Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 428/2024-T
Data da decisão: 2024-11-18  IRS  
Valor do pedido: € 246.262,58
Tema: IRS – residência fiscal – ónus da prova de residência fiscal noutro Estado
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SUMÁRIO:

  1. A residência fiscal configura-se como um conceito basilar em termos de determinação da sujeição pessoal ao IRS.
  2. Nos termos e para os efeitos do disposto no Código do IRS, a prova de residência fiscal noutro Estado pode ser feita por intermédio da apresentação de meios complementares de prova que demonstrem essa prova, não cabendo ao certificado de residência fiscal exigido pela Autoridade Tributária esse exclusivo.

 

DECISÃO ARBITRAL[1]

Requerentes –A... e B...

Requerida - Autoridade Tributária e Aduaneira

 

Os Árbitros, Carla Castelo Trindade (Árbitro Presidente), Sílvia Oliveira (Relatora) e Sofia Ricardo Borges, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar o Tribunal Arbitral Colectivo, constituído em 11-06-2024, com respeito ao processo acima identificado, decidiram o seguinte:

 

  1. RELATÓRIO

 

  1. A..., contribuinte fiscal nº ... e B..., contribuinte fiscal nº..., ambos com residência em ..., no Reino Unido (adiante designados por “Requerentes”), apresentaram pedido de pronúncia arbitral e de constituição de Tribunal Arbitral Colectivo no dia 25-03-2024, ao abrigo do disposto no Decreto-lei nº 10/2011, de 20 Janeiro [Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT)], em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por “Requerida”).

 

  1. Os Requerentes apresentaram pedido de pronúncia arbitral, na sequência da notificação da decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa n.º ...2022... (previamente apresentada), “(…) com vista à declaração de ilegalidade do ato de liquidação (…) identificado no pedido (…) relativo à Liquidação Oficiosa de Imposto sobre os Rendimentos das Pessoas Singulares (IRS) n.º 2022..., referente a 2018 (…)”, esclarecendo que “(…) o objeto mediato do presente Pedido de Pronúncia Arbitral (…) é o indeferimento da referida Reclamação Graciosa, identificada com o número de processo ...2022..., e o objeto imediato é a apreciação da Liquidação Oficiosa de IRS n.º 2022..., referente ao ano de 2018, com o valor a pagar de 246.262,58€ (…)”.

 

  1. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD em 27-03-2024 e notificado, na mesma data, à Requerida.

 

  1. Em 20-05-2024, dado que os Requerentes não procederam à nomeação de árbitro, foram os signatários designados como árbitros pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, ao abrigo do disposto no artigo 6º, nº 2 do RJAT, tendo as nomeações sido aceites, no prazo e termos legalmente previstos.

 

  1. Na mesma data, foram as Partes devidamente notificadas dessas designações, não tendo manifestado vontade de as recusar, nos termos do disposto no artigo 11º nº 1 alíneas a) e b) do RJAT e nos artigos 6º e 7º do Código Deontológico.

 

  1. Em 11-06-2024, em conformidade com o preceituado na alínea c) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, o Tribunal Arbitral Colectivo foi constituído, tendo sido proferido despacho arbitral na mesma data (notificado a 12-06-2024), no sentido de notificar a Requerida para, nos termos do disposto no artigo 17º, nº 1 do RJAT, apresentar Resposta, no prazo máximo de 30 dias e, caso quisesse, solicitar a produção de prova adicional.

 

  1. Adicionalmente, foi ainda referido naquele despacho arbitral que a Requerida deveria remeter ao Tribunal Arbitral, dentro do prazo da Resposta, cópia do processo administrativo.

 

  1. A Requerida, em 05-07-2024, apresentou a sua Resposta, tendo-se defendido por excepção (da incompetência do CAAD para conceder a alteração de morada com efeitos retroativos) e por impugnação, e concluído no sentido de que “a) Deve a exceção invocada proceder, e a Requerida ser absolvida da instância; b) Na hipótese de assim não se entender, o que não se concede, deve a presente ação arbitral ser julgada improcedente, por não provada, e ser a Requerida absolvida do pedido e os atos impugnados serem mantidos na ordem jurídica”.

 

  1. Na mesma data, a Requerida anexou aos autos cópia do processo administrativo.

 

  1. Por despacho arbitral de 16-09-2024, foram os Requerentes notificados para se pronunciarem, no prazo de 10 dias, sobre a matéria de excepção suscitada pela Requerida.

 

  1. Os Requerentes apresentaram a sua defesa à matéria de excepção em 26-09-2024, tendo concluído que “(…) não pode lograr a excepção dilatória invocada pela Autoridade Tributária, pois o que cumpre ao Tribunal Arbitral apreciar é a legalidade da Liquidação Oficiosa de IRS n.º 2022..., referente a 2018, a qual implica, necessariamente, o juízo de mérito sobre erro na qualificação dos Requerentes como residentes fiscais, em Portugal, em 2018” pelo que entende que deve “(…) o pedido de pronúncia arbitral ser apreciado e julgado procedente”.

 

  1. Por despacho arbitral de 18-10-2024, foram as Partes notificadas da decisão de dispensa da realização da reunião a que alude o artigo 18º do RJAT, bem como da dispensa de apresentação de alegações, sendo a decisão final proferida até ao dia 11-12-2024.

 

  1. Adicionalmente, foram ainda os Requerentes notificados para, no prazo de dez dias, procederem ao depósito da taxa de arbitragem subsequente e à junção aos autos do respectivo comprovativo.

 

  1. CAUSA DE PEDIR

 

2.1.    Os Requerentes começam por referir que “em 2017, o Requerente A... deslocou-se ao Serviço de Finanças de ... para realizar um registo de propriedade, em seu nome, para efeitos de Alojamento Local” mas “considerando que a língua nativa do ora Requerente não é a língua portuguesa, (…), a comunicação entre o Requerente e o funcionário da Autoridade Tributária resultou numa série de desentendimentos que culminaram na alteração da morada fiscal dos Requerentes para a ..., em ..., Portugal”.

 

2.2.    Esclarecem os Requerentes que “face às dificuldades em entender a língua portuguesa, confiaram a preparação e submissão das suas declarações fiscais a um contabilista” o qual “(…) agindo de acordo com o cadastro fiscal dos Requerentes, procedeu, autonomamente, à submissão das declarações de IRS dos Requerentes, na qualidade de residentes fiscais, para os anos de 2018, 2019 e 2020” mas “(…) os Requerentes nunca foram residentes fiscais, em Portugal, entre 2017 e a presente data, tendo sempre declarado os seus rendimentos – e sujeitado os mesmos a tributação – no Reino Unido”.

 

  1. Consequentemente, “os Requerentes e o seu contabilista procederam à substituição das Declarações de IRS para os anos de 2018, 2019 e 2022, nas quais identificaram corretamente o seu estatuto de Não Residentes” mas, em 2022, os Requerentes foram notificados da emissão da Liquidação Oficiosa de IRS n.º 2022..., relativa ao ano de 2018.

 

  1. Inconformados com a situação, os Requerentes dirigiram-se presencialmente ao Serviço de Finanças de Cascais – ..., onde submeteram, em mão, a Reclamação Graciosa e corrigiram o seu estatuto de residência fiscal, em Portugal, passando a contar como residência fiscal a morada onde sempre residiram no Reino Unido”.

 

  1. Alegam os Requerentes que “adicionalmente, foi solicitado ao Serviço de Finanças de Cascais – ... que a alteração de morada tivesse efeitos retroactivos ao ano de 2017 (ano em que lhes foi indevidamente alterada a residência para Portugal), tendo todo este procedimento sido realizado presencialmente no Serviço de Finanças”.

 

  1. Prosseguem os Requerentes esclarecendo que, “em 2 de Novembro de 2023, (…) foram notificados da resposta da Autoridade Tributária desse mesmo pedido, o qual foi indeferido somente porque os Requerentes não lograram juntar documentação que atestasse a sua residência no Reino Unido em 2017 (…)”, “nomeadamente, (…) que os Requerentes não lograram apresentar um certificado que ateste a sua residência fiscal no estrangeiro durante o período em causa”.

 

  1.  Acrescentam os Requerentes que “não conformados com a decisão da Autoridade Tributária, os Requerentes exerceram o seu direito de participação na decisão, (…), tendo nesse âmbito apresentado as suas declarações de rendimentos e cartas de confirmação de residência no Reino Unido”.

 

  1. Não obstante, “(…) foram os Requerentes notificados da decisão final de indeferimento, no âmbito do processo de Reclamação Graciosa n.º ...20220... (…)”.

 

  1. Referem os Requerente que “(…) a questão controvertida é a de saber se apresentação de um Certificado de residência fiscal, emitido por um país terceiro, é a única forma de um contribuinte demonstrar que é residente nesse outro Estado e, consequentemente, não é considerado como residente fiscal em Portugal não havendo aqui lugar à tributação dos rendimentos obtidos no estrangeiro”.

 

  1. Neste âmbito, alegam os Requerentes que “pese embora no cadastro da Autoridade Tributária os Requerentes constassem como residentes fiscais em Portugal, tal registo tem força meramente declarativa, não constitutiva, pelo que sempre prevalecerá a qualificação do estatuto de residência dos Requerentes face ao disposto no artigo 16.º do Código do IRS” pelo que “(…) não são nem podem os Requerentes ser considerados como residentes fiscais em Portugal já que aqui não permaneceram mais de 183 dias e a habitação que aqui possuíam, à data, não fazia pressupor que a intenção dos Requerentes era de a manter e ocupar como residência habitual”.

 

  1. Adicionalmente, citando diversa jurisprudência, concluem os Requerentes que “(…) da conjugação da jurisprudência emanada pelos doutos tribunais arbitrais resulta que o Certificado de Residência fiscal num Estado terceiro não é o único documento idóneo para efeitos de provar a não residência em Portugal”.

 

  1. RESPOSTA DA REQUERIDA

 

3.1.    Começa a Requerida por referir que, “(…) embora os Requerentes peticionem a final apenas a (…) anulação do acto de liquidação de IRS relativos ao ano de 2018 (…) é manifesto que a sua pretensão vai muito mais além (…)” porquanto “(…) a questão controvertida é a de saber se apresentação de um Certificado de residência fiscal, emitido por um país terceiro, é a única forma de um contribuinte demonstrar que é residente nesse outro Estado e, consequentemente, não é considerado como residente fiscal em Portugal não havendo aqui lugar à tributação dos rendimentos obtidos no estrangeiro”.

 

3.2.    Ou seja, segundo alega a Requerida, “(…) o verdadeiro objeto da lide circunscreve-se à impugnação do ato que indeferiu o pedido de alteração de morada com efeitos retroativos, pois só com o seu deferimento poderia vingar a suposta ilegalidade da liquidação de IRS referente ao ano de 2018, com fundamento na alegada violação do artigo 16.º do CIRS”, reiterando que “(…) o peticionado não pode proceder, em primeiro lugar porque a questão controvertida não pode ser apreciada pelo CAAD, e, ainda que assim não fosse, (…), sempre se diria que os atos impugnados não padecem da ilegalidade que lhe é apontada”.

 

3.3.    Assim, a Requerida veio suscitar a excepção da incompetência do CAAD para conceder a alteração de morada com efeitos retroativos porquanto entende que “(…) o que os Requerentes pretendem com a presente lide é que lhes seja concedido o pedido de alteração de morada com efeitos retroativos ao ano de 2017”, “pois, só após o reconhecimento dessa alteração de morada é que a liquidação de IRS de 2018 poderia ser considerada ilegal por violação do artigo 16.º do CIRS”.

