Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 651/2024-T
Data da decisão: 2024-11-05  IRS  
Valor do pedido: € 19.800,31
Tema: IRS - residente não habitual; inscrição no registo dos contribuintes; art. 16.º,n.ºs 8, 9 e 10 do CIRS.
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SUMÁRIO:

 

O Tribunal Arbitral é materialmente incompetente para apreciar se o indeferimento do pedido de inscrição no regime dos residentes não habituais merece ou não censura, por ser matéria não contemplada no nº.1 do artigo 2º do RJAT e não foi objeto de vinculação, nos termos do artigo 2º da Portaria nº 112-A/2011 de 22 de março, com as alterações introduzidas pela Portaria n.º 287/2019, de 13 de setembro.

 

DECISÃO ARBITRAL

 

 

  • RELATÓRIO

 

A..., contribuinte fiscal ..., residente na Rua ... nº ...,  ...,  ..., ...-... Braga, área do serviço de finanças de Braga ..., tendo sido notificado da decisão de indeferimento da reclamação graciosa nº ...2023..., dirigida contra a liquidação de IRS 2023..., referente ao exercício de 2022 no valor de € 19 800,31, vem, nos termos e para efeitos do disposto nos artigos 102.º e seguintes do CPPT, e na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, no n.º 1 do artigo 3.º, na alínea a) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 10.º ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, RJAT, apresentar o presente pedido de pronúncia arbitral, com vista à declaração de ilegalidade do ato de indeferimento da reclamação graciosa dirigida contra a liquidação em questão, que em seu entender peca por excesso de quantificação.

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite em 17/05/2024 pelo Exmo. Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Requerida.

O Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro o Senhor Presidente do CAAD informou as Partes da designação do Árbitro Licenciado Arlindo José Francisco, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, que comunicou a respetiva aceitação no prazo aplicável. As partes, notificadas dessa designação, não manifestaram vontade de a recusar.

 

Assim, em conformidade com o preceituado no n.º 8 artigo 11.º do RJAT, decorrido o prazo previsto no seu artigo 11.º n.º 1, sem que as Partes nada viessem dizer, o Tribunal Arbitral ficou constituído em 26 de julho de 2024 tendo a 29 do mesmo mês proferido Despacho, nos termos e efeitos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 17.º do RJAT, para a notificação da Exma Senhora Diretora-Geral da AT, para, no prazo de 30 dias, apresentar resposta, e, querendo, solicitar a produção de prova adicional, bem como, para junção, no mesmo prazo, de cópia integral do processo administrativo.

O Requerente, em síntese, suporta o pedido no facto de, em seu entender, ao rendimento por ele obtido no exercício de 2022 não ter sido aplicado pela AT o regime do residente não habitual, quando o Requerente preenchia todos os pressupostos para que pudesse beneficiar de tal regime ao mesmo tempo que considera que a liquidação carece de fundamentação, pedindo a sua anulação.

Por sua vez a Requerida, também em síntese, começa por apresentar defesa por exceção, considerando o Tribunal incompetente para apreciar o pedido de aplicação ao Requerente do regime jurídico-tributário dos residentes não habituais e por impugnação vem dizer que a liquidação resultou dos elementos declarados, a norma invocada (nº 6 do artigo 81º do CIRS) estava revogada pela Lei 2/2020 de 31 de Março e a norma suscetível de verificação, seria o artigo 72º nº 12 do CIRS, mas em qualquer dos casos seria sempre de comprovar o estatuto de residente não habitual o que não foi feito, devendo o presente pedido improceder, mantendo-se na ordem jurídica o ato de indeferimento da reclamação graciosa bem como a liquidação contra a qual a mesma se dirigia, absolvendo a Requerida da instância.

 

 

II - SANEAMENTO

 

 

O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído, em conformidade com o preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, 6.º, n.º 1 e 11.º, n.º 1, do RJAT (com a redação introduzida pelo artigo 228.º da lei nº 66-B/2012, de 31 de dezembro), tendo o pedido sido tempestivamente apresentado nos termos dos artigos 5.º e 10.º, n.º 1, alínea a), do RJAT.

