Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 235/2024-T
Data da decisão: 2024-09-24  IMI  
Valor do pedido: € 35.797,35
Tema: IMI e AIMI – Inicio de Tributação - Data da conclusão dos prédios urbanos
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Decisão Arbitral

Sumario

  1. Existindo uma divergência entre a declaração Mod. 1 entregue pelo Sujeito Passivo e a posição da AT, o n.º 2 do artigo 10.º do Código do IMI prevê a possibilidade de fixação oficiosa da data de conclusão ou modificação de um prédio, através de despacho fundamentado do chefe do serviço de finanças competente, o que acontecerá, em princípio, quando o sujeito passivo violar o dever declarativo previsto no artigo 13.º. Esta decisão deverá respeitar os critérios previstos nas alíneas do n.º 1 do artigo 1.º, fixando-se a data mais antiga das aí previstas.
  2. Na determinação da data da conclusão ou modificação dos prédios urbanos, com vista à tributação em IMI, releva a emissão da autorização de utilização, por esta condicionar a possibilidade de uso normal do imóvel.

I - Relatório

A - Identificação Das Partes

Requerente: A..., LDA, titular do número único de matrícula e de pessoa coletiva..., com sede ... n.º..., ...-... Cascais, doravante designada de Requerente ou Sujeito Passivo.

Requerida: Autoridade Tributaria e Aduaneira, doravante designada de Requerida ou AT.

A Requerente, apresentou o pedido de constituição de Tribunal Arbitral em matéria tributária e pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e da alínea a) do n. º 1 do artigo 10.º, ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, adiante abreviadamente designado por RJAT).

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral, foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD, em 20-02-2024, e em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66­B/2012, de 31 de dezembro, notificada a Autoridade Tributária em 20-02-2024.

A Requerente, não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico, designou como Árbitra, a Dra. Rita Guerra Alves, aceite por esta, nos termos legalmente previstos.

Em 10-04-2024, as partes foram devidamente notificadas dessa designação, e não manifestaram vontade de a recusar, nos termos do artigo 11.º n.º 1, alínea a) e b), do RJAT e artigos 6.º e 7º do Código Deontológico.

Desta forma, o Tribunal Arbitral Singular, foi regularmente constituído em 02-05-2024, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de janeiro, para apreciar e decidir o objeto do presente litígio, e automaticamente notificada a Autoridade Tributaria e Aduaneira, para querendo se pronunciar, conforme consta da respetiva ata.

Por despacho de 02-05-2024, a Requerida foi notificada para apresentar a sua resposta e juntar o processo administrativo, que o fez em 05-06-2024.

No dia 08-07-2024, realizou-se a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, com inquirição das testemunhas arroladas e apresentadas pela Requerente. As Partes foram também notificadas para apresentarem alegações escritas finais e o Tribunal indicou a data previsível para prolação da decisão arbitral, com advertência à Requerente da necessidade de pagamento da taxa arbitral subsequente até essa data (v. ata que se dá por reproduzida e gravação áudio disponível no SGP do CAAD).

A Requerente e Requerida apresentaram as suas alegações em 30-08-2024 e 04-09-2024, respetivamente, reafirmando, no essencial, as posições assumidas nos respetivos articulados.

O processo não enferma de nulidades.

B – Pedido   

  1. A ora Requerente, deduziu pedido de pronúncia arbitral de declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação em sede de Imposto Municipal sobre Imóveis  n.º 2022 ... de 06-07-2023, referente a IMI do ano de 2022; e Liquidação/nota de cobrança nº 2022 ... de 05-10-2023, referente a IMI do ano de 2022;  liquidação adicional nº 2022 ... de 31-10-2023, referente a IMI do ano de 2022; liquidação do AIMI nº 2023 ... de 01-11-2023, referente ao ano de 2023; nota de cobrança de AIMI do ano 2023 – documento nº 2023 ..., de 03-11-2023; dos quais resultou um imposto global a liquidar de 35.797,35 (trinta e cinco mil setecentos e noventa e sete euros e trinta e cinco cêntimos)

 