 

  1. Porém, alega a Requerida que, “(…) nos termos da lei, quer o ato que indeferiu o pedido, quer o reconhecimento pretendido está excluído do âmbito da competência material deste Tribunal Arbitral, não podendo (…) este conhecer, e/ou pronunciar-se sobre a retroatividade da alteração da morada” e, enumerando decisões arbitrais, conclui a Requerida que “a incompetência material configura uma exceção dilatória, (…) que determina a absolvição da instância no que a este pedido concerne (…)”.

 

  1. Por outro lado, defende-se a Requerida por impugnação, alegando que “aceitam-se como verdadeiros os factos descritos nos artigos 6.º, 13.º, 14.º, 15.º, 16.º, 17.º e 18.º do P.P.A., impugnando-se todos os demais”.

 

  1. Segundo alega a Requerida, “só em 06/12/2021 é que os Requerentes alteraram a morada fiscal para o Reino Unido” e é “em 2022, após notificação da liquidação oficiosa de IRS n.º 2022..., referente ao ano de 2018, [que] apresentaram reclamação graciosa”, concluindo a Requerida que “em simultâneo solicitaram os Requerentes que a alteração de morada retroagisse a 2017, pedido indeferido por manifesta falta de prova, designadamente, por não terem logrado apresentar um certificado que ateste a sua residência fiscal no estrangeiro durante o período em causa. A reclamação graciosa igualmente foi indeferida com o mesmo fundamento do pedido de alteração de morada com efeitos retroativos

 

  1. Assim, para a Requerida, “face à factualidade descrita e tendo presente que à data dos factos os Requerentes constavam como residentes fiscais em Portugal e que só em 2021 mudaram a residência para o Reino Unido, importa chamar à colação o disposto no artigo 19.º da LGT”, nos termos do qual se refere, segundo alega a Requerida, que “é obrigatória a comunicação do domicílio do sujeito passivo à administração tributária. Sendo, por força do n.º 4 da mesma norma, ineficaz qualquer mudança de domicílio enquanto não for comunicada à administração tributária. Tal não obsta, como esclarece o n.º 1 do referido artigo 19.º, que a administração tributária retifique oficiosamente o domicílio fiscal dos sujeitos passivos se tal decorrer dos elementos ao seu dispor”.

 

  1. Acrescenta a Requerida que “(…) os Requerentes só apresentaram um certificado de residência fiscal emitido pelas autoridades fiscais do Reino Unido respeitante à Requerente B...” o qual “ainda que emitido pelas autoridades fiscais do Reino Unido, (…) não preenche os requisitos de aceitação enquanto meio de prova válido para o efeito pretendido”, “porquanto dele não se poder excluir a possibilidade da residência da Requerente também se situar em Portugal, considerando que foi emitido ao abrigo do artigo 1.º da Convenção para evitar a Dupla Tributação (CDT) celebrada entre os Estados Português e Inglês, e, nessa medida, ser possível a existência de um conflito de residência”.

 

  1. E reitera a Requerida que “é nos termos do artigo 4.º da CDT que um eventual conflito de residência é resolvido, pelo que a certificação deveria ter sido emitida ao abrigo dessa disposição, sob pena de se revelar dúbia e inconclusiva”.

 

  1. Neste âmbito, esclarece a Requerida que “(…) foram as mesmas autoridades fiscais que comunicaram à AT rendimentos e/ou património em nome dos Requerentes, durante, pelo menos, os anos de 2015 a 2019, o que naturalmente faz pressupor a sua consideração como residentes em território português” porquanto “as comunicações efetuadas ao abrigo dos mecanismos de troca de informação internacional são, regra geral, levadas a cabo pelo Estado da fonte dos rendimentos ao Estado de residência do respetivo beneficiário, de modo a assegurar a tributação neste último”.

 

  1. Assim, segundo alega a Requerida, “(…) é evidente que só o certificado de residência fiscal poderia dissipar as dúvidas e as contradições assinaladas, e afastar a residência fiscal em Portugal resultante do próprio mecanismo de troca de informações previsto na CDT Portugal / Reino Unido”, “documento que os Requerentes, não obstante a insistência, continuam sem juntar”, concluindo que “(…) os Requerentes não logram apresentar prova de residência fiscal fora de Portugal, para o período em causa, ónus que lhe compete nos termos do artigo 74.º da LGT”.

 

  1. Nestes termos, conclui a Requerida que “deve a exceção invocada proceder, e a Requerida ser absolvida da instância” ou “na hipótese de assim não se entender, o que não se concede, deve a presente ação arbitral ser julgada improcedente, por não provada, e ser a Requerida absolvida do pedido e os atos impugnados serem mantidos na ordem jurídica”.

 

  1. SANEADOR

 

4.1.    O Tribunal encontra-se regularmente constituído, nos termos do artigo 2º, nº 1, alínea a), artigos 5º e 6º, todos do RJAT e é competente quanto à apreciação do pedido de pronúncia arbitral formulado pelo Requerente.

 

          Neste âmbito, refira-se que a Requerida suscitou a excepção da incompetência do Tribunal Arbitral para conhecer do pedido porquanto entende que “(…) o que os Requerentes pretendem com a presente lide é que lhes seja concedido o pedido de alteração de morada com efeitos retroativos ao ano de 2017”, “pois, só após o reconhecimento dessa alteração de morada é que a liquidação de IRS de 2018 poderia ser considerada ilegal por violação do artigo 16.º do CIRS”.

 

Tendo em consideração que a questão da incompetência do Tribunal é de conhecimento prioritário [artigo 13.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos aplicável aos processos arbitrais tributários por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT], remete-se aqui para a análise da mesma, preliminarmente, no ponto 6. desta decisão.

 

4.2.    As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária, são legítimas quanto ao pedido de pronúncia arbitral e estão devidamente representadas, nos termos do disposto nos artigos 4º e 10º do RJAT e do artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março.

 

4.3.    O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo uma vez que foi apresentado no prazo previsto na alínea a) do nº 1 do artigo 10º do RJAT.

 

  1. Não foram suscitadas outras excepções de que cumpra conhecer.

 

4.5.    Não se verificam nulidades pelo que se impõe conhecer do mérito do pedido.

 

  1. MATÉRIA DE FACTO

 

5.1.    Preliminarmente, e no que diz respeito à matéria de facto, importa salientar que o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas Partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da matéria não provada [cfr. artigo 123º, nº 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e artigo 607º, nºs 3 e 4, do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi artigo 29º, nº 1, alíneas a) e), do RJAT].

 

5.2.    Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito.

 

Dos factos provados

 

  1. Os Requerentes são casados entre si e cidadãos nacionais do Reino Unido (em conformidade com documentação anexada pelas Partes).

 

  1. Com efeitos a 21-02-2017, foi alterada a morada fiscal dos Requerentes, em Portugal, para a ..., ..., em ..., no concelho de S. João da Pesqueira (em conformidade com PA anexado pela Requerida).

 

  1. Os Requerentes passaram a estar enquadrados como residentes para efeitos fiscais em Portugal (em conformidade com artigos 6º e 7º do PPA, aceite pela Requerida no artigo 12º da Resposta).

 

  1. De acordo com a informação constante do Sistema de Gestão e Registo de Contribuintes, a situação cadastral dos Requerentes, a 31-12-2018, era de que eram residentes em Portugal, na morada indicada no ponto 5.5. (em conformidade com teor das págs. 54 e sgts. e 79 e sgts. do PA anexado pela Requerida).

 

  1. Em 2017, os Requerentes beneficiaram de uma redução de taxa de IMT por ocasião da aquisição de uma habitação própria e permanente (em conformidade com teor das págs. 145 e 151 do PA anexado pela Requerida).

 

  1. Os Requerentes para além do imóvel identificado no ponto 5.5., supra, possuem (ou possuíam) ainda outros imóveis localizados no ..., em Silves e em ... (em conformidade com teor das págs. 68 a 77 do PA anexado pela Requerida)

 

  1. Os Requerentes, com efeitos a 21-02-2017, estavam colectados, em Portugal, como auferindo rendimentos empresariais (Categoria B do IRS), aí exercendo, como actividade principal (CAE 55201), a actividade de “Alojamento Mobilado Para Turistas” (em conformidade com o teor das págs. 54 e segts e 79 e segts do PA anexado pela Requerida).

 

  1. Os Requerentes, por referência ao ano 2018, submeteram em 22-04-2019, uma declaração modelo 3 de IRS (nº ... - 2018 - ...–...), nela se enquadrando como residentes fiscais em Portugal (em conformidade com artigo 9º do PPA e pág. 4 do PA), com indicação de 3 dependentes, na qual anexaram (i) um anexo A àquela declaração, no qual declararam rendimentos da Categoria A, no montante de EUR 5.820,00 (obtidos pelo Requerente), de fonte nacional e contribuições para a Segurança Social, no montante de EUR 640,20 e, (ii) dois anexos B àquela declaração, titulados por cada um dos Requerentes, mas sem evidência de terem sido auferidos rendimentos (em conformidade com pág. 7 e segts. do PA anexado pela Requerida).

 

  1. Com base na declaração identificada no ponto anterior, foi emitido o acto tributário de liquidação de IRS nº 2019..., de 28-04-2029, o qual não deu origem a qualquer imposto a pagar ou a receber (em conformidade com PA anexado pela Requerida).

 

  1. Os Requerentes, no ano 2018, auferiram rendimentos no Reino Unido, aí tendo apresentado as suas declarações de rendimentos (em separado) relativas àquele ano fiscal de 2018 (compreendido entre 6 de Abril de 2018 e 5 de Abril de 2019), em 08-04-2019, nelas indicando serem residentes, para efeitos fiscais, no Reino Unido, em conformidade com o teor do doc. nº 5 anexado pelos Requerentes com o PPA e PA anexado pela Requerida)

 

  1. Os Requerentes alteraram, a 06-12-2021, no seu registo cadastral para efeitos fiscais, a sua residência fiscal para o Reino Unido, passando a estar enquadrados como não residentes para efeitos fiscais em Portugal, passando a ser residentes no Reino Unido, na seguinte morada – ..., Cobham ...(em conformidade com págs. 86 e sgts. do PA).

 

  1. Em 28-01-2022, a Requerida (internamente) identificou uma situação irregular (divergência nº...) que envolvia o Requerente no ano 2018, nos termos da qual, se referia que “de acordo com os elementos disponibilizados por administrações fiscais de outros países/jurisdições, existem rendimentos obtidos no estrangeiro, nomeadamente rendimentos de trabalho dependente, pensões, prediais ou de capitais obtidos no estrangeiro, mencionados nas Diretivas de Cooperação Administrativa (DAC) 1 e 2, no Foreign Account Tax Compliance Act (FATCA) acordo entre a República Portuguesa e os Estados Unidos da América (EUA), e ainda no acordo Multilateral das Autoridades Competentes para a Troca Automática de Informações de Contas Financeiras, no qual foi estabelecido a norma comum de comunicação (Common Report Standard, CRS), que não foram declarados no anexo J da declaração mod.3 de IRS” (em conformidade com teor da pág. 48 do PA anexado pela Requerida).

