Processo n.º 707/2014-T
Tema: Imposto do Selo. Verba 28.1 da TGIS. Terrenos para construção.
DECISÃO ARBITRAL
I. RELATÓRIO
1. No dia 8 de outubro de 2014, a “A”, NIPC …, com sede na … (doravante, Requerente), apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (doravante, abreviadamente designado RJAT), visando a declaração de ilegalidade e a anulação dos atos de liquidação de Imposto do Selo, efetuados ao abrigo da verba 28.1 da Tabela Geral do Código do Imposto do Selo (doravante, TGIS), com referência ao ano de 2013 e aos prédios urbanos inscritos sob os artigos ... (atual P ...) e ... (atual P ...) na matriz predial urbana da …, concelho e distrito do …, ambos da propriedade da Requerente.
É Requerida a AT – Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante, Requerida ou AT).
A Requerente arrolou duas testemunhas, não tendo juntado documentos, nem requerido a produção de quaisquer outras provas.
No essencial e em breve síntese, a Requerente alegou o seguinte:
É proprietária de dois prédios urbanos, atualmente classificados, em sede de IMI, como “terrenos situados dentro de aglomerado urbano onde não é permitido construir e sem afetação agrícola”, sitos na União das Freguesias de …, concelho do ....
Na sequência da avaliação geral oficiosamente promovida pela AT no ano de 2012, àqueles prédios urbanos foram atribuídos os valores patrimoniais tributários de € 2.846.620,00 e de € 3.131.440,00, sendo que os mesmos foram então classificados como terrenos para construção.
Em 18 de março de 2014, tendo por base a verba 28.1 da TGIS, a AT procedeu à liquidação de Imposto do Selo relativo ao ano de 2013, sobre os referidos prédios urbanos – enquanto terrenos para construção e com os valores patrimoniais tributários de € 2.846.620,00 e de € 3.131.440,00 –, nos montantes de € 28.446,20 e de € 31.314,40.
Ambos os prédios foram objeto de reavaliação, em sede de IMI, em junho de 2014, passando a ser classificados como “terrenos situados dentro de aglomerado urbano onde não é permitido construir e sem afetação agrícola”, com os valores patrimoniais tributários de € 33.270,00 (antes era de € 2.846.620,00) e de € 32.520,00 (antes era de € 3.131.440,00).
Em julho de 2014, a Requerente deduziu reclamação graciosa contra as referidas liquidações de Imposto do Selo, a qual veio a ser indeferida pela AT.
No entender da Requerente, a avaliação que, em 2012, foi efetuada pela AT aos mencionados prédios, não cumpriu todos os pressupostos legais, pois em 2012 e 2013 aqueles prédios já não poderiam ser descritos como terrenos para construção nem lhes poderiam ser fixados valores patrimoniais tributários tão elevados. Tal classificação e os correspetivos valores patrimoniais já em 2012 estavam desajustados da realidade física, jurídica e económica daqueles prédios, pois sobre ambos já então impendiam, e continuam a impender, diversos ónus e condicionantes de conhecimento público, os quais influem decisivamente quer na classificação, quer na determinação do valor patrimonial tributário dos prédios.
A Requerente não reclamou da avaliação que a AT efetuou àqueles prédios em 2012, porque estava isenta de IMI e de Imposto do Selo, até finais de novembro de 2013, e porque não alcançou as consequências dessa omissão.
Nesta medida, segundo a Requerente, a atuação da AT: «- levou incorreções à matriz, quanto à descrição e classificação dos prédios e quanto ao seu VPT (C.IMI/130.º, 3); - consubstanciou erro imputável aos serviços (LGT/78.º, 1, 4, 5); - evidenciou abuso de direito quanto ao poder de cobrar impostos, ofendendo e excedendo os fins da tributação (LGT/5.º, CC/334.º); - perpetrou ilegalidade no processo avaliativo, no âmbito da avaliação geral em sede de IMI, que se refletem na liquidação do Imposto de Selo em impugnação (C:IMI/130.º, 3); - violou elementares princípios do procedimento tributário, designadamente os princípios da igualdade, da proporcionalidade e da justiça, no respeito pelas garantias dos contribuintes (LGT/55.º; CRP/266.º, 1, 2); - prejudicou, grave e injustamente, a proprietária.»
Impõe-se, pois, a anulação das mencionadas liquidações de Imposto do Selo referentes a 2013, por falta de base tributável, uma vez que, nos termos da verba 28.1 da TGIS, apenas estão sujeitos a este imposto os prédios com valor patrimonial tributário superior a € 1.000.000,00 (os VPT corretos a considerar são, segundo a Requerente, de € 32.520,00 e de € 33.270,00).
Noutra ordem de considerações, verifica-se ainda que os terrenos para construção sobre cuja propriedade incidiu o Imposto do Selo que a AT liquidou à Requerente, não têm cabimento na previsão da verba 28.1 da TGIS – apesar de serem prédios urbanos, não são “prédios urbanos com afetação habitacional” –, pelo que as liquidações impugnadas são ilegais na medida em que violam aquela norma de incidência, configurando erro sobre os pressupostos de direito, o que as torna anuláveis nos termos do disposto no artigo 135.º do Código de Procedimento Administrativo.
Noutra parametria, as liquidações de Imposto do Selo em apreço constituem uma violação do princípio da igualdade fiscal previsto no artigo 13.º da CRP porque, por um lado, baseiam-se numa norma – a verba 28.1 da TGIS – que trata contribuintes que se encontram em situações idênticas de forma bem diferente, não sendo a medida da diferença aferida pela sua capacidade contributiva e, por outro lado, estão baseadas num a solução legal arbitrária sem qualquer fundamento racional e, finalmente, porque a mesma realidade é duplamente tributada.
A Requerente remata o pedido de pronúncia arbitral preconizando que «devem ser considerados procedentes os argumentos expostos» e, consequentemente, formula os seguintes pedidos:
«a) Anulação da liquidação do Imposto de Selo referente ao ano de 2013, no que respeita ao imposto liquidado quanto aos artigos urbanos ... ... ..., por erro na avaliação do VPT, respetivamente no montante de € 28.466,20 e de € 31.340,40;
Caso assim se não entenda,
b) Anulação das liquidações com base em erro na qualificação do facto tributário, ou, ainda,
c) Anulação da liquidação com base na ilegalidade do imposto por inconstitucionalidade da norma de incidência contida na verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, em conjugação com o art. 1.º, n.º 1 do Código do Imposto do Selo, por violação do princípio da igualdade fiscal previsto no artigo 13.º da CRP.»
2. O pedido de constituição de tribunal arbitral foi aceite e automaticamente notificado à AT em 15 de outubro de 2014.
3. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do art. 6.º e da alínea a) do n.º 1 do art. 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou o signatário como árbitro do Tribunal Arbitral singular, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.
