Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 166/2024-T
Data da decisão: 2024-09-23   Outros 
Valor do pedido: € 106.117,13
Tema: Contribuição de Serviço Rodoviário (CSR). Competência dos tribunais arbitrais. Legitimidade processual.
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SUMÁRIO:

 

  1. A Contribuição de Serviço Rodoviário consubstancia um tributo que deve ser qualificado como imposto, pelo que sob essa qualificação os tribunais arbitrais têm competência para apreciar os correspondentes atos de liquidação.
  2. A Requerente não suportou o encargo da Contribuição de Serviço Rodoviário por repercussão legal. Deste modo, a legitimidade da Requerente deve ser aferida pela qualidade de mera repercutida de facto, circunstância em que tem de demonstrar um interesse legalmente protegido, como se extrai do cotejo dos artigos 9.º do CPPT, 18.º da LGT e 9.º do CPTA.
  3. Esse interesse há-de corresponder à circunstância de ter suportado, do ponto de vista económico, o imposto [CSR] ilegalmente liquidado ao sujeito passivo fornecedor dos combustíveis. O que implica duas condições: a primeira é que o fornecedor de combustíveis tenha repercutido, de facto, à Requerente, a CSR; e a segunda é que o fenómeno da repercussão “voluntária” tenha ficado por aí, sem que a Requerente tenha, de igual modo, repercutido aos seus clientes o “peso” económico da CSR.
  4. Não tendo ficado provado o valor da CSR repercutido pelo fornecedor de combustíveis, nem que a Requerente tenha suportado o encargo económico do imposto em definitivo, falece àquela legitimidade para pedir a anulação das respetivas liquidações e o reembolso do imposto.
  5. A solução preconizada enquadra-se numa interpretação conforme à Constituição (v. artigo 268.º, n.º 4), porquanto o direito à impugnação dos atos lesivos não pode deixar de reportar-se aos sujeitos cuja esfera jurídico-patrimonial sofreu a lesão (os lesados) e não a outros.

DECISÃO ARBITRAL

Os árbitros, Fernando Araújo, (Presidente), Hélder Faustino e Rui Miguel Zeferino Ferreira (Relator), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa – CAAD para formar Tribunal Arbitral Coletivo, constituído em 19 de abril de 2024, decidem o seguinte:

I.      RELATÓRIO

 

  1. A..., LDA, doravante designada “Requerente”, NIPC..., com sede na ..., n.º..., ...-... Viana do Castelo, na sequência da formação da presunção de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa, apresentado em 11.07.2023, junto da Autoridade Tributária e Aduaneira, sobre as liquidações de Contribuição de Serviço Rodoviário (CSR), não se conformando com os mesmos, veio, ao abrigo do artigo 2.º, n.º 1, al. a) e 10.º, ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária ou “RJAT”), apresentar pedido de pronúncia arbitral com vista à declaração de ilegalidade dos atos de repercussão de CSR, consubstanciados na obrigação de pagamento de preço de combustível adquirido, acrescido de respetivos impostos e, subsidiariamente, a declaração de ilegalidade das correspondentes liquidações de CSR praticadas pela Administração Tributária e Aduaneira (“AT”), com base nas declarações de introdução ao consumo, submetidas pelas respetivas fornecedoras de combustível, para que se determine a sua anulação, parcial ou total, com as demais consequências legais, designadamente o reembolso à Requerente das quantias suportadas a título de CSR, bem como o pagamento de juros indemnizatórios.

 

  1. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral Coletivo apresentado pela Requerente em 7 de fevereiro de 2024, foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente comunicado à Requerida que foi do mesmo notificada em 9 de fevereiro de 2024.

 

Em 7 de fevereiro de 2024, a Requerente apresentou requerimento onde juntou os documentos 3 a 10, do seu pedido de pronúncia arbitral, pelo facto dos mesmos ultrapassarem o limite de 10MB da plataforma do CAAD.

 

Em 19 de fevereiro de 2024, a Requerida veio informar o CAAD que, “(...) analisado o pedido, não detetou a identificação de qualquer ato tributário, identificação que, aliás, também não consta da plataforma do Centro de Arbitragem Administrativa”, pelo que, concluiu, requerendo “(...) que seja(m) identificado(s) o(s) ato(s) de liquidação cuja legalidade a Requerente pretende ver sindicada, entendendo-se que o termo inicial do prazo para o exercício da faculdade prevista no artigo 13.º do RJAT só ocorre após notificação, à Autoridade Tributária e Aduaneira, da identificação, em concreto, do(s) ato(s) de liquidação cuja ilegalidade é suscitada.”.

 

 

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo os aqui signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

Em 1 de abril de 2024, foram as Partes devidamente notificadas dessas designações, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

 

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Tribunal Arbitral Coletivo foi constituído em 19 de abril de 2024.

 

  1. Por despacho de 22 de abril de 2024, o Tribunal Arbitral concedeu à Requerente o prazo de 10 (dez) dias para se pronunciar sobre as questões suscitadas na comunicação da requerida, apresentada em 19 de fevereiro de 2024.

 

Em 3 de maio de 2024, a Requerente apresentou pronúncia sobre a comunicação da Requerida, de 19 de fevereiro de 2024, em que alegou, entre o demais, o seguinte:

 

“(...) a requerente pretende declaração de ilegalidade de atos de liquidação – e esta pode ser declarada mesmo sem ser decretado o seu reembolso que será, todavia, questão necessariamente suscitada em sede de execução de decisão arbitral por força dos efeitos da mesma”. (...) “Sem que a competência do Tribunal Arbitral seja extravasada por uma decisão que declare a ilegalidade de liquidações da CSR.”. (...) Pois é evidente que o contencioso da jurisdição arbitral do CAAD é um contencioso de plena jurisdição, e não de mera cassação (...).

 

(...) Neste contexto, e para que o Tribunal conheça da ilegalidade das liquidações em questão, não é necessário a identificação de um ato de liquidação concreto pela requerente. (...) Primeiramente, porque a requerente também alega a ilegalidade abstracta da CSR – o que, nos seus termos, dispensa de apreciação de ilegalidade concreta e, nessa medida, de identificação de ato de liquidação ilegal concretamente praticado. (...) Todos os atos de liquidação de CSR são ilegais – e toda a repercussão da mesma, nessa medida, também o é. (...) Seguidamente, a requerente identifica os fornecedores de combustível por referência a NIPCs e faturas de compra – informação fiscalmente relevante e que permite à AT identificar as liquidações de CSR em crise e que originam as pretensões da requerente vertidas no pedido.

