SUMÁRIO:
I – As entidades utilizadoras da rede rodoviária nacional que suportam o encargo tributário da Contribuição de Serviço Rodoviário (CSR) por efeito da repercussão, têm legitimidade processual para impugnar judicialmente os atos de liquidação do imposto que incidam sobre combustíveis que tenham adquirido, como meio de reagirem contra a ilegalidade da repercussão.
II – A prova da repercussão de impostos indiretos suportados pelo operador económico carece de ser demonstrada através de documentos que identifiquem o efetivo pagamento do imposto, comprovando a factualidade invocada.
DECISÃO ARBITRAL
A Árbitra Ana Rita do Livramento Chacim, designada pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar o Tribunal Arbitral Singular, constituído em 7 de maio de 2024, decide no seguinte:
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RELATÓRIO
A..., pessoa coletiva com o número de identificação fiscal
..., com sede ..., ... – ... ... (doravante “Requerente”), nos termos do disposto nos artigos 95.º, n.º 1 e 2 da Lei Geral Tributária (“LGT”), e ao abrigo do artigo 2.º, n.º 1, alínea a) e dos artigos 10.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, adiante abreviadamente designado por “RJAT”), requereu a constituição do Tribunal Arbitral, em que é Requerida a AUTORIDADE TRIBUTARIA E ADUANEIRA (doravante, “Requerida” ou “AT”), peticionando a pronúncia deste Tribunal sobre a legalidade dos atos tributários de liquidação respeitantes à Contribuição de Serviço Rodoviário (“CSR”), no valor de 31.103,09 Euros (trinta e um mil cento e três euros e nove cêntimos), acrescido dos respetivos juros indemnizatórios.
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Do pedido
A Requerente deduziu pedido de pronúncia arbitral peticionando a apreciação da legalidade das liquidações respeitantes à CSR cujo encargo tributário foi repercutido na sua esfera jurídica, na sequência da aquisição de 247.723,36 (duzentos e quarenta e sete mil, setecentos e vinte e três vírgula trinta e seis) litros de gasóleo e, em face da qual suportou 27.497,27 Euros (vinte e sete mil quatrocentos e noventa e sete euros e vinte e sete cêntimos) de CSR e 41.446,22 (quarenta e um mil quatrocentos e quarenta e seis vírgula vinte e dois) litros de gasolina e, em face da qual suportou 3.605,82 Euros (três mil seiscentos e cinco euros e oitenta e dois cêntimos) de CSR àquela entidade, conforme faturas apresentadas.
Concretiza a final o seu pedido, «Nestes termos e nos demais de Direito, deve a presente pronúncia arbitral ser julgada procedente e provada, e em consequência serem anulados os atos tributários melhor identificados no frontispício desta petição com as demais consequências legais, designadamente a restituição do montante indevidamente suportado, no valor de 31.103,09 Euros (trinta e um mil cento e três euros e nove cêntimos), acrescido dos respetivos juros indemnizatórios calculados nos termos do artigo 43.º, n.º 1 e 100.º n.º 1 da LGT.».
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Do requerimento da AT anterior à constituição do Tribunal Arbitral
Em 15.03.2024, a Requerida apresentou Requerimento dirigido ao Senhor Presidente do CAAD, no sentido de: «(…) informar que analisado o pedido, não detetou a identificação de qualquer ato tributário. Identificação que, aliás, também não consta da plataforma do Centro de Arbitragem Tributária. Tendo em conta, que: a) A competência dos tribunais arbitrais, que funcionam no CAAD, abrange exclusivamente a apreciação direta da legalidade de ato(s) de liquidação ou de atos de segundo ou terceiro grau que tenham por objeto a apreciação da legalidade de ato(s) daquele tipo, conforme decorre do n.º 1, do artigo 2.º do RJAT e como se depreende das referências expressas que se fazem na alínea a), do nº 1, do artigo 10.º do RJAT ao n.º 2 do artigo 102.º do CPPT; Conforme dispõe expressamente a alínea b), do nº 2, do artigo 10º do RJAT, do requerimento em que é formulado o pedido de constituição de tribunal arbitral deve constar a identificação do ato ou atos tributários objeto do pedido de pronúncia arbitral; c) Sem a identificação, por parte dos interessados, do ato ou atos tributários, cuja ilegalidade é invocada, não pode o dirigente máximo da AT exercer a faculdade prevista no artigo 13.º do RJAT. Solicita-se que seja(m) identificado(s) o(s) ato(s) de liquidação cuja legalidade o requerente pretende ver sindicada, entendendo-se que o termo inicial do prazo para o exercício da faculdade prevista no artigo 13º do RJAT só ocorre após a notificação, à Autoridade Tributária e Aduaneira, da identificação, em concreto, do(s) ato(s) de liquidação cuja ilegalidade é suscitada.»
Na mesma data, as partes foram notificadas do despacho proferido pelo Senhor Presidente do CAAD no sentido de informar que «Com referência ao Processo em epígrafe e na sequência da comunicação da Autoridade Tributária envie-se a mesma ao Tribunal Arbitral a constituir, por ser esse o órgão competente para a sua apreciação. (…)»
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Tramitação processual
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD, em 26.02.2024, e em conformidade com o preceituado no artigo 11.º, n.º 1, alínea c), do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66B/2012, de 31 de dezembro, tendo sido notificada nessa data a AT.
A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto do artigo 6.º, n.º 1 e do artigo 11.º, n.º 1, alínea b) do RJAT, o Conselho Deontológico, designou a árbitra do Tribunal Singular, aqui signatária, que comunicou a sua aceitação, nos termos legalmente previstos.
Em 15.04.2024, as partes foram devidamente notificadas dessa designação, e não manifestaram vontade de a recusar, nos termos do artigo 11.º n.º 1, alínea a) e b), do RJAT e artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Desta forma, o Tribunal Arbitral Singular foi regularmente constituído em 07.05.2024, com base no disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do RJAT, para apreciar e decidir o objeto do presente litígio, e automaticamente notificada a AT, para querendo se pronunciar, conforme consta da respetiva ata.
Por entender este Tribunal que as questões suscitadas antes da sua constituição deveriam ser apreciadas numa fase posterior do processo (saneamento), foi proferido o despacho previsto no artigo 17.º do RJAT em 08.05.2024 mandando-se notificar a AT para, no prazo de 30 (trinta) dias, apresentar Resposta, juntar cópia do processo administrativo e, querendo, requerer a produção de prova adicional.
Por despacho de 21.06.2024, foi a Requerente notificada para, no prazo de 15 dias, se pronunciar, querendo, sobre a matéria de exceção suscitada pela Requerida na sua resposta.
Em resposta ao despacho de 21.06.2024 deste Tribunal, a Requerente apresentou em 11.07.2024, a sua resposta às exceções invocadas pela AT.
Por despacho de 22.07.2024, a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT foi dispensada, determinando-se que «À luz dos princípios da autonomia que regem o processo arbitral (artigo 29.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária- RJAT) e do princípio da livre condução do processo a que se refere o artigo 19.º do RJAT) dispensa-se a reunião do tribunal arbitral a que se refere o artigo 18.º desse Regime e determina-se o prosseguimento do processo mediante a notificação das partes para, no prazo simultâneo de 15 (quinze) dias, apresentarem alegações finais escritas facultativas.»
As partes apresentaram as respetivas alegações finais: a Requerente no dia 31.07.2024 e a Requerida no dia 17.09.2024.
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POSIÇÃO DAS PARTES
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Pedido da Requerente
A fundamentar o seu pedido de pronúncia arbitral, a Requerente alegou, com vista à declaração de anulação dos atos de liquidação identificados, o seguinte.
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No período compreendido entre julho de 2019 e dezembro de 2022, a Requerente adquiriu, no âmbito da sua atividade, 247.723,36 (duzentos e quarenta e sete mil, setecentos e vinte e três vírgula trinta e seis) litros de gasóleo e 41.446,22 (quarenta e um mil quatrocentos e quarenta e seis vírgula vinte e dois) litros de gasolina à sociedade B..., LDA.
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Por força da repercussão efetuada pela entidade fornecedora identificada ( B..., LDA.), o encargo tributário, a título de CSR, repercutido sobre a Requerente, correspondeu a 31.103,09 Euros (trinta e um mil cento e três euros e nove cêntimos).
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Não se conformando com os atos tributários em questão, a Requerente apresentou a revisão oficiosa, indeferida tacitamente, e a presente pronúncia arbitral.
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Analisada a natureza jurídica da CSR, e como tal, a sua qualificação enquanto contribuição financeira, entende que se verifica a ausência de qualquer contraprestação indireta e presumivelmente destinada aos contribuintes sobre quem recai o encargo da CSR - os repercutidos - que justifique a sua oneração com este tributo.
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Considera assim que a Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, pela qual se institui a CSR, se limita a consignar genericamente a receita decorrente da CSR à INFRAESTRUTURAS DE PORTUGAL, S.A., não estabelecendo qualquer contrapartida indireta ou presumivelmente aproveitada pelos sujeitos passivos da CSR nem tão-pouco evidenciando qualquer objetivo extrafiscal de modelação de comportamentos desses mesmos sujeitos passivos.
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Desta forma, conclui que a CSR, não é uma contribuição financeira, mas um verdadeiro imposto, dado o seu carácter inequivocamente unilateral. Neste sentido, a Requerente
socorre-se do Parecer sobre a Conta Geral do Estado de 2008, elaborado pelo Tribunal de Contas, bem como de decisões arbitrais já proferidas pelo Centro de Arbitragem Administrativa (processos n.º 629/2021-T, 410/2023-T e 293/2023-T), afastando qualquer argumento de incompetência material pelos tribunais arbitrais para apreciação os respetivos atos de liquidação, face ao regime do RJAT e à respetiva Portaria de vinculação.
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Entende igualmente que a legitimidade atribuída ao repercutido justifica-se com o facto de recair sobre si o encargo patrimonial inerente ao pagamento da prestação tributária, circunstância que o torna naturalmente lesado caso o montante liquidado não se mostre legalmente devido. Neste sentido, conclui pela total irrelevância da modalidade de repercussão, havendo apenas que aferir quem de facto suportou o encargo do imposto. Assim, o repercutido será, independentemente da modalidade de repercussão, titular de um interesse legalmente protegido justificativo da atribuição de legitimidade procedimental e processual para discussão da legalidade da dívida tributária.
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Requer ao presente Tribunal Arbitral que, a coberto do princípio do inquisitório plasmado no artigo 99.º da LGT, oficie a B..., LDA., no sentido de vir confirmar se repercutiu o encargo com a CSR, subjacente ao combustível transmitido à Requerente, para a esfera jurídica desta última; requer à Autoridade Tributária que oficie Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos esta entidade a disponibilizar toda a informação relevante de que dispõe – e que não seja já possível consultar online –, a qual inequivocamente atestará ter o encargo tributário em referência sido repercutido na esfera jurídica da Requerente.
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Na ausência de qualquer conexão entre a liquidação e cobrança da CSR e um qualquer objetivo juridicamente atendível, distinto do ISP e sem cariz meramente orçamental, é manifesta a ilegalidade da Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, por preterição do disposto no artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva IEC. Desta forma, prevalecendo o Direito europeu sobre o Direito interno conflituante dos Estados- Membros, tendo em consideração o princípio do primado previsto no artigo 8.º, n.º 4, da CRP, conclui-se pela prevalência do primeiro sobre o segundo, impondo-se a não aplicação da Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto e sendo consequentemente ilegais todas as liquidações de CSR efetuadas ao abrigo deste diploma legal.
