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Sumário:
Verifica-se a inutilidade superveniente da lide e a consequente extinção da instância se o Requerente obteve a plena satisfação do seu pedido em virtude da revogação pela AT, após a constituição do Tribunal Arbitral, do acto de liquidação que havia impugnado.
A Árbitra Rita Guerra Alves, designada pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formar o Tribunal Arbitral Singular, decide o seguinte:
DECISÃO ARBITRAL
I – RELATÓRIO
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A Requerente A…, titular do número de identificação fiscal …, com morada na Rua …, Lisboa, requereu a constituição do presente Tribunal Arbitral para impugnar a decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º …, contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”) n.º 2023… relativa ao exercício de 2022, no valor de € 16. 360,35€ (dezasseis mil trezentos e sessenta euros e trinta e cinco cêntimos).
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O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite em 21 de Agosto de 2021 pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD e a Requerida automaticamente notificada.
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A Requerente não exerceu o direito à designação de árbitro pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 1 e do artigo 11.º, n.º 1, alínea a), ambos do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou a signatária como árbitra.
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Em 8 de Outubro de 2024, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não manifestaram vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alínea b), do RJAT, e dos artigos 6.º e 7.º, do Código Deontológico do CAAD.
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Em conformidade com o disposto no artigo 11.º, n.º 1, alínea c), do RJAT o Tribunal Arbitral Singular ficou constituído em 28 de Outubro de 2024.
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Em 28 de Outubro de 2024 foi proferido despacho arbitral ao abrigo do disposto no artigo 17.º do RJAT, concedendo-se à Autoridade Tributária e Aduaneira o prazo de 30 dias para apresentar resposta e, querendo, solicitar produção de prova adicional, bem como, remeter ao Tribunal Arbitral, nos termos do número 2 do citado artigo, cópia do processo administrativo.
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A Requerida notificada do dito despacho não apresentou resposta.
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Em 15 de Novembro de 2024, mediante requerimento, veio a Requerida informar os autos que por despacho da Subdiretora-geral de 10 de Novembro de 2024, foi revogado no dia 4 de Novembro de 2024, o ato impugnado nos presentes autos e juntou o documento Informação n.º 455/2024 da Direção de Serviços do IRS.
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Por despacho de 4 de Dezembro de 2024, ao abrigo dos artigos 18.º, 21.º do RJAT, a Requerente foi notificada para se pronunciar, em 10 dias, sobre se se opõe à revogação do ato impugnado e declarar se mantém interesse no prosseguimento do procedimento, sem que se tenha pronunciado no prazo concedido.
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Por despacho de 2 de Janeiro de 2025, a Requerente foi novamente notificada para se pronunciar ao despacho de 4 de Dezembro de 2024, sem que se tenha pronunciado no prazo concedido.
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Assim como ao abrigo do disposto nos artigos 19.º, nº 2 e 29.º, nº 2 do RJAT, o Tribunal dispensou a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e a produção de alegações escritas. Mais advertiu a Requerente para proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente no prazo de 10 dias, nos termos do n.° 3 do artigo 4° do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributaria e comunicar o pagamento ao CAAD.
II – SANEAMENTO
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O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 4.º, e 5.º, todos do RJAT.
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As partes gozam de personalidade e capacidade judiciarias, são legitimas e estão regularmente representadas, nos termos dos artigos 4.o e 10.º, n.º 2, ambos do RJAT, e dos artigos 1.º a 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.
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O processo não enferma de nulidades.
III – DO MÉRITO
III.1. MATÉRIA DE FACTO
III.1.1. Factos provados
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Com relevo para a decisão da causa consideram-se provados os seguintes factos:
a) Em 21 de Agosto de 2024 a AT foi notificada por e-mail da apresentação do pedido de pronuncia arbitral;
b) Em 20 de Outubro de 2024 o Tribunal Arbitral ficou constituído;
c) Em 10 de Novembro de 2024 foi revogado o acto de liquidação objeto do presente processo por despacho proferido pelo Subdirector-geral do IRS;
d) A AT deu conhecimento da revogação do ato mediante requerimento apresentado em 15 de Novembro de 2024.