 

  1. A 28-01-2022, a Requerida enviou, no âmbito da Gestão de Divergência, o Ofício nº ...2022... ao Requerente, o qual não efectuou qualquer interação, de acordo com informação de 23-02-2022 (em conformidade com teor da pág. 49 do PA anexado pela Requerida)

 

  1. A 11-10-2022, após troca de informação fiscal com Autoridades Fiscais estrangeiras, a Requerida identificou a existência de rendimentos obtidos, pelos Requerentes, no Reino Unido, não declarados em Portugal para efeitos de tributação enquanto contribuintes aí residentes para efeitos fiscais.

 

  1. Em consequência, a Requerida procedeu à emissão de declaração oficiosa de rendimentos relativa ao ano 2018 (a nº ... - 2018 - ... – ...), na qual para além de ter considerado um Anexo A e dois Anexos B, com os rendimentos anteriormente declarados pelos Requerentes, considerou ainda dois Anexos J, nos quais considerou os seguintes rendimentos auferidos, pelos Requerentes, no Reino Unido (código 826), em conformidade com pág. 20 e sgts do PA anexado pela Requerida:

 

 

RENDIMENTOS

IMPOSTO PAGO NO ESTRANGEIRO

SUJEITO PASSIVO

TRABALHO DEPENDENTE

PENSÕES

PREDIAIS

A

605.748,60

 

39.823,53

144.271,30

B

665.150,45

7.990,35

45.943,04

297.374,03

TOTAL

1.270.899,05

7.990,35

85.766,57

441.645,33

 

 

  1. Os Requerentes foram notificados, em 2022, da emissão da Liquidação Oficiosa de IRS n.º 2022..., relativa ao ano de 2018, nos termos da qual foram considerados rendimentos no montante total de EUR 1.284.709,40, sendo os mesmos maioritariamente rendimentos obtidos no Reino Unido, conforme evidenciado no ponto anterior (em conformidade com pág. 42 do PA anexado pela Requerida).

 

  1. Adicionalmente, foi concedida aos Requerentes, no âmbito das deduções à colecta de IRS, uma dedução por dupla tributação internacional no montante de EUR 441.645,33 (em conformidade com pág. 43 do PA anexado pela Requerida).

 

  1. Em consequência da emissão da Liquidação Oficiosa de IRS identificada no ponto anterior, foi apurado IRS a pagar em Portugal, relativo ao ano de 2018, no montante de EUR 220.589,58, bem como juros compensatórios no montante de EUR 25.673,00, num total de EUR 246.262,58, a pagar até 12-12-2022 (em conformidade com o teor do doc. nº 1 anexado pelos Requerentes com o PPA e o PA anexado pela Requerida).

 

  1. O Requerente A... submeteu, em 14-12-2022, no Serviço de Finanças de Cascais – ..., uma Reclamação Graciosa (a nº ...2022...), com referência ao documento de cobrança de IRS nº 2022 ... (e de acerto de contas nº ...), com o seguinte teor (em conformidade com págs. 1, 44 e 45 do PA anexado pela Requerida):

 

“(…). Eu, A... Contribuinte Fiscal ... e residente em ... na Inglaterra vem (…) reclamar contra a liquidação de IRS (Rendimentos no Estrageiro do ano de 2018 no valor de Euros 246,262.58) em virtude de: 1) Nos anos 2018 e 2019 estava residente fiscal na Inglaterra e não em Portugal. Só tive conhecimento que este tinha sido alterado para Portugal quando recebi pedido de Rendimentos recebidos no Estrangeiro no início de 2021. Logo nessa altura eu corrigi o erro no Balcão de Finanças em Portimão. 2) Eu nunca pedi ou autorizei especificamente uma mudança da minha morada fiscal. Em 2017 dirigi-me as Finanças em ... para fazer um registo de propriedade em meu nome para possíveis efeitos de Alojamento Local. Entendo agora que nessa altura o funcionário também alterou a minha morada fiscal para Portugal. Isto nunca foi entendido e ocorreu por lapso ou desentendimento. 3) No entanto foi só no início de novembro 2022 que recebi um pedido de Liquidação de IRS. No entanto já pedi as autoridades da HMRC na Inglaterra que me confirmem e enviem uma declaração de minha residência fiscal na Inglaterra para os anos 2018 e 2019 para eu apresentar. 4) Hoje apresentei no balcão de Serviços de Finanças em Cascais ... um pedido de Alteração de Morada com efeitos Retroativos (Modelo A) dos anos 2018 e 2019, onde também faco referencia a esta Reclamação Graciosa. (…)”.

 

  1. Em conformidade com o declarado, foi pedida a alteração do estatuto de residência fiscal, em Portugal, para a de não residentes, pretendendo que fossem considerados como residentes fiscais no Reino Unido, com a seguinte morada naquele país -..., Cobham... .

 

  1. Adicionalmente, foi ainda solicitado ao Serviço de Finanças de Cascais – ... que a alteração da residência fiscal (e morada) tivesse efeitos retroactivos ao ano de 2017.

 

  1. A 05-01-2023, não tendo os Requerentes procedido ao pagamento da liquidação oficiosa identificada no ponto 5.19., supra, foi instaurado o processo de execução fiscal nº ...2023..., o qual foi extinto por regularização do valor em dívida em 24-02-2023 (em conformidade com pág. 47 do PA anexado pela Requerida).

 

  1. O Requerente A... foi notificado, através de carta registada (RL ... PT), na pessoa do seu representante fiscal em Portugal (C...), de Ofício de 10-02-2023, “(…) do projeto de decisão que foi proferido no âmbito do pedido de alteração de residência fiscal, respeitante a A... (…)” e, “(…) uma vez que o projeto de decisão lhe é desfavorável, poderá, querendo, pronunciar-se, por escrito, no prazo continuo referido no despacho e contado a partir desta notificação (…). Adverte-se que, caso não seja efetuada qualquer pronúncia no prazo fixado, o projeto de decisão será convertido em decisão definitiva quanto ao pedido em causa” (sublinhado nosso), em conformidade com teor do doc. nº 2 anexado pelos Requerentes com o PPA e o teor das págs 142 e sgts do PA anexado pela Requerida).

 

  1. O projecto de decisão referido no ponto anterior (relativo ao Requerente A...) tinha o seguinte teor (em conformidade com o PA anexado pela Requerida):

 

Considerando o presente pedido, subsequente informação e demais elementos em posse da AT e face ao superiormente determinado (cf. Instrução de serviço n° .../2017, de 03.08.2017, do gabinete do subdirector-geral (…), verifica-se a inexistência dos pressupostos, legais e de facto, previstos para a concessão do efeito retroativo do pedido na alteração de morada, conforme informado no(s) ponto(s) 7, 8, 10 e 11, pelo que com os referidos fundamentos, projeto o indeferimento do pedido. Para efeitos do exercício do direito de audição, (…), fixo o prazo de 20 dias. Notifique-se. (…)” (negrito nosso).

 

  1. A Requerente B... foi notificada, através de carta registada (RL ... PT), na pessoa do seu representante fiscal em Portugal (C...), de Ofício de 10-02-2023, “(…) do projeto de decisão que foi proferido no âmbito do pedido de alteração de residência fiscal, respeitante a respeitante a B... (…)” e, “(…) uma vez que o projeto de decisão lhe é desfavorável, poderá, querendo, pronunciar-se, por escrito, no prazo continuo referido no despacho e contado a partir desta notificação (…). Adverte-se que, caso não seja efetuada qualquer pronúncia no prazo fixado, o projeto de decisão será convertido em decisão definitiva quanto ao pedido em causa” (sublinhado nosso), em conformidade com teor das págs 148 e sgts do PA anexado pela Requerida).

 

  1. O projecto de decisão referido no ponto anterior (relativo à Requerente B...) tinha o seguinte teor:

 

Considerando o presente pedido, subsequente informação e demais elementos em posse da AT e face ao superiormente determinado (cf. Instrução de serviço n° .../2017, de 03.08.2017, do gabinete do subdirector-geral (…), verifica-se a inexistência dos pressupostos, legais e de facto, previstos para a concessão do efeito retroativo do pedido na alteração de morada, conforme informado no(s) ponto(s) 7, 8, 10 e 11, pelo que com os referidos fundamentos, projeto o indeferimento do pedido. Para efeitos do exercício do direito de audição, (…), fixo o prazo de 20 dias. Notifique-se. (…)” (negrito nosso).

 

  1. O Requerente A... foi notificado, através de carta registada (RH ... PT, de 20-10-2023), do Ofício ..., da DF Finanças de Lisboa, também de 20-10-2023, relativo ao projeto de indeferimento da reclamação graciosa (nº ...2022...), bem como para exercer, querendo, o respectivo direito de audição (em conformidade com o teor da pág. 93 e stgs do PA anexado pela Requerida).

 

  1. O projecto de indeferimento da reclamação graciosa identificada no ponto anterior foi suportado nos seguintes argumentos (em conformidade com o teor das págs. 97 e sgts do PA anexado pela Requerida):

 

V – ANÁLISE DO PEDIDO E PARECER

A questão controvertida nos presentes autos, prende-se com a tributação de rendimentos obtidos no estrangeiro por sujeito passivo inscrito como residente fiscal em Portugal. Não obstante o alegado pelo ora reclamante no que diz respeito à residência fiscal no Reino Unido, cumpre observar o seguinte:

Após consulta ao Sistema de Gestão e Registo de Contribuintes, verifica-se que a
31-12-2018, data relevante para efeitos de tributação, quer o reclamante, quer o sujeito passivo B, encontravam-se inscritos como residentes em território português, tendo a morada sido alterada para o Reino Unido com efeitos a 06-12-2021. Ora, dispõe o nº 8 do art.º 13.º do CIRS que “A situação pessoal e familiar dos sujeitos passivos relevante para efeitos de tributação é aquela que se verificar no último dia do ano a que o imposto respeite.” Constatou-se também que o ora reclamante submeteu não só a declaração de rendimentos Modelo 3 de IRS, referente ao ano em apreciação, como também as declarações de rendimentos Modelo 3 de IRS, referentes aos anos de 2019 a 2020, na qualidade de residente em território português, nas quais declarou, no anexo A, rendimentos de trabalho dependente. Realça-se que o nº 1 do art.º 15.º do CIRS dispõe que “Sendo as pessoas residentes em território português, o IRS incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território.” O reclamante beneficiou, na qualidade de residente em território nacional, não só de deduções específicas, como também de deduções à coleta, nos termos do art.º 53.º e do nº 5 do art.º 78.º do CIRS, nomeadamente, da dedução por dupla tributação internacional no montante de € 441.645,33 (€ 144.271,30 + € 297.374,03), referente ao imposto pago no estrangeiro. Mais se informa que a declaração oficiosa emitida, nos termos do nº 4 do art.º 65.º do CIRS e de acordo com o nº 1 do art.º 13.º, o nº 1 do art.º 15.º e o art.º 18.º do mesmo Código, teve por base informação de que a AT dispunha proveniente de uma troca de informação automática das autoridades fiscais estrangeiras e que esta informação é proveniente da troca automática de informação, que tem origem na Diretiva 2011/16/UE de Conselho de 15 de fevereiro de 2011, relativa à cooperação administrativa no domínio da fiscalidade que foi transposta para a ordem jurídica nacional através do Decreto-Lei n.º 61/2013 de 10 de maio. Os valores considerados no Anexo J da declaração oficiosa acima referida estão em conformidade com o comunicado pelas Autoridades Fiscais estrangeiras e acrescenta-se ainda que também as Autoridades Fiscais estrangeiras ao enviar a referida informação consideraram o ora Reclamante e o sujeito passivo B como residentes fiscais em Portugal, pelo que, se afigura que foi o ora reclamante e o sujeito passivo B que também se consideraram junto daquele país como residentes fiscais em Portugal. Assim, não se encontrando juntos aos presentes autos, quaisquer documentos comprovativos do alegado, recaindo sobre o contribuinte a obrigação de demonstrar o exposto, nos termos do art.º 74.º da LGT, informa-se que, até prova em contrário, considera-se o ora Reclamante e o sujeito passivo B como residentes em Portugal para o ano 2018, estando obrigados a declarar os rendimentos auferidos no estrangeiro, confirmando-se os valores constantes do anexo J da declaração oficiosa. Assim, poderá o ora reclamante apresentar, no exercício do direito de audição prévia nos termos do art.º 60.º da LGT, documentos comprovativos não só da sua situação tributária no estrangeiro, como também da situação tributária do sujeito passivo B, nomeadamente: •Pedido de Alteração de Morada com efeitos Retroativos (Modelo A) dos anos 2018 e 2019 referido na petição; •Documentos comprovativos emitidos ou certificados pelas autoridades fiscais estrangeiras, que discriminem a natureza e o montante dos rendimentos obtidos no estrangeiro, da nota de liquidação e documento comprovativo do pagamento do imposto no estrangeiro; •Certificado de residência fiscal no Reino Unido para o ano em questão.