C – Causa De Pedir

  1. A fundamentar o seu pedido de pronúncia arbitral, a Requerente alegou, com vista à declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação, o seguinte:
  1. A Requerente é uma sociedade comercial por quotas cujo objeto social consiste na compra e venda para revenda de bens imobiliários, promoção imobiliária, consultoria imobiliária e consultoria de serviços imobiliários
  2. Em 27-06-2019, a Requerente comprou à B... da freguesia de ... o prédio urbano sito na Rua ..., ..., concelho de Cascais, descrito na Segunda Conservatória do Registo Predial de Cascais sob a ficha ... da freguesia do ... e inscrito sob o artigo nº ... da união das freguesias de ... e ... .
  3. A aquisição do referido prédio urbano foi registada a favor da Requerente pela AP ... de 2019/06/27.
  4. Em 05-08-2000, a Câmara Municipal de Cascais emitiu o alvará de obras de alteração/demolição nº..., nos termos do qual foi aprovada a demolição da edificação existente e construção de um edifício com a área total de 3.172,70 m2 (três mil, cento e setenta e dois metros quadrados e setenta decímetros quadrados), composto por quatro pisos, sendo um abaixo da cota de soleira e três acima da cota de soleira, com 12 (doze) fogos, destinado a habitação.
  5. Feita a demolição das construções existentes no prédio, este passou a constituir um terreno para construção e, em cumprimento do disposto no nº 1 do artigo 13º do Código do IMI, a Requerente, em 14-11-2020, apresentou à AT declaração para inscrição do novo prédio na matriz predial urbana da freguesia de... e ... .
  6. Ao prédio foi atribuído o artigo ... e o Serviço de Finanças de Cascais -... promoveu a sua avaliação, tendo-lhe sido fixado o valor patrimonial tributário de € 564.060,00 (quinhentos e sessenta e quatro mil e sessenta euros), o qual não foi objeto de reclamação.
  7. Entretanto, a Requerente promoveu a construção de um novo edifício no terreno identificado nos artigos 6 e 7 precedentes, com 12 fogos, a ser submetido ao regime da propriedade horizontal, destinando a venda as respetivas frações autónomas.
  8. A utilização do edifício referido no artigo precedente foi autorizada para habitação mediante o alvará nº ..., emitido pela Câmara Municipal de Cascais em 17-02-2023.
  9. A Requerente, em cumprimento do disposto no artigo 13º/1 do CIMI, apresentou à AT, em 02-03-2023, declaração para inscrição no novo prédio na matriz predial urbana da freguesia de ... e ..., tendo-lhe sido atribuído o artigo provisório ...
  10. A Requerente constituiu o prédio em regime de propriedade horizontal, mediante escritura pública outorgada em 03-03-2023 e retificada por escritura pública de 21-03-2023.
  11. O Predio é constituído por edifício com quatro pisos, e engloba 12 (doze) frações autónomas, todas destinadas a habitação, designadas pelas letras: A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, L e M.
  12. A Requerente vendeu 11 (onze) das 12 (doze) frações autónomas, no período compreendido entre 28-03-2023 e 22-09-2023
  13. Na sequência do recebimento da participação indicada no artigo 10º precedente e da retificação feita ao título constitutivo da propriedade horizontal, a AT promoveu a avaliação das 12 (doze) frações autónomas que constituem o predico, tendo-lhes sido atribuídos os seguintes valores patrimoniais tributários, os quais somam € 5.401.820,00 (cinco milhões quatrocentos e um mil oitocentos e vinte euros): a) Fração autónoma A: € 359.770,00 (trezentos e cinquenta e nove mil setecentos e setenta euros); b) Fração autónoma B: € 269.390,00 (duzentos e sessenta e nove mil trezentos e noventa euros); c) Fração autónoma C: € 418.680,00 (quatrocentos e dezoito mil seiscentos e oitenta euros);  d) Fração autónoma D: € 404.910,00 (quatrocentos e quatro mil novecentos e dez euros); e) Fração autónoma E: € 589.080,00 (quinhentos e oitenta e nove mil e oitenta euros); f) Fração autónoma F: € 399.070,00 (trezentos e noventa e nove mil e setenta euros); g) Fração autónoma G: € 251.800,00 (duzentos e cinquenta e um mil e oitocentos euros); h) Fração autónoma H: € 405.170,00 (quatrocentos e cinco mil cento e setenta euros); i) Fração autónoma I: € 357.140,00 (trezentos e cinquenta e sete mil cento e quarenta euros); j) Fração autónoma J: € 546.690,00 (quinhentos e quarenta e seis mil seiscentos e noventa euros); k) Fração autónoma L: € 708.770,00 (setecentos e oito mil setecentos e setenta euros); l) Fração autónoma M: € 691.350,00 (seiscentos e noventa e um mil trezentos e cinquenta euros);
  14. Os referidos valores patrimoniais tributários foram notificados à Requerente em 06-04-2023 e não foram objeto de reclamação.
  15. Na declaração para inscrição do Prédio na matriz predial urbana, a Requerente indicou como data do facto a data da emissão do alvará da autorização de utilização desse prédio, ou seja, 17-02-2023.
  16. Na verdade, o prédio só ficou concluído em 07-03-2023, data em que a C..., S.A., comunicou à Requerente que o prédio estava em condições de ser ligado à rede elétrica e, consequentemente, passou a poder ser abastecido de energia elétrica, quer quanto às partes comuns quer quanto às 12 (doze) frações autónomas que o compunham.
  17. Até à referida data o prédio não tinha condições de habitabilidade, pois todas as instalações, equipamentos, eletrodomésticos, quer fossem comuns quer fossem privativos das várias frações autónomas não podiam funcionar por falta de energia elétrica.
  18. Por esse motivo, as escrituras de compra e vendas das frações autónomas só puderam ser realizadas a partir de 28-03-2023, pois os promitentes-compradores pretendiam vistoriar previamente o prédio, sendo necessário para o efeito que o mesmo estivesse já ligado à rede elétrica.
  19. Nenhuma das frações autónomas nem nenhuma parte comum do prédio foram ocupadas ou utilizadas antes de 28-03-023, data do início da outorga das escrituras de compra e venda das frações autónomas do Prédio.
  20. Em 14-04-2023, a AT liquidou o Imposto Municipal sobre Imóveis, referente ao ano de 2022, sobre o património predial da Requerente, constituído por três prédios inscritos em seu nome á data de 31-12-2022 – liquidação nº 2022 ... – tendo apurado uma coleta de € 5.017,87 (cinco mil e dezassete euros e oitenta e sete cêntimos),– artigo 17.542 – a coleta de € 1.917,80 (mil novecentos e dezassete euros e oitenta cêntimos).
  21. A liquidação do IMI foi notificada à Requerente em 15-05-2023, com indicação da primeira prestação a pagar no mês de Maio/2022, no montante global de € 1.672,62 (mil seiscentos e setenta e dois euros e sessenta e dois cêntimos), a qual foi paga pela Requerente em 15-05-2023, correspondendo a quantia de € 639,27 (seiscentos e trinta e nove euros e vinte e sete cêntimos) ao IMI (1ª prestação) do prédio, e o restante valor ao IMI aos outros dois prédios da Requerente, englobados na mesma liquidação.
  22. Em 06-07-2023, a AT fez a liquidação nº 2022..., referente a IMI do ano de 2022, tendo aumentado a coleta da liquidação nº 2022..., feita em 14-04-2023, de € 5.017,87 (cinco mil e dezassete euros e oitenta e sete cêntimos), para € 20.042,76 (vinte mil e quarenta e dois euros e setenta e seis cêntimos), como resultado das alterações operadas no património predial tomado como base da liquidação:
