Processo n.º 770/2014 - T
Requerentes: A.. e B…
Requerida: Autoridade Tributária e Aduaneira
Tema: Tributação de mais-valias por alienação de participações sociais no ano de 2010. Retroactividade da norma tributária.
Acórdão Arbitral
I – Relatório
1. Os contribuintes A… (NIF: …) e … (NIF: …), casados entre si (doravante "Requerentes"), apresentaram, no dia 17 de Novembro de 2014, um pedido de constituição de Tribunal Arbitral Colectivo, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º, 1, a) e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante "RJAT"), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante "AT", ou "Requerida").
2. Os Requerentes vêm pedir a pronúncia arbitral sobre a ilegalidade da liquidação adicional de IRS nº 2014…, de 2 de Julho de 2014, e correspondente liquidação de juros compensatórios nº 2014…, referentes ao ano de 2010 e perfazendo o total de €68.778,55.
3. Os Requerentes pedem o decretamento da anulação dessas liquidações com base em violação do art. 12º, 2 da LGT, e ainda uma indemnização por prestação de garantia indevida.
4. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 17 de Novembro de 2014.
5. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com a redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou os árbitros do Tribunal Arbitral Colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável, e notificou as partes dessa designação.
6. O Tribunal Arbitral Colectivo ficou constituído em 30 de Janeiro de 2015; foi-o regularmente e é materialmente competente, à face do preceituado nos arts. 2.º, n.º 1, alínea a), 5º, 6º, n.º 1, e 11º, n.º 1, do RJAT (com a redacção introduzida pelo art. 228.º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro).
7. Nos termos dos n.os 1 e 2 do art. 17º do RJAT, foi a AT notificada, em 9 de Fevereiro de 2015, para apresentar resposta.
8. A AT apresentou a sua resposta em 6 de Março de 2015, acompanhada da documentação que integra o correspondente Processo Administrativo; e nessa resposta alega, em síntese, a total improcedência do pedido dos Requerentes, pedindo a absolvição de todos os pedidos.
9. O Despacho Arbitral de 13 de Março de 2015 determinou a dispensa da reunião referida no art. 18º do RJAT e das alegações das partes; e fixou a data de 31 de Março de 2015 para a prolação da decisão final.
10. As Partes têm personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade, nos termos dos arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT, e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.
11. As Partes encontram-se devidamente representadas.
12. O processo não enferma de nulidades e não foram suscitadas questões, prévias ou subsequentes, prejudiciais ou de excepção, que obstem à apreciação do mérito da causa, mostrando-se reunidas as condições para ser proferida decisão final.
II – Fundamentação: a matéria de facto
II.A. Factos que se consideram provados
a) No dia 30 de Abril de 2010, os Requerentes alienaram, à C… – Agências Funerárias, S.A., 998 acções representativas de 19,96% do capital social da sociedade Agência Funerária …, S.A., por um preço de €310.000,00, obtendo por esse meio €308.998,00 de mais-valias.
b) Os Requerentes, que detinham essas acções desde 2005, não inseriram qualquer referência a esse rendimento de mais-valias na Declaração de IRS referente ao ano de 2010.
c) Os Requerentes foram notificados da liquidação adicional de IRS nº 2014…, de 2 de Julho de 2014, e da correspondente liquidação de juros compensatório nº 2014…, referentes ao ano de 2010 e perfazendo o total de €68.778,55.
d) Essa liquidação adicional foi resultado de uma acção inspectiva durante a qual foi exercido, pelos Requerentes, o seu Direito de Audição Prévia; e cujos resultados, em Relatório Final, tinham sido notificados aos Requerentes, na pessoa do seu Procurador, em 11 de Junho de 2014.
e) No processo de execução fiscal nº …2014…, que tem por título a referida liquidação adicional de IRS, os Requerentes, para obterem a suspensão da execução enquanto reclamam das liquidações, ofereceram como garantia a constituição de hipoteca voluntária sobre um imóvel; o Serviço de Finanças de …, aceitando como idónea a garantia oferecida, em resposta datada de 30 de Outubro de 2014 notificou os Requerentes para, no prazo de 15 dias, constituírem sobre o referido prédio uma hipoteca voluntária a favor da Fazenda Nacional, no valor de €87.640,93 (calculado pelo somatório: quantia exequenda + juros de mora + custas + acréscimo de 25%).
II.B. Factos que se consideram não provados
a) A prova apresentada é de base documental e foi incorporada no processo.
b) Nenhuma matéria provada nos autos viu a sua autenticidade ou correspondência com os factos serem questionadas.
c) Não se mostra provada a constituição efetiva de qualquer garantia a favor do Estado, conforme artigo 77.º da Resposta da AT.
d) Não há quaisquer outros factos não provados que tenham interesse para a decisão da causa.
III – Fundamentação: a matéria de Direito
III.A. Posição dos Requerentes
a) Os Requerentes alegam nada terem inserido relativamente a rendimentos de mais-valias na Declaração de IRS do ano de 2010 por entenderem que, à data da alienação – 30 de Abril de 2010 –, tal rendimento se encontrava excluído de tributação (já que se tratava de activos detidos desde 2005, ou seja, há mais do que os 12 meses exigidos pelo art. 10º, 2, a) do CIRS).
b) Mais alegam os Requerentes que a entrada em vigor da Lei nº 15/2010, de 26 de Julho, que ocorreu no dia 27 de Julho de 2010, significa que não é abarcado no respectivo regime o anterior período de 2010 – por força do art. 12º, 2 da LGT, que expressamente veda, mesmo para factos tributários de formação sucessiva, qualquer forma de retroactividade ou retrospectividade.
c) Sendo assim, a revogação, pela Lei nº 15/2010, de 26 de Julho, do regime de exclusão de tributação de mais-valias, não teria, segundo os Requerentes (apoiados em doutrina e em jurisprudência jurisdicional e arbitral), o condão de tornar supervenientemente tributável o que não o fora no momento da sua ocorrência, o que o não fora no momento de geração do rendimento que passou, para futuro, a ser tributado: nomeadamente, no caso, as "mais-valias de longo prazo".
d) Por outro lado, os Requerentes fazem derivar o seu pedido de indemnização por prestação de garantia indevida do facto de terem tido que constituir uma hipoteca voluntária com base naquilo que eles consideram ser um erro imputável aos serviços – o que, por aplicação combinada dos n.os 1 e 2 da LGT, tornaria ressarcíveis os prejuízos advindos da prestação de tal garantia (nomeadamente os custos de constituição, manutenção e levantamento), em proporção do vencimento na impugnação da dívida garantida.