4. Em 27 de novembro de 2014, as partes foram devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do art. 11.º, n.º 1, alíneas b) e c), do RJAT e dos arts. 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.
5. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do art. 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral coletivo foi constituído em 16 de dezembro de 2014.
6. No dia 2 de fevereiro de 2015, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua Resposta na qual impugnou, especificadamente, os argumentos aduzidos pela Requerente e concluiu pela improcedência da presente ação, com a sua consequente absolvição do pedido.
A Requerida não juntou documentos, nem requereu a produção de quaisquer outras provas.
Na mesma ocasião, a Requerida juntou aos autos o respetivo processo administrativo (doravante, abreviadamente designado PA).
No essencial e também de forma breve, importa respigar os argumentos mais relevantes em que a Requerida alicerçou a sua contestação:
O conceito de “prédios com afetação habitacional”, para efeitos do disposto na verba 28 da TGIS, compreende quer os prédios edificados quer os terrenos para construção, atento, desde logo, o elemento literal da norma. O legislador não refere “prédios destinados a habitação”, tendo antes optado pela noção “afetação habitacional”, expressão que é diferente e mais ampla e cujo sentido há-de ser encontrado na necessidade de integrar outras realidades para além das mencionadas no artigo 6.º, n.º 1, alínea a), do CIMI.
A mera constituição de um direito de potencial construção faz aumentar o valor do imóvel em causa, razão de ser da norma constante do artigo 45.º do CIMI que manda separar as duas partes do terreno.
Por outro lado, atento o disposto no Regime Jurídico da Urbanização e Edificação e o conteúdo típico dos Planos Diretores Municipais, é possível apurar e determinar a afetação do terreno para construção, antes da efetiva edificação do prédio.
Noutra parametria, a Requerida entende que a previsão da verba 28 da TGIS não viola qualquer comando constitucional. Porquanto, desde logo, incide sobre o valor do imóvel e é uma norma geral e abstrata, aplicável indistintamente a todos os casos em que se verifiquem os respetivos pressupostos de facto e de direito. Ademais, a diferente valoração e tributação de um prédio constituído em propriedade horizontal face a um prédio em propriedade total radica nos diferentes efeitos jurídicos inerentes a estas duas figuras. Acresce que a diferente aptidão dos imóveis sustenta o diferente tratamento fiscal, tendo constituído opção do legislador, por razões de natureza política e económica, afastar da incidência do Imposto do Selo os imóveis destinados a outros fins que não os habitacionais.
A Requerida sustenta, em conclusão, que «a liquidação em crise consubstancia uma correta interpretação e aplicação do direito aos factos, não padecendo de vício de violação de lei, seja da CRP ou do CIS, devendo, em consequência, julgar-se improcedente a pretensão aduzida e absolver-se a Entidade Requerida do pedido».
7. Em 2 de fevereiro de 2015, a Requerida veio aos autos propor que fosse dispensada a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, por a mesma se afigurar desnecessária, podendo assim o Tribunal Arbitral conhecer desde logo do pedido.
Notificada para se pronunciar quanto ao conteúdo desse requerimento, a Requerente veio aos autos manifestar a sua adesão àquela posição da AT, tendo então prescindido da produção de prova testemunhal.
Atentas as posições convergentes assumidas pelas Partes, foi pois dispensada a realização da reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT e não houve lugar à produção de quaisquer alegações.
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II. SANEAMENTO
O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é competente.
O processo não enferma de nulidades.
As partes gozam de personalidade e de capacidade judiciárias, encontram-se devidamente representadas e são legítimas.
Admite-se a cumulação de pedidos em virtude de se verificar que a procedência dos pedidos formulados pela Requerente depende essencialmente da apreciação das mesmas circunstâncias de facto – radicadas na propriedade da Requerente sobre dois prédios urbanos – e da interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou regras de direito – in casu, da verba 28.1 da TGIS (cf. artigo 3.º, n.º 1, do RJAT).
Não há exceções ou outras questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito e de que cumpra conhecer.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
III.1. DE FACTO
§1. FACTOS PROVADOS
Relativamente à matéria de facto, importa, antes de mais, salientar que o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art. 123.º, n.º 2, do CPPT e art. 607.º, n.ºs 3 e 4, do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT). Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito.
Nesta parametria, tendo em consideração, nomeadamente, as posições assumidas pelas partes, a prova documental produzida e o processo administrativo junto aos autos, consideram-se provados os seguintes factos com relevo para a decisão:
1. A Requerente é uma pessoa jurídica canónica que integra a Igreja Católica – factualidade aceite por acordo – cf. PA junto aos autos (factualidade aceite por acordo).
2. A Requerente é proprietária do prédio urbano, classificado, em sede de IMI, como “terreno situado dentro de aglomerado urbano onde não é permitido construir e sem afetação agrícola”, sito na União das Freguesias de ..., concelho e distrito do ..., inscrito na respetiva matriz predial sob o artigo P..., com o valor patrimonial tributário de € 33.270,00 – cf. PA junto aos autos (factualidade aceite por acordo).
3. A Requerente é proprietária do prédio urbano, classificado, em sede de IMI, como “terreno situado dentro de aglomerado urbano onde não é permitido construir e sem afetação agrícola”, sito na União das Freguesias de ..., concelho e distrito do ..., inscrito na respetiva matriz predial sob o artigo P..., com o valor patrimonial tributário de € 32.520,00 – cf. PA junto aos autos (factualidade aceite por acordo).
4. Os prédios urbanos identificados nos factos provados 2. e 3. localizam-se na zona de implantação do Projeto de Intervenção Urbanística, da Câmara Municipal do ..., destinado à abertura da inicialmente denominada …, recentemente redenominada Avenida …, a qual fará a ligação entre a … e a … – cf. PA junto aos autos (factualidade aceite por acordo).
5. O referido Projeto de Intervenção Urbanística identifica a Unidade Operativa de Planeamento e Gestão (UOPG 1) da Avenida ... e consta do PDM da Câmara Municipal do ... em vigor – cf. PA junto aos autos (factualidade aceite por acordo).
6. Os dois prédios urbanos identificados nos factos provados 2. e 3. correspondem, na mencionada UOPG 1, às parcelas 35 e 46 – cf. PA junto aos autos (factualidade aceite por acordo).
7. Sobre as ditas parcelas 35 e 46 incidem ónus e condicionantes urbanísticas que já existiam nos anos de 2012 e 2013 – cf. PA junto aos autos (factualidade aceite por acordo).
8. O traçado da mencionada Avenida ... ocupará grande parte da área de cada um dos prédios urbanos identificados nos factos provados 2. e 3. – cf. PA junto aos autos (factualidade aceite por acordo).