 

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se devidamente representadas de harmonia com os artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT, e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.

A Requerida apresentou resposta e processo administrativo em 26/09/2024. Tendo apresentada defesa por exceção e impugnação.

O Tribunal, em 27/09/2024, proferiu o seguinte Despacho:

Atendendo a que não foram indicadas testemunhas e tendo em conta os princípios da autonomia do Tribunal Arbitral na condução do processo, da simplificação e da informalidade processuais (artigos 19.º e 29.º, n.º 2, ambos do RJAT), dispensa-se, a reunião prevista no seu artigo 18.º.

Porém como foi suscitada na resposta da Requerida, uma exceção concede-se o prazo de 10 dias ao Requerente, para, querendo pronunciar-se sobre a mesma. Findo este prazo, concede-se o prazo simultâneo de 15 dias para as partes, querendo, produzir alegações escritas.

Notifique-se o Requerente para, até 31 de outubro, proceder ao pagamento da taxa de justiça subsequente, após o que será proferida a decisão, dentro do prazo a que alude o artigo 28º do RJAT”.

Em 10/08/2024 o Requerente respondeu às exceções invocadas pela Requerida pugnando pela sua improcedência, tudo como melhor consta no respetivo requerimento que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

Em 23 e 24 de outubro de 2024 Requerente e Requerida, respetivamente, produziram alegações escritas nas quais, no essencial, deram enfase aos respetivos pontos de vista sobre o litígio, tudo como melhor consta nas respetivas peças processuais que aqui se dão por integralmente reproduzidas para todos os efeitos legais.

O processo não enferma de nulidades, e as exceções invocadas pela Requerida irão ser oportunamente apreciadas.

 

III- FUNDAMENTAÇÃO

 

  1. As questões a dirimir são as seguintes:
  1. Apreciar e decidir sobre as exceções invocadas pela Requerida.
  2. Se em caso de improcedência das exceções suscitadas o ato de indeferimento da reclamação graciosa nº ...2023..., dirigida contra a liquidação de IRS 2023..., referente ao exercício de 2022 no valor de € 19 800,31deverá ser anulado, nos termos requeridos, com a consequente anulação da referida liquidação, ou se, pelo contrário, deverá ser mantido na ordem jurídica o despacho de Indeferimento da reclamação e consequentemente a respetiva liquidação.

 

2 – Matéria de facto

2.1 Factos provados

a) O Requerente foi residente na Suíça desde 06 de Maio de 1991 a 31 de dezembro de 2017, conforme certificado de residência fiscal traduzido e certificado, documento-3.

b) Tornou-se residente em Portugal desde 01-01-2018, conforme documento 4.

c) Em 21-05-2019 o Requerente pediu a sua inscrição como residente não habitual, conforme documento 5, pedido que veio a ser indeferido, por ser residente em território português desde 2018 e ter apresentado a respetiva declaração de rendimentos nessa qualidade, Doc. 6.

d) Desta decisão de indeferimento o Requerente apresentou recurso hierárquico que veio a ser também indeferido, conforme notificação (Doc.7), constando da mesma a possibilidade de impugnação do ato, nos termos do artigo 50º do CPTA, no prazo previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 58º do mesmo Código, a contar da data em que se concretizou a notificação, nos termos do artigo 39º do CPPT.

e) Em 21/06/2023, o Requerente apresentou a declaração de rendimentos respeitante ao exercício de 2022 com o anexo J que incluía rendimentos de categoria H, obtidos na Suíça no montante de € 63 324,31, conforme Doc.16.

f) Em resultado da apresentação da aludida declaração foi o Requerente notificado da demonstração de liquidação de IRS nº 2023..., com o valor a pagar de € 19 800,31, Doc.17.

e) Constatando que a referida liquidação não teve em conta o estatuto de residente não habitual, apresentou reclamação graciosa contra a referida demonstração de liquidação, que veio a ser indeferida, Doc.1, com os fundamentos nele constante e que aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais.

f) Contra tal ato de indeferimento apresentou em 16 de Maio de 2024 o presente pedido de pronúncia arbitral.

