Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 780/2024-T
Data da decisão: 2024-10-08  Selo  
Valor do pedido: € 1.421.852,06
Tema: Imposto do Selo. Âmbito territorial. Cash-pooling. Isenção. Violação do Direito da União Europeia.
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Decisão Arbitral

 

 

           Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dra. Raquel Franco e Dr. Nuno Miguel Morujão (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 28-08-2024, acordam no seguinte:

          

           1. Relatório

 

A..., S.A., pessoa colectiva n.º..., com sede na..., n.º ..., ..., ...–... Lisboa, doravante designada por “A...” ou “Requerente”, apresentou pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante “RJAT”), tendo em vista a declaração da ilegalidade do indeferimento da reclamação graciosa n.º ...2023... e, bem assim, a ilegalidade das autoliquidações de Imposto do Selo relativas a utilizações de crédito nos meses de novembro de 2021 a novembro de 2023, Imposto do Selo este no montante total de € 1.421.852,06.

A Requerente pede ainda o reembolso à requerente desta quantia, acrescido de juros indemnizatórios à taxa legal contados desde 16.03.2024  inclusive até ao seu integral reembolso

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante também identificada por “AT” ou simplesmente “Administração Tributária”).

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 24-06-2024.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral coletivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 09-08-2024, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral coletivo foi constituído em 28-08-2024.

A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta, em que defendeu a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.

Por despacho de 01-10-2024, foi decidido dispensar a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e alegações.

O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e do n.º 1 do artigo 10.º, ambos do RJAT e é competente.

As partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigo 4.º e n.º 2 do artigo 10.º, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março) e o Tribunal é competente.

O processo não enferma de nulidades.

 

2. Matéria de facto

2.1. Factos provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos com relevo para a decisão:

 

  1. A Requerente é uma sociedade comercial de direito português, constituída sob o tipo de sociedade anónima, que desenvolve a sua atividade no setor das telecomunicações e que tem por objecto social o “estabelecimento, gestão e exploração de infra-estruturas, prestação de serviços de comunicações electrónicas e exercício da actividade de televisão, bem como de qualquer actividade complementar ou acessória” (documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
  2. A totalidade do capital social da Requerente, bem como dos direitos de voto na Requerente, é detida directa ou indirectamente a 100%, incluindo nos meses dos exercícios de 2021 a 2023 pela sociedade B... (“B...” doravante), cabeça do Grupo C... sediada no Reino Unido (relatórios e contas que constam do documento n.º 5, página 199-202, do documento n.º 6, páginas 205-208, e do documento n.º 7, páginas 201-203, e IES (Informação Empresarial Simplificada) da A... referentes aos períodos de tributação de Abril 2020 a Março de 2021 (Documento n.º 8), de Abril 2021 a Março 2022 (Documento n.º 9, e de Abril de 2022 a Março de 2023 (Documento n.º 10), e certificado de residência da  B... que consta do Documento n.º 11, documentos esses juntos com o pedido de pronúncia arbitral cujos teores se dão como reproduzidos;
  3. Para além de dominar directa ou indirectamente a 100% a ora Requerente A..., a B... detinha ainda directa ou indirectamente, nos anos de 2020 a 2023, a totalidade do capital social e dos direitos de voto de uma outra sociedade: a “D...”, também conhecida por “E...” e por “F...” (Documento n.º 5, páginas 199 e 200, documento n.º 6, páginas 205 e 206, e documento n.º 7, páginas 201 e 202, e certidão de registo comercial na Hungria destas sociedade húngara (doravante designada “E...”) que consta do documento n.º 12, documentos esses juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos;
  4. A E... está em relação de grupo com a A..., sendo uma sociedade de direito húngaro com sede na Hungria (certidão de registo comercial  e certificado de residência fiscal emitido pelas autoridades competentes da Hungria por referência aos exercícios de 2018 a 2023, que constam dos documentos n.ºs 12 e 13 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
  5. No âmbito da organização do Grupo C... em que se insere, a Requerente celebrou com a sociedade integrante do grupo E..., em 1 de Outubro de 2009, um contrato de cash-pooling denominado de “Multi Currency Cash Management Call Account Loan Agreement”, cuja cópia e tradução constam do documento n.º 14 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;
  6. Esse contrato visou implementar um sistema de gestão de fluxos de tesouraria entre a A... e a E..., no âmbito de uma gestão centralizada de tesouraria no Grupo C...;
  7. Nos termos do contrato referido, os saldos de tesouraria são transferidos numa base diária a partir de uma conta no H... da A..., para conta da E... aberta junto do H..., onde ficarão concentrados, até ao montante máximo de € 200.000.000 e no fim do mês os montantes acumulados são reembolsados, iniciando-se a zeros, com contas saldadas em relação ao período mensal anterior, novo ciclo mensal de transferência de excedentes de tesouraria (o enquadramento inicial, definição de “Facility” (Empréstimo) na cláusula 1, e cláusulas 2, 4, 5 e 6 do referido contrato).;
  8. Foram realizadas as cedências de liquidez diária pela Requerente à E... e respectivo apuramento de imposto do selo, e as cedências de liquidez no final de cada mês à B... no Reino Unido, no âmbito da designada “Política de grupo”, e respectivo apuramento de imposto do selo, que constam do documento n.º 15 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;
  9. A utilização de crédito disponibilizada através destas transferências diárias de liquidez encontra-se sujeita a um limite máximo (€ 200.000.000) e a um período não superior a um mês, havendo lugar a reembolso todos os meses e reinício a zeros do novo ciclo mensal seguinte (documentos n.ºs 14 e 15);
  10. No final de cada mês, o saldo das transferências diárias de liquidez para a E... foi devolvido à Requerente, e esse excedente mensal de liquidez foi de imediato cedido pela Requerente à B... (cabeça do grupo) no âmbito da execução da política de grupo;
  11. Dos fluxos financeiros ocorridos no âmbito do referido contrato de cash-pooling (transferências diárias de liquidez para a E..., saldadas – reembolsada - no final de cada mês) e no âmbito das transferências mensais de liquidez no âmbito da Política de grupo para a B..., resultaram os seguintes saldos médios mensais e cada uma dessas duas operações de cedência de liquidez, nos meses entre Novembro de 2021 e Novembro de 2023:

 

(Declarações mensais de Imposto do Selo juntas com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos e artigo 22.º da Resposta da AT);

  1. Sobre cada um destes dois saldos médios mensais (“soma dos saldos apurados diariamente, durante o mês, divididos por 30”, de acordo com a Verba 17.1.4. da TGIS) incidiu o Imposto do Selo indicado no quadro que antecede, que no conjunto dos meses de Novembro de 2021 a Novembro de 2023, ascendeu a € 212.192,83 (cash-pooling) e a € 1.209.569,23 (Política de grupo), num total de € 1.421.852,06, imposto este que a Requerente autoliquidou nas declarações mensais indicadas no quadro que antecede, que foram entregues nas datas neste indicadas;
  2. A Requerente pagou as quantias autoliquidadas (ponto 20 da informação para que remete o despacho de indeferimento da reclamação graciosa e documentos n.º 2 e 3 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
  3. A Requerente não recorreu a financiamentos bancários contratados nos períodos de Abril de 2020 a Março de 2021, Abril de 2021 a Março de 2022 e Abril de 2022 a Março de 2023 (documento n.º 20, página 51, Documento n.º 21 páginas 49 e 50, e documento n.º 22, páginas 51 e 52, juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
  4. Em 14-12-2023, a Requerente apresentou reclamação graciosa das autoliquidações referidas (processo administrativo);
  5. A reclamação graciosa foi indeferida por despacho de 15-03-2024, proferido despacho de Indeferimento, pelo Chefe de Divisão de Serviço Central, ao abrigo de Subdelegação de competências (documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
  6. Na informação para que remete o despacho de deferimento da reclamação graciosa refere-se, além do mais, o seguinte:

30. Não se conformando com os referidos atos tributários de autoliquidação, vem a Reclamante pedir na sua petição a anulação dos mesmos, devido a, no seu entendimento, as liquidações a que se faz referência no quadro 11., se encontrarem desconformes com a legislação fiscal em vigor, pelo que requer a procedência do peticionado, e que em consequência, seja reembolsada do IS indevidamente suportado, no montante total de € 1.421.852,00, em virtude de entender se encontrarem preenchidos os pressupostos da isenção do Imposto do selo, prevista na ai. h) do n° 1 do art. 79 do CIS.

 

Questão a resolver,

31. Saber se o imposto de selo que, é devido pelas operações de gestão centralizada de tesouraria, denominadas cash-pooling, é exigível à entidade mutuante do financiamento, neste caso a Reclamante.

32. Para reconhecimento do benefício fiscal, é necessário o preenchimento do pressuposto subjetivo de que depende o mesmo por parte da Reclamante, nos termos do disposto nas alíneas g) eh) do n.º 1, n.º 2 e n.°3 do artigo 7.º do CIS.

33. O artigo 7.° n.° 1 alíneas g) e h), n.ºs 2 e 3 do CIS depois da alteração da Lei n.° 2/2020, de 31 de março, tem a seguinte redação:

"g)Os empréstimos, incluindo os respetivos juros, por prazo não superior a um ano, desde que exclusivamente destinados à cobertura de carência de tesouraria, e efetuados por sociedades de capital de risco (SCR) a favor de sociedades em que detenham participações, bem como os efetuados por outras sociedades a favor de sociedades por elas dominadas ou a sociedades em que detenham uma participação de, pelo menos, 1 O % do capital com direito de voto ou cujo valor de aquisição não seja inferior a 5 000 000 €, de acordo com o último balanço acordado e, bem assim, os efetuados em benefício de sociedade com a qual se encontre em relação de domínio ou de grupo; (Redação da Lei n.° 2/2020, de 31 de março)

h) Os empréstimos, incluindo os respetivos juros, por prazo não superior a um ano, quando concedidos por sociedades, no âmbito de um contrato de gestão centralizada de tesouraria, a favor de sociedades com a qual estejam em relação de domínio ou de grupo; (Redação da Lei n.° 2/2020, de 31 de março)

2 - O disposto nas alíneas g) e h) do n. º 1 não se aplica quando qualquer dos intervenientes não tenha sede ou direção efetiva no território nacional, com exceção das situações em que o credor tenha sede ou direção efetiva noutro Estado membro da União Europeia ou num Estado em relação ao qual vigore uma convenção para evitara dupla tributação sobre o rendimento e o capital acordada com Portugal, caso em que subsiste o direito à isenção, salvo se o credor tiver previamente realizado os financiamentos previstos nas alíneas g) e h) do n. º 1 através de operações realizadas com instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no estrangeiro ou com filiais ou sucursais no estrangeiro de instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no território nacional.

3- O disposto nas alíneas g), h) e i) do n. º 1 não se aplica quando qualquer das sociedades intervenientes ou o sócio, respetivamente, seja entidade domiciliada em território sujeito a regime fiscal  privilegiado, a definir por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças.(Redação da Lei n.° 83-C/2013, de 31 de Dezembro)

 

34. O acordo de gestão centralizada de tesouraria - Cash Pooling, tem enquadramento na isenção da alínea h) do n.° 1 do artigo 7.° do CIS, desde que a as operações financeiras realizadas pela Reclamante concretizem o preenchimento do pressuposto subjetivo de que depende o direito ao benefício fiscal.

35. Para a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), na medida em que são como tal qualificadas nos termos do CIS e da respetiva TGIS, estas operações de tesouraria, traduzidas em movimentos de cedência e tomada de fundos, representam verdadeiras operações financeiras, pois a relação jurídica estabelecida entre as entidades credoras e devedoras do capital e juros e a entidade centralizadora concretiza-se através de financiamentos concedidos/obtidos que representam efetivas operações de crédito, quaisquer que sejam a sua forma ou prazo.

36. Deste modo, os fluxos da conta bancária individual da Reclamante para a conta bancária da entidade centralizadora (por referência aos períodos em análise), ou em sentido inverso, constituem operações financeiras que se consubstanciam na utilização de fundos concedidos e, como tal, têm enquadramento no âmbito de incidência objetiva do imposto do selo, por força do n.° 1 do artigo 1.,° do CIS.

37. Alega a Reclamante, que o contrato de cash pooling prevê a transferência, numa base diária, de excessos de liquidez da conta bancária da Reclamante, para uma conta bancária centralizadora ou transferência, também numa base diária, de liquidez da conta bancária centralizadora para a conta da Reclamante para compensar saldos negativos (descobertos), nesta última conta (zero Balancing).

38. Também não há dúvidas quanto à identificação do sujeito passivo neste tipo de operações financeiras, que é a entidade concedente do crédito (cf. alínea b) do n.° 1 do artigo 2.° do CIS), ou a entidade  mutuária se a operação não for intermediada por uma instituição de crédito ou sociedade financeira (cf.  alínea d) do n.º 1 do artigo 2.° do CIS); considerando-se as operações realizadas em território nacional.

 39. Por conseguinte, caberá à Reclamante a responsabilidade pela liquidação, cobrança e entrega do imposto nos cofres do Estado, quer esteja na posição de concedente de crédito, quer esteja na posição  de utilizadora de crédito, conforme estabelecem os artigos 23. ,41.°e 43.° do CIS.