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Alega ainda que, ao fazer incidir um imposto sobre um conjunto restrito de contribuintes, a Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, padece de inconstitucionalidade material, por preterição do princípio constitucional da igualdade, previsto no artigo 13.º da CRP, na medida em que onera de forma injustificada um conjunto de contribuintes em face do seu setor de atividade económica, fazendo-os contribuir em maior medida para o financiamento de funções do Estado igualmente aproveitáveis por todos os cidadãos.
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Verificando-se, no presente caso, uma clara violação do direito comunitário no ato de liquidação objeto do presente pedido de revisão, tem a requerente a legitimidade e o direito de requerer a restituição da CSR que lhe foi indevidamente cobrada, por erro imputável aos serviços, no prazo alargado de quatro anos estabelecido no artigo 78.º, n.º 1, da LGT.
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Nestes termos, por ser inconstitucional o seu regime jurídico, são consequentemente ilegais todas as liquidações de CSR, designadamente, as identificadas nos presentes autos, o que implica a sua anulação e consequente restituição dos montantes ilegalmente liquidados e subsequentemente repercutidos na esfera jurídica da Requerente, bem como o pagamento dos respetivos juros indemnizatórios.
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Resposta da Requerida
A Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou tempestivamente a sua Resposta, tendo-se defendido por exceção e por impugnação, alegando, em síntese, o seguinte.
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POR EXCEÇÃO:
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Da incompetência do Tribunal em razão da matéria:
Começa por salientar a necessidade de clarificar a natureza jurídica da CSR para efeitos de inclusão, ou não, no âmbito de vinculação dos serviços e organismos ao CAAD. Entende aqui que se trata de uma contribuição e não de um imposto, pelo que as matérias sobre a CSR
encontram-se excluídas da arbitragem tributária, por ausência de enquadramento legal
(cf. artigos 2.º e 3.º do RJAT e artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
Neste sentido, a Requerida salienta várias decisões proferidas por tribunais a funcionar no CAAD, em particular, a respeitante ao Processo n.º 31/2023-T (referindo ainda, designadamente, os processos n.º 508/2023-T, 520/2023-T e 675/2023-T), na qual se conclui que não é abrangida pela vinculação da AT, a apreciação de litígios que tenham por objeto a apreciação das pretensões relativas à CSR.
Entende, assim que, a CSR não é, por definição, um imposto e, portanto, o CAAD não tem competência material para decidir sobre esta matéria. Desta forma, estamos perante uma exceção dilatória nos termos do vertido nos artigos 576.º, nº 1 e 577.º, al. a) do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ao presente processo por via do artigo 29.º, n.º 1 al. e) do RJAT, a qual prejudica o conhecimento do mérito da causa.
Sem conceder, a AT alega igualmente que a Requerente suscita a legalidade do regime da CSR, pretendendo, em rigor, a não aplicação de um diploma legislativo aprovado por Lei da Assembleia da República, decorrente do exercício da função legislativa. Desta forma, considera que a presente ação, visa suspender a eficácia de atos legislativos, sendo que, conforme decorre do RJAT, a instância arbitral constitui um contencioso de mera anulação. Não sendo da competência do tribunal arbitral nem a fiscalização da legalidade de normas em abstrato, sem enquadramento processual impugnatório de ato concreto de liquidação, nem a execução de sentenças/decisões.
Argumenta ainda a Requerida, salientando várias decisões proferidas por tribunais arbitrais que funcionam no CAAD que, ainda que se considerasse a competência do tribunal arbitral para a apreciação da ilegalidade dos atos de liquidação de ISP/CSR (que a Requerente não consegue identificar), nunca poderia o tribunal arbitral pronunciar-se sobre atos de repercussão da CSR, subsequentes e autónomos dos atos de liquidação de ISP/CSR, e que para mais, não correspondem a uma repercussão legal, mas a uma repercussão meramente económica ou de facto, como, à frente, se desenvolverá.
Pelo que, o presente pedido arbitral extravasa e excede a competência do tribunal arbitral em razão da matéria, o que consubstancia uma exceção dilatória nos termos do vertido nos artigos 576.º, nº 1 e nº 2 e 577.º, al. a) do CPC, aplicável ao presente processo por via do artigo 29.º, n.º 1 al. e) do RJAT, a qual prejudica o conhecimento do mérito da causa.
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Da ilegitimidade processual e substantiva da Requerente
Igualmente sem conceder, a Requerida alega não existir ilegitimidade processual e substantiva da Requerente, entendendo que, no âmbito dos Impostos Especiais Sobre o Consumo vigora um regime particular de acordo com o qual, apenas os sujeitos passivos que tenham procedido à introdução no consumo dos produtos em território nacional e provem o pagamento dos respetivos ISP/CSR possuem legitimidade para solicitar o reembolso do valor pago. De acordo com o estatuído nos artigos 15.º e 16.º do respetivo Código, os múltiplos adquirentes dos produtos não têm legitimidade para efeitos de solicitação da revisão do ato tributário e consequente pedido de reembolso do imposto.
Argumenta que estas disposições legais do Código dos IEC encontram fundamento no regime característico dos impostos especiais sobre o consumo, dado que se tratam de impostos monofásicos, que incidem apenas na fase de declaração para consumo, o que, regra geral, ocorre uma única vez. Sendo diferente do caso dos impostos plurifásicos, como é o caso do IVA, que incidem em todas as fases do circuito económico, através do crédito do imposto a jusante e do débito a montante.
Como tal, no âmbito destes impostos, de acordo com o estatuído nos artigos 15.º e 16.º do CIEC, os múltiplos adquirentes dos produtos não são considerados partes legítimas para efeitos de solicitação da revisão do ato tributário e consequente reembolso do imposto.
Esta situação contém, assim, duas relações jurídicas distintas: a relação jurídica tributária de direito público, pela qual o Estado é credor de uma certa quantia de um sujeito passivo, e a relação jurídica de direito privado, pela qual os adquirentes do combustível, na medida em que entendem ser repercutidos, podem vir a ter o direito de exigir uma certa quantia do sujeito passivo. Conclui a Requerida que não pode a Requerente pedir à AT o reembolso de um tributo que nunca entregou ao Estado.
A repercussão da CSR tem uma natureza meramente económica ou de facto, entendendo que a Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, que instituiu a CSR, não contempla qualquer mecanismo de repercussão legal. Tal como ocorre nos designados impostos especiais sobre o consumo (como o ISP/ISPPE, IABA ou IT) o ónus da CSR é transferível, através do fenómeno financeiro da repercussão económica dos custos (todas as despesas que se repercutem no valor do produto ou serviço: matéria-prima, custos administrativos, impostos, despesas salariais, margem de lucro, etc.) que podem ser tidos em conta na política de definição dos preços de venda. Tendo em conta a política de definição dos preços de venda e as consequências para a sua atividade, designadamente, em termos do aumento de preços para o consumidor final, e que, de acordo com a lei da procura, poderá redundar numa diminuição da quantidade procurada e do lucro obtido.
Recorrendo às respetivas densificações doutrinárias [Jónatas E. M. Machado e Paulo Nogueira da Costa], a Requerida vem distinguir a repercussão progressiva e a repercussão regressiva. Assim, será progressiva quando o encargo tributário é transferido pelo vendedor para o comprado, através da subida de preço e, pelo contrário, regressiva, na circunstância em que os vendedores podem ter interesse em suportar, eles próprios, através da diminuição do preço dos bens, o custo adicional gerado pelo agravamento do imposto. Desta forma, a Requerente deverá provar a alegada repercussão económica no seio da CSR, bem como que a mesma assume natureza progressiva.
Contrariamente ao pretendido pela Requerente, as faturas apresentadas não corporizam atos de repercussão de CSR, nem atestam que tal tributo foi suportado pela Requerente enquanto consumidor final. A Requerente não consegue demonstrar que o valor pago pelos combustíveis que adquiriu às suas fornecedoras, tem incluído o valor da CSR pago pelo sujeito passivo de ISP/CSR, nem que suportou, a final, o encargo de tal tributo, atenta, nomeadamente a existência dos vários intervenientes na cadeia de distribuição/comercialização de combustíveis até chegar ao consumidor final.
De onde decorre a falta de legitimidade da Requerente. Nesse mesmo sentido, já se pronunciaram vários tribunais arbitrais a funcionar no CAAD (nomeadamente as proferidas no âmbito dos Processos n.os 296/2023-T, 332/2023-T, 375/2023-T, 408/2023-T, 438/2023-T, 466/2023-T, 467/2023-T, 490/2023-T, 681/2023-T, 633/2023-T 537/2023-T e 604/2023-T).
Inexistindo efetiva titularidade do direito a que se arroga, carece a Requerente de legitimidade processual, o que consubstancia uma exceção dilatória nos termos dos artigos 576.º, nº 1 e
n.º 2, 577.º, al. e) e 578.º do CPC, aplicáveis ex vi do artigo 29.º, n.º 1 al. e) do RJAT, a qual prejudica o conhecimento do mérito da causa, devendo, consequentemente, a Requerida ser absolvida da instância.
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Ineptidão da petição inicial – Da falta de objeto
Alega ainda a Requerida que se encontra verificada a ineptidão da petição inicial por conter deficiências que comprometem irremediavelmente a sua finalidade, determinando a nulidade de todo o processo e a absolvição da instância, conforme artigos 186.º, n.º 1, 576.º, n.ºs 1 e 2, 577.º alínea b) e 278.º, n.º 1, alínea b), do CPC, aplicáveis ex vi da alínea e), do n.º 1, do artigo 29.º do RJAT.
Entende assim que o presente PPA não respeita os pressupostos legais de aceitação do requerimento/petição inicial, por violação da alínea b) do n.º 2 do artigo 10.º do RJAT, requisito essencial à aceitação do pedido. A identificação do(s) ato(s) tributário(s) objeto do pedido é condição essencial para a aceitação do pedido de constituição do tribunal arbitral. O que não acontece, existindo apenas a identificação de faturas de aquisição de combustíveis aos fornecedores, sem a identificação dos atos tributários. Desta forma, alega a AT que não lhe é possível estabelecer qualquer correspondência entre os atos de liquidação alegadamente praticados pelas suas fornecedoras e as faturas apresentadas pela Requerente.
Tendo sido remetido ao Senhor Presidente do CAAD, um requerimento no qual a AT suscita a não identificação dos atos tributários, salienta que não se verificou qualquer impulso por parte da Requerente, que nada veio oferecer aos autos, notificada que foi do referido requerimento.
Explica ainda que é impossível à AT suprir a falha relativa à identificação dos atos tributários, porquanto se revela impraticável estabelecer qualquer correspondência entre os atos de liquidação praticados em relação aos sujeitos passivos de ISP/CSR e o alegado pela Requerente, bem como os documentos juntos com este aos autos, de onde não constam quaisquer dados que permitam a associação às correspondentes liquidações. Afirma igualmente que tal impossibilidade não é passível de superação através de eventuais atuações processuais, como sejam a recolha, consulta ou análise de elementos ao dispor da AT ou da realização por parte da AT de outras diligências instrutórias.
Argumenta que a Requerente não é sujeito passivo de ISP, nem efetuou qualquer introdução no consumo de produtos petrolíferos. Desta forma, entende que a Requerente alega, mas não concretiza, nem logra provar que efetuou qualquer pagamento a título de CSR. Efetivamente, apenas os sujeitos da liquidação, isto é, apenas os sujeitos passivos que declararam os produtos para consumo e efetuaram o pagamento das imposições correspondentes, podem solicitar a revisão das liquidações/reembolso da CSR e do ISP junto da alfândega competente.