  23. Apesar das alterações feitas quanto ao património predial da Requerente, tomado em consideração para efeitos da citada liquidação nº 2022..., o montante exigido pela AT como segunda prestação do IMI liquidado, reportado ao ano de 2022, manteve-se igual ao montante da 1ª prestação do IMI do mesmo de 2022 - € 1.672,62 (mil seiscentos e setenta e dois euros e sessenta e dois cêntimos).
  24. A referida liquidação foi notificada à Requerente em 09-07-2023, com expressa indicação da quantia a pagar no mês de agosto de 2023, a título de 2ª prestação do IMI do ano de 2022, no montante de € 1.672,62 (mil seiscentos e setenta e dois euros e sessenta e dois cêntimos), que a Requerente pagou em 10-08-2023.
  25. Em 05-10-2023, a AT notificou a Requerente da liquidação nº 2022..., referente a IMI do ano de 2022, cuja coleta corresponde ao montante global de € 20.042,76 (vinte mil e quarenta e dois euros e setenta e seis cêntimos), ou seja, igual à coleta já apurada em 06-07-2023, aquando da liquidação nº 2022... .
  26. A referida liquidação indicava a quantia que a Requerente devia pagar no mês de novembro de 2023, a título de 3ª prestação do IMI do ano 2022, no montante de € 16.697,52 (dezasseis mil seiscentos e noventa e sete euros e cinquenta e dois cêntimos), correspondente à diferença entre o montante da liquidação - € 20.042,76 (vinte mil e quarenta e dois euros, e setenta e seis cêntimos) – e o montante já pago pela Requerente a título de 1ª e 2ª prestação - 20.042,76 - (1.672,62 x 2) = 16.697,52.
  27. A Requerente pagou à AT, em 27-11-2023, a referida quantia de € 16.697,52 (dezasseis mil seiscentos e noventa e sete euros e cinquenta e dois cêntimos).
  28. Em 31-10-2023, a AT fez a liquidação adicional nº 2022..., referente a IMI do ano de 2022, tendo aumentado a coleta de € 20.042,76 (vinte mil e quarenta e dois euros e setenta e seis cêntimos), para € 21.466,27 (vinte e um mil quatrocentos e sessenta e sis euros e vinte e sete cêntimos), como resultado inclusão da fração autónoma C do prédio no património predial da Requerente.
  29. A referida liquidação foi notificada à Requerente em 04-11-2023, com expressa indicação da quantia a pagar no mês de dezembro de 2023, a título de liquidação adicional, no montante de € 1.423,51 (mil quatrocentos e vinte e três euros e cinquenta e um cêntimos), que a Requerente pagou em 14-12-2023.
  30. Em 30-06-2023, a AT liquidou o Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis referente ao ano de 2023, calculado sobre a soma dos valores patrimoniais tributários de dois prédios urbanos de que a Requerente era titular á data de 01-01-2023, correspondendo ao prédio o valor patrimonial tributário de € 564.060,00 (quinhentos e sessenta e quatro mil e sessenta euros) e ao prédio com o artigo 017.967 o valor patrimonial tributário de € 911.650,00 (novecentos e onze mil seiscentos e cinquenta euros) – liquidação nº 2023 ... - no montante de € 5.902,84 (cinco mil novecentos e dois euros e oitenta e quatro cêntimos).
  31. Essa liquidação do AIMI foi notificada à Requerente em 09-08-2023, com expressa indicação da quantia a pagar no mês de setembro de 2023, no montante de € 5.902,84 (cinco mil novecentos e dois euros e oitenta e quatro cêntimos), que a Requerente pagou em 12-09-2023.
  32. Em 03-11-2023, a AT fez nova liquidação do AIMI referente ao ano de 2023 (liquidação nº 2023...), tendo aumentado a coleta da liquidação nº 2023... - no montante de € 5.902,84 (cinco mil novecentos e dois euros e oitenta e quatro cêntimos), feita em 09-08-2023, para no montante de € 23.579,16 (vinte e três mil quinhentos e setenta e nove euros e dezasseis cêntimos), como resultado das alterações operadas no património predial tomado como base da liquidação.
  33. A liquidação do AIMI nº 2023... foi notificada à Requerente em 04-11-2023, simultaneamente com a nota de cobrança – documento nº 2023..., com expressa indicação da quantia a pagar até 31-12-2023, no montante de € 17.676,32 (dezassete mil seiscentos e setenta e seis euros e trinta e dois cêntimos), correspondente à diferença do valor da liquidação nº 2023... (€ 5.902,84), já pago, e o valor da liquidação nº 2023 ... (€ 23.579,16).
  34. A Requerente pagou a referida quantia de € 17.676,32 (dezassete mil seiscentos e setenta e seis euros e trinta e dois cêntimos) em 14-12-2023.
  35. Sustenta a Requerente, que nos termos do disposto na alínea c) do artigo 9º/1 do CIMI, o IMI é devido a partir “do ano, inclusive, da conclusão das obras de edificação, de melhoramento ou de outras alterações que hajam determinado a variação do valor patrimonial tributário de um prédio”.
  36. Ora, conforme alegado, a autorização camarária para utilização do prédio foi aprovada por despacho do Sr. Vereador com o pelouro do licenciamento urbanístico, proferido em 14-02-2023, e emitida em 17-02-2023, a declaração para inscrição do prédio na matriz indica a data 17-02-2023 como data de conclusão das obras e nenhuma das frações reunia condições de habitabilidade antes da data de 07-03-2023 – data da ligação do prédio à rede elétrica e nenhuma das frações autónomas foi efetivamente utilizada antes de 28-03-2023.
  37. Consequentemente, seja qual for o facto que se considere relevante para presumir a conclusão das obras de edificação, o mesmo ocorreu, sem margem para contestação, no ano de 2023 e, por isso, ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do artigo 9º do CIMI, o IMI incidente sobre as frações autónomas do prédio era devido apenas a partir do ano de 2023, inclusive.
  38. Logo, as liquidações do IMI referentes às frações autónomas do prédio, reportadas ao ano de 2022, e as respetivas notas de cobrança, são inválidas pois violaram o disposto na alínea c) do n.º1 do artigo 9º e o n.º 1 do artigo 10º, ambos do CIMI.
  39. A Requerente tem direito à restituição do IMI ilegalmente liquidado, exigido pela AT e pago pela Requerente, no montante global de € 18.121,03 (dezoito mil cento e vinte e um euros e três cêntimos).
  40. Nos termos do nº 1 artigo 135-B e do nº 1 do artigo 135-C, ambos do CIMI, o AIMI incide sobre a soma dos valores patrimoniais tributários dos prédios urbanos situados em território português de que o sujeito passivo seja titular e o valor tributável corresponde à soma dos valores patrimoniais tributários, reportados a 1 de janeiro do ano a que respeita o AIMI, dos prédios que constam nas matrizes prediais na titularidade do sujeito passivo.
  41. Essa liquidação é ilegal, na parte reportada ao AIMI calculado sobre os valores patrimoniais das 11 (onze) frações autónomas do Prédio, por violação do disposto no nº 1 do artigo 135-C e no nº 1 do artigo 135-G, ambos do CIMI.
  42. A Requerente solicita, ao abrigo do disposto no artigo 43º da Lei Geral Tributária, a juros indemnizatórios calculados sobre os valores de IMI e de AIMI, indevidamente cobrados, por aplicação de taxa igual à taxa de juros compensatórios desde a data do pagamento efetuado pelo sujeito passivo.

