Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 371/2024-T
Data da decisão: 2024-11-27   Outros 
Valor do pedido: € 176.264,19
Tema: AIMI - Fixação do valor patrimonial tributário - Procedimento de revisão oficiosa - Inaplicabilidade do artigo 78.º, da LGT - Invocação de novos vícios do acto em sede arbitral.
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SUMÁRIO:

 

I – Os actos de avaliação de valores patrimoniais previstos no CIMI são actos destacáveis, para efeitos de impugnação contenciosa, sendo objeto de impugnação autónoma, não podendo na impugnação dos atos de liquidação que com base neles sejam efetuadas discutir-se a legalidade daqueles actos.

II – Tendo sido invocados no procedimento de revisão oficiosa unicamente fundamentos relativos a vícios dos actos de fixação do valor patrimonial tributário e sendo o artigo 78.º, da LGT, inaplicável a tais actos - Acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, de 23-02-2023, processo n.º 0102/22.2BALSB e de 22-11-2023, processo n.º 115/23.7BALSB -, não é possível à Requerente, na sequência do indeferimento da revisão oficiosa, obter pronúncia arbitral com fundamento em outros vícios não anteriormente invocados, sob pena de admitir-se que um pedido administrativo inviável, porque inadmissível, possa ser idóneo para abrir a via contenciosa visando a discussão relativamente a outros fundamentos nunca anteriormente invocados.

 

 

DECISÃO ARBITRAL

 

Os árbitros Guilherme W. d'Oliveira Martins (Presidente), Carla Alexandra Pacheco de Almeida Rocha da Cruz e Martins Alfaro, designados pelo Conselho Deontológico do CAAD para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 28-05-2024, acordam no seguinte:

 

A - RELATÓRIO

 

A.1 - Requerente da constituição de tribunal arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAMT): A... S.A., com o número único de matrícula e de identificação fiscal..., com sede SOCIAL em ..., ...-... Almancil.

 

A.2 - Requerida: Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

A.3 - Objecto da pronúncia arbitral:

 

Constitui objecto do pedido de pronúncia arbitral o acto de liquidação de AIMI n.º 2018..., referente ao ano de 2018, no qual se apurou o montante total de imposto a pagar de € 314.908,14, que por seu turno, foi alvo de rectificação pela liquidação n.º 2018... e relativamente aos seguintes prédios:

 

Artigo Matricial

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Artigo Matricial

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Artigo Matricial

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Constitui ainda objecto do pedido de pronúncia arbitral a decisão final do procedimento de revisão oficiosa que incidiu sobre a apreciação da legalidade do acto tributário objecto do pedido de pronúncia arbitral.

 

A.4 - Pedido:

 

Que o pedido de constituição do tribunal arbitral seja julgado totalmente procedente, por provado e, em consequência, seja anulada a decisão de indeferimento do procedimento de revisão oficiosa n.º ...2021..., bem como seja determinada a anulação parcial da liquidação de AIMI de 2018, tudo com as legais consequências, nomeadamente, o reembolso do montante indevidamente pago pela Requerente (€ 176.264,19), acrescido de juros indemnizatórios, desde a data em que decorreu o prazo de um ano desde a apresentação do pedido de revisão oficiosa, até ao seu efectivo reembolso.

 

A.5 - Fundamentação do pedido:

 

Para fundamentar o seu pedido, a Requerente alega, em síntese, o seguinte:

 

Na sequência das diversas fragilidades que tinham vindo a ser apontadas, quer pela doutrina, quer pelos tribunais superiores, ao modo como a Autoridade Tributária apurava, até 31-12-2020, o valor patrimonial tributário (doravante, VPT) dos terrenos para construção - que calculava o VPT dos terrenos para construção com recurso a elementos destinados à avaliação de prédios urbanos (já edificado) para habitação, comércio, indústria e serviços, em detrimento do estabelecido no artigo 45.º do Código do IMI -, a Requerente apresentou, em 26-12-2018, um pedido de rectificação da inscrição matricial dos prédios sobre os quais incidiu o imposto impugnado e, bem assim, submeteu as Declarações Modelo 1 de IMI adequadas para o efeito, onde pugnou pela neutralização dos elementos indevidamente utilizados pela Autoridade Tributária.

 

Na sequência da notificação do resultado definitivo das avaliações dos imóveis efetuadas pela Autoridade Tributária, foram revistas as liquidações de IMI de 2018 (e, consequentemente, foi promovida a sua anulação parcial), com base nos novos VPT.