III.B. Posição da Requerida
a) Em resposta, a AT sustenta que nenhuma razão assiste aos Requerentes, e que, pelo contrário, a fundamentação das liquidações assenta na correcta interpretação e aplicação do quadro normativo pertinente.
b) A Requerida defende que mais-valias obtidas em 2010, mas anteriormente a 27 de Julho desse ano (data da entrada em vigor da Lei nº 15/2010, de 26 de Julho) concorrem para o saldo a que se reporta o art. 43º do CIRS, e que não pode haver por isso qualquer discriminação de rendimentos dessa categoria, nem qualquer sua tributação "pro rata temporis".
c) Apoiando-se naquilo que alega ter sido a "mens legislatoris", e nalguma doutrina e jurisprudência, a AT sustenta que a tributação das mais-valias em sede de IRS não pode senão enquadrar-se no funcionamento próprio desta tributação do rendimento das pessoas singulares, que é a de incidir, de forma unitária e englobante, sobre saldos anuais de fluxos de riqueza – pelo que o contrato de 30 de Abril de 2010 só verdadeiramente se converteria num facto gerador do imposto em 31 de Dezembro de 2010: após a entrada em vigor da Lei nº 15/2010, de 26 de Julho, sujeito integralmente, pois, ao respectivo regime de tributação das mais-valias (admitindo a AT que, com isso, tenha ocorrido uma retroactividade "fraca" ou "inautêntica", uma "retrospectividade").
d) Qualquer entendimento em contrário, alega a Requerida, desvirtuará não somente a anualidade do IRS, sua característica essencial; como atentará contra a própria forma de cálculo do rendimento a tributar nas diversas categorias, desvirtuando-o ou inviabilizando-o – no caso, impedindo que se espraie pelo período inteiro de um ano a consideração das mais-valias e das menos-valias que concorrerão para o saldo final (forçando uma consideração isolada e singular, não-periódica, que, no final, poderia redundar em prejuízo do próprio contribuinte).
e) Por outro lado, a AT aponta para o facto de a LGT ser um diploma sem valor reforçado, pelo que as suas normas não podem ser invocadas em detrimento de lei superior, posterior ou especial – respondendo assim à invocação, pelos Requerentes, da regra contida no art. 12º, 2 da LGT, que a AT sustenta dever ceder perante as normas do CIRS.
f) Contra o pedido de indemnização por prestação de garantia indevida, a AT contra-argumenta que não vislumbra qualquer "erro dos serviços" que, nos termos do nº 2 do art. 53º da LGT, dispensasse a verificação do prazo de 3 anos estabelecido no nº 1 do mesmo artigo; e que, mais decisivo ainda, a garantia em causa nem sequer foi constituída ainda, mas meramente oferecida, pelo que obviamente nenhum prejuízo pode ter ocorrido entretanto.
IV Do direito
O cerne da questão controvertida consiste em conhecer qual a lei aplicável à transmissão onerosa de ações realizada em 30 de abril de 2010 pelos Requerentes, detidas desde 2005.
Recordando os fundamentos invocados pelas partes, tem-se que na perspetiva dos Requerentes o facto tributário é unicamente constituído pela alienação das ações, esgotando-se nesse momento, consolidando-se na esfera do sujeito passivo o direito à tributação pela lei vigente à data da referida alienação. A aplicação da legislação publicada 3 meses após a data de ocorrência dos factos, a Lei 15/2010, de 26 de Julho, que revoga a anterior, expressa no n.º 2 do artigo 10.º do Código do IRS, encontrar-se-ia ferida de ilegalidade e inconstitucionalidade por violação, respetivamente, dos artigo 12.º da LGT e 103.º da Constituição.
Já a Requerida sustenta que nenhuma razão assiste aos Requerentes, e que, pelo contrário, a fundamentação das liquidações assenta na correta interpretação e aplicação do quadro normativo pertinente.
A Requerida defende ainda que mais-valias obtidas em 2010, mas anteriormente a 27 de Julho desse ano (data da entrada em vigor da Lei nº 15/2010, de 26 de Julho) concorrem para o saldo a que se reporta o art. 43º do CIRS, e que não pode haver por isso qualquer discriminação de rendimentos dessa categoria, nem qualquer sua tributação "pro rata temporis”.
Apoiando-se naquilo que alega ter sido a "mens legislatoris", e nalguma doutrina e jurisprudência, a AT sustenta que a tributação das mais-valias em sede de IRS não pode senão enquadrar-se no funcionamento próprio desta tributação do rendimento das pessoas singulares, que é a de incidir, de forma unitária e englobante, sobre saldos anuais de fluxos de riqueza – pelo que o contrato de 30 de Abril de 2010 só verdadeiramente se converteria num facto gerador do imposto em 31 de Dezembro de 2010: após a entrada em vigor da Lei nº 15/2010, de 26 de Julho, sujeito integralmente, pois, ao respectivo regime de tributação das mais-valias (admitindo a AT que, com isso, tenha ocorrido uma retroactividade "fraca" ou "inautêntica", uma "retrospectividade").
Qualquer entendimento em contrário, alega a Requerida, desvirtuará não somente a anualidade do IRS, sua característica essencial; como atentará contra a própria forma de cálculo do rendimento a tributar nas diversas categorias, desvirtuando-o ou inviabilizando-o – no caso, impedindo que se espraie pelo período inteiro de um ano a consideração das mais-valias e das menos-valias que concorrerão para o saldo final (forçando uma consideração isolada e singular, não-periódica, que, no final, poderia redundar em prejuízo do próprio contribuinte).
Por outro lado, a AT aponta para o facto de a LGT ser um diploma sem valor reforçado, pelo que as suas normas não podem ser invocadas em detrimento de lei superior, posterior ou especial – respondendo assim à invocação, pelos Requerentes, da regra contida no art. 12º, 2 da LGT, que a AT sustenta dever ceder perante as normas do CIRS.
Contra o pedido de indemnização por prestação de garantia indevida, a AT contra-argumenta que não vislumbra qualquer "erro dos serviços" que, nos termos do nº 2 do art. 53º da LGT, dispensasse a verificação do prazo de 3 anos estabelecido no nº 1 do mesmo artigo; e que, mais decisivo ainda, a garantia em causa nem sequer foi constituída ainda, mas meramente oferecida, pelo que obviamente nenhum prejuízo pode ter ocorrido entretanto.
Cumpre decidir.
O artigo 10.º do Código do IRS - na redacção vigente à data da alienação - apresenta o seguinte teor:
“1. Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de:
(…)
b) Alienação onerosa de partes sociais, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, e de outros valores mobiliários (…)
2 - Excluem-se do disposto no número anterior as mais-valias provenientes da alienação de:
a) Acções detidas pelo seu titular durante mais de 12 meses
(…)
3. Os ganhos consideram-se obtidos no momento da prática dos actos previstos no n.º 1, sem prejuízo do disposto nas alíneas seguintes:
(…)
12. A exclusão estabelecida no n.º 2 não abrange as mais-valias provenientes de acções de sociedades cujo activo seja constituído, directa ou indirectamente, em mais de 50%, por bens imóveis ou direitos reais sobre bens imóveis situados em território português”.
Lei n.º 15/2010, de 26/07:
“Artigo 1.º
Alteração ao Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares
Os artigos 10.º, 43.º, 72.º……do Código do IRS, passam a ter a seguinte redação:”
“Artigo 10.º
…
2 – (Revogado)”
Art.º 72.º
“…
4 – O saldo positivo entre as mais-valias e menos-valias, resultante das operações previstas nas alíneas b), e), f) e g) do n.º 1 do artigo 10.º, é tributado à taxa de 20%”.