 

D - Da Resposta Da Requerida

  1. A Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou tempestivamente a sua resposta na qual, em síntese abreviada, alegou o seguinte:
  1. A Requerente, delimita o seu pedido indicando como data da conclusão das obras de edificação do prédio, a data da emissão do alvará da autorização de utilização desse prédio, ou seja, 17-02-2023, nomeadamente por atraso no abastecimento de eletricidade pela C..., S.A, condicionando a falta de condições de habitabilidade no Prédio até 07-03-2023.
  2. Donde, a questão em apreço e que cumpre resolver, é a de saber qual é a data a considerar para o início da tributação de um prédio (cf artigo 9º n.º 1 alínea c) do CIMI), e qual é a data a considerar como de conclusão da obra (artigo 10º do CIMI).
  3. Ora, o n.º 1 do artigo 10.º do CIMI estatui uma presunção legal de conclusão de prédio urbano, para efeitos de inscrição na matriz.
  4. Contudo, tendo em conta a lista do n.º 1 do referido artigo, deve atentar-se ao acontecimento que ocorrer em primeiro lugar.
  5. No termo de responsabilidade do diretor de obra junto ao livro de obra consta que o edifício foi concluído em 03-10-2022, pelo que o Serviço de Finanças de Cascais ... notificou o impugnante em 22-02-2023 para proceder à entrega da declaração modelo 1 de IMI com data de conclusão de obra de 2022.
  6. O Requerente, em 02-03-2023 procedeu à entrega da modelo 1 n.º ..., conforme solicitado, para inscrição do prédio novo, a que foi atribuído o artigo Provisório n.º ... (...) com vista à sua avaliação e inscrição na matriz, (proveniente do art.º ... (...) contudo, indicou como data de conclusão da obra, a data da licença de utilização 17.02.2023.
  7. Perante a declaração apresentada pelo ora Requerente, o Chefe do Serviço de Finanças usou da prerrogativa constante no n.º 2 do art.º 10.º do CIMI, alterando a data do facto de 17-02-2023 para 03-10-2022, com fundamento nos documentos enviados ao serviço de finanças pelo grupo de Apoio da Câmara Municipal de Cascais.
  8. Como se lê do documento junto, ali constam: o Termo de Responsabilidade, com a identificação de D..., Engenheiro, inscrito na O.E sob o n.º ..., que declara na qualidade de Diretor de Obra localizada na Rua ... n.º ... em Cascais, se encontra concluída desde 03-10-2022, em conformidade com o projeto. Constam ainda do caderno de obras, entre vários averbamentos, as folhas do termo de encerramento assinado pelos titulares do alvará de licença; Dono de obra, em 25-10-2022; pelo Técnico responsável pela fiscalização da obra, em 25-10-2022; e pelo Empreiteiro a 25-102-2022.
  9. Demonstra por isso, o mesmo documento, que a conclusão da obra ocorreu em 03-10-2022, data relevante para a inscrição do novo prédio na matriz predial urbana, gerando no sujeito passivo a obrigação declarativa prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 13.º do CIMI, ou seja, a obrigação de declarar, nos 60 (sessenta) dias seguintes, que foram concluídas as obras de edificação de um prédio.
  10. Os factos alegados e a prova apresentada pelo Impugnante não contrariam a prova de que o edifício já tinha as obras concluídas em 03-10-2022.
  11. Na realidade, os eventos da emissão da licença de utilização e da ligação dos serviços de eletricidade reforçam que a Obra já estava concluída em data anterior, sendo factos externos ao processo construtivo do edifício e que, por isso, não são relevantes para a determinação da data de inscrição matricial do novo prédio.
  12. De salientar, que, o n.º 1 do art.º 8.º prevê a incidência subjetiva do IMI, determinando que o imposto é devido por quem for o proprietário, em 31 de dezembro do ano a que o imposto respeita.
  13. Pelo que, em face dos elementos probatórios comunicados pela Câmara Municipal de Cascais ao Serviço de Finanças, o prédio estava concluído em 03-10-2022, ficando comprovado que existia à data do facto tributário do IMI de 2022.
  14. Acresce que, as liquidações de IMI com a data de 2022 foram apuradas com base no VPT determinado e com efeitos produzidos à data da conclusão do prédio, em respeito pelo disposto no n.º 2 do art.º 10º do CIMI e da decisão do Chefe de Finanças suportada na documentação camarária, não padecendo de qualquer ilegalidade.
  15. No que respeita à liquidação de AIMI contestada, a mesma observa aquele enquadramento e o disposto no n.º 1 do artigo 135.º-G do CIMI, porque foi apurada tendo em conta o proprietário na matriz à data de 1 de janeiro do ano a que respeita o AIMI (2023) e, por conseguinte, não padece de qualquer erro nem ilegalidade.
  16. C
  17. Termina a Requerida peticionando que o presente pedido de pronúncia arbitral deve ser julgado improcedente por não provado, e, consequentemente, ser a Requerida absolvida de todos os pedidos, nos termos acima peticionados.

 

