Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 578/2024-T
Data da decisão: 2024-12-10  IRC  
Valor do pedido: € 146.469,89
Tema: IRC – regime da participation exemption; cláusula específica anti-abuso; artigo 51.º, n.ºs 1, 13 e 14, do Código do IRC. Cláusula geral anti-abuso; artigo 38.º, n.ºs 2 e 3, da LGT.
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Sumário:

  1. A aplicação do regime da participation exemption aos lucros e reservas distribuídos a sujeitos passivos de IRC com sede ou direção efetiva em território português, depende da verificação cumulativa dos requisitos previstos nas diversas alíneas do n.º 1 do artigo 51.º do Código do IRC.
  2. A norma específica anti-abuso prevista no artigo 51.º, n.ºs 13 e 14, do Código do IRC não pode ser aplicada quando o que estiver em causa forem negócios realizados por terceiros que a AT considerou como abusivos mas, relativamente aos quais, não aplicou a cláusula geral anti-abuso prevista no artigo 38.º, n.ºs 2 e 3, da LGT.

 

 

DECISÃO ARBITRAL

 

Os árbitros José Poças Falcão (presidente), Paula Cristina Gomes Florindo e Ricardo Rodrigues Pereira (vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, acordam no seguinte:

 

            I. Relatório

1. No dia 19 de abril de 2024, A..., Lda., NIPC..., com sede na ..., Rua..., ..., ...-... ... (doravante, Requerente), apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.ºs 1, alínea a), e 2, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (doravante, abreviadamente designado RJAT), com vista à pronúncia deste Tribunal relativamente à ilegalidade do ato de liquidação adicional de IRC n.º 2023..., referente ao exercício de 2019, da liquidação de juros compensatórios n.º 2023 ... e da respetiva demonstração de acerto de contas n.º 2023..., da qual resultou o valor total a pagar de € 146.469,89.

A Requerente juntou 6 (seis) documentos, não tendo requerido a produção de quaisquer outras provas. 

É Requerida a AT – Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante, Requerida ou AT).

 

2. Como resulta do pedido de pronúncia arbitral (doravante, PPA), a Requerente alega, essencialmente, o seguinte:

A Requerente, constituída em 1997, tinha, à data dos factos (2019), por atividade principal, a compra e venda de bens imobiliários e, por atividades secundárias, o arrendamento de bens imobiliários, o alojamento mobilado para turistas, assim como o comércio a retalho de computadores, unidades periféricas e programas informáticos, em estabelecimentos especializados; acresce que no respetivo Contrato de Sociedade está previsto que a Requerente pode participar no capital social de outras sociedades, mesmo que com objeto social diferente do seu.

A Requerente sempre foi uma sociedade familiar, sendo que, à data dos factos (em abril de 2019) e tal como sucede atualmente, é detida por mãe (detentora de uma participação minoritária de 27,5%) e suas duas filhas (detentoras, cada uma, de uma participação social de 36,25%). 

A sócia-gerente da Requerente era detentora, desde o ano de 2014, de uma participação direta de 12,4% no capital social da empresa “B..., SGPS, S.A.”; em 11 de setembro de 2019, a mencionada sócia-gerente vendeu à Requerente essa participação social, pelo valor de € 713.366,00. Por via dessa transmissão, a referida sócia-gerente passou a ser titular de uma participação indireta de 3,4% no capital social da “B..., SGPS, S.A.”, uma vez que as restantes sócias da Requerente passaram a ser titulares, cada uma, de uma participação indireta de 4,5% no capital social da “B..., SGPS, S.A.”.   

Segundo a Requerente, o investimento realizado na aquisição da participação social na “B..., SGPS, S.A.” revelou-se compensador ao longo dos últimos anos, tendo-lhe permitido desenvolver as atividades de alojamento e compreendidas no seu objeto social, designadamente com a aquisição de dois imóveis. Alega, ainda, a Requerente que a referida transmissão da participação social na “B..., SGPS, S.A.” que era detida pela sua sócia-gerente permitiu obviar a futuras questões sucessórias, proporcionando uma melhor organização e gestão do património familiar.  

A Requerente foi alvo de um procedimento de inspeção tributária externa, relativo ao exercício de 2019, tendo sido propostas pela AT correções à matéria tributável, em sede de IRC, no valor de € 621.860,00.

Segundo a Requerente, da análise do RIT verifica-se que, apesar de verificados os requisitos para benefício do regime de participation exemption, com vista à eliminação da dupla tributação económica dos lucros e reservas distribuídos, à luz do artigo 51.º do Código do IRC, a AT entendeu que as reservas livres distribuídas pela sociedade anónima “B..., SGPS, S.A.” deveriam concorrer para a determinação do lucro tributável da Requerente; porquanto, na opinião da AT, tal distribuição de lucros a favor da Requerente consubstancia uma “construção” sem substância económica, realizada “com a finalidade principal ou uma das finalidades principais de obter uma vantagem fiscal, nos termos dos n.ºs 13 e 14 do artigo 51.º do Código do IRC”.

Os factos invocados pela AT no RIT para justificar a existência de uma “construção” não genuína e sem substância económica são, resumidamente, os seguintes: a sociedade “C..., Lda.”, entretanto transformada em sociedade anónima, era detida a 100% pela sociedade “B..., SGPS, S.A.”, desde o ano de 2007; em dezembro de 2018, foi celebrado entre a “B..., SGPS, S.A.” e a sociedade “D... SARL”, com sede no Luxemburgo (parte não relacionada), um contrato-promessa de compra e venda de ações da “C..., Lda.”; no ano de 2019, a “C..., Lda.” procedeu à distribuição de reservas a favor da “B..., SGPS, S.A.”, no montante de € 4.300.000,00, tendo a “B..., SGPS, S.A.” alienado 100% da sua participação na “C..., Lda.” , nesse mesmo ano, pelo valor de € 6.500.000,00, tendo sido realizadas mais-valias com essa transmissão; ainda no ano de 2019, a Requerente, que não era titular de qualquer outra participação, adquiriu a participação na “B..., SGPS, S.A.” detida pela respetiva sócia-gerente, pelo valor de € 713.366,00; outros acionistas (pessoas singulares) alienaram, também em 2019, as suas participações sociais na “B..., SGPS, S.A.” , a favor de sociedades nas quais detinham uma participação social; também em 2019, a “B..., SGPS, S.A.”  distribuiu € 5.015.000,00 de reservas a favor das respetivas sociedade acionistas, tendo sido efetuada a respetiva retenção na fonte de 25%; a “B..., SGPS, S.A.” distribuiu a favor da Requerente € 621.860,00 a título de reservas, os quais foram objeto de retenção na fonte de € 155.465,00, tendo sido recebido um valor líquido de € 466.395,00; posteriormente, foi aplicado o regime de participation exemption, após apuramento do cumprimento cumulativo dos respetivos pressupostos, tendo sido devolvida à Requerente a retenção na fonte, no valor de € 155.465,00; a Requerente, que não tinha liquidez imediata para assegurar o pagamento das ações da “B..., SGPS, S.A.”, procedeu ao pagamento do respetivo total, a favor da respetiva sócia-gerente, no decurso dos anos de 2019 e 2020.           

Nesta conformidade, a AT entendeu que a sócia-gerente da Requerente beneficiou, a final, dos lucros da “B..., SGPS, S.A.”, por via dos valores para si transferidos a título de pagamento do preço das ações da “B..., SGPS, S.A.”, não tendo a mesma sido tributada, em sede de IRS, pelo recebimento, por via indireta, de rendimentos de capitais.

A Requerente termina o seu pedido de pronúncia arbitral (doravante, PPA) peticionando o seguinte:

“Nestes termos, e nos demais de direito que V.ª Ex.ª doutamente suprirá, se requer que defira o presente pedido de pronúncia arbitral e se digne a anular a liquidação adicional de IRC e respetiva liquidação de juros compensatórios em apreço, com fundamento em ilegalidade por vício de violação de lei por desconsideração ilegal da aplicação do regime de participation exemption, nos termos do artigo 51.º do Código do IRC:

- Em virtude da ausência de prova dos pressupostos de que depende a aplicação da norma anti-abuso específica, prevista no artigo 51.º, n.ºs 13 e 14, do Código do IRC; e

- E por ausência de aplicação do regime da cláusula geral anti-abuso, previsto no artigo 38.º da LGT.” 

 

3. O pedido de constituição de tribunal arbitral foi aceite e notificado à AT em 26 de abril de 2024.

           

4. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.ºs 2, alínea a) e 3 e no artigo 11.º, n.º 1, alínea a), ambos do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os signatários como árbitros do Tribunal Arbitral coletivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 14 de junho de 2024, as partes foram devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.

Assim, em conformidade com o preceituado no artigo 11.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, o Tribunal Arbitral coletivo foi constituído em 2 de julho de 2024.

 

5. No dia 30 de setembro de 2024, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua Resposta na qual impugnou os argumentos aduzidos pela Requerente, tendo concluído pela improcedência da presente ação, com a sua consequente absolvição do pedido.

A Requerida juntou 12 (doze) documentos, não tendo requerido a produção de quaisquer outras provas.