 

(...) não cabe à requerente identificar os atos de liquidação. (...) Não os praticou e não os conhece. (...) Ao passo que a AT conhece os mesmos – e não nega que tenha havido liquidação de CSR nem afirma estar a cobrar coercivamente a mesma aos fornecedores da requerente. (...) E com o fornecimento de imposto, é repercutida CSR.

 

(...) Nesta medida, afirma-se ser suficiente o alegado para identificar atos de liquidação de CSR com base nas declarações de introdução ao consumo (...) submetidas pelas respetivas identificadas fornecedoras de combustível, subjacentes às identificadas facturas de combustível. (...) Dispensando-se assim a Requerente de identificar os mesmos – até por impossibilidade factual de o fazer e porquanto tem a AT dados suficientes para identificar as DIC relevantes e prejudiciais (...) aos atos em crise.”

 

Em conclusão, a requerente requereu o prosseguimento nos autos como no pedido de pronúncia arbitral.

 

  1. No pedido arbitral a Requerente invocou, em síntese:

 

  1. Que na sequência da decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia, que declarou no processo C-460/21, versando sobre a CSR, a jurisprudência arbitral tem sido unânime em considerar a dita contribuição um autêntico imposto contrário ao Direito da União Europeia, pelo qual os atos de liquidação, cobrança e repercussão daquele imposto enfermam de várias ilegalidades;

 

  1. Que sendo a CSR um imposto, é o presente litígio subsumível a este Tribunal Arbitral, conforme o decidido nos processos arbitrais n.ºs 113/2023-T, 24/2023-T, 410/2023;

 

  1. Que a Requerente tem legitimidade para os presentes autos, em conformidade com o disposto no artigo 9.º, n.º 1, do Código do Procedimento e do Processo Tributário (“CPPT”) e no artigo 18.º, n.º 4, al. a), da Lei Geral Tributária (“LGT”), uma vez que mesmo que não seja considerada sujeito passivo, a Requerente tem um interesse legalmente protegido, visto que foi a sua capacidade contributiva que foi ilegalmente tributada e foi o seu património que suportou o desfalque ínsito na natureza ablativa da CSR;

 

  1. Que a CSR incide sobre a gasolina, o gasóleo rodoviário e o GPL auto, a qual é devida pelos sujeitos passivos do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos, sendo aplicável à sua liquidação, cobrança e pagamento o disposto no Código dos Impostos Especiais de Consumo, pelo que são repercutidos os contribuintes, que tal como a Requerente, vêm a sua capacidade contributiva tributada por força do fenómeno da repercussão;

 

  1. Que quando a Requerente é tributada, é a sua capacidade contributiva que sofre a ablação, o que justifica que qualquer ato ablativo da mesma lhe confira legitimidade processual em agir, até porque quando outros repercutidos de CSR já obtiveram provimento aos seus pedidos de restituição do imposto ilegalmente liquidado e repercutido, por imperativo de igualdade a mesma solução dever-lhe-á ser aplicada.

 

  1. Que a nossa jurisprudência já afirmou por diversas vezes a legitimidade processual em agir do sujeito que não é sujeito passivo, mas cuja capacidade contributiva é afetada por liquidação de imposto ou que cuja consistência patrimonial é afetada por ato tributário, como sucedeu em sede de imposto do selo, em que se decidiu que a repercutida e o sujeito passivo, que atuaram em coligação, “ambas possuem legitimidade processual para se apresentarem em juízo”;

 

  1. Que, assim sendo, há que concluir pela legitimidade do repercutido de CSR em impugnar legalidade intrínseca e abstrata da liquidação, demandando a restituição do montante de CSR que na sequência lhe foi indevidamente cobrado por repercussão e em impugnar o ato de repercussão que lhe foi efetuado mediante cobrança de imposto no preço de fornecimento de produto petrolífero, demandando a restituição do montante de CSR que na sequência lhe foi indevidamente cobrado por repercussão;

 

  1. Que distinto entendimento será violador do princípio da tutela jurisdicional efetiva, constante dos artigos 20.º, n.º 1 e 268.º, n.º 4, da CRP, bem como privaria a Requerente de meio judicial para reaver o montante ilegalmente cobrado;

 

  1. Que não é o vendedor que tem de restituir o montante de imposto indevidamente cobrado à Requerente, porquanto meramente repercutiu o mesmo, o que resulta de uma presunção natural e da inelasticidade dos impostos sobre o consumo, destinados a ser repercutidos no comprador, tal como resulta do artigo 2.°, do CIEC, pelo que a possibilidade da Requerente demandar diretamente a AT para a restituição da CSR, é a única solução que garante a tutela do seu direito;

 

  1. Que, quanto à possibilidade da Requerida poder reembolsar múltiplas vezes, é esta que deve arcar com as suas insuficiências demonstrativas, alegatórias e de organização, não os contribuintes, por ter sido aquela que lançou mão de uma tributação ilegal;

 

  1. Que interpretação que negue o direito da Requerente é negatória e violadora do princípio do Estado de Direito Democrático, constante do artigo 2.º CRP, pois não podem ser os privados a sofrer as consequências da legislação de um imposto contrário ao Direito da UE, não sendo reembolsados, e promovendo o enriquecimento da requerida sem causa à custa dos contribuintes, pelo que se impõe a legitimidade da Requerente para os presentes autos;

 

  • Que negar à Requerente legitimidade no presente pleito com base num argumento de qualidade processual ligado à repercussão do imposto seria duplamente contrário ao Direito da UE, e, nessa medida, contrário à CRP por violação do disposto no seu artigo 8.°, n.º 4, uma vez que um Estado-Membro está, em princípio, obrigado a reembolsar os impostos cobrados em violação do direito da União, ao abrigo das regras processuais nacionais aplicáveis e no respeito pelos princípios da equivalência e da efetividade;

 

  1. Que a Requerente apresentou, em 11.07.2023, pedido de revisão de atos tributários, peticionando a anulação das liquidações de CSR identificadas e realizadas pelos fornecedores por ilegalidade; a declaração da ilegalidade da cobrança e repercussão da CSR incidente sobre as transações; e o reembolso do montante de CSR acompanhado dos devidos juros indemnizatórios, por vício de ilegalidade abstrata e concreta, bem como por ser o regime legal da CSR contrário ao direito da UE.