E- Matéria de Facto

E.1. Factos Provados

  1. Para a análise da questão submetida à apreciação do Tribunal, cumpre enunciar a matéria de facto relevante, baseada nos factos que não mereceram impugnação e na prova documental e testemunhal constante dos autos.
  2. A Requerente é uma sociedade comercial por quotas cujo objeto social consiste na compra e venda para revenda de bens imobiliários, promoção imobiliária, consultoria imobiliária e consultoria de serviços imobiliários.
  3. Em 27-06-2019, a Requerente comprou à B... da freguesia de ... o prédio urbano sito na Rua ..., ..., concelho de Cascais, descrito na Segunda Conservatória do Registo Predial de Cascais sob a ficha 1.201 da freguesia do ... e inscrito sob o artigo nº... da união das freguesias de ... e ..., conforme escritura de compra e venda que se junta – cfr. Doc. 1 do PPA.
  4. A aquisição do referido prédio urbano foi registada a favor da Requerente pela AP ... de 2019/06/27 – cfr. doc 2 do PPA.
  5. Em 05-08-2000, a Câmara Municipal de Cascais emitiu o alvará de obras de alteração/demolição nº..., nos termos do qual foi aprovada a demolição da edificação existente e construção de um edifício com a área total de 3.172,70 m2, composto por quatro pisos, sendo um abaixo da cota de soleira e três acima da cota de soleira, com 12 (doze) fogos, destinado a habitação, – cfr. Doc 3 do PPA.
  6. Feita a demolição das construções existentes no prédio, este passou a constituir um terreno para construção e, em cumprimento do disposto no nº 1 do artigo 13º do CIMI, a Requerente, em 14-11-2020, apresentou à AT declaração para inscrição do novo prédio na matriz predial urbana da freguesia de ... e ...– cfr. DOC 4 do PPA.
  7. Ao prédio foi atribuído o artigo ... e o Serviço de Finanças de Cascais -... promoveu a sua avaliação, tendo-lhe sido fixado o valor patrimonial tributário de € 564.060,00 (quinhentos e sessenta e quatro mil e sessenta euros), o qual não foi objeto de reclamação – crf. Doc 5 do PPA.
  8. A utilização do edifício referido no artigo precedente foi autorizada para habitação mediante o alvará nº ..., emitido pela Câmara Municipal de Cascais em 17-02-2023 – cfr. doc 6.
  9. A Requerente, em cumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 13º do CIMI, apresentou à AT, em 02-03-2023, declaração para inscrição no novo prédio na matriz predial urbana da freguesia de ... e ..., tendo-lhe sido atribuído o artigo provisório ...– cfr. doc 7.
  10. A Requerente constituiu o prédio em regime de propriedade horizontal, mediante escritura pública outorgada em 03-03-2023 e retificada por escritura pública de 21-03-2023 – cfr. doc 8 e 9 do PPA.
  11. O Predio é constituído por edifício com quatro pisos, e engloba 12 (doze) frações autónomas, todas destinadas a habitação, designadas pelas letras: A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, L e M - cfr 2, 6 e 8 do PPA.
  12. A Requerente vendeu 11 (onze) das 12 (doze) frações autónomas, no período compreendido entre 28-03-2023 e 22-09-2023
  13. Na presente data, a Requerente é apenas proprietária da fração autónoma designada pela letra “M”. – cfr. Doc 20 do PPA.
  14. Na sequência do recebimento da participação indicada no artigo 10º precedente e da retificação feita ao título constitutivo da propriedade horizontal, a AT promoveu a avaliação das 12 (doze) frações autónomas que constituem o predico, tendo-lhes sido atribuídos os seguintes valores patrimoniais tributários, os quais somam € 5.401.820,00 (cinco milhões quatrocentos e um mil oitocentos e vinte euros):  Fração autónoma A: € 359.770,00 (trezentos e cinquenta e nove mil setecentos e setenta euros); b) Fração autónoma B: € 269.390,00 (duzentos e sessenta e nove mil trezentos e noventa euros); c) Fração autónoma C: € 418.680,00 (quatrocentos e dezoito mil seiscentos e oitenta euros);  d) Fração autónoma D: € 404.910,00 (quatrocentos e quatro mil novecentos e dez euros); e) Fração autónoma E: € 589.080,00 (quinhentos e oitenta e nove mil e oitenta euros); f) Fração autónoma F: € 399.070,00 (trezentos e noventa e nove mil e setenta euros); g) Fração autónoma G: € 251.800,00 (duzentos e cinquenta e um mil e oitocentos euros); h) Fração autónoma H: € 405.170,00 (quatrocentos e cinco mil cento e setenta euros); i) Fração autónoma I: € 357.140,00 (trezentos e cinquenta e sete mil cento e quarenta euros); j) Fração autónoma J: € 546.690,00 (quinhentos e quarenta e seis mil seiscentos e noventa euros); k) Fração autónoma L: € 708.770,00 (setecentos e oito mil setecentos e setenta euros); l) Fração autónoma M: € 691.350,00 (seiscentos e noventa e um mil trezentos e cinquenta euros);
  15. Os referidos valores patrimoniais tributários foram notificados à Requerente em 06-04-2023 e não foram objeto de reclamação.
  16. Na declaração para inscrição do Predio na matriz predial urbana, a Requerente indicou como data do facto a data da emissão do alvará da autorização de utilização desse prédio, ou seja, 17-02-2023.
  17. Em 07-03-2023, a C..., S.A., comunicou à Requerente que o prédio estava em condições de ser ligado à rede elétrica e, consequentemente, passou a poder ser abastecido de energia elétrica, quer quanto às partes comuns quer quanto às 12 (doze) frações autónomas que o compunham – cfr. Doc 33.
  18. Nenhuma das frações autónomas nem nenhuma parte comum do prédio foram ocupadas ou utilizadas antes de 28-03-023, data do início da outorga das escrituras de compra e venda das frações autónomas do Predio.
  19. Em 14-04-2023, a AT liquidou o IMI, referente ao ano de 2022, sobre o património predial da Requerente, constituído por três prédios inscritos em seu nome à data de 31-12-2022 – liquidação nº 2022...– tendo apurado uma coleta de € 5.017,87 (cinco mil e dezassete euros e oitenta e sete cêntimos),– artigo...– a coleta de € 1.917,80 (mil novecentos e dezassete euros e oitenta cêntimos) – cfr. doc 34 do PPA.
  20. A liquidação do IMI foi notificada à Requerente em 15-05-2023, com indicação da primeira prestação a pagar no mês de Maio/2022, no montante global de € 1.672,62 (mil seiscentos e setenta e dois euros e sessenta e dois cêntimos), a qual foi paga pela Requerente em 15 de maio de 2023, correspondendo a quantia de € 639,27 (seiscentos e trinta e nove euros e vinte e sete cêntimos) ao IMI (1ª prestação) do PRÉDIO 2, e o restante valor ao IMI aos outros dois prédios da Requerente, englobados na mesma liquidação – Cfr. Doc. 35 do PPA.
  21. Em 06-07-2023, a AT fez a liquidação nº 2022 ..., referente a IMI do ano de 2022, tendo aumentado a coleta da liquidação nº 2022..., feita em 14-04-2023, de € 5.017,87 (cinco mil e dezassete euros e oitenta e sete cêntimos), para € 20.042,76 (vinte mil e quarenta e dois euros e setenta e seis cêntimos), como resultado das alterações operadas no património predial tomado como base da liquidação.
  22. A referida liquidação foi notificada à Requerente em 09-07-2023, com expressa indicação da quantia a pagar no mês de agosto de 2023, a título de 2ª prestação do IMI do ano de 2022, no montante de € 1.672,62 (mil seiscentos e setenta e dois euros e sessenta e dois cêntimos), que a Requerente pagou em 10-08-2023.
  23. Em 05-10-2023, a AT notificou a Requerente da liquidação nº 2022..., referente a IMI do ano de 2022, cuja coleta corresponde ao montante global de € 20.042,76 (vinte mil e quarenta e dois euros e setenta e seis cêntimos), ou seja, igual à coleta já apurada em 06-07-2023, aquando da liquidação nº 2022... .
  24. A referida liquidação indicava a quantia que a Requerente devia pagar no mês de novembro de 2023, a título de 3ª prestação do IMI do ano 2022, no montante de € 16.697,52 (dezasseis mil seiscentos e noventa e sete euros e cinquenta e dois cêntimos), correspondente à diferença entre o montante da liquidação - € 20.042,76 – e o montante já pago pela Requerente a título de 1ª e 2ª prestação - 20.042,76 - (1.672,62 x 2) = 16.697,52.
  25. A Requerente pagou à AT, em 27-11-2023, a referida quantia de € 16.697,52 (dezasseis mil seiscentos e noventa e sete euros e cinquenta e dois cêntimos).
  26. Em 31-10-2023, a AT fez a liquidação adicional nº 2022..., referente a IMI do ano de 2022, tendo aumentado a coleta de € 20.042,76 (vinte mil e quarenta e dois euros e setenta e seis cêntimos), para € 21.466,27 (vinte e um mil quatrocentos e sessenta e seis euros e vinte e sete cêntimos), como resultado inclusão da fração autónoma C do PRÉDIO 3 no património predial da Requerente.
  27. A referida liquidação foi notificada à Requerente em 04-11-2023, com expressa indicação da quantia a pagar no mês de dezembro de 2023, a título de liquidação adicional, no montante de € 1.423,51 (mil quatrocentos e vinte e três euros e cinquenta e um cêntimos), que a Requerente pagou em 14-12-2023 – cfr. Doc 41. Do PPA.
  28. Em 30-06-2023, a AT liquidou o Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis referente ao ano de 2023, calculado sobre a soma dos valores patrimoniais tributários de dois prédios urbanos de que a Requerente era titular á data de 01-01-2023, correspondendo ao valor patrimonial tributário de € 564.060,00 e ao prédio com o artigo ... o valor patrimonial tributário de € 911.650,00 – liquidação nº 2023 ... - no montante de € 5.902,84 (cinco mil novecentos e dois euros e oitenta e quatro cêntimos) – cfr. doc 42 do PPA.
  29. Essa liquidação do AIMI foi notificada à Requerente em 09-08-2023, com expressa indicação da quantia a pagar no mês de setembro de 2023, no montante de € 5.902,84 (cinco mil novecentos e dois euros e oitenta e quatro cêntimos), que a Requerente pagou em 12-09-2023 – cfr. Doc. 43 do PPA.
  30. Em 03-11-2023, a AT fez nova liquidação do AIMI referente ao ano de 2023 (liquidação nº 2023...), tendo aumentado a coleta da liquidação nº 2023 ...- no montante de € 5.902,84 (cinco mil novecentos e dois euros e oitenta e quatro cêntimos), feita em 09-08-2023, para no montante de € 23.579,16 (vinte e três mil quinhentos e setenta e nove euros e dezasseis cêntimos), como resultado das alterações operadas no património predial tomado como base da liquidação – cfr. Doc. 44 e 45.
  31. A liquidação do AIMI nº 2023... foi notificada à Requerente em 04-11-2023, simultaneamente com a nota de cobrança – documento nº 2023..., com expressa indicação da quantia a pagar até 31-12-2023, no montante de € 17.676,32 (dezassete mil seiscentos e setenta e seis euros e trinta e dois cêntimos), correspondente à diferença do valor da liquidação nº 2023 ... (€ 5.902,84), já pago, e o valor da liquidação nº 2023... (€ 23.579,16).
  32. A Requerente pagou a referida quantia de € 17.676,32 (dezassete mil seiscentos e setenta e seis euros e trinta e dois cêntimos) em 14-12-2023 – cfr. Doc 44 do PPA.