 

Contudo, ao contrário do que seria expectável, a Autoridade Tributária não reviu as liquidações de AIMI de 2018 com base nos novos VPT.

 

Sendo que a Autoridade Tributária estava adstrita a refletir os novos VPT na liquidação de AIMI de 2018 e, consequentemente, a promover a sua anulação parcial.

 

A.6 - Resposta da Requerida, Autoridade Tributária e Aduaneira:

 

A Requerida defende o seguinte:

 

A Requerente pretende a anulação dos actos impugnados com fundamento em vícios, não do ato de liquidação, mas sim dos actos que fixaram o Valor patrimonial Tributário (VPT).

 

A presente acção não é fundamentada em qualquer vício do ato de liquidação, já que aos actos impugnados não é imputado qualquer vício específico da operação de liquidação ou do seu procedimento,

 

Ou seja, o que a Requerente contesta é, apenas e só, o acto destacável de fixação do VPT e não o acto de liquidação, sendo que os vícios do acto que definiu o valor patrimonial tributário não são suscetíveis de ser impugnados no acto de liquidação que seja praticado com base no mesmo,

 

Porquanto foram as liquidações foram praticadas tendo em conta os valores patrimoniais tributários, reportados a 1 de janeiro do ano a que respeita o AIMI, nos termos dos artigos 135.º-A e 135.º G do CIMI.

 

E esses valores patrimoniais tributários encontravam-se em tal data juridicamente consolidados, válidos e vigentes nas respectivas matrizes prediais e, nessa medida, serviram de base às liquidações em causa nos autos.

 

Conclui no sentido da improcedência do pedido arbitral.

B - SANEAMENTO:

 

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira nos termos regulamentares.

 

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAMT, na redacção introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico do CAAD designou como árbitros do Tribunal Arbitral colectivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.


As partes foram oportuna e devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAMT e dos artigos 6.° e 7.,º do Código Deontológico.

 

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAMT, o Tribunal Arbitral colectivo foi constituído em 28-05-2024.

 

O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, atenta a conformação do objecto do processo e à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do RJAMT).

 

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas.

 

O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do RJAMT.

 

O Tribunal dispensou a produção de alegações escritas, sem que nenhuma das partes se opusesse.

 

O processo não enferma de nulidades.

 

Cumpre assim apreciar e decidir, o que se fará de seguida.

 

 

C - FUNDAMENTAÇÃO:

 

C.1 - Matéria de facto - Factos provados:

 

Os factos relevantes para a decisão da causa que são tidos como assentes são os seguintes:

 

A liquidação impugnada refere-se a AIMI do ano de 2018, liquidação n.º ..., na qual foi apurado imposto a pagar no montante de 314.918,14 €, tendo esta sido posteriormente substituída pelas liquidações nrs. ... e ... - Facto admitido por ambas as partes.

 

A Requerente é titular dos prédios urbanos, “terrenos para construção”, inscritos na matriz, com os seguintes artigos matriciais:

 

Artigo Matricial

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Artigo Matricial

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Artigo Matricial

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- Facto admitido por ambas as partes.

 

As liquidações de AIMI objecto do presente pedido de pronúncia arbitral incidiram sobre o VPT constantes das matrizes prediais à data de 01-01-2018 - Facto admitido por ambas as partes.

 

A Requerente apresentou, em 26-12-2018, reclamação das matrizes relativamente aos prédios anteriormente listados as Declarações Modelo 1 de IMI adequadas para o efeito - Facto não impugnado.

 

Na sequência das reclamações das matrizes e da notificação do resultado das avaliações dos imóveis, a AT procedeu à revisão das liquidações de IMI de 2018, com a consequente anulação parcial, com base nos novos VPT - Facto não impugnado.

 

Em 01-07-2021, a Requerente apresentou pedido de revisão oficiosa, tendo como objecto, entre outras, as liquidações de AIMI aqui impugnadas - Facto admitido por ambas as partes.

 

Como fundamento do pedido de revisão oficiosa, a Requerente alinhou, em síntese, a seguinte argumentação:

 

[…] requereu a segunda avaliação dos PRÉDIOS e, em consequência, foi notificada do resultado final das avaliações efetuadas pela Autoridade Tributária, razão pela qual deduz o presente Pedido de Revisão Oficiosa, por referência ao IMI e AIMI de 2017 e 2018, nos termos abaixo minudenciados.