 

  • Que a extensão do prazo da revisão dos atos tributários para 4 (quatro) anos é aplicável aos autos na medida em que ocorre, na liquidação, cobrança e repercussão da CSR, “erro imputável aos serviços” para efeitos de aplicação do artigo 78.º, n.º 1, da LGT, pelo que a ilegalidade invocada [por violação do direito da União Europeia] corresponde a um erro imputável aos serviços para os efeitos que aqui se discutem, como o estabeleceu o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 22/03/2011, proferido no âmbito do processo n.º 01009/10;

 

  • Que a Requerente está em tempo para requerer o reembolso de todos os montantes de CSR suportados ilegalmente nos 4 anos anteriores à interposição de pedido, pelo que não tendo a requerida respondido, tem-se por formada a presunção de indeferimento tácito da pretensão da Requerente, e consequentemente o presente pedido de constituição de Tribunal Arbitral é tempestivo;

 

  1. Que a Requerente é uma sociedade comercial que tem como objeto social transportes públicos de passageiros, que entre 4 de julho de 2019 e 31 de dezembro de 2022, realizou compras de combustível sujeito a incidência de CSR, o qual considera ilegal, decorrente das aquisições de gasóleo rodoviário à B..., S.A., nas quantidades seguintes:

 

ANO

LITROS

PREÇOS SEM IVA

2019

233.998,74

€ 244.036,59

2020

208.062,79

€ 203.435,79

2021

241.751,26

€ 268.824,28

2022

272.197,40

€ 381.271,67

TOTAL

956.010,19

€ 1.097.568,33

 

  1. Que a introdução ao consumo dos referidos litros de combustível determina operação tributável em sede de Imposto sobre os Produtos Petrolíferos e Energéticos, bem como, nos termos da Lei 55/2007 estavam sujeitos a CSR, o que significa que a Requerente pagou, a título de CSR e aos seus fornecedores de combustível, a quantia de € 106.117,13 (cento e seis mil cento e dezassete euros e treze cêntimos) pelos fornecimentos de gasóleo e que reverteram para os cofres do Estado;

 

  1. Que a CSR é devida pelos sujeitos passivos de ISP, sendo aplicável à cobrança, liquidação e pagamento da CSR o disposto no CIEC com as devidas adaptações, sendo a CSR objeto de repercussão no comprador final;

 

  1. Que sendo a CSR contrária ao direito da União Europeia e determinando este a obrigação de reembolso de imposto cobrado num Estado-Membro em violação das disposições do direito da União, é uma autêntica imposição constitucional que tal decisão seja efetivada, por força do princípio do primado, pelo que deve a mesma ser objeto de reembolso;

 

  1. Que quem suporta o seu encargo, por repercussão, é o comprador final, que no caso dos presentes autos será a Requerente, uma vez que esta compra os produtos petrolíferos para seu consumo e incorporação na sua produção, não repercutindo o preço dos mesmos a mais ninguém;

 

  1. Que, portanto, a Requerente suportou o encargo económico, por repercussão e cobrança, dos montantes de CSR liquidados pelo seu fornecedor das transações identificadas, a qual é ilegal por violação do direito da União Europeia, tal como decorre da decisão proferida pelo TJUE, no âmbito do processo C-460/21, pelo que deverá ser declarada a anulação das liquidações de CSR, subjacentes às vendas identificadas, por ilegalidade das mesmas, cuja anulação essa que deverá ser parcial da liquidação de ISP, se não destacável totalmente a liquidação de CSR desta, ou total desta e, bem assim, anulada a cobrança da CSR ínsita nas mesmas e a sua repercussão na Requerente, por ilegalidade, por violação do direito da União Europeia;

 

  1. Que, subsidiariamente, deverá ser declarada a ilegalidade da cobrança e repercussão da CSR incidente sobre as transações supra identificadas sobre a Requerente, com o reembolso do montante identificado acrescido de juros indemnizatórios desde o pagamento de cada uma das faturas em questão, nos termos do disposto no artigo 43.º, n.º 1, da LGT.

 

  1. Em 7 de junho de 2024, após notificação à Requerida para apresentação de resposta, a mesma apresentou-a, bem como juntou na mesma data o respetivo processo administrativo, invocando em síntese:

 

  1. Que a espécie tributária da CSR é qualificada como contribuição e não como imposto, encontrando-se, assim, excluída do âmbito material da arbitragem tributária, por força do disposto nos artigos 2.º e 3.º, do RJAT, e do artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março (“Portaria de Vinculação”), tal como entendeu o Tribunal Arbitral no acórdão proferido em 29 de maio de 2023, no processo n.º 31/2023-T;

 

  1. Que, independentemente do nomen iuris ou da natureza jurídica da CSR, a verdade é que não é, por definição, um imposto e, portanto, o CAAD não tem competência para decidir sobre esta matéria, sendo que esta interpretação do artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 é compaginável com a Constituição, como já decidiu o Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 545/2019, de 16.10.2019, proferido no processo n.º 1067/2018, recentemente confirmada pelas Decisões Sumárias n.º 70/2024, de 08.02.2024, n.º 74/2024, de 12.02.2024, e n.º 99/2024, de 21.02.2024, proferidas, respetivamente, nos Autos de Recurso n.º 1347/23 (Proc.º CAAD nº 520/2023-T), nº 137/2024 (Proc.º CAAD nº 375/2023-T) e nº 128/23 (Proc.º CAAD nº 408/2023- T), do Tribunal Constitucional;

 

  1. Que se encontrando a CSR excluída da arbitragem tributária, por não abranger os tributos que devam ser qualificados como contribuição, não se encontra verificada a arbitrabilidade do thema decidendum, não sendo, por isso, os tribunais arbitrais do CAAD materialmente competentes para conhecer do mérito do pedido em apreço;

 

  1. Que estamos perante uma exceção dilatória nos termos do vertido nos artigos 576.º, nº 1 e 577.º, al. a) do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ao presente processo por via do artigo 29.º, n.º 1, al. e) do RJAT, a qual prejudica o conhecimento do mérito da causa;

 

  1. Que a incompetência do Tribunal Arbitral para conhecer do pedido da Requerente resulta ainda do facto de esta questionar a legalidade do regime da CSR, no seu todo, pelo que pretendendo em rigor a não aplicação de diplomas legislativos aprovados por Lei da Assembleia da República, decorrentes do exercício da função legislativa, visa, com a presente ação, suspender a eficácia de atos legislativos, o que extravasa as competências dos Tribunais Arbitrais;

 

  1. Que, ainda que se considerasse a competência do Tribunal Arbitral para a apreciação da ilegalidade dos atos de liquidação de ISP/CSR, nunca poderia o Tribunal Arbitral pronunciar-se sobre atos de repercussão da CSR, subsequentes e autónomos dos atos de liquidação de ISP/CSR, que não são atos de tributários e que, para mais, não correspondem a uma repercussão legal, mas a uma repercussão meramente económica ou de facto;

 