9. No ano de 2012, os dois prédios mencionados nos factos provados 2. e 3. foram sujeitos à avaliação geral dos prédios urbanos, em sede de IMI, no âmbito da qual foram os mesmos então classificados como “terreno para construção”, tendo-lhes sido atribuídos os seguintes valores patrimoniais tributários [cf. PA junto aos autos (factualidade aceite por acordo)]:
Artigo matricial
(2012)
|
Artigo matricial
(atual)
|
VPT
|
...
|
P ...
|
€ 2.846.620,00
|
...
|
P ...
|
€ 3.131.440,00
|
10. A Requerente foi notificada do resultado daquela avaliação, por ofício datado de 21.01.2013, não tendo requerido a segunda avaliação dos referidos prédios urbanos – cf. PA junto aos autos (factualidade aceite por acordo).
11. Os referidos valores patrimoniais tributários apurados na sequência da predita avaliação dos mencionados prédios urbanos, foram lançados nas respetivas matrizes prediais em 26.02.2013 – cf. PA junto aos autos.
12. No ano de 2013, os dois prédios mencionados nos factos provados 2. e 3. tinham, em sede de IMI, a classificação e os valores patrimoniais tributários referidos no facto provado 9. – cf. PA junto aos autos (factualidade aceite por acordo).
13. No ano de 2014, os dois prédios urbanos mencionados nos factos provados 2. e 3. foram sujeitos a nova avaliação, em sede de IMI, tendo-lhes então sido atribuídos os artigos matriciais, classificação e valores patrimoniais tributários referidos nos factos provados 2. e 3. – cf. PA junto aos autos (factualidade aceite por acordo).
14. A Requerente foi notificada do resultado dessa avaliação, por ofícios datados de 17.06.2014 – cf. PA junto aos autos (factualidade aceite por acordo).
15. Os dois prédios urbanos mencionados nos factos provados 2. e 3. estiveram isentos de IMI e de Imposto do Selo até ao mês de novembro de 2013, ao abrigo do disposto no artigo 26.º, n.º 2, da Concordata celebrada entre a Santa Sé a República Portuguesa, assinada em 18 de maio de 2004 – cf. PA junto aos autos (factualidade aceite por acordo).
16. Por despacho, datado de 19 de novembro de 2013, do Chefe de Finanças Adjunto do Serviço de Finanças de ...-2, foi declarada a cessação daquela isenção de impostos – cf. PA junto aos autos (factualidade aceite por acordo).
17. A Requerente foi notificada da liquidação n.º 2014 ... de Imposto do Selo, referente ao ano de 2013, datada de 18.03.2014, no montante de € 28.466,20, incidente sobre o prédio urbano mencionado no facto provado 2., tal como este é descrito no facto provado 9. – cf. PA junto aos autos (factualidade aceite por acordo).
18. A Requerente foi notificada da liquidação n.º 2014 ... de Imposto do Selo, referente ao ano de 2013, datada de 18.03.2014, no montante de € 31.314,40, incidente sobre o prédio urbano mencionado no facto provado 3., tal como este é descrito no facto provado 9. – cf. PA junto aos autos (factualidade aceite por acordo).
19. As liquidações de Imposto do Selo mencionadas nos factos provados 17. e 18. resultaram da aplicação da verba 28.1 da TGIS aos referidos prédios urbanos – cf. PA junto aos autos (factualidade aceite por acordo).
20. Em 25 de julho de 2014, a Requerente apresentou, no Serviço de Finanças de ...-2, uma reclamação graciosa contra as liquidações de Imposto do Selo mencionadas nos factos provados 17. e 18. – cf. PA junto aos autos (factualidade aceite por acordo).
21. A Requerente foi notificada pelo ofício n.º 6094/3182-20, de 25.08.2014, do Serviço de Finanças de ...-2, remetido por correio registado (conforme registo dos CTT n.º RD … PT), do projeto de decisão de indeferimento da mencionada reclamação graciosa – a qual foi autuada sob o n.º ... – e para exercer, querendo, o seu direito de audição prévia, sob a forma escrita – cf. PA junto aos autos.
22. O mencionado projeto de decisão dá-se aqui por inteiramente reproduzido, constando do mesmo, além do mais, o seguinte (cf. PA junto aos autos):
«No âmbito da avaliação geral foi o sujeito passivo notificado do resultado da avaliação (…).
Findo o prazo constante da referida notificação e não tendo sido apresentado pedido de 2.ª avaliação e, posteriormente, impugnação judicial, forma de reclamar de eventuais incorreções, foi o valor patrimonial apurado lançado à matriz em 2013-02-26.
De acordo com a redação da Lei 55-A/2012, de 29.10, dispõe o artigo 3.º as alterações ao Código do Imposto do Selo, sendo relevante para a questão aqui reclamada a alteração à redação do artigo 67.º do CIS, “Às matérias não reguladas no presente Código respeitantes à verba 28 da Tabela Geral aplica-se, subsidiariamente, o disposto no CIMI”.
Com efeito, os prédios urbanos que sejam terrenos para construção e aos quais, no âmbito da respetiva avaliação, tenha sido atribuída a afetação habitacional, como é o caso, estará sujeita a Imposto do Selo.
O facto de na norma de incidência (verba 28.1), se ter positivado o prédio com afetação habitacional, faz apelo ao coeficiente de afetação (artigo 41.º do CIMI), que se aplica, indistintamente, a todos os prédios urbanos.
Pelo exposto a liquidação foi efetuada com observância dos preceitos legais que regem esta matéria, pelo que a presente reclamação merece projeto de indeferimento.»
23. A Requerente não exerceu o seu direito de audição prévia relativamente ao predito projeto de decisão da reclamação graciosa – cf. PA junto aos autos.
24. A mesma reclamação graciosa foi indeferida por despacho proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de ...-2, datado de 23.09.2014, tendo a decisão sido fundamentada por remissão para o respetivo projeto de decisão – cf. PA junto aos autos.
25. Aquela decisão de indeferimento da reclamação graciosa foi notificada à Requerente pelo ofício n.º 6668/3182-20, de 22.09.2014, do Serviço de Finanças de ...-2, remetido por correio registado (conforme registo dos CTT n.º RD … PT), com aviso de receção – cf. PA junto aos autos.
26. A Requerente foi notificada da decisão de indeferimento da reclamação graciosa em 26.09.2014 – cf. PA junto aos autos.
27. Em 8 de outubro de 2014, a Requerente apresentou o pedido de constituição de tribunal arbitral que deu origem ao presente processo – cf. sistema informático de gestão processual do CAAD.
