5 do artigo 24.º do RJAT “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previstos na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”, o que remete para o disposto nos artigos 43.º, n.º 1, e 61.º, n.º 5, de um e outro desses diplomas, implicando o pagamento de juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respetiva nota de crédito.
Na situação vertente, quanto aos juros compensatórios pagos pela Requerente, está em causa a errada interpretação e aplicação pela Requerida do art. 35º da LGT e ficou demonstrado que as liquidações de IMI padecem parcialmente de erro de direito imputável à AT, vício para o qual a Requerente em nada contribuiu.
Há assim lugar, na sequência de declaração de ilegalidade parcial dos atos de liquidação de IMI, ao pagamento de juros indemnizatórios, nos termos das citadas disposições dos artigos 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º, n.º 5, do CPPT, calculados sobre a quantia que a Requerente pagou indevidamente (valor dos juros compensatórios- €1.047,74), à taxa dos juros legais (artigos 35.º, n.º 10, e 43.º, n.º 4, da LGT).
V. DECISÃO
Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral julgar parcialmente procedente o pedido arbitral formulado e, em consequência:
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Anular parcialmente as liquidações de IMI, na parte que incluíram juros compensatórios;
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Condenar a Requerida no reembolso do imposto indevidamente pago (€1.047,74) e no pagamento de juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido até à data do processamento da respetiva nota de crédito;
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Condenar a Requerente e a Requerida nas custas do processo, na proporção de 94,58% e 5,42%, respetivamente, face ao decaimento
VI. Valor do processo
Fixa-se o valor do processo em €19.328,36, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 3 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
VII. Custas
Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em €1.224,00 nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela Requerente (94,58%) e pela Requerida (5,42%), nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 5 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
Notifique-se.
Lisboa 12 de fevereiro de 2025
O Árbitro
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(André Festas da Silva)