  1. Que, assim, verifica-se uma exceção dilatória nos termos do vertido nos artigos 576.º, n.º 1 e n.º 2 e 577.º, al. a) do CPC, aplicável ao presente processo por via do artigo 29.º, n. º1, al. e) do RJAT, a qual prejudica o conhecimento do mérito da causa, pelo que deve o Tribunal Arbitral declarar-se incompetente em razão da matéria e, consequentemente, absolver a Requerida da instância;

 

  1. Que decorre dos artigos 15.º e 16.º do Código dos Impostos Especiais de Consumo (“CIEC”), que o reembolso só poderá ser solicitado pelos sujeitos passivos que tenham procedido à introdução no consumo dos produtos em território nacional e provem o pagamento do respetivo imposto, pelo que os múltiplos adquirentes dos produtos não têm legitimidade para efeitos de solicitação da revisão do ato tributário e consequente pedido de reembolso do imposto;

 

  1. Que não se encontram reunidos os pressupostos para a revisão dos atos tributários, porquanto tal direito não se encontra incluído na esfera jurídica dos repercutidos económicos ou de facto, não podendo as entidades, em que alegadamente teria sido repercutido o imposto, apresentar pedidos de revisão ou de reembolso por erro, pelo que não sendo a Requerente sujeito passivo nos termos e para o efeito do disposto no artigo 4.º do CIEC, não tem legitimidade para apresentar pedido de revisão oficiosa nem, consequentemente, o presente pedido arbitral;

 

  1. Que carece igualmente de legitimidade, atendendo ao disposto no artigo 18.º, n.º 4, alínea a), do Decreto-Lei n.º 398/98 de 17 de dezembro (Lei Geral Tributária – LGT), pois não é sujeito passivo quem suporte o encargo do imposto por repercussão legal, porquanto não está em causa uma alegada situação de repercussão legal, visto que a repercussão da CSR tem uma natureza meramente económica ou de facto;

 

  1. Que em matéria de repercussão a mesma pode assumir uma natureza regressiva, ou seja “os vendedores podem ter interesse em suportar eles próprios, através da diminuição do preço dos bens, o custo adicional gerado pelo agravamento do imposto …” [Jónatas E.M. Machado e Paulo Nogueira da Costa, in Manual de Direito Fiscal - Perspetiva Multinível, Almedina 2016, p. 38],  porquanto, não basta à Requerente alegar (e provar) a repercussão económica no seio da CSR, tem igualmente que provar que a mesma assume natureza progressiva [“quando o encargo tributário é transferido pelo vendedor para o comprador, através da subida dos preços”.];

 

  • Que não existe no âmbito da CSR um ato tributário de repercussão legal, subsequente e autónomo do(s) ato(s) de liquidação de ISP/CSR, sendo que as faturas não corporizam atos de repercussão de CSR, apenas titulando operações de compra e venda de combustíveis, e que o valor pago a título de CSR pelo sujeito passivo de ISP/CSR, pode, ou não, ter sido repercutido, no preço pago pelos adquirentes dos combustíveis, pelo que, a venda do combustível não dá obrigatoriamente origem a uma repercussão;

 

  1. Que dada a natureza da repercussão da CSR, ainda que o sujeito passivo de ISP/CSR repasse o custo da CSR, ou parte dele, no preço de venda dos combustíveis, os seus clientes não são, necessariamente, quem suporta, a final, o encargo do tributo, uma vez os adquirentes de combustíveis, enquanto operadores económicos que desenvolvem uma atividade comercial e que utilizam os combustíveis como fatores de produção no circuito económico, procuram, também eles, repassar nos preços praticados todos gastos em que incorrem, por forma a concretizarem o objetivo lucrativo da sua atividade económica;

 

  • Que, porque a repercussão fiscal não é em si mesma uma questão linear, pois será legal ou económica, progressiva ou regressiva, entende-se, portanto, que não foi o legislador despiciendo ao mencionar expressamente no artigo 18.º, sob a epígrafe “Sujeitos”, n.º 4, alínea a), da LGT apenas os repercutidos legais, pelo que haverá de considerar que a repercussão económica ou de facto, a não prevista na lei e contabilisticamente prevista no PVP, não atribui legitimidade procedimental e processual a quem venha eventualmente a suportar o encargo do imposto;

 

  • Que a seguir o alegado pela Requerente, a mesma enquanto sociedade comercial que desenvolve uma atividade com fins lucrativos, relacionada com transportes terrestes de passageiros diversos, repassa, necessariamente no preço dos serviços prestados, os gastos em que incorre, nomeadamente com a aquisição de combustíveis, pelo que as entidades potencialmente lesadas com o encargo da CSR, serão os consumidos finais de tais serviços e não a Requerente.

 

  1. Que, por um lado, só os sujeitos passivos de imposto que tenham procedido à introdução no consumo dos produtos em território nacional e provem o pagamento do respetivo ISP/CSR possuem legitimidade para solicitar o reembolso do valor pago e, bem assim, não se assiste, no âmbito da CSR, à prática de uma repercussão legal, uma vez que aquilo que se verifica no âmbito da CSR é a mera possibilidade da repercussão económica ou de facto, total ou parcial, sendo que as faturas de compra não corporizam atos de repercussão de CSR, nem atestam que tal tributo foi suportado pela Requerente, enquanto consumidora final.

 

  1. Que a Requerente não consegue demonstrar que o valor pago pelos combustíveis que adquiriu à sua fornecedora, tem incluído o valor da CSR pago pelo sujeito passivo de ISP/CSR, nem que suportou, a final, o encargo de tal tributo, isto é, que não o repassou no preço dos serviços prestados aos seus clientes, sendo estes os consumidores finais.

 

  1. Que, em suma, a Requerente não é sujeito passivo de ISP/CSR e não integra a relação tributária subjacente às liquidações contestadas, não sendo o devedor, nem quem estava obrigado ao seu pagamento ao Estado, que está a jusante do sujeito passivo na cadeia económica, que em termos jurídicos não é um terceiro substituído, que não suporta a contribuição por repercussão legal, nem tão pouco corresponde ao consumidor final, pelo que não tem legitimidade nem para apresentar o pedido de revisão oficiosa nem, consequentemente, o presente pedido arbitral, nos termos do n.º 2, do artigo 15.º do CIEC e dos n.º 3 e 4, al. a), do artigo 18.º da LGT.