VII - PROPOSTA DE DECISÃO

Face ao acima exposto e, salvo melhor entendimento, propõe-se o INDEFERIMENTO da reclamação, de acordo com os fundamentos da presente informação. (…)”.

 

  1. A proposta de indeferimento mereceu a concordância superior, em conformidade com o teor das págs. 93 e 94 do PA anexado pela Requerida, nos seguintes termos:

 

Tendo em consideração a informação, e os elementos que instruem o processo, afigura-se que o reclamante pretende a anulação da liquidação de IRS n.º 2022..., materializada na nota de acerto de contas n.º 2022..., no montante total a pagar de € 246.262,58, referente ao ano de 2018, alegando que nesse ano já se encontrava a residir em Inglaterra e não em Portugal pelo que não tinha que ser tributado em Portugal. Analisados os elementos constantes dos autos, nomeadamente os entregues pelo reclamante, os consultados no sistema informático da AT e de acordo com o informado infra, o reclamante, em 2018, era considerado residente em Portugal pelo que a liquidação oficiosa não encerra qualquer ilegalidade, não tendo sido juntos aos autos prova suficiente e cabal que comprovem o alegado pela reclamante, tal como lhe competia nos termos do n.º 1 do artigo 74.º da LGT. De realçar, que a primeira declaração do ano em crise foi entregue pelo contribuinte reclamante como residente em Portugal. Face ao exposto, propõe-se o INDEFERIMENTO do pedido nos termos e com os fundamentos da presente informação notificando-se o reclamante, para querendo, exercer o direito de audição, nos termos do disposto no artigo 60.º da LGT. (…)”.

 

  1. Os Requerentes apresentaram (a 13-11-2023), pedido de prorrogação do prazo de audição prévia, no sentido de serem obtidos documentos provenientes do estrangeiro, o qual apenas deu entrada a 28-11-2023, tendo aquele prazo sido prorrogado até 11 de Dezembro de 2023 (em conformidade com o teor da pág. 166 e sgts do PA anexado pela Requerida).

 

  1. Os Requerentes, não conformados com o projecto de decisão referido no ponto 5.30., supra, exerceram o seu direito de participação na decisão, em 15-11-2023 (Entrada nº 2023..., em conformidade com teor do doc. nº 3 anexado pelos Requerentes com o PPA), reiterando o pedido de anulação da liquidação nº 2022..., a alteração de morada com efeitos retroactivos ao ano de 2017 e a devolução dos valores “ilegalmente” recebidos pela Autoridade Tributária, tendo neste âmbito apresentado as suas declarações de rendimentos relativas ao ano fiscal de 2018 (em conformidade com o teor do doc. nº 5 anexado pelos Requerentes com o PPA) e carta com certificado de residência fiscal no Reino Unido, relativa à Requerente B..., emitida pelos HM Revenue & Customs, em 14-12-2022, nos termos do qual se refere o seguinte (em conformidade com o teor do doc. nº 6 anexado pelos Requerentes com o PPA):

 

Certificate of UK fiscal residence, To whom it may concern, I certify that to the best of HM Revenue and Customs' knowledge. Mrs A… of …

 from 6 April 2016 to 5 April 2020 was a resident of the UK in accordance with Article 1 of the Convention in force between the UK and Portugal”.

 

  1. Os Requerentes apresentaram, em 15-11-2023, novo pedido de prorrogação do prazo de audição prévia, no sentido de serem obtidos documentos provenientes do estrangeiro, anexando relativamente ao Requerente A..., anexada carta de confirmação de residência fiscal no Reino Unido, emitida pelos HM Revenue & Customs, em 23-11-2023, [com a ressalva de que "the letter of confirmation States that to the best of our knowledge and belief you are a resident of the UK for tax purposes. You can use this to meet requirements or support claims under the domestic law of the foreign state or EU law. However, this cannot be used to claim relief under a Double Taxation Agreement. You need a certificate of residence to do this. (...)"], nos termos da qual se refere (em conformidade com teor do doc. nº 9 anexado à reclamação graciosa constante das págs. 158 a 160 do PA anexado pela Requerida):

 

Letter of confirmation of residence, To whom it may concern, This is not a certificate of residence for the purpose of claiming benefíts under any Double Taxation Agreement with the UK, I confirm that to the best of HM Revenue and Customs' knowledge and belief, that Mr A…  of … from 1 January 2018 to 31 December 2021 was a resident of the UK for tax purposes” (negrito nosso).

 

  1. O mandatário dos Requerentes e o Requerente A... foram notificados do Ofício datado de 20-12-2023 (RL ... PT), nos termos do qual se dá conhecimento do despacho de indeferimento (de 19-12-2023) da Reclamação Graciosa apresentada (processo nº ...2022...), proferido pelo Chefe de Divisão da Direção de Finanças, ao abrigo da Subdelegação de competências, em conformidade com o teor do doc. nº 4 anexado pelos Requerentes com o PPA e teor das pág. 169 a 178 do PA anexado pela Requerida).

 

  1. De acordo com a referida notificação, o projecto de indeferimento foi convolado em definitivo, nos seguintes termos (em conformidade com teor das pág. 173 e segts do PA anexado pela Requerida):

 

VIII - INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR

a) Audição Prévia

Atendendo aos fundamentos de facto e de direito constantes do projeto de decisão, foi exarado, em 19-10-2023, despacho no sentido do Indeferimento do pedido, pelo Senhor Diretor de Finanças Adjunto do Departamento A da Justiça Tributária, da Direção de Finanças de Lisboa, por delegação, notificado ao ora reclamante através do Ofício nº..., de 20-10-2023, conforme registo dos CTT RH...PT, de 20-10-2023, para, no prazo de 15 dias, exercer o direito de audição prévia (…). Considerando o estatuído no art.º 39.º do CPPT, quanto à perfeição das notificações, a notificação foi entregue a 31-10-2023, considerando-se efetuada na mesma data, pelo que, o termo do prazo para exercer tal direito ocorreu em 15-11-2023.

A 13-11-2023, foi apresentado pedido de prorrogação do prazo de audição prévia, nos termos do nº 6 do art.º 60.º da LGT, no sentido de serem obtidos documentos provenientes do estrangeiro, o qual foi deferido, conforme resposta CRM-e-balcão remetida a 28-11-2023, tendo aquele prazo sido prorrogado até 11 de dezembro. Mais se informa que, a 15-11-2023, foi remetida exposição, a qual deu entrada GPS com o nº 2023..., para exercício do direito de audição prévia, a qual se encontra subscrita por advogado Dr..., (…), na qual reitera nos fundamentos de facto já alegado em sede da petição e já apreciados no projeto de decisão, no que diz respeito à residência fiscal. Informa-se ainda que consta do ponto 3 daquela exposição que “Como forma de comprovar o acima alegado, junto se envia Declarações de Rendimentos apresentadas no Reino Unido enquanto residentes fiscais e Certificado de Residência Fiscal emitido pelas competentes autoridades do Reino Unido como Documentos n.º 2, 3,4, 5 e 6.”, protestando juntar procuração forense e documentos nº 5 e 6. A 11-12-2023, foram remetidos o documento nº 9 e a procuração forense, os quais deram entrada com o nº 2023..., protestando juntar documentos nº 5 e 6 e solicitando nova prorrogação do prazo para audição prévia.

b) Análise e Parecer

Após análise da presente exposição, informa-se que o ora reclamante reitera nos fundamentos alegados e já apreciados em sede do projeto de decisão (…). O ora reclamante alega que tendo adquirido um bem imóvel para exercício da atividade de alojamento local, passou a constar, erradamente, no Cadastro do Contribuinte, como sua residência fiscal a ..., ..., Portugal. Ora, relativamente a este ponto, constatou-se que o domicílio fiscal passou a ser no Reino Unido - ..., somente a partir de 06-12-2021.

No que diz respeito aos documentos apresentados, verifica-se que os mesmos não são suficientes para comprovar a residência fiscal e a sua situação tributária no Reino Unido, ou dos seus dependentes, no ano em causa nos presentes autos, nos termos do art.º 74.º da LGT. O ora reclamante requer também, em sede da presente exposição, que a morada seja alterada com efeitos retroativos ao ano de 2017.

Ora, verifica-se que que foi junto aos autos, PEDIDO DE ALTERAÇAO DE MORADA COM EFEITOS RETROATIVOS, o qual foi apresentado, a 14-12-2022, perante o Serviço de Finanças de Cascais 1, o qual foi objeto de decisão de indeferimento, por inexistência dos pressupostos legais para a concessão da alteração da residência fiscal com efeitos retroativos, sendo o meio próprio de reação desta decisão de indeferimento, o recurso hierárquico.

Por fim, informa-se que o novo pedido de prorrogação para exercício do direito de audição prévia formulado em sede de audição prévia não tem suporte legal, dado que, o nº 6 do art.º 60.º da LGT dispõe que” O prazo do exercício oralmente ou por escrito do direito de audição é de 15 dias, podendo a administração tributária alargar este prazo até o máximo de 25 dias em função da complexidade da matéria.” Ora, tal prazo de 25 dias findou a 11-12-2023.

Mais se informa que o ora Reclamante poderá apresentar os documentos pretendidos em sede de recurso hierárquico ou impugnação judicial em conformidade com o teor da notificação da decisão final proferida em sede da presente reclamação que lhe irá ser remetida, nos termos do art.º 39.º do CPPT, e na qual constarão os meios de reação e respetivos prazos.

JUROS INDEMNIZATÓRIOS

Mais se informa que, não se encontrando verificados os pressupostos previstos no art.º 43.º da LGT, não assiste (…) direito aos juros indemnizatórios.

Após consulta, na data de hoje, às aplicações informáticas da AT – Sistema de Contencioso Judicial Tributário, não constatamos a interposição de impugnação judicial, sobre a matéria em crise.

c) Conclusão

Face ao exposto, propõe-se a convolação do projeto de decisão em definitivo, no sentido do INDEFERIMENTO do pedido. (…)” (negrito nosso).