 

2.2. Factos não provados

 

Não foi provado que o Requerente tenha intentado a ação contra o ato de indeferimento do recurso hierárquico sobre a sua condição de residente não habitual, nos termos do artigo 50º do CPTA, no prazo previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 58º do mesmo Código, a contar da data em que se concretizou a notificação, nos termos do artigo 39º do CPPT. Para além deste não há outros factos não provados com relevância para a decisão.

 

2.3. Fundamentação da Decisão sobre a Matéria de Facto

 

O Tribunal não tem que se pronunciar sobre todos os detalhes da matéria de facto que foi alegada pelas Partes, cabendo-lhe o dever de selecionar os factos que interessam à decisão e discriminar a matéria que julga provada e declarar a que considera não provada (cfr. artigo123.º, n.º 2, do CPPT, e artigo 607.º, n.º 3, do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são selecionados e conformados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções para o objeto do litígio no direito aplicável (conforme artigo 596.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

 

A convicção do Tribunal Arbitral fundou-se na livre apreciação das posições assumidas pelas Partes, no teor dos documentos juntos aos autos, por elas não contestados.

 

 

3. MATÉRIA DE DIREITO

 

3.1 Da incompetência material do Tribunal arbitral

A Requerida na sua resposta defende-se, em primeira linha, por exceção, invocando a incompetência material do Tribunal.

 Sendo a competência material dos tribunais de ordem pública, deve a mesma ser aferida independentemente de vir a ser suscitada, precedendo o seu conhecimento a qualquer outra matéria, conforme se retira dos artigos 16.º do CPPT e 13.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos – CPTA, ex vi alínea c) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.

A Requerida na sua resposta, embora reconhecendo que o Requerente solicita a anulação da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, dirigida contra o ato demonstrativo da liquidação de IRS nº 2023..., com o valor a pagar de € 19 800,31, referente ao ano de 2022, entende que a causa de pedir que suporta tal pedido, centra-se na sua eventual condição de Residente Não Habitual (RNH), pretendendo que lhe seja reconhecido o direito a ser tributado ao abrigo do RNH, regime especial em sede de IRS, questão que não abarca a apreciação da legalidade de nenhum ato concreto de liquidação de imposto, termos em que considera o Tribunal Arbitral incompetente em razão da matéria para apreciar o pedido de aplicação do regime jurídico-tributário dos RNH.

Em suporte do seu ponto de vista refere jurisprudência de Tribunais constituídos no âmbito do CAAD, do STA e do TC, tudo como melhor consta na sua resposta que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais.

Por sua vez o Requerente na resposta à exceção vem dizer que resulta claro, do teor do pedido de pronúncia arbitral, que o que se impugna é liquidação de IRS n.º 2023..., do ano de 2022, à qual o Requerente imputa o vício de excesso de quantificação da matéria tributável para efeitos de IRS, pela não aplicação das regras de tributação na qualidade de residente não habitual, e de vício de fundamentação. Sendo também claro que o objeto imediato do pedido arbitral é a decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º ...2023... e objeto mediato deste pedido arbitral o ato de liquidação de IRS n.º 2023..., relativo ao ano de 2022. O que está em causa é a legalidade da liquidação que não teve em conta a regulação jurídica aplicável à situação concreta de NRH do Requerente.

Em apoio ao seu ponto de vista cita diversas decisões de Tribunais constituídos no âmbito do CAAD, tudo como melhor consta no seu requerimento de resposta de 8 de Outubro de 2024.

