Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 910/2024-T
Data da decisão: 2024-11-07  IRC  
Valor do pedido: € 18.431,84
Tema: IRC de 2022. Não residente. Mais-valias imobiliárias. Artigo 63º do TFUE vs artigo 43º-2 – b) do CIRS.
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SUMÁRIO

Apresentada impugnação de acto de liquidação de IRS e tendo a Autoridade Tributária, na pendência do processo, revogado o acto impugnado de forma a satisfazer plenamente o pedido do sujeito passivo, verifica-se inutilidade superveniente da lide, com a consequente extinção da instância, aplicando-se o regime de responsabilidade pelas custas do nº 4 do artigo 536º do CPC.

 

  1. A..., NF ..., residente na Rua ..., n.º ..., ..., ..., Espanha, veio ao abrigo da alínea a), do n.º 1, do artigo 2.º e da alínea a), do n.º 1, do artigo 10.º, ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, da alínea d) do n.º 1 do artigo 102.º do CPPT e da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, requerer a constituição de Tribunal, pedindo:  

(1) a apreciação da legalidade parcial do ato de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”) n.º 2023..., de 14.07.2023, referente ao ano de 2022, no valor de 18.431,84€;

(2) bem como, do acto de indeferimento tácito da reclamação graciosa apresentada no dia 28.12.2023, rececionada pelo serviço de finanças competente no dia 29.12.2023.

  1. Termina pedindo: “(a) a anulação parcial do ato de liquidação de IRS n.º 2023..., no excesso de 50% julgado incompatível com o direito comunitário, por aplicação do disposto no n.º 2, do artigo 43.º do Código do IRS, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 4, do artigo 8.º, da CRP e do artigo 63.º do TFUE, tudo com todas as demais consequências legais; (b) Condenação da AT no pagamento do montante de imposto indevidamente pago, bem como, no pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º, da LGT, tudo com todas as demais consequências legais”.
  2. É demandada a Autoridade Tributária e Aduaneira, adiante designada por Requerida ou AT.

 

  1. Por despacho do Tribunal Arbitral Singular (TAS) de 08.10.2024 foi a Requerida notificada para contestar.

 

  1. Em 29.10.2024 a Requerida juntou despacho de revogação de 21.10.2024 onde refere: “11. ... a jurisprudência tem vindo a considerar que o referido quadro legal violava os artigos 63º e 65º do Tratado de Funcionamento da União Europeia ("TFUE") por constituir uma  discriminação negativa suscetível de restringir a circulação de capitais, com destaque para o Acórdão de uniformização de jurisprudência do Supremo Tribunal de Administrativo ("STA") de 09.12.2020, proferido no âmbito do Processo nº 75/20.6BALSB, bem como para a Decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia ("TJUE") de 18.03.2021, proferida no âmbito do Processo C-388/19 (Caso MK).

12.0ra, nos termos da alínea b) do nº 4 do artigo 68º da Lei Geral Tributária ("LCT"), a administração tributária deve rever as orientações genéricas quando, entre outros fatores, exista acórdão de uniformização de jurisprudência proferido pelo STA.

13. Assim, nos procedimentos administrativos e processos judiciais pendentes, no quadro normativo em que ainda não tinha entrado em vigor a alteração legislativa introduzida pela Lei nº 24-D/2022, de 30 de dezembro, foi, por despacho do SEAAF nº 177/2021 -XXII, de 04/06/2021, decidido aplicar, caso a caso, o disposto no nº 2 do artigo 43º do CIRS aos sujeitos passivos não residentes, mantendo-se a tributação autónoma à taxa especial de 28%.

14. Quanto ao pedido de juros indemnizatórios, é o artigo 43º da Lei Geral Tributária (LGT) que define os pressupostos do direito aos mesmos a favor do contribuinte, consignando, na sua redação atual, sob a epígrafe «Pagamento indevido da prestação tributária»: “1-São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido ...”.

15. Uma vez que foi agora assumido pela AT a aplicação do nº 2 do artigo 43º do CIRS ao saldo das mais valias do requerente, refletindo-se na exclusão de 50% do mesmo, consubstancia assim um erro imputável aos serviços, tem o requerente direito aos juros indemnizatórios, no valor pago superior ao devido.

V — Conclusão

Após apreciação do pedido de pronúncia arbitral, afigura-se-nos que deverá ser aplicada na liquidação o disposto na alínea b) do nº 2 do artigo 43º do CIRS considerando-se o saldo das mais-valias imobiliárias em apenas 50% do seu valor, restituindo-se o imposto pago a mais, assim como o pagamento dos respetivos juros indemnizatórios”.

 

 

  1. Por despacho do TAS de 29.10.2024 foi notificado o Requerente para o exercício do contraditório, tendo por Requerimento de 06.11.2024 referido “... foi notificado de despacho de revogação junto pela AT aos presentes autos, o qual assegura a sua pretensão plasmada no seu pedido de pronúncia arbitral, pelo que, com o mesmo concorda, nada mais tendo a pronunciar, acrescentar ou requerer”.

 

  1. O pedido de constituição do tribunal arbitral (PPA) foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira nos termos regulamentares.

De acordo com o disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228. ° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral singular (TAS) o signatário desta decisão, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.

As partes foram oportuna e devidamente notificadas da designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT e dos artigos 6. ° e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral singular (TAS) foi regularmente constituído em 8 de Outubro de 2024.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

O processo não enferma de nulidades.

 

Cabe decidir.

 

DECISÃO

                           

A Requerida com a decisão revogatória parcial do acto de liquidação, na parte impugnada, deu satisfação voluntária à pretensão do Requerente.

Foi cumprido o nº 3 do artigo 3º do CPC.

Nos termos da alínea e) do artigo 277º do CPC e do nº 4 do artigo 536º do CPC julga-se extinta a instância por inutilidade superveniente da lide (normas aplicáveis por força da alínea e) do nº 1 do artigo 29º do RJAT).

Não se aplica o regime geral em matéria de custas (artigo 527º do CPC) uma vez que, ao caso, é aplicável o regime específico do nº 4 do artigo 536º do CPC.

 

Valor da causa

O Requerente indicou como valor económico da causa o montante de € 18 431,84, o que a Requerida também menciona na informação que sustenta a decisão revogatória. Assim, nos termos da alínea a) do nº 1 do artigo 97ºA do CPPT, fixa-se em € 18 431,84, o valor da causa.

 

Custas

Nos termos dos artigos 12.º, n.º 3, do RJAT, e 5.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e Tabela II anexa a esse Regulamento, fixa-se o montante das custas em € 1 224,00, que ficam a cargo da Requerida em função da regra específica do nº 4 do artigo 536º do CPC.

 

Notifique.

 

Lisboa, 07 de Novembro de 2024

Tribunal Arbitral Singular

Augusto Vieira