 

  1. Que inexistindo efetiva titularidade do direito a que se arrogam, carece a Requerente de legitimidade processual, o que consubstancia uma exceção dilatória nos termos do vertido nos artigos 576.º, nº 1 e nº 2, 577.º, al. e) e 578.º do CPC, aplicáveis ex vi do artigo 29.º, n.º 1 al. e) do RJAT, a qual prejudica o conhecimento do mérito da causa, devendo, consequentemente, a Requerida ser absolvida da instância; ou caso assim não se entenda, carece de legitimidade substantiva, o que consubstancia uma exceção perentória nos termos e para o efeito do disposto nos artigos 576.º n.º1 e n.º3 e 579.º do CPC, aplicáveis ex vi do artigo 29.º, n.º1 al. e) do RJAT, devendo a Requerida ser absolvida do pedido.

 

  1. Que o pedido arbitral não respeita os pressupostos legais de aceitação do requerimento/petição inicial, por violação da alínea b) do n.º 2 do artigo 10.º do RJAT, requisito essencial à aceitação do pedido, designadamente a identificação do(s) ato(s) tributário(s) objeto do pedido é condição essencial para a aceitação do pedido de constituição do Tribunal Arbitral, pelo que deverá ser declarado inepto.

 

  1. Que a Requerente não identifica qualquer ato que liquidação de ISP/CSR praticados pela administração tributária e aduaneira, nem as DIC submetidas pelos sujeitos passivos de ISP/CSR, limitando-se a elencar números de faturas de aquisição de combustíveis, sem, sequer, associar as respetivas datas e quantidades de produto adquirido, e sem ter junto aos autos as respetivas faturas - considerando que aquelas consubstanciam atos de repercussão de ISP/CSR.

 

  1. Que as faturas não são aptas a comprovar qualquer ato tributário e de onde também não resulta qualquer prova de “atos de repercussão da CSR”, a que acresce que, no caso concreto, nem sequer constam dos autos quaisquer faturas das alegadas aquisições de combustível.

 

  1. Que não é possível à Requerida identificar factos essenciais omitidos pela Requerente, por ser impossível estabelecer qualquer correlação/correspondência entre os atos de liquidação praticados pelos sujeitos passivos de ISP/CSR e o alegado pela Requerente no pedido arbitral e os documentos juntos com este aos autos, de onde não constam quaisquer dados que permitam a associação às correspondentes liquidações.

 

  1. Que é totalmente impossível à Requerida identificar o ato de liquidação subjacente à declaração dos produtos para o consumo, que vão sendo transacionados ao longo da cadeia de comercialização, pelo que apenas o sujeito passivo que declarou os produtos para consumo, a quem foi liquidado o imposto e que efetuou o correspondente pagamento, reúne condições para identificar os atos de liquidação, já que não há qualquer possibilidade, relativamente às transações posteriores, de identificar o registo de liquidação correspondente.

 

  1. Que, por um lado, a identificação das liquidações não é feita pela Requerente, nem é possível à AT suprir tal omissão, dada a impossibilidade absoluta em estabelecer qualquer correlação/correspondência dos produtos que vieram a ser adquiridos pela Requerente à sua fornecedora

 

  1. Que verifica-se a exceção de ineptidão da petição inicial, na medida em que o pedido arbitral não identifica qualquer ato tributário, violando o requisito da al. b) do n.º 2 do artigo 10.º do RJAT, o que determina a nulidade de todo o processo, e, obstando a que o Tribunal Arbitral conheça do mérito da causa, dá lugar à absolvição da instância, conforme artigos 186.º, n.º 1, 576.º, n.ºs 1 e 2, 577.º, al. b) e 278.º, nº 1, al. b), do CPC, aplicáveis ex vi do artigo 29.º do RJAT, devendo, consequentemente, determinar-se a nulidade de todo o processo e a absolvição da Requerida da instância.

 

  1. Que tomando por referência o alegado pela Requerente, aquisições no período compreendido entre 4 de julho de 2019 e 31 de dezembro de 2022, em 10-07-2023, há muito que se encontrava ultrapassado o prazo da reclamação graciosa de 120 (cento e vinte) dias a contar do termo do prazo do pagamento do ISP/ CSR, previsto no artigo 78.º, n.º 1, primeira parte da LGT.

 

  1. Que estando a Requerida vinculada ao princípio da legalidade e tendo efetuado as liquidações em estrita observância dos normativos legais em vigor à data dos factos, não existe qualquer erro imputável aos serviços.

 

  1. Que mesmo que apenas parcialmente, constata-se a caducidade do (alegado) direito de ação por parte da Requerente, o que consubstancia uma exceção perentória, devendo, nessa medida, a Requerida ser absolvida do pedido;  e ainda que assim não se entenda, sempre consubstanciará uma exceção dilatória por assim ser qualificada especialmente nos termos e para o efeito do disposto nos artigos 89.º n.º1, 2 e 4 al. k) do CPTA, devendo, nessa medida, ser a Requerida absolvida do pedido ou da instância.

 

  1. Que a Requerente não consegue fazer prova do que alega, designadamente que pagou e suportou integralmente o encargo do pagamento da CSR por repercussão, bem como não se pode presumir a existência de repercussão quando estamos perante uma repercussão que não é legal, mas meramente económica ou de facto.

 

  1. Que a Requerente não logra fazer qualquer prova do que alega, desde logo sobre o alegado facto de ter adquirido à B..., no período em causa, as quantidades de gasóleo indicadas, sendo que lhe cabia o ónus da prova da materialidade das transações em causa, exigia-se, desde logo, que tivesse sido feita prova individualizada de cada uma das aquisições, juntando-se aos autos todas as faturas que estão (insuficientemente) “identificadas”.

 

  1. Que a Requerente não logra fazer prova de que a sua fornecedora foi quem, na qualidade de sujeito passivo de ISP/CSR, introduziu no consumo os combustíveis que alegadamente vieram a ser adquiridos, e quem liquidou e pagou ao Estado a respetiva CSR, que veio a ser integralmente repercutida na Requerente, pois não são identificadas quaisquer liquidações de ISP/CSR praticadas com base nas declarações de introdução no consumo submetidas pelo sujeito passivo de ISP/CSR.

 

  1. Que, em suma, é forçoso concluir que não logra a Requerente fazer prova de que efetivamente ocorreu repercussão, parcial ou total, da CSR na aquisição dos combustíveis à sua fornecedora e que, nessa sequência, efetuou o pagamento e suportou, a final, o encargo da CSR (sem o ter repassado, a jusante, no preço dos serviços prestados pela Requerente aos seus clientes ou consumidores finais).

 

  1. Que o TJUE não considerou ilegal a CSR, e, bem assim, que não existe qualquer decisão judicial nacional transitada em julgado que declare a CSR ilegal, pelo que o ordenamento jurídico português não está em contradição ou antinomia com o Direito da União Europeia, nomeadamente, no que respeita à pretensa desconformidade do regime da CSR com o previsto na Diretiva Europeia;

 

  1. Que existe e existia à data dos factos na CSR objetivos/finalidades não orçamentais, estando subjacente à sua criação e afetação motivos específicos distintos de uma finalidade orçamental, nomeadamente finalidades de redução de sinistralidade e de sustentabilidade ambiental, sendo, pois, a referida CSR conforme ao direito da União Europeia.