 

  1. De acordo com a informação constante do Sistema de Gestão e Registo de Contribuintes, a situação cadastral do Requerente, a 17-08-2023 (com efeitos a 06-12-2021), era de que era residente no Reino Unido (Grã-Bretanha e Irlanda do Norte), na morada indicada no ponto 5.23., supra (em conformidade com teor da pág. 62 do PA anexado pela Requerida) e a situação cadastral da Requerente, a 24-08-2023 (com efeitos a 06-12-2021), era também de que era residente no Reino Unido (Grã-Bretanha e Irlanda do Norte), na referida morada (em conformidade com teor da pág. 87 do PA anexado pela Requerida).

 

  1. Os Requerentes apresentaram, em 25-03-2024, o presente pedido de pronúncia arbitral.

 

Motivação quanto à matéria de facto

 

  1. No tocante à matéria de facto provada, a convicção do Tribunal Arbitral Colectivo fundou-se, para além da livre apreciação das posições assumidas pelas Partes, no teor dos documentos juntos aos autos pelos Requerentes (com pertinência de prova do pretendido), e constantes do processo administrativo.[2]

 

Dos factos não provados

 

  1. Não ficou provado que os Requerentes tivessem apresentado, em Portugal, qualquer declaração modelo 3 de IRS de substituição relativa ao ano 2018), na qual se tenham enquadrado como sendo “Não Residentes” fiscais em Portugal (em conformidade com o alegado no artigo 11º do PPA).

 

  1. Não ficou provado que os Requerentes fossem, a 31-12-2018, por referência àquele ano fiscal, de considerar como não residentes fiscais em Portugal.

 

  1. Não se verificaram quaisquer outros factos dados como não provados com relevância para a decisão arbitral.

 

6.       MATÉRIA DE DIREITO

 

Questão prévia – excepção da incompetência do Tribunal Arbitral

 

6.1.    Não obstante este Tribunal Arbitral já se ter considerado competente para conhecer do pedido (vide ponto 4.1., supra), preliminarmente, tendo em consideração que a Requerida suscitou a excepção da incompetência do Tribunal Arbitral para conhecer do pedido, analise-se desde já a mesma.

 

6.2.    Neste âmbito refira-se que a Requerida entende, resumidamente, que “(…) o que os Requerentes pretendem com a presente lide é que lhes seja concedido o pedido de alteração de morada com efeitos retroativos ao ano de 2017”, “pois, só após o reconhecimento dessa alteração de morada é que a liquidação de IRS de 2018 poderia ser considerada ilegal por violação do artigo 16.º do CIRS”, concluindo a Requerida que “a incompetência material configura uma exceção dilatória, (…) que determina a absolvição da instância no que a este pedido concerne (…)”.

 

6.3.    Os Requerentes, na defesa à matéria de excepção, não acompanham a posição da Requerida, alegando que “(…) o objecto do PPA (…) é a declaração de ilegalidade da Liquidação Oficiosa de (…) (“IRS”) n.º 2022... , datada de 11 de Outubro de 2022, com o valor a pagar de 246.262,58 €” e, “(…) decorre do PPA que o vício que contaminou a liquidação de IRS sub judice é o erro na qualificação dos Requerentes como residentes fiscais, em Portugal, no ano de 2018”, entendendo que “(…) todas as impugnações de actos de liquidação têm subjacente um vício, que constitui a questão material controvertida que o Tribunal Arbitral terá, necessariamente, de conhecer para decidir sobre a legalidade do acto em causa”.

 

6.4.    Assim, consideram os Requerentes que “(…) não pode a Autoridade Tributária desvirtuar a unicidade do PPA, separando o pedido de pronúncia das causas que lhe dão fundamento”, concluindo “(…) que o presente Tribunal Arbitral é materialmente competente para se pronunciar sobre a (i)legalidade da Liquidação Oficiosa de IRS (…), e para o efeito terá de apreciar a qualificação dos Requerentes enquanto residentes fiscais, em Portugal, durante o ano de 2018”.

 

6.5.    Cumpre analisar e decidir.

 

6.6.    A competência contenciosa dos Tribunais Arbitrais em matéria de arbitragem tributária, tal como resulta do artigo 2º do RJAT, compreende a apreciação de pretensões que visem a “declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta” e a “declaração de ilegalidade de atos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de atos de determinação da matéria coletável e de atos de fixação de valores patrimoniais” (sublinhado nosso).

 

6.7.    O artigo 4º, nº 1, do RJAT faz ainda depender a vinculação da Administração Tributária à jurisdição dos Tribunais Arbitrais de portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, que deverá estabelecer, designadamente, o tipo e o valor máximo dos litígios abrangidos.

 

6.8.    E o diploma que, em execução desse preceito, define o âmbito e os termos da vinculação da Autoridade Tributária à jurisdição dos Tribunais Arbitrais que funcionam no CAAD é a Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março, que no seu n.º 2, sob a epígrafe “Objeto de vinculação”, e com a alteração resultante da Portaria nº 287/2019, de 3 de Setembro, dispõe que “os serviços e organismos referidos no artigo anterior vinculam-se à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD que tenham por objeto a apreciação das pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida referidas no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com exceção das seguintes:

a) Pretensões relativas à declaração de ilegalidade de atos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário;

b) Pretensões relativas a atos de determinação da matéria coletável e atos de determinação da matéria tributável, ambos por métodos indiretos, incluindo a decisão do procedimento de revisão;

c) Pretensões relativas a direitos aduaneiros sobre a importação e demais impostos indiretos que incidam sobre mercadorias sujeitas a direitos de importação;

d) Pretensões relativas à classificação pautal, origem e valor aduaneiro das mercadorias e a contingentes pautais, ou cuja resolução dependa de análise laboratorial ou de diligências a efetuar por outro Estado membro no âmbito da cooperação administrativa em matéria aduaneira;

e) Pretensões relativas à declaração de ilegalidade da liquidação de tributos com base na disposição antiabuso referida no n.º 1 do artigo 63.º do CPPT, que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos do n.º 11 do mesmo artigo”.[3]

 

6.9.    A Portaria n.º 112-A/2011, também chamada Portaria de vinculação, fixa um segundo nível de delimitação das pretensões que poderão ser sujeitas à jurisdição arbitral, mas tratando-se de um mero regulamento de execução, a Portaria não poderia ir além do estabelecido na lei quanto ao âmbito de competência material dos Tribunais Arbitrais, podendo estabelecer restrições quanto ao âmbito da vinculação à arbitragem tributária, mormente por referência ao tipo de litígios e ao valor do processo.[4]

 

6.10.  Assim, terá de se concluir que a vinculação se reporta a qualquer das pretensões mencionadas no artigo 2.º, n.º 1, do RJAT que respeitem a impostos (com a exclusão de outros tributos) e a impostos que sejam geridos pela Autoridade Tributária.

 

6.11.  Na situação em análise, peticionando os Requerentes a “(…) declaração de ilegalidade do ato de liquidação (…) identificado no pedido (…) relativo à Liquidação Oficiosa de Imposto sobre os Rendimentos das Pessoas Singulares (IRS) n.º 2022..., referente a 2018 (…)”, esclarecendo que “(…) o objeto mediato do presente Pedido de Pronúncia Arbitral (…) é o indeferimento da referida Reclamação Graciosa, identificada com o número de processo ...2022..., e o objeto imediato é a apreciação da Liquidação Oficiosa de IRS n.º 2022..., referente ao ano de 2018, com o valor a pagar de 246.262,58€ (…)”, os Requerentes pretendem, tal como resulta do artigo 2º do RJAT, a “declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos” (no caso, de IRS), imputando ao referido acto de liquidação vícios que cabe a este Tribunal apreciar.

 

6.12.  Nestes termos, considera-se este Tribunal Arbitral competente para conhecer do pedido, sendo assim improcedente a excepção da incompetência suscitada pela Requerida.

 

6.13.  Prosseguindo a análise do pedido, os Requerentes alegam que “(…) a questão controvertida é a de saber se apresentação de um Certificado de residência fiscal, emitido por um país terceiro, é a única forma de um contribuinte demonstrar que é residente nesse outro Estado e, consequentemente, não é considerado como residente fiscal em Portugal não havendo aqui lugar à tributação dos rendimentos obtidos no estrangeiro” porquanto, “(…) embora no cadastro da Autoridade Tributária os Requerentes constassem como residentes fiscais em Portugal, tal registo tem força meramente declarativa, não constitutiva, pelo que sempre prevalecerá a qualificação do estatuto de residência dos Requerentes face ao disposto no artigo 16.º do Código do IRS” pelo que “(…) não são nem podem os Requerentes ser considerados como residentes fiscais em Portugal já que aqui não permaneceram mais de 183 dias e a habitação que aqui possuíam, à data, não fazia pressupor que a intenção dos Requerentes era de a manter e ocupar como residência habitual”.

 

6.14.  Assim, não se conformam os Requerentes com o indeferimento da reclamação graciosa apresentada, com fundamento no facto de, alegadamente, os Requerentes não terem logrado juntar documentação que atestasse a sua residência no Reino Unido em 2018, “nomeadamente, (…) não lograram apresentar um certificado que ateste a sua residência fiscal no estrangeiro durante o período em causa” porquanto, vieram anexar, ao exercerem o seu direito de participação no projecto de indeferimento da reclamação graciosa, as suas declarações de rendimentos e cartas de confirmação de residência no Reino Unido.

 

6.15.  Concluem os Requerentes que “(…) da conjugação da jurisprudência emanada pelos doutos tribunais arbitrais resulta que o Certificado de Residência fiscal num Estado terceiro não é o único documento idóneo para efeitos de provar a não residência em Portugal”.

 

6.16.  Por outro lado, a Requerida alega em síntese que “só em 06/12/2021 é que os Requerentes alteraram a morada fiscal para o Reino Unido” e foi “em 2022, após notificação da liquidação oficiosa de IRS n.º 2022..., referente ao ano de 2018, [que] apresentaram reclamação graciosa” e, “em simultâneo solicitaram (…) que a alteração de morada retroagisse a 2017, pedido indeferido por manifesta falta de prova, designadamente, por não terem logrado apresentar um certificado que ateste a (…) residência fiscal no estrangeiro durante o período em causa. A reclamação graciosa igualmente foi indeferida com o mesmo fundamento do pedido de alteração de morada com efeitos retroativos” pelo que, para a Requerida, “face à factualidade descrita e tendo presente que à data dos factos os Requerentes constavam como residentes fiscais em Portugal e que só em 2021 mudaram a residência para o Reino Unido (…)”, sendo “(…) obrigatória a comunicação do domicílio do sujeito passivo à administração tributária (…) [é] ineficaz qualquer mudança de domicílio enquanto não for comunicada à administração tributária (…)”.

 

6.17.  Neste âmbito, segundo alega a Requerida, dado que “(…) os Requerentes só apresentaram um certificado de residência fiscal emitido pelas autoridades fiscais do Reino Unido respeitante à Requerente B...” o qual, “ainda que emitido pelas autoridades fiscais do Reino Unido, (…) não preenche os requisitos de aceitação enquanto meio de prova válido para o efeito pretendido”, “porquanto dele não se poder excluir a possibilidade da residência da Requerente também se situar em Portugal, considerando que foi emitido ao abrigo do artigo 1.º da Convenção para evitar a Dupla Tributação (CDT) celebrada entre os Estados Português e Inglês, e, nessa medida, ser possível a existência de um conflito de residência”, e que “(…) foram as mesmas autoridades fiscais que comunicaram à AT rendimentos e/ou património em nome dos Requerentes, (…), o que naturalmente faz pressupor a sua consideração como residentes em território português”, considera a Requerida que “(…) é evidente que só o certificado de residência fiscal poderia dissipar as dúvidas e as contradições assinaladas, e afastar a residência fiscal em Portugal resultante do próprio mecanismo de troca de informações previsto na CDT Portugal / Reino Unido”, “documento que os Requerentes, não obstante a insistência, continuam sem juntar”, concluindo a Requerida que “(…) os Requerentes não logram apresentar prova de residência fiscal fora de Portugal, para o período em causa, ónus que lhe compete nos termos do artigo 74.º da LGT”.