Posteriormente, a Requerida procedeu à junção aos autos do processo administrativo (doravante, PA).

 

6. No dia 21 de outubro de 2024, foi proferido despacho arbitral a dispensar a realização da reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, a conceder prazo para as partes, querendo, apresentarem alegações escritas e a indicar o dia 12 de dezembro de 2024 como data previsível para a prolação da decisão arbitral.

 

7. As partes apresentaram as alegações escritas que aqui se dão por inteiramente reproduzidas, tendo essencialmente reiterado as posições anteriormente vertidas nos respetivos articulados.

 

II. Saneamento

8. O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é competente, atenta a conformação do objeto do processo (cf. artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 5.º, n.ºs 1 e 3, alínea a), do RJAT).

O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do RJAT.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas (cf. artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

O processo não enferma de nulidades.

Não existem quaisquer exceções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito e que cumpra conhecer.

 

III. Fundamentação                             

III.1. De Facto

§1. Factos Provados

9. Com relevo para a apreciação e decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:

a) A Requerente tem o capital social de € 40.000,00, detido por E..., NIF..., com uma quota de € 11.000,00 (27,5%) e pelas suas filhas F..., NIF ... e G..., NIF..., com quotas iguais de € 14.000,00 (36,25%), cada uma, sendo a gerência de facto e de direito exercida por E... . [cf. documento n.º 5 anexo ao PPA e PA]

b) A Requerente tem por atividade principal “Arrendamento de bens imobiliários” (CAE 68200) e por atividades secundárias “Outros locais de alojamento de curta duração” (CAE 55204) e “Organização de feiras, congressos e outros eventos” (CAE 82300), encontrando-se enquadrada, em sede de IRC, no regime geral de determinação do lucro tributável e apresentando um período de tributação coincidente com o ano civil. [cf. documento n.º 5 anexo ao PPA e PA]       

c) No Contrato de Sociedade da Requerente – na redação à data dos factos e que permanece inalterada – está previsto o seguinte no n.º 2 do respetivo artigo 4.º: “A sociedade poderá participar no capital social de outras sociedades, mesmo que com objeto social diferente do seu.”

d) A sociedade comercial C..., S.A., NIPC..., era detida a 100% pela sociedade comercial B... SGPS, S.A., NIPC ..., desde 2007 e manteve-se como sociedade por quotas até dezembro de 2018, momento em que alterou o tipo societário para sociedade anónima, tendo os seguintes administradores: H..., NIF..., cargo: Presidente, e E..., cargo: Vogal. [cf. documento n.º 5 anexo ao PPA e PA] 

e) O ativo da C..., S.A., em 2018, era constituído por um ativo fixo tangível: prédio urbano em propriedade total com andares ou divisões suscetíveis de utilização independente, sito na Rua ..., n.ºs ... a ... e Rua ..., n.ºs... a..., ...-... Lisboa, inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º ... da freguesia de ... . [cf. documento n.º 5 anexo ao PPA e PA] 

f) A 20 de dezembro de 2018, foi celebrado entre a B... N SGPS, S.A. e a sociedade comercial D... SARL, com sede no Luxemburgo, um contrato-promessa de compra e venda de ações da C..., S.A. [cf. documento n.º 5 anexo ao PPA e PA]

g) A 20 de março de 2019, foi realizado o primeiro aditamento ao aludido contrato-promessa de compra e venda de ações, no qual se acordou 30 de abril de 2019 como a data limite para a celebração do contrato de compra e venda, mediante o pagamento de um reforço de sinal no montante de € 400.000,00, bem como que se o mesmo não fosse celebrado até ao dia 22 de abril de 2019, a D... SARL pagaria, a título de reforço adicional de sinal, o montante de € 100.000,00. [cf. documento n.º 5 anexo ao PPA e PA]

h) A 29 de março de 2019, em Assembleia Geral da C..., S.A., foi deliberado proceder à distribuição de reservas à sua acionista B... SGPS, S.A., no montante de € 4.300.000,00. [cf. documento n.º 5 anexo ao PPA e PA]

i) A 16 de abril de 2019, foi celebrado um segundo aditamento ao aludido contrato-promessa de compra e venda de ações, tendo sido estabelecido que, em virtude de a C..., S.A. ter procedido à distribuição de reservas à sua acionista B... SGPS, S.A., no montante de € 4.300.000,00, em momento anterior à celebração do contrato de compra e venda, era reduzido o preço que inicialmente tinha sido acordado, passando este a ser de € 6.500.000,00. [cf. documento n.º 5 anexo ao PPA e PA]             

j) A 9 de maio de 2019, a B... SGPS, S.A. alienou, pelo valor de € 6.500.000,00, à D... SARL, a sua participação social (100%) na C..., S.A. [cf. documento n.º 5 anexo ao PPA e PA]

k) Em junho e julho de 2019, alguns dos acionistas, pessoas singulares, da  B... SGPS, S.A. constituíram novas sociedades comerciais, a saber [cf. documento n.º 5 anexo ao PPA e PA]:

 

l) A 11 de setembro de 2019, os referidos acionistas, pessoas singulares, da B... SGPS, S.A., celebraram com as sociedades por si constituídas, ou de que já eram sócios, contratos de compra e venda, procedendo à alienação das ações de que eram titulares no capital social da B... SGPS, S.A. [cf. documento n.º 5 anexo ao PPA e PA]

m) Neste contexto e na mesma data, a acionista E... também procedeu à venda da participação social que detinha na B... SGPS, S.A. (12,4%), pelo preço global de € 713.366,00, sendo a entidade compradora a Requerente. [cf. documento n.º 5 anexo ao PPA e PA]

n) Nos termos do respetivo contrato de compra e venda, o preço seria pago pela Requerente à sua sócia-gerente, E..., da seguinte forma: (i) o valor de € 356.683,00, correspondente a 50% do preço total, seria pago até final do ano de 2019; e (ii) o valor remanescente (€ 356.683,00) seria pago até ao final do ano de 2020. [cf. documento n.º 5 anexo ao PPA e PA]

o) A dívida incorrida pela Requerente, relativa ao pagamento do preço de € 713.366,00 pela compra da participação social na B... SGPS, S.A. adquirida à sua sócia-gerente, foi registada na contabilidade da Requerente numa conta de fornecedores de investimentos (#271111115538356), em nome de E... . [cf. documento n.º 5 anexo ao PPA e PA]

p) A 13 de setembro de 2019, os acionistas da B... SGPS, S.A. deliberaram a distribuição de € 5.015.000,00 de reservas livres, na proporção das participações detidas no respetivo capital social. [cf. documento n.º 5 anexo ao PPA e PA]

q) Nessa sequência, a 19 de setembro de 2019, a Requerente recebeu o montante de € 621.860,00, a título de reservas livres distribuídas pela B... SGPS, S.A., as quais foram objeto de retenção na fonte, em sede de IRC, no montante de € 155.465,00, tendo a Requerente recebido o valor líquido de € 466.395,00. [cf. documento n.º 5 anexo ao PPA e PA]  

r) Tal valor não foi objeto de tributação a final, em face da devolução da referida retenção na fonte, por via da dedução do montante de € 155.465,00, inscrito no Campo 359, do Quadro 10, e o montante de € 621.860,00, inscrito no Campo 771, do Quadro 7, ambos da declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC, referente ao exercício de 2019, da Requerente. [cf. documento n.º 5 anexo ao PPA e PA]

s) A 31 de dezembro de 2019, a Requerente já tinha pago à sua sócia-gerente, E..., a quantia total de € 325.000,00 referente ao preço devido pela compra da participação social na B... SGPS, S.A. [cf. documento n.º 5 anexo ao PPA e PA]        

t) A Requerente mantém, até ao presente, a sua participação de 12,4% no capital social da B... SGPS, S.A.  

u) No ano de 2019, a Requerente não detinha património imobiliário, sendo que, no decurso do ano de 2023, possuía os imóveis com os artigos matriciais... , com o valor patrimonial tributário de € 197.161,90 e ....-A, com o valor patrimonial tributário de € 111.841,31. [cf. documento n.º 5 anexo ao PPA e PA (RIT)]     

v) A coberto da Ordem de Serviço n.º OI2022..., a Requerente foi sujeita a um procedimento de inspeção tributária de âmbito parcial (IRC e IVA), de caráter externo e incidente sobre o período de tributação de 2019, realizado pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa, que culminou com a elaboração do respetivo Relatório de Inspeção Tributária (RIT), validamente notificado à Requerente e que aqui se dá por inteiramente reproduzido, do qual resultou a seguinte correção em sede de IRC, com a fundamentação que é assim sintetizada [cf. documentos n.ºs 2 e 5 anexos ao PPA e PA (RIT)]:     

«V. Descrição dos factos e fundamentos das correções/irregularidades

V.1. IRC - Imposto s/ Rendimento das Pessoas Coletivas

V.1. a) Eliminação da dupla tributação económica de lucros e reservas distribuídos

Em resultado da análise efetuada às operações que conduziram à aquisição por parte do sp à sua sócia-gerente, das ações representativas de 12,40 % do capital social da sociedade B... SGPS, bem como da distribuição de reservas pela B... ao sp no montante de € 621.860,00, verificou-se que estas operações foram uma construção realizada com a finalidade principal, ou indubitavelmente uma das finalidades principais de obter uma vantagem fiscal.