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§2. FACTOS NÃO PROVADOS
Com relevo para a apreciação e decisão da causa, não há factos que não se tenham provado.
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§3. MOTIVAÇÃO QUANTO À MATÉRIA DE FACTO
No tocante à matéria de facto provada, a convicção do Tribunal fundou-se nas afirmações feitas nos articulados, cuja aderência à realidade não foi posta em causa, e no processo administrativo junto aos autos, conforme referências feitas em relação aos diversos pontos.
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III.2. DE DIREITO
§1. Antes de entrarmos na apreciação e decisão da questão que constitui o thema decidendum do presente processo arbitral, importa que previamente analisemos os dois aspetos seguintes: a definição do objeto deste processo e a ordem de conhecimento dos vícios apontados aos atos tributários impugnados.
Vejamos, pois.
§1.1. Como resultou provado, em 25 de julho de 2014, a Requerente apresentou, no Serviço de Finanças de ...-2, uma reclamação graciosa contra as liquidações de Imposto do Selo em causa nestes autos (cf. facto provado 20.), a qual foi indeferida por despacho proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de ...-2, datado de 23.09.2014 (cf. facto provado 24.), tendo a Requerente sido notificada dessa decisão de indeferimento em 26.09.2014 (cf. facto provado 26.).
Na situação sub judice temos, pois, dois níveis distintos de atos: os atos de liquidação de Imposto do Selo, que são atos de primeiro grau, e o ato de indeferimento da reclamação graciosa, que constitui um ato de segundo grau.
No pedido de pronúncia arbitral, a Requerente, para além de aludir àquela reclamação graciosa, refere ainda o seguinte: «Caso a pronúncia requerida resulte na declaração da ilegalidade dos actos tributários deve ser anulado o indeferimento proferido pela AT na sequência da reclamação graciosa.».
Na perspetiva deste processo e, mais concretamente, do respetivo objeto, verificamos, efetivamente, que o ato de indeferimento da sobredita reclamação graciosa constitui o seu objeto imediato, sendo o seu objeto mediato os referenciados atos de liquidação de Imposto do Selo. No entanto, «o objecto real da impugnação é o acto de liquidação e não o acto que decidiu a reclamação, pelo que são os vícios daquela e não deste despacho que estão verdadeiramente em crise» (cf. acórdão do STA de 16/11/2011, processo 0156/11). Porquanto, como se explicita no acórdão do STA de 28/10/2009, proferido no processo n.º 0595/09, «nos casos em que a reclamação graciosa é expressamente indeferida, o objecto do processo de impugnação judicial é, formal e directamente, o acto de indeferimento, que manteve a liquidação que foi objecto da reclamação, mas, o objecto real da impugnação, o acto cuja legalidade está em causa apurar, é o acto de liquidação que foi mantido pelo acto de indeferimento da reclamação.».
A este propósito, importa ainda dizer que, apesar de na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT apenas se fazer referência explícita à competência dos tribunais arbitrais para declararem a ilegalidade de atos de liquidação, essa competência estende-se a atos de segundo e terceiro graus que apreciem a legalidade desses atos primários, designadamente atos de indeferimento de reclamações graciosas e atos de indeferimento de recursos hierárquicos interpostos das decisões destas reclamações.
Tal conclusão é alcançada a partir da alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do RJAT, que faz referência expressa ao n.º 2 do artigo 102.º do CPPT (que trata do indeferimento de reclamação graciosa) e à decisão do recurso hierárquico (cf., neste sentido, Jorge Lopes de Sousa, “Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária”, in Guia da Arbitragem Tributária, Coord. Nuno Villa-Lobos e Mónica Brito Vieira, Coimbra, Almedina, 2013, p. 121).
Dito isto, entremos agora na análise do segundo aspeto supra enunciado.
§1.2. O artigo 124.º do CPPT, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, estatui o seguinte:
Artigo 124.º
Ordem do conhecimento dos vícios da sentença
1. Na sentença, o tribunal apreciará prioritariamente os vícios que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade do acto impugnado e, depois, os vícios arguidos que conduzam à sua anulação.
2. Nos referidos grupos a apreciação dos vícios é feita pela ordem seguinte:
a) No primeiro grupo, o dos vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos;
b) No segundo grupo, a indicada pelo impugnante, sempre que este estabeleça entre eles uma relação de subsidiariedade e não sejam arguidos outros vícios pelo Ministério Público ou, nos demais casos, a fixada na alínea anterior.
Este preceito legal estabelece uma prioridade para o conhecimento dos vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos.
Revertendo para o caso dos autos, afigura-se inequívoco que nenhum dos vícios invocados pela Requerente pode ser considerado como proveniente de situações que possam determinar a nulidade dos atos tributários impugnados, à luz dos critérios legais que os caracterizam.
Por outro lado, constatamos que a Requerente estabeleceu uma relação de subsidiariedade entre os vícios por si invocados contra as liquidações de Imposto do Selo em apreço neste processo.
Nesta parametria, os vícios assacados aos atos tributários impugnados irão ser conhecidos pela ordem de prioridade que a própria Requerente estabeleceu, a saber: erro na classificação dos prédios e na avaliação do valor patrimonial tributário; erro na qualificação do facto tributário; e violação do princípio constitucional da igualdade.
§1.2.1. A Requerente impugna as liquidações de Imposto do Selo em apreço nestes autos, começando por invocar a existência de «erro na classificação dos prédios e na avaliação do VPT», alegando, em síntese, que a avaliação que, em 2012, foi efetuada pela AT aos referenciados prédios urbanos, em sede de IMI, não cumpriu todos os pressupostos legais, pois em 2012 e 2013 aqueles prédios já não poderiam ser descritos como terrenos para construção nem lhes poderiam ser fixados valores patrimoniais tributários tão elevados.
A forma como a Requerente invoca e, posteriormente, desenvolve esta questão, ao longo do seu articulado inicial, leva-nos a concluir que ela pretende atacar, embora de forma indireta (isto é, sem que tal integre o objeto deste processo), os atos de fixação dos valores patrimoniais tributários dos mencionados prédios urbanos, aquando da avaliação, em sede de IMI, a que eles foram oficiosamente sujeitos em 2012.
Adiantamos, desde já, que tal pretensão da Requerente terá de soçobrar, como se passará a demonstrar através de um breve excurso pelo regime legal da avaliação geral dos prédios urbanos que em 1 de dezembro de 2011 ainda não tinham sido abrangidos pelo procedimento de avaliação do Código do IMI, instituído pela Lei n.º 64-A/2011, de 30 de novembro, que aditou os artigos 15.º-A a 15.º-P ao Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro.
No regime legal da avaliação geral a iniciativa da avaliação dos prédios urbanos é sempre da AT (cf. artigo 15.º-C, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 287/2003), sendo esta uma das mais importantes inovações instituídas por este regime.