 

Da ilegalidade da liquidação de IMI por errónea quantificação do VPT dos PRÉDIOS:

 

O presente Pedido de Revisão Oficiosa tem como objeto a análise da legalidade das liquidações de IMI e AIMI acima melhor identificadas (cfr. citados Documentos 1 a 4), as quais, na ótica da Requerente, padecem de ilegalidade pelo facto de o imposto ter sido calculado tendo por referência um VPT errado.

 

Na verdade, tanto a doutrina, como os tribunais superiores, têm apontado diversas fragilidades ao modo como a Autoridade Tributária apura o VPT dos terrenos para construção - que tende a calculá- lo com recurso a elementos destinados à avaliação de prédios urbanos (já edificados) para habitação, comércio, indústria e serviços, em detrimento do estabelecido no artigo 45.° do Código do IMI insurgindo-se, concretamente, quanto à: (i) determinação dos coeficientes de afetação, localização, e coeficiente de qualidade e conforto - detalhados nos artigos 41.° a 43.° do Código do IMI, em valor superior a "1"; e (ii) majoração de 25% do valor base dos prédios edificados, constante do n.° 1 do artigo 39.° do Código do IMI.

 

[…]

 

Da (i)legalidade da utilização dos coeficientes de afetação, localização, e coeficiente de qualidade e conforto para determinação do VPT dos terrenos para construção:

 

[…] por referência às liquidações de IMI e AIMI aqui em escrutínio, deve a Autoridade Tributária, promovera substituição dos coeficientes de afetação, localização, e qualidade e conforto, por "1", porquanto os valores considerados para apuramento do VPT dos PRÉDIOS se afigura ilegal - facto reconhecido e corrigido pela própria Autoridade Tributária na avaliação dos PRÉDIOS.

 

[…]

 

Da (i)legalidade da majoração de 2S°/o do valor base dos prédios edificados prevista no n .° l do artigo 39.0 do Código do IMI:

 

Em decorrência do exposto, conclui-se que valor que advém da majoração de 25% do valor médio de construção por metro quadrado é manifestamente ilegal, pelo que, para efeitos de apuramento do VPT dos PRÉDIOS deverá ser considerado (apenas) o valor médio de construção por metro quadrado fixado em Portaria (jn casu € 482,40, cfr. Portarias n.°s 345-B/2016, de 30 de dezembro e 379/2017, de 19 de dezembro), devendo, por isso, ser ordenada a revisão oficiosa das liquidações de IMI e AIMI aqui sindicadas.

 

Assim sendo, impõe-se que o método de cálculo do VPT dos PRÉDIOS subjacente às liquidações de IMI e AIMI aqui sindicadas seja corretamente determinado, i.e., nos termos do artigo 45.° do Código do IMI (num montante que não o sobrevalorize), o que só é possível se os elementos indevidamente utilizados peia Autoridade Tributária sejam neutralizados (através da substituição dos coeficientes de localização, afetação e qualidade e conforto, fixados pela Autoridade Tributária, por "1" e, bem assim, da desconsideração da majoração do valor base em 25%), tal como demonstrado na tabela

 

[…]

 

Caso assim não se entenda, e como resulta do ante exposto, sempre se dirá que prevalecendo majoração de 25% prevista no n.° 1 do artigo 39.° do Código do IMI, relativa ao cálculo do valor base por metro quadrado que incide sobre a área bruta autorizada, jamais poderá vingara aplicação da percentagem da área de implantação em valor superior a 15%, determinada nos termos do n.° 3 do artigo 42.° do Código do IMI, sob pena de o VPT dos terrenos para construção considerar, em duplicado, a mesma realidade - Processo Administrativo - 2.ª parte.

 

A decisão final de indeferimento do procedimento de revisão oficiosa foi notificada à Requerente pelo ofício da Direção de Serviços do Imposto Municipal sobre Imóveis, datado de 10-01-2024, proferida no âmbito procedimento de revisão oficiosa n.º ...2021..., com os seguintes fundamentos:

 

As liquidações questionadas pela requerente, quanto aos prédios que identificou no seu pedido, foram lançadas observando os elementos matriciais vigentes em 31-12-2017 e 31-12-2018 ou em 01-01-2017 e 01-01-2018, respetivamente, para o IMI e AIMI, tendo em conta os VPT’s definitivos inscritos nas matrizes prediais;

 

[…] não sendo possível alterar os valores patrimoniais tributários respeitantes aos prédios aqui em crise, as liquidações contestadas não padecem do necessário erro imputável à Administração Tributária que justifique a revisão oficiosa nos termos do n.º 1 do artigo 78.º da LGT”, sendo que “[e] o mesmo se constata relativamente ao n.º 4 do mesmo artigo, pois também nesse caso os prazos legais para concretização da revisão da matéria tributável apurada com fundamento em injustiça grave ou notória já se encontravam ultrapassados à data da entrega do requerimento que deu azo a este procedimento.