 

6.18.  Cumpre analisar e decidir.

 

6.19.  Com o presente processo cabe aferir se os Requerentes deverão ou não ser considerados residentes em Portugal, no ano de 2018, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 15º, nºs 1 e 2, e 16º, n.ºs 1, alíneas a) e b), 2 e 3, do Código do IRS (na redação em vigor à data dos factos) e, para efeitos de resposta a esta questão, caberá igualmente decidir se a documentação junta é (ou não) idónea para efeitos de prova da não residência fiscal em Portugal.

 

Do direito interno

 

6.20.  Nos termos do disposto no artigo 16º do Código do IRS, em vigor à data dos factos, e no que ao caso possa interessar, “1 - São residentes em território português as pessoas que, no ano a que respeitam os rendimentos: a) Hajam nele permanecido mais de 183 dias, seguidos ou interpolados; b) Tendo permanecido por menos tempo, aí disponham, em 31 de Dezembro desse ano, de habitação em condições que façam supor a intenção de a manter e ocupar como residência habitual; c) (…); d) (…). 2 - São sempre havidas como residentes em território português as pessoas que constituem o agregado familiar, desde que naquele resida qualquer das pessoas a quem incumbe a direcção do mesmo. 3 - A condição de residente resultante da aplicação do disposto no número anterior pode ser afastada pelo cônjuge que não preencha o critério previsto na alínea a) do n.º 1, desde que efectue prova da inexistência de uma ligação entre a maior parte das suas actividades económicas e o território português, caso em que é sujeito a tributação como não residente relativamente aos rendimentos de que seja titular e que se considerem obtidos em território português nos termos do artigo 18.º. 4 - Sendo feita a prova referida no número anterior, o cônjuge residente em território português apresenta uma única declaração dos seus próprios rendimentos, da sua parte nos rendimentos comuns e dos rendimentos dos dependentes a seu cargo segundo o regime aplicável às pessoas na situação de separados de facto nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 59.º (…)” (sublinhado nosso).

 

6.21.  O artigo 13º, nº 1 do Código do IRS estabelece que “ficam sujeitas a IRS as pessoas singulares que residam em território português e as que, nele não residindo, aqui obtenham rendimentos” sendo que o artigo 15º prevê que “sendo as pessoas residentes em território português, o IRS incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território” (nº 1) e que “tratando-se de não residentes, o IRS incide unicamente sobre os rendimentos obtidos em território português” (nº 2).

 

6.22.  Como refere Paula Rosado Pereira, “temos, portanto, no IRS, uma distinção essencial entre sujeitos passivos residentes e sujeitos passivos não residentes. A residência é, a par da fonte do rendimento, um dos elementos de conexão que definem os termos da aplicação da lei fiscal no espaço, quando nos encontramos perante situações com um elemento internacional relevante. Reportando-nos ao (…) artigo 13.º, n.º 1 do CIRS, a tributação em Portugal dos rendimentos obtidos por pessoas singulares que residam em território português reflete o elemento de conexão “residência”, ao passo que a tributação dos não residentes quanto aos rendimentos considerados como obtidos em território português concretiza a aplicação do elemento de conexão “fonte”. (…) A definição de residência em território português é dada pelo artigo 16.º do CIRS, prevendo-se que sejam residentes em território português as pessoas que, no ano a que respeitam os rendimentos: a) Hajam nele permanecido mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, em qualquer período de 12 meses com início ou fim no ano em causa; b) Tendo permanecido por menos tempo, aí disponham, num qualquer dia do período referido na alínea anterior, de habitação em condições que façam supor intenção atual de a manter e ocupar como residência habitual. (…) Para além de corresponder, como vimos, a um dos elementos de conexão para a aplicação da lei fiscal no espaço, a residência é também um conceito essencial para determinar o âmbito de sujeição pessoal ao IRS, uma vez que este tende a ser bastante distinto para residentes e não residentes. Relativamente aos residentes, o IRS incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora de território português (artigo 15.º, n.º 1 do CIRS). Os residentes encontram-se, portanto, sujeitos a um princípio da universalidade ou da tributação universal ou ilimitada pelo Estado da residência. Assim, podem ser tributados em Portugal todos os rendimentos obtidos por um residente, independentemente do local onde tais rendimentos sejam obtidos. (…) Em contrapartida, um não residente – pessoa singular que não preencha nenhum dos critérios de residência fiscal previstos no artigo 16.º do CIRS – encontra-se sujeito a IRS unicamente quanto aos rendimentos obtidos em território português (artigo 15.º, n.º 2 do CIRS). Os não residentes são tributados ao abrigo do elemento de conexão fonte do rendimento. O artigo 18.º elenca os rendimentos que se consideram obtidos em território português e que, como tal, podem ser tributados em sede de IRS mesmo quando auferidos por um não residente” (sublinhado nosso).[5]

 

6.23.  Como afirma Pedro Roma, “(…) tendo em conta estas três normas [artigo 16.º, n.ºs 1, alínea a), 2 e 3, do Código do IRS], julgamos que se poderá formular este critério de residência fiscal [a permanência por mais de 183 dias num período de 12 meses] do seguinte modo: (i) um sujeito passivo é considerado residente fiscal se, em qualquer período de 12 meses, permanecer mais de 183 dias (que incluam dormida) em Portugal e (ii) será considerado residente fiscal em Portugal desde o primeiro dia de permanência daquele período de 183 dias. (…) (…), a mera disposição de uma habitação não é suficiente para que se possa concluir pelo preenchimento deste critério de residência fiscal em Portugal [critério previsto no artigo 16.º, n.º 1, alínea b), do Código do IRS], pois é necessária a existência de “condições que façam supor intenção atual de a manter e ocupar como residência habitual”. Em primeiro lugar, deverá tratar-se de uma residência habitual, o que significa que não basta a existência de um imóvel em Portugal que é ocupado ocasionalmente (e.g. em período de férias ou fins-de-semana) para que o mesmo qualifique para este efeito. Por outro lado, veio a nova redação desta norma esclarecer que temos que estar perante uma intenção “atual”, o que significa que o imóvel em questão até pode ter sido adquirido para que no futuro venha a ser utilizado como residência habitual do sujeito passivo – contudo, se no momento em questão o mesmo não estiver a ser ocupado com esse propósito, não poderá ser considerado uma residência habitual para este efeito. Por último, no que respeita às “condições que [fazem] supor” a intenção de manter e ocupar uma habitação, como residência habitual, verificamos que o legislador decidiu não concretizar que condições são essas, deixando-as ao critério do intérprete. (…) Uma vez que a ocupação da habitação como residência habitual não é objeto de prova direta, a mesma resulta das condições objetivas e subjetivas que a façam supor. (…) Não obstante, (…), uma análise casuística impor-se-á sempre. (…) Por último, (…) os critérios de residência fiscal previstos nas alíneas a) e b) do artigo 16.º, n.º 1 do Código do IRS são alternativos, (…)” Destarte, temos, pois, que o critério previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 16.º do Código do IRS se cinge à presença física (corpus), em Portugal, considerando residentes, de forma automática, os indivíduos que permaneçam mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, num período de 12 meses, no território nacional. Por seu turno, a alínea b) do n.º 1 do artigo 16.º do Código do IRS, exigindo uma ligação física menos qualificada, impõe uma análise casuística que permita, ainda assim, assegurar que existe uma conexão efetiva com o território; esta conexão tem-se por verificada através de um elemento subjetivo mediato, a intenção de ser residente (animus), que deve ser analisado de uma perspetiva objetiva, ou seja, através de elementos imediatos que permitam a reconstrução da vontade do indivíduo a partir dos indícios por si revelados”.[6]

 

6.24.  Por outro lado, é importante clarificar a questão associada com a existência de um domicílio fiscal em Portugal e aferir a sua relevância para efeitos de residência fiscal.

 

6.25.  O artigo 19º da LGT, estatuindo sobre o domicílio fiscal, contém diversas regras que importa aqui ter em consideração, a saber:

 

6.25.1.   O domicílio fiscal do sujeito passivo é, salvo disposição em contrário, para as pessoas singulares, o local da residência habitual [cf. n.º 1, alínea a)];

6.25.2.   É obrigatória a comunicação do domicílio do sujeito passivo à administração tributária (cf. n.º 3);

6.25.3.   É ineficaz a mudança de domicílio enquanto não for comunicada à administração tributária (cf. n.º 4);

6.25.4.   Sempre que seja alterado o estatuto de residência de um sujeito passivo, este deve comunicar tal alteração à administração tributária (cf. n.º 5).

 

6.26.  Neste âmbito, como salienta Rui Duarte Morais, “são diferentes as noções de residência e domicílio fiscal, ainda que relativamente aos residentes o local do domicílio fiscal coincida com o da sua residência habitual (art. 19.º, n.º 1, al. a) da Lei Geral Tributária). Enquanto o conceito de residência integra a hipótese de normas tributárias substantivas, determinantes da existência e da extensão da obrigação de imposto, a questão do domicílio fiscal projecta-se em consequências processuais. A questão de saber se alguém é ou não residente em Portugal é independente da do domicílio fiscal. Aquele que efectivamente transferiu a sua residência para o estrangeiro não pode mais ser considerado residente em Portugal, mesmo que nos registos da administração fiscal continue a figurar como domiciliado em Portugal (mesmo que por omissão dele, sujeito passivo, em promover a necessária alteração). A nosso ver, o domicílio fiscal não constitui, no plano internacional, qualquer presunção de residência” (sublinhado nosso).[7]

 

6.27.  Por outro lado, e ainda a propósito de domicílio e residência fiscal, também a jurisprudência de tribunais superiores tem consagrado o que se acaba de referir, nomeadamente, no Acórdão do TCAS, de 11-11-2021 (proferido no âmbito do processo n.º 2369/09.7BELRS,), nos termos do qual se refere que “(…) os conceitos de domicílio fiscal (…) e de residente fiscal para efeitos de IRS não são sinónimos. (…) O dever de comunicação, previsto quer no n.º 1 do art. 43.º do CPPT quer no então art. 19.º, n.º 2, da LGT (atual n.º 3), não se trata de formalidade ad substanciam, pelo que a sua preterição não tem necessária e definitivamente impacto em termos de tributação. (…)”.

 

6.28.  E também o Acórdão do TCAS, de 08-07-2021 (proferido no processo n.º 803/05.0BESNT) refere que “saber se alguém é ou não residente em Portugal não está dependente do domicílio fiscal, por este não constituir, no plano internacional, qualquer presunção de residência. (…) O conceito de residência integra a hipótese de normas tributárias substantivas, determinantes da existência e da extensão da obrigação de imposto, enquanto o domicílio fiscal projecta-se em consequências processuais” (sublinhado nosso).