III.1.2. Factos não provados
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Com relevo para a decisão da causa, não existem factos que devam considerar-se como não provados.
III.1.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto
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Ao Tribunal incumbe o dever de selecionar os factos que interessam à decisão e discriminar a matéria que julga provada e declarar a que considera não provada, não tendo de se pronunciar sobre todos os elementos da matéria de facto alegados pelas partes, tal como decorre da aplicação conjugada do artigo 123.º, n.º 2, do Código de Procedimento e Processo Tributário (“CPPT”) e do artigo 607.º, n.º 3, do CPC, aplicáveis por força do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT. Assim sendo, os factos pertinentes para o julgamento da causa foram selecionados e conformados em função da sua relevância jurídica, a qual é determinada tendo em conta as várias soluções plausíveis das questões de direito para o objeto do litígio, conforme decorre da aplicação conjugada do artigo 596.º, n.º 1, do CPC, aplicável por força do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT. Nestes termos, tendo em conta as posições assumidas pelas partes e a prova documental junta aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.
III.2. MATÉRIA DE DIREITO
III.2.1. Da inutilidade superveniente da lide
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Ao ter sido revogado o ato de liquidação impugnado pelo Requerente nos presentes autos, cumpre analisar a utilidade da apreciação do pedido.
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A respeito da inutilidade superveniente da lide pronunciou-se o Supremo Tribunal Administrativo em Acórdão de 30 de Julho de 2014, proferido no âmbito do processo n.º 0875/14, no qual referiu que “A inutilidade superveniente da lide (que constitui causa de extinção da instância - al. e) do art. 277.º do CPC) verifica-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a solução do litígio deixe de interessar, por o resultado que a parte visava obter ter sido atingido por outro meio”.
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É também este o sentido que a doutrina tem conferido ao conceito em análise, referindo Lebre de Freitas, Rui Pinto e João Redinha, em Código de Processo Civil Anotado, Volume 1.º, 2.ª edição, Coimbra Editora, 2008, p. 555, que “(...) a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide dá-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objeto do processo, ou encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida. Num e noutro caso, a solução do litígio deixa de interessar – além, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por já ter sido atingido por outro meio”.
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Ora, conforme resulta da matéria de facto dada como provada nos presentes autos, o ato tributário impugnado pela Requerente foi revogado pela AT, o que implica a inutilidade e impossibilidade deste Tribunal declarar a ilegalidade e determinar a consequente anulação de um ato que já se encontra suprimido da ordem jurídica. Com a referida revogação a Requerente atingiu a totalidade dos efeitos pretendidos com o presente pedido de pronúncia arbitral, já que a AT reconheceu o ato de revogação anulatória.
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Em face do exposto entende este Tribunal que se verifica a inutilidade superveniente da lide quanto à apreciação da legalidade e consequente anulação do ato tributário impugnado pelo Requerente, de tal forma que se julga extinta a instância nos termos e para os efeitos previstos no artigo 277.º, alínea e), do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.
C. DECISÃO
Nestes termos, decide o Tribunal Arbitral Singular:
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Julgar extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos do art. 277º do Código do Processo Civil, aplicável ex vi art. 29º, nº 1, alínea e) do RJAT.
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Absolver a Requerente da instância;
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Condenar a Requerida nas custas do processo.
D. Valor do processo
Fixa-se o valor do processo em € 16. 360,35€ (dezasseis mil trezentos e sessenta euros e trinta e cinco cêntimos, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 3 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
E. Custas
Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 1.224,00, nos termos dos arts.12º, nº2 e 24º, nº 4 do RJAT e 3º, nº 2 do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, e Tabela I anexa a esse Regulamento, a pagar pela Requerida, nos termos do art. 536º, nº 3, in fine, do CPC, por ter dado causa à inutilidade da lide.
Registe-se e notifique-se.
Lisboa, 13 de Janeiro de 2025
A Árbitra
(Rita Guerra Alves)
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