A avaliação é feita nos termos do Código do IMI, utilizando-se, para tal, a fórmula do seu artigo 38.º e todos os respetivos coeficientes. A avaliação é efetuada por um perito local, designado nos termos do artigo 63.º do Código do IMI. A determinação do valor patrimonial tributário é efetuada com base nos elementos que a AT dispõe acerca de cada prédio, não sendo obrigatório que o prédio seja vistoriado pelo perito avaliador (cf. artigo 15.º-D, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 287/2003).
Concluídos os atos de avaliação, o valor patrimonial tributário apurado é notificado ao respetivo sujeito passivo e à câmara municipal da área onde se localiza o prédio avaliado (cf. artigo 15.º-E do Decreto-Lei n.º 287/2003).
Se o sujeito passivo, a câmara municipal ou o chefe de finanças não concordarem com o resultado da avaliação geral de prédio urbano, podem, respetivamente, requerer ou promover a segunda avaliação, no prazo de 30 dias a contar da data em que se considera notificado o sujeito passivo (cf. artigo 15.º-F, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 287/2003). Esta segunda avaliação consiste apenas na correção dos eventuais erros cometidos na primeira avaliação, uma vez que no trabalho a realizar o perito independente está vinculado a aplicar de novo a fórmula e os coeficientes previstos no Código do IMI e utilizados na primeira avaliação (cf. artigo 15.º-F, n.º 2, o Decreto-Lei n.º 287/2003).
A decisão da segunda avaliação é suscetível de impugnação judicial, nos termos previstos no CPPT, com os fundamentos indicados no artigo 77.º do Código do IMI (cf. artigo 15.º-G do Decreto-Lei n.º 287/2003).
O valor patrimonial tributário torna-se definitivo logo que seja efetuada a notificação da segunda avaliação – ou, em caso de impugnação judicial, logo que a respetiva decisão transite em julgado – ou, caso esta não tenha sido requerida ou promovida, depois de transcorrido o prazo de 30 dias para a solicitar. Assim, logo que a decisão da segunda avaliação produza os seus efeitos, ou após o decurso do respetivo prazo sem que tenha sido solicitada ou promovida, os serviços da AT procedem à inscrição na matriz predial do valor patrimonial tributário que dela tiver resultado (cf. artigo 15.º-H do Decreto-Lei n.º 287/2003).
Aplicando este regime legal ao caso concreto, temos que resultou provado que, no ano de 2012, os prédios urbanos em causa foram sujeitos à dita avaliação geral, em sede de IMI, no âmbito da qual foram os mesmos então classificados como “terreno para construção”, tendo-lhes sido atribuídos os seguintes valores patrimoniais tributários: artigo matricial ... - € 2.846.620,00 e artigo matricial ... - € 3.131.440,00 (cf. facto provado 9.). Ademais, a Requerente foi notificada do resultado daquela avaliação, por ofício datado de 21.01.2013, não tendo requerido a segunda avaliação dos referidos prédios urbanos (cf. facto provado 10.). Por esse motivo, os citados valores patrimoniais tributários resultantes daquela avaliação tornaram-se definitivos, pelo que os serviços da AT procederam à sua inscrição na matriz predial em 26.02.2013 (cf. facto provado 11.).
Assim, resulta meridianamente claro que esta não é a forma e, muito menos, o tempo, para a Requerente reagir contra o resultado daquela avaliação oficiosa, em sede de IMI, a que os mencionados prédios urbanos foram sujeitos em 2012. Efetivamente, a Requerente deveria ter requerido ao respetivo chefe de finanças, no prazo estatuído no artigo 15.º-F, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 287/2003, a realização de uma segunda avaliação e, caso também não concordasse com o resultado desta, poderia ter deduzido impugnação judicial. Não o tendo feito, sibi imputat, afigurando-se impertinente tudo quanto a Requerente alega para justificar a sua inação.
Sem necessidade de maiores considerações, julga-se pois improcedente o invocado vício de erro na classificação dos prédios e na avaliação do valor patrimonial tributário.
Isto posto, passemos a apreciar o segundo vício assestado pela Requerente contra as liquidações de Imposto do Selo em apreço nestes autos, o que nos leva, concomitantemente e desde já, a entrar na apreciação da questão decidenda.
§2. A questão a apreciar e decidir neste processo é, nuclearmente, a de saber se a verba 28.1 da TGIS – na redação introduzida pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro e, portanto, em vigor em 2013 –, tem ou não aplicabilidade aos terrenos para construção.
Esta mesma questão já foi objeto de tratamento em múltiplas decisões quer arbitrais (entre outras, vide, as proferidas nos processos n.ºs 48/2013-T, 53/2013-T, 288/2013-T e 310/2013-T, todas disponíveis em www.caad.pt) quer judiciais (entre outros, vide, acórdãos do STA proferidos nos processos n.ºs 048/14, 01870/13, 0270/14, 0272/14 e 0676/14, todos disponíveis em www.dgsi.pt), as quais firmaram jurisprudência no sentido de que os terrenos para construção não podem ser considerados, para efeitos da norma de incidência do Imposto do Selo contida na verba 28.1 da TGIS (na redação da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro), como prédios urbanos com afetação habitacional.
Trata-se de jurisprudência que também aqui se acolhe, por com ela concordarmos plenamente, pelo que, no essencial, limitar-nos-emos a reproduzir o que sobre a questão ficou dito na decisão arbitral proferida no processo n.º 53/2013-T, a cujos fundamentos de direito aderimos sem quaisquer reservas:
«A Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, efectuou várias alterações ao Código do Imposto do Selo e aditou à TGIS a verba 28, com a seguinte redacção:
28 – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000 – sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeitos de IMI:
28.1 – Por prédio com afetação habitacional – 1%;
28.2 – Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residente em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças – 7,5%.
Nas disposições transitórias que constam do artigo 6.º daquela Lei n.º 55-A/2012, estabeleceram-se as seguintes regras atinentes à liquidação do imposto retido naquela verba:
1 – Em 2012, devem ser observadas as seguintes regras por referência à liquidação do imposto do selo previsto na verba n.º 28 da respetiva Tabela Geral:
a) O facto tributário verifica-se no dia 31 de outubro de 2012;
b) O sujeito passivo do imposto é o mencionado no n.º 4 do artigo 2.º do Código do Imposto do Selo na data referida na alínea anterior;
c) O valor patrimonial tributário a utilizar na liquidação do imposto corresponde ao que resulta das regras previstas no Código do Imposto Municipal sobre Imóveis por referência ao ano de 2011;
d) A liquidação do imposto pela Autoridade Tributária e Aduaneira deve ser efetuada até ao final do mês de novembro de 2012;
e) O imposto deverá ser pago, numa única prestação, pelos sujeitos passivos até ao dia 20 de dezembro de 2012;
f) As taxas aplicáveis são as seguintes:
i) Prédios com afetação habitacional avaliados nos termos do Código do IMI: 0,5%;
ii) Prédios com afetação habitacional ainda não avaliados nos termos do Código do IMI: 0,8%;
iii) Prédios urbanos quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares seja residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças: 7,5%.