A sócia-gerente transmitiu as ações a uma sociedade familiar, aqui utilizada com efeitos instrumentais de furtar os valores referidos à tributação em sede de IRS.

A passagem da posse direta para indireta foi de facto a única mudança com esta transmissão; no entanto sem esta alteração de titularidade das ações não seria possível obter, sem qualquer custo acrescido, a vantagem fiscal decorrente do recebimento de dividendos como se de pagamento de preço se tratasse, obstando à tributação dos mesmos.

Nessa senda importava proceder à distribuição de lucros por parte da C..., S.A. à B... antes da sua alienação, de forma a poder distribuí-los pelos acionistas livremente.

É nesta fase que a sociedade A..., Lda. é fundamental e instrumental, para servir de ponte entre os lucros da B... e a sua acionista/sócia da A... .

Temos então que a sociedade A... serve para alcançar o objetivo de obter uma vantagem fiscal e frustra o objeto e finalidade da norma consagrada no artigo 51.º do CIRC, de eliminar a dupla tributação sobre os rendimentos (reservas distribuídas em apreço).

Face ao exposto o montante de € 621,860,00, correspondente às reservas distribuídas pela B... à sociedade A... Lda. não confere o direito à dedução ao lucro tributável do exercício, nos termos dos n.ºs 13 e 14 do artigo 51.º do CIRC, por não lhe ser aplicável um benefício atribuído em função de razões económicas válidas e substância económica das operações que no caso em apreço não se verifica existirem.

V.2. Correções propostas na Mod. 22

Em resultado das irregularidades acima descritas, o lucro tributável apurado, nos termos do disposto no artigo 17.º do CIRC, é o seguinte:

Modelo 22 – Quadro 7 – Apuramento do lucro tributável

Exercício em análise

Declarado

Correção

Valor Final

(após Correções)

701 – Resultado Líquido do Período

619.923,83

0,00

619.923,83

708 – SOMA (campos 701+702+703-704-705+706-707)

619.923,83

0,00

619.923,83

A Acrescer

724 – IRC, incluindo as tributações autónomas de outros impostos que direta e indiretamente incidam sobre os lucros (art. 23.º-A, n.º 1, al.a))

107,84

0,00

107,84

731 – Encargos não devidamente documentados (art. 23.º-A, n.º 1, al. c))

953,30

0,00

953,30

752 – Outros Acréscimos

2.128,94

0,00

2.128,94

753 – SOMA (campos 708 a 752)

623.113,91

0,00

623.113,91

A Deduzir

771 – Eliminação da dupla tributação económica dos lucros e reservas distribuídos (arts. 51.º e 51.º-D)

621.860,00

621.860,00

0,00

776 – SOMA (campos 754 a 775)

621.860,00

621.860,00

0,00

778 – LUCRO TRIBUTÁVEL

1.253,91

 

623.113,91

»

w) Sequentemente, a AT emitiu a liquidação adicional de IRC n.º 2023..., referente ao exercício de 2019, a liquidação de juros compensatórios n.º 2023... e, ainda, a respetiva demonstração de acerto de contas n.º 2023..., da qual resultou o valor total a pagar de € 146.469,89, com data limite de pagamento a 22.01.2024. [cf. documento n.º 1 anexo ao PPA]   

x) A Requerente não procedeu ao pagamento do aludido montante de € 146.469,89, tendo-lhe sido instaurado o processo de execução fiscal n.º ...2024... .

y) No dia 19.04.2024, a Requerente apresentou o pedido de constituição de tribunal arbitral que deu origem ao presente processo. [cf. Sistema de Gestão Processual do CAAD]

 

§2. Factos não Provados

10. Com relevo para a apreciação e decisão da causa, não há factos que não se tenham por provados.

 

§3. Motivação quanto à Matéria de Facto

11. Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, à face das soluções plausíveis das questões de direito.

Não se deram como provadas nem não provadas as alegações feitas pelas partes e apresentadas como factos, consubstanciadas em afirmações meramente conclusivas e, por isso, insuscetíveis de prova e cuja veracidade terá de ser aquilatada em face da concreta matéria de facto consolidada. 

Conforme indicado em cada uma das alíneas do probatório, a convicção do Tribunal resultou da apreciação crítica e de uma adequada ponderação, à luz das regras da racionalidade, da lógica e da experiência comum e segundo juízos de normalidade e razoabilidade, do acervo probatório de natureza documental (incluindo o constante do PA) que foi carreado para os autos, em conjugação com as alegações das partes nos respetivos articulados quando reportadas a factos pertinentes para a decisão que não se mostraram controvertidos. 

 

III.2. De Direito

§1. O thema decidendum

12. A questão jurídico-tributária que está no epicentro do dissídio entre as partes e que, por isso, o Tribunal Arbitral é chamado a apreciar e decidir, consiste em determinar se a liquidação adicional de IRC n.º 2023..., referente ao exercício de 2019 e, por inerência, a liquidação de juros compensatórios n.º 2023 ... e a respetiva demonstração de acerto de contas  n.º 2023..., padecem dos seguintes vícios invalidantes que lhes são imputados pela Requerente: (i) vício de violação de lei consubstanciado na violação do regime da participation exemption, previsto no artigo 51.º, n.º 1, do Código do IRC; (ii) vício de violação de lei consubstanciado na errada interpretação e aplicação da cláusula específica anti-abuso, prevista no artigo 51.º, n.ºs 13 e 14, do Código do IRC;  e, (iii) vício de violação de lei consubstanciado na não aplicação do regime da cláusula geral anti-abuso, previsto no artigo 38.º da LGT.

 

            §2. As Posições das Partes

            13. A propósito da aludida questão jurídico-tributária, a Requerente propugna, nuclearmente, o seguinte:

            Relativamente à entidade que distribuiu as reservas (a “B..., SGPS, S.A.”), verifica-se que esta é uma sociedade sujeita e não isenta de IRC e tem a sua direção efetiva e residência em Portugal, cumprindo o disposto nas alíneas d) e e) do n.º 1 do artigo 51.º do Código do IRC.

            No tocante à Requerente, as condições das alíneas a), b) e c) do n.º 1 do artigo 51.º do Código do IRC, estão igualmente preenchidas, uma vez que: detém uma participação direta não inferior a 10% na entidade que distribuiu as reservas, pois a participação detida é de 12,40%; tal participação, apesar de detida há menos de um ano aquando da distribuição, é detida até à presente data, ou seja, foi mantida, ininterruptamente, durante o tempo necessário para completar o período de um ano; e, a mesma não é abrangida pelo regime de transparência fiscal.

Assim, a Requerente entende que estão cumulativamente preenchidos todos os requisitos para que possa beneficiar do regime de eliminação da dupla tributação previsto no artigo 51.º, n.º 1, do Código do IRC.

Relativamente ao disposto nos n.ºs 13 e 14 do artigo 51.º do Código do IRC, afirma a Requerente que estas normas legais visam acautelar que sociedades que frustrem o objeto e finalidade do regime de participation exemption, dele possam beneficiar por via de construções sem substância económica e engendradas com a finalidade principal de obtenção de vantagem fiscal; porquanto, o regime de participation exemption visa potenciar um ambiente propício ao investimento, sendo dirigido a sociedades que mantêm participações estáveis e relevantes, com vista à sua rentabilização e crescimento económico. Afirma, pois, a Requerente que, de acordo com a norma específica anti-abuso, prevista nos n.ºs 13 e 14 do artigo 51.º do Código do IRC, o regime de participation exemption deve ser recusado quando apenas haja um preenchimento formal (e não substancial) dos pressupostos que dão acesso ao regime; concretizando, o objeto e finalidade do regime de participation exemption seria frustrado se se constatasse a existência de uma construção artificiosa com vista ao preenchimento cumulativo dos respetivos requisitos. 

Assim, a Requerente entende que para que o regime de participation exemption possa ser afastado no caso concreto, competiria à AT, nos termos do disposto no artigo 74.º, n.º 1, da LGT, provar a existência de uma construção ou construções não genuína(s) e sem substância económica, realizada(s) com a finalidade principal, ou uma das finalidades principais, de obtenção de uma vantagem fiscal que frustre o objeto e finalidade de eliminação da dupla tributação.

A Requerente advoga que a AT não provou ter sido contornado qualquer dos critérios de aplicação do regime de participation exemption, tendo-se limitado a concluir que a venda da participação na “B..., SGPS, S.A.” à Requerente pela sua sócia-gerente resulta num cenário fiscalmente mais vantajoso em sede de IRS e, por isso, censurável, e não que a própria transmissão da participação e posterior distribuição de reservas fosse artificiosa ou não genuína. Segundo a Requerente, a posição da AT assenta, portanto, na argumentação de que a sócia-gerente da Requerente seria tributada de forma mais gravosa pelo recebimento de rendimentos de capitais, ao invés de pela realização de mais-valias com as venda das ações; deste modo, neste caso concreto, o imposto evitado sempre seria o IRS da sócia-gerente e não o IRC da Requerente, não conseguindo, pois, a AT demonstrar o desvio à cobrança da receita fiscal de IRC, através do uso da Requerente como construção não genuína.