 

Em conclusão: Por tudo quanto foi exposto, e considerando o valioso suporte obtido através da argumentação aduzida no Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, de 23-02-2023, que constitui a melhor e mais recente jurisprudência dos Tribunais Superiores, afigura-se-nos ser de negar provimento ao pedido de revisão referente ao IMI e AIMI dos anos de 2017 e 2018 - Facto não impugnado.

 

A Requerente apresentou, em 15-03-2024, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral - Sistema Informático de Gestão Processual (SGP) do CAAD.

 

C.2 - Matéria de facto - Factos não provados:

 

Não se provaram outros factos com relevância para a decisão arbitral.

 

C.3 - Motivação quanto à matéria de facto:

 

Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram seleccionados em função da sua relevância jurídica, face às soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2, do CPPT, 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3, do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAMT.

 

Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos pelas partes, não impugnados, e no processo administrativo.

 

A convicção do Tribunal fundou-se igualmente nos factos articulados pelas partes, cuja aderência à realidade não se entende posta em causa, e no acervo probatório carreado para os autos, o qual foi objecto de uma análise crítica e de adequada ponderação, à luz das regras da racionalidade, da lógica e da experiência comum e segundo juízos de normalidade e de razoabilidade.

 

 

C.4 - MATÉRIA DE DIREITO:

 

C.4.1 - Questões a decidir:

 

Primeira questão a decidir: - Tendo sido invocados no procedimento de revisão oficiosa unicamente fundamentos relativos a vícios dos actos de fixação do valor patrimonial tributário e sendo o artigo 78.º, da LGT, inaplicável a tais actos - Acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, de 23-02-2023, processo n.º 0102/22.2BALSB e de 22-11-2023, processo n.º 115/23.7BALSB -, é possível à Requerente, na sequência do indeferimento da revisão oficiosa, obter pronúncia arbitral com fundamento em outros vícios não anteriormente invocados?

 

Segunda questão a decidir: As liquidações objecto do pedido de pronúncia arbitral devem ser anuladas parcialmente?

 

Terceira questão a decidir: Deve a Requerida AT ser condenada no pagamento de juros indemnizatórios?

 

Vejamos:

 

C.4.2 - Apreciação da primeira questão: Tendo sido invocados no procedimento de revisão oficiosa unicamente fundamentos relativos a vícios dos actos de fixação dos valor patrimonial tributário e sendo o artigo 78.º, da LGT, inaplicável a tais actos - Acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, de 23-02-2023, processo n.º 0102/22.2BALSB e de 22-11-2023, processo n.º 115/23.7BALSB -, é possível à Requerente, na sequência do indeferimento da revisão oficiosa, obter pronúncia arbitral com fundamento em outros vícios não anteriormente invocados?

 

No pedido de constituição do Tribunal arbitral, a Requerente escreveu que:

 

[…] não pode aceitar a posição sufragada pela Autoridade Tributária, quanto ao ato de liquidação de AIMI de 2018, por entender que o mesmo deveria ter sido revisto - ainda que em valores distintos dos apresentados pela Requerente em sede do pedido de revisão -, à luz dos novos VPT que resultaram do pedido de avaliação dos imóveis apresentado em 26.12.2018.

 

A Requerente refere ainda, a propósito da «violação do disposto no n.º 8 do artigo 130.º Código do IMI», o seguinte:

33.º

Ora, no caso concreto e como é visível pela análise das cadernetas prediais dos PRÉDIOS, a Requerente apresentou o pedido de retificação do VPT dos imóveis melhor identificados no artigo 8.º do presente pedido arbitral em 26.12.2018 (cf. citados Documentos 3 e 4),

 

34.º

Pelo que a Autoridade Tributária estava adstrita a refletir o novo VPT na liquidação de AIMI de 2018 e, consequentemente, promover a sua anulação parcial, com o consequente reembolso do montante de € 176.264,19 à Requerente.