40. Relativamente ao encargo do imposto, o mesmo é suportado pela entidade utilizadora dos fundos transferidos (cf. alínea f) do n.º 3 do artigo 3. º do CIS), pelo que, incumbirá à Reclamante efetuar a  repercussão do montante do imposto liquidado.

41. Quanto à forma de apuramento do valor tributável e do imposto, o sistema de cash pooling a que a  Reclamante aderiu, pressupõe a abertura e existência de uma conta corrente financeira da Reclamante e a conta bancária da entidade centralizadora, na qual serão registadas todas as transferências efetuadas de e para a Reclamante, pelo que será aplicável a verba 17.1.4 da TGIS, pois a utilização do crédito será feita sob a forma de conta corrente.

42. Quanto aos juros, credores e devedores, apenas estarão sujeitos a imposto do selo se decorrerem de operações que sejam realizadas por ou com intermediação de instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas e quaisquer outras instituições financeiras, conforme estipula a verba 17.3.1 da TGIS.

43. Determina a alínea h) do n.° 1do artigo 7.° do CIS que '[o]s empréstimos, incluindo os respetivos juros, por prazo não superior a um ano, quando concedidos por sociedades, no âmbito de um contrato de gestão centralizada de tesouraria, a favor de sociedades com a qual estejam em relação de domínio ou de grupo", ficam isentos do pagamento de imposto do selo.5

44. Consta do Relatório do Orçamento do Estado de 2020, que foi intenção do legislador "como forma de apoio à tesouraria das empresas", isentar "de Imposto do Selo todas as operações financeiras de curto prazo realizadas entre sociedades em relação de domínio ou de grupo no âmbito de contratos de gestão centralizada de tesouraria (cash pooling). ".

45. O reconhecimento e concessão da isenção está condicionado à observância do disposto no novo n.° 8 do mesmo artigo que determina que '[s]em prejuízo do estabelecido nos n.ºs 2 e 3, para efeitos do disposto na alínea h) do n.° 1, existe relação de domínio ou grupo, quando uma sociedade, dita dominante, detém, há mais de um ano, direta ou indiretamente, pelo menos, 75 % do capital de outra ou outras sociedades ditas dominadas, desde que tal participação lhe confira mais de 50 % dos direitos de voto."

46. Relevam ainda sobre esta matéria o disposto nos n.ºs 2 e 3 do citado artigo, na medida em que concorrem para a delimitação do elemento espacial de aplicação daquela norma de isenção, pelo que importa ter presente a sua redação onde se estabelece que " [o] disposto nas alíneas g) e h), do n.º 1 não se aplica quando qualquer dos intervenientes não tenha sede ou direção efetiva no território nacional, com exceção das situações em que o credor tenha sede ou direção efetiva noutro Estado membro da União Europeia ou num Estado em relação ao qual vigore uma convenção para evitar a dupla tributação sobre o rendimento e o capital acordada com Portugal, caso em que subsiste o direito à isenção, salvo se o credor tiver previamente realizado os financiamentos previstos nas alíneas g) e h), do n. º 1 através de operações realizadas com instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no estrangeiro ou com filiais ou sucursais no estrangeiro de instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no território nacional"(n.°2); e que "[o] disposto nas alíneas g), h) e i) do n. º 1 não se aplica quando qualquer das sociedades intervenientes ou o sócio, respetivamente, seja entidade domiciliada

em território sujeito a regime fiscal privilegiado, a definir por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças" (n.° 3).

47. Fazendo uma leitura integrada do disposto nos normativos citados, conclui-se que o benefício da isenção depende do preenchimento cumulativo dos seguintes pressupostos:

(i) do prazo da operação financeira, isto é, do prazo de concessão e utilização dos fundos transferidos, que não deve ser superior a um ano; e,

 (ii) da relação entre as sociedades intervenientes nos fluxos financeiros que se estabelecem

entre elas.

48. Quanto às relações financeiras estabelecidas entre a Reclamante e a entidade centralizadora, por referência aos períodos em análise (de novembro de 2021 a novembro de 2023), e de acordo com a informação constante dos pontos 14.° e 15.° da petição, não foi apresentado esclarecimento cabal e  prova documental quanto à relação entre as duas empresas, designadamente através da apresentação de um organograma do grupo, referindo-se apenas que a Reclamante é detida pela "G... B.V." e que ambas fazem parte do universo do grupo C... .

49. Assim conclui-se pela não verificação do requisito de relação das sociedades intervenientes nos fluxos financeiros estabelecidos entre elas, nos termos previstos no n.º 8 do artigo 7.° do CIS, que determina que "[s]em prejuízo do estabelecido nos n.ºs 2 e 3, para efeitos do disposto na alínea h) do n.º 1, existe relação de domínio ou grupo, quando uma sociedade, dita dominante, detém, há mais de um ano, direta ou indiretamente, pelo menos, 75 % do capital de outra ou outras sociedades ditas dominadas, desde que tal participação lhe confira mais de 50 % dos direitos de voto. "

50. No regime de cash pooling, as sociedades que integram o grupo implementaram entre si um sistema de gestão centralizada de tesouraria designado cash pooling, na modalidade zero balancing, o que significa que os saldos de tesouraria das diferentes contas bancárias das empresas do grupo são consolidados (de forma efetiva e não meramente virtual) numa única conta centralizadora. Estas operações traduzem-se, na prática, numa forma de concessão ou obtenção de créditos entre as várias empresas do grupo.

51. Este sistema é objeto de tributação pela verba 17.1.4 da TGIS, por se tratar de um crédito "utilizado sob a forma de conta corrente ou qualquer outra forma em que o prazo de utilização não seja determinado ou determinável", sendo devido imposto de 0,04% sobre a "média mensal obtida através da soma dos saldos em dívida apurados diariamente, durante o mês divididos por 30".

52. A liquidez do Grupo é, assim, utilizada de forma dinâmica e expedita mediante a concessão de crédito a curto prazo (i.e., por prazo inferior a um ano), e exclusivamente destinado a fazer face às carências de tesouraria, com o objetivo estratégico de minorar a dependência desta última de financiamentos externos e dos encargos que os mesmos acarretam, recorrendo para a sua cobertura a recursos próprios do Grupo.

53. Em conformidade com o n.° 1 do art. 1.° do CIS, o imposto do selo "(..) incide sobre todos os atos, contratos, documentos, títulos, livros, papéis, e outros factos previstos na Tabela Geral(...)", ou seja, a incidência objetiva do IS é estabelecida por referência a um conjunto de factos e operações constantes da Tabela anexa ao Código.

54. Por sua vez, a Tabela Geral do Imposto do Selo define na verba "17. Operações Financeiras: 17.1. Pela utilização de crédito, sob a forma de fundos, mercadorias e outros valores, em virtude da concessão de  crédito a qualquer título, incluindo a cessão de créditos, o factoring e as operações de tesouraria quando envolvam qualquer tipo de financiamento ao cessionário, aderente ou devedor, considerando-se, sempre, como nova concessão de crédito a prorrogação do prazo do contrato -sobre o respetivo valor, em função do prazo:(...) 17.1.4. Crédito utilizado sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou qualquer outra forma em que o prazo de utilização não seja determinado ou determinável, sobre a média mensal obtida através da soma dos saldos em dívida apurados diariamente, durante o mês, divididos por 30-0,04%".

55. Sem prejuízo do que a AT tem vindo a considerar como "nova concessão de crédito" e tendo por base a Circular n.º 15/2000, de 05.07.2000 da Direção de Serviços dos Impostos do Selo e das Transmissões do Património, não é qualquer utilização de crédito que despoleta a aplicação do imposto.

56. É de facto necessário que haja um encontro de vontades dirigido à concessão de crédito (com utilização do mesmo) ou então de outro modo, não se verifica o facto tributário, não havendo lugar à incidência do imposto.

57. Resumidamente, o imposto incide sobre a utilização do crédito em resultado de uma operação de concessão de crédito, nas quais comummente se incluem a "abertura de crédito, empréstimos, cessão de créditos, factoring e operações de tesouraria", considerando-se ainda, como nova operação financeira, por exemplo a prorrogação, seja ela automática ou não.

58. Atendendo ao princípio de que o encargo do imposto (conforme alínea f) do n.º 3 do artigo 3.° do CIS) se reflete sobre a entidade utilizadora daquela concessão, uma vez que é sob esta última que reside o  respetivo interesse económico, por outro lado e conforme se demonstrará, a regra geral de incidência no que concerne a estas operações, é a de que as entidades concedentes de crédito têm a obrigação de promover a liquidação do imposto e respetivo pagamento, conforme resulta aliás da letra da alínea b) do artigo 2.° do CIS. Excetuando-se quando tal não acontece, ser a entidade utilizadora do crédito a promover a liquidação do Imposto do selo.

59. Atendendo à informação prestada sobre o acordo de gestão centralizada de tesouraria (Cash Pooling) - Isenção da alínea h) do n.° 1 do artigo 7.° do CIS, Processo: 2020000840 - IV n.º 18431, com despacho concordante de 2021.02.18, da Diretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, consta o seguinte:

II - INFORMAÇÃO Para melhor compreendermos o enquadramento dos fluxos financeiros estabelecidos entre a Requerente e a "D" no âmbito do "CONTRATO" de gestão de tesouraria em  apreço, importa, em primeiro lugar, atender às relações societárias estabelecidas entre as várias sociedades com relevo para o presente pedido. De acordo com o organograma remetido a nosso pedido, no topo do "GRUPO ABCD" encontra-se a sociedade «"A" (U.S.)», que detém a totalidade do capital social da sociedade «"B" (U.S.)» e da sociedade «"C" (SPAIN)». Por sua vez, estas duas sociedades formam dois ramos paralelos dentro do "GRUPO ABCD" detendo cada uma delas, respetivamente, e de forma indireta, a totalidade do capital social da "D" e da Requerente.

Ora, do organograma resulta com nitidez que os fluxos financeiros de e para a Requerente, resultantes da execução do "CONTRATO'' são estabelecidos exclusivamente entre duas "sociedades-irmãs" do GRUPO ABCD"; isto é, são realizados numa lógica "horizontal", não tendo a entidade centralizadora, in casu, a "D" qualquer participação social, direta ou indireta, no capital da Requerente, nem vice-versa.

Sucede que, especificamente para efeitos da aplicação da isenção da alínea h) do n. º 1 do artigo 7.° do CIS, o legislador fiscal criou um conceito próprio sobre o que se deve entender por "relações de domínio ou de grupo", estabelecendo um conjunto de critérios legais, taxativos e cumulativos, que se não forem preenchidos resultam na inexistência de uma "relação de grupo" tal como o legislador a configurou e, por consequência, na inaplicabilidade da isenção. De facto, com a redação dada pela LOE 2020 à alínea h) do n.º 1 do artigo 7.%, o legislador fiscal autonomizou no CIS as operações de gestão centralizada de tesouraria (vulgo "cash pooling"), construindo em simultâneo, para efeitos de aplicabilidade desta nova isenção, um conceito próprio de "relação de domínio ou de grupo", expresso no n.°8 daquele artigo, com a seguinte redação: "8 - Sem prejuízo do estabelecido nos n.ºs 2 e 3, para efeitos do disposto na alínea h) do n.º 1, existe relação de domínio ou grupo, quando uma sociedade, dita dominante, detém, há mais de um ano, direta ou indiretamente, pelo menos, 75 % do capital de outra ou outras sociedades ditas dominadas, desde que tal participação lhe confira mais de 50 % dos direitos de voto". Ora, na medida que a literalidade da norma conduz o destinatário/intérprete para uma aceção formal do conceito em análise, a definição de "relação de grupo" nela contida -tida como verificada entre uma sociedade dita "dominante" e uma ou outras sociedades ditas "dominadas", na qual aquela detém, há mais de um ano, direta ou indiretamente, pelo menos 75% do capital e mais de 50% dos direitos de voto no capital desta(s) -, aponta para as relações "verticais", diretas ou indiretas, estabelecidas entre "sociedades-mães" ou "dominantes" e "sociedades-filhas" ou "dominadas", deixando de fora as relações "horizontais" estabelecidas entre "sociedades irmãs", ainda que sob domínio e controlo comuns. Contudo, no caso concreto das "relações de grupo", essa não se nos afigura ser a leitura mais correta. Com efeito, e desde

logo, porque o legislador fiscal, para efeitos específicos desta isenção, só considera relevantes os  "grupos" cuja direção económica unitária de duas ou mais sociedades, que conservam a sua personalidade jurídica autónoma e respetivas estruturas organizativas, resulte do preenchimento dos critérios legais estabelecidos naquela norma, formando-se, assim, entre as sociedades ditas "dominantes" e "dominadas", uma "relação de grupo", o que abre a possibilidade de no seu seio existirem e serem admitidas, para além das relações bilaterais caraterísticas das relações de coligação entre sociedades, relações plurilaterais entre as diversas sociedades que o compõem. Ou seja, só no seio de uma "relação de grupo", assumem relevância não só as relações existentes entre uma sociedade-mãe e cada uma das suas sociedades-filhas, mas também os vínculos que ligam estas sociedades (sociedades-irmãs) entre si. Esta circunstância, isto é, a existência de relações plurilaterais entre sociedades, impõe-se objetivamente numa "relação de grupo" e surge como uma consequência lógica da existência de um poder legal e unitário de direção que se pode manifestar, designadamente, no direito  da sociedade mãe ordenar transferências patrimoniais e de lucros entre quaisquer sociedades integradas no seu perímetro, incluindo entre sociedades-irmãs, desde que tal sirva os interesses do "grupo" e seja feito de forma diligente. Posto que, para efeitos da isenção prevista na alínea h) do n.º 1 do artigo 7.° do CIS, é nosso entendimento que o conceito de "relação de grupo", constante do n.° 8 daquele artigo, deverá ser interpretado no sentido de abranger também as relações "horizontais''. Isto é, as relações estabelecidas entre "sociedades-irmãs" sob domínio e controlo comuns relativamente às quais se verifique, direta ou indiretamente, o nível de participação e controlo previsto na norma - ou seja, pelo menos 75% do capital e mais de 50% dos direitos de voto, se mantidos por mais de um ano -, não se limitando essa "relação de grupo" às relações "verticais" estabelecidas entre "sociedades mães" e "sociedades-filhas", já compreendidas no conceito de "relação de domínio".