 

  1. Que se deve entender que os juros indemnizatórios só serão devidos depois de decorrido um ano após a apresentação dos pedidos de revisão oficiosa, e não desde a data do pagamento do imposto.

 

  1. Que deve o Tribunal Arbitral decidir no sentido da improcedência do pedido de anulação do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa, bem como da anulação parcial da(s) liquidação(ões) de ISP/CSR, não havendo, consequentemente, lugar ao reembolso da CSR alegadamente repercutida, nem ao pagamento de juros indemnizatórios.

 

  1. Por despacho de 11 de junho de 2024, foi a Requerente notificada para exercer o direito ao contraditório, o que esta veio a fazer em 21 de junho de 2024, onde sustentou em síntese, que as exceções invocadas pela Requerida devem ser todas julgadas improcedentes.

 

  1. Por despacho de 24 de junho de 2024, determinou-se a dispensa da realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, atento que subsistirem essencialmente questões de direito, dado que não foi apresentada prova testemunhal, e dado que a Requerente respondeu já à matéria de exceção suscitada pela Requerida.

 

Igualmente, foi determinado a possibilidade de as Partes apresentarem alegações escritas, a Requerente no prazo de 10 dias contados sobre a notificação do dito despacho, e a Requerida no prazo de 10 dias contado da notificação das alegações da Requerente, ou da falta de apresentação das mesmas.

 

  1. Em 28 de junho de 2024, a Requerente juntou aos autos declaração da B..., S.A., admitido por despacho de 2 de julho de 2024, em que a mesma declara que “(...) a Contribuição de Serviço Rodoviária por si entrege, na qualidade de sujeito junto dos cofres do Estado, por referência ao combustível fornecido às entidades melhor identificadas no quadro infra (doravante coletivamente designadas por “ENTIDADES DO GRUPO C...”), foi por si integralmente repercutida na esfera das ENTIDADES DO GRIPO C...”.

 

  1. Em 16 de julho de 2024, a Requerida exerceu o contraditório sobre o documento apresentado, pugnando que o mesmo não altera o seu entendimento sobre a questão sub judice, bem como impugnou a eficácia do mesmo, por dele não resultar comprovada a repercussão da CSR no preço dos combustíveis adquiridos pela Requerente. A título de alegações, a Requerida manteve o constante da resposta ao pedido arbitral.

 

  1. Em 17 de julho de 2024, a Requerente apresentou alegações, mantendo a posição já expressa no pedido de pronúncia arbitral e no requerimento de resposta à matéria de exceção, reforçando, contudo, a sua posição sobre a questão da igualdade e da repercussão. Nesse contexto, alegou que os presentes autos devem ser decididos no mesmo sentido de outras decisões favoráveis à pretensão da Requerente, como decorre do sentido e do princípio contido no artigo 161.º, n.º 1, do CPTA, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, al. c), do RJAT, e do princípio da igualdade.

 

Por outro lado, quanto à repercussão, que competia à Requerida demonstrar, nos procedimentos administrativos ou nas ações processuais instauradas pelos sujeitos passivos da CSR, que se verificou a repercussão do imposto nos utilizadores da rede rodoviária nacional para, desse modo, evitar o reembolso do imposto indevidamente liquidado com base na situação de enriquecimento sem justa causa.

 

  1. A Requerente procedeu ao pagamento da taxa de arbitragem integral (inicial e subsequente), com a submissão do pedido de pronuncia arbitral.

 

  1. Detectado um lapso na documentação junta ao processo (Documentos n.os 3 a 10), foi lavrado Despacho em 9 de setembro de 2024, e de imediato sanado esse lapso.

 

  1. SANEAMENTO

 

  1. O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído, as Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e estão regularmente representadas, em conformidade com o disposto nos artigos 4.º e 10.º, n.º 2, ambos do RJAT, e nos artigos 1.º a 3.º da n.º 112- A/2011, de 22 de Março (Portaria de Vinculação).

 

  1. Para efeitos de saneamento do processo cumpre apreciar as exceções, de:

 

  1. Incompetência do Tribunal Arbitral em razão da matéria;
  2. Ilegitimidade processual e substantiva da Requerente;
  3. Ineptidão da petição inicial (por falta de objeto);
  4. Caducidade do direito de ação;

 

  1. A apreciação das exceções será efetuada pela ordem supra identificada, a título prévio, logo após a fixação da matéria de facto provada e não provada.

 

 

  1. DA MATÉRIA DE FACTO

 

  1. FACTOS PROVADOS

 

  1. Analisada a prova produzida nos presentes autos, com relevo para a decisão da causa consideram-se provados os seguintes factos:

 

  1. A Requerente é uma sociedade de direito português, com sede e direção efetiva em Portugal, que se dedica ao transporte terrestre de passageiros

 

  1. A  B..., S.A. é uma empresa que comercializa combustíveis.

 

  1. A Requerente faz aquisição de combustível para a respetiva frota de veículos, afeta ao transporte terrestre de passageiros.

 

  1. Durante o período compreendido entre 4 de julho de 2019 e 31 de dezembro de 2022, a Requerente adquiriu 956.010,19 litros de gasóleo rodoviário à fornecedora de combustível (B..., S.A.).

 

  1. No ano de 2019, adquiriu à B..., S.A. 233.998,74 litros de gasóleo rodoviário.

 

  1. No ano de 2020, adquiriu à B..., S.A. 208.062,79 litros de gasóleo rodoviário.

 

  1. No ano de 2021, adquiriu à B..., S.A. 241.751,26 litros de gasóleo rodoviário.

 

  1. No ano de 2022, adquiriu à B..., S.A. 272.197,40 litros de gasóleo rodoviário.

 

  1. As faturas de aquisição de combustível não apresentam de forma discriminada o valor da CSR.

 

  1. A Requerente apresentou pedido de revisão de atos tributários, tendo em vista a anulação das liquidações de CSR por ilegalidade; a declaração da ilegalidade da cobrança e repercussão da CSR incidente sobre as transações; e o reembolso do montante de CSR acompanhado dos devidos juros indemnizatórios.