 

35.º

Ou seja, ainda que se entendesse que a pretensão da Requerente, em sede do pedido de revisão oficiosa, não poderia proceder - em virtude de não lhe ser legítimo discutir os vícios da avaliação dos imóveis em sede de contestação da liquidação dos impostos sobre o património -, a realidade é que a Autoridade Tributária estava adstrita a, por força dos novos VPT, rever a liquidação de AIMI de 2018 – o que não se verificou.

[…]

 

38.º

Assim, tendo a Requerente apresentado um pedido de avaliação dos PRÉDIOS em 26.12.2018, a avaliação dali resultante deverá ser refletida em todas as liquidações relativas ao ano de 2018 e não, como entendeu a Autoridade Tributária (ao rever o IMI de 2018), apenas nas liquidações efetuadas após a data do pedido de avaliação.

 

39.º

Em face do exposto, verifica-se que a mera reflexão dos novos VPT (resultantes da avaliação pedido em 28.12.20218) levaria à anulação parcial da liquidação de AIMI de 2018 e, consequentemente, teria um imediato impacto no valor a ser reembolsado à Requerente

 

Como resulta do probatório, no pedido de abertura do procedimento de revisão oficiosa (na sequência de cujo indeferimento a Requerente apresentou o pedido de constituição do Tribunal Arbitral), os fundamentos daquele pedido consistiram apenas na alegação de vícios atinentes à fixação dos valores patrimoniais que serviram de base às liquidações revidendas.

 

Contudo, no pedido de constituição do Tribunal Arbitral, a Requerente invoca já não os vícios atinentes à fixação dos valores patrimoniais, mas sim o facto de, na sequência de novas avaliações, a Requerida não ter procedido oficiosamente à anulação parcial das liquidações impugnadas.

 

É certo que saber se o particular pode vir invocar, em sede de impugnação judicial - e, consequentemente, em sede de processo arbitral tributário -, vícios que não invocou em procedimento de reclamação graciosa ou de revisão oficiosa, é hoje uma questão resolvida pelo acórdão de uniformização de jurisprudência do STA, de 03-06-2015, processo n.º 0793/14,[1] precisamente no sentido da admissibilidade da invocação de tais (novos) vícios.

 

Daí que, aparentemente, nada se oponha ao ocorrido nos presentes autos.

 

Contudo, a situação destes autos não corresponde à do citado acórdão do STA.

 

Com efeito, os Acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, proferidos em 23-02-2023, processo n.º 0102/22.2BALSB e em 22-11-2023, processo n.º 115/23.7BALSB uniformizaram a jurisprudência no sentido de que «deixando o contribuinte precludir a possibilidade de sindicar o valor patrimonial tributário nos termos previstos nos artigos 76.º e 77.º do Código do IMI, não pode arguir a ilegalidade da liquidação com fundamento na ilegalidade subjacente ao cálculo do valor patrimonial tributário que lhe serviu de matéria coletável» e que «o artigo 78º [da LGT] é inaplicável aos actos de fixação do valor patrimonial tributário».

 

Isto é, a formação do denominado caso resolvido administrativo determina a inimpugnabilidade dos actos objecto do pedido de revisão oficiosa com fundamento em erro na fixação do valor patrimonial tributário.

 

Na verdade, não sendo impugnado tempestivamente o acto de fixação de valores patrimoniais, forma-se caso decidido ou resolvido sobre a avaliação, que se impõe em sede de liquidação de IMI, sendo que «o imposto é liquidado anualmente, em relação a cada município, pelos serviços centrais da Direcção-Geral dos Impostos, com base nos valores patrimoniais tributários dos prédios e em relação aos sujeitos passivos que constem das matrizes em 31 de Dezembro do ano a que o mesmo respeita» (artigo 113.º do CIMI).

 

A natureza de actos destacáveis que é atribuída aos actos de avaliação de valores patrimoniais é, há muito, reconhecida pela jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, desde o tempo em que regime idêntico ao do artigo 134.º, n.ºs 1 e 7 do CPPT, previsto nos n.ºs 1 e 6 do artigo 155.º do Código de Processo Tributário de 1991, quer em sede de Sisa, quer de contribuição autárquica, quer de IMI, quer de IMT.