A Requerente entende, ainda, que a cláusula específica anti-abuso, prevista no artigo 51.º, n.ºs 13 e 14, do Código do IRC, deve ser interpretada em conjugação com o artigo 1.º da Diretiva (UE) 2015/121, de 27 de janeiro de 2015, que procedeu à alteração do artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva 2011/96/UE, norma esta que deve ser interpretada e aplicada de forma restritiva, uma vez que constitui uma exceção aos benefícios daquela Diretiva.

Em suma, diz a Requerente que a AT não provou devidamente de que forma a Requerente, por via de uma construção não genuína e sem substância económica, frustrou o objeto e finalidade do regime de participation exemption, com o objetivo de aproveitamento indevido de uma vantagem fiscal em sede de IRC.

Noutra ordem de considerações, afirma a Requerente que as construções artificiais, a existirem, apenas poderiam ser desconsideradas, para efeitos fiscais, por via da aplicação da cláusula geral anti-abuso prevista no artigo 38.º da LGT; porquanto, segundo a Requerente, o que a AT parece querer concluir é que determinados acionistas (pessoas singulares) da “B..., SGPS, S.A.”. por via da realização de reestruturação não genuína ou por via da própria constituição “artificial” de sociedades, poderão ter beneficiado, a final, dos lucros da “B..., SGPS, S.A.”, obviando à tributação em sede IRS, constituindo o negócio normal e não artificioso o recebimento direto dos rendimentos de capitais. Ora, diz a Requerente, tal vantagem fiscal, em face desse alegado esquema artificioso, sempre seria obtida em sede de IRS dos acionistas transmitentes e não em sede de IRC das sociedades adquirentes das ações. Assim, nesse cenário, teria pois a AT que recorrer ao regime da cláusula geral anti-abuso e não a uma cláusula específica anti-abuso para benefícios indevidamente obtidos em sede de IRC.

Assim, a Requerente entende que a AT deveria ter aplicado o regime geral de que dispõe para, junto dos ditos sujeitos passivos de IRS, ao abrigo do disposto no artigo 38.º da LGT, desqualificar, para efeitos fiscais, as referidas reestruturações ou constituições de sociedades, transmissões de ações e subsequente distribuição de reservas, liquidando o correspondente IRS.   

      

            14. Por seu turno, a Requerida aduz, essencialmente, a seguinte argumentação:

            A Requerida entende que a aplicação da cláusula específica anti-abuso, prevista no artigo 51.º, n.ºs 13 e 14, do Código do IRC, depende da comprovação concreta dos seguintes requisitos: a existência de uma série de construções não genuínas, isto é, não realizadas por razões económicas válidas e que não reflitam substância económica; realizadas com uma das finalidades principais de obter uma vantagem fiscal; e que esta esta frustre o objeto e finalidade de eliminar a dupla tributação sobre tais rendimentos.  

            Quanto ao primeiro requisito, a AT diz que os SIT efetuaram uma cabal descrição das construções levadas a cabo pela Requerente, pela sócia-gerente E... e pelos demais sócios envolvidos e lograram demonstrar exaustivamente o carácter não genuíno de tais construções, permitindo concluir pela total ausência de um racional económico que pudesse suportar a execução de tal negócio jurídico de compra e venda de ações da “B..., SGPS, S.A.”.

            No referente ao segundo requisito, a AT considera que, através do trabalho dos SIT, ficou amplamente provado que a única finalidade da alteração da titularidade das participações de uma detenção direta para uma detenção indireta era a de granjear à sócia-gerente E... acesso a recursos monetários livres de tributação onerosa; porquanto, se aquela sócia-gerente não tivesse optado pelo contrato de compra e venda das ações da “B..., SGPS, S.A.”, teria que, por forma a ter acesso aos mesmos recursos monetários albergados na “B..., SGPS, S.A.”, decidir pela distribuição de dividendos de acordo com as proporções detidas no capital social, juntamente com os demais sócios, o que originaria um facto tributário que seria sujeito a tributação em sede de IRS, à taxa liberatória de 28%, nos termos do disposto na alínea h) do n.º 2 do artigo 5.º, conjugado com o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 71.º, ambos do Código do IRS.

            A AT acrescenta que, caso a preocupação da sócia-gerente E... fosse obviar a futuras questões sucessórias, nada a impediria de efetuar uma doação ou uma partilha em vida das ações por ela detidas na “B..., SGPS, S.A.”, em qualquer medida percentual de detenção que desejasse, às suas duas filhas.

            No tocante ao terceiro requisito, a Requerida argumenta que a linha de interpretação (ultra) restritiva defendida pela Requerida no sentido de que “o regime de participation exemption deve ser recusado quando apenas haja um preenchimento formal (e não substancial) dos pressupostos que dão acesso ao regime”, não encontra qualquer respaldo nos n.ºs 13 e 14 do artigo 51.º do Código do IRC. Acrescenta, ainda, que não se pode aceitar como válida a ideia de que a aplicação deste regime mais benéfico a uma distribuição de dividendos, que essencialmente mais não é do que um passo artificioso numa construção não genuína para obter uma vantagem fiscal ilegítima, corresponde ao intuito pretendido pelo legislador para este regime excecional. 

A AT conclui, assim, que a Requerente juntamente com a sua sócia-gerente E..., não só criou uma série de construções não genuínas para obter uma vantagem fiscal, como também as usou para frustrar o objeto e finalidade do regime de participation exemption; a AT salienta, ainda, que a Requerente não fez qualquer investimento, tendo-se limitado a receber os lucros sob a forma de reservas provenientes da “B..., SGPS, S.A.” e a canalizá-los para a sua sócia-gerente, servindo de mera sociedade veículo. Mais refere a AT que o conjunto de operações realizado pela sócia-gerente da Requerente e por esta não são indissociáveis do conjunto de operações/negócios jurídicos realizados pelo conjunto de acionistas da “B..., SGPS, S.A.”.

Noutra ordem de considerações, a Requerida argumenta que não tinha de lançar mão da cláusula geral anti-abuso, prevista no artigo 38.º da LGT, porque está legitimada por lei para efetuar as correções ao lucro tributável declarado pelo contribuinte quando não se mostram cumpridos os pressupostos definidos no Código do IRC para efeitos de aplicação da dedução especial contida no regime de participation exemption, com fundamento em normas específicas anti-abuso, como é o caso dos n.ºs 13 e 14 do artigo 51.º do Código do IRC. Assim, ao escrutinar a dedutibilidade fiscal especial dos dividendo deduzidos pela Requerente ao seu lucro tributável, os SIT fizeram-no dentro do quadro legal aplicável, ou seja, analisando se estavam verificadas as condições e as exceções estabelecidas nas alíneas a) a e) do n.º 1 e nos n.ºs 13 e 14 do artigo 51.º do Código do IRC. A Requerida afirma, ainda, que esta cláusula específica anti-abuso prevalece sobre a cláusula geral anti-abuso, prevista no artigo 38.º da LGT, não estando sujeita à aplicação do procedimento estabelecido no artigo 63.º do CPPT. Mais advoga que a cláusula específica anti-abuso, prevista nos n.ºs 13 e 14 do artigo 51.º do Código do IRC não exige que a vantagem fiscal se verifique somente no âmbito do IRC, apenas exigindo que as construções artificiais produzam uma vantagem fiscal que frustre o objeto e as finalidades do regime de participation exemption.   

 

Cumpre apreciar e decidir.

 

§3. O direito à boa gestão fiscal, o planeamento fiscal ilícito e a elisão fiscal

15. Antes de mais, louvando-nos das judiciosas considerações vertidas na decisão arbitral proferida no processo n.º 414/2023-T que, data venia, fazemos nossas, importa assentar os seguintes aspetos: 

“(…) O direito à boa gestão fiscal

Aos contribuintes assiste o direito ao livre desenvolvimento de uma actividade económica, que pode ser exercida através do modelo de organização empresarial que aqueles entendam ser mais adequado para o efeito, conforme decorre dos princípios da liberdade de iniciativa económica privada e da liberdade de iniciativa, organização e gestão empresarial previstos nos artigos 61º, 1, 80º, c) e 86º, 2, todos da Constituição da República Portuguesa (CRP).

Um corolário da tutela conferida por aqueles princípios é a liberdade de gestão fiscal, nos termos da qual se assegura aos contribuintes a necessária amplitude na planificação das actividades económico-empresariais, e na escolha das opções que permitam uma maximização de receitas e uma optimização de custos, com a consequente obtenção, dentro dos limites da lei, de todas as vantagens fiscais possíveis.

Não está em causa que a “boa gestão fiscal” suponha a minimização dos custos fiscais, a “economia” ou “poupança” fiscal, avaliando as consequências económicas e fiscais das suas escolhas, buscando a optimização dos seus meios e a maximização dos seus resultados – dos seus proveitos.

Mas esse direito não é absoluto, e não só supõe o rigoroso cumprimento das leis tributárias como, também, deve subordinar-se às opções expressas na lei relativamente à ponderação de valores e interesses que devam funcionalizar o exercício da própria liberdade económica, demarcando o exercício da liberdade económica por balizas de legitimidade e admissibilidade – fronteiras para lá das quais a referida ponderação qualificará com abusivo o exercício da mesma liberdade económica.