Alega ainda a AT que os produtos sobre os quais incide CSR são tributados de acordo com a respetiva unidade de tributação, i.e., no caso da gasolina e gasóleo, a unidade de tributação é de 1000 litros tendo em conta a temperatura de referência de 15.º C (cf. artigo 91.º do Código dos IEC). Ou seja, aquando da DIC são consideradas as quantidades de acordo com a temperatura de referência a 15º C. Nas vendas subsequentes desses produtos, não é possível fazer tal conversão sendo consideradas as quantidades em função da temperatura observada no momento o que, obviamente, originará oscilações (regra geral, quantidades superiores, tendo em conta a temperatura média nacional). No limite, os litros vendidos e os correspondentes montantes de CSR que a Requerente alega ter suportado serão, por isso, superiores aos montantes de CSR efetivamente liquidados e cobrados ao sujeito passivo (considerando a temperatura de referência a 15º C). Pelo que, o valor efetivamente cobrado pela AT poderá ser inferior ao montante que a Requerente pretende ver devolvido, de onde resulta imprescindível que a Requerente faça prova dos valores efetivamente pagos por si a título de CSR, como alega, demonstrando de que forma calculou o apuramento daqueles montantes, sendo que, os documentos juntos com o PPA não contêm uma descrição de valores faturados a título de CSR.
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Ineptidão da petição inicial – Da ininteligibilidade do pedido e contradição entre este e sua causa de pedir
Alega ainda a Requerida que a Requerente formulou um pedido de pronúncia sobre a legalidade de liquidações, sendo certo que não identifica qualquer ato através da mera impugnação das alegadas repercussões, bem como o nexo entre as repercussões e as liquidações da CSR.
Entende a Requerida que não se pode inferir, da alegada ilegalidade das liquidações, a ilegalidade das alegadas repercussões. Indica, para o efeito, o decidido no Processo
n.º 364/2023-T, em que foi Árbitro Presidente o Senhor Doutor Professor Fernando Araújo, com uma factualidade semelhante à que tratamos nos presentes autos, no qual o Tribunal considerou existir uma margem de ininteligibilidade na indicação no pedido, não sendo possível discernir se o objeto do pedido seriam as liquidações, ou, se seriam, por outro lado, as repercussões. Ainda na mesma decisão, o tribunal detetou uma contradição entre o pedido – anulação das liquidações e do indeferimento tácito da revisão dessas liquidações – e a causa de pedir - a repercussão de um tributo inválido por desconformidade desse tributo com o Direito da UE.
Considera assim que, ainda que a exceção dilatória de ineptidão da petição inicial seja de conhecimento oficioso, nos termos do artigo 196º do CPC (aplicável ex vi da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT), a Requerida vem invocar a mesma por uma dupla razão: a
não-identificação do ato ou atos tributários objeto do pedido de pronúncia arbitral, o que compromete irremediavelmente, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 10.º, a finalidade da petição inicial, e a contradição entre o pedido e a causa de pedir, levando à nulidade de todo o processo nos termos conjugados do n.º 1 do artigo 186.º e da alínea b) do artigo 577.º, ambos do CPC.
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Da caducidade do direito de ação
Alega ainda a caducidade do direito de ação, e consequente exceção dilatória nos termos e para o efeito do disposto nos artigos 89.º n.º1, 2 e 4 al. k) do CPTA, considerando que a falta de identificação dos atos de liquidação em discussão impede a aferição da tempestividade do pedido de revisão oficiosa da liquidação e de reembolso por alegado pagamento de valores a título de alegada repercussão económica da CSR, e, consequentemente, da tempestividade do pedido arbitral formulado pela Requerente.
Com referência às aquisições ocorridas no período compreendido entre julho de 2019 e 31 de dezembro de 2022, e não tendo sido apresentada reclamação graciosa, a Requerente apresenta em 24.07.2023, um pedido de revisão oficiosa, fundamentado em erro imputável ao serviço (cf. 2ª parte do n.º 1 do artigo 78.º da LGT), de modo a fazer-se valer do prazo de 4 (quatro) anos aí previsto. O que, entende a AT, seria sempre infundado, dado que a Requerida, adstrita que se encontra ao princípio da legalidade, sempre efetuou as liquidações em estrita observância dos normativos legais em vigor à data dos factos.
Donde, deverá o pedido de revisão oficiosa apresentado pela Requerente ser considerado extemporâneo (por desrespeito do prazo de 120 dias aplicável), o que terá como consequência a consideração do presente pedido arbitral como intempestivo. De igual modo, afasta a aplicação do prazo de três anos previsto no artigo 78.º, n.º 4 da LGT (situação de injustiça grave e notória).
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POR IMPUGNAÇÃO
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Defendendo-se igualmente por impugnação, alega a Requerida que o conjunto de faturas apresentadas são idóneas, provando cabalmente a aquisição de gasóleo rodoviário e gasolina, no período compreendido entre julho de 2019 e dezembro de 2022. Contudo, nada é referido nas faturas acerca da CSR, nem quanto à sua repercussão na esfera da Requerente, não comportando estas qualquer elemento que espelhe o pagamento da CSR.
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Quanto ao montante alegadamente suportado a título de CSR, num total de 31.103,09 euros, cumpre impugná-lo, porquanto nenhuma palavra é dita pela Requerente quanto à fórmula de cálculo que terá utilizado para redundar num valor específico.
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não tendo existido certificação da medição da temperatura na descarga do combustível adquirido (temperatura ambiente), conforme oportunamente explicado.
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Para efeitos de prova de pagamento da CSR, não é prova suficiente justificar a ocorrência de uma efetiva repercussão desse tributo, através de juízos presuntivos.
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Por último, e no que respeita ao pagamento de juros indemnizatórios, defende a AT que sendo seguida a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo (Acórdãos de 28/01/2015, no Processo n.º 0722/14, de 11/12/2019, no Processo n.º 058/19.9BALSB, de 20/05/2020, no Processo n.º 05/19.8BALSB, de 26/05/2022, no Proc. n.º 159/21.3BALSB), entende-se que os juros indemnizatórios só serão devidos depois de decorrido um ano após a apresentação do pedido de revisão oficiosa, e não desde a data do pagamento do imposto. Nestes termos, dado que no caso concreto o pedido de revisão oficiosa foi apresentado em 24.07.2023, só haveria lugar ao pagamento de juros indemnizatórios um ano após a apresentação daquele pedido, face ao estabelecido na alínea c), do n.º 3, do artigo 43.º da LGT.
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Face a todo o exposto, conclui que o Tribunal Arbitral deverá decidir no sentido da improcedência do pedido de anulação do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa, bem como da anulação parcial da(s) liquidação(ões) de ISP/CSR, não havendo, consequentemente, lugar ao reembolso da CSR alegadamente repercutida, nem ao pagamento de juros indemnizatórios.
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A posição da Requerente sobre as Exceções
A Requerente veio pronunciar-se quanto à matéria de exceção suscitada pela Requerida, entendendo fundamentalmente que:
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A respeito da competência do Tribunal, entende que a CSR já foi qualificada como um imposto, não sendo a designação “contribuição de serviço rodoviário” que qualifica este tributo como contribuição financeira, mas sim a sua substância. Recorrendo a diferentes decisões prolatadas por tribunais a funcionar no CAAD, entende, assim, que o presente Tribunal Arbitral é competente para apreciar o presente litígio.
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Clarifica que pretende a declaração da ilegalidade dos atos identificados, com base na desconformidade do regime jurídico da CSR com o Direito da União Europeia (Diretiva n.º 2008/118/CE), bem como na inconstitucionalidade do regime da CSR, para o que considera competente o tribunal arbitral. Clarifica ainda que, o que a Requerente pede ao tribunal arbitral é a apreciação da legalidade dos atos de liquidação de CSR, cujo encargo tributário suportou por repercussão, e não a apreciação da legalidade dos atos de repercussão.
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Reitera que é parte legítima, explicitando que a legitimidade ativa dos repercutidos é reconhecida pelo artigo 18.º, n.º 4, alínea a) da LGT, ao dispor que, embora não sejam sujeitos passivos, os repercutidos legais mantêm o direito de reclamação, recurso, impugnação ou de pedido de pronúncia arbitral. Esta legitimidade é ainda confirmada pelos artigos 54.º, n.º 2, 65.º e 95.º da LGT e pelos n.ºs 1 e 4 do artigo 9.º do CPPT. Todos aplicáveis ao processo arbitral por força do artigo 29.º do RJAT. Em qualquer situação de repercussão, legal ou económica, verifica-se uma diminuição do património pessoal do repercutido, que suporta o encargo tributário ainda que sem participar no procedimento de liquidação. Desta forma, o repercutido sempre será o titular de um interesse legalmente protegido e por isso terá legitimidade para reagir contra atos tributários que o lesem, nos termos dos artigos 20.º e 268.º da CRP, dos artigos 9.º, 65.º e 95.º da LGT, do artigo 9.º do CPPT e do artigo 29.º do RJAT.
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No que respeita à prova da repercussão, a Requerente salienta que trouxe aos presentes autos todas as faturas de que dispunha, tendo solicitado no PPA que a B..., LDA. fosse oficiada para confirmar a repercussão.
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Com respeito à alegada ineptidão da petição inicial, a Requerente salienta que é titular de um interesse legalmente protegido, enquanto repercutida que efetivamente suportou o encargo tributário, não sendo responsável pela liquidação do tributo. Desta forma, se não lhe foram emitidos os atos de liquidação, como pode ela especificar esses atos? Nesta linha, a Requerente identificou todos os elementos de que dispunha por referência aos atos tributários de CSR cuja ilegalidade requer, pelo que não ser penalizada com a exigência de uma prova documental especifica cujo acesso lhe é impossível. Por não ser possível, nem exigível, à Requerente a identificação dos atos de liquidação, também não o será a demonstração de um nexo de causalidade entre as liquidações impugnadas e a repercussão do encargo através das faturas de compra.
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Por último, e a respeito da caducidade do direito de ação, a Requerente reitera o seu entendimento de que deverá considerar-se como tempestiva, quer o pedido arbitral, quer o pedido de revisão oficiosa apresentado previamente. Alega que é aqui aplicável o prazo de quatro anos para apresentação de pedido de revisão oficiosa, reafirmando que o conceito de “erro imputável aos serviços” abrange também um erro de direito, aqui se incluindo a aplicação de normas de direito interno desconformes ao direito da UE. Manifesta que os prazos foram devidamente cumpridos, com respeito, respetivamente, ao pedido de revisão oficiosa e ao presente pedido arbitral. Por cautela, a Requerente invocou ainda o prazo de três anos para o pedido de revisão oficiosa previsto no n.º 4 do artigo 78.º da LGT, pois sempre se verificaria uma situação de injustiça grave e notória.
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Afasta ainda o regime constante dos artigos 15.º a 20.º referente ao pedido de reembolso.
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ALEGAÇÕES FINAIS
As Partes pronunciaram-se no prazo concedido para a apresentação das alegações finais escritas, reiterando os entendimentos apresentados.
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SANEAMENTO
O Tribunal foi regularmente constituído e as Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, estando ambas regularmente representadas, de harmonia com os artigos 4.º e 10.º, n.º 2, ambos do RJAT.
Tendo em consideração a matéria de exceção suscitada pela Requerida (da incompetência do Tribunal em razão da matéria, da ilegitimidade processual e substantiva da Requerente, da caducidade do direito de ação, da ineptidão da petição inicial por falta de objeto, da ininteligibilidade do pedido e contradição entre este e sua causa de pedir), importa apreciar, preliminarmente, estas matérias para efeitos de saneamento do processo, começando pela da incompetência do Tribunal Arbitral, que é de conhecimento prioritário (artigo 13.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aplicável aos processos arbitrais tributários por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT). Neste âmbito, vide análise das mesmas no ponto 5 desta decisão.