 

E.2. Factos Não Provados

  1. Dos factos com interesse para a decisão da causa, todos objetos de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.
  2. Não foram identificados outros factos que devam ser considerados não provados.

 

E.3. Fundamentação da matéria de facto

  1. Cabe ao Tribunal Arbitral selecionar os factos relevantes para a decisão, em função da sua relevância jurídica considerando as várias soluções plausíveis das questões de Direito, bem como discriminar a matéria provada e não provada (cfr. artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.ºs 3 e 4, do CPC, aplicáveis ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).
  2. Segundo o princípio da livre apreciação dos factos, o Tribunal baseia a sua decisão, quanto à matéria de facto, na sua íntima e prudente convicção, formada a partir do exame e avaliação dos meios de prova trazidos ao processo, e de acordo com as regras da experiência (cfr. artigo 16.º, alínea e), do RJAT, e artigo 607.º, n.º 4, do CPC, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
  3. Somente relativamente a factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, a factos que só possam ser provados por documentos, a factos que estejam plenamente provados por documentos, acordo ou confissão, ou quando a força probatória de certos meios se encontrar pré-estabelecida na lei (e.g., força probatória plena dos documentos autênticos, cfr. artigo 371.º do Código Civil), é que não domina, na apreciação da prova produzida, o referido princípio da livre apreciação (cfr. artigo 607.º, n.º 5, do CPC, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
  4. Consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados como factos provados, tendo por base a análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos e da prova testemunhal.
  5. As Testemunhas, aparentaram depor com isenção e com conhecimento pessoal dos factos, responderam de forma clara, objetiva e circunstanciada, que se revelou importante na formação da convicção do tribunal, importa salientar os contributos trazidos pelos depoimentos de: E..., F... e G... .
  6. Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas Partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada, nem os factos incompatíveis ou contrários aos dados como provados.

 

G -  Matéria De Direito

  1. Atendendo à posição das Partes e à matéria de facto dada como assente, compete ao tribunal averiguar qual é a data a considerar para o início da tributação de um prédio urbano nos termos da alínea c) do artigo 9º n.º 1 do CIMI, e qual é a data a considerar como de conclusão da obra para efeitos de aplicação do artigo 10º do CIMI.
  2. Iniciamos pela análise do regime fiscal aplicável ao caso sub júdice, vejamos o artigo 9.º e 10 do CIMI, aplicável a data dos factos.

Artigo 9.º

Início da tributação

1- O imposto é devido a partir:

a) Do ano, inclusive, em que a fracção do território e demais elementos referidos no artigo 2.º devam ser classificados como prédio;

b) Do ano seguinte ao do termo da situação de isenção, salvo se, estando o sujeito passivo a beneficiar de isenção, venha a adquirir novo prédio para habitação própria e permanente e continuar titular do direito de propriedade do prédio isento, caso em que o imposto é devido no ano em que o prédio deixou de ser habitado pelo respectivo proprietário;

c) Do ano, inclusive, da conclusão das obras de edificação, de melhoramento ou de outras alterações que hajam determinado a variação do valor patrimonial tributário de um prédio;

d) Do 4.º ano seguinte, inclusive, àquele em que um terreno para construção tenha passado a figurar no inventário de uma empresa que tenha por objecto a construção de edifícios para venda;

e) Do 3.º ano seguinte, inclusive, àquele em que um prédio tenha passado a figurar no inventário de uma empresa que tenha por objecto a sua venda

2 - Nas situações previstas nas alíneas d) e e) do número anterior, caso ao prédio seja dada diferente utilização, liquida-se o imposto por todo o período decorrido desde a sua aquisição.