E uma dessas fronteiras é, precisamente, a da existência, ou inexistência, de substância económica ou de razões comerciais ou empresariais válidas para a escolha, pelo contribuinte, de um meio específico para a realização dos seus negócios – porque a inexistência dessas razões fará desaparecer qualquer intenção expressa da lei em termos de poupança ou ganho fiscal equacionado pelo legislador.

 

(…) O planeamento fiscal ilícito e a elisão fiscal

É possível, assim, demarcar o planeamento fiscal lícito, por um lado, da evasão e da elisão fiscais, por outro lado.

  1. No planeamento lícito, “secundum legem” ou “intra legem”, o contribuinte adapta a sua conduta por forma a obter as tais referidas poupanças ou ganhos fiscais equacionados pelo legislador.
  2. A evasão fiscal (“tax evasion”) consistirá num planeamento “contra legem”, consistente numa conduta ilegal e censurável de tentativa de obtenção de vantagens fiscais.
  3. A elisão fiscal (“tax avoidance”) corresponde ao planeamento fiscal “extra legem”, consistente numa conduta que, composta de actos que não violam directamente a lei, alcançam, por abuso dos meios disponibilizados pela lei, resultados censuráveis, resultados que violam os valores e objectivos do ordenamento jurídico-tributário.

O abuso de mecanismos aparentemente legais converte esses mesmos mecanismos em expedientes anómalos, impróprios e artificiais, desprovidos da racionalidade económica, comercial ou empresarial que legitimaria o respectivo emprego, e cuja utilização se explica pelo intuito proeminente de contornar ou instrumentalizar as normas jurídico-tributárias, tendo em vista a obtenção de uma poupança fiscal.

A propósito da elisão, note-se que o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) já assinalou que “o princípio geral da proibição de práticas abusivas deve ser oposto a uma pessoa quando esta invoca certas regras do direito da União que preveem uma vantagem de uma forma que não é coerente com os objetivos que essas regras visam”, e que um “contribuinte não pode beneficiar de um direito ou de uma vantagem decorrente do direito da União caso a operação em causa seja puramente artificial no plano económico e vise eximir-se à aplicação da legislação do Estado-Membro em causa” (cfr. acórdão do TJUE de 26 de Janeiro de 2019, processos apensos C-115/16, C-118/16, C-119/16 e C-299/16, N Luxembourg 1 e outros, n.os 102 e 109).

O combate à elisão é um exercício de conciliação de valores e interesses, visto que, a seu pretexto, não se pode colocar em crise todos os resultados fiscais obtidos pelos contribuintes, ou seja, não se pode invadir totalmente os domínios do planeamento lícito – mas ao mesmo tempo não se pode conceber que, enredada nas naturais limitações que a obediência ao princípio da legalidade impõe para a globalidade da actuação administrativa da AT, esta se veja desarmada no combate à elisão fiscal.

Por isso a lei confere à AT poderes de actuação que lhe permitem sindicar a legalidade, e colocar em crise o planeamento fiscal realizado pelos contribuintes, quando haja indícios de que esse planeamento degenerou em elisão fiscal: e um dos seus principais instrumentos é a CGAA, que foi aplicada pela AT aos ora Requerentes, de forma a corrigir as respectivas situações jurídico-tributárias.”                             

           

§4. Do regime da participation exemption (artigo 51.º, n.º 1, do Código do IRC) e da cláusula específica anti-abuso (Artigo 51.º, n.ºs 13 e 14, do Código do IRC)

16. Como vimos, a Requerente imputa, desde logo, os seguintes vícios invalidantes aos atos tributários controvertidos: (i) vício de violação de lei consubstanciado na violação do regime da participation exemption, previsto no artigo 51.º, n.º 1, do Código do IRC; e, (ii) vício de violação de lei consubstanciado na errada interpretação e aplicação da cláusula específica anti-abuso, prevista no artigo 51.º, n.ºs 13 e 14, do Código do IRC.

O artigo 51.º do Código do IRC, nos segmentos aqui a considerar, estatui o seguinte:

Artigo 51.º

Eliminação da dupla tributação económica de lucros e reservas distribuídos

1 – Os lucros e reservas distribuídos a sujeitos passivos de IRC com sede ou direção efetiva em território português não concorrem para a determinação do lucro tributável desde que se verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos:

  1. O sujeito passivo detenha direta ou direta e indiretamente, nos termos do n.º 6 do artigo 69.º, uma participação não inferior a 10% do capital social ou dos direitos de voto da entidade que distribui os lucros ou reservas;
  2. A participação referida no número anterior tenha sido detida, de modo ininterrupto, durante o ano anterior à distribuição ou, se detida há menos tempo, seja mantida durante o tempo necessário para completar aquele período;
  3. O sujeito passivo não seja abrangido pelo regime da transparência fiscal previsto no artigo 6.º;
  4. A entidade que distribui os lucros ou reservas esteja sujeita e não isenta de IRC, do imposto referido no artigo 7.º, de um imposto referido no artigo 2.º da Diretiva 2011/96/UE, do Conselho, de 30 de novembro, ou de um imposto de natureza idêntica ou similar ao IRC e a taxa legal aplicável à entidade não seja inferior a 60% da taxa do IRC prevista no n.º 1 do artigo 87.º;  
  5. A entidade que distribui os lucros ou reservas não tenha residência ou domicílio em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável constante de lista aprovada por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças.

            (…)

            13 – O disposto no n.º 1 não é aplicável aos lucros e reservas distribuídos quando exista uma construção ou série de construções que, tendo sido realizada com a finalidade principal ou uma das finalidades principais de obter uma vantagem fiscal que frustre o objeto e finalidade de eliminar a dupla tributação sobre tais rendimentos, não seja considerada genuína, tendo em conta todos os factos e circunstâncias relevantes.

            14 – Para efeitos do número anterior, considera-se que uma construção ou série de construções não é genuína na medida em que não seja realizada por razões económicas válidas e não reflita substância económica.”   

            A propósito do regime da participation exemption, previsto nesta norma legal, Gustavo Lopes Courinha[1] afirma o seguinte:

            “Trata-se da transposição do artigo 4.º/1 da Diretiva Mães-Filhas, por meio da adoção de uma das soluções possíveis da mesma: a isenção dos dividendos auferidos.

            Esta isenção adota hoje uma conceção mais ampla de distribuições de resultados, abarcando, além dos clássicos dividendos e outras distribuições de lucro, as reservas distribuídas, os valores atribuídos ao associado nas associações em participação ou os reembolsos feitos aos sócios com a natureza de amortização de participações sociais sem redução de capital social (por isso, com natureza claramente remuneratória do investimento).

            (…)

            São vários os requisitos exigidos para tal isenção.

            Em primeiro lugar, exige-se uma participação relevante, ou seja, a detenção pela sociedade-mãe de uma participação qualificada de 10%, calculada direta ou indiretamente, no capital social das sociedade-filha.

            (…)

            Em segundo lugar, a aplicação do regime é feita depender da obrigação de detenção da participação qualificada pelo período mínimo de 12 meses.

            (…)

            Ainda a respeito deste prazo, admite-se a especial aplicação do regime acaso a dita participação qualificada, embora “detida há menos tempo, seja mantida durante o tempo necessário para completar aquele período”, solução que se compreende atentas as capacidades de controlo e correção de há muito existentes. Nesta circunstância, se for eventualmente violada tal exigência temporal, haverá lugar à respetiva correção da dedução efetuada.

Um terceiro requisito prende-se com a não sujeição da sociedade-mãe ao regime da transparência fiscal previsto no artigo 6.º do Código do IRC.

Trata-se, aqui, de prevenir que um instrumento de eliminação da dupla tributação económica aproveite a um sujeito que já beneficia de um outro regime de eliminação de dupla tributação, o qual implica a não sujeição dos respetivos lucros a IRC.

Num quarto requisito, encontra-se a obrigação que impende sobre a sociedade-filha de sujeição sem isenção a IRC ou a um outro imposto similar.

Este requisito assume a não isenção subjetiva da sociedade-filha enquanto condição de aplicação do regime, porquanto a sujeição abstrata a imposto (e, portanto, a possibilidade de pagar concretamente imposto) constitui a própria razão de ser do regime: sem a verificação de uma dupla sujeição a imposto das sociedades mãe e filha não se chegaria sequer a formar o pressuposto do próprio regime.

(…)
            Como quinto e penúltimo requisito, exige-se a sujeição da sociedade-filha a um nível de tributação mínima correspondente à aplicação de uma taxa legal “não inferior a 60% da taxa do IRC prevista no n.º 1 do artigo 87.º”, ou seja, presentemente uma taxa de 12,6% (em face dos atuais 21% em vigor).

(…)

Importa, ainda, sublinhar que se trata de uma taxa legal e não de uma taxa de tributação efetiva aquela a que este preceito se refere; o exercício a fazer é um exercício simples de identificação da taxa estatutária nominal e não um exercício contabilístico-matemático de determinação do valor concreto de imposto pago (carga fiscal concreta) ou o estabelecimento de um qualquer rateio ou proporção entre os lucros e os dividendos a distribuir em regime de isenção.