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MATÉRIA DE FACTO
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Factos provados
Para a decisão da causa submetida à apreciação do Tribunal, cumpre atender aos seguintes factos que se julgam provados:
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A Requerente é uma pessoa coletiva de direito público que prossegue atividades de interesse geral, em cumprimento do respetivo quadro constitucional e legal, exercendo as suas atribuições e competências tendo em vista a promoção e salvaguarda dos interesses próprios da respetiva população, não sendo um operador económico detentor do estatuto IEC de destinatário registado, concedido ao abrigo e nos termos do regime previsto no Código dos IEC - facto não controvertido;
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Entre julho de 2019 e dezembro de 2022, a Requerente adquiriu à empresa fornecedora de combustíveis identificada nos autos – B..., LDA., sem que tal fosse controvertido, o total de 247.723,36 litros de gasóleo e 41.446,22 litros de gasolina - cfr. cópia das faturas anexas ao PPA como documentos n.º 1 a 4, PA – RO-2 a 12, incluindo a descrição de operações realizadas com cartão “...”);
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A 24 de julho de 2023 deu entrada um pedido de revisão oficiosa com vista à anulação dos atos de liquidação respeitantes à CSR, e dos consequentes atos de repercussão, no valor global de € 31 103,09 (trinta e um mil, cento e três euros e nove cêntimos) – cf. cópia do pedido entregue na Alfândega de Viana do Castelo anexo ao PPA como documentos n.º 5, PA – RO-1;
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A AT não emitiu decisão quanto ao pedido de revisão oficiosa no prazo legalmente cominado para o efeito – facto não controvertido;
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O pedido de pronúncia arbitral foi efetuado no dia 22.02.2024 e aceite em 26.02.2024.
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Factos não provados
O Tribunal Arbitral considera como não provados os seguintes factos:
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A empresa fornecedora de combustíveis da Requerente tenha pago o imposto apurado nos atos de liquidação CSR praticados pela Autoridade Tributária e Aduaneira com base nas e-DICs por aquela submetidas.
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Com a aquisição do referido combustível, a Requerente suportou a título de CSR, a quantia global de € 31 103,09 (trinta e um mil, cento e três euros e nove cêntimos).
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Motivação da decisão da matéria de facto
O Tribunal não tem de se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe apenas selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada e com relevância para a decisão – cf. n.º 2, do art.º 123.º do CPPT e n.º 3 do art.º 607.º do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicável ex vi al. a) e e) do n.º 1, do art. 29.º do RJAT.
A convicção do Tribunal quanto à matéria de facto dada como provada, para além do reconhecimento de factos não controvertidos pelas partes, resultou da análise crítica dos documentos juntos aos autos com o pedido de pronúncia arbitral, da resposta da Requerida e dos demais documentos juntos e constantes do processo, como indicado em relação a cada facto julgado provado.
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MATÉRIA DE DIREITO
A Requerida na Resposta invoca várias exceções e, a proceder alguma, obstará ao conhecimento do pedido e que, por isso, são de decisão prévia.
Considerando o disposto no artigo 13.º do CPTA, subsidiariamente aplicável, por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT há que iniciar por determinar a competência do presente Tribunal Arbitral, sendo que o seu conhecimento precede o de qualquer outra matéria.
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Exceção da incompetência relativa do tribunal arbitral em razão da matéria
Estando em causa o âmbito de competência dos Tribunais arbitrais do CAAD previsto no artigo 2.º do RJAT, o qual abrange (al. a) do seu n.º 1) a “declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta;” e no proémio do artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, no qual se estabelece tal vinculação às “pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida”, tem sido objeto de discussão se as pretensões referentes a “contribuições” podem ser objeto de apreciação pelos tribunais arbitrais que funcionem no CAAD.
Suscita assim a Requerida a incompetência do Tribunal fundamentando com a respetiva vinculação à apreciação de impostos, aqui não se incluindo tributos de outra natureza como as contribuições, manifestando a Requerente a sua integral discordância, nos termos já descritos.
Salienta este Tribunal que a presente questão foi várias vezes objeto de análise e pronúncia por tribunais arbitrais que funcionam no CAAD. A este respeito, considera este Tribunal a decisão prolatada nos processos n.º 409/2023-T, 1048/2023-T, 977/2023-T, nos quais foi signatária a presente Árbitro, e onde se pôde concluir pela competência dos Tribunais arbitrais do CAAD.
Pode ler-se na decisão prolatada no processos n.º 409/2023-T (CAAD) que: «Como se escreveu no Sumário da decisão do processo n.º 629/2021-T, “Uma parcela de um imposto especial de consumo não deixa de ser um imposto especial de consumo por o legislador lhe atribuir uma narrativa (de resto oscilante entre a compensação de custos e a contrapartida de benefícios) e lhe providenciar uma consignação orgânica (mormente se a entidade que dela beneficia deixa de ter como função única providenciar a suposta contrapartida que justificaria a alteração de género).”
Nessa decisão, os argumentos usados para caracterizar a CSR como imposto foram essencialmente os seguintes (negritos no original, *notas suprimidas):
- histórico:
“A Lei n.º 55/2007, de 31 de Agosto (“Regula o financiamento da rede rodoviária nacional a cargo da EP - Estradas de Portugal, E. P. E.”) criou a CSR por desdobramento do ISP – que é, indiscutivelmente, um imposto especial de consumo*. Como se escrevia no artigo 7.º dessa lei, sob a epígrafe “Fixação das taxas do ISP”,
“As taxas do ISP são estabelecidas por portaria conjunta nos termos do Código dos Impostos Especiais de Consumo, por forma a garantir a neutralidade fiscal e o não agravamento do preço de venda dos combustíveis em consequência da criação da contribuição de serviço rodoviário.”
(…)
a única diferença entre os € 525,1 milhões que o ISP perdeu e os € 525,1 milhões que a CSR ganhou em 2008 residiu na alteração da sua designação e na sua afectação. Enquanto imposto especial de consumo louvava-se na cobertura de um custo: os custos ambientais que o preço dos combustíveis não internalizavam (uma externalidade). A partir do momento em que uma parte – arbitrária – da receita gerada pelo ISP passou a ter a designação de CSR, passou (parece – mas contra o já referido pelo legislador*) a louvar-se no benefício proporcionado aos causadores do custo.”.
- conceptual:
“Procurando identificar os critérios de distinção das taxas, das contribuições financeiras*, das contribuições especiais e dos impostos, a A. [Suzana Tavares da Silva, As Taxas e a Coerência do Sistema Tributário, 2.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2013] recorre, para a delimitação dos contornos das contribuições financeiras, aos critérios desenvolvidos pelo Tribunal Constitucional Alemão:
“1) incidir sobre um grupo homogéneo; 2) manter uma proximidade com a obrigação tributária e as suas finalidades; 3) corresponder a uma relação encargo/benefício capaz de demonstrar que as receitas geradas são fruídas pelos membros do grupo” (p. 91).”
(…)
“a CSR apresenta diferenças muito significativas em relação ao comum das contribuições financeiras, sejam elas contribuições para a segurança social, quotas para associações públicas, “taxas” de regulação ou as “grandes contribuições” que foram surgindo a título transitório e se vão mantendo (Contribuição sobre o Sector Bancário, Contribuição Extraordinária sobre o Sector Energético - CESE, Contribuição Extraordinária sobre a Indústria Farmacêutica, …).
Em primeiro lugar, nessas contribuições para a segurança social, quotas para associações públicas, “taxas de regulação” e “contribuições”, o sujeito passivo é o contribuinte (na CESE há mesmo uma proibição da sua repercussão), enquanto que na CSR um e outro são diferentes: o sujeito passivo (quem tem de entregar o imposto ao Fisco) é o introdutor dos produtos no mercado e o contribuinte (quem tem de suportar a exacção fiscal) é o adquirente dos combustíveis (incluindo, como a já citada jurisprudência arbitral evidencia, adquirentes de combustíveis que nada têm a ver com a utilização das estradas a cargo da Infraestruturas de Portugal).
Em segundo lugar, o nexo grupal – que faria das contribuições financeiras uma espécie de taxas colectivas – não se estabelece com os sujeitos passivos da CSR, mas sim com terceiros não participantes na relação tributária. (…)
Em terceiro lugar, enquanto nas contribuições para a segurança social, quotas para associações públicas, “taxas de regulação” e “contribuições” é a pertença ao grupo que permite de imediato a identificação do devedor – sendo a indução de um custo ou a obtenção de um benefício presumida a partir dessa inclusão nele – na CSR não há nenhum grupo prévio a que se possa imputar o pagamento: é porque se paga a CSR que se supõe que se integra o grupo. (…)
Em quarto lugar, o princípio da equivalência – a que se recorre para conferir unidade de sentido às contribuições financeiras*, equiparando-se o pagamento feito à repartição, tendencialmente idêntica (ou, pelo menos, com base em características dadas e estáveis), dos custos especificamente gerados pelo grupo homogéneo (ou dos benefícios auferidos pelo grupo homogéneo, como nas “taxas” das autoridades reguladoras, ou, forçando mais ou menos a nota, nas tais “grandes contribuições”) – assume na CSR uma ligação a um índice variável: o do consumo dos “grandes combustíveis rodoviários”*. Com a agravante de o presumido benefício não ter uma relação directa com esse índice variável: por um lado, as vias da Rede Rodoviária Nacional (que foram concessionadas, em 2007, à EP - Estradas de Portugal, E.P.E.) não são a totalidade das estradas nacionais (além das auto-estradas concessionadas, e da rede municipal – urbana e rural –, o Plano Rodoviário Nacional prevê a transferência para as autarquias das estradas que não estejam nele incluídas). Noutras palavras: a utilidade proporcionada pela circulação nas estradas a cargo da Infraestruturas de Portugal não é segmentável da que é proporcionada pelas demais; por outro lado, uma fracção crescente dos utilizadores dessa sub-parcela das vias de circulação automóvel – a rede rodoviária nacional – não fica sujeita a essa “contribuição”: o dos utilizadores dela com veículos eléctricos ou velocípedes. (…)
Em quinto lugar, e não obstante – como já referido – não ser bom critério determinar a natureza de um tributo a partir da sua consignação material ou orgânica*, certo é que a EP - Estradas de Portugal, E.P.E. só gastava o dinheiro em estradas (e no mais necessário a poder fazê-lo, incluindo as suas despesas correntes), mas, com a fusão, em 2015, com a Rede Ferroviária Nacional - REFER E.P.E. para dar origem à Infraestruturas de Portugal, isso deixou de ser assim.”
E, em termos de índices da natureza da CSR[1],
- doutrinal:
“- na recolha de Casalta Nabais Estudos sobre a Tributação dos Transportes e do Petróleo, Almedina, Coimbra, 2019, pp. 42-43, refere-se, a propósito da CSR (e de outras figuras aí referidas), “estarmos perante tributos que, atenta a sua estrutura unilateral, se configuram como efectivos impostos, muito embora dada a titularidade activa das correspondentes relações tributárias (e o destino da sua receita), tenham clara natureza parafiscal.”. Como o A. escreve em Direito Fiscal, 11.ª ed, Almedina, Coimbra, 2021, pp. 53-54, “o critério para a distinção entre os tipos de tributos [reporta-se] exclusivamente à estrutura da relação tributária, ao tipo de relação que se estabelece entre os respetivos sujeito ativo e passivo, e não à titularidade activa dessa relação (…) É, pois, a estrutura bilateral da relação jurídica, em que assentam tanto as taxas como as contribuições financeiras, que revela a natureza comutativa destes tributos, os quais, porque concretizam uma efectiva troca de utilidades económicas, têm por base […] uma legitimidade económica. / O que vale também relativamente à titularidade da receita dos tributos. De facto, esta titularidade, até porque está para além da relação tributária integrando [-se …] numa relação financeira a constituir-se a jusante da relação tributária, nada pode dizer sobre o tipo de tributo.” (destaques aditados).”