 

II -- CONCLUSÃO

Tendo presente o pedido da Requerente e o acima exposto é de concluir que:

Os fluxos financeiros resultantes da execução do "CONTRATO" de gestão centralizada de tesouraria que se analisou estão sujeitos a Imposto do Selo, nos termos previstos no CIS para estas operações e no modo referido pela Requerente. Independentemente de se tratar de empréstimos realizados entre "sociedades-irmãs", nos termos conjugados da alínea h) do n. º 1 do artigo 7.° do CIS com o n.° 8 do mesmo preceito, tais operações podem beneficiar da isenção, desde que verificado o outro pressuposto cumulativo aí previsto; isto é, o prazo de concessão/utilização dos fundos transferidos não deve ser superior a um ano.

Contudo, mesmo que, na perspetiva da Requerente, se encontrem preenchidos todos os pressupostos da isenção, atendendo à limitação de âmbito espacial imposta pelo n.° 2 daquele normativo , apenas as operações que se traduzam em utilizações de fundos (empréstimos) transferidos da conta bancária centralizadora, titulada pela "D", para a conta bancária da Requerente, poderão aproveitar da isenção, desde que tais fundos não tenham sido previamente obtidos pela "D" por recurso a financiamentos junto de instituições de crédito ou sociedades financeiras. Deste modo, ficam afastadas do benefício da isenção as operações realizadas em sentido inverso; isto é, as que se traduzam em utilizações de fundos excedentários transferidos da conta bancária da Requerente para a conta bancária centralizadora, titulada pela "D".

Cumpre salientar

60. Na IVE supracitada conclui-se "que poderão aproveitar da isenção, desde que tais fundos não tenham sido previamente obtidos pela "D" por recurso a financiamentos junto de instituições de crédito ou sociedades financeiras.

61. Adequando à informação prestada na IVE nº 18431 ao caso subjudice, mesmo quando se encontrassem preenchidos todos os pressupostos da isenção, o benefício fiscal apenas pode ser concedido, se tais fundos não tiverem sido previamente obtidos pela entidade centralizadora, por recurso a financiamentos junto de instituições de crédito ou sociedades financeiras, ou vice-versa, o que compete provar à Reclamante, nos termos do artº 74º da LGT.

62. Concluímos, pois, que apenas as transferências diárias de excedentes de liquidez apurados pelas empresas participantes no contrato (os quais são alocados às necessidades de tesouraria das empresas que se verifiquem a cada momento), poderão aproveitar da isenção prevista na ai) h) do n 1 do art7° do CIS, após comprovação de estarem cumpridos os pressupostos objetivos e subjetivos que a lei prevê, bem como deve ser realizada a prova de que os fluxos financeiros entre as sociedades do grupo provêm de excedentes de liquidez gerados pelo próprio Grupo, ou seja não provêm de financiamentos externos.

 

Sobre a prova apresentada

63. Sobre os dois documentos apresentados, mais concretamente, sobre o contrato de cash pooling, está redigido em língua estrangeira. Porém, essa prova carece de tradução para a língua portuguesa, conforme dispõem os art.s. 133° e 134° do Código do Processo Civil, aplicável por remição da alínea e) do artigo 2.° do CPPT.

64. Também não ficou esclarecido qual a posição da Reclamante dentro do Grupo C..., à data dos factos contestados (novembro de 2021 a novembro de 2023).

65. Por outro lado, apesar de terem sido juntos, ao requerimento petitório, dois documentos, também deles, não é possível inferir quais as operações descritas que têm por base excedentes de liquidez do grupo ou se decorrem de linha de crédito junto de instituições financeiras, disponibilizada através da conta da entidade centralizadora, o que inviabilizaria o benefício fiscal.

66. De facto, para provar a existência de excedentes de liquidez e o fluxo das operações financeiras subjacentes à liquidação do IS contestado, e se realizadas por prazo inferior a um ano, poderia por exemplo, ter sido junto aos autos, um extrato de conta corrente que refletisse os movimentos referentes ao contrato de cash pooling, bem como, um balancete mensal que evidenciasse o saldo mensal da respetiva conta.

67. Atendendo à situação aqui em apreciação e aos períodos de referência (novembro de 2021 a novembro de 2023), e à insuficiência de prova quanto aos fluxos financeiros realizados entre a Reclamante e a entidade centralizadora, que justifiquem a posição de credor da Reclamante, como concedente do crédito, cuja sede se situa em Portugal, conclui-se que nos termos do n.º 2 do artigo 7.° do CIS, não se encontram verificados todos os pressupostos das isenções previstas nas alíneas g) e h) do n.º 1 do mesmo artigo.

68. Nos termos do disposto no n.º 1 do art. 74,° da Lei Geral Tributária, "O ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da Administração Tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque".

69. A determinação legal do ónus da prova orienta as partes sobre os factos que devem provar e indica ao decisor qual a parte que deve ser afetada pela inexistência ou insuficiência da prova. O ónus da prova  interessa à apreciação do decisor que, perante uma situação de inexistência de prova de determinado facto, decidirá, contra quem tem o ónus da prova.

70. Não obstante o princípio do inquisitório, segundo o qual cabe à Administração Tributária o dever de procurar a verdade material, continuam a ser os particulares (quando o ónus da prova lhes é atribuído) com o dever de demonstração de determinados factos.

71. A inexistência ou insuficiência dessa demonstração terão como consequência a desconsideração do facto, que se terá como não verificado. Neste sentido decidiu o Ac. STA de 01-06-2011, (Processo nº 0211/11), do qual consta no Sumário "I-- Cabe à Administração o ónus da prova da verificação dos pressupostos da tributação e ao contribuinte o ónus da prova dos factos tributários que alega como fundamento do seu direito (...) "-citado no Sumário do Acórdão do STA, processo nº 060/13, de 03-04-2013.

72. Não estando preenchidos os pressupostos de que depende a concessão do benefício fiscal, é forçoso concluir que a Reclamante não pode usufruir do mesmo.

73. Assim concluímos que é devido imposto de selo pelas operações de gestão centralizada de tesouraria realizadas pela Reclamante, em que o sujeito passivo é a entidade concedente do crédito, tendo em conta o exposto, pelo que consideramos o pedido como improcedente.

74. Perante o exposto, somos a concluir pela improcedência dos argumentos da Reclamante, mantendo-se por isso válidas na ordem jurídica as liquidações de IS elencadas no Quadro 11., por referência aos períodos de novembro de 2021 a novembro de 2023, no montante de € 1.421.852,00, uma vez que a  Reclamante não logrou provar o preenchimento dos pressupostos da respetiva isenção, previstos nas alíneas g), h) e i) do n.° 1 do art.º 7.% do CIS.

 

VI. DO EXERCÍCIO DO DIREITO DE AUDIÇÃO

(...)

82. No âmbito da execução do referido contrato de gestão centralizada de tesouraria houve uma efetiva utilização de crédito pela entidade residente para efeitos fiscais no Reino Unido e na Hungria, em  virtude da sua concessão pela entidade residente, para efeitos fiscais, em Portugal, sendo incontestável que tais operações terem enquadramento no âmbito da incidência objetiva do IS, por força do n.° 1 do artigo 1.° do CIS e da verba 17.1.4 da TGIS.

83. Estabelece-se, por sua vez, no n.° 1 do artigo 4.° do CIS, sob a epígrafe "territorialidade", que "sem prejuízo das disposições do presente Código e da Tabela Geral em sentido diferente, o Imposto do Selo incide sobre todos os factos referidos no artigo 1.° ocorridos em território nacional."

84. Da factualidade acima descrita resulta que os empréstimos em causa foram concedidos em Portugal apesar do destinatário dos mesmos ter residência fora deste território, pelo que, competia à Reclamante, enquanto entidade concedente do crédito e sujeito passivo do imposto, liquidar, cobrar e entregar nos cofres do Estado o imposto repercutido à "B..." e "E...", conforme decorre da alínea b) do n.° 1 do artigo 2.°, da alínea f) do n.º 3 do artigo 3.°, da alínea g) do artigo 5.°, do n.º 1 do artigo 9.°, do n.° 1 do artigo 22.°, do n.° 1 do artigo 23.°, dos artigos 41.°e 43.°e do n.º 1 do artigo 44.°, todos do IS.

85. Exatamente a este propósito, como bem se equaciona na decisão arbitral n.° 279/2020-T:

 

"[...] em causa não está saber se este tipo de transferências de excedentes de tesouraria são operações enquadráveis na verba 17. 1. Sobre essa questão há consenso na jurisprudência do STA, que entende que "as operações de cash pooling estão sujeitas à tributação em imposto de selo nos termos do disposto no artigo 4%, n.° 1 do CIS e verba 17. 1.4 da TGIS". Dificilmente se poderia entender doutro modo. Por força dos contratos de cash pooling geram-se fluxos financeiros entre as empresas de um mesmo grupo económico que constituem, indiscutivelmente, movimentos de concessão e obtenção de crédito, permitindo que o grupo opere uma gestão de necessidades de fundos, através de compensação diária com os excedentes, evitando o recurso a métodos de satisfação das necessidades de tesouraria que passam pelo financiamento externo, propiciando uma gestão eficiente das disponibilidades de tesouraria através de um mecanismo de compensação entre excessos e necessidades de tesouraria dentro das empresas do grupo que participem neste sistema, reduzindo assim custos de transação e reforçando a posição negocial na busca de financiamento externo." (cf. ponto 30 da mesma).

86. Assim, como aí se refere:

"O que verdadeiramente está em causa, no presente processo, é se, tratando-se de excedentes utilizados em França pela I..., fica afastada incidência IS, por força da regra da territorialidade consagrada no artigo 4.° do CIS, ou, caso assim não se entenda, se, no caso de se tratar de operações que se inserem no âmbito de incidência do IS, é aplicável isenção, à face das alíneas g). h) e i) do n. e do n.° 2 do artigo 7,° do CIS, em consonância com o Direito da União Europeia." (cf. ponto 31 da mesma).

87. No mesmo sentido, também seguiu a decisão arbitral proferida no processo n.° 452/29018-T, concluindo-se igualmente que da conjugação das regras de incidência objetiva, previstas na verba 17.1 da TGIS, e as previstas no artigo 4.º do CIS, em especial do seu n.º 1, ou até da alínea b) do seu n.º 2, não se retira que o legislador tenha alguma vez desejado que o crédito concedido por uma entidade com residência em território nacional a favor de uma entidade não residente constituísse uma operação financeira não sujeita a Imposto do Selo pelo simples facto de esta última ter o seu domicílio fiscal no estrangeiro.

88. De resto, este entendimento da Reclamante conduz à distinção, para efeitos de sujeição, os fluxos financeiros (concessão/utilização de crédito) realizados exclusivamente entre entidades com sede ou direção efetiva em território nacional e entre estas e entidades com sede ou direção efetiva no estrangeiro, com a consequente discriminação fiscal de umas em favor de outras, ofendendo o princípio da igualdade de tratamento, da capacidade contributiva e, provocando, por essa via, uma distorção da concorrência, desconsiderando o princípio da neutralidade fiscal.

89. Efetivamente, perante fluxos financeiros materialmente idênticos aos aqui contestados, as pessoas residentes beneficiárias de crédito estariam sempre sujeitas ao pagamento de Imposto do Selo, ao passo que as não residentes beneficiárias de crédito, como no presente caso, não estariam sequer sujeitas, independentemente do local de utilização efetiva desses fundos, que poderia até ocorrer em território nacional.

90. De igual modo é ainda referido na decisão arbitral proferida no processo n.° 315/2022-T que, perante uma situação destas a Reclamante conseguiria, a final, obter um tratamento fiscal mais favorável do que o dispensado a outras empresas que praticassem o mesmo tipo de operações financeiras, o que não se compagina com o disposto no CIS, que não discrimina para efeitos de tributação entre entidades residentes e entidades não residentes que realizem operações financeiras que preencham o campo de incidência do Imposto do Selo.