 

Em consequência, os actos de liquidação objecto do pedido de revisão oficiosa apresentado pela Requerente eram inimpugnáveis, ainda que administrativamente, já que tendo deixado «o contribuinte precludir a possibilidade de sindicar o valor patrimonial tributário nos termos previstos nos artigos 76.º e 77.º do Código do IMI, não pode arguir a ilegalidade da liquidação com fundamento na ilegalidade subjacente ao cálculo do valor patrimonial tributário que lhe serviu de matéria coletável» sublinhando-se que «o artigo 78º [da LGT] é inaplicável aos actos de fixação do valor patrimonial tributário».[2]

 

Ora, em tal contexto, entende o Tribunal não ser possível à Requerente apresentar um pedido de revisão oficiosa inadmissível - porque «o artigo 78º [da LGT] é inaplicável aos actos de fixação do valor patrimonial tributário» - e, uma vez aberta a via contenciosa assente num pedido inadmissível, vir nesta última via invocar outros fundamentos, esses já admissíveis.

 

A entender-se de modo diverso - e este Tribunal não o entende -, bastaria então que o particular apresentasse revisão oficiosa - por exemplo, intempestivamente - e esta fosse indeferida, para abrir um prazo para impugnação judicial ou pronúncia arbitral.

 

Como se escreveu, entre outras, na Decisão Arbitral proferida no processo n.º 114/2019-T, «estaria aberto o caminho para continuar a discutir a legalidade de actos tributários relativamente aos quais findaram já, há muito, os respectivos prazos de contestação».

 

Deste modo, o Tribunal entende que, tendo sido invocados no procedimento de revisão oficiosa unicamente fundamentos relativos a vícios dos actos de fixação do valor patrimonial tributário e sendo o artigo 78.º, da LGT, inaplicável a tais actos, não é possível à Requerente obter pronúncia arbitral com fundamento em outros vícios não anteriormente invocados, sob pena de admitir-se que um pedido administrativo inviável, porque inadmissível, possa ser idóneo para abrir a via contenciosa visando a discussão quanto a outros fundamentos nunca anteriormente invocados.

 

Por fim, dir-se-á ainda que é certo que o vício (agora) assacado às liquidações no pedido de constituição do Tribunal Arbitral constitui, por sim mesmo, uma questão arbitrável.

 

Porém, sendo tal vício invocado na sequência de um procedimento administrativo inadmissível, a verdade é que, ainda que o Tribunal pretendesse apreciar a (nova) questão autonomamente, a isso sempre obstaria a intempestividade do pedido de constituição do Tribunal Arbitral, já que, em tal hipótese, se trataria do recurso directo à via arbitral e o prazo estatuído no artigo 10.º, n.º 1, do RJAMT, já havia decorrido à data da apresentação do pedido.

 

Nestes termos, o Tribunal irá decidir não conhecer do pedido de pronúncia arbitral e absolver a Requerida, da instância.

 

A solução desta questão prejudica a apreciação das demais questões suscitadas pela Requerente, nos termos do disposto no artigo 660.º, n.º 2, primeiro segmento, do CPC, aplicável ex vi o artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAMT.[3]

 

 

D - DECISÃO:

 

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral não conhecer do pedido de pronúncia arbitral e, em consequência:

  1. Absolver a Requerida da instância;
  2. Condenar a Requerente nas custas do processo, no montante abaixo fixado.

 

 

E - VALOR DA CAUSA:

 

A Requerente indicou como valor da causa o montante de € 176.264,19.

 

O valor indicado pela Requerente não foi impugnado e não considera o Tribunal existir fundamento para o alterar, pelo que, de harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e ainda 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se à presente causa o valor de € 176.264,19.

 

 

F - CUSTAS:

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAMT, e da Tabela I, anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em € 3.672,00, indo a Requerente, que foi vencida, condenada nas custas do processo.

 

Notifique.

 

Lisboa, 27 de Novembro de 2024.

 

Os Árbitros,

 

 

Guilherme W. d'Oliveira Martins (Presidente),

 

 

 

 

 

 

Carla Alexandra Pacheco de Almeida Rocha da Cruz

 

 

 

 

Martins Alfaro

 

 



[2] Acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA citados.

[3] Neste sentido, mutatis mutandis, veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 07-12-2011, proferido no processo n.º 0241/11, onde se concluiu que «a intempestividade do meio impugnatório implica a não pronúncia do tribunal sobre as questões suscitadas na petição inicial, ainda que de conhecimento oficioso, na medida em que a lide impugnatória não chega a ter o seu início». Disponível em: https://blook.pt/caselaw/PT/STA/372187/