(…).»
Recorrendo ainda ao elemento jurisprudencial:
“apenas DUAS das 19 decisões do CAAD que a Requerente invoca (na sua Resposta às excepções) para afirmar que tais tribunais arbitrais têm aceite a sua jurisdição sobre a CSR o poderiam substanciar (as dos processos n.os 483/2014-T e 147/2015-T8, que autonomizaram o seu tratamento), sendo as demais resultantes da consideração indiferenciada da CSR com o imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos (ISP)*.
O mesmo se diga para a jurisprudência dos Tribunais superiores, ainda que estes não tenham de cuidar da delimitação da sua competência em função da natureza do tributo, e se não conheçam decisões suas sobre a CSR.
Também não é indiferente que o Tribunal de Contas, a pp. 90 do seu Parecer sobre a Conta Geral do Estado de 2008 (https://erario.tcontas.pt/pt/actos/parecer-cge/2008/pcge2008-v1.pdf ), tenha considerado o seguinte:
“Face ao conteúdo normativo das disposições legais aplicáveis aos vários aspectos de que se reveste a problemática da contribuição de serviço rodoviário e tendo em conta os artigos 103.º, 105.º e 106.º da Constituição, a Lei de enquadramento orçamental e a legislação fiscal aplicável, o Tribunal de Contas considera que a contribuição de serviço rodoviário tem as características de um verdadeiro imposto ou, pelo menos, que dada a sua natureza não pode deixar de ser tratada como imposto pelo que, sendo considerada como receita do Estado, não pode deixar de estar inscrita no Orçamento do Estado, única forma de o Governo obter autorização anual para a sua cobrança.””
Conclui o Tribunal, com o qual se concorda, que «Evidentemente, sendo a CSR um imposto, a questão da competência do presente Tribunal deixa de ser controvertida, e fica prejudicada a indagação de saber se as questões relativas às contribuições se incluem no âmbito da jurisdição dos Tribunais arbitrais do CAAD – e, ou, no da vinculação da AT à sua jurisdição.»
Neste mesmo sentido, remete-se ainda para a decisão prolatada no Processo n.º 534/2023-T, quando recorda que «(…) no processo arbitral que motivou o pedido de reenvio prejudicial ao Tribunal de Justiça (Processo n.º 564/2020-T, de 30-03-2022), o Tribunal qualificou a CSR como um imposto, formulando as questões prejudiciais com base nesse pressuposto.
6.46. Afigura-se que na decisão em que culminou esse pedido de reenvio (o Despacho do Tribunal de Justiça de 07-02-2022 Vapo Atlantic, processo C-460/21), o Tribunal de Justiça, para além de não colocar em causa essa qualificação, assume, para efeitos do artigo 1 da Diretiva 2008/118, um conceito funcional ou autónomo de imposto indireto. Tal conceito abrange quaisquer “imposições” indiretas que, pelas suas caraterísticas estruturais e teleológicas, não tenham um “motivo específico” na aceção da diretiva e possam, por conseguinte, privar o imposto especial de consumo harmonizado (no caso português, o ISP) de “todo o efeito útil”.
6.47. Dito de outro modo, para o Tribunal de Justiça, o tributo instituído pela lei portuguesa – e que este designou por “contribuição” – constitui um imposto porquanto, em virtude do desenho escolhido pelo legislador português, representa uma imposição indireta sem motivo específico e como tal suceptível de frustrar os desideratos de harmonização positiva subjacentes à Diretiva 2008/118.
No sentido do que acima se entende, concluindo-se pela competência do Tribunal,
concorda-se com a posição assumida nas decisões prolatadas nos processos n.º 534/2023-T, na qual se remete para o igual sentido da posição assumida nos processos n.º 113/2023-T e 410/2023-T.
Em face do que se expõe, improcede a alegada exceção da incompetência relativa do Tribunal Arbitral em razão da matéria suscitada pela Requerida.
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Exceção da incompetência absoluta do tribunal arbitral em razão da matéria
A Requerida alega igualmente que a Requerente suscita a legalidade do regime da CSR, pretendendo, em rigor, a não aplicação de um diploma legislativo aprovado por Lei da Assembleia da República, decorrente do exercício da função legislativa. Desta forma, considera que a presente ação visa suspender a eficácia de atos legislativos, sendo que, conforme decorre do RJAT, a instância arbitral constitui um contencioso de mera anulação. Não sendo assim da competência do tribunal arbitral nem a fiscalização da legalidade de normas em abstrato, sem enquadramento processual impugnatório de ato concreto de liquidação, nem a execução de sentenças/decisões.
Desta forma, salienta a Requerida que, ainda que se considerasse a competência do tribunal arbitral para a apreciação da ilegalidade dos atos de liquidação de ISP/CSR (que a Requerente não consegue identificar), nunca poderia o tribunal arbitral pronunciar-se sobre atos de repercussão da CSR, subsequentes e autónomos dos atos de liquidação de ISP/CSR, e que para mais, não correspondem a uma repercussão legal, mas a uma repercussão meramente económica ou de facto.
Manifestando a Requerente a sua integral discordância, clarifica que, o que é pedido ao tribunal arbitral é a apreciação da legalidade dos atos de liquidação de CSR, cujo encargo tributário suportou por repercussão, e não a apreciação da legalidade dos atos de repercussão.
A este respeito, subscreve este Tribunal o entendimento vertido nas decisões prolatadas no Processo n.º 534/2023-T e Processo n.º 410/2023-T CAAD, transcrevendo-se o disposto neste último quando refere que: «(…) continuando a adoptar a posição assumida no âmbito do Processo nº 113/2023-T, de 13-07-2023, refira-se, desde já, que entende este Tribunal Arbitral que improcede também esta excepção da incompetência absoluta do Tribunal Arbitral em razão da matéria para apreciar o mérito do pedido arbitral, porquanto a arguição da excepção pela Requerida assenta num evidente equívoco.
Com efeito, as Requerentes formularam um pedido de pronúncia arbitral (na sequência da formação da presunção de indeferimento tácito dos pedidos de revisão oficiosa apresentados (em 31 de Janeiro de 2023, junto da Alfândega do Jardim do Tabaco e da Alfândega de Setúbal), relativos à declaração de ilegalidade dos actos de liquidação de CSR praticados pela Requerida (com base nas Declarações de Introdução no Consumo («DIC») submetidas pelas fornecedoras de combustíveis) e, bem assim, relativos aos consequentes actos de repercussão da referida CSR consubstanciados nas faturas referentes à gasolina e ao gasóleo rodoviário adquiridos, pelas Requerentes, àquelas entidade fornecedoras, no período compreendido entre 2019 e 2022, tendo invocando como causa de pedir, a desconformidade do regime da CSR com o previsto na Diretiva 2008/118, do Conselho, de 16 de Dezembro de 2008, não tendo sido suscitada a inconstitucionalidade de qualquer das normas do respectivo regime jurídico.» [nosso sublinhado]
A referida situação acompanha a estrutura factual subjacente ao presente PPA, tendo por objeto a impugnação de CSR cobrada em faturas emitidas entre julho de 2019 e dezembro 2022, tendo sido invocada na causa de pedir a situação de desconformidade com a Diretiva 2008/118/CE do Conselho, de 16 de dezembro de 2008 («Diretiva 2008/118/CE»).
Recorrendo ainda à fundamentação presente na decisão prolatada no Processo n.º 534/2023-T: «Mas ainda que o tivessem feito, importa assinalar que a Constituição admite o controlo difuso de constitucionalidade pelos tribunais (artigo 204.º) e prevê o recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que recusem a aplicação de norma com fundamento na sua inconstitucionalidade ou apliquem norma cuja constitucionalidade haja sido suscitada durante o processo (artigo 280.º, n.º 1).
A desaplicação de normas pelos tribunais, por iniciativa oficiosa ou por iniciativa das partes, corresponde a uma forma de fiscalização concreta de constitucionalidade para que os tribunais têm competência própria, não se confundindo com a competência do Tribunal Constitucional, que intervém em sede de recurso de constitucionalidade ou no âmbito da fiscalização abstracta da constitucionalidade (artigo 281.º da CRP).
Por outro lado, o referido artigo 204.° da Constituição, ao admitir o controlo difuso da constitucionalidade, refere-se genericamente aos tribunais, não distinguindo entre Tribunais Estaduais e Tribunais Arbitrais, e o artigo 280.°, ao definir o âmbito da fiscalização concreta de constitucionalidade, admite o recurso de constitucionalidade relativamente a decisões dos tribunais, referindo-se a decisões de quaisquer tribunais.
E, como o Tribunal Constitucional tem também vindo a afirmar, os Tribunais Arbitrais (necessários ou voluntários) são também tribunais, dispondo do poder-dever de verificar a conformidade constitucional de normas aplicáveis no decurso de um processo arbitral e de recusar a aplicação das que considerem inconstitucionais.[5]
Como facilmente se compreenderá, ainda que tivesse sido suscitada, no pedido de pronúncia arbitral, a inconstitucionalidade de qualquer das normas do regime da CSR, nada obstava a que o Tribunal Arbitral se pronunciasse sobre a questão de constitucionalidade no âmbito do controlo difuso a que se refere o artigo 204° da Constituição.
No caso, estando em causa a desconformidade do regime da CSR com a o regime previsto na Diretiva 2008/118, do Conselho, de 16 de Dezembro de 2008, não pode deixar de concluir-se, do mesmo modo, pela competência contenciosa do Tribunal Arbitral para a apreciação do litígio.
Com efeito, as normas de direito europeu derivado, como normas de direito internacional convencional, vigoram diretamente na ordem jurídica interna com a mesma relevância das normas de direito interno, vinculando imediatamente o Estado e os cidadãos (artigo 8.º da Constituição).
A impugnação judicial de um acto de liquidação pode ser deduzida com fundamento em qualquer ilegalidade (artigo 99.º do CPPT), nada permitindo distinguir entre a ilegalidade resultante de normas de direito interno ou de direito internacional convencional.
Torna-se assim claro que não existe qualquer obstáculo a que o Tribunal Arbitral se pronuncie sobre o fundamento de ilegalidade dos actos de liquidação baseado em desconformidade do regime da CSR com o previsto na Diretiva Europeia acima referida, sendo, nestes termos, considerada improcedente a alegada excepção de incompetência absoluta do Tribunal Arbitral em razão da matéria.
Em face do que acima se expõe, entende este Tribunal que improcede a alegada exceção da incompetência absoluta do Tribunal Arbitral em razão da matéria suscitada pela Requerida. No sentido do que se entende, refere-se a posição assumida na decisão prolatada no processo
n.º 113/2023-T.
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Legitimidade processual e substantiva da Requerente
Considera a Requerida que apenas os sujeitos passivos que tenham procedido à introdução no consumo dos produtos em território nacional e provem o pagamento dos respetivos ISP/CSR, possuem legitimidade para solicitar o reembolso do valor pago. Conclui a Requerida que não pode a Requerente pedir à AT o reembolso de um tributo que nunca entregou ao Estado. A repercussão da CSR tem uma natureza meramente económica ou de facto, entendendo que a Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, que instituiu a CSR, não contempla qualquer mecanismo de repercussão legal. Tal como ocorre nos designados impostos especiais sobre o consumo (como o ISP/ISPPE, IABA ou IT) o ónus da CSR é transferível, através do fenómeno financeiro da repercussão económica dos custos.