 

  1. Sobre o pedido de promoção de revisão oficiosa não recaiu, até ao momento, qualquer decisão da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

  1. Em 07.02.2024, a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral, que deu origem aos presentes autos.

 

 

  1. FACTOS NÃO PROVADOS:

 

  1. Não se provou que, durante o período compreendido entre 4 de julho de 2019 e 31 de dezembro de 2022, a quantidade de combustíveis adquiridos à B..., S.A. tenha gerado o valor global de CSR de € 106.117,13 (cento e seis mil cento e dezassete euros e treze cêntimos). A Requerente limitou-se a apresentar as faturas de aquisição do combustível, que não permitem comprovar, por falta de especificação, o valor de CSR em causa, nem permitem fazer a correspondência com os atos de liquidação correspondentes.

 

  1. Não foi feita prova que tenha sido a Requerente a suportar economicamente o imposto em causa, a final, dado que, para fazer tal prova, seria necessário demonstrar duas vertentes cumulativas:
  1. Que a CSR foi repercutida à Requerente, quais os montantes e em que períodos;
  2. Que foi a Requerente que suportou em definitivo o encargo da CSR, ou seja, que no preço dos serviços que prestam aos seus clientes não estava contemplada a repercussão da CSR (e/ou em que medida não estava), por forma a poder sustentar que suportou, de forma efetiva, o encargo do imposto.

 

  1. A Requerente limitou-se a juntar as faturas de aquisição do combustível e respetivos comprovativos do seu pagamento ao seu fornecedor de combustíveis [B..., S.A.], as quais estão longe de conter os elementos concretos indispensáveis à comprovação do acima exposto, bem como declaração genérica do identificado fornecedor de combustíveis, a qual está longe de conter os elementos concretos indispensáveis à comprovação do acima exposto.

 

 

  1. FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA E NÃO PROVADA

 

  1. Relativamente à matéria de facto, o Tribunal Arbitral não tem de se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe sim o dever de selecionar os factos que importa, para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123º, n.º 2 do CPPT e artigo 607.º, n.º 3, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT.

 

  1. Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. artigo 596º do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT).

 

  1. Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes à luz do artigo 110.º, n.º 7 do CPPT, bem como o processo administrativo e a prova documental junta aos autos, consideram-se provados, com relevo para a decisão, os factos supra elencados, bem como não provados os factos acima referenciados.

 

  1. No que concerne aos factos dados como não provados, este Tribunal Arbitral entende que as faturas de aquisição de combustível e a declaração da B..., desacompanhada das DIC globalizadas, dos consequentes atos de liquidação e dos respetivos comprovativos de pagamento não permitiam certificar a efetiva liquidação e pagamento da CSR pela introdução no consumo das quantidades de gasóleo rodoviário referidas nos pontos D) a H) da matéria de facto dado como provada.

 

  1. Igualmente, quanto aos factos dados como não provados, impõe-se registar que a prova da repercussão pressupõe inevitavelmente como ponto de partida a demonstração de que a CSR foi inicialmente liquidada e paga pelo sujeito passivo daquele tributo aquando da introdução no consumo dos produtos a ele sujeitos – o que, conforme se viu supra, não foi demonstrado pela Requerente. Na realidade apenas se pode dar como provado o pagamento das faturas, mas não a liquidação e o pagamento da CSR.

 

  1. Acresce que a Requerente não cumpriu o critério a observar na prova da repercussão da CSR, tal qual fixado pelo TJUE no despacho Vapo Atlantic, proferido em 7 de Fevereiro de 2022, no processo n.º C-460/21. Ao que aqui importa, referiu aquele Tribunal o seguinte:

 

“(…) ainda que, na legislação nacional, os impostos indiretos tenham sido concebidos de modo a serem repercutidos no consumidor final e que, habitualmente, no comércio, esses impostos indiretos sejam parcial ou totalmente repercutidos, não se pode afirmar de uma maneira geral que, em todos os casos, o imposto é efetivamente repercutido. A repercussão efetiva, parcial ou total, depende de vários fatores próprios de cada transação comercial e que a diferenciam de outras situações, noutros contextos. Consequentemente, a questão da repercussão ou da não repercussão em cada caso de um imposto indireto constitui uma questão de facto que é da competência do órgão jurisdicional nacional, cabendo a este último apreciar livremente os elementos de prova que lhe tenham sido submetidos (v., neste sentido, Acórdãos de 25 de fevereiro de 1988, Les Fils de Jules Bianco e Girard, 331/85, 376/85 e 378/85, EU:C:1988:97, n.º 17, e de 2 de outubro de 2003, Weber’s Wine World e o., C-147/01, EU:C:2003:533, n.º 96).

 

45 Não se pode no entanto admitir que, no caso dos impostos indiretos, exista uma presunção segundo a qual a repercussão teve lugar e que cabe ao contribuinte provar negativamente o contrário. Sucede o mesmo quando o contribuinte tenha sido obrigado, pela legislação nacional aplicável, a incorporar o imposto no preço de custo do produto em causa. Com efeito, essa obrigação legal não permite presumir que a totalidade do imposto tenha sido repercutida, mesmo no caso de a violação de essa obrigação conduzir a uma sanção (Acórdão de 14 de janeiro de 1997, Comateb e o., C-192/95 a C-218/95, EU:C:1997:12, n.ºs 25 e 26).

 

46 O direito da União exclui assim que se aplique toda e qualquer presunção ou regra em matéria de prova destinada a fazer recair sobre o operador em causa o ónus de provar que os impostos indevidamente pagos não foram repercutidos noutras pessoas e que visem impedir a apresentação de elementos de prova destinados a contestar uma pretensa repercussão (Acórdão de 21 de setembro de 2000, Michaïlidis, C-441/98 e C-442/98, EU:C:2000:479, n.º 42).

 

(…)

 

48 Nestas condições, há que responder à segunda e terceira questões que o direito da União deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que as autoridades nacionais possam fundamentar a sua recusa de reembolsar um imposto indireto contrário à Diretiva 2008/118 na presunção de que esse imposto foi repercutido sobre terceiros e, consequentemente, no enriquecimento sem causa do sujeito passivo.”. (destaque nosso)

 

  1. Da aplicação da jurisprudência do TJUE ao presente caso resulta que a repercussão da CSR sobre terceiros – que não decorre de qualquer imposição legal prevista na Lei n.º 55/2007, de 31 de Agosto, que instituiu a CSR, sendo tão só “expectável” perante o regime e funcionamento deste tributo –, não pode ser em qualquer caso presumida.