 

6.29.  A este propósito, afigura-se também pertinente considerar o seguinte posicionamento de Pedro Roma (acima já citado), no sentido de que “(…) o conceito de não residência fiscal não se encontra expressamente contemplado no ordenamento jurídico-fiscal português. Tal como analisado por José Calejo Guerra (…) entendemos que o conceito de não residência fiscal resulta a contrario do próprio Código do IRS, uma vez que todos aqueles que não preencherem um dos critérios de residência fiscal previstos no artigo 16.º do Código do IRS deverão ser considerados não residentes fiscais em Portugal”.[8]

 

6.30.  E, acrescenta ainda o referido Autor que a não residência fiscal é uma definição legal não escrita que se encontra sob a alçada da reserva relativa de lei da Assembleia da República (que resulta do artigo 165º, nº 1, alínea i) da CRP) e, nesta medida, é defendido que a administração tributária não pode introduzir, através da sua actuação (ainda que baseada em orientações administrativas), quaisquer exigências que, de algum modo, dificultem ou impeçam que um qualquer sujeito passivo, que não preencha nenhum critério de residência fiscal em Portugal, seja considerado não residente fiscal.[9]

 

 

Do direito internacional - Convenção para Evitar a Dupla Tributação celebrado entre Portugal e o Reino Unido

 

6.31.  Do ponto de vista internacional, e de acordo com o disposto no artigo 1º (Pessoas Visadas) da Convenção para Evitar a Dupla Tributação assinada entre Portugal e o Reino Unido, destinada (como o nome assim o indica) a evitar a dupla tributação e a prevenir a evasão fiscal em matéria de imposto sobre o rendimento (como é, em Portugal, o caso do IRS), a “(…) Convenção aplica-se às pessoas residentes de um ou de ambos os Estados Contratantes”, sendo que nos termos do seu artigo 4º (Residência), no que ao caso interessa, “(…) a expressão residente de um Estado contratante significa qualquer pessoa que, por virtude da legislação desse Estado, está aí sujeita a imposto devido ao seu domicílio, à sua residência, (…) ou a qualquer outro critério de natureza similar (…)” (nº1).

 

6.32.  Já de acordo com o nº 2 daquele artigo 4º, “quando, por virtude do disposto no parágrafo 1), uma pessoa singular for residente de ambos os Estados contratantes, a situação será resolvida como segue: a) Será considerada residente apenas do Estado em que tenha uma habitação permanente à sua disposição. Se tiver uma habitação permanente à sua disposição em ambos os Estados, será considerada residente apenas do Estado com o qual sejam mais estreitas as suas relações pessoais e económicas (centro de interesses vitais). b) Se o Estado em que tem o centro de interesses vitais não puder ser determinado ou se não tiver habitação permanente à sua disposição em nenhum dos Estados, será considerada residente apenas do Estado em que permanece habitualmente; c) Se permanecer habitualmente em ambos os Estados ou se não permanecer habitualmente em nenhum deles, será considerada residente apenas do Estado de que for nacional; d) Se for nacional de ambos os Estados ou não for nacional de nenhum deles, as autoridades competentes dos Estados contratantes resolverão o caso de comum acordo”.

 

6.33.  Nestes termos, dada a supremacia do direito internacional sobre o direito interno ordinário (consagrada nos artigos 8º da CRP e 1º, nº 1 da LGT), o conceito de “residência por dependência”, acolhido no artigo 16° nº 2 do Código do IRS, não pode sobrepor-se ao conceito convencional de residência constante do artigo 4º da Convenção contra a Dupla Tributação celebrada entre Portugal e o Reino Unido.

 

6.34.  Mas, no caso em concreto, o que temos?

 

6.35.  Neste caso, o que está pois em causa á a possibilidade de a Requerida tributar, em Portugal, dois cidadãos de nacionalidade inglesa, que entendem dever ser considerados como não residentes em território nacional, por referência ao ano 2018 (caso em concreto dos autos) relativamente a rendimentos obtidos fora do território nacional, com base nas informações que constam do Sistema de Registo de Contribuintes, complementada com informações resultantes do mecanismo da troca automática de informações, efectuado ao abrigo da Directiva 2011/16/EU do Conselho, de 15 de Fevereiro, entre a HM Revenue & Customs (Reino Unido) e a Requerida (Portugal).

 

6.36.  Como acima referido, os Requerentes alegam que em momento algum pretenderam declarar que, em 2018, tinham residência fiscal em Portugal e que assim que se aperceberam do lapso (e das suas consequências), pretenderam corrigir (em 14-12-2022) a situação cadastral com efeitos retroactivos a 2017, ano em que o referido lapso declarativo ocorreu, indicando a morada no Reino Unido onde alegam ter sempre residido.

 

6.37.  Por outro lado, a Requerida, com base na situação cadastral a 31-12-2018, veio liquidar oficiosamente IRS, assumindo que os Requerentes eram residentes em Portugal naquele ano, com base no facto de “após consulta ao Sistema de Gestão e Registo de Contribuintes, verifica-se que a 31-12-2018, data relevante para efeitos de tributação, quer o reclamante, quer o sujeito passivo B, encontravam-se inscritos como residentes em território português (…)” e que “constatou-se também que o ora reclamante submeteu não só a declaração de rendimentos Modelo 3 de IRS, referente ao ano em apreciação, como também as declarações de rendimentos Modelo 3 de IRS, referentes aos anos de 2019 a 2020, na qualidade de residente em território português (…)” e sendo “(…) residentes em território português, o IRS incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território. (…)”.

 

6.38.  Por outro lado, refere ainda a Requerida que “(…) que a declaração oficiosa emitida, (…), teve por base informação de que a AT dispunha proveniente de uma troca de informação automática das autoridades fiscais estrangeiras e que esta informação é proveniente da troca automática de informação (…)” sendo que “os valores considerados no Anexo J da declaração oficiosa acima referida estão em conformidade com o comunicado pelas Autoridades Fiscais estrangeiras(…)”, acrescentando que “(…) as Autoridades Fiscais estrangeiras ao enviar a referida informação consideraram o ora Reclamante e o sujeito passivo B como residentes fiscais em Portugal, pelo que, se afigura que foi o ora reclamante e o sujeito passivo B que também se consideraram junto daquele país como residentes fiscais em Portugal (...)”.

 

6.39.  Assim, tendo em consideração as conclusões que apresenta, a Requerida concluiu no projecto de indeferimento da reclamação graciosa (processo nº ...2022...), apresentada pelos Requerentes que “(…) não se encontrando juntos aos presentes autos, quaisquer documentos comprovativos do alegado, recaindo sobre o contribuinte a obrigação de demonstrar o exposto, nos termos do art.º 74.º da LGT, informa-se que, até prova em contrário, considera-se o ora Reclamante e o sujeito passivo B como residentes em Portugal para o ano 2018, estando obrigados a declarar os rendimentos auferidos no estrangeiro, confirmando-se os valores constantes do anexo J da declaração oficiosa. (…)”.

 

6.40.  Como referido no ponto 5.34., supra, com o exercício do direito de audição prévia, os Requerentes vieram juntar alguns documentos sobre os quais recaiu a seguinte apreciação da Requerida em sede de reclamação graciosa:

 

“Como forma de comprovar o acima alegado, junto se envia Declarações de Rendimentos apresentadas no Reino Unido enquanto residentes fiscais e Certificado de Residência Fiscal emitido pelas competentes autoridades do Reino Unido (…). (…). Após análise da presente exposição, informa-se que o ora reclamante reitera nos fundamentos alegados e já apreciados em sede do projeto de decisão (…). O ora reclamante alega que tendo adquirido um bem imóvel para exercício da atividade de alojamento local, passou a constar, erradamente, no Cadastro do Contribuinte, como sua residência fiscal a..., ..., Portugal. Ora, relativamente a este ponto, constatou-se que o domicílio fiscal passou a ser no Reino Unido -..., somente a partir de 06-12-2021. No que diz respeito aos documentos apresentados, verifica-se que os mesmos não são suficientes para comprovar a residência fiscal e a sua situação tributária no Reino Unido, ou dos seus dependentes, no ano em causa nos presentes autos (…). O ora reclamante requer também, em sede da presente exposição, que a morada seja alterada com efeitos retroativos ao ano de 2017. Ora, verifica-se que que foi junto aos autos, PEDIDO DE ALTERAÇAO DE MORADA COM EFEITOS RETROATIVOS, o qual foi apresentado, a 14-12-2022, perante o Serviço de Finanças de Cascais 1, o qual foi objeto de decisão de indeferimento, por inexistência dos pressupostos legais para a concessão da alteração da residência fiscal com efeitos retroativos (…)” (sublinhado nosso).

 

6.41.  A reclamação graciosa identificada no ponto anterior foi, como é sabido, indeferida.

 

6.42.  Em concreto, como resulta da factualidade provada, os Requerentes para fazerem a referida prova, apresentaram em sede graciosa e/ou com o pedido de pronúncia arbitral, com pertinência de prova do pretendido, cópia dos seguintes documentos:

6.42.1.   Declarações fiscais de rendimentos apresentadas a 08-04-2019, no Reino Unido, junto das autoridades fiscais, respeitantes a cada um dos Requerentes e relativas ao ano fiscal de 6 de Abril de 2018 a 5 de Abril de 2019;

6.42.2.   Certificado de residência fiscal no Reino Unido (Certificate of UK fiscal residence), emitido em 14-12-2022, pelas autoridades fiscais, no qual certificam, com ressalva, que a Requerente B... foi residente fiscal, de acordo com o disposto no artigo 1º da CDT em vigor (assinada entre Portugal e o Reino Unido), no Reino Unido no período entre 6 de Abril de 2018 e 5 de Abril de 2020;

6.42.3.   Carta de confirmação de residência no Reino Unido, respeitante ao Requerente A..., emitida pelas autoridades fiscais, em 23-11-2023, confirmando a sua residência fiscal no Reino Unido no período entre 1 de Janeiro de 2018 e 31 de Dezembro de 2021 mas ressalvando que “the letter of confirmation States that to the best of our knowledge and belief you are a resident of the UK for tax purposes. You can use this to meet requirements or support claims under the domestic law of the foreign state or EU law. However, this cannot be used to claim relief under a Double Taxation Agreement. You need a certificate of residence to do this. (...)";

6.42.4.   Outros documentos (extratos bancários, despesas de educação dos dependentes, despesas com seguros e outros, maioritariamente com datas não coincidentes com o período de tributação de rendimentos em análise (01-01-2018 a 31-12-2018).

 

6.43.  Neste âmbito, refira-se que como alega a Requerida, incumbia aos Requerentes, ao abrigo das regras do ónus da prova previstas no artigo 74º, da LGT, fazer prova do pretendido, ou seja de que eram residentes para efeitos fiscais, no ano de 2018, no Reino Unido e não em Portugal, devendo para este efeito apresentar prova suficiente para afastar o normativo nacional

 

6.44.  Nesta matéria, cite-se o Acórdão do TCAS nº 06935/13, de 28-11-2013 (Relator Eugénio Sequeira), nos termos do qual se refere que “ainda que em regra, o ónus da prova se reporte aos factos positivos de certo direito pretendido fazer valer, contudo, a lei, não fez inverter o ónus da prova para os casos em que tal ónus assenta sobre factos negativos como forma de infirmar o direito (positivo) invocado pela parte contrária”.[10]

 

6.45.  Sublinha-se que a prova da residência fiscal não é exclusivamente efectuada através de um Certificado de Residência Fiscal emitido pelas autoridade fiscais do Reino Unido, para o ano em causa (2018) e para efeitos de aplicação da CDT celebrada entre Portugal e o Reino Unido porquanto inexiste qualquer norma legal, incluindo no Código do IRS, que condicione/limite os meios de prova de que o contribuinte se pode socorrer para comprovar a sua residência fiscal.[11]

 

6.46.  Contudo, da documentação anexada pelos Requerentes com o PPA (e que condicionou a factualidade dada como provada no Capítulo 5. desta Decisão Arbitral), não resulta do seu teor a possibilidade deste Tribunal Arbitral ficar cabalmente esclarecido quanto ao estatuto de não residência fiscal dos Requerentes, em Portugal, no ano de 2018.