3 - Na situação prevista na alínea e) do n.º 1, o imposto é ainda devido a partir do ano, inclusive, em que a venda do prédio tenha sido retardada por facto imputável ao respectivo sujeito passivo.

4 - Para efeitos do disposto nas alíneas d) e e) do n.º 1, devem os sujeitos passivos comunicar ao serviço de finanças da área da situação dos prédios, no prazo de 60 dias contados da verificação do facto determinante da sua aplicação, a afectação dos prédios àqueles fins.

5 - Nas situações a que alude o número anterior, se a comunicação for apresentada para além do prazo referido, o imposto é devido por todo o tempo já decorrido, iniciando-se a suspensão da tributação apenas a partir do ano da comunicação, cessando, todavia, no ano em que findaria caso tivesse sido apresentada em tempo.(Redacção dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro)

6 - Não gozam do regime previsto nas alíneas d) e e) do n.º 1 os sujeitos passivos que tenham adquirido o prédio a entidade que dele já tenha beneficiado.

7 - O disposto nas alíneas d) e e) do n.º 1 não é aplicável aos sujeitos passivos que:(Redação da Lei nº 75-B/2020, de 31 de dezembro)

a) Tenham domicílio fiscal em país, território ou região sujeito a um regime fiscal mais favorável, constante de lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças;(Redação da Lei nº 75-B/2020, de 31 de dezembro)

b) Sejam, nos termos previstos no n.º 8 do artigo 17.º do Código do IMT, uma entidade dominada ou controlada, direta ou indiretamente, por entidade que tenha domicílio fiscal em país, território ou região sujeito a um regime fiscal mais favorável, constante de lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças.(Redação da Lei nº 75-B/2020, de 31 de dezembro)

Artigo 10.º

Data da conclusão dos prédios urbanos

1 - Os prédios urbanos presumem-se concluídos ou modificados na mais antiga das seguintes datas:

a) Em que for concedida licença camarária, quando exigível;

b) Que a declaração de inscrição na matriz indique como data de conclusão das obras;

c) Em que se verificar uma qualquer utilização, desde que a título não precário;

d) Em que se tornar possível a sua normal utilização para os fins a que se destina.

2 - O chefe de finanças da área da situação dos prédios fixa, em despacho fundamentado, a data da conclusão ou modificação dos prédios, nos casos não previstos no número anterior e naqueles em que as presunções nele enunciadas não devam relevar, com base em elementos de que disponha, designadamente os fornecidos pelos serviços da administração fiscal, pela câmara municipal ou resultantes de reclamação dos sujeitos passivos.

  1. Vejamos em melhor detalhe, a análise jurídica sobre a aplicação da alínea c) do n.º 1 do artigo 9.º do CIMI, estabelece que o início da tributação é a do ano, inclusive, da conclusão das obras de edificação, de melhoramento ou de outras alterações.
  2. Restando, por conseguinte, a presunção prevista da alínea a) da mesma disposição legal, consubstanciada na data em que foi emitida a licença camarária, quando exigível, ou seja, no caso a autorização de utilização.
  3. Porém, como a própria disposição estabelece, a data da emissão da autorização de utilização é uma mera presunção da data da conclusão das obras no prédio melhorado.
  4. Contudo, apurando-se a verdadeira data de conclusão das obras, é esta a que deve valer para determinação do início do período de tributação, tal como determina a alínea c) do n.º 1 do artigo 9.º do Código do IMI.
  5. Refira-se que tem sido entendimento da Jurisprudência, que tem vindo a entender que, nomeadamente o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, 01189/08.6BEVIS, 06-05-2020:

“Este quadro jurídico e dogmático permite afirmar com segurança que o alvará não constitui condição de eficácia da autorização, assumindo a natureza de acto certificativo mediante o qual a administração verifica o cumprimento pelo destinatário do título das normas legais e regulamentares aplicáveis à utilização pretendida do edifício.

A interpretação segundo a qual a normal utilização do edifício apenas seria possível na data da emissão do alvará de utilização (10 agosto 2007) é refutada como os seguintes argumentos:

1º O legislador não considera como presunção de conclusão do prédio urbano a emissão de alvará de autorização de utilização, diferentemente do que estabelece para a licença camarária (art.10 nº 1 als.a) e d) CIMI);

2º Para o legislador releva decisivamente como ano do início da tributação aquele em que se verificar uma qualquer utilização, desde que não precária, ainda que sem título jurídico correspondente; ou a mera possibilidade da normal utilização do prédio para os fins que se destina, conferida pelo proferimento de despacho de autorização (art.10º nº1 als.c) e d) CIMI)

3º A formulação das citadas presunções legais de conclusão dos prédios urbanos aponta inequivocamente no sentido de se privilegiar a substância económica da situação do sujeito passivo, em detrimento da forma jurídica pela qual se inscreve no mundo jurídico, impondo a tributação sempre que a utilização efectiva do prédio constituir manifestação do aproveitamento da utilidade de um imóvel de que seja proprietário, pelo qual revela a sua capacidade contributiva.

4º O elenco de presunções de conclusão dos prédios urbanos (estabelecido no art.10º nº1 CIMI) não distingue utilizações tituladas e não tituladas; pretende contemplar qualquer situação fáctica ou jurídica que revele estar integrada na esfera jurídica do sujeito passivo uma nova realidade física com expressão económica (com a designação de prédio urbano), traduzindo um acréscimo patrimonial que legitima a sujeição a tributação