2 – Em 2013, a liquidação do imposto do selo previsto na verba n.º 28 da respetiva Tabela Geral deve incidir sobre o mesmo valor patrimonial tributário utilizado para efeitos de liquidação de imposto municipal sobre imóveis a efetuar nesse ano.
3 – A não entrega, total ou parcial, no prazo indicado, das quantias liquidadas a título de imposto do selo constitui infração tributária, punida nos termos da lei.
Utilizou-se na referida verba 28.1 e nas subalíneas i) e ii) da alínea f) do n.º 1 do artigo 6.º da Lei n.º 55-A/2012, um conceito que não é utilizado em qualquer outra legislação tributária nestes precisos termos que é o de “prédio com afectação habitacional”. Designadamente no CIMI, que em várias normas do CIS introduzidas por aquela Lei é indicado como diploma de aplicação subsidiária relativamente ao tributo previsto na referida verba n.º 28 [artigos 2.º, n.º 4, 3.º, n.º 3, alínea u), 5.º, alínea u), 23.º, n.º 7, 46.º e 67.º do CIS], não é utilizado um conceito definido naqueles termos.
(…)
No CIMI enumeram-se as espécies de prédios nos seus artigos 3.º a 6.º nos seguintes termos:
Artigo 2.º
Conceito de prédio
1 - Para efeitos do presente Código, prédio é toda a fracção de território, abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial.
2 - Os edifícios ou construções, ainda que móveis por natureza, são havidos como tendo carácter de permanência quando afectos a fins não transitórios.
3 - Presume-se o carácter de permanência quando os edifícios ou construções estiverem assentes no mesmo local por um período superior a um ano.
4 - Para efeitos deste imposto, cada fracção autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio.
Artigo 3.º
Prédios rústicos
1 - São prédios rústicos os terrenos situados fora de um aglomerado urbano que não sejam de classificar como terrenos para construção, nos termos do n.º 3 do artigo 6.º, desde que:
a) Estejam afectos ou, na falta de concreta afectação, tenham como destino normal uma utilização geradora de rendimentos agrícolas, tais como são considerados para efeitos do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS);
b) Não tendo a afectação indicada na alínea anterior, não se encontrem construídos ou disponham apenas de edifícios ou construções de carácter acessório, sem autonomia económica e de reduzido valor.
2 - São também prédios rústicos os terrenos situados dentro de um aglomerado urbano, desde que, por força de disposição legalmente aprovada, não possam ter utilização geradora de quaisquer rendimentos ou só possam ter utilização geradora de rendimentos agrícolas e estejam a ter, de facto, esta afectação.
3 - São ainda prédios rústicos:
a) Os edifícios e construções diretamente afetos à produção de rendimentos agrícolas, quando situados nos terrenos referidos nos números anteriores;
b) As águas e plantações nas situações a que se refere o n.º 1 do artigo 2.º
4 - Para efeitos do presente Código, consideram-se aglomerados urbanos, além dos situados dentro de perímetros legalmente fixados, os núcleos com um mínimo de 10 fogos servidos por arruamentos de utilização pública, sendo o seu perímetro delimitado por pontos distanciados 50 m do eixo dos arruamentos, no sentido transversal, e 20 m da última edificação, no sentido dos arruamentos.
Artigo 4.º
Prédios urbanos
Prédios urbanos são todos aqueles que não devam ser classificados como rústicos, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte.
Artigo 5.º
Prédios mistos
1 - Sempre que um prédio tenha partes rústica e urbana é classificado, na íntegra, de acordo com a parte principal.
2 - Se nenhuma das partes puder ser classificada como principal, o prédio é havido como misto.
Artigo 6.º
Espécies de prédios urbanos
1 - Os prédios urbanos dividem-se em:
a) Habitacionais;
b) Comerciais, industriais ou para serviços;
c) Terrenos para construção;
d) Outros.
2 - Habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins.
3 - Consideram-se terrenos para construção os terrenos situados dentro ou fora de um aglomerado urbano, para os quais tenha sido concedida licença ou autorização, admitida comunicação prévia ou emitida informação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção, e ainda aqueles que assim tenham sido declarados no título aquisitivo, exceptuando-se os terrenos em que as entidades competentes vedem qualquer daquelas operações, designadamente os localizados em zonas verdes, áreas protegidas ou que, de acordo com os planos municipais de ordenamento do território, estejam afectos a espaços, infra-estruturas ou equipamentos públicos.
4 - Enquadram-se na previsão da alínea d) do n.º 1 os terrenos situados dentro de um aglomerado urbano que não sejam terrenos para construção nem se encontrem abrangidos pelo disposto no n.º 2 do artigo 3.º e ainda os edifícios e construções licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal outros fins que não os referidos no n.º 2 e ainda os da excepção do n.º 3.
(…)
O artigo 11.º da Lei Geral Tributária estabelece as regras essenciais da interpretação das leis tributárias nos seguintes termos:
Artigo 11.º
Interpretação
1 - Na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis.
2 - Sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer directamente da lei.
3 - Persistindo a dúvida sobre o sentido das normas de incidência a aplicar, deve atender-se à substância económica dos factos tributários.
4 - As lacunas resultantes de normas tributárias abrangidas na reserva de lei da Assembleia da República não são susceptíveis de integração analógica.
Os princípios gerais da interpretação das leis, para que remete o n.º 1 do artigo 11.º da LGT, são estabelecidos no artigo 9.º do Código Civil, que estabelece o seguinte:
Artigo 9.º
Interpretação da lei
1 - A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.
2 - Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.
3 - Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.
(…)
Como se vê pelas normas do CIMI transcritas, não +e utilizado na classificação dos prédios o conceito de “prédio com afectação habitacional”. Também não se encontra este conceito, com esta terminologia, em qualquer outro diploma.
Assim, na falta de correspondência terminológica exacta do conceito de “prédio com afectação habitacional” com qualquer outro utilizado noutros diplomas, podem aventar-se várias hipóteses interpretativas.
O ponto de partida da interpretação daquela expressão “prédios com afectação habitacional” é, naturalmente, o texto da lei, sendo com base nele que há que reconstituir o “pensamento legislativo”, como impõe o n.º 1 do artigo 9.º do Código Civil, aplicável por força do disposto no artigo 11.º, n.º 1, da LGT.