“Art.º 2.º (da Lei 15/2010)
Revogação de disposições no âmbito do Código do IRS
São revogados os n.ºs 2 e 12 do artigo 10.º do Código do IRS, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro”.
“Art.º 5.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação”.
Donde se conclui que a citada Lei n.º 15/2010 é omissa relativamente a quaisquer regras especiais de aplicação da lei no tempo, muito embora tenha sido abordada esta questão no quadro do debate parlamentar que precedeu a aprovação da mesma.
O artigo 12.º da LGT dispõe que:
“1 - As normas tributárias aplicam-se aos factos posteriores à sua entrada em vigor, não podendo ser criados quaisquer impostos retroactivos.
2 - Se o facto tributário for de formação sucessiva, a lei nova só se aplica ao período decorrido a partir da sua entrada em vigor.
(o sublinhado é nosso)
3 - As normas sobre procedimento e processo tributário são de aplicação imediata, sem prejuízo das garantias, direitos e interesses legítimos anteriormente constituídos dos contribuintes.
4 - Não são abrangidos pelo disposto no número anterior as normas que, embora integradas no processo de determinação da matéria tributável, tenham por função o desenvolvimento das normas de incidência tributária.”
Iniciamos a nossa apreciação pelo momento em que ocorre o facto tributário - Capítulo em que, desde já, nos socorremos do acórdão n.º 85/2010 do Tribunal Constitucional, que versou sobre a não dedutibilidade fiscal - em sede de IRC - de 50% do saldo negativo entre as mais e as menos-valias fiscais apuradas mediante a transmissão onerosa de participações sociais.
Concretamente, a Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, alterou o normativo fiscal vigente, passando a restringir, para metade, a dedutibilidade fiscal do saldo anual negativo decorrente da transmissão onerosa de participações sociais por parte dos sujeitos passivos de IRC.
Termos em que se colocou a questão de saber qual o regime aplicável às partes de capital adquiridas em momento prévio ao da entrada em vigor da referida lei, mas alienadas após essa vigência. Tudo isto, no quadro de um imposto periódico, de formação complexa e sucessiva, cujo facto tributário ocorre no último dia do exercício (conforme o n.º 9 do artigo 8.º do Código do IRC).
Uma factualidade análoga à situação controvertida, pelo que o acórdão do Tribunal Constitucional é merecedor de leitura quando se expressa da forma seguinte:
“No que se refere à problemática da proibição da retroactividade, parece claro que a hipótese de uma qualquer aplicação retroactiva do disposto no artigo 42º, n.º 3, do CIRC, no caso concreto e nos termos proibidos pelo n.º 3 do artigo 103º da Constituição - retroactividade própria ou autêntica, ou seja, aplicação de lei nova a factos anteriores à entrada em vigor da lei nova -, não se pode colocar. Na verdade, por um lado, o facto gerador da obrigação - a alienação - ocorre indubitavelmente na vigência da lei nova. Por outro, não é sustentável afirmar a existência de um facto jurídico-fiscal complexo de formação sucessiva. Na verdade, não basta que se verifique uma aquisição anterior e uma alienação posterior para que se possa afirmar a existência de um único facto, embora complexo. A ser assim, qualquer aquisição que, no futuro, próximo ou longínquo, desse origem a uma alienação seria um facto complexo, não obstante serem distintos o primeiro alienante e o segundo adquirente, não obstante o conteúdo da contratação ser diverso na primeira e na segunda alienação, não obstante ocorrer um lapso de tempo mais ou menos prolongado entre tais operações. A intermediação meramente casual de uma pessoa (no caso, o primeiro adquirente/segundo alienante) não pode ser elemento suficientemente capaz de produzir a união de factos que são juridicamente distintos, quer do ponto de vista dos intervenientes, quer, acima de tudo, do ponto de vista da sua substância”..
(os sublinhados são nossos)
Idêntico entendimento - quanto ao momento da produção do facto tributário - já constava do acórdão de 20 de Maio de 2009 do STA (processo n.º 0204/09).
Este aresto versou sobre a restrição da dedutibilidade das menos-valias obtidas (em 2003) na alienação de partes de capital adquiridas em exercício anterior. Um caso inteiramente coincidente com a matéria de facto sobre a qual se pronunciou, no ano seguinte, o Tribunal Constitucional no seu acórdão n.º 85/2010.
Diz-nos o STA que “não estamos perante um facto tributário complexo. Facto tributário aqui relevante é sim a venda. (…) A retroactividade pressupunha que se estivesse perante um facto complexo de formação sucessiva, o que não tem sustentação na hipótese dos autos”.
(os sublinhados são nossos)
À primeira vista, poder-se-ia entender que a jurisprudência do Tribunal Constitucional não tem aderência ao caso controvertido. Afinal, tratar-se-ia apenas de relevar o óbvio: a inexistência de um nexo de causalidade entre os momentos de aquisição e transmissão de partes de capital.
Quando o que está em causa nos autos não é aplicabilidade da lei vigente à data de aquisição das partes de capital. Mas antes a aplicabilidade da lei antiga ou da lei nova no próprio exercício em que ocorre a alienação.
Julgamos, todavia, que o raciocínio tem o seu acento tónico na fixação do momento em que ocorre o facto gerador: a transmissão onerosa das partes de capital. Sendo neste momento, definido pelo n.º 3 do artigo 10.º do CIRS, que ocorre o facto tributário, por que se regerá a sujeição ou não a imposto.
E que em nada se confunde com a regra de quantificação de um rendimento sujeito a imposto, por via da adição dos ganhos e perdas para efeitos de apuramento de um dado saldo positivo ou negativo.
Porquanto esse saldo apenas pode ser composto por ganhos tributáveis e perdas dedutíveis. Dito de outra forma, a liquidação do imposto a um dado saldo exige a prévia sujeição a esse imposto das operações previamente realizadas (e que concorrem para a formação desse saldo).
Sendo que algumas dessas operações são excluídas do apuramento do saldo, conforme sucede com a exclusão de tributação das mais-valias - e, convém não o esquecer, das menos-valias - decorrentes da alienação de ações detidas há mais de 12 meses.
Note-se que o Tribunal Constitucional mantém uma jurisprudência uniforme no tempo. Englobando tanto a dedução de menos-valias no saldo anual negativo, como a dedução de menos-valias que são subtraídas ao saldo anual (positivo ou negativo).
Jurisprudência esta que é posterior ao acórdão 399/2010, que versou sobre a inconstitucionalidade das Leis n.º 11/2010, de 15 de Junho e n.º 12-A/2010, de 30 de Junho, as quais modificaram os escalões de IRS e as correspondentes taxas marginais.
Aqui não oferece dúvidas que o Tribunal Constitucional caracterizou o IRS como um imposto periódico e de formação complexa e sucessiva no tempo. Pelo que “o facto tributário que a lei nova pretende regular na sua totalidade não ocorreu totalmente ao abrigo da lei antiga, antes se continua formando na vigência da lei nova, como acontece nos presentes autos”.
Continua o Tribunal Constitucional que “a relação jurídica fonte da obrigação de imposto tem na sua base situações estáveis que se prolongam no tempo”.
E “nos termos do artigo 22.º, n.º 1, do CIRS, o rendimento colectável em IRS é o que resulta do englobamento dos rendimentos das várias categorias auferidos em cada ano, depois de feitas as deduções e os abatimentos. Ou seja, trata-se de um imposto anual, em que não se tributa cada rendimento percebido de per si (embora a retenção na fonte possa, por vezes, obnubilar esta realidade), mas sim o englobamento de todos os rendimentos recebidos num determinado ano. O que significa que só no final do ano de 2010 se pode apurar a taxa do imposto, bem como o escalão no qual o contribuinte se insere”.
(os sublinhados são nossos)
O acórdão 399/2010 centra-se na sucessão da lei no tempo no que respeita à definição dos escalões de rendimento e respectivas taxas marginais e progressivas. Afastando a divisão temporal do facto tributário e consagrando o nascimento do mesmo no final do ano fiscal.
Chegados aqui, o que devemos concluir quanto ao nascimento do facto tributário decorrente de uma mais-valia obtida com a transmissão onerosa de partes de capital?
Em primeiro lugar, o IRS - malgrado a sua denominação como imposto único - incide sobre o valor anual das rendimentos das diversas categorias tributáveis (ex vi do n.º 1 do artigo 1.º).
Cada uma dessas categorias de rendimento rege-se por um normativo autónomo, no que respeita:
(i) Ao momento em que o rendimento é obtido.
A título exemplificativo, basta atentar nos diferentes momentos em que se consideram obtidos os rendimentos das categorias A e B (respectivamente, pagamento e exigibilidade do IVA). Ou ainda nos rendimentos de capital, que se podem considerar auferidos, consoante os casos, no pagamento, vencimento ou apuramento.
(ii) Às regras e critérios de quantificação do rendimento.
Mais uma vez de forma exemplificativa, atentemos nas deduções específicas destinadas à tributação pelo rendimento líquido e cuja amplitude varia consoante as diferentes categorias.
É precisamente esta divisão sistemática que o Código do IRS acolhe: primeiro fixa-se a regra de incidência (sujeição a imposto) de um facto tributário, seguindo-se os critérios de quantificação do rendimento tributável de cada categoria.
Saliente-se, por fim, as regras de agregação do rendimento tributável das diferentes categorias.
Ora impedindo a sua agregação, por via da não comunicabilidade das perdas de determinadas categorias (contraposto com a possibilidade de reporte dessas perdas aos rendimentos futuros dessa categoria). Ora evitando a tributação agregada do rendimento, através do estabelecimento de taxas liberatórias, especiais e autónomas. Com ou sem opção pelo englobamento.
Passemos esta organização estrutural do Código do IRS para os ganhos ou perdas resultantes da transmissão onerosa de partes de capital.
Começando pela incidência, e nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 9.º, os ganhos de mais-valias constituem incrementos patrimoniais sujeitos a IRS (categoria G), desde que não considerados como rendimentos de outras categorias.
Com efeito, uma mais-valia constitui o produto de uma operação irregular e não prevista pelo sujeito passivo no momento da aquisição do bem. Em suma, um ganho ocasional e inesperado (trazido pelo vento, no dizer anglo-saxónico).
Contrariamente à prática reiterada de operações de compra e venda de bens, a qual é passível de enquadramento na categoria B, dado que os bens já não configuram activos fixos, mas antes existências adquiridas com o propósito de subsequente revenda.
O artigo 10.º define, no seu n.º 1, o conceito de mais-valia tributável, o qual é encabeçado pela alínea b): “Alienação onerosa de partes sociais, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, e de outros valores mobiliários (…)”.
Ora o momento em que o ganho sujeito a imposto se considera obtido é enunciado no n.º 3 do artigo 10.º como reportado à data “da prática dos actos previstos no n.º 1”.
Não oferecendo dúvidas que o facto gerador ocorre no momento em que as partes de capital são objecto de transmissão onerosa.
Esclarecido que está o nascimento do facto gerador - a transmissão onerosa das partes de capital -, o qual é consistente com a jurisprudência do Tribunal Constitucional, podemos passar às regras de quantificação do correspondente rendimento.
Também aqui é notória a variabilidade das regras plasmadas no Código do IRS. Porque se é verdade que as normas de quantificação da obrigação tributária divergem consoante as diferentes categorias de rendimento, não é menos verdade que é no âmbito dos ganhos que compõem a categoria G que tais diferenças se engrandecem.
Assim, nos termos do artigo 43.º, os ganhos e perdas resultantes das várias operações sujeitas a imposto são adicionados para efeitos de apuramento de um saldo positivo ou negativo.
Esse saldo não é, todavia, único para as mais-valias apuradas pelo sujeito passivo. Com efeito, a transmissão onerosa de partes de capital é segregada dos demais rendimentos igualmente qualificados como mais-valias.
Desta divisão resultam duas consequências relevantes para as mais-valias que não provêm da transmissão onerosa de partes de capital: (i) o valor positivo ou negativo do saldo é considerado em 50% e (ii) tal rendimento é sujeito a englobamento obrigatório e consequente liquidação do imposto às taxas marginais previstas para os diferentes escalões de rendimento.
Para as mais e menos-valias resultantes da transmissão onerosa de partes de capital está reservado um fim diametralmente oposto: (i) o saldo positivo ou negativo é relevado pelo respectivo valor integral e (ii) tal saldo é tributado a uma taxa especial, ou seja, é subtraído à regra de englobamento.
E se é verdade que ao sujeito passivo é permitida a opção pelo englobamento, há que salientar que o não englobamento constitui o regime supletivo e - até à Reforma Fiscal de 2015 - o exercício dessa opção implicava o englobamento dos rendimentos de capital. Acresce que a opção era condição necessária para o reporte (para os dois exercícios seguintes) do saldo negativo.
Face ao exposto, retiramos que, apesar de IRS se apresentar como um imposto periódico, o mesmo encerra diferentes factos geradores da sujeição a imposto consoante as diversas categorias de rendimento.
Tratando-se da transmissão onerosa de partes de capital, o facto gerador que determina a exigibilidade do imposto (e subsequente quantificação do rendimento tributável) reporta-se, precisamente, à data desse acto translativo.
Teremos assim, num dado exercício, tantos factos geradores quantas as transmissões onerosas de partes de capital. As quais serão agregadas para efeitos de determinação de um saldo positivo ou negativo. O qual, se positivo, será sujeito a uma taxa especial, exceto se o sujeito passivo optar pelo englobamento.
Temos assim que um imposto de natureza periódica, como o IRS, é compatível e até composto por rendimentos de formação instantânea e outros de formação sucessiva.
Com efeito, alguns rendimentos são - pela natureza do seu facto gerador - de formação sucessiva no tempo. Basta atentar nos rendimentos das categorias A, B, F ou H, em que os rendimentos e respetivas deduções se vão sucedendo no tempo, sendo o imposto liquidado em função dos escalões e taxas marginais que resultam da agregação destas categorias.
Contrariamente, as mais-valias provêm de operações isoladamente realizadas - instantâneas - em que cada facto gerador se apresenta como autónomo e completo, i. e sem exigência de qualquer facto ou ocorrência posterior – que poderá existir ou não.
Quer isto dizer que a alienação das ações por parte dos Requerentes, realizada em 30 de Abril de 2010, configura um facto gerador autónomo e completo. Que em nada carece de qualquer evento posterior ocorrido após a vigência da lei nova.
Sob pena de uma regra de quantificação de uma obrigação tributária e/ou de liquidação do imposto por via da aplicação de uma taxa especial de 20% (por subtracção ao englobamento obrigatório), se transformar numa autêntica norma de incidência (facto gerador).
E na situação controvertida há que destacar o facto de os Requerentes terem realizado um só ganho, decorrente de uma só transmissão onerosa de partes de capital.
Pelo que não se entenderia que essa única operação relevasse para o apuramento de um saldo anual, porquanto ambos se reconduziriam à mesma realidade e idêntico quantum.
Na verdade, a existência de uma única operação reforça a natureza instantânea do facto gerador, na medida em que retira qualquer sentido e relevância ao domínio temporal da lei nova.
Não subsistindo qualquer facto, realidade ou momento que - após a vigência da lei nova - se apresente como necessário para completar o facto gerador (alienação onerosa das partes de capital) ocorrido ao abrigo da lei antiga.
Insiste-se que a quantificação da obrigação tributária a realizar no final do ano e ao abrigo da lei nova, não pode se pode estender a um facto gerador - a transmissão onerosa - temporalmente verificado no período de vigência da lei antiga.
Temos assim que a aplicação da lei nova a um facto gerador integralmente ao abrigo da lei antiga, não reconduz ao conceito de retroatividade em terceiro grau, designada de restrospetividade.
Para mais, quando estamos perante a prática de uma única operação realizada em Abril de 2010.
Mas sempre diríamos que mesmo que não assim não fosse - e ocorressem diversas operações de alienação ao abrigo das leis antiga e nova - cada facto gerador seria integrado na lei vigente à respectiva data de ocorrência.
Não identificando, sequer, quaisquer obstáculos que suportam a pretensa impraticabilidade de alguns na quantificação do rendimento tributável. Atenta a simplicidade inerente à restrição do apuramento do saldo final às operações ocorridas ao abrigo da lei nova.
Trata-se de um argumento que, para além de não colher, não poderia ser esgrimido com o propósito de se sobrepor ao princípio da irretroactividade acolhido no quadro constitucional, no Código do IRS e na LGT.
E sobre o princípio da não retroatividade da Lei Fiscal, o Tribunal Constitucional precisou-o nos seguintes termos:
“O Tribunal Constitucional tem vindo a seguir o entendimento que esta proibição da retroatividade, no domínio da lei fiscal, apenas se dirige à retroatividade autêntica, abrangendo apenas os caos em que o facto tributário que a lei nova pretende regular já tenha produzido todos os seus efeitos ao abrigo da lei antiga, excluído do seu âmbito aplicativo as situações de retrospetividade ou de retroatividade imprópria, ou seja, aquelas situações em que a lei é aplicada a factos passados mas cujos efeitos ainda perduram no presente, como sucede quando as normas fiscais que produziram um agravamento da posição fiscal dos contribuintes em relação a factos tributários que não ocorreram totalmente no domínio da lei antiga e continuam a formar-se, ainda no decurso do mesmo ano fiscal, na vigência da nova lei (v.g. acórdãos n.ºs 128/2009, 85/2010 e 399/2010, todos acessíveis em www.tribunalconstitucional.pt)”.
“Ora é bom de ver que no caso das mais-valias de participações sociais sendo o facto gerador do imposto a sua alienação onerosa, não estamos perante um facto tributário complexo, de formação sucessiva ao longo de um ano, mas sim perante um facto tributário instantâneo. O facto tributário que dá origem ao imposto esgota-se na realização da mais-valia (Atente-se que já o imposto de mais-valias era tido como de obrigação única – cf. Ac. so STA de 18.1.1995, P.18287).
Note-se ainda que a regra de caducidade prevista no n.º 4 do artigo 45.º da LGT não remove a consideração de cada transmissão onerosa como constituindo um facto tributário instantâneo e autónomo.
A referida norma postula que, nos impostos periódicos, a caducidade conta-se “a partir do termo do ano em que se verificou a facto tributário”.
Tal não significa que o facto tributário ocorre no final do ano. Outrossim, denota que, na ausência desta norma, a caducidade contar-se-ia a partir do momento da verificação de cada facto tributário.
O que explica a necessidade de inserção desta norma excepcional, no sentido de forçar a contagem da caducidade - nos impostos periódicos - a partir do último dia do ano em que se verificou o respectivo facto tributário.
Em suma, esta regra de caducidade apenas reforça a compatibilidade de um imposto periódico com a conjugação de factos tributários de formação tanto sucessiva como instantânea. Em que os primeiros se completam no último dia de cada exercício, ao passo que os segundos ocorrem na data de realização da operação económica subjacente.
Tanto assim, que a contagem do prazo de caducidade do Imposto sobre o Valor Acrescentado e das retenções na fonte (a título liberatório) se inicia no primeiro dia do ano civil seguinte (conforme o citado n.º 4 do artigo 45.º da LGT). Trata-se de uma excepção que não prejudica a consideração destes tributos como impostos de obrigação única.
Chegados aqui, não será demais singularizar que este entendimento volta a estar alinhado com a jurisprudência, desta vez do Supremo Tribunal Administrativo (STA), que nos seus acórdãos de 4 de Dezembro de 2013 (processo n.º 1582/13) e 8 de Janeiro de 2014 (processo n.º 1078/12), decidiu pela inaplicabilidade da lei nova a factos tributáveis instantâneos e prévios à sua vigência, conforme sucede com a alienação de partes de capital.
É de salientar que estas decisões decorrem de recursos apresentados pela AT, facto que permite constatar o alinhamento jurisprudencial dos tribunais superior e de primeira instância. Acresce a unanimidade das decisões do STA.
No acórdão de 4 de Dezembro de 2013 podemos ler que “o mesmo princípio da legalidade não poderá deixar de impedir que a lei tributária disponha para o passado, com efeitos retroactivos, prevendo a tributação de actos praticados quando ela ainda não existia, sob pena de se permitir que o Estado imponha determinadas consequências a uma realidade posteriormente a ela se ter verificado, sem que os seus atores tivessem podido adequar a sua actuação de acordo com as novas regras”.
Esta questão não é, de todo, despicienda, atento o facto de os Requerentes terem alienado as partes de capital em Abril de 2010, data em que era manifestamente desconhecida qualquer intenção de alteração legislativa do regime de tributação de mais ou menos-valias.
Continua o referido aresto que “em sede de IRS, o art. 10.º, n.º 1, al. b) do Código insere no campo de incidência da tributação as mais-valias de partes sociais e valores mobiliários, sendo que esta incidência supõe a realização da mais-valia, ou seja, a sua alienação onerosa. E é esta alienação onerosa o facto gerador”.
“No que respeita ao momento em que o imposto é exigível […] rege o n.º 3 do artigo 10.º, que estabelece, como regra geral, que os ganhos se consideram obtidos no momento da prática dos actos previstos no n.º 1”. Quer dizer, o facto gerador reporta-se ao momento do ato que “realiza” a mais-valia. Dir-se-á, em termos gerais, que o momento relevante é, pois, o da alienação do activo em que se apuraram mais-valias tributáveis, ou operação a ela equiparada”.
Mais salienta o STA que “ora, é bom de ver que no caso das mais-valias de participações sociais sendo o facto gerador do imposto a sua alienação onerosa, não estamos perante um facto tributário complexo, de formação sucessiva ao longo de um ano, mas sim perante um facto tributário instantâneo”.
“O facto tributário que dá origem ao imposto esgota-se na realização da mais-valia (Atente-se que já o imposto de mais-valias era tido como de obrigação única - cf. Ac. do STA de 18.1.1995, P. 18287)”.
Conforme supra salientámos, a norma de quantificação do rendimento tributável não se confunde com o normativo de incidência, i. e. com a regra de sujeição a imposto, que precede a quantificação da obrigação tributária e sem a qual esta não pode operar.
Também aqui alinhamos com o STA, para o qual “a este entendimento não obsta a circunstância de ser tributado “o saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano”, pois que o que está em causa no art. 43.º, n.º 1 do CIRS é, ao lado das normas que regem a determinação do ganho sujeito a imposto, a determinação da matéria coletável no que se reporta aos rendimentos resultantes de mais-valias”.
De seguida, o STA arrola a comparabilidade entre o apuramento do saldo anual das diversas operações realizadas no exercício fiscal e a liquidação das tributações autónomas.
Constatando tratar-se “a nosso ver, de uma situação semelhante às tributações autónomas em sede de IRC, onde se concluiu que “o facto de a liquidação do imposto ser efetuada no fim de um determinado período não transforma o mesmo num imposto periódico, de formação sucessiva ou de caráter duradouro. Essa operação de liquidação traduz-se apenas na agregação, para efeito de cobrança, do conjunto de operações sujeitas a essa tributação [...]” [cf. Ac. do Tribunal Constitucional n.º 310/2012].
Concluindo o STA que “também nas mais-valias resultantes da alienação de participações sociais o tributo incide sobre operações que se produzem e esgotam de modo instantâneo, surgindo o facto gerador do tributo isolado no tempo. Simplesmente há uma consolidação anual das mais-valias e menos-valias para efeito de apuramento da matéria colectável, sobre a qual vai incidir a taxa especial ou que vai ser englobada aos rendimentos das demais categorias”.
É verdade que o apuramento do saldo anual assenta na soma das mais-valias e dedução das menos-valias apuradas no exercício. O saldo positivo será tributado a uma taxa especial ou mediante englobamento, ao passo que o saldo negativo poderá ou não ser reportado para os dois exercícios seguintes.
Contrariamente, a tributação autónoma consiste na adição de despesas que partilham uma dada natureza, a cujo valor total é liquidado imposto a uma determinada taxa.
Trata-se, todavia, de diferenças na aritmética de apuramento do rendimento colectável, que em nada contende com o facto de - em ambos os casos – se estar perante regras de quantificação da obrigação tributável, como consequência da sujeição a imposto de uma dada operação (norma de incidência) decorrente da qualificação dessa operação como um facto tributário (facto gerador).
O alinhamento com o sentido da decisão do STA é ainda mais contundente, quando este salienta que “a similitude com as situações de tributação autónoma é ainda maior quando, como in casu, o contribuinte não opta pelo englobamento”.
E aplicando-se uma taxa especial ao saldo anual, fica definitivamente afastada a aplicabilidade do acórdão 399/2010 do Tribunal Constitucional, na medida em que não existe qualquer escalão de rendimento ou taxa marginal e progressiva, cuja aplicabilidade dependa da formação sucessiva de uma dada corrente de rendimento.
Para mais quando, há-que não o esquecer, no caso controvertido os Requerentes realizaram uma única operação em 2010. Caindo por terra a necessidade de apurar um qualquer saldo anual no decurso da vigência da lei nova. Não só um tal cálculo não chega a ocorrer, mas, acima de tudo, trata-se de uma operação de quantificação de uma matéria colectável proveniente de um facto tributário ocorrido na vigência da lei antiga.
Por fim, a decisão arbitral do CAAD, no Processo n.º 135/2013-T, aporta um contributo adicional, mormente, ao ressaltar que “(…) certo é que existe lei expressa que nos dá a solução do caso sub judice, o art.º 12.º, n.º 2, da LGT: se o facto tributário for de formação sucessiva, a lei nova só se aplica ao período decorrido a partir da entrada em vigor. (…) Ou seja, o art.º 12.º, n.º 2, da LGT manda que, nos impostos periódicos (i.e., relativamente a factos tributários de formação sucessiva), o período de tributação seja cindido, aplicando-se a lei antiga aos factos geradores de imposto ocorridos antes da alteração legislativa e a lei nova aos posteriores”.
Transcrevemos ainda que “As normas legais que regem a tributação devem assegurar que quem pratica um ato potencialmente gerador de obrigação de imposto possa “ter a certeza” das consequências fiscais daí resultantes. Condição primeira para tal é, obviamente, que a lei que regerá tais obrigações seja conhecida, seja a que está em vigor naquele momento (...) A tese de que o facto gerador do imposto, nos impostos periódicos, apenas ocorre no último dia do ano, tem como consequência implícita a aceitação de um certo grau de retroactividade da lei fiscal (a chamada retroactividade imprópria ou de 3.º grau) (...) Sabemos que tal “grau” de retroactividade é considerado constitucionalmente admissível pela nossa jurisprudência. Mas para que tal aplicação retroactiva exista é necessário que exista um ‘dictum’ legislativo que a tal obrigue (...) Ora, tal não acontece no presente caso, pois que a regra geral constante do n.º 2 do art.º 12.º da LGT visa, precisamente, evitar situações de retroactividade da lei fiscal (ainda que “moderada”), sempre que o legislador não determine, especialmente, o contrário (...) O art.º 12.º, n.º 2 da LGT é, pois, uma norma totalmente conforme aos princípios constitucionais que presidem à tributação, é mesmo, a que, nesta específica questão, melhor dará tradução a tais princípios, ao prevenir a ocorrência de situações de aplicação retroactiva da lei fiscal”.
E continua esse aresto arbitral, em linha com a jurisprudência do STA:
“(...)Apesar de a matéria colectável (mais-valias mobiliárias) a ser tributada em IRS corresponder ao saldo das mais e menos valias realizadas pelo sujeito passivo ao longo do ano, o certo é que, no caso concreto, só houve uma única alienação em 2010:, ou sejam o facto tributário, em abstracto de formação sucessiva, “esgotou-se” numa única transacção (...) sendo as mais-valias obtidas com a alienação de participações sujeitas a uma tributação autónoma (a uma taxa proporcional, não sendo aqui tidos em conta os elementos de personalização que, por princípio, deviam estar presentes na tributação de todos os rendimentos, caso o IRS fosse um verdadeiro imposto único - estamos perante uma das traduções do carácter dual deste imposto), nenhuma dificuldades se colocam relativamente às demais operações que a liquidação (entendido o termo em sentido amplo) do imposto implica, quando feita com observância do disposto no n.º 2 do art.º 12.º da LGT(...) Inviabilizar a aplicação do preceito (art.º 12.º, n.º 2, da LGT) em casos como o presente significaria, “ignorar” a sua existência, o que é vedado a qualquer Tribunal (...) Em resumo, entende-se que nada obsta à aplicação do disposto no n.º 2 do art.º 12 da LGT, da regra geral aí contida, a qual - repete-se - o legislador entendeu não afastar na Lei n.º 15/2010 (...)”.
Deparamo-nos agora com um novo fundamento que pugna pela inaplicabilidade da lei nova ao facto tributário que a precede.
Com efeito, ainda que fosse de sufragar a tese do facto jurídico-fiscal complexo e de natureza sucessiva, não poderíamos deixar de entrar em linha de conta com o disposto no n.º 2 do artigo 12.º da LGT, ao abrigo do qual “se o facto tributário for de formação sucessiva, a lei nova só se aplica ao período decorrido a partir da sua entrada em vigor”.
Há doutrina que destaca o facto de a LGT não revestir a natureza de lei reforçada. Pelo que estaríamos perante uma lei ordinária, regida pelos princípios de sucessão da lei no tempo (a lei nova derroga a lei antiga) e da hierarquia (a lei especial derroga a lei geral).
Acontece que, conforme resulta do preâmbulo da LGT, “a reforma fiscal da tributação directa de 1989 não foi precedida da instituição de uma lei geral tributária que clarificasse os princípios fundamentais do sistema fiscal, as garantias dos contribuintes e os poderes da administração tributária”.
Pretendia-se “a concentração, clarificação e síntese em um único diploma das regras fundamentais do direito fiscal (…)”, de forma a permitir “(…) a uniformização dos critérios de aplicação do direito tributário, de que depende (…) a estabilidade e coerência do sistema tributário”.
Pelo que “a presente lei não se limita à sistematização e aperfeiçoamento de normas já existentes (…)”.
E “no título I, procede a presente lei, em conformidade com esses objectivos, à definição dos princípios fundamentais da ordem tributária, acolhendo as normas da Constituição fiscal e clarificando as regras de aplicação das leis tributárias no tempo e no espaço”.
É, precisamente, no Capítulo I que se situa a norma de sucessão da lei no tempo plasmada no citado artigo 12.º.
A LGT foi, naturalmente, aprovada no uso de uma lei de autorização, cujo objecto se centrou na publicação de “(…) uma lei geral tributária donde constem os grandes princípios substantivos que regem o direito fiscal (…)”.
Acima de tudo “a lei geral tributária visará aprofundar as normas constitucionais tributárias e com relevância em direito tributário (…)”.
Face ao exposto, não oferece dúvidas que à LGT foi atribuído um estatuto de supraordenção sobre a demais legislação ordinária, sempre que esta disponha em sentido contrário.
Nos planos formal e material, a LGT configura a consecução do imperativo constitucional, não sendo permitido que uma qualquer legislação ordinária subsequente a derrogue.
Note-se que tal não eleva a LGT a um pedestal de inalterabilidade. Todavia, será exigível que a legislação por que se operem tais alterações subsequentes, se revista de uma natureza e conteúdo semelhantes. Ou seja, que tal legislação vise o estabelecimento da relação jurídico-tributária fundamental.
Dito de outra forma, que o sentido e alcance da norma modificadora esteja em plano equivalente ao da LGT.
Resulta, assim, clara a inaplicabilidade dos princípios pelos quais a lei nova prevalece sobre a lei antiga e a lei especial derroga a lei geral.
Concretamente, a Lei n.º 15/2010, de 26 de Julho, não derroga o n.º 2 do artigo 12.º da LGT.
Quanto ao argumento de que o legislador pretendeu, in casu, que a lei nova se aplicasse a todas as transmissões onerosas de partes de capital realizadas em qualquer linha temporal de 2010, haverá que contrapor que o legislador não conformou uma tal vontade no texto legislativo. Nem expressa, nem sequer tacitamente.
Acresce que o mesmo legislador estruturou, através da LGT, o quadro fundamental de obediência e conformação das relações jurídico-tributárias. Sendo despiciendo discutir se a LGT dispõe ou não do estatuto de lei de valor reforçado, porquanto nos planos material e substantivo, não oferece dúvida que a LGT possui uma tal natureza, na medida em que, insiste-se, lhe coube o papel de positivar os princípios da Constituição fiscal.
E dado que o facto tributário se apresenta como instantâneo, completando-se ao abrigo da lei antiga, a lei nova teria de excecionar o n.º 2 do artigo 12.º da LGT.
Porquanto, nesse caso, dúvidas não restariam que o legislador pretenderia, através de lei posterior e especial, dispensar a lei nova do cumprimento do princípio da irretroatividade da lei fiscal.
Finalmente, sobre o argumento da AT de que não pode haver qualquer discriminação de rendimentos dessa categoria (de mais-valias de ações), nem qualquer tributação “pro rata temporis” e o de que apoiando-se na “mens legislatoris” e nalguma doutrina a Jurisprudência, a tributação das mais-valias em sede de IRS não pode deixar de ser feita de forma unitária e englobante sobre os saldos anuais dos fluxos de riqueza, este Tribunal não pode concordar com tais argumentos, por um lado, porque levariam à retroatividade autêntica, proibida pela CRP, como vimos, e por outro, porque não existe qualquer impraticabilidade na tributação dos saldos das mais e menos-valias gerados posteriormente à nova Lei 15/2010, deixando, de fora, os saldos apurados por factos tributários de idêntica natureza, cujo facto gerador tenha ocorrida anteriormente à entrada em vigor da referida Lei 15/2010, de 26/7.
Para tanto, veja-se ainda,finalmente, e em reforço desta tese, o que refere o Acórdão do STA proferido no Proc. n.º 01582/13, de 4/12/2013[1], que em apreciação de um recurso da Fazenda Pública, de uma decisão do TAF de Viseu, favorável ao impugnante, determinou:
“a anulação da liquidação sindicada, na parte impugnada, correspondente à tributação do saldo de todas as mais-valias e menos-valias realizadas até 26.7.2010 à taxa de 20%, quando apenas poderia ser tributado o saldo das mais-valias e menos-valias decorrentes da alienação de ações, ocorrida até 26.7.2010 e desde que à data da alienação tivessem sido detidas há menos de 12 meses, à taxa de 10%...e condenando a Administração tributária ao pagamento de juros indemnizatórios contados desde 7.9.2011 (data de pagamento) até à data da emissão da respetiva nota de crédito, no entendimento de que a liquidação sindicada padecia do vício de violação de lei por aplicação retroativa das alterações ao CIRS introduzidas pela Lei n.º 15/2010, de 26 de Julho, em violação do disposto no n.º 3 do artigo 103.º da Constituição e do disposto no artigo 12.º da Lei Geral Tributária”.
“(...) Para que o Estado possa cobrar um imposto ele terá que ser previamente aprovado pelos representantes do povo e terá que estar perfeitamente determinado em lei geral e abstrata, só assim se evitando que esse poder possa ser exercido de forma abusiva e arbitrária, indigna de um verdadeiro Estado de direito” (...) “Por outro lado, o mesmo princípio da legalidade não poderá deixar de impedir que a lei tributária disponha para o passado, com efeitos retroativos, prevendo a tributação de atos praticados quando ela ainda não existia, sob pena de
se permitir que o Estado imponha determinadas consequências a uma realidade posteriormente a ela se ter verificado, sem que os seus autores tivessem podido adequar a sua atuação de acordo com as novas regras (...). ” [Cfr Ac do T. Const nº 319/02, citado pelo Ac do STA mencionado na nota de rodapé].
“…Esta exigência revela as preocupações do princípio da proteção da confiança dos cidadãos, também ele princípio estruturante do Estado de direito democrático, refletidas na vertente do princípio da legalidade, segundo o qual, a lei, numa atitude de lealdade com os seus destinatários, só deve reger para o futuro, só assim se garantindo uma relação íntegra e leal entre o cidadão e o Estado. É neste sentido que deve ser entendida a opção do legislador constituinte de, na revisão constitucional de 1997, ao consagrar no artigo 103.º, n.º 3, a regra da proibição da retroatividade da lei fiscal desfavorável”.[2]
E sobre o princípio da não retroatividade da Lei Fiscal, o Tribunal Constitucional precisou-o nos seguintes termos:
“O Tribunal Constitucional tem vindo a seguir o entendimento que esta proibição da retroatividade, no domínio da lei fiscal, apenas se dirige à retroatividade autêntica, abrangendo apenas os casos em que o facto tributário que a lei nova pretende regular já tenha produzido todos os seus efeitos ao abrigo da lei antiga, excluído do seu âmbito aplicativo as situações de retrospetividade ou de retroatividade imprópria, ou seja, aquelas situações em que a lei é aplicada a factos passados mas cujos efeitos ainda perduram no presente, como sucede quando as normas fiscais que produziram um agravamento da posição fiscal dos contribuintes em relação a factos tributários que não ocorreram totalmente no domínio da lei antiga e continuam a formar-se, ainda no decurso do mesmo ano fiscal, na vigência da nova lei (v.g. acórdãos n.ºs 128/2009, 85/2010 e 399/2010, todos acessíveis em www.tribunalconstitucional.pt)”.
“Ora é bom de ver que no caso das mais-valias de participações sociais sendo o facto gerador do imposto a sua alienação onerosa, não estamos perante um facto tributário complexo, de formação sucessiva ao longo de um ano, mas sim perante um facto tributário instantâneo. O facto tributário que dá origem ao imposto esgota-se na realização da mais-valia (Atente-se que já o imposto de mais-valias era tido como de obrigação única – cf. Ac. so STA de 18.1.1995, P. 18287)[3]”.
V - Decisão
Aplicando-se as considerações supra ao caso sub juditio, logo se evidencia a ilegalidade da liquidação decorrente da aplicação retroativa do regime fiscal aprovado pela citada Lei nº 15/2010, de 26 de Julho.
A transmissão onerosa das partes de capital ocorreu em Abril de 2010. Esta operação de alienação constitui, nos termos do n.º 3 do artigo 10.º do Código do IRS, o momento em que ocorre o facto tributário e, portanto, o facto gerador do imposto, a ser devido. O qual se apresenta como único e instantâneo, não revestindo a natureza de acto complexo e ou de formação sucessiva.
Pelo que à data da realização da mais-valia fiscal, que constitui o facto gerador da tributação, vigorava o regime de exclusão de tributação plasmado no n.º 2 do artigo 10.º do Código do IRS.
Este normativo é conjugado com os n.º 1 e 2 do artigo 12.º da LGT, o qual afasta a aplicação da lei nova a factos tributários plenamente verificados na constância da lei antiga.
Assim, e ao contrário do que entende a Requerida, à Lei n.º 15/2010 apenas estava permitida a tributação das operações efectuadas após a respectiva entrada em vigor.
O sentido desta nossa decisão acompanha a jurisprudência do Tribunal Constitucional e do STA no que respeita ao momento da ocorrência do facto tributário, e do STA no que concerne ao mesmo thema decidendum.
Um alinhamento que contribui para interpretação e aplicação uniformes do direito, reforçando a correspondente unidade de sentido, conforme postulado no n.º 3 do artigo 8.º do Código Civil.
Nem seria compreensível que um tribunal arbitral, como meio alternativo de resolução jurisdicional de conflitos em matéria tributária e que decide de iure constituto, se pudesse afastar da jurisprudência dos tribunais judiciais superiores.
Relativamente ao pedido de indemnização pela alegada prestação indevida de garantia para suspensão do processo de execução fiscal instaurado para cobrança coerciva do imposto e juros compensatórios exigíveis, para que foi notificado do Despacho de 27-10-2014 do Chefe do Serviço de Finanças da …, tal garantia exigível (hipoteca voluntária) não se concretizou, conforme consta da Resposta da AT prestada em 13/03/2015.
Deste modo, indefere-se o pedido de pagamento de indemnização solicitado pelos Requerentes, por indevida, pelos fundamentos expressos.
Termos em que se decide:
a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral; e
b) Anular o acto tributário de liquidação de IRS e respetivos juros compensatórios.
c) Indeferir o pedido de indemnização solicitado, respeitante à alegada prestação de garantia (hipoteca voluntária), por não se mostrar provado nos autos que tenha sido prestada.
Notifique-se as partes.
VI. Valor do processo
Fixa-se o valor do processo em € 68.778,55, nos termos do disposto no art. 97.º-A do CPPT, aplicável ex vi art. 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT e art. 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processo de Arbitragem Tributária (RCPAT).
VII. Custas
Custas a cargo da Requerida, a Autoridade Tributária e Aduaneira, dado que o presente pedido foi julgado procedente na totalidade, no montante de € 2.448,00, nos termos da Tabela I do RCPAT, e em cumprimento do disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT.
Lisboa, 31 de Março de 2015
Os Árbitros
José Poças Falcão
(Presidente)
Fernando Borges Araújo
José Rodrigo de Castro
[1] Sumário: As alterações introduzidas ao regime tributário das mais-valias mobiliárias pela Lei n.º 15/2010, de 26 de Julho aplicam-se apenas aos factos tributários ocorridos em data posterior à da sua entrada em vigor (27 de Julho de 2010 – art. 5.º da Lei n.º 15/2010).
II - Nas mais-valias resultantes da alienação onerosa de valores mobiliários sujeitas a IRS como incrementos patrimoniais o facto tributário ocorre no momento da alienação (artigo 10.º n.º 3 do Código do IRS), sendo esse o momento relevante para efeitos de aplicação no tempo da lei nova, na ausência de disposição expressa do legislador em sentido diverso (artigos 12.º n.º 1 da LGT e do CC).
III - Sendo o rendimento anual para efeitos de IRS um facto complexo de formação sucessiva, na ausência de norma expressa em sentido diverso, poderá aplicar-se, sem retroactividade própria ou autêntica, a lei nova aos factos que o integram ocorridos a partir da sua entrada em vigor (artigo 12.º n.º 2 da Lei Geral Tributária).
[2] Cfr citado Ac do STA.