 

  1. O que é compreensível, se se tiver em consideração que a repercussão opera aqui como um fenómeno económico, com uma configuração e amplitude variáveis. Como explica SÉRGIO VASQUES:

 

“A repercussão (…) pod[e] operar por mais que uma forma sobre os preços. A forma mais comum é a da repercussão descendente, que se verifica quando o vendedor soma o tributo ao preço de um bem, fazendo com que o comprador o suporte: por exemplo, quando se dá um aumento do imposto sobre a cerveja e os comerciantes sobem o preço na mesma medida, fazendo com que os consumidores o suportem. A repercussão transversal verifica-se quando o vendedor soma o tributo ao preço de um bem diferente daquele que é onerado pelo tributo: por exemplo, quando se dá um aumento do imposto sobre a cerveja e os comerciantes diluem esse aumento através do agravamento do preço da generalidade das bebidas alcoólicas. Enfim, a repercussão ascendente verifica-se quando o vendedor subtrai o tributo ao preço de um bem de que é comprador, obrigando os fornecedores a suportar-lhe o peso económico: por exemplo, quando se dá um aumento do imposto sobre a cerveja e os comerciantes obrigam as empresas cervejeiras a baixar o preço nessa mesma medida.

 

A repercussão constitui um fenómeno que depende em larga medida das condições económicas que rodeiem uma transacção”. [Manual de Direito Fiscal, 2.ª edição, Almedina, 2019, p. 399].

 

  1. Consequentemente, a ocorrência do fenómeno de repercussão descendente não pode simplesmente ser presumida por mais que tenha sido querida na lógica de funcionamento do tributo. Ao invés, impõe-se uma análise do contexto e dos vários fatores que conformam cada transação comercial para daí extrair a conclusão de que o encargo da CSR foi total ou parcialmente “repassado” ao longo dos vários intervenientes do circuito económico até atingir o consumidor final. É que, conforme se referiu, a Requerente não demonstrou que suportou em definitivo o encargo da CSR, ou seja, que no preço dos serviços de transporte rodoviário de passageiro que prestam aos seus clientes não estava contemplada a repercussão da CSR, por forma a poder sustentar que suportou, de forma efetiva, o encargo do imposto.

 

  1. Ora, este exercício de prova não foi realizado pela Requerente, que se limitou a estabelecer meros juízos presuntivos de que suportou a CSR em virtude de uma suposta – embora inexistente – obrigação legal de repercussão do encargo daquele tributo.

 

  1. Na realidade, a Requerente procurou provar a repercussão através das faturas de aquisição do combustível, bem como através da declaração, junta aos autos com o requerimento de 28.06.2024, onde a B..., S.A se limita a afirmar de forma genérica e abstrata que repercutiram o encargo da CSR. Por um lado, tal declaração não versa sobre as concretas transações realizadas entre a fornecedora de combustíveis e a Requerente; não faz a correspondência entre as operações praticadas e as declarações de introdução no consumo dos combustíveis transacionados; não estabelece a relação entre as transações e as DIC com as correspondentes liquidações emitidas pela AT e, finalmente, não demonstra a incorporação do encargo da CSR nas faturas de venda de gasóleo rodoviário à Requerente, nem tão pouco em que grau e/ou medida em que tal incorporação se processou.

 

  1. E, por outro lado, as faturas não comprovam de igual modo que a fornecedora de combustível [B..., S.A.] tenha repercutido o encargo da CSR. Ora, tais documentos não versam sobre as concretas transações realizadas entre a fornecedora de combustíveis e a Requerente; não faz a correspondência entre as operações praticadas e as declarações de introdução no consumo dos combustíveis transacionados; não estabelece a relação entre as transações e as DIC com as correspondentes liquidações emitidas pela AT e, finalmente, não demonstra a incorporação do encargo da CSR nas faturas de venda de gasóleo rodoviário à Requerente, nem tão pouco em que grau e/ou medida em que tal incorporação se processou.

 

  1. Acresce que mesmo que a Requerente tivesse demonstrado a liquidação e repercussão da CSR, sempre inexistiriam elementos nos autos que permitam certificar que o encargo da CSR se cristalizou na sua esfera jurídica, isto é, que foi a Requerente a entidade que em última instância foi onerada com o tributo em causa, porquanto não incorporou o seu custo no preço dos serviços prestados de transporte rodoviário de passgeiros aos seus clientes, que podem situar-se no circuito ou cadeia económico-comercial como os verdadeiros consumidores finais.

 

  1. Por fim, regista-se que não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas partes, que apesar de serem apresentadas como factos, consistem em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada.

 

 

  1. MATÉRIA DE DIREITO

 

  1. Questão prévia: incompetência do tribunal arbitral em razão da matéria

 

  1. Quanto à competência deste Tribunal Arbitral, impõe-se em primeiro lugar aferir se, em termos gerais, o pedido formulado pela Requerente é arbitrável, isto é, se a apreciação de pretensões referentes à CSR se encontra ou não inserida no âmbito de competência material da arbitragem tributária.

 

  1. A competência dos Tribunais Arbitrais é delimitada no RJAT nos seguintes termos:

 

“Artigo 2.º

Competência dos tribunais arbitrais e direito aplicável

1 - A competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação das seguintes pretensões:

a) A declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta;

b) A declaração de ilegalidade de actos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de actos de determinação da matéria colectável e de actos de fixação de valores patrimoniais”. (negrito nosso)

 

  1. Este âmbito material é, por sua vez, circunscrito na Portaria de Vinculação, nos seguintes termos:

 

Artigo 2.º

Objecto da vinculação

Os serviços e organismos referidos no artigo anterior vinculam-se à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD que tenham por objecto a apreciação das pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida referidas no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com excepção das seguintes:

a) Pretensões relativas à declaração de ilegalidade de actos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário;

b) Pretensões relativas a actos de determinação da matéria colectável e actos de determinação da matéria tributável, ambos por métodos indirectos, incluindo a decisão do procedimento de revisão;

c) Pretensões relativas a direitos aduaneiros sobre a importação e demais impostos indirectos que incidam sobre mercadorias sujeitas a direitos de importação; e

d) Pretensões relativas à classificação pautal, origem e valor aduaneiro das mercadorias e a contingentes pautais, ou cuja resolução dependa de análise laboratorial ou de diligências a efectuar por outro Estado membro no âmbito da cooperação administrativa em matéria aduaneira;

e) Pretensões relativas à declaração de ilegalidade da liquidação de tributos com base na disposição antiabuso referida no n.º 1 do artigo 63.º do CPPT, que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos do n.º 11 do mesmo artigo.” (negrito nosso)

 

  1. Ainda que a conjugação das referidas normas jurídicas não apresente uma resposta incontestável quanto à arbitrabilidade de atos de liquidação de contribuições, que parecem ter sido em parte excluídos do âmbito material da arbitragem tributária pela Portaria de Vinculação, o que tem reflexo na jurisprudência arbitral que não é uniforme nesta matéria, o certo é que