 

6.47.  Desde logo, refira-se que as declarações de rendimentos apresentadas pelos Requerentes, no Reino Unido, enquanto residentes fiscais neste Estado não se sobrepõem, nem têm necessária primazia sobre as declarações de rendimentos que aqueles apresentaram, em 2018, em Portugal, também na qualidade de residentes fiscais nesta jurisdição.

 

6.48.  Assim, apenas por referência a estas declarações fiscais, nenhuma conclusão é possível ser retirada acerca do Estado onde os Requerente podem ou devem ser considerados, em 2018, residentes para efeitos fiscais (Portugal ou Reino Unido?).

 

6.49.  Por outro lado, e no que diz respeito ao teor do certificado de residência fiscal referente à Requerente B... refira-se que este é, no mínimo, posto em causa pelo facto de a HM Revenue & Customs ter comunicado à Requerida, através mecanismo da troca automática de informações, informações acerca dos rendimentos que os Requerentes obtiveram, no ano de 2018, no Reino Unido (vide pág. 98 do PA).

 

6.50.  Com efeito, ao abrigo da Directiva 2011/16/EU do Conselho, de 15 de Fevereiro, o mecanismo referido no ponto anterior assenta no pressuposto que uma autoridade tributária de um EM (neste caso, a HM Revenue & Customs do Reino Unido) comunica as informações de que dispõe relativas a residentes noutro EM (neste caso, Portugal) às autoridades fiscais desse EM, ou seja, considerando/admitindo aquelas autoridades a possibilidade de os Requerentes serem residentes fiscais em Portugal.

 

6.51.  Adicionalmente, o Requerente A... não apresenta em nenhum momento qualquer certificado de residência fiscal emitido pela HM Revenue & Customs apresentando uma carta de confirmação de residência para efeitos fiscais, mas com ressalva quanto aos seus efeitos probatórios (vide ponto 5.35., supra).

 

6.52.  Mas porque a prova poderia ir para além dos certificados de residência, seria necessário apresentar prova que afastasse o enquadramento dos Requerentes no artigo 16º do Código do IRS, ou seja, prova que afastasse os critérios nacionais aplicáveis para qualificarem os Requerentes como residentes fiscais em Portugal:

 

          “(…) a) Hajam nele permanecido mais de 183 dias, seguidos ou interpolados; b) Tendo permanecido por menos tempo, aí disponham, em 31 de Dezembro desse ano, de habitação em condições que façam supor a intenção de a manter e ocupar como residência habitual; (…)”.

 

6.53.  E, refira-se, como ficou demonstrado, da prova apresentada, em nenhuma se demonstra que os Requerentes não permaneceram em Portugal por menos de 183 dias, seguidos ou interpolado num dado ano fiscal (2018 no caso) e que, se permaneceram por menos tempo, não dispunham, em Portugal, a 31-12-2018, de uma habitação em condições que fizessem supor a intenção de a manter e ocupar como residência habitual.

 

6.54.  Em suma e face ao acima exposto, ao abrigo das regras do ónus da prova prescritas no artigo 74.º, da LGT, considera este Tribunal que os Requerentes não foram capazes de cumprir com o ónus que incidia sobre os mesmos e, por conseguinte, respondendo à questão anteriormente colocada, considera-se que os Requerentes deverão ser considerados como residentes para efeitos fiscais em Portugal, no ano de 2018, porquanto não demonstraram com os documentos apresentados que o referido enquadramento não lhes era aplicável naquele ano.

 

6.55.  Em consequência, conforme resulta de tudo o acima exposto, o acto de liquidação de IRS nº 2022..., referente ao ano de 2018 (com o valor a pagar de EUR 246.262,58), não padece de qualquer vício de violação de lei, devendo ser mantido na ordem jurídica nacional, assim como deverá ser mantido o despacho de indeferimento da reclamação graciosa que sobre aquele acto de liquidação incidiu, julgando-se improcedente a pretensão dos Requerentes.

 

Da responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais

 

6.56.  De harmonia com o disposto no artigo 22º, nº 4, do RJAT, “da decisão arbitral proferida pelo tribunal arbitral consta a fixação do montante e a repartição pelas partes das custas directamente resultantes do processo arbitral” sendo que:

 

6.56.1.   Nos termos do disposto no artigo 527º, nº 1 do CPC (ex vi 29º, nº 1, alínea e) do RJAT), deve ser estabelecido que será condenada em custas a Parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito;

6.56.2.   Nos termos do nº 2 do referido artigo concretiza-se a expressão “houver dado causa”, segundo o princípio do decaimento, entendendo que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.

 

6.57.  No caso em análise, tendo em consideração o acima exposto e decidido, o princípio da proporcionalidade impõe que seja atribuída a responsabilidade integral por custas aos Requerentes, de acordo com o disposto no artigo 12º, nº 2 e 22º, nº 4 do RJAT e artigo 4º, nº 5 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

  1. DECISÃO

 

7.1.    Nestes termos, tendo em consideração as conclusões apresentadas no Capítulo anterior, decidiu este Tribunal Arbitral Colectivo:

 

7.1.1.     Julgar improcedente a excepção da incompetência do Tribunal Arbitral, suscitada pela Requerida;

7.1.2.     Julgar improcedente o pedido de anulação do acto de liquidação oficiosa de IRS relativo ao ano 2018, bem como o pedido de anulação do despacho de indeferimento da reclamação graciosa interposta contra aquela liquidação;

7.1.3.     Em consequência, condenar os Requerentes no pagamento integral das custas do presente processo.

 

Valor do processo: Tendo em consideração o disposto nos artigos 306º, nº 2 do CPC, artigo 97º-A, nº 1 do CPPT e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor do processo em EUR 246.262,58 (porquanto corresponde ao valor indicado pelos Requerentes e que corresponde ao acto de liquidação oficiosa de IRS impugnado).

 

Nos termos do disposto na Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor das custas do Processo Arbitral em EUR 4.284,00, de acordo com o artigo 22º, nº 4 do RJAT.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 18 de Novembro de 2024

 

Carla Castelo Trindade

 

 

(Árbitro Presidente)

 

Sílvia Oliveira

 

(Árbitro Vogal e Relatora)

 

Sofia Ricardo Borges

 

 

(Árbitro Vogal)

 

 



[1] A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990, excepto transcrições efectuadas.

[2] Ainda que alguns dos documentos anexados pelo Requerente estejam redigidos em língua estrangeira (inglês), foi possível ao tribunal retirar dos referidos documentos os elementos probatórios necessários, tornando-se desnecessário oficiar a tradução dos documentos juntos.

[3] A referência a serviços e organismos que se vinculavam à jurisdição arbitral era feita para a Direcção-Geral dos Impostos e a Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo, que foram, entretanto, extintas, tendo-lhes sucedido a Autoridade Tributária e Aduaneira.

[4] A este propósito, o acórdão proferido no Processo n.º 48/2012-T, de 06-07-2012, depois seguido por diversos outros arestos, consignou que “a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é, em primeiro lugar, limitada às matérias indicadas no artigo 2.º, n.º 1, do [RJAT]. Numa segunda linha, a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é também limitada pelos termos em que Administração Tributária se vinculou àquela jurisdição, concretizados na Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, pois o artigo 4.º do RJAT estabelece que «a vinculação da administração tributária à jurisdição dos tribunais constituídos nos termos da presente lei depende de portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, que estabelece, designadamente, o tipo e o valor máximo dos litígios abrangidos. Em face desta segunda limitação da competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, a resolução da questão da competência depende essencialmente dos termos desta vinculação, pois, mesmo que se esteja perante uma situação enquadrável naquele artigo 2.º do RJAT, se ela não estiver abrangida pela vinculação estará afastada a possibilidade de o litígio ser jurisdicionalmente decidido por este tribunal arbitral”.

[5] Vide Manual de IRS, Almedina, Coimbra, 2018, pp. 56 a 59.

[6] Vide Residência Fiscal Parcial em IRS, Almedina, Coimbra, 2018, pp 131 a 145.

[7] Vide Sobre o IRS, Almedina, Coimbra, 2006, pp 17 e 18.

[8] Cf. José Calejo Guerra, “A (não) residência fiscal no Código do IRS e seus requisitos: do conceito legal À distorção administrativa”, Cadernos de Justiça Tributária, n.º 6, Outubro-Dezembro 2014, pp. 16-22.

[9] Na verdade, de acordo com a actual prática administrativa, como é até a espelhada no caso em análise, a administração tributária exige a apresentação de um comprovativo de residência no estrangeiro para proceder à alteração do estatuto de residência fiscal dos sujeitos passivos para não residentes em Portugal, prática que, para alguns autores, se poderá reputar de ilegal, por violação do princípio da legalidade tributária, que encontra cobertura legal no artigo 8.º da LGT e cobertura constitucional no já citado artigo 165.º, n.º 1, alínea i) da CRP.

[10] Neste Acórdão é referido, a propósito do ónus da prova para efeitos de residência que “(…) o que interessaria provar (…) é que o ora recorrente nos referidos anos de 2008 a 2010, não tenha permanecido em território português até 183 dias, seguidos ou interpolados, para que nos termos do disposto no art.º 16.º, n.º1, alínea a) do CIRS, não possa ser considerado como residente em território português, independentemente de possuir ou não outra residência em qualquer um outro País, não sendo por outro lado, aquela afirmada residência em Angola, impeditiva de ter permanecido mais de 183 dias em território português, como é bem de ver, para ao abrigo de tal alínea ser considerado residente e sujeito a tal incidência subjectiva do imposto nos termos do disposto nos art.ºs 13.º e 15.º do mesmo CIRS (…)” (sublinhado nosso). E prossegue referindo que “(…) o recorrente (…) em todos estes anos aqui em causa, andou a entregar declarações de IRS, onde nelas sempre fez constar que a sua residência era em território português (…)” e que “(…) a liquidação de tal imposto assenta no método declarativo nos termos do disposto nos art.ºs 57.º, 65.º e 76.º do CIRS, sendo o imposto liquidado com base nos elementos declarados pelo contribuinte, para si favoráveis ou desfavoráveis, para além de que, em termos probatórios, as menções narradas pelos contribuintes presumem-se verdadeiras e de boa fé, nos termos do disposto nos art.ºs 75.º da LGT e 59,.º do CPPT, desta forma passando a AT a ter a seu favor uma presunção legal (no caso, de o ora recorrente ter residência em território português), pelo que escusava de fazer a prova o facto a que ela conduz, nos termos do disposto no n.º1 do art.º 350.º do Código Civil, passando desta forma a caber ao contribuinte a fazer a prova do contrário do facto presumido, nos termos do n.º2 deste mesmo artigo, ou seja, que nesses anos esteve em território português menos de 183 dias, que não à AT a prova de que o mesmo nesses mesmos anos esteve em território português por mais de 183 dias, por beneficiar da citada presunção legal (…)”.

[11] Neste sentido, vide Decisão Arbitral proferida no âmbito do P 85/2022-T, de 24-10-2022 e P 155/2022-T, de 11-10-2022.