SUMÁRIO:
Estão verificados os pressupostos para a inutilidade superveniente da lide se, após a constituição do Tribunal Arbitral, a Requerente obtém a satisfação do seu pedido.
DECISÃO ARBITRAL
A árbitra Marisa Almeida Araújo, designada pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formar o presente Tribunal Arbitral, constituído em 19 de abril de 2024, decide:
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Relatório
A..., Unipessoal, Lda,.”, contribuinte fiscal n.º..., com sede na ..., n.º..., ..., ..-... em Alcochete, (adiante apenas “Requerentes”) veio, ao abrigo do artigo 10.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (adiante apenas designado por RJAT) e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 março, requerer a constituição de tribunal arbitral.
É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (de ora em diante “Requerida” ou “AT”).
A Requerente pretende que o Tribunal declare a ilegalidade parcial do ato de liquidação de ISV e proceder à sua consequente anulação, e da decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa, que teve como objeto a liquidação em apreço; condene a Requerida a restituir à Requerente o valor indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios, calculados nos termos legais; dê sem efeito a coima aplicada e condenar a Requerida no pagamento integral das custas do presente processo e custas de parte.
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi apresentado a 8 de fevereiro de 2024 tendo sido aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD a 12 de fevereiro de 2024 e seguiu a sua normal tramitação.
Em conformidade com os artigos 5.º, n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a) e 11.º, n.º 1, alínea a), todos do RJAT, o Conselho Deontológico do CAAD designou o árbitro do Tribunal Arbitral Singular.
As partes, notificadas dessa designação em 1 de abril de 2024, não se opuseram, nos termos dos artigos 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) e 8.º do RJAT, 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.
O Tribunal Arbitral Singular foi constituído em 19 de abril de 2024.
A Requerida foi notificada para apresentar resposta em 24 de abril de 2024, o que a Requerida fez em 28 de maio de 2024.
Notificada para o efeito, e tendo em conta a defesa, também, por exceção da Requerida, a Requerente veio exercer o contraditório quanto a essa matéria em 11 de setembro de 2024.
Em 13 de setembro de 2024, veio a AT informar os autos que o ato impugnado e sub judice foi parcialmente revogado. Foi a Requerente notificada para se pronunciar quanto à revogação.
Em 22 de janeiro a Requerente veio informar que não se opondo à revogação e foi já emitida liquidação de substituição e devolução à Requerente do montante peticionado, entende que a AT tem que ser responsável pelos demais pedidos formulados nos presentes autos.
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Saneamento
O Tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria, atenta a conformação do objeto do processo (cf. artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 5.º do RJAT).
O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas (cf. artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
III.I. Matéria de facto
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Com relevo para a decisão, importa atender aos seguintes factos que se julgam provados:
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A Requerente apresentou pedido de revisão oficiosa em 3 de outubro de 2023;
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No dia 8 de fevereiro de 2024 a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral;
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O tribunal arbitral foi constituído em 19 de abril de 2024;
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A AT foi notificada para apresentação de resposta a 24 de abril de 2024;
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A AT apresentou resposta em 28 de maio de 2024;
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A AT revogou parcialmente o ato em apreço nos autos a 13 de setembro de 2024;
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A AT já emitiu liquidação de substituição e devolveu ao Requerente o montante de € 2.157,78, pago em excesso
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O Requerente veio manifestar a sua concordância com a revogação do ato mas mantém os demais pedidos.
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Não há factos relevantes para esta Decisão Arbitral que não se tenham provado.
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Fundamentação da Fixação da Matéria de Facto
A matéria de facto foi fixada por este Tribunal Arbitral Singular e a sua convicção ficou formada com base na peça processual, requerimentos das partes e informação constante no sistema do CAAD.
Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem o dever de se pronunciar sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de selecionar a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor, conforme n.º 1 do artigo 596.º e n.º 2 a 4 do artigo 607.º, ambos do Código Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi das alíneas a) e e) do n.º do artigo 29.º do RJAT e consignar se a considera provada ou não provada, conforme n.º 2 do artigo 123.º Código do Procedimento e do Processo Tributário (CPPT).
Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas Partes e a prova documental junta aos autos, consideraram-se provados, com relevo para esta Decisão Arbitral, os factos acima elencados.
III.II Matéria de Direito (fundamentação)
A Requerida veio informar os autos que foram revogados os atos tributários impugnados.
A Requerente informou os autos que o seu pedido quanto ao reembolso do montante de €2.157,78, pago em excesso, estava integralmente satisfeito.
Desta forma, nos termos do preceituado no art. 277.º, al. e) do Código de Processo Civil (ex vi art. 29.º do RJAT), em consequência com a ato de liquidação em causa nos autos torna-se inútil apreciar a sua ilegalidade, concluindo-se que, in casu, ocorre uma inutilidade superveniente da lide.
Da responsabilidade pelos juros e pagamento das custas arbitrais
O reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral, resulta do disposto no artigo 24º, n.º 5 do RJAT, quando estipula que “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”.
Tal direito vem consagrado no art.º 43º da LGT o qual tem como pressuposto que se apure, em reclamação graciosa ou impugnação judicial - ou em arbitragem tributária – que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida em montante superior ao legalmente devido.
No caso em apreço não poderá deixar de considerar-se ter ocorrido erro imputável aos serviços, sendo que, para efeitos do disposto no referido artigo 43.º, n.os 1 e 3, alínea c), da LGT, se a decisão for proferida dentro do prazo de um ano, não há lugar a juros indemnizatórios.
Conforme foi dado como provado, o pedido de revisão oficiosa sido apresentado em 3 de outubro de 2023, pelo que haverá lugar a juros indemnizatórios a contar de 4 de outubro de 2024.
Em conclusão, assiste à Requerente o direito ao pretendido pagamento de juros indemnizatórios relativamente ao imposto pago a contar da data referida até à data do referido reembolso.
Tendo em conta a revogação do ato em apreço nos autos, é devida a devolução de tudo o que haja, por conta deste sido, pago, com as devidas consequências legais.
Nos termos do disposto no artigo 527.º, n.º 1 do CPC (ex vi 29.º, nº 1, alínea e) do RJAT), deve ser estabelecido que será condenada em custas a Parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito.
Neste âmbito, o n.º 2 do referido artigo concretiza a expressão “houver dado causa”, segundo o princípio do decaimento, entendendo que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.
Nestes termos, tendo em consideração o acima exposto, a responsabilidade em matéria de custas arbitrais deverá ser imputada exclusivamente à Requerida.
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Decisão
Nestes termos, este Tribunal Arbitral Singular decide:
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Julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide.
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Condenar a AT no pagamento de juros indemnizatórios e demais encargos com o processo, com as devidas consequências legais.
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Valor do processo:
Tendo em consideração o disposto nos artigos 306.º, n.º 2 do CPC, artigo 97.º-A, n.º 1 do CPPT e no artigo 3.º, nº. 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor do processo em € 2.203,36.
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Custas:
Nos termos do disposto na Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor das custas do Processo Arbitral em € 612,00, a cargo da Requerida, de acordo com o artigo 22.º, n.º 4 e 13.º, n.º 1, ambos do RJAT.
Notifique-se.
Lisboa e CAAD, 3 de fevereiro de 2025
A Árbitra,
(Marisa Almeida Araújo)