 

Quid juris

Nem todo o contencioso tributário pode ser resolvido no âmbito dos Tribunais Arbitrais do CAAD, estando a sua competência circunscrita e contemplada no artigo 2º nº 1 al. a) e b) do RJAT que aqui transcrevemos:

 

Artigo 2.º

Competência dos tribunais arbitrais e direito aplicável

1 – A competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação das seguintes

pretensões:

a) A declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de

retenção na fonte e de pagamento por conta;

b) A declaração de ilegalidade de atos de fixação da matéria tributável quando não dê

origem à liquidação de qualquer tributo, de atos de determinação da matéria coletável e de

atos de fixação de valores patrimoniais; (…)”

 

Também a Portaria nº 112-A/2011 de 22 de março, com as, com as alterações introduzidas pela Portaria n.º 287/2019, de 13 de setembro, embora na linha do RJAT, vem de uma forma mais específica vincular vários serviços e organismos do Ministério das Finanças e da Administração Pública à jurisdição do CAAD, conforme artigo 2º que aqui também se transcreve:

“Artigo 2.º

Objeto da vinculação

Os serviços e organismos referidos no artigo anterior vinculam-se à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD que tenham por objeto a apreciação das pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida referidas no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com exceção das seguintes:

a) Pretensões relativas à declaração de ilegalidade de atos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário;

b) Pretensões relativas a atos de determinação da matéria coletável e atos de determinação da matéria tributável, ambos por métodos indiretos, incluindo a decisão do procedimento de revisão;

c) Pretensões relativas a direitos aduaneiros sobre a importação e demais impostos indiretos que incidam sobre mercadorias sujeitas a direitos de importação; e

d) Pretensões relativas à classificação pautal, origem e valor aduaneiro das mercadorias e a contingentes pautais, ou cuja resolução dependa de análise laboratorial ou de diligências a efetuar por outro Estado membro no âmbito da cooperação administrativa em matéria aduaneira;

e) Pretensões relativas à declaração de ilegalidade da liquidação de tributos com base na disposição anti -abuso referida no n.º 1 do artigo 63.º do CPPT, que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos do n.º 11 do mesmo artigo”.

 Da leitura destes normativos é patente a exclusão da competência dos Tribunais Arbitrais a apreciar a legalidade de certas relações jurídicas fiscais administrativas, associadas a comportamentos declarativos que se consubstanciam em deveres autónomos do contribuinte perante a AT, dos quais ficam depois dependentes as operações de lançamento e da liquidação de certos impostos. Será o caso da determinação do valor patrimonial tributário e da definição do estatuto de residente não habitual, entre outras, situações que não se confundem com a liquidação, esta sim impugnável.

A jurisprudência invocada pelas partes tiveram aplicabilidade e reconduzem-se aos casos em que foram proferidas que, poderão ter pontos de contacto com a situação em apreço, mas terão outros que diferem, merecendo-nos todo o respeito, mas que seguiremos apenas como orientação e nas situações que considerarmos aplicáveis.

No caso concreto e revisitando a petição e a matéria de facto dada como provada verifica-se que o Requerente tornou-se residente em território nacional a partir de 01 de janeiro de 2018 e, só em 21de maio de 2019, solicitou a sua inscrição como residente não habitual, quando nos termos o nº 10 do artigo 16º do CIRS, então em vigor, lhe era imposto o dever de solicitar a inscrição até 31 de Março de 2019.

Tal pedido de inscrição foi indeferido bem como o respetivo recurso hierárquico não estando demonstrado que o Requerente tenha intentado a impugnação desse ato de indeferimento, nos termos do artigo 50º do CPTA, no prazo previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 58º do mesmo Código, pelo que se consolidou na sua esfera jurídico-tributária a qualidade de residente habitual.

Tendo apresentado, oportunamente, a declaração de rendimentos respeitante ao exercício de 2022 com o anexo J que incluía rendimentos de categoria H, obtidos na Suíça no montante de € 63 324,31, veio a ser notificado da consequente liquidação de IRS 2023..., referente ao mesmo exercício com o valor apagar de € 19 800,31,contra a qual apresentou reclamação graciosa, invocando o excesso de quantificação por não ter sido considerado na tributação o estatuto de residente não habitual.