(…)

Um sexto e último requisito (negativo) – destinado a responder diretamente aos problemas de deslocalização e erosão internacional de base tributável (fenómeno BEPS) – respeita à obstaculização do regime de isenção quanto aos lucros e reservas distribuídos que, à luz da jurisdição do Estado da Fonte, tenham beneficiado de dedução à base tributável da sociedade-filha.

(…)

Em transposição da Diretiva 2015/121/UE, do Conselho, de 27 de janeiro de 2015, foram aditados [Pela Lei n.º 5/2016, de 29 de fevereiro.] ao artigo 51.º do Código do IRC os n.ºs 13 e 14, os quais introduzem uma norma setorial anti-abuso no regime da receção e pagamento de dividendos.

Segundo estes novos normativos, o regime de isenção dos dividendos não é aplicável quando existam “construções ou séries de construções…não genuínas”, motivadas por razões fiscais e que permitam defraudar o propósito do próprio regime (o qual, a nosso ver, só pode ser a própria eliminação da dupla tributação económica).

Ainda nos termos destas alterações, consideram-se não genuínas as construções jurídicas “não realizadas por razões económicas válidas e que não reflitam substância económica”.   

 

            §5. Da cláusula geral anti-abuso (artigo 38.º, n.ºs 2 e 3, da LGT)

            17. A Requerente imputa, ainda, aos atos tributários controvertidos o vício de violação de lei consubstanciado na não aplicação do regime da cláusula geral anti-abuso, previsto no artigo 38.º da LGT.

            O artigo 38.º da LGT, nos segmentos aqui a considerar, estatui o seguinte:

Artigo 38.º

Ineficácia de atos e negócios jurídicos

            (…)

            2 – As construções ou séries de construções que, tendo sido realizadas com a finalidade principal ou uma das finalidades principais de obter uma vantagem fiscal que frustre o objeto ou a finalidade do direito fiscal aplicável, sejam realizadas com abuso das formas jurídicas ou não sejam consideradas genuínas, tendo em conta todos os factos e circunstâncias relevantes, são desconsideradas para efeitos tributários, efetuando-se a tributação de acordo com as normas aplicáveis aos negócios ou atos que correspondam à substância ou realidade económica e não se produzindo as vantagens fiscais pretendidas.

3 – Para efeitos do número anterior considera-se que:

a) Uma construção ou série de construções não é genuína na medida em que não seja realizada por razões económicas válidas que reflitam a substância económica;

b) Uma construção pode ser constituída por mais do que uma etapa ou parte.

            A propósito desta cláusula geral anti-abuso (CGAA) e dos elementos que a compõem, Gustavo Lopes Courinha[2] propugna o seguinte:

            “A CGAA é composta de 5 elementos: – elemento meio; – elemento resultado; – elemento intelectual; – elemento normativo; – elemento sancionatório.

            Os primeiros quatro elementos são requisitos cumulativos de aplicação da CGAA, enquanto o último corresponde à estatuição da norma.

O elemento meio respeita aos actos ou negócios praticados pelo contribuinte, os quais, quando formem uma unidade lógica, sequencial e indivisível, podem qualificar-se como estrutura. 

Os actos ou negócios praticados deverão ser anómalos ou inusuais e desadequados.

O elemento resultado é composto pela vantagem fiscal obtida, a qual, para além dos casos previstos na lei, contempla ainda aqueles que se conclua serem vantajosos por comparação com o nível e termos de tributação ou carga tributária apurados numa operação normal.

O elemento resultado é ainda composto, no caso em que a estrutura não seja de natureza circular, pela obtenção de um resultado económico equivalente àquele que seria obtido não fossem considerações de ordem fiscal, a qual se pode contemplar nos termos dessa estrutura.

O elemento intelectual pressupõe que os meios utilizados pelo contribuinte (actos ou negócios jurídicos) sejam dirigidos às produção de determinado resultado (vantagem fiscal), e que este seja preponderante na motivação do contribuinte.

Não importa, nesta sede, apurar se a motivação do contribuinte contempla o carácter anti-jurídico da vantagem fiscal obtida; basta que contemple a vantagem per si.

A demonstração da motivação pode ser subjectiva (ou psicológica), ou objectiva, sendo neste último caso apurada em atenção a elementos de prova que, segundo critérios de razoabilidade e normalidade, demonstrem a motivação fiscal preponderante.

Fica sempre ressalvada a possibilidade de demonstração em contrário pelo contribuinte.

Na falta de elenco pela lei dos elementos mais sintomáticos da prevalência da motivação fiscal, poderá o intérprete socorrer-se de todos aqueles que se revelem suficientes para tal, em especial por análise das obrigações e direitos legalmente decorrentes dos meios empregues.

O apuramento do elemento normativo é uma questão de Direito.

O elemento normativo não decorre directamente da lei, (…).

O elemento normativo decorre da teoria da Fraude à Lei e encontra-se consagrado pelo STA, como pressuposto dos actos de elisão ou evitação fiscal.

O elemento normativo tem por sua função primordial distinguir os casos de elisão fiscal dos casos de poupança fiscal legítima, em consideração dos princípios de Direito Fiscal, sendo que só nos casos em que se demonstre uma intenção legal contrária ou não legitimadora do resultado obtido, se pode falar naquela.

(…)

O elemento sancionatório corresponde à estatuição da norma e visa impedir a produção do resultado fraudulento, afastando, uma vez comprovados os requisitos da CGAA, os efeitos fiscais produzidos, sem afectar os efeitos civis.

(…)

Apenas os efeitos fiscais obtidos pelo contribuinte e reprovados pela CGAA, devem ser desconsiderados.”

A aplicação da CGAA deve observar o disposto no artigo 63.º do CPPT que, nos segmentos que aqui importa considerar, estatui o seguinte:

Artigo 63.º

Aplicação de disposição antiabuso

            1 – A liquidação de tributos com base na disposição antiabuso constante do n.º 2 do artigo 38.º da Lei Geral Tributária segue os termos previstos neste artigo.

            (…)

3 – A fundamentação do projecto e da decisão de aplicação da disposição antiabuso referida no n.º 1 contém necessariamente:

a) A descrição da construção ou série de construções que foram realizadas com abuso das formas jurídicas ou que não foram realizadas por razões económicas válidas que reflitam a substância económica;

b) A demonstração de que a construção ou série de construções foi realizada com a finalidade principal ou uma das finalidades principais de obter uma vantagem fiscal não conforme com o objeto ou a finalidade do direito fiscal aplicável;

c) A identificação dos negócios ou atos que correspondam à substância ou realidade económica, bem como a indicação das normas de incidência que se lhes aplicam;

d) A demonstração de que o sujeito passivo sobre o qual recairia a obrigação de efetuar a retenção na fonte, ou de reter um montante de imposto superior, tinha ou deveria ter conhecimento da construção ou série de construções, quando aplicável.

4 – A aplicação da disposição antiabuso referida no n.º 1 depende de:

a) Audição prévia do contribuinte, nos termos da lei;

b) Existência de procedimento de inspeção dirigido ao beneficiário do rendimento e ao substituto tributário, quando se verifique o recurso às regras gerais de responsabilidade em caso de substituição tributária a que se refere o n.º 5 do artigo 38.º da Lei Geral Tributária.

5 – O direito de audição prévia é exercido no prazo de 30 dias a contar da notificação do projecto de aplicação da disposição antiabuso ao contribuinte.

6 – No prazo referido no número anterior poderá o contribuinte apresentar a prova que entender pertinente.

7 – A aplicação da disposição antiabuso referida no n.º 1 é prévia e obrigatoriamente autorizada, após a audição prévia do contribuinte prevista no n.º 5, pelo dirigente máximo do serviço ou pelo funcionário em quem ele tiver delegado essa competência.

(…)”

 

            §6. A relação entre a norma específica anti-abuso (artigo 51.º, n.ºs 13 e 14, do Código do IRC) e a cláusula geral anti-abuso (artigo 38.º, n.ºs 2 e 3, da LGT)

18. No caso concreto, estamos confrontados, por lado, com uma norma específica anti-abuso e, por outro lado, com a cláusula geral anti-abuso, importando, pois, delimitar os respetivos âmbitos aplicativos a partir daqueles que são os respetivos perímetros normativos acima enunciados.