Opondo-se ao referido entendimento, a Requerente conclui que improcede igualmente esta exceção.
Sendo esta uma questão já igualmente discutida por diversos Tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, salientando-se aqui as decisões prolatadas nos processos n.º 113/2023-T,
676/2023-T, 24/2023-T, e n.ºs 1048/2023-T, 977/2023-T, estes dois últimos nos quais foi signatária a presente Árbitro, entende este Tribunal que a legitimidade processual ativa da Requerente, aqui Repercutida, compreende a análise conjugada do disposto nos artigos 18.º,
n.º 4, alínea a), 2.ª parte da Lei Geral Tributária (LGT) «Não é sujeito passivo quem: a) suporte o encargo do imposto por repercussão legal, sem prejuízo do direito de reclamação, recurso, impugnação ou de pedido de pronúncia arbitral nos termos das leis tributárias;» em articulação com o artigo 54.º, n.º 2 da LGT segundo o qual, «As garantias dos contribuintes previstas no presente capítulo aplicam-se também à autoliquidação, retenção na fonte ou repercussão legal a terceiros da dívida tributária, na parte não incompatível com a natureza destas figuras.» Neste mesmo sentido, o artigo 9.º, n.º 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), vem consagrar uma abrangência alargada no que concerne à determinação de legitimidade no procedimento tributário, definindo que, «Têm legitimidade no procedimento tributário, além da administração tributária, os contribuintes, incluindo substitutos e responsáveis, outros obrigados tributários, as partes dos contratos fiscais e quaisquer outras pessoas que provem interesse legalmente protegido». Neste sentido, refere-se ainda o disposto no artigo 65.º da LGT que, sob a epígrafe “Contribuintes e outros interessados”, vem estabelecer que «Têm legitimidade no procedimento os sujeitos passivos da relação tributária e quaisquer pessoas que provem interesse legalmente protegido.»
A este respeito, e como bem se refere na decisão prolatada no processo n.º 676/2023-T, «Embora não seja o sujeito passivo da relação tributária subjacente à repercussão, as Requerentes, enquanto entidades repercutidas, podem impugnar os próprios atos de liquidação do imposto, através de qualquer daqueles meios procedimentais ou processuais, como modo de reagir contra a ilegalidade da repercussão. Para além da legitimidade ativa das Requerentes, se encontrar coberta pela referida norma do artigo 18.º, n.º 4, alínea a), da LGT, essa legitimidade é também reconhecida pela regra geral do artigo 9.º, n.º 1, do CPPT, segundo a qual “têm legitimidade no procedimento tributário, além da administração tributária, os contribuintes, incluindo substitutos e responsáveis, outros obrigados tributários, as partes dos contratos fiscais e quaisquer outras pessoas que provem interesse legalmente protegido”.
Alega ainda a Autoridade Tributária que, face ao regime especial dos artigos 15.º e 16.º do CIEC, apenas os sujeitos passivos que tenham procedido à introdução no consumo dos produtos em território nacional e provem o pagamento do ISP e da CSR possuem legitimidade para solicitar o reembolso do valor pago, e, como tal, os adquirentes dos produtos não têm legitimidade para efeitos de solicitação da revisão do ato tributário e consequente pedido de reembolso do imposto.
Há que fazer notar, a este propósito, que o artigo 5.º, n.º 1, da Lei n.º 55/2007, que cria a Contribuição de Serviço Rodoviário, apenas remete para o CIEC o procedimento de liquidação e cobrança do imposto, remissão que igualmente é efetuada para a LGT e o CPPT, significando que, nesse âmbito, haverá de ter-se em consideração as disposições conjugadas do CIEC e da demais legislação tributária aplicável.
Por outro lado, o regime específico previsto nos artigos 15.º e seguintes do CIEC abrange o reembolso com fundamento em erro na liquidação ou em caso de expedição ou exportação, ao passo que o que está em causa no presente processo arbitral não é um qualquer pedido de reembolso, mas a declaração de ilegalidade dos atos tributários de repercussão do imposto por violação do direito europeu.
E, nesses termos, a questão da legitimidade ativa terá de ser analisada à luz das regras processuais aplicáveis, e não do regime específico do reembolso do imposto que consta das citadas disposições do CIEC. [nosso sublinhado]
Concluiu então o Douto Tribunal que «A alegada exceção de ilegitimidade ativa, tal como se encontra formulada, é improcedente e nada obsta ao prosseguimento do processo no tocante aos falados atos de liquidação como meio de obter a consequente anulação dos atos de repercussão.»
Entende igualmente este Tribunal que aquele que suporta o ónus financeiro do tributo (CSR) terá sempre “interesse legítimo” em contestar o impacto (decréscimo) patrimonial ilegal em que incorre enquanto repercutido do mesmo.
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Ineptidão da petição inicial Ineptidão da petição inicial – Da falta de objeto, ininteligibilidade e contradição entre este a sua causa de pedir
A Requerida alega ainda que se encontra verificada a ineptidão da petição inicial, por não identificar os atos tributários objeto do pedido e, desta forma, não respeitar os pressupostos legais de aceitação do requerimento/petição inicial, por violação da alínea b) do n.º 2 do artigo 10.º do RJAT. Entende a mesma que, existe apenas a identificação de faturas de aquisição de combustíveis aos fornecedores, sem a identificação dos atos tributários. Desta forma, alega que não lhe é possível estabelecer qualquer correspondência entre os atos de liquidação alegadamente praticados pelas suas fornecedoras e as faturas apresentadas pela Requerente. Argumenta ainda que, a Requerente não é sujeito passivo de ISP, nem efetuou qualquer introdução no consumo de produtos petrolíferos. Desta forma, entende que a Requerente alega, mas não concretiza, nem logra provar que efetuou qualquer pagamento a título de CSR.
Efetivamente, apenas os sujeitos da liquidação, isto é, apenas os sujeitos passivos que declararam os produtos para consumo e efetuaram o pagamento das imposições correspondentes, podem solicitar a revisão das liquidações/reembolso da CSR e do ISP junto da alfândega competente.
A presente exceção dilatória é invocada pela Requerida por uma dupla razão. Desde logo, por não ser possível discernir se o objeto do pedido seriam as liquidações, ou, se seriam, as repercussões, suscitando ainda um sentido de contradição entre o pedido – anulação das liquidações e do indeferimento tácito da revisão dessas liquidações – e a causa de pedir - a repercussão de um tributo inválido por desconformidade desse tributo com o Direito da UE.
Para efeitos de análise pelo presente Tribunal, considera-se o entendimento exposto na decisão prolatada no Processo n.º 534/2023-T, segundo o qual, «O artigo 98º, nº 1, alínea a), do CPPT, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29º, nº 1, alínea c), do RJAT, indica como uma das nulidades insanáveis em processo judicial tributário, a ineptidão da petição inicial. Não indicando o CPPT as situações em que se deve entender que ocorre ineptidão da petição inicial, há que fazer apelo ao CPC, que é de aplicação subsidiária, nos termos do artigo 2º, alínea e), daquele Código, e também o é no âmbito do processo arbitral tributário, por força do disposto no artigo 29º, nº 1, alínea e), do RJAT.
No artigo 186.º, n.º 2, do Código do Processo Civil (CPC), «Diz-se inepta a petição: a) Quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir; b) Quando o pedido esteja em contradição com a causa de pedir; c) Quando se cumulem causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis.»
O nº 3 do mesmo artigo estabelece que “se o réu contestar, apesar de arguir a ineptidão com fundamento na alínea a) do número anterior, a arguição não é julgada procedente quando, ouvido o autor, se verificar que o réu interpretou convenientemente a petição inicial”.
Neste sentido, como se salienta da decisão prolatada no Processo n.º 790/2023-T, «A ineptidão da petição inicial, gerando a nulidade do processo, ocorre quando se verifiquem alguns dos vícios mencionados no artigo 186.º, n.º 2, do CPC, ou seja, quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir, quando o pedido esteja em contradição com a causa de pedir ou se cumulem causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis. Para se considerar inepta a petição, no primeiro caso, não basta uma qualquer deficiência da petição, tornando-se necessária a absoluta falta de indicação do pedido ou a sua formulação em termos insanavelmente obscuros ou contraditórios de modo a não permitir determinar, em face do articulado, qual é o pedido ou a causa de pedir (cfr. Manuel Andrade, Lições Elementares de Processo Civil, Coimbra, 1976, pág. 177).»
Ora, no caso em apreço, resulta claro ao Tribunal que se pretende a declaração da ilegalidade das liquidações respeitantes à CSR praticadas pela Requerida com base nas DIC submetidas pela respetiva fornecedora de combustíveis, com consequente (declaração de) ilegalidade da liquidação da CSR consubstanciada nas faturas de aquisição de gasóleo e gasolina pela Requerente. Sendo estas referentes aos meses entre dezembro de 2019 e dezembro de 2022, perfazendo o valor global de €31.103,09 a título de CSR, e respetivos juros indemnizatórios e, bem assim, da decisão de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa apresentado contra aqueles atos tributários.
Com respeito à exigência de identificação da liquidação, entende este Tribunal que tal exigência não poderá ser aqui imposta, na medida em que o repercutido nunca teria a possibilidade de as identificar, considerando os termos legalmente definidos pelo próprio regime jurídico que aprova a CSR.
Reside aqui em causa a legalidade da cobrança de CSR, a qual, por imposição do referido regime legal, teria que se encontrar ínsita nas faturas de aquisição de combustível. Considerar que a respetiva apreciação de legalidade se encontra dependente da identificação das respetivas liquidações não respeitaria o princípio constitucional da proporcionalidade e o direito à tutela judicial efetiva garantido pelos artigos 20.º e 268.º, n.º 4, da CRP, pois inviabilizaria a possibilidade prática de as Requerentes impugnarem contenciosamente atos que lhe aplicam tributação e lesam as suas esferas jurídicas.
Neste sentido, refere-se o entendimento exposto na decisão prolatada no processo
n.º 676/2023-T. «Como se depreende do transcrito artigo 18.º, n.º 4, alínea a) da LGT, o preceito recusa a qualidade de sujeito passivo a quem não estiver sujeito diretamente a uma obrigação fiscal, como é o caso do consumidor final de bens ou serviços, mas admite que da repercussão do imposto possa resultar a violação de um interesse legalmente protegido, e, nesse sentido, confere ao repercutido o direito à impugnação administrativa ou judicial como meio adequado de reação contra a repercussão ilegal do imposto, o que se justifica, no plano de política legislativa, por razões de similitude com a lesão que seja causada por um ato ilegal de liquidação (cfr. António Lima Guerreiro, Lei Geral Tributária Anotada, Lisboa, 2001, págs. 116-117). [nosso sublinhado]
Nada obsta, por conseguinte, que as Requerentes possam deduzir um pedido de pronúncia arbitral contra os atos tributários de liquidação da CSR, e, por outro lado, esses atos encontram-se identificados e documentados pelo único meio possível qual seja a emissão de faturas emitidas pelo fornecedor do combustível que consubstancia a repercussão do encargo tributário na esfera jurídica dos adquirentes. [nosso sublinhado]
Resta referir que, não sendo as Requerentes os sujeitos passivos do imposto, nem os diretos responsáveis pela sua liquidação, mas apenas as entidades que suportam o encargo por efeito da repercussão, não lhes compete o ónus de identificação e de comprovação dos atos de liquidação repercutidos, nem a prova da conexão entre os atos de liquidação e as faturas de compra que revelam a repercussão do imposto. [nosso sublinhado]
Sendo certo que o contribuinte se encontra na impossibilidade de obter elementos de informação que estão na posse de uma terceira entidade, por não ser ele também o sujeito passivo do imposto. [nosso sublinhado]
Não se verifica, por conseguinte, a ineptidão da petição por falta ou ininteligibilidade da indicação do pedido ou da causa de pedir, nem por alguma das outras causas enunciadas no artigo 186.º do CPC.