(…)
O conceito mais próximo do teor literal desta expressão utilizada é manifestamente o de “prédios habitacionais”, definido no n.º 2 do artigo 6.º do CIMI como abrangendo “os edifícios ou construções” licenciados para fins habitacionais ou, na falta de licença, que tenham como destino normal fins habitacionais.
A entender-se que a expressão “prédio com afectação habitacional” coincide com o de “prédios habitacionais”, é manifesto que as liquidações enfermarão de erro sobre os pressupostos de facto e de direito, pois todos os prédios relativamente aos quais foi liquidado o Imposto do Selo ao abrigo da referida verba n.º 28.1 são terrenos para construção, sem qualquer edifício ou construção, exigidos para se preencher aquele conceito de “prédios habitacionais”.
Por isso, a adoptar-se a interpretação de que “prédio com afectação habitacional” significa “prédio habitacional”, as liquidações cuja declaração de ilegalidade é pedida serão ilegais, por não haver em qualquer dos terrenos qualquer edifício ou construção.
No entanto, a não coincidência dos termos da expressão utilizada na verba n.º 28.1 da TGIS com a que se extrai do n.º 2 do artigo 6.º do CIMI, aponta no sentido de não se ter pretendido utilizar o mesmo conceito.
(…)
A palavra “afectação”, neste contexto de utilização de um prédio, tem o significado de “acção de destinar alguma coisa a determinado uso” [Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa, I volume, página 102].
“Quando, como é de regra, as normas (fórmulas legislativas) comportam mais que um significado, então a função positiva do texto traduz-se em dar mais forte apoio a ou sugerir mais fortemente um dos sentidos possíveis. É que, de entre os sentidos possíveis, uns corresponderão ao significado mais natural e directo das expressões usadas, ao passo que outros só caberão no quadro verbal da norma de uma maneira forçada, contrafeita. Ora, na falta de outros elementos que induzam à eleição do sentido menos imediato do texto, o intérprete deve optar em princípio por aquele sentido que melhor e mais imediatamente corresponde ao significado natural das expressões verbais utilizadas, e designadamente ao seu significado técnico-jurídico, no suposto (nem sempre exacto) de que o legislador soube exprimir com correcção o seu pensamento” [Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, página 182].
A relevância do texto da lei é especialmente acentuada em matéria de interpretação de normas de incidência do Imposto do Selo, que se reconduzem a uma amálgama, sob uma denominação comum, de um conjunto incongruente de tributos de naturezas completamente distintas (sobre o rendimento, sobre a despesa, sobre o património, sobre actos, etc.), que não deixa margem apreciável para aplicação do critério interpretativo primordial, que é a unidade do sistema jurídico, que reclama a sua coerência global.
A reconhecida falta de coerência do Imposto do Selo é particularmente exuberante no caso desta verba n.º 28.1, apressadamente incluída à margem do Orçamento geral do estado, por um legislador fiscal sem orientação fiscal global perceptível, que vai implementando sucessivamente normas de agravamento fiscal à medida dos revezes da execução orçamental, das imposições dos credores institucionais internacionais (representados pela “troika”) e da fiscalização do Tribunal Constitucional.
(…)
Neste contexto, não existindo elementos interpretativos seguros que permitam detectar coerência legislativa na solução adoptada na referida verba n.º 28.1 ou o acerto ou desacerto da solução adoptada (relevante para efeitos interpretativos à face do n.º 3 do artigo 9.º do Código Civil), o teor do texto legal tem de ser o elemento primacial da interpretação, em conformidade com a presunção, imposta pelo mesmo n.º 3 do artigo 9.º, de que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.
À face daqueles significados das palavras “afectação” e “afectar”, que são “dar destino” ou “aplicar”, a fórmula utilizada naquela verba n.º 28.1 da TGIS, abrange, manifestamente, os prédios que já estão aplicados a fins habitacionais, pelo que importa indagar se abrangerá também os prédios que, apesar de não estarem ainda aplicados a fins habitacionais, estão a estes destinados e aqueles cujo destino é desconhecido.
À face do teor literal da verba n.º 28.1, é de afastar do âmbito de incidência do Imposto do Selo aí previsto os terrenos para construção (…) que ainda não têm definido qualquer tipo de utilização, pois ainda não estão aplicados nem destinados a fins habitacionais [como sucede no caso sub judice]. Isto é, os terrenos para construção que não têm utilização definida não podem ser considerados prédios com afectação habitacional, pois não têm ainda nenhuma afectação nem outro destino que não seja a construção de tipo desconhecido. Uma interpretação no sentido de que a verba n.º 28.1 se reporta a prédios cuja afectação é desconhecida não tem o mínimo de correspondência verbal na letra daquela norma, pelo que um hipotético pensamento legislativo desse tipo não pode ser considerado pelo intérprete da lei, em face da proibição que consta do n.º 2 do artigo 9.º do Código Civil.
Mas, isto não basta para esclarecer a situação daqueles terrenos para construção que, não estando ainda aplicados a fins habitacionais, já têm um destino determinado, designadamente, na licença de loteamento (…).
Por isso, haverá que esclarecer quando é que se pode entender que um prédio está afectado a fim habitacional, designadamente se é quando lhe é fixado esse destino num acto de licenciamento ou semelhante, ou apenas quando a efectiva atribuição desse destino é concretizada.
Desde logo, o confronto da verba n.º 28.1 da TGIS com o n.º 2 do artigo 6.º do CIMI, que define o conceito de prédios habitacionais, aponta, manifestamente, no sentido de ser necessária uma afectação efectiva.
Na verdade, um edifício ou construção licenciado para habitação ou, mesmo sem licença, mas que tenha como destino normal a habitação, é, à face do n.º 2 daquele artigo 6.º, um prédio habitacional.
Por isso, no pressuposto de que o legislador da Lei n.º 55-A/2012 soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (como impõe o artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil que se presuma), se pretendesse reportar-se a esses prédios já licenciados para habitação ou que tenham a habitação como destino normal, decerto teria utilizado o conceito de “preditos habitacionais”, que expressaria perfeita e claramente o seu pensamento, à face da definição dada por aquele n.º 2 do artigo 6.º do CIMI.
Consequentemente, deve presumir-se que o uso de uma expressão diferente tem em vista uma realidade distinta, pelo que, em boa hermenêutica, “prédio com afectação habitacional” não poderá ser um prédio apenas licenciado para habitação ou destinado a esse fim (isto é, não bastará que seja um “prédio habitacional”), tendo de ser um prédio que tenha já efectiva afectação a esse fim.