A propósito das normas anti-abuso, Joaquim Freitas da Rocha[3] afirma o seguinte:

“Do ponto de vista da sua abrangência material, as normas antiabuso podem ser gerais (NAAG) ou específicas (NAAE). As primeiras são aquelas que, sem recortar uma específica situação material a que se apliquem, procuram atingir de modo indiscriminado qualquer comportamento abusivo fiscal, independentemente do domínio substantivo em causa e do regime a que o mesmo se sujeita (geral ou especial, sujeição ou isenção, residente ou não residente, etc.); neste sentido, pode dizer-se que irradiam os seus efeitos em relação a um círculo normativo jurídico-fiscal subjetiva e objetivamente indeterminado, abrangendo potencialmente quaisquer impostos, quaisquer regimes e quaisquer pessoas; por tal motivo, aliás, cada ordenamento se basta com a existência de uma norma deste género. As segundas, diferentemente, existem em quantidade elevada e procedem ao recorte – abstrato, claro, uma vez que se trata de normas jurídicas – das específicas situações jurídicas materiais e dos sujeitos a que se aplicam, sinalizando determinadas zonas que o normador supõe que são de elevada probabilidade de práticas abusivas (…). Suspeitar-se-á que nestes domínios os atores usam uma forma jurídica civilisticamente limpa para prosseguir um fim de afastamento, redução ou diferimento fiscal que não foi pensado para lhe corresponder. (…)

Por outro lado, e sem constituir propriamente uma novidade, atentos os ensinamentos da hermenêutica geral da teoria do Direito – e particularmente da regra lex specialis –, compreende-se que as NAAE, atendendo ao seu perímetro de abrangência mais focalizado, têm prevalência aplicativa relativamente à NAAG. Neste sentido se poderá falar em subsidiariedade desta última, bem assim como da sua natureza de ultimum remedium, apenas podendo ser invocada e utilizada em situações em que, urgindo efetivamente combater as práticas abusivas, não existem normas antiabuso de natureza específica.

(…) as NAAE revestem natureza bastante mais recortada e rígida, procedendo ao desenho abstrato das específicas situações jurídicas materiais a que se aplicam e dos respetivos sujeitos, em casos em que se revelam acrescidos riscos de evitação abusiva ou evasão.”

  Também neste conspecto, Gustavo Lopes Courinha[4] afirma o seguinte:

“A CGAA encontra-se estruturada para operar em termos dinâmicos, visando quaisquer actos ou negócios jurídicos estruturados e levados a cabo principal ou unicamente com o objectivo de obter uma vantagem fiscal e não sujeitos, pela mera actividade interpretativa, à norma tributária (em regra à norma de sujeição), embora tais actos produzam efeitos económicos equivamentes aos dos actos ou negócios jurídicos tipificados em tal norma. (…)

As normas especiais anti-abuso, pelo contrário e qualquer que seja o seu modo de actuação, funcionam de um modo rígido. (…)

Na confluência entre as normas especiais anti-abuso, (…) e a CGAA, encontra-se uma terceira espécie que comunga de certas características de ambas: são as cláusulas sectoriais anti-abuso. (…)

O modo de actuação é, sem dúvida, próprio de uma CGAA, com a aplicação da norma de incidência que melhor se adapte aos efeitos económicos ou práticos do acto ou operação, ainda que eventualmente prescindindo do elementos intelectual; mas quanto à abrangência, encontra-se mais próxima da norma especial anti-abuso, por se delimitar em referência a um dado imposto, ou sector de tributação (…).

As normas sectoriais anti-abuso pretendem assim atingir grupos de casos não pré-determinados, correspondentes a situações ou pressupostos de facto, que revelem efeitos económicos idênticos ou equivalentes às situações de facto objecto de tribnutação naquele sector específico do sistema fiscal e/ou tenham sido praticados com a intenção prevalecente ou única de reduzir a carga tributária. (…)   

Em conclusão, as normas especiais anti-abuso e a CGAA não podem ser concorrentes relativamente a uma mesma situação de facto. Se uma norma especial anti-abuso afasta, implícita ou expressamente, tal situação do campo da elisão fiscal, porque tal situação foi efectivamente prevista pelo legislador, não pode a CGAA reconduzi-la a tal área. Mas tal já não sucederá se o escopo da norma especial anti-abusiva não tiver sequer contemplado aquela situação, caso em que a CGAA pode ser susceptível de aplicação.” 

 

§7. O caso concreto: subsunção normativa

19. Uma vez feito o antecedente périplo normativo, importa agora subsumir-lhe o caso concreto a fim de aquilatarmos se se verificam ou não os vícios invalidantes imputados pela Requerente aos atos tributários controvertidos.

 

20. No concernente à aplicação do regime da participation exemption, previsto no artigo 51.º, n.º 1, do Código do IRC, há que verificar se, no caso concreto, estão preenchidos os requisitos cumulativos legalmente exigidos para que se possa operar a sua aplicação, ou seja, para que o montante de € 621.860,00 que a Requerente recebeu a título de reservas livres distribuídas pela B... SGPS, S.A. (cf. facto provado q)), não concorra para a determinação do lucro tributável da Requerente, em sede de IRC, referente ao exercício de 2019. Vejamos, pois, seguindo a ordem pela qual são tais requisitos enunciados nas diversas alíneas do n.º 1 do artigo 51.º do Código do IRC:

a) A Requerente detém uma participação direta de 12,4% no capital social da B... SGPS, S.A. (cf. factos provados m) e t));

b) A Requerente detém, ininterruptamente, a referida participação no capital social da B... SGPS, S.A. desde 11.11.2019 até ao presente, ou seja, há mais de 5 (cinco) anos (cf. factos provados m) e t));

c) A Requerente não está abrangida pelo regime da transparência fiscal previsto no artigo 6.º do Código do IRC (cf. facto provado b));

d) A B... SGPS, S.A. está sujeita e não isenta de IRC e a taxa que lhe é aplicável não é inferior a 60% da taxa de IRC prevista no n.º 1 do artigo 87.º do Código do IRC (cf. documento n.º 5 anexo ao PPA e PA); e,

e) A B... SGPS, S.A. tem a sua sede e direção efetiva em Portugal (cf. documento n.º 5 anexo ao PPA e PA).

Nesta conformidade, resulta evidenciado que estão preenchidos os requisitos cumulativos legalmente previstos para a aplicação do regime da participation exemption à aludida distribuição de reservas livres feita pela B... SGPS, S.A. à Requerente, no montante de € 621.860,00 que, assim, não deverá concorrer para a determinação do lucro tributável da Requerente, em sede de IRC do exercício de 2019.

 

21. Isto posto, importa agora aquilatar se se verificam os pressupostos legalmente previstos para que possa ser aplicada, in casu, a cláusula específica anti-abuso, prevista no artigo 51.º, n.ºs 13 e 14, do Código do IRC; há, pois, que apurar se foi realizada uma construção ou série de construções não genuína, motivada por razões fiscais e destinada, apenas ou principalmente, a defraudar o propósito do regime da participation exemption, ou seja, a obter indevidamente a eliminação da dupla tributação económica.

As regras de repartição do ónus da prova, vertidas no artigo 74.º, n.º 1, da LGT, determinam que compete a quem invoque essa cláusula específica anti-abuso, ou seja, à AT, provar o seguinte: (i) a existência de uma construção ou série de construções; e (ii) que a mesma não é genuína – ou seja, não foi realizada por razões económicas válidas e não reflete substância económica – e apenas foi realizada com a finalidade principal ou uma das finalidades principais de obter uma vantagem fiscal que frustre o objeto e finalidade de eliminar a dupla tributação económica.

A fundamentação aduzida pela AT para alicerçar a sua posição no sentido da verificação dos pressupostos legais da aludida cláusula específica anti-abuso consta do RIT (cf. facto provado v)) e assenta, nuclearmente, na análise das operações realizadas pelos acionistas, pessoas singulares, da B... SGPS, S.A., referenciadas nos factos provados k) e l) e, sobretudo, da operação de venda da participação social de 12,4% que a E... – sócia-gerente da Requerente (cf. facto provado a)) – detinha na B... SGPS, S.A. à Requerente (cf. factos provados m), n) e o)). Na perspetiva da AT, a venda por parte da E... da sua participação social na B... SGPS, S.A. à Requerente não foi realizada por razões económicas válidas e não reflete qualquer substância económica. Com efeito, entende a AT que “a única finalidade da alteração da titularidade das participações de uma detenção direta para uma detenção indireta era a de granjear à sócia-gerente E... acesso a recursos monetários livres de tributação mais onerosa”; porquanto, caso a E... não tivesse optado por vender a sua participação social na B... SGPS, S.A. à Requerente, “teria que, por forma a obter acesso aos mesmos recursos monetários albergados na B... SGPS, decidir pela distribuição de dividendos de acordo com as proporções detidas no capital social, juntamente com os demais sócios”, o que “daria origem a um facto tributário que seria sujeito a tributação em sede de IRS, à taxa liberatória de 28%, por força do disposto na alínea h) do n.º 2 do art. 5.º, conjugado com a alínea a) do n.º 1 do art. 71.º, ambos do CIRS”. Nesta conformidade, a AT entende que a aludida distribuição de reservas livres pela B... SGPS, S.A. à Requerente e a subsequente eliminação da dupla tributação económica frustram o objeto do regime da participation exemption, consagrado no artigo 51.º, n.º 1, do Código do IRC.    

Vista esta argumentação expendida pela AT, afigura-se-nos que da mesma não resulta que a transferência da participação social de 12,4% que a E... detinha na B... SGPS, S.A. para a Requerente não tenha sido genuína, ou seja, não tenha sido o negócio pretendido celebrar, e efetivamente celebrado, pelas partes nele envolvidas (a E... e a Requerente); com efeito, o que resulta dos argumentos esgrimidos pela AT é que esta entende que o meio usado para efetuar aquela transferência se revela artificioso, pois, “por forma a evitar efetuar a referida distribuição de dividendos, a sócia-gerente E... preferiu criar um conjunto de passos através da interposição da sociedade A..., Lda., os quais foram desde a compra e venda das ações à posterior distribuição de resultados entre duas pessoas coletivas, tudo executado de forma a garantir que os fundos lhe chegavam sobre a forma de pagamento de uma dívida”.