A questão de saber se houve uma efetiva repercussão do encargo tributário na esfera jurídica da adquirente, aqui Requerente, ou se existe correlação entre os atos de liquidação da CSR e as faturas de aquisição de combustível, apenas poderá relevar no âmbito da apreciação da matéria para efeito do julgamento de procedência do pedido.
Pelo que acima se expõe, entende este Tribunal que improcede igualmente a exceção de ineptidão da petição inicial.
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Caducidade do direito de ação
A respeito da alegada caducidade do direito de ação defendida pela Requerida, considerando que a falta de identificação dos atos de liquidação impede a aferição da tempestividade do pedido de revisão oficiosa formulado pela Requerente, entendendo que a mesma não poderia invocar o prazo de 4 anos previsto na 2ª parte do artigo 78.º, n.º 1, da LGT, e consequentemente da tempestividade do pedido arbitral, refere este Tribunal o entendimento exposto na decisão prolatada no processo n.º 676/2023-T. «Deve começar por dizer-se - como se afirma, entre outros, nos acórdãos do STA de 14 de Março de 2012 (Processo n.º 01007/11) e de 8 de Março de 2017 (Processo n.º 01019/14) – que a revisão oficiosa do acto tributário pode ser efetuada a pedido do contribuinte no prazo de quatro anos contados da liquidação (ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago) quando houver erro imputável aos serviços, devendo entender-se como tal o erro material, o erro de facto ou o erro de direito, independentemente da demonstração da culpa dos funcionários envolvidos na emissão da liquidação.
É o que resulta do disposto no artigo 78.º, n.º 7, da LGT, pelo qual a revisão oficiosa, nos termos previstos no n.º 1 desse artigo, pode ser desencadeada pelo sujeito passivo mediante requerimento dirigido ao órgão competente da Administração Tributária e com base nos mesmos pressupostos legais: no prazo de quatro anos e com fundamento em erro imputável aos serviços. O que se tem entendido como uma decorrência do princípio da justiça e da verdade material (cfr., neste sentido, Joaquim Freitas da Rocha, Lições de Procedimento Tributário, 5.ª edição, Coimbra, págs. 227-228). (…)
Conforme é também jurisprudencialmente aceite, existindo um erro de direito numa liquidação efetuada pelos serviços da administração tributária, e não decorrendo essa errada aplicação da lei de qualquer informação ou declaração do contribuinte, o erro em questão é imputável aos serviços, em resultado da obrigação genérica de a administração tributária atuar em plena conformidade com a lei.
Por outro lado, como é evidente, a existência do erro que constitui fundamento do pedido de revisão não pode ser aferida a partir da posição jurídica que tenha sido assumida pela Autoridade Tributária na apreciação do pedido de revisão, mas com base nos vícios de ilegalidade que tenham sido arguidos pelo sujeito passivo na formulação do pedido. Sendo que o processo arbitral foi deduzido precisamente para discutir a validade do entendimento adotado pela Administração na decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa.
Nestes termos, tendo sido invocado um erro imputável aos serviços e verificando-se que o pedido de revisão oficiosa deu entrada em 24 de julho de 2023, tendo por objeto a impugnação de CSR cobrada em faturas emitidas entre julho de 2019 e dezembro 2022, no momento da apresentação do pedido, considerando a regra de contagem do prazo do artigo 279.º, alínea b), do Código Civil, não tinha ainda decorrido o prazo de quatro anos após a liquidação a que se refere o artigo 78.º, n.º 1, da LGT.
Não tendo havido decisão do pedido de revisão oficiosa até 22.02.2024, data em que a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral (aceite em 26.02.2024), dentro do prazo de 90 dias após o termo do prazo legalmente cominado para a decisão sobre o pedido de revisão oficiosa, o pedido arbitral é igualmente tempestivo.
Não se verifica, por conseguinte, a pretendida caducidade do direito de ação.
Não foram suscitadas quaisquer outras exceções de que cumpra conhecer nem se verificam nulidades.
Cumpre analisar.
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Sobre a anulação dos atos tributários referentes às liquidações de CSR e o imposto alegadamente suportado pelo contribuinte por repercussão fiscal:
A análise da matéria em discussão já foi várias vezes objeto de análise e pronúncia por tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, no qual se incluem decisões proferidas pela Árbitro aqui signatária.
Considerado o respetivo enquadramento legal, refere-se que a CSR foi instituída pela Lei
n.º 55/2007, de 31 de agosto, constituindo «a contrapartida pela utilização da rede rodoviária nacional, tal como esta é verificada pelo consumo dos combustíveis»., sendo desta forma, «fonte de financiamento da rede rodoviária nacional a cargo da [Infraestruturas de Portugal, S.A.] – anteriormente, Estradas de Portugal, E.P.E. - , no que respeita à respetiva conceção, projeto, construção, conservação, exploração, requalificação e alargamento»[2].
Nos termos do respetivo diploma, a CSR começou por incidir sobre a gasolina e o gasóleo rodoviário sujeitos a ISP e dele não isentos (cf. artigo 4.º, n.º 1, da Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, na redação inicial), tendo, por via da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, sido alargado ao combustível GPL auto. A contribuição incide assim sobre a gasolina e o gasóleo rodoviário sujeitos ao imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos e dele não isentos e é devida pelos sujeitos passivos do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos, sendo aplicável à sua liquidação, cobrança e pagamento o disposto no Código dos Impostos Especiais de Consumo (artigo 5.º, n.º 1).
Define igualmente o regime jurídico que o financiamento da rede rodoviária nacional a cargo da Infraestruturas de Portugal, S.A. é assegurado pelos respetivos utilizadores e, subsidiariamente, pelo Estado, nos termos da lei e do contrato de concessão aplicável (cf. artigo 2.º).
Tendo sido chamado a pronunciar-se, concluiu o TJUE[3] que, «(…) embora a afetação predeterminada do produto da CSR ao financiamento, pela concessionária da rede rodoviária nacional, das competências gerais que lhe são atribuídas possa constituir um elemento a tomar em consideração para identificar a existência de um motivo específico, na aceção do artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva 2008/118, essa afetação não pode, enquanto tal, constituir um requisito suficiente». [nosso sublinhado]
Desta forma, «[para se considerar que prossegue um motivo específico, na aceção desta disposição, a CSR deveria destinar-se, por si só, a assegurar os objetivos de redução da sinistralidade e de sustentabilidade ambiental que foram atribuídos à concessionária da rede rodoviária nacional. Seria esse o caso, nomeadamente, se o produto deste imposto devesse ser obrigatoriamente utilizado para reduzir os custos sociais e ambientais especificamente associados à utilização dessa rede que é onerada pelo referido imposto. Seria então estabelecida uma relação direta entre a utilização das receitas e a finalidade da imposição em causa (v., neste sentido, Acórdãos de 27 de fevereiro de 2014, Transportes Jordi Besora, C-82/12, EU:C:2014:108, n.0 30, e de 25 de julho de 2018, Messer France, C-103/17, EU:C:2018:587, n.º 38)»[4]. [nosso sublinhado]
Entende ainda o TJUE que «(…) como resulta do n.º 14 do presente despacho, é certo que a Autoridade Tributária sustenta que existe uma relação entre a afetação das receitas geradas pela CSR e o motivo específico que levou à instituição deste imposto, uma vez que o decreto-lei que atribuiu a concessão da rede rodoviária nacional à IP impõe a esta última que trabalhe em prol, por um lado, da redução da sinistralidade nessa rede e, por outro, da sustentabilidade ambiental. No entanto, como foi salientado no n.º15 do presente despacho, resulta da decisão de reenvio que o produto do imposto em causa no processo principal não se destina exclusivamente ao financiamento de operações que supostamente concorrem para a realização dos dois objetivos mencionados no número anterior do mesmo despacho. Com efeito, as receitas provenientes da CSR destinam-se, mais amplamente, a assegurar o financiamento da atividade de conceção, projeto, construção, conservação, exploração, requalificação e alargamento da rede rodoviária nacional»[5] [nosso sublinhado]
Por último, «(…) o pedido de decisão prejudicial não contém nenhum elemento que permita considerar que a CSR, na medida em que incide sobre os utilizadores da rede rodoviária nacional, foi concebida, no que respeita à sua estrutura, de tal modo que dissuade os sujeitos passivos de utilizarem essa rede ou que os incentiva a adotar um tipo de comportamento cujos efeitos seriam menos nocivos para o ambiente e que seria suscetível de reduzir os acidentes»[6].
Em suma, o TJUE concluiu que, «o artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva 2008/118 deve ser interpretado no sentido de que não prossegue “motivos específicos", na aceção desta disposição, um imposto [em concreto, a CSRJ cujas receitas ficam genericamente afetadas a uma empresa pública concessionária da rede rodoviária nacional e cuja estrutura não atesta a intenção de desmotivar o consumo dos principais combustíveis rodoviários»[7].[nosso sublinhado]
Pelo que se expõe, haverá este Tribunal igualmente de concluir pela não compatibilidade do regime jurídico da CSR, criada pela Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, com o disposto no artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva n.º 2008/118.
Na sequência da apreciação das exceções invocadas pela Requerida e do reconhecimento da legitimidade da Requerente, enquanto entidade repercutida, entendendo-se que esta tem um interesse legalmente protegido e o direito de ação, tendo como objetivo a revisão dos respetivos atos de liquidação de CSR, podendo ser ressarcida dos prejuízos decorrentes do alegado pagamento indevido do imposto, caso seja confirmada a sua repercussão do encargo.
Considerada a questão decidenda em análise, e como bem se refere na decisão prolatada no Processo n.º 113/2023-T (igualmente exposto na decisão prolatada no processo n.º 676/2023-T), o Tribunal de Justiça pronunciou-se nos seguintes termos:
«“38. (…) Assim, um Estado-Membro está, em princípio, obrigado a reembolsar os impostos cobrados em violação do direito da União, ao abrigo das regras processuais nacionais aplicáveis e no respeito pelos princípios da equivalência e da efetividade (-).
39. A obrigação de reembolsar os impostos cobrados num Estado-Membro em violação das disposições da União conhece apenas uma exceção. Com efeito, sob pena de conduzir a um enriquecimento sem causa dos titulares do direito, a proteção dos direitos garantidos na matéria pela ordem jurídica da União exclui, em princípio, o reembolso dos impostos, direitos e taxas cobrados em violação do direito da União quando seja provado que o sujeito passivo responsável pelo pagamento desses direitos os repercutiu efetivamente noutras pessoas (-). [nosso sublinhado].
40. Por conseguinte, incumbe às autoridades e aos órgãos jurisdicionais nacionais assegurar o respeito pelo princípio da proibição do enriquecimento sem causa, incluindo quando nada conste a este respeito no direito nacional.