91. Com efeito, no que respeita ao modo de determinação da matéria coletável e taxa aplicável às operações financeiras, o CIS equipara-as, não estabelecendo qualquer diferença de tratamento entre elas, garantindo as mesmas condições fiscais entre fluxos financeiros realizados entre entidades residentes, entre entidades não residentes e residentes e entre estas e entidades não residentes, como sucede no presente caso.

92. Nesta medida, para efeitos de sujeição, não existe qualquer discriminação entre entidades, uma vez que estas normas de incidência relativas ao Imposto do Selo são aplicadas indistintamente a todas as operações financeiras legalmente previstas, sem discriminação em função da nacionalidade, território ou tipo societário das entidades nelas envolvidas.

93. No que respeita aos relatórios de contas dos períodos de 2020, 2021 e 2022, juntos aos autos nesta sede, constatamos a existência de descobertos bancários que a Reclamante alega não terem natureza de financiamento, contudo, até à presente data não veio juntar aos autos o extrato de conta corrente que refletisse os movimentos referentes ao contrato de cash pooling, nem um balancete mensal que evidenciasse o saldo mensal da respetiva conta e as operações financeiras subjacentes à liquidação de IS que ora se discute.

94. Desta feita, a Reclamante não faz prova de que não recorreu a financiamentos bancários nos períodos em apreço.

95. Por outro lado, também não faz prova de que o crédito obtido foi, efetivamente, e em todas as situações, utilizado fora de Portugal.

96. Aliás, essa situação, num contrato de cash pooling, afigura-se bastante improvável, na medida em que os fluxos de dinheiro, de e para a Reclamante, acorrem numa base diária.

97. Face ao exposto, analisados que foram os fundamentos invocados, bem como os documentos apresentados, propõe-se o indeferimento do pedido mantendo-se por isso válidas na ordem jurídica as liquidações de IS elencadas no quadro li., por referência aos períodos de novembro de 2021 a novembro de 2023, no montante de€ 1.421.852,00.

 

  1. Em 21-06-2024, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.

 

2.2. Factos não provados e fundamentação da decisão da matéria de facto

 

2.2.1. Os factos antecedentes foram dados como provados com base nos documentos juntos com o pedido de pronúncia arbitral e os que constam do processo administrativo.

 

2.2.2. Os relatórios e contas da Requerente, que constam dos documentos 20 a 22 (documento n.º 20, página 51, Documento n.º 21 páginas 49 e 50, e documento n.º 22, páginas 51 e 52), corroborados pela informação e listas das movimentações diárias que consta do documento n.º 15, permitem concluir que a Requerente, antes dos financiamentos que fez à E.. no âmbito do contrato de cash-pooling, não recorreu a prévios financiamentos através de «linha de crédito junto de instituições financeiras, disponibilizada através da conta da entidade centralizadora», como aventa a Autoridade Tributária e Aduaneira no RIT, sem sequer indicar qualquer facto que possa indiciar que isso pudesse ter acontecido e sem realizar qualquer diligência no sentido de apurar da existência desses financiamentos.

Por outro lado, a existência de fluxos diários de transferências efectuadas pela Requerente para a conta de gestão centralizada de tesouraria, indicia que os valores transferidos resultam da sua actividade habitual.

Para além disso, o facto de a Requerente ter intervenção no contrato de cash-pooling, na generalidade dos movimentos, como cedente de liquidez (como se conclui do documento n.º 15 e seus anexos II e III) e o facto de ter efectuado transferência mensais para a B... revelam que a Requerente tinha permanente excesso de liquidez, o que aponta no sentido de não ter necessidade de recorrer a financiamento bancário, designadamente através de uma hipotética  linha de crédito disponibilizada através da conta da entidade centralizadora (os “descobertos bancários” verificados devem-se a insuficiências de tesouraria na data de relato).

Assim, a generalidade da prova que consta dos autos sobre essa matéria permite concluir que a Requerente não recorreu a quaisquer financiamentos bancários, nomeadamente através de qualquer linha de crédito.

 

2.2.3. No que concerne à duração das cedências e liquidez, a informação contabilística e os extractos de conta e as movimentações diárias no âmbito do contrato de cash-pooling e reembolso dos montantes transferidos diariamente no final de cada mês, que constam dos Anexos II e III do documento n.º 15, corroborados pelas declarações mensais para pagamento de imposto do selo, impõem que se conclua que todos os créditos foram concedidos pela Requerente por período muito inferior a um ano, o que está em sintonia com os próprios termos do contrato de cash-pooling.

 

 2.2.4. Quanto à utilização do crédito, o facto de as transferências diárias serem efectuadas para uma conta da Requerente no H... e desta para uma conta da E... e o facto de a Requerente, em todos os casos, ter tido intervenção como credora, leva a concluir que as cedências de liquidez no âmbito do contrato de cash-pooling eram utilizadas fora de Portugal, pois a E... não desenvolvia a sua actividade em Portugal (o que, aliás, nem sequer é aventado).

 

2.2.5. Não se provou que a Requerente tivesse utilizado cedências de liquidez efectuadas pela E... no período de Novembro de 2021 a Novembro de 2023.

Os anexos II e II do documento n.º 15 mostram que a Requerente foi sempre credora nas transferências efectuadas no âmbito do contrato.

 

2.2.6. Não se provou que tivessem sido feitas transferências para a B... no âmbito de qualquer contrato de cash-pooling.

A B... não é parte no contrato de cash-pooling que consta do documento n.º 14 junto com o pedido de pronúncia arbitral e não foi junto aos autos nem é invocado qualquer contrato desse tipo em que aquela seja interveniente juntamente com a Requerente.

Por outro lado, a própria Requerente autoliquidou separadamente o Imposto do Selo relativo ao cash-pooling e o relativo à política de grupo (anexos IV e V do documento n.º 15).

 

2.2.7. Não se provou também que as transferências efectuadas pela Requerente para a B... fossem efectuadas por esta se encontrar em situações de carências de tesouraria.

Nenhuma prova foi apresentada que permita concluir que a B... tivesse insuficiências de tesouraria, sendo alegado pela Requerente que elas foram efectuadas no âmbito da execução da política de grupo quanto a excedentes de liquidez, política esta cuja concretização não se provou que dependesse de carências de tesouraria da  B...

 

3. Matéria de direito

 

           3.1. Fundamentação relevante dos actos tributários     

 

           O processo arbitral tributário, como meio alternativo ao processo de impugnação judicial (n.º 2 do artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril), é, como este, um meio processual de mera legalidade, em que se visa eliminar os efeitos produzidos por actos ilegais, anulando-os ou declarando a sua nulidade ou inexistência [artigos 2.º do RJAT e 99.º e 124.º do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea a), daquele].

           Por isso, os actos impugnados têm de ser apreciados tal como foram praticados, não podendo o tribunal, perante a constatação da invocação de um fundamento ilegal como suporte da decisão administrativa, apreciar se a sua actuação poderia basear-se noutros fundamentos. ( [1] )

           Assim, a fundamentação sucessiva ou a posteriori não é relevante para aferir a sua suficiência, quando não acompanhada de revogação e prática de um novo acto. ( [2] )  

           O que, de resto, se compreende à luz dos direitos de defesa ínsitos no princípio constitucional da tutela judicial efectiva (arts. 20.º, n.º 1, e 268.º, n.º 4 da CRP), pois, se a Autoridade Tributária e Aduaneira tivesse invocado outros fundamentos da liquidação, a fundamentação da impugnação poderia ser diferente e as provas que o Sujeito Passivo a trazer ao processo poderiam ser diferentes.

           Por isso, o direito à tutela judicial efectiva não permite que o Tribunal conheça de possíveis fundamentos do acto impugnado que o sujeito passivo não teve oportunidade  de conhecer quando elaborou a sua impugnação e relativamente aos quais não teve oportunidade de utilizar todos os meios de defesa administrativos (reclamação graciosa, recurso hierárquico) e contenciosos (impugnação judicial o pedido de constituição do tribunal arbitral) que a lei prevê, nas condições em que a lei atribui esses direitos.

           Neste sentido, pode ver-se o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 01-07-2020, processo n.º 309/14.6BEBRG), em que se entendeu que:

      I – O tribunal, na apreciação da legalidade de uma decisão administrativa, não pode considerar que esta se alicerça noutros fundamentos que não aqueles que aí foram externados.

      II – Assim, não pode julgar improcedente a impugnação judicial da decisão que indeferiu o pedido de revisão de um acto tributário alicerçando-se na não verificação de um requisito se a AT não usou esse fundamento para indeferir aquele pedido.

  

 

           Nos casos em que uma decisão fundamentada da impugnação administrativa aprecia um acto sem fundamentação expressa (como sucede nos casos de reclamação graciosa de actos de autoliquidação), não se está perante uma situação em que o acto seja confirmativo, à face do preceituado no artigo 53.º, n.º 1, do CPTA, pois os actos de retenção na fonte não têm fundamentação originária emitida pela Administração Tributária.

           Por isso, a manutenção em impugnação administrativa de um acto de autoliquidação gera uma situação de revogação por substituição, em que o acto impugnado subsiste na ordem jurídica após a decisão com a fundamentação que dela consta, como está ínsito no artigo 173.º do Código do Procedimento Administrativo de 2015. ( [3] )

           Também neste caso, não é relevante a fundamentação posterior ao acto que decidir a impugnação administrativa.

           Assim, neste caso, é à face da fundamentação da decisão da reclamação graciosa que há que apreciar a legalidade dos actos de autoliquidação, sendo irrelevantes possíveis motivos de indeferimento que naquela não são invocados, designadamente os que apenas são invocados no processo contencioso impugnatório.

          

3.2. Posições das Partes e questões a decidir

 

A Requerente e a E... integravam o grupo B... entre Novembro de 2021 e Novembro de 2023, sendo detidas por esta a 100%.

A Requerente e a E... celebraram em 2009 um contrato de cash-pooling (gestão centralizada de tesouraria) que implementou um sistema de gestão de fluxos de tesouraria entre a Requerente e a E... .

Nos termos do contrato referido  os saldos de tesouraria são transferidos numa base diária a partir de uma conta no H... da A..., para conta da E... aberta junto do H..., onde ficarão concentrados, até ao montante máximo de € 200.000.000 e no fim do mês os montantes acumulados são reembolsados, iniciando-se a zeros, com contas saldadas em relação ao período mensal anterior, novo ciclo mensal de transferência de excedentes de tesouraria.

Da execução do contrato resultaram transferências de liquidez da Requerente para a E..., que foram reembolsadas no fim de cada mês.

Na sequência dos reembolsos, a Requerente transferiu os valores reembolsados para a B..., no âmbito de execução da política do grupo.

Como diz a Requerente, «não é controverso que, no caso concreto os fluxos da conta bancária da A..., quer para a E... quer para a B..., constituem operações financeiras que se consubstanciam na utilização de fundos concedidos e, como tal, têm enquadramento no âmbito de incidência objetiva do imposto do selo, por força do n.º 1 do artigo 1.º do CIS e da verba 17.1 da TGIS».

Por todas estas transferências de liquidez da Requerente para a E... e para a B... realizadas entre Novembro de 2021 e Novembro de 2023, foi autoliquidado Imposto do Selo, por aplicação da verba 17.1.4. da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), nos valores globais de  € 212.192,83 (cash-pooling) e de € 1.209.569,23 (Política de grupo), num total de € 1.421.852,06.

A Autoridade Tributária e Aduaneira indeferiu a reclamação graciosa apresentada pela Requerente por entender, em suma, o seguinte:

–  no âmbito da execução do referido contrato de gestão centralizada de tesouraria houve uma efetiva utilização de crédito pela entidade residente para efeitos fiscais no Reino Unido e na Hungria, em  virtude da sua concessão pela entidade residente, para efeitos fiscais, em Portugal, sendo incontestável que tais operações terem enquadramento no âmbito da incidência objetiva do IS, por força do n.° 1 do artigo 1.° do CIS e da verba 17.1.4 da TGIS;

– para efeitos de sujeição, não existe qualquer discriminação entre entidades, uma vez que estas normas de incidência relativas ao Imposto do Selo são aplicadas indistintamente a todas as operações financeiras legalmente previstas, sem discriminação em função da nacionalidade, território ou tipo societário das entidades nelas envolvidas;

– este tipo de operações financeiras consideram-se as operações realizadas em território nacional, nos termos dos n.ºs 1 e 2, alínea b), o artigo 4.º do Código do Imposto do Selo (CIS);

– por força do n.º 2 do artigo 7.º do CIS, apenas as operações que se traduzam em utilizações de fundos (empréstimos) transferidos da conta bancária centralizadora para a conta bancária da Requerente, poderão aproveitar da isenção. desde que tais fundos não tenham sido previamente obtidos por recurso a financiamentos junto de instituições de crédito ou sociedades financeiras; ficam afastadas do benefício da isenção as operações realizadas em sentido inverso, isto é, as que se traduzam em utilizações de fundos excedentários transferidos da conta bancária da Requerente para a conta bancária centralizadora;

– recai sobre  a Requerente o ónus da prova.