Acontece que, como a própria AT reconhece, o imposto que assim terá sido evitado foi o IRS e não o IRC que está em causa neste processo. Ora, o pressuposto do próprio regime da participation exemption é a sujeição a IRC e, portanto, a possibilidade de pagar este imposto e não um qualquer outro imposto.

Ademais, a AT centrou toda a sua argumentação na atuação da E... e, paralelamente, na dos demais acionistas da B... SGPS, S.A., nada tendo carreado para os autos no sentido de demonstrar que a aquisição da aludida participação social pela Requerente se tratou de uma operação meramente oportunista e, portanto, de um investimento temporário (rectius, de uma aparência de investimento) e com caráter abusivo. Sendo certo que resultou provado que a Requerente mantém, até ao presente, a aludida participação social na B... SGPS, S.A. (cf. facto provado t)) e que, relativamente ao preço devido pela aquisição dessa participação social, a Requerente apenas pagou à sua sócia-gerente E..., até 31 de dezembro de 2019, a quantia total de € 325.000,00 (cf. facto provado s)). Mais, resultou ainda provado que, no ano de 2019 – exercício em que recebeu o montante de € 621.860,00, a título de reservas livres distribuídas pela B... SGPS, S.A. (cf. facto provado q)) –, a Requerente não detinha património imobiliário, sendo que, no decurso do ano de 2023, possuía os dois imóveis identificados no facto provado u), com um valor patrimonial tributário global de € 309.003,21.

            Acresce que, como é salientado na decisão arbitral proferida no processo n.º 735/2022-T:

            “Por outro lado, se o legislador fiscal consentiu, no artigo 51.º do CIRC, verificados os correlativos pressupostos, que seja eliminada a dupla tributação económica quanto aos dividendos distribuídos por entidades sujeitas a IRC a outras entidades sujeitas ao mesmo imposto, também não se vê como possa merecer algum tipo de reparo um sujeito passivo que dele beneficie por opção deliberada, no quadro da sua gestão e organização pessoal ou empresarial.

Caso diferente seria não se pretender efetuar uma determinada (re)organização e recorrer artificiosamente a ela para beneficiar de um regime mais favorável, o que não ficou demonstrado no caso sub judice. (…)

Não se pode pretender penalizar um sujeito passivo – no caso a Requerente –, e no quadro de uma ulterior distribuição de dividendos, pelo comportamento de outros sujeitos passivos, os quais, por meio de uma operação porventura feita de forma abusiva, retiraram (estes e não aquele) vantagens fiscais indevidas. (…)

A escolha das opções menos onerosas não pode, de per se, originar a aplicação das normas anti-abuso.”

Nesta conformidade, constitui entendimento deste Tribunal Arbitral que não foi demonstrada a verificação dos pressupostos legalmente previstos para que possa ser aplicada, in casu, a cláusula específica anti-abuso, prevista no artigo 51.º, n.ºs 13 e 14, do Código do IRC.

                                                                                          

22. Isto posto, resulta do anteriormente exposto que a AT fundamenta a sua posição no entendimento de que a E... alienou a sua aludida participação social na B... SGPS, S.A. à Requerente visando, dessa forma, evitar uma distribuição de dividendos de acordo com as proporções detidas no capital social, juntamente com os demais sócios”, o que “daria origem a um facto tributário que seria sujeito a tributação em sede de IRS, à taxa liberatória de 28%, por força do disposto na alínea h) do n.º 2 do art. 5.º, conjugado com a alínea a) do n.º 1 do art. 71.º, ambos do CIRS”.

Como é explicitado na decisão arbitral proferida no processo n.º 414/2023-T, “a dissimulação da distribuição de dividendos (tributáveis) noutras formas não-tributáveis de distribuição pelos sócios dos rendimentos de uma empresa, por transformação desses rendimentos em mais-valias, ou em reembolsos de dívidas, é um esquema de elisão conhecido.

Na primeira dessas modalidades, este esquema envolve, como passos essenciais, que pessoas singulares, sócios dominantes de uma sociedade que possui avultadas reservas disponíveis, traduzíveis em elevada liquidez, que derivam de uma política sistemática de não-distribuição de dividendos, procedem à alienação onerosa das acções de que são titulares a uma outra sociedade, designadamente uma SGPS, igualmente por eles controlada (sendo coincidente a estrutura accionista e o Conselho de Administração de ambas as sociedades), com pagamento diferido do preço, que será efectuado uma vez distribuídas as reservas disponíveis à sociedade adquirente, a qual não suporta qualquer tributação sobre esses lucros recebidos por força dos mecanismos da eliminação da dupla tributação económica de lucros distribuídos, uma montagem com a qual os sócios pessoas singulares conseguem receber como mais-valias não tributadas, advenientes do preço das acções alienadas de cujo crédito são titulares na SGPS, aquilo que, em termos normais, receberiam sob a forma de dividendos tributados em sede de IRS.”

Uma vez que a AT entende ser isto o que se verifica, incumbir-lhe-ia então lançar mão da cláusula geral anti-abuso, prevista no artigo 38.º, n.ºs 2 e 3, da LGT e que é aplicada nos termos previstos no artigo 63.º do CPPT, relativamente à atuação da E..., a fim de, nesta estrita perspetiva, desqualificar, para efeitos fiscais, a aludida transmissão da participação social na B... SGPS, S.A., realizada pelo preço global de € 713.366,00, e tributar a referida distribuição de reservas livres, no valor de € 621.800,00, “em sede de IRS, à taxa liberatória de 28%, por força do disposto na alínea h) do n.º 2 do art. 5.º, conjugado com a alínea a) do n.º 1 do art. 71.º, ambos do CIRS”, liquidando o correspondente IRS.

Ao invés disso, a AT delineou e alicerçou a sua intervenção na perspetiva da própria Requerente, aplicando, erradamente, a cláusula específica anti-abuso prevista nos n.ºs 13 e 14 do artigo 51.º do Código do IRC e, dessa forma, desconsiderou, também erradamente, a aplicação do regime da particpation exemption às reservas livres distribuídas pela B... SGPS, S.A. à Requerente, pese embora estarem preenchidos todos os respetivos requisitos legais.    

 

23. Nesta conformidade, a liquidação adicional de IRC n.º 2023 ..., referente ao ano de 2019, afigura-se ilegal, por violação do disposto no artigo 51.º, n.ºs 1, 13 e 14, do Código do IRC e, por consequência, deve ser anulada (cf. artigo 163.º, n.º 1, do CPA); por emergirem e, portanto, encontrarem o seu fundamento naquela liquidação adicional de IRC, também a liquidação de juros compensatórios n.º 2023... e a demonstração de acerto de contas n.º 2023..., da qual resultou o valor total a pagar de € 146.469,89, padecem de ilegalidade e devem, por isso, ser anuladas. 

 

24. A finalizar, importa referir que foram conhecidas e apreciadas as questões relevantes submetidas à apreciação deste Tribunal, não o tendo sido aquelas cuja decisão ficou prejudicada pela solução dada a outras ou cuja apreciação seria inútil (cf. artigos 130.º e 608.º, n.º 2, do CPC ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

 

IV. Decisão

Nos termos expostos, este Tribunal Arbitral delibera julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e, consequentemente:

  1. São declaradas ilegais e anuladas a liquidação adicional de IRC n.º 2023..., referente ao exercício de 2019, a liquidação de juros compensatórios n.º 2023... e a respetiva demonstração de acerto de contas n.º 2023..., com as legais consequências;
  2. É a Autoridade Tributária e Aduaneira condenada no pagamento das custas do processo.    

 

V. Valor do Processo

Atento o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT, no artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT e no artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, é fixado ao processo o valor de € 146.469,89 (cento e quarenta e seis mil quatrocentos e sessenta e nove euros e oitenta e nove cêntimos).

 

VI. Custas

Nos termos do disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, do RJAT e no artigo 4.º, n.º 4, e na Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, o montante das custas é fixado em € 3.060,00 (três mil e sessenta euros), cujo pagamento fica a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

Notifique.

 

Lisboa, 10 de dezembro de 2024.

 

 

O Presidente do Tribunal Arbitral,

 

(José Poças Falcão)

 

A Árbitra vogal,

 

 

(Paula Cristina Gomes Florindo)

 

O Árbitro vogal (relator),

 

(Ricardo Rodrigues Pereira)

 

 



[1] Manual do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, Coimbra: Almedina, 2019, pp. 125-130.

[2] A Cláusula Geral Anti-Abuso no Direito Tributário, Contributos para a sua Compreensão, reimpressão da edição de Maio/2004, Coimbra: Almedina, 2009, pp. 210-211.

[3] Introdução ao Planeamento Fiscal, Coimbra: Almedina, 2023, pp. 139-141

[4] Ob. cit., pp. 95, 103, 106 e 110.