(…)
42. Por conseguinte, um Estado-Membro só se pode opor ao reembolso de um imposto indevidamente cobrado à luz do direito da União quando as autoridades nacionais provarem que o imposto foi suportado na íntegra por uma pessoa diferente do sujeito passivo e quando o reembolso do imposto conduzisse, para este sujeito passivo, a um enriquecimento sem causa. Daqui resulta que, se só tiver sido repercutida uma parte do imposto, as autoridades nacionais só estão obrigadas a reembolsar o montante não repercutido (-). [nosso sublinhado].
43. Constituindo esta exceção ao princípio do reembolso dos impostos incompatíveis com o direito da União uma restrição a um direito subjetivo resultante da ordem jurídica da União, há que interpretá-la de forma restritiva, atendendo nomeadamente ao facto de que a repercussão de um imposto no consumidor não neutraliza necessariamente os efeitos económicos da tributação no sujeito passivo (-).[nosso sublinhado].
Salienta o Tribunal na decisão prolatada no Processo n.º 113/2023-T que, «Como sublinha ainda o TJUE, “a questão da repercussão ou da não repercussão em cada caso de um imposto indireto constitui uma questão de facto que é da competência do órgão jurisdicional nacional, cabendo a este último apreciar livremente os elementos de prova que lhe tenham sido submetidos” (parágrafo 44). [nosso sublinhado].
Na Resposta apresentada, a Requerida conclui que a repercussão da CSR tem uma natureza meramente económica ou de facto, entendendo que a Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, que instituiu a CSR, não contempla qualquer mecanismo de repercussão legal. Tal como ocorre nos designados impostos especiais sobre o consumo (como o ISP/ISPPE, IABA ou IT) o ónus da CSR é transferível, através do fenómeno financeiro da repercussão económica dos custos.
Efetivamente, considerado o disposto no regime jurídico que aprova a CSR, compreende este Tribunal que, as empresas petrolíferas, em regra, repercutem o ISP e, ao tempo, a CSR nos operadores a jusante, incluindo, nos consumidores finais. Enquanto impostos aplicados ao consumo, estes caracterizam-se pelo facto de o seu encargo financeiro ser, em regra, repercutido nos restantes operadores da atividade comercial, maxime, no consumidor final.
Não obstante, atendendo ao próprio entendimento do TJUE, na ausência de um mecanismo formal de repercussão da CSR, a prova da repercussão da contribuição dos preços praticados ao consumidor, só pode partir da análise de factos conhecidos e demonstráveis e que possuam alguma consistência prática.
Desta forma, constituindo a repercussão fiscal da CSR um facto positivo, o ónus da prova impende sobre quem o invoca, por forma a comprovar a qualidade de entidade repercutida e lesada pelo encargo tributário. Salienta-se aqui o entendimento proferido pelo Tribunal na decisão prolatada no Processo n.º 452/2023-T: «A repercussão fiscal consiste na transferência do imposto que legalmente incide sobre um sujeito passivo, para um terceiro, alheio à relação jurídica tributária, com quem aquele tem relações económicas. Nas palavras de alguns autores, o repercutido será um mero "contribuinte de facto" (titular da capacidade contributiva), por contraposição ao "contribuinte de direito", aquele a quem é juridicamente exigível o pagamento do tributo. De acordo com a doutrina pode fazer-se a distinção entre a repercussão obrigatória ou legal, a qual encontra consagração, por exemplo, em sede de I.V.A., por contraposição à repercussão voluntária (…)” – Proc. 0581/17.0BEALM, acórdão STA de 28-10-2020.
Termos em que o reconhecimento da legitimidade de ação do contribuinte consumidor final no imposto indireto – CSR - e o equilíbrio entre o direito material e direito processual, exige a clara e rigorosa demonstração dos elementos essenciais para decisão, em especial, meios de prova detalhados que permitam apurar inequivocamente quem efetivamente suportou o imposto, ou seja, a presença de elementos completos sobre o facto tributário subjacente às liquidações do imposto.»
No que concerne à aqui Requerente, impõe-se o apuramento inequívoco do imposto suportado. O que à semelhança do entendimento que se transcreve, não acontece.
Explica-se ali (decisão prolatada no Processo n.º 452/2023-T) que «A Requerente como elementos de prova apresentou as faturas emitidas pelo SP, as quais especificam três parcelas: o “preço sem IVA”, “descontos” e “valor IVA”, desconhecendo-se as diferentes componentes que permitem aferir se a CSR integra o preço, ou seja, se foi, total ou parcialmente, repercutida na Requerente pelo SP. (…)
Face à sua natureza de imposto objeto de repercussão legal pelo SP, o IVA encontra-se objetiva e claramente discriminado nas faturas. Atento o regime da CRS e a possibilidade ou não de ser repercutida, a mesma não se apresenta discriminada nas faturas emitidas pelo SP.
Acresce que faturas apresentadas pela Requerente ao conterem uma parcela com a designação “desconto”, sem descritivo da respetiva natureza e conteúdo, contribuem para a falta de rigor e criam a dúvida sobre a própria presunção da repercussão da CSR, na falta, ainda, de elementos que permitam esclarecer os termos da referida relação contratual e tratamento comercial e fiscal da CSR, ou seja, sobre a efetiva repercussão fiscal no âmbito desses operações comerciais relativas ao fornecimento de combustíveis pelo SP (C.../D...) à Requerente.
A prova da repercussão deve ser objetivamente demonstrada por documentos que identifiquem o efetivo pagamento do imposto, não podendo assentar em juízos presuntivos ou em meras declarações genéricas (quando apresentadas) que não contenham os necessários requisitos declarativos (neste sentido, a decisão arbitral proferida no Processo n.º 790/2023-T).
Sem prejuízo do que se refere, não pode este Tribunal deixar de salientar a dificuldade de prova positiva da repercussão, estando apenas na posse da Requerente as faturas comprovativas da aquisição de combustível, em que apenas se indica o preço no qual se presume estar incluída a CSR. Situação que decorre dos termos de aplicação do próprio regime jurídico que institui a CSR. Conforme expressa o Tribunal na decisão prolatada no Processo n.º 452/2023-T, «Em face declaração de ilegalidade da CSR pelo TJUE e os subsequentes pedidos de revisão dos atos de liquidação e pedido de reembolso, a Requerida não emitiu orientações para o reembolso da CSR, contrariamente à prática em outros EM na sequência da declaração de ilegalidade de tributos.»
Acresce igualmente referir que a «a administração tributária deve, no procedimento, realizar todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material, não estando subordinada à iniciativa do autor do pedido» (artigo 58.º da LGT), pelo que a mesma tinha o dever de diligenciar no sentido de apurar quais as liquidações que ela própria emitiu e os pagamentos que recebeu relativas ao pagamento de CSR pelos fornecedores de combustíveis, com referência ao período das faturas em causa, confirmando os respetivos pagamentos pela Requerente.
Trata-se de matéria que foi alegada pela Requerente, contestada pela Requerida, em que a primeira pretende provar o pagamento da CSR através das faturas que documentam as aquisições de combustíveis entre julho de 2019 e dezembro de 2022, mediante a presunção da sua repercussão fiscal no preço, e junção de um quadro com a identificação das mesmas e o respetivo montante da CSR, com respeito ao pagamento das faturas constantes da relação que anexou.
Considerando que, importa verdadeiramente averiguar se a prova documental apresentada pela Requerente foi suficiente, entende este Tribunal que não resulta evidente de que tenha havido uma efetiva repercussão do imposto, e qual o efetivo encargo tributário na esfera da Requerente, de modo a poder confirmar-se rigorosamente a factualidade invocada pela Requerente sobre o pagamento da CSR.
Entende-se assim, conforme decisão prolatada no Processo n.º 452/2023-T, que «A prova de um facto positivo – repercussão fiscal da CSR - impende sobre quem a invoca – a
Requerente -, por forma a comprovar a qualidade de entidade repercutida e lesada no âmbito da relação jurídico-tributária da CSR. (…)
Por fim, recorda-se a jurisprudência do TJUE e o teor do Acórdão de 7 de fevereiro de 2022, Proc. C-460/21, ponto 44: "Com efeito, ainda que, na legislação nacional, os impostos indiretos tenham sido concebidos de modo a serem repercutidos no consumidor final e que, habitualmente, no comércio, esses impostos indiretos sejam parcial ou totalmente repercutidos, não se pode afirmar de uma maneira geral que, em todos os casos, o imposto é efetivamente repercutido. A repercussão efetiva, parcial ou total, depende de vários fatores próprios de cada transação comercial e que a diferenciam de outras situações, noutros contextos. Consequentemente, a questão da repercussão ou da não repercussão em cada caso de um imposto indireto constitui uma questão de facto que é da competência do órgão jurisdicional nacional, cabendo a este último apreciar livremente os elementos de prova que lhe tenham sido submetidos – Vd, neste sentido, Acórdãos de 25 de fevereiro de 1988, Les Fils de Jules Bianco e Girard, 331/85, 376/85 e 378/85, EU:C:1988:97, n.º 17, e de 2 de outubro de 2003, Weber’s Wine World e o., C‑147/01, EU:C:2003:533, n.º 96. (decisão prolatada no Processo
n.º 452/2023-T).
Na ausência de prova bastante de que tenha havido lugar à repercussão do imposto, afastando o caracter presuntivo na determinação do encargo na esfera da Requerente, o pedido arbitral mostra-se ser improcedente.
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Do direito reembolso do imposto indevidamente pago e de juros indemnizatórios.
Face à improcedência do pedido principal, fica necessariamente prejudicado o pedido acessório de reembolso do imposto pago e de pagamento de juros indemnizatórios.
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DECISÃO
Nos termos expostos, este Tribunal Arbitral decide:
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Julgar improcedentes as exceções invocadas pela Requerida;
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Julgar improcedente o pedido arbitral, bem como a decisão de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa;
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Julgar prejudicado o conhecimento do pedido de reembolso do imposto pago e de pagamento de juros indemnizatórios.
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Condenar a Requerente no pagamento das custas do processo.
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VALOR DO PROCESSO
A Requerente indicou como valor da causa o montante de € 31.103,09 que não foi contestado pela Requerida e corresponde ao valor da liquidação a que se pretendia obstar, pelo que se fixa nesse montante o valor da causa.
Nos termos do disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT, no artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT e no artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, é fixado ao processo o valor de € 1.836,00 (mil, oitocentos e trinta e seis euros).
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CUSTAS
Nos termos do disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, do RJAT e no artigo 4.º, n.º 4, e na Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, o montante das custas é fixado em € 1.836,00 (mil, oitocentos e trinta e seis euros), cujo pagamento fica a cargo da Requerente.
Notifique-se.
Lisboa, 29 de outubro de 2024
A Árbitra do Tribunal Arbitral
Ana Rita Chacim
[1] Escreveu-se então:
“Ainda que a qualificação jurídica de um tributo como imposto ou não-imposto tenha de depender das suas características intrínsecas (…), não são indiferentes os índices que – sendo externos a essa qualificação – foram invocados pela Requerente e pela Requerida. Assim, para começar, a jurisprudência do CAAD (e dos tribunais estaduais que a examinaram) não é indiferente”.
[2] Cfr. artigo 3.º, n.º 1 e 2, da Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, na sua redação atual.
[5] Despacho do TJUE de 7 de fevereiro de 2022, proferido no caso Vapo Atlantic, Proc. C-460-21, n.º 31 e 32, disponível em: Vapo Atlantic (europa.eu)
[6] Despacho do TJUE de 7 de fevereiro de 2022, proferido no caso Vapo Atlantic, Proc. C-460-21, n.º 34.
[7] Despacho do TJUE de 7 de fevereiro de 2022, proferido no caso Vapo Atlantic, Proc. C-460-21, n.º 36.