Que é este o sentido da expressão “afectação”, no mesmo contexto de classificação de prédios que faz o CIMI, confirma-se pelo artigo 3.º em que, relativamente aos prédios rústicos, se faz referência aos que “estejam afectos ou, na falta de concreta afectação, tenham como destino normal uma utilização geradora de rendimentos agrícolas”, que evidencia que a afectação é concreta, efectiva. Na verdade, como se vê pela parte final deste texto, um prédio pode ter como destino uma determinada utilização e estar ou não afecto a ela, o que evidencia que a afectação é, a nível da ligação de um prédio a determinada utilização, algo mais intenso que o mero destino e que pode ou não ocorrer, a jusante deste e não a montante.
De resto, o texto da lei ao adoptar a fórmula “prédio com afectação habitacional”, em vez de “prédios urbanos de afectação habitacional”, (…), aponta fortemente no sentido de que se exige que a afectação habitacional já esteja concretizada, pois só assim o prédio estará com essa afectação.
No que concerne ao artigo 45.º do CIMI, não tem qualquer relação com a classificação de prédios apenas indicando os factores a ponderar na avaliação de terrenos para construção. O que se pondera aí, ao fazer referência ao “edifício a construir” é a ponderação do destino do terreno, que, como se viu, é algo que, no contexto do CIMI, não implica afectação e ocorre antes desta.
A correcção desta interpretação no sentido de que só prédios que estejam efetivamente afectos à habitação, se inserem no âmbito de incidência da verba n.º 28.1 da TGIS é também confirmada pela ratio legis perceptível da restrição do campo de aplicação da norma aos prédios com afectação habitacional, no contexto das “circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada”, que o artigo 9.º, n.º 1, do Código Civil também erige em elementos interpretativos.
Desde logo, a limitação da tributação em Imposto do Selo aos “prédios com afectação habitacional” deixa perceber que não se pretendeu abranger no âmbito de incidência do imposto os prédios com afectação a serviços, indústria ou comércio, isto é, os prédios afectos à actividade económica, (…)
Por isso, é de concluir que os elementos interpretativos disponíveis, inclusivamente as “circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada”, apontam claramente no sentido de não se ter pretendido abranger no âmbito de incidência da verba n.º 28.1 as situações de prédios que ainda não estão afectos à habitação, nomeadamente os terrenos para construção detidos por empresas.»
Esta linha argumentativa resulta reforçada pela «alteração introduzida à verba 28.1 pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro [Lei do Orçamento do Estado para 2014], que sem ter carácter interpretativo, veio sujeitar ao imposto expressamente “os terrenos cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação”, assumindo deste modo expressamente que esta realidade não estaria sujeita a tributação antes desta alteração» (decisão arbitral de 22.04.2014, processo n.º 310/2013-T).
Ainda na mesma perspetiva, importa chamar à colação a intervenção do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, na Assembleia da República, aquando da apresentação e discussão da proposta de lei que deu origem à Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro (Proposta de Lei n.º 96/XII – 2.ª), que então afirmou o seguinte (DAR I Série n.º 9/XII/2, de 11.10.2012, p. 32):
«… o Governo propõe a criação de uma taxa especial sobre os prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor. É a primeira vez que em Portugal é criada uma tributação especial sobre propriedades de elevado valor destinadas à habitação. Esta taxa será de 0,5% a 0,8% em 2012 e de 1% em 2013, e incidirá sobre as casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros. Com a criação desta taxa adicional o esforço fiscal exigido a estes proprietários será significativamente aumentado em 2012 e 2013.» (sublinhados nossos)
Destas palavras proferidas por aquele membro do Governo com responsabilidade direta sobre a área dos impostos extrai-se, com meridiana clareza, que a realidade a tributar que foi tida em vista pelo Governo e aprovada pelos deputados na Assembleia da República foi, afinal, «“os prédios (urbanos) habitacionais”, em linguagem corrente “as casas”, e não outras realidades» (acórdão do STA de 09.04.2014, processo n.º 048/14).
Dito isto, volvendo ao caso dos autos, verificamos que todos os prédios urbanos propriedade da Requerente são terrenos para construção, sobre os quais não se mostram erigidas quaisquer edificações ou construções (cf. factos provados 1. e 2.).
Por isso, atento o que se deixou transcrito e dito, não estamos perante prédios com afetação habitacional, pelo que sobre esses mesmos prédios urbanos não incide o Imposto do Selo previsto na verba 28.1 da TGIS.
Consequentemente, é mister concluir que as liquidações de Imposto do Selo em causa nestes autos, enfermam de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, o que conduz inelutavelmente à declaração da sua ilegalidade e sequente anulação.
§3. O que se vem de explanar implica necessariamente que o ato de indeferimento da reclamação graciosa interposta pela Requerente contra as liquidações de Imposto do Selo que são objeto destes autos, padece igualmente de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, o que conduz também à declaração da sua ilegalidade e consequente anulação (cf. artigo 135.º do CPA).
§4. O já citado artigo 124.º do CPPT, ao estabelecer uma ordem de conhecimento de vícios, pressupõe que, julgado procedente um vício que assegura a eficaz tutela dos direitos dos impugnantes, não é necessário conhecer dos restantes, pois, se fosse sempre necessário apreciar todos os vícios imputados ao ato impugnado, seria indiferente a ordem do seu conhecimento.
Nesta parametria, uma vez que do acima exposto resulta a declaração de ilegalidade, com a sua consequente anulação, das liquidações de Imposto do Selo que são objeto deste processo, por vício que impede a renovação desses atos, fica prejudicado o conhecimento dos restantes vícios que lhes são imputados pela Requerente, concretamente a alegada inconstitucionalidade da norma de incidência contida na verba 28.1 da TGIS.
***
IV. DECISÃO
Nos termos expostos, este Tribunal Arbitral decide:
a) Julgar procedente o pedido de declaração de ilegalidade das seguintes liquidações de Imposto do Selo, por erro sobre os pressupostos de direito, com a sua consequente anulação:
- liquidação n.º 2014 ..., datada de 18.03.2014, no valor de € 28.466,20; e
- liquidação n.º 2014 ..., datada de 18.03.2014, no valor de € 31.314,40.
b) Declarar a ilegalidade do ato de indeferimento da reclamação graciosa interposta contra os atos de liquidação de Imposto do Selo referidos na alínea anterior, com a sua consequente anulação;
c) Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento das custas do presente processo.
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VALOR DO PROCESSO:
Em conformidade com o disposto nos arts. 306.º, n.º 2, do CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 59.780,60 (cinquenta e nove mil setecentos e oitenta euros e sessenta cêntimos).
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CUSTAS:
Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 2.142,00 (dois mil cento e quarenta e dois euros), nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.
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Lisboa, 23 de março de 2015.
O Árbitro,
(Ricardo Rodrigues Pereira)