  1. Em igual sentido, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 15-09-2022 no processo 1821/11.4 BELRS, que decidiu “Na determinação da data da conclusão ou modificação dos prédios urbanos, com vista à tributação em IMI, releva a emissão da autorização de utilização, por esta condicionar a possibilidade de uso normal do imóvel.”.
  2. Existindo uma divergência entre a declaração Mod. 1 entregue pelo Sujeito Passivo e a posição da AT, o n.º 2 do artigo 10.º do Código do IMI prevê a possibilidade de fixação oficiosa da data de conclusão ou modificação de um prédio, através de despacho fundamentado do chefe do serviço de finanças competente, o que acontecerá, em princípio, quando o sujeito passivo violar o dever declarativo previsto no artigo 13.º. Esta decisão deverá respeitar os critérios previstos nas alíneas a), c), e d) do n.º 1, fixando-se a data mais antiga das aí previstas. (Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte Processo 00662/10.0BEAVR).
  3. Nos presentes autos a AT alega que “perante a declaração apresentada pelo ora Requerente, o Chefe do Serviço de Finanças usou da prerrogativa constante no n.º 2 do art.º 10.º do CIMI, alterando a data do facto de 17.02.2023 para 03.10.2022, com fundamento nos documentos enviados ao serviço de finanças pelo grupo de Apoio da Câmara Municipal de Cascais.”.
  4. Existindo uma divergência quanto à data de data da conclusão dos prédios urbanos, e nas situações previstas n.º 1 artigo 10.º, o legislador previu no n.º 2 do referido artigo, o mecanismo legal para a AT poder proceder a sua fixação.
  5. Porém, não foi junto aos autos o despacho fundamentado que o n.º 2 do artigo 10.º impõem, ou indicação da sua notificação ao sujeito passivo.
  6. Nesta senda, a AT entende que a data de conclusão da obra é de 03-10-2022, fundamentando a sua posição no Termo de Responsabilidade, do técnico D..., Engenheiro, inscrito na O.E sob o n.º..., que declara na qualidade de Diretor de Obra localizada na Rua ... n.º... em Cascais, o qual do referido termo expressamente declara que a obra estava concluída desde 03-10-2022.
  7. Alegando a AT que a data de conclusão da obra é de 03-10-2022, competia-lhe o respetivo ónus da prova da sua alegação.
  8. Competia-lhe, assim, demonstrar que o imóvel em 03-10-2022, já respeitava os critérios previstos nas alíneas c), e d) do n.º 1 do artigo 10.º, contudo não apresentou prova e evidencias que em 3 de outubro de 2022, o imóvel já estava em condições de se verificar uma qualquer utilização, desde que a título não precário (aliena c) ou que era possível a sua normal utilização para os fins a que se destina (alínea d).
  9. Por outras palavras, a AT, não logrou em demonstrar que em 03-10-2022, já se encontrava em utilização ou em condições de utilização.
  10. Ora perante a factualidade dada como provada, sobre a data em que foi concedida a licença camarária, não se suscita dúvida, a mesma verificou-se com a emissão do alvará nº 53,  pela Câmara Municipal de Cascais em 17-02-2023. Ou seja,  no decorrer do ano de 2023.
  11. Nestes termos, por força da aliena a) do n. º1 do artigo 10, deve ser esta a data a considerar para efeitos da data de conclusão da obra.
  12. Da que coincide com a declaração entregue pelo Requerente, em 02-03-2023 procedeu à entrega da modelo 1 n.º..., conforme solicitado, para inscrição do prédio novo, a que foi atribuído o artigo Provisório n.º ... (...) com vista à sua avaliação e inscrição na matriz, (proveniente do art.º ... (...), tendo indicado como data de início a data da licença de utilização 17-02-2023.
  13. Por último ainda se refira, que a alínea b) do n.º 1 do artigo 10.º, refere expressamente a data de conclusão das obras que consta da declaração de inscrição na matriz, o que não é o caso, não se aplicando aos presentes autos.
  14. Face a todo o exposto e às invocadas normas legais, conclui-se que a data de conclusão dos prédios urbanos para efeitos da alínea c) do n.º 1 do artigo 9 e do artigo 10.º do CIMI, é a data correspondente a emissão do alvará nº..., emitido pela Câmara Municipal de Cascais em 17.02.2023, o qual procedeu à autorização para habitação do referido imóvel, por a mesma ser a data mais antiga, conforme impõe os normativos.
  15. No caso em apreço, e conforme o anteriormente exposto, conclui-se pela ilegalidade das liquidações em apreço, e em consequência considera-se procedente o pedido de pronúncia arbitral.
  16. Veio ainda a Requerente pedir a condenação da Requerida no reembolso da quantia paga indevidamente e acrescida de juros indemnizatórios.

 

I - Pedido de reembolso da quantia paga e juros indemnizatórios

  1. A procedência do pedido de anulação do ato de liquidação objeto do pedido de pronúncia arbitral tem por consequência vincular a AT nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º, do RJAT, e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, a “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito”, o que inclui, para além da restituição do indevido, “o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previstos na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário.”.

89.       Igual consequência decorre do disposto no n.º 1 do artigo 100.º, da Lei Geral Tributária (LGT), aplicável ao processo arbitral tributário por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT, que estabelece “1 - A administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei.”.

90.       O regime dos juros indemnizatórios consta do artigo 43.º, da LGT, que fixa o momento a partir do qual os mesmos são devidos, por erro imputável aos serviços (n.ºs 1 e 2) ou por “outras circunstâncias” (n.º 3), bem como a respetiva taxa (n.º 4) e a consequência do atraso na execução da sentença transitada em julgado (n.º 5).

91.       Na sequência da anulação do ato de liquidação de IMI e AIMI, tem a Requerente direito a ser reembolsada da quantia paga em excesso, como consequência da anulação total do ato de liquidação de IMI e AIMI nos termos do n.º 1 do artigo 43.º, da LGT, desde a data de pagamento do imposto até ao integral reembolso.

92.       Face a todo o exposto e às invocadas normas legais, decide-se pela procedência do pedido da Requerente.

J-Questões De Conhecimento Prejudicado

  1. O tribunal tem o dever de se pronunciar sobre todas as questões, abstendo-se de se pronunciar sobre questões de que não deva conhecer (segmento final do n.º 1 do artigo 125.º, do CPPT). Contudo as questões sobre que recaem os poderes de cognição do tribunal, são, de acordo com o n.º 2 do artigo 608.º, do CPC, aplicável subsidiariamente ao processo arbitral tributário, por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT, “as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)”.
  2. Em face da solução dada, fica prejudicado o conhecimento de qualquer outra questão incluída no pedido de pronúncia arbitral

L - Decisão

Termos em que, de harmonia com o exposto, decide-se neste Tribunal Arbitral, julgar totalmente procedente o pedido arbitral formulado pela Requerente, e em consequência:

  1. Declarar a ilegalidade e consequente anulação do ato de liquidação de IMI e AIMI, referente ao período de 2022, no montante total de 35.797,35 (trinta e cinco mil setecentos e noventa e sete euros e trinta e cinco cêntimos
  2. Condenar a Requerida a restituir à Requerente a quantia paga, acrescido de juros indemnizatórios nos termos do n.º 1 do artigo 43.º da LGT;
  3. Condenar a Requerida no pagamento integral das custas do processo.

M. Valor Do Processo e Custas

Fixa-se o valor do processo em 35.797,35 (trinta e cinco mil setecentos e noventa e sete euros e trinta e cinco cêntimos), correspondente ao valor económico do processo aferido pelo valor das liquidações de imposto cuja ilegalidade é impugnada.

 

 

N. Custas

 Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 1.836.00 (mil e oitocentos e trinta e seis euros), nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida.

 

Notifique-se.

Lisboa, 24 de setembro de 2024.

A Árbitra

Rita Guerra Alves