Para a composição do litígio o Tribunal necessita de apreciar se o Requerente deveria ou não ser considerado residente não habitual no exercício de 2022, se a decisão da AT que não lhe reconheceu tal estatuto merece ou não censura, questões que ficam a montante da liquidação.

Embora a competência dos Tribunais arbitrais possa sindicar atos secundários de impugnação administrativa, o seu conhecimento fica excluído quando se trate de atos de reconhecimento de um benefício fiscal individual, como nos ensina o Senhor Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, no seu comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, Guia da Arbitragem Tributária”, Almedina, 2013, p. 105, que se transcreve: “Mas, mesmo relativamente à impugnação de atos praticados no âmbito de procedimentos tributários, a competência destes tribunais arbitrais restringe-se à atividade conexionada com atos de liquidação de tributos, ficando de fora da sua competência a apreciação da legalidade de atos administrativos de indeferimento total ou parcial ou de revogação de isenções ou outros benefícios fiscais, quando dependentes de reconhecimento da Administração Tributária, bem como de outros atos administrativos relativos a questões tributárias que não comportem a apreciação da legalidade do ato de liquidação, a que se refere a alínea p) do n.º 1 do artigo 97.º do CPPT”.

Nesta perspetiva é patente estarmos em presença de um ato administrativo de reconhecimento de um benefício fiscal a atribuir ao Requerente, no caso concreto o estatuto de residente não habitual que não lhe foi reconhecido pela AT por ter sido apresentado fora do prazo a que aludia o nº 10 do artigo 16º do CIRS.

Para o Tribunal aquilatar se o ato de indeferimento da reclamação graciosa dirigida contra a liquidação de IRS 2023..., está ou não ferido de ilegalidade forçoso seria a apreciação do reconhecimento ou não do estatuto de residente não habitual do Requerente, matéria, como já se viu, está fora das competências dos Tribunais Arbitrais previstas no nº 1 do artigo 2º do RJAT e nem a mesma foi objeto de vinculação, nos termos do artigo 2º da Portaria nº 112-A/2011 de 22 de março, com as alterações introduzidas pela Portaria n.º 287/2019, de 13 de setembro. Com este sentido, em situações semelhantes, têm vindo a ser proferidas decisões de Tribunais do CAAD, designadamente Pº 796/2022-T e 906/2023-T que se acompanham.

Nestas circunstâncias é patente a incompetência material do Tribunal e consubstanciando esta uma exceção dilatória que obsta ao prosseguimento do processo o que, forçosamente, conduz à absolvição da instância quanto ao pedido respetivo, de acordo com o previsto nos artigos 576.º, n.º 2, 577.º, alínea a) e 278.º, n.º 1, alínea a) do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, alínea e) do RJAT, ficando assim prejudicada por inútil o conhecimento de outras exceções ou questões suscitadas pelas Partes.

 

IV. DECISÃO

 

Face ao exposto o Tribunal Arbitral Singular decide:

 

a) Julgar procedente a exceção de incompetência material do Tribunal Arbitral suscitada pela Requerida;

b) Declarar a absolvição da instância quanto ao pedido respetivo, de acordo com o previsto nos artigos 576.º, n.º 2, 577.º, alínea a) e 278.º, n.º 1, alínea a) do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, alínea e) do RJAT;

c) Fixar o valor do processo em € 19 800,31, de acordo com o disposto nos artigos 296.º e 306.º, do Código do Processo Civil (CPC) e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT, aplicáveis por força do artigo 29.º, n.º 1 alíneas a) e e), do RJAT, e 3.º, n.ºs 2 e 3, do RCPAT.

d) Fixar as custas em € 1 224,00, ao abrigo do disposto no artigo 22.º, n.º 4, do RJAT e da Tabela I anexa ao RCPAT, que ficam a cargo do Requerente.

 

Notifique.

Lisboa, 05 de novembro de 2024

 

O Árbitro,

 

Arlindo Francisco