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira invocou na decisão da reclamação graciosa outros fundamentos para indeferimento da pretensão da Requerente, que estão prejudicados pela decisão da matéria de facto, designadamente: 

– verifica-se o requisito de relação de grupo em que se integram as sociedades intervenientes nos fluxos financeiros, nos termos previstos no n.º 8 do artigo 7.° do CIS;

– foi apresentada tradução do contrato de cash pooling;

– as operações descritas têm por base excedentes de liquidez do grupo e não decorrem de linha de crédito junto de instituições financeiras, disponibilizada através da conta da entidade centralizadora;

– foram juntos documentos que reflectem os movimentos referentes ao contrato de cash pooling;

– as cedências de liquidez foram, em todas as situações, utilizados fora de Portugal.

 

 

A Requerente defende que as autoliquidações de Imposto do Selo são ilegais porque, em suma:

– sendo os créditos utilizados fora de  Portugal, está-se fora do âmbito de incidência territorial Imposto do Selo [violação do artigo 4.º, n.º 1 e n.º 2, alínea b), do Código do Imposto do Selo (CIS)];

– no caso das operações de crédito em causa, o facto tributário a considerar é a utilização do crédito, haverá lugar a tributação em sede de Imposto do Selo apenas quando esse mesmo facto tributário (a utilização do crédito) ocorra em território nacional, o que não se verifica quando o mutuante seja entidade com sede em Portugal e o mutuário não seja residente em território português;

– adicionalmente, é aplicável à cedência diária de liquidez à E... (cash-pooling), das isenções de Imposto do Selo sobre as operações financeiras previstas no artigo 7.º, n.º 1, alínea h) (na redacção em vigor desde 1 de Abril de 2020), do Código do Imposto do Selo (CIS), enfermando a decisão da reclamação graciosa de erro quanto à interpretação desta norma e desconformidade com os artigos 63.º e 65.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE).

 

No presente processo, a Autoridade Tributária e Aduaneira mantém a posição defendida na decisão da reclamação graciosa, citando jurisprudência em abono das suas posições, dizendo anda, em suma:

–  embora para efeitos do CIS, o titular do interesse económico, sobre quem recai o encargo do Imposto do Selo, seja o utilizador do crédito, nos termos da alínea  f) do n.º 3 do artigo 3.º do CIS, o facto tributário é a concessão de crédito, o que decorre do próprio texto daquela alínea  ao referir que se considera titular do interesse económico “na concessão do crédito, o utilizador do crédito”, e não “na utilização do crédito, o utilizador do crédito”, como seria adequado se o facto tributário fosse a utilização;

– a utilização de crédito com base em negócio jurídico de concessão de crédito é que torna aparente o contrato de concessão de crédito que o legislador quer tributar. Até que essa utilização se verifique, não há lugar a tributação e esta, quanto à sua taxa, depende muito do valor e periodicidade da utilização;

– a conexão relevante para aferir a incidência territorial do Imposto do Selo, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 4.º do CIS, é o local da concessão do crédito, independentemente da residência do seu utilizador ou do local onde o mesmo é utilizado;

– a Requerente não demonstra, tal como lhe competia, nos termos do n.º 1 do art.º 74.º da Lei Geral Tributária, que aqueles valores foram concedidos por um   período de tempo inferior ao prazo de um ano indicado na norma como requisito para aproveitamento da isenção, o que inviabiliza a que se possa dar como provada a verificação desse pressuposto da isenção neste crédito;

– cabia à recorrente demonstrar o facto por si alegado.

 

Assim, as questões a decidir são a de saber se há aplicação de tributação em Imposto do Selo, à face do princípio da territorialidade, quanto às cedências de liquidez efectuadas pela Requerente à B... e à E... e, em relação a estas últimas, ainda saber se é aplicável a isenção prevista na alínea h) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS.

Adicionalmente, no caso de procedência de alguma dos pretensões da Requerente, haverá que apreciar os pedidos de reembolso e juros indemnizatórios.

 

              3.3. Questão da aplicação do CIS quanto aos créditos utilizados fora do território português

 

A verba 17.1.4 da Tabela Geral do Imposto do Selo estabelece que incide Imposto do Selo sobre «crédito utilizado sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou qualquer outra forma em que o prazo de utilização não seja determinado ou determinável, sobre a média mensal obtida através da soma dos saldos em dívida apurados diariamente, durante o mês, divididos por 30».

O Supremo Tribunal Administrativo proferiu, em 28-11-2018, decisão no processo n.º 06/11.4BESNT 0436/16, em que apreciou, entre outras,  a questão de saber se o crédito sob a forma de conta corrente, concedido por uma entidade com sede em território português a uma entidade com sede noutro Estado, no qual se procederá à utilização do crédito, é sujeita a IS em Portugal ao abrigo do disposto no artigo 4.º, n.º 1, do CIS.

              É esta a primeira questão colocada no presente processo, quanto às cedências de liquidez efectuadas pela Requerente à B... e E... .

O Supremo Tribunal Administrativo decidiu o seguinte:

 

“Com esta verba do IS pretende-se tributar as transferências de saldos entre a impugnante, enquanto empresa nacional, e a entidade centralizadora, sedeada na Suécia, devendo tais transferências de saldos ser qualificadas como financiamentos concedidos também para efeitos do disposto no artigo 4º, n.º 1 do CIS. Portanto, no caso concreto, incumbiria à impugnante a liquidação do imposto de selo, na qualidade de concedente do crédito, que seguidamente o deveria debitar à A’………… não residente.

E tais transferências de saldos, tanto são tributadas quando ocorrem entre empresas nacionais, entre empresas de estados-membros ou até entre empresas de estados-membros e de países terceiros, aplicando-se sempre as normas constantes dos artigos 1º. n º 1, 2º, b), 3º, n.º 1, f), 4º, n.º 1, 23º, n.º 1, 41º e 44º, todos do CIS.

Nesta medida, não se vislumbra que sejam ofendidas as normas do artigo 63º do TFUE e 40º do Acordo EEE, que consagram a livre circulação de capitais, uma vez que estas normas relativas ao IS são aplicadas indistintamente a todas as operações económicas legalmente previstas, sem discriminação em função da nacionalidade ou do território, quando duas empresas operem nas mesmas condições e sujeitas aos mesmos acordos que a impugnante e a A’………., em sentido coincidente, onde se decidiu que o direito da União era ofendido por haver um tratamento diferente em razão do território, pode ver-se o acórdão do TJUE proferido no processo n.º C-439/97.

Efectivamente a operação de transferência de capitais realizada entre a impugnante e a dita A’…………, e ao contrário do que defende a impugnante, tem que ser necessariamente subsumida ao disposto no artigo 4º, n.º 1 do CIS e respectiva verba 17.1.4 da TGIS, desde logo porque tem que ser qualificada como uma operação de crédito com contrapartida, isto é, remunerada por via do pagamento dos juros calculados a uma taxa acordada entre as partes e durante o período de tempo de duração da cedência do capital. E sempre que haja a utilização desse mesmo capital por parte da A’………..–crédito utilizado- ocorre a possibilidade de tributação ao abrigo das normas respeitantes ao CIS e à TGIS atrás indicadas”.

 

À luz deste acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, deverá entender-se que, embora para efeitos do CIS o titular do interesse económico, sobre quem recai o encargo do Imposto do Selo, seja o utilizador do crédito [nos termos do artigo 3.º, n.º 3, alínea f), do CIS], o facto tributário é a concessão de crédito, o que decorre do próprio texto desta alínea f) ao referir que se considera titular do interesse económico «na concessão do crédito, o utilizador do crédito» (e não «na utilização do crédito, o utilizador do crédito», como seria adequado se o facto tributário fosse a utilização).

No mesmo sentido de o facto tributário ser a concessão do crédito aponta a globalidade do regime legal, ao considerar sujeito passivo quem concede o crédito [de harmonia com o disposto no artigo 2.º, n.º 1 alínea b), do mesmo Código], incumbi-lo da liquidação do imposto «devido por operações de crédito» (nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 23.º do mesmo Código) e impondo-lhe a obrigação de efectuar o seu pagamento (artigo 41.º do CIS).

Haverá que ter presente, ao nível do imposto do selo, quem é o sujeito passivo de direito (artigo 2º do CIS – a entidade que tem a obrigação de liquidar, cobrar e entregar o imposto ao Estado) e quem é o sujeito passivo de facto (artigo 1º e artigo 3º do CIS – a entidade que é a titular do interesse económico, quem suporta efetivamente o encargo do imposto). Ou seja, em regra, o sujeito passivo de direito procede à liquidação do imposto e repercute-o (efectua a sua cobrança) perante o sujeito passivo de facto que é o titular do interesse económico no facto tributário sujeito a imposto do selo e depois de cobrado, procede à sua entrega ao Estado.

O facto de apenas haver lugar a tributação quando o crédito concedido for utilizado, que resulta da verba 17.1 da TGIS, não obsta ao entendimento, que estará subjacente ao referido acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de que as «operações financeiras» que se pretendem tributar são as de concessão de crédito que apenas se consideram concretizadas no momento em que o crédito concedido é utilizado.

Isto é, o facto tributário é constituído pela «utilização de crédito (...) em virtude da concessão de crédito», a que se refere a verbas 17.1., subjacente à verba 17.1.4. A concessão de crédito é a «operação financeira» que se pretende tributar. Ou, como diz a Autoridade Tributária e Aduaneira, «o imposto incide sobre a utilização do crédito em resultado de uma operação de concessão de crédito», sendo esta operação a «operação financeira» que é objecto de incidência no âmbito de todas as situações previstas na verba 17. da TGIS.

Aliás, é também esse o entendimento adoptado no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 14-03-2018, proferido no processo n.º 0800/17, citado pelo Requerente no artigo 108.º do pedido de pronúncia arbitral, como se vê pelo respectivo sumário:

 

“I - A concessão de crédito está sujeita a imposto do selo, qualquer que seja a natureza e forma, relevando, contudo, para o efeito a efectiva utilização do crédito concedido.

II - O facto tributário eleito para tributação em imposto de selo é, sempre, a concessão de crédito - prestação de valores monetários de uma parte a outra obrigando-se esta última a restituir aquele montante (em singelo ou acrescido de valor convencionado), no futuro.

III - A mera celebração do contrato de concessão de crédito nem sempre gera facto tributário do imposto. Quando a utilização do crédito for imediata, o facto tributário emerge na data de utilização que coincide com a data de celebração do contrato de concessão de crédito.

IV - Quando a utilização do crédito não for imediata, o facto tributário emerge na data de utilização que não coincide com a data de celebração do contrato concessão de crédito”.

 

Sendo assim, a conexão relevante para aferir a incidência territorial do Imposto do Selo é o local da concessão do crédito, que determina o dever de liquidar do concedente.

É certo que a solução da questão não será pacífica, como se vê pela decisão arbitral de 06-11-2019, proferida no processo n.º 61/2019-T.

Mas, estando-se, tanto no caso do acórdão proferido no processo 06/11.4BESNT 0436/16, como no proferido no processo 0800/17, perante decisões do Supremo Tribunal Administrativo, proferidas por unanimidade, sobre uma questão idêntica à que se coloca neste processo, afigura-se, que um Tribunal que julga em 1ª instância, como é este Tribunal Arbitral, deverá aderir a essa jurisprudência, pelos fundamentos invocados, que têm suporte legal nas normas invocadas.

Improcede, assim, o primeiro fundamento invocado pela Requerente às autoliquidações impugnadas.

 

3.4. Questão da  aplicação na cedência diária de liquidez à E... (cash-pooling), das isenções de Imposto do Selo sobre as operações financeiras previstas no artigo 7.º, n.º 1, alínea h) (na redacção em vigor desde 1 de Abril de 2020), do CIS

 

A Requerente defende que «ainda que se conclua pela sujeição a Imposto do Selo das referidas operações de crédito nas quais a A... assumiu a posição de mutuante face à  E... (...), entende a requerente que são ilegais os actos de liquidação de Imposto do Selo sobre essas utilizações de crédito, por violação do disposto no artigo 7.º, n.º 1, alínea  h) (na redacção em vigor desde 1 de Abril de 2020), do CIS, na medida em que entende serem aplicáveis ao caso concreto a isenção prevista na referida norma». 

O artigo 7.º do CIS estabelece o seguinte, na redacção vigente em 2021, resultante da Lei n.º 2/2020, de 31 de Março), no aqui interessa:

 

Artigo 7.º
Outras isenções

 

1 - São também isentos do imposto:

 

(...)

 

h) Os empréstimos, incluindo os respetivos juros, por prazo não superior a um ano, quando concedidos por sociedades, no âmbito de um contrato de gestão centralizada de tesouraria, a favor de sociedades com a qual estejam em relação de domínio ou de grupo; (redacção introduzida pela Lei n.º 2/2020, de 31 de Março)

 

2 - O disposto nas alíneas g) e h) do n.º 1 não se aplica quando qualquer dos intervenientes não tenha sede ou direcção efectiva no território nacional, com excepção das situações em que o credor tenha sede ou direcção efectiva noutro Estado membro da União Europeia ou num Estado em relação ao qual vigore uma convenção para evitar a dupla tributação sobre o rendimento e o capital acordada com Portugal, caso em que subsiste o direito à isenção, salvo se o credor tiver previamente realizado os financiamentos previstos nas alíneas g) e h) do n.º 1 através de operações realizadas com instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no estrangeiro ou com filiais ou sucursais no estrangeiro de instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no território nacional.

 

Com a Lei n.º 12/2022, de 27 de Junho, este n.º 2 passou a ter a seguinte redacção:

   

 

2 - O disposto nas alíneas g) e h) do n.º 1 não se aplica quando qualquer dos intervenientes não tenha sede ou direção efetiva no território nacional, com exceção das situações em que o credor ou o devedor tenha sede ou direção efetiva noutro Estado-Membro da União Europeia ou num Estado em relação ao qual vigore uma convenção para evitar a dupla tributação sobre o rendimento e o capital acordada com Portugal, caso em que subsiste o direito à isenção, salvo se o credor tiver previamente realizado os financiamentos previstos nas alíneas g) e h) do n.º 1 através de operações realizadas com instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no estrangeiro ou com filiais ou sucursais no estrangeiro de instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no território nacional.

 

3.4.1. O regime legal previsto no artigo 7.º, n.º 1, alínea h) e n.º 2 do CIS

 

 

Na alínea h) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS prevê-se isenção de Imposto do Selo para «os empréstimos, incluindo os respetivos juros, por prazo não superior a um ano, quando concedidos por sociedades, no âmbito de um contrato de gestão centralizada de tesouraria, a favor de sociedades com a qual estejam em relação de domínio ou de grupo».

D matéria de facto fixada conclui-se que a situação da Requerente se enquadra na previsão desta norma, quanto às operações entre ela e a E..., pois foram realizadas no âmbito de um contrato de gestão centralizada de tesouraria, os empréstimos foram por período inferior a um ano e as sociedades enquadram-se no mesmo grupo.

No entanto, no que concerne às operações realizadas até  à entrada em vigor da Lei n.º- 2/2020, de 31 de Março, a aplicação da isenção era afastada pelo n.º 2 do mesmo artigo 7.º, pois nos casos em que qualquer dos intervenientes não tivesse sede ou direcção efectiva no território nacional, só mantinha a isenção nas «situações em que o credor tenha sede ou direcção efectiva noutro Estado membro da União Europeia ou num Estado em relação ao qual vigore uma convenção para evitar a dupla tributação sobre o rendimento e o capital acordada com Portugal».

Como a E... figurou sempre como devedora, e não como credora, nas operações realizadas no âmbito do contrato de cash-pooling, tem de se concluir que este n.º 2, na redacção anterior à Lei n.º 2/2020, afastava a aplicação da isenção.

Porém, esse afastamento da isenção não ocorre quanto às operações financeiras realizadas após a entrada em vigor da redacção do n.º 2 introduzida pela Lei n.º 12/2022, de 27 de Junho, pois estabelece que subsiste a isenção nas situações em que o credor ou o devedor tenha sede ou direção efetiva noutro Estado-Membro da União Europeia ou num Estado em relação ao qual vigore uma convenção para evitar a dupla tributação sobre o rendimento e o capital acordada com Portugal».

Na verdade, resulta da matéria de facto fixada que não se verifica a excepção prevista na parte final deste n.º 2, pois a Requerente não realizou os financiamentos ocorridos no âmbito do contrato de cash-pooling «através de operações realizadas com instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no estrangeiro ou com filiais ou sucursais no estrangeiro de instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no território nacional».

Assim, tem de se concluir que, resulta da redacção do artigo 7.º do CIS vigente após a 12/2022, de 27 de Junho, que é aplicável a isenção de Imposto do Selo, mas, à face da redacção anterior, era afastada a isenção.

 Assim, quanto às operações anteriores à entrada em vigor da Lei n.º 12/2022, de 27 de Junho, só por imposição de normas de hierarquia superior poderá este regime ser afastado, o que é propugnado pela Requerente, ao considerar tal regime incompatível com o Direito da União Europeia.  

 

3.4.2. Questão da incompatibilidade do regime do artigo 7.º do CIS com o Direito da União Europeia

 

A Requerente defende que deve ser aplicada a isenção prevista na alínea g) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS, por, em suma, o afastamento da sua aplicação nas situações em que o devedor tem sede ou direcção efectiva num Estado Membro da União Europeia não poder ser aplicado, por ser incompatível com os artigos 63.º e 65.º do Tribunal de Justiça da União Europeia (TFUE) e ser discriminatório.

O artigo 8.º, n.º 4, da CRP estabelece que «as disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respectivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático».

Desta norma decorre o primado do Direito da União Europeia sobre o Direito Interno, quando não está em causa os princípios fundamentais do Estado de direito democrático.

Como tem sido pacificamente entendido pela jurisprudência e é corolário da obrigatoriedade de reenvio prejudicial prevista no artigo 267.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (que substituiu o artigo 234.º do Tratado de Roma, anterior artigo 177.º), a jurisprudência do TJUE tem carácter vinculativo para os Tribunais nacionais, quando tem por objecto questões de Direito da União Europeia ([4] ).

Os artigos 63.º e 65.º do TJUE estabelecem o seguinte:

 

Artigo 63.º

(ex-artigo 56.º TCE)

 1. No âmbito das disposições do presente capítulo, são proibidas todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados-Membros e entre Estados-Membros e países terceiros.

2. No âmbito das disposições do presente capítulo, são proibidas todas as restrições aos pagamentos entre Estados-Membros e entre Estados-Membros e países terceiros.

 

Artigo 65.º

(ex-artigo 58.º TCE)

 1.  O disposto no artigo 63.º não prejudica o direito de os Estados-Membros:

 a)  Aplicarem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido;

b) Tomarem todas as medidas indispensáveis para impedir infrações às suas leis e regulamentos, nomeadamente em matéria fiscal e de supervisão prudencial das instituições financeiras, preverem processos de declaração dos movimentos de capitais para efeitos de informação administrativa ou estatística, ou tomarem medidas justificadas por razões de ordem pública ou de segurança pública.

 2. O disposto no presente capítulo não prejudica a possibilidade de aplicação de restrições ao direito de estabelecimento que sejam compatíveis com os Tratados.

 3. As medidas e procedimentos a que se referem os n.ºs 1 e 2 não devem constituir um meio de discriminação arbitrária, nem uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais e pagamentos, tal como definida no artigo 63.º.

4. Na ausência de medidas ao abrigo do n.º 3 do artigo 64.º, a Comissão, ou, na ausência de decisão da Comissão no prazo de três meses a contar da data do pedido do Estado-Membro em causa, o Conselho, pode adotar uma decisão segundo a qual as medidas fiscais restritivas tomadas por um Estado-Membro em relação a um ou mais países terceiros são consideradas compatíveis com os Tratados, desde que sejam justificadas por um dos objetivos da União e compatíveis com o bom funcionamento do mercado interno. O Conselho delibera por unanimidade, a pedido de um Estado-Membro.

 

  Os empréstimos de curto prazo são movimentos de capitais, como resulta da Directiva n.º 88/361/CEE, do Conselho de 24-06-1988, o que não é objecto de controvérsia.

A questão em apreço, foi objecto de várias decisões arbitrais que, na sequência da decisão arbitral de 06-10-2020, proferida no processo n.º 277/2020-T, concluíram pela incompatibilidade daquele n.º 2 do artigo 7.º do CIS, na redacção anterior à Lei n.º  12/2022, de 27 de Junho, com o artigo 63.º, n.º 1, conjugado com o artigo 65.º, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE).

O TJUE, no acórdão 14-10-1999, proferido no processo n.º C-439/97, Sandoz GmbH, o seguinte (com actualização dos números dos artigos), em suma:

– a proibição do artigo 63.º, n.º 1, do TFUE (anteriores artigo 73.º-B, n.º 1, e 56.º do Tratado CE) abrange quaisquer restrições aos movimentos de capitais entre os Estados-Membros e entre os Estados-Membros e países terceiros (n.º 18);

–  uma legislação que priva os residentes num Estado-Membro da possibilidade de beneficiarem de uma eventual não tributação dos mútuos contraídos fora do território nacional, é uma medida de molde a dissuadi-los de contraírem mútuos com pessoas estabelecidas noutros Estados-Membros (n.º 19 daquele acórdão, citando o acórdão de 14 de Novembro de 1995, Svensson e Gustavsson, C-484/93, Colect., p. I-3955, n.º 10).

– tal legislação constitui por isso uma restrição aos movimentos de capitais no sentido do artigo 63.º, n.º 1 do TFUE (anteriores artigos 73.º-B, e 56.º) (n.º 20).

 

É precisamente uma situação deste tipo que gera o afastamento da isenção prevista na alínea g) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS.

Na verdade, à face deste regime, os residentes num Estado-Membro (Hungria) são privados da possibilidade de beneficiarem de uma eventual não tributação dos mútuos contraídos fora do seu território nacional.

O facto de o sujeito passivo do imposto ser o credor (a Requerente) e não o devedor não afasta esta conclusão.

Na verdade, embora não se esteja perante uma situação de substituição tributária em sentido próprio (que se efectua através de retenção na fonte do imposto liquidado pelo substituto, nos termos do artigo 20.º da LGT), está-se perante uma situação em que se admite (e legalmente se pretende) a repercussão económica do imposto em relação ao titular do interesse económico, que é o utilizador do crédito, que deve suportar o encargo do imposto, nos termos dos n.ºs 1 e 3, alínea f), do artigo 3.º do CIS.

Aliás, nestas situações de substituição fiscal imprópria, no caso de não pagamento do imposto pelo sujeito passivo (credor), o imposto até poderá ser exigido directamente ao titular do interesse económico, designadamente nos casos de operações de cash pooling, como entendeu o Supremo Tribunal Administrativo no acórdão de 19-02-2020, proferido no processo n.º 2244/12.3BEPRT 0898/17. ( [5] )

Por isso, este regime legal reconduz-se a que, na perspectiva legislativa, é sempre o utilizador do crédito que acaba por pagar o Imposto do Selo, seja por ele lhe ser repercutido pela entidade concedente, seja por ele lhe ser directamente exigido.

Assim, o afastamento da isenção nas situações em que devedor tenha sede ou direcção efectiva num Estado Membro constitui uma restrição aos movimentos de capitais no sentido do artigo 63.º, n.º 1, do TFUE, que só pode ser admitida nas situações previstas no artigo 65.º do mesmo diploma.

Na alínea a) do n.º 1 do artigo 65.º do TFUE, permite-se aos Estados-Membros «aplicarem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido».

Na interpretação deste artigo 65.º o TJUE entendeu o seguinte, no acórdão de 22-11-2018, proferido no processo n.º C-575/17 - Sofina SA:

45. Esta disposição, na medida em que constitui uma derrogação ao princípio fundamental da livre circulação de capitais, deve ser objeto de interpretação estrita. Por conseguinte, não pode ser interpretada no sentido de que qualquer legislação fiscal que comporte uma distinção entre os contribuintes em função do lugar onde residam ou do Estado‑Membro onde invistam os seus capitais será automaticamente compatível com o Tratado. Com efeito, a derrogação prevista no artigo 65.o, n. o 1, alínea a), TFUE é ela própria limitada pelo disposto no n.º 3 desse mesmo artigo, que prevê que as disposições nacionais a que se refere o n.º 1 «não devem constituir um meio de discriminação arbitrária, nem uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais e pagamentos, tal como definida no artigo 63.o [TFUE]» (Acórdão de 17 de setembro de 2015, Miljoen e o., C‑10/14, C‑14/14 e C‑17/14, EU:C:2015:608, n.º 63).»

46. Assim, há que distinguir as diferenças de tratamento autorizadas pelo artigo 65.o, n.º 1, alínea a), TFUE das discriminações proibidas pelo artigo 65.o, n. 3, TFUE. Ora, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, para que uma legislação fiscal nacional possa ser considerada compatível com as disposições do Tratado relativas à livre circulação de capitais, é necessário que a diferença de tratamento que daí resulta respeite a situações não comparáveis objetivamente ou se justifique por uma razão imperativa de interesse geral (Acórdão de 17 de setembro de 2015, Miljoen e o., C‑10/14, C‑14/14 e C‑17/14, EU:C:2015:608, n. o  64).

 

3.4.2.1. Comparabilidade das situações

 

No caso em apreço, está-se perante um imposto de obrigação única, devido relativamente a cada acto de concessão de crédito, e os intervenientes num contrato de cash pooling encontram-se em situações idênticas, independentemente do local da sua residência  ou do local onde o capital é investido, havendo mesmo possibilidade de frequentes inversões das posições de credor e devedor no âmbito do mesmo contrato, em função das disponibilidades e necessidades de tesouraria de cada um dos intervenientes.

Assim, tem de se concluir pela comparabilidade das situações entre residentes e não residentes, para efeitos da isenção em causa, em contratos do tipo do dos autos. 

Neste contexto, a atribuição de uma vantagem fiscal aos devedores residentes em Portugal que é recusada aos devedores não residentes constitui uma diferença de tratamento entre estas duas categorias de contribuintes, que é de qualificar como discriminação, na acepção do Tratado, por não existir qualquer diferença objectiva de situação susceptível de justificar tratamento diferenciado.

Assim, a alínea a) do n.º 1 e o n.º 3 do artigo 65.º do TFUE não permitem o regime consubstanciado nas referidas normas do CIS, pois a diferença de tratamento não é justificada por uma diferença de situação objetiva.

 

3.4.2.2. Razões imperiosas de interesse geral

 

A alínea b) do n.º 1 deste artigo 65.º do TFUE admite que os Estrados Membros tomem «todas as medidas indispensáveis para impedir infrações às suas leis e regulamentos, nomeadamente em matéria fiscal e de supervisão prudencial das instituições financeiras, preverem processos de declaração dos movimentos de capitais para efeitos de informação administrativa ou estatística, ou tomarem medidas justificadas por razões de ordem pública ou de segurança pública».

Como se vê pelo n.º 46 do citado acórdão proferido no processo n.º C-575/17, o TJUE entende que, relativamente a situações comparáveis, a diferença de tratamento só pode ser justificada «por uma razão imperativa de interesse geral».

No caso em apreço, afigura-se ser manifesto que não existe qualquer razão de interesse geral que possa justificar a referida discriminação, o que nem sequer é aventado pela Administração Tributária.

Na verdade, está-se perante uma situação que não há dificuldades de eficaz controlo fiscal, pois há possibilidade de a Administração Tributária fazer uso das trocas de informações previstas na generalidade das Convenções para evitar Dupla Tributação ([6] ).

Por outro lado, não se vislumbra qualquer outra razão de interesse público que possa justificar o tratamento discriminatório referido, designadamente uma hipotética intenção legislativa de evitar fraudes e abusos no âmbito das operações de tesouraria de curto prazo entre empresas do mesmo grupo, pois a intenção geral que está ínsita na atribuição dos benefícios fiscais previstos nas alíneas g) a i) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS, não pode ser a de «impedir comportamentos que consistam em criar expedientes puramente artificiais, desprovidos de realidade económica, cujo objetivo é beneficiar indevidamente de uma vantagem fiscal», que podem justificam restrições à livre circulação de capitais (Acórdãos do TJUE de 05-07-2012, SIAT, processo C-318/16, EU:C:2017:415, n.º 40; de 07-09-2017, Eqiom e Enka, processo C-6/16, EU:C:2017:641, n.º 30; e de 20-09-2018, EV, processo C-685/16, n.º 95), mas, será, pelo contrário, de admitir ou mesmo incentivar esses comportamentos, concedendo benefícios fiscais.

Pelo exposto, conclui-se que o afastamento da aplicação da isenção prevista na alínea g) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS que se prevê no n.º 2 do mesmo artigo, na redacção anterior `^â Lei n.º 12/2022, de 27 de Junho, nas situações em que o devedor não tem sede ou direcção efectiva em Portugal, mas a tem num Estado Membro da União Europeia, constitui uma restrição injustificada à liberdade de movimentos de capitais garantida pelo artigo 63.º do TFUE, pelo que esta restrição não pode ser aplicada, por forma do preceituado no n.º 4 do artigo 8.º da CRP.

 

3.4.2.3. Desnecessidade de reenvio prejudicial

 

No artigo 19.º, n.º 3, alínea b) e no artigo 267.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia prevê-se o reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), que é obrigatório quando uma questão sobre a interpretação dos actos adoptados pelas instituições, órgãos ou organismos da União seja suscitada em processo pendente perante um órgão jurisdicional nacional cujas decisões não sejam susceptíveis de recurso judicial previsto no direito interno.

No entanto, quando a lei europeia seja clara e quando já haja um precedente na jurisprudência europeia não é necessário proceder a essa consulta, como o TJUE concluiu no Acórdão de 06-10-1982, Caso Cilfit, Proc. 283/81.

Até mesmo quando as questões em apreço não sejam estritamente idênticas (doutrina do acto aclarado) e quando a correcta aplicação do Direito da União Europeia seja tão óbvia que não deixe campo para qualquer dúvida razoável no que toca à forma de resolver a questão de Direito da União Europeia suscitada (doutrina do acto claro) (idem, n.º 14).

Como se refere no n.º 33 do acórdão do TJUE de 22-11-2018, MEO, processo C-295/17, «Segundo jurisprudência constante do TJUE, «no âmbito da cooperação entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais instituída pelo artigo 267.º TFUE, o juiz nacional,  a  quem  foi  submetido  o  litígio  e  que  deve  assumir  a  responsabilidade  pela  decisão judicial a tomar, tem competência exclusiva para apreciar, tendo em conta as especificidades do processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência  das  questões  que  submete  ao  Tribunal.  Consequentemente, desde que as questões submetidas sejam relativas à interpretação do direito da União, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a pronunciar-se (Acórdão de 6 de março de 2018, SEGRO e Horváth, C-52/16 e C-113/16, EU:C:2018:157, n. o 42 e jurisprudência referida)».

No caso em apreço, para além de a citada jurisprudência anterior do TJUE permitir dar uma resposta segura às questões de Direito da União Europeia que se suscitam no processo, constata-se, recentemente, o TJUE prenunciou-se especificamente no sentido da compatibilidade daquele n.º 2 do artigo 7.º do CIS,  na redacção anterior a Lei n.º 12/2022, de 27 de Junho, no acórdão de 20-06-2024, processo n.º C-420/23, em que se decidiu:

 

O artigo 63.º TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado-Membro segundo a qual as operações de tesouraria de curto prazo estão isentas de imposto do selo quando nestas intervenham duas entidades estabelecidas nesse Estado-Membro, mas não estão isentas quando o mutuário esteja estabelecido noutro Estado-Membro.      

 

Na fundamentação desta decisão, refere-se no acórdão do TJUE, além do mais, o seguinte:

“Quanto à livre circulação de capitais

 21  O artigo 63.º, n.º 1, TFUE proíbe, de maneira geral, os entraves aos movimentos de capitais entre os Estados-Membros. As medidas proibidas por esta disposição, enquanto restrições aos movimentos de capitais, incluem as que são suscetíveis de dissuadir os não residentes de investir num Estado-Membro ou de dissuadir os residentes desse Estado-Membro de investir noutros Estados (Acórdão de 27 de abril de 2023, L Fund, C-537/20, EU:C:2023:339, n.º 42 e jurisprudência referida).

 22  No caso em apreço, resulta do pedido de decisão prejudicial que o CIS prévia, em caso de concessão de empréstimos por um residente português, regras de tributação diferentes consoante o mutuário residisse ou não em Portugal, estando prevista uma isenção do imposto do selo unicamente no primeiro caso.

 23  Tal diferença de tratamento é suscetível de tornar menos atrativos, para os residentes portugueses, investimentos como a concessão de empréstimos, realizados no estrangeiro, em relação aos investimentos realizados no território português. Esta diferença de tratamento produz também um efeito restritivo em relação aos mutuários não residentes, uma vez que constitui um obstáculo à recolha de capitais em Portugal que os mutuários residentes não encontram.

 24  Neste contexto, é irrelevante o facto de, segundo a legislação portuguesa em causa no processo principal, o sujeito passivo do imposto do selo ser o mutuante estabelecido em Portugal e não o mutuário estabelecido noutro Estado-Membro. Com efeito, o facto de o exercício da livre circulação de capitais se tornar menos atrativo devido a uma regulamentação fiscal nacional que trata diferentemente uma situação interna e uma situação transfronteiriça basta, por si só, para demonstrar a existência de uma restrição.

 25  Além disso, também não é suscetível de demonstrar a inexistência de uma restrição à livre circulação de capitais o argumento do Governo Português segundo o qual o imposto do selo não constitui um encargo fiscal para o mutuante, uma vez que são os mutuários que suportam efetivamente o imposto, embora, regra geral, tenham a possibilidade de deduzir o seu montante no âmbito do imposto sobre os lucros.

 26  É certo que, como indicou a própria recorrente no processo principal nas suas observações escritas, pode acontecer que o mutuário suporte o imposto do selo, quer porque o mutuante lhe imputa um montante correspondente, quer porque o imposto lhe é diretamente exigido em caso de não pagamento desse imposto pelo sujeito passivo. Todavia, por um lado, esta conclusão em nada altera o facto de, por força da legislação nacional em causa no processo principal, ser o mutuante que é sujeito passivo do imposto do selo. Por outro lado, em todo o caso, como foi salientado no n.º 23 do presente acórdão, esta legislação produz um efeito restritivo não só em relação aos mutuantes residentes mas também em relação aos mutuários não residentes.

 27  Como tal, uma legislação como a que está em causa no processo principal constitui uma restrição à liberdade de circulação de capitais, proibida, em princípio, pelo artigo 63.º TFUE.

 28  Posto isto, segundo o artigo 65.º, n.º 1, alínea a), TFUE, o artigo 63.º TFUE não prejudica o direito de os Estados-Membros aplicarem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido.

 29  Resulta de jurisprudência constante que o artigo 65.º, n.º 1, alínea a), TFUE, uma vez que constitui uma derrogação ao princípio fundamental da livre circulação de capitais, deve ser objeto de interpretação estrita. Por conseguinte, esta disposição não pode ser interpretada no sentido de que toda a legislação fiscal que comporte uma distinção entre os contribuintes em função do lugar em que residem ou do Estado em que investem os seus capitais é automaticamente compatível com o Tratado [Acórdão de 16 de novembro de 2023, Autoridade Tributária e Aduaneira (Mais-valias sobre transmissões de participações sociais), C-472/22, EU:C:2023:880, n.º 27 e jurisprudência referida].

 30  Com efeito, as diferenças de tratamento autorizadas pelo artigo 65.º, n.º 1, alínea a), TFUE não devem constituir, de acordo com o n.º 3 deste artigo, um meio de discriminação arbitrária nem uma restrição dissimulada. Assim, o Tribunal de Justiça declarou que semelhantes diferenças de tratamento só podem ser autorizadas se disserem respeito a situações que não são objetivamente comparáveis ou, no caso contrário, se forem justificadas por uma razão imperiosa de interesse geral [Acórdão de 16 de novembro de 2023, Autoridade Tributária e Aduaneira (Mais-valias sobre transmissões de participações sociais), C-472/22, EU:C:2023:880, n.º 28 e jurisprudência referida].

 31  Segundo jurisprudência do Tribunal de Justiça, a comparabilidade de uma situação transfronteiriça com uma situação interna do Estado-Membro deve ser examinada tendo em conta o objetivo prosseguido pelas disposições nacionais em causa, bem como o objeto e o conteúdo destas últimas. Apenas os critérios de distinção pertinentes estabelecidos pela legislação em causa devem ser tidos em conta para apreciar se a diferença de tratamento resultante dessa legislação reflete uma diferença objetiva entre as situações [Acórdão de 16 de novembro de 2023, Autoridade Tributária e Aduaneira (Mais-valias sobre transmissões de participações sociais), C-472/22, EU:C:2023:880, n.º 29 e jurisprudência referida].

 32  A este respeito, por um lado, nem o órgão jurisdicional de reenvio nem o Governo Português especificaram o objetivo prosseguido pela isenção parcial do imposto do selo resultante da legislação nacional em causa no processo principal.

 33  Por outro lado, o único critério de distinção estabelecido pela legislação nacional em causa no processo principal baseia-se no local de residência do mutuário, uma vez que as operações de tesouraria de curto prazo estão isentas de imposto do selo quando envolvam duas entidades estabelecidas em Portugal ou quando o mutuário esteja estabelecido nesse Estado-Membro, mas não estão isentas quando o mutuário esteja estabelecido noutro Estado-Membro.

 34  No entanto, como a Comissão salientou nas suas observações escritas, no que respeita ao imposto do selo cobrado em Portugal, o caso de um empréstimo concedido a um mutuário residente afigura-se comparável à de um empréstimo concedido a um mutuário não residente, uma vez que esse imposto é calculado com base em cada operação individual e à qual se aplica uma taxa de imposto fixa, tendo em conta as circunstâncias particulares da operação.

 35  Assim, tendo em conta o objeto e o conteúdo da regulamentação nacional em causa no processo principal, a diferença de tratamento que dela resulta não parece assentar, sem prejuízo de verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio, numa diferença de situações objetiva.

 36  De resto, nem o órgão jurisdicional de reenvio nem o Governo Português invocaram uma razão imperiosa de interesse geral que justifique a restrição gerada por essa regulamentação.

 37  Tendo em conta todas as considerações anteriores, há que responder à questão submetida que o artigo 63.º TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado-Membro segundo a qual as operações de tesouraria de curto prazo estão isentas de imposto do selo quando nestas intervenham duas entidades estabelecidas nesse Estado-Membro, mas não estão isentas quando o mutuário esteja estabelecido noutro Estado-Membro”.

 

Pelo exposto, as autoliquidações de Imposto do Selo, nas partes em que têm subjacentes operações ocorridas no âmbito do contrato de cash-pooling enfermam de vício de violação de lei, por erro de interpretação do artigo 7.º, n.ºs 1, alínea h), e 2 do artigo 7.º do CIS e violação dos artigos 63.º e 65.º do TFUE, o que justifica a anulação das autoliquidações nas partes respectivas, nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.

A decisão da reclamação graciosa enferma dos mesmos vícios na medida em que manteve as autoliquidações nas partes em que têm subjacentes operações ocorridas no âmbito do contrato de cash-pooling.

 

 

4. Pedido de reembolso das quantias pagas e juros indemnizatórios           

 

O Requerente pede reembolso das quantias autoliquidadas, acrescidas de juros indemnizatórios.

 

4.1. Reembolso

 

Na sequência da anulação parcial das autoliquidações, Requerente tem direito a ser reembolsado das quantias indevidamente autoliquidadas, o que é consequência da anulação.

Assim, tendo sido indevidamente autoliquidada a quantia global de € 212.192,83, referente às operações no âmbito do contrato de cash-pooling, a Requerente tem direito a ser reembolsada desta quantia.

 

4.2. Juros indemnizatórios

 

           O TJUE tem decidido que a cobrança de impostos em violação do direito da União tem como consequência não só direito ao reembolso como o direito a juros, como pode ver-se pelo acórdão de 18-04-2013, processo n.º C-565/11 (e outros nele citados), em que se refere:

 

“21 Há que lembrar ainda que, quando um Estado-Membro tenha cobrado impostos em violação do direito da União, os contribuintes têm direito ao reembolso não apenas do imposto indevidamente cobrado, mas igualmente das quantias pagas a esse Estado ou por este retidas em relação direta com esse imposto. Isso inclui igualmente o prejuízo decorrente da indisponibilidade de quantias de dinheiro, devido à exigibilidade prematura do imposto (v. acórdãos de 8 de março de 2001, Metallgeselischaft e o., C-397/98 e C-410/98, Colet., p. I-1727, n.ºs 87 a 89; de 12 de dezembro de 2006, Test Claimants in the FII Group Litigation, C-446/04, Colet., p. I-11753, n.º 205; Littlewoods Retail e o., já referido, n.º 25; e de 27 de setembro de 2012, Zuckerfabrik Jülich e o., C-113/10, C-147/10 e C-234/10, n.º 65).

 

22 Resulta daí que o princípio da obrigação de os Estados-Membros restituírem com juros os montantes dos impostos cobrados em violação do direito da União decorre desse mesmo direito da União (acórdãos, já referidos, Littlewoods Retail e o., n.º 26, e Zuckerfabrik Jülich e o., n.º 66).

 

23 A esse respeito, o Tribunal de Justiça já decidiu que, na falta de legislação da União, compete ao ordenamento jurídico interno de cada Estado-Membro prever as condições em que tais juros devem ser pagos, nomeadamente a respetiva taxa e o modo de cálculo. Essas condições devem respeitar os princípios da equivalência e da efetividade, isto é, não devem ser menos favoráveis do que as condições relativas a reclamações semelhantes baseadas em disposições de direito interno, nem organizadas de modo a, na prática, impossibilitar ou dificultar excessivamente o exercício dos direitos conferidos pelo ordenamento jurídico da União (v., neste sentido, acórdão Littlewoods Retail e o., já referido, n.ºs 27 e 28 e jurisprudência referida)”.          

 

No entanto, como se refere neste n.º 23, cabe a cada Estado-Membro prever as condições em que tais juros devem ser pagos, nomeadamente a respetiva taxa e o modo de cálculo.

           O regime substantivo do direito a juros indemnizatórios é regulado no artigo 43.º da LGT, que estabelece, no que aqui interessa, o seguinte:

 

Artigo 43.º

 Pagamento indevido da prestação tributária

 

1 – São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

2 – Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar da liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas.

3. São também devidos juros indemnizatórios nas seguintes circunstâncias:

a) Quando não seja cumprido o prazo legal de restituição oficiosa dos tributos;

b) Em caso de anulação do acto tributário por iniciativa da administração tributária, a partir do 30.º dia posterior à decisão, sem que tenha sido processada a nota de crédito;

c) Quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária.

d) Em caso de decisão judicial transitada em julgado que declare ou julgue a inconstitucionalidade ou ilegalidade da norma legislativa ou regulamentar em que se fundou a liquidação da prestação tributária e que determine a respetiva devolução.

 

4. A taxa dos juros indemnizatórios é igual à taxa dos juros compensatórios.

5. No período que decorre entre a data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado e a data da emissão da nota de crédito, relativamente ao imposto que deveria ter sido restituído por decisão judicial transitada em julgado, são devidos juros de mora a uma taxa equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas.

 

              A ilegalidade da decisão da reclamação graciosa é imputável à Administração Tributária, que a indeferiu por sua iniciativa.

No entanto, os erros que afectam as autoliquidações, nas partes respeitantes às operações realizadas no âmbito do contrato de cash-pooling, são imputáveis à Requerente, pois foi ela que procedeu às autoliquidações.

Por outro lado, não se provou que existisse alguma orientação genérica da Autoridade Tributária e Aduaneira sobre a interpretação do artigo 7.º, n.º2, do CIS

Por isso, quanto aos actos de autoliquidação, não ocorreu erro imputável aos serviços, não havendo, consequentemente, direito a juros indemnizatórios derivado da sua prática.

No entanto, o mesmo não sucede com a decisão da reclamação graciosa, pois deveria ter sido deferida a pretensão da Requerente, quanto às autoliquidações de Imposto do Selo que têm subjacentes as operações realizadas no âmbito do contrato de cash-pooling.

Esta situação de a Autoridade Tributária e Aduaneira manter uma situação de ilegalidade, quando devia repô-la deverá ser enquadrada, por mera interpretação declarativa, no n.º 1 do artigo 43.º da LGT, pois trata-se de uma situação em que há nexo de causalidade adequada entre um erro imputável aos serviços e a manutenção de um pagamento indevido e a omissão de reposição da legalidade quando se deveria praticar a acção que a reporia deve ser equiparada à acção. ( [7] )

Neste sentido tem vindo a decidir uniformemente o Supremo Tribunal Administrativo como pode ver-se pelos seguintes acórdãos:

– de 28-10-2009, proferido no processo n.º 601/09;

 – de 18-11-2020, proferido no processo n.º 2342/12.3BELRS;

 – de 28-04-2021, proferido no processo n.º 16/10.9BELRS 0884/17;

 – de 09-12-2021, proferido no processo n.º 1098/16.5BELRS;

 – do Pleno de 29-06-2022, proferido no processo n.º 93/21.7BALSB;

 – de 13-07-2022, proferido no processo n.º 1693/09.9BELRS.

 

Nesta linha , o Supremo Tribunal Administrativo, nos acórdãos do Pleno de 29-06-2022 e de 22-11-2023, processo n.º 125/23.4BALSB, uniformizou jurisprudência sobre juros indemnizatórios nos casos de retenção na fonte impugnados através de reclamação graciosa, nestes termos:

 

“Em caso de retenção na fonte e havendo lugar a reclamação graciosa do acto tributário em causa, o erro passa a ser imputável à AT depois do indeferimento tácito ou, se anterior, do indeferimento expresso do mesmo procedimento gracioso, sendo a partir da data desse indeferimento que se contam os juros indemnizatórios que sejam devidos, nos termos do art. 43.º, n.ºs 1 e 3, da LGT”.

 

Esta jurisprudência é transponível para os casos de reclamação graciosa de autoliquidação, quando esta não seguiu orientações genéricas da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 No caso em apreço, a reclamação graciosa foi apresentada e, 14-12-2023 e foi indeferida em 15-03-2024, dentro do prazo legal previsto no n.º 1 do artigo 57.º da LGT, pelo que a partir de 16-03-2024, começam a contar-se juros indemnizatórios, relativamente à quantia de € 212.192,83, correspondente às autoliquidações referentes ao contrato de cash-pooling.

Os juros indemnizatórios são devidos, nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 1 e 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, 61.º, n.º 5, do CPPT, 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril, à taxa legal supletiva, e contados desde 16-03-2024 até à data do processamento da respectiva nota de crédito.

 

          

5. Decisão        

 

              De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:

 

  1. Julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral, e anular parcialmente as autoliquidações de Imposto do Selo que constam da alínea K) da matéria de facto fixada, nas partes correspondentes às operações realizadas no âmbito do contrato de cash-pooling;
  2.   Julgar parcialmente procedente o pedido de reembolso, quanto ao valor de  € 212.192,83 e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagar esta quantia a Requerente;
  3. Julgar parcialmente procedente o pedido de juros indemnizatórios, nos termos referidos no ponto 4.2. deste acórdão;
  4. Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral nas partes restantes e absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira dos pedidos nas partes respectivas.

 

6. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto nos artigos 296.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 1.421.852,06, indicado pela Requerente sem oposição da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

7. Custas

 

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 18.792,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerente na percentagem de 85,08% e a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira na percentagem de 14,92%.

 

Lisboa, 08-10-2024

 

  Os Árbitros

 

 

 

(Jorge Lopes de Sousa)

(relator)

 

 

 

(Raquel Franco)

 

 


(Nuno Miguel Morujão)

 

 



[1] Essencialmente neste sentido, podem ver–se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, a propósito de situação paralela que se coloca nos processos de recurso contencioso:

– de 10–11–98, do Pleno, proferido no recurso n.º 32702, publicado em AP–DR de 12–4–2001, página 1207.

– de 19/06/2002, processo n.º 47787, publicado em AP–DR de 10–2–2004, página 4289.

– de 09/10/2002, processo n.º 600/02.

– de 12/03/2003, processo n.º 1661/02;

– de 22–03–2018, processo nº 0208/17.

 

                  Em sentido idêntico, podem ver–se:

 –  MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, volume I, 10.ª edição, página 479 em que refere que é "irrelevante que a Administração venha, já na pendência do recurso contencioso, invocar como motivos determinantes outros motivos, não exarados no acto", e volume II, 9.ª edição, página 1329, em que escreve que "não pode (...) a autoridade recorrida, na resposta ao recurso, justificar a prática do acto recorrido por razões diferentes daquelas que constam da sua motivação expressa".

 –  MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, Direito Administrativo, Volume I, página 472, onde escreve que "as razões objectivamente existentes, mas que não forem expressamente aduzidas, como fundamentos do acto, não podem ser tomadas em conta na aferição da sua legalidade".

 

( [2] ) Neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: de 11-2-93, do Pleno, processo n.º 26389, publicado em Apêndice ao Diário da República de 16-10-95, página 103; de 4-11-93, processo n.º 31798, publicado em Apêndice ao Diário da República de 15-10-96, página 6007; e de 3-2-94, processo n.º 32325, publicado em Apêndice ao Diário da República de 20-12-96, página 791.           

No mesmo sentido, podem ver-se os acórdãos da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 24-11-1999, processo n.º 23720; e 19-12-2007, recurso n.º 874/07.

[3] Essencialmente neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo: de 06-10-1999, processo n.º 023379, publicado em Apêndice ao Diário da República de 30-09-2002, página 3102; de 29-05-2002, processo n.º 047541, publicado em Apêndice ao Diário da República 10-02-2004, página 4047; de 12-12-2002, processo n.º 047699; de 18-12-2002, processo n.º 048366; de 06-05-2020, processo n.º 512/10.8BEPRT.

[4] Neste sentido, podem ver-se, entre muitos, os seguintes Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo: de 25-10-2000, processo n.º 25128, publicado em Apêndice ao Diário da República de 31-1-2003, página 3757; de 7-11-2001, processo n.º 26432, publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, página 2602; de 7-11-2001, processo n.º 26404, publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, página 2593.

[5] Entendeu-se neste acórdão do Supremo Tribunal Administrativo que

 

I – Nas operações de cash pooling, dada a natureza puramente convencional das titularidades de sujeito passivo e de titular do interesse económico, resultante de, na prática, estas titularidades serem cambiantes em razão da própria natureza dinâmica das operações de crédito que lhe estão subjacentes, é de considerar que estamos perante uma situação jurídica equiparável a um mecanismo de substituição fiscal imprópria.

II – No âmbito desta substituição fiscal imprópria, o titular do interesse económico ainda integra a relação jurídica tributária, uma vez que o legislador visa constituir sobre ele (sobre a sua situação económica) o encargo do imposto, ainda que impropriamente, ou seja, por via da interposição do sujeito passivo.

III – Nestes casos de substituição fiscal imprópria, nada impede que, quando o sujeito passivo não cumpra os seus deveres legais de liquidação do imposto, a Administração Tributária possa exigir, directamente, ao titular do interesse económico, o imposto em falta.

[6] No caso da França, tal troca de informações prevê-se no artigo 27.º da Convenção entre Portugal e a França para Evitar a Dupla Tributação e Estabelecer Regras de Assistência Administrativa Recíproca em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, assinada em Paris em 14 de Janeiro de 1971, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 105/71, de 26 de Março.

( [7] )           ANTUNES VARELA, Das Obrigações em Geral, 10.ª edição, página 528:

«A omissão, como pura atitude negativa, não pode gerar física ou materialmente o dano sofrido pelo lesado; mas entende-se que a omis­são é causa do dano, sempre que haja o dever jurídico especial de praticar um acto que, seguramente ou muito provavelmente, teria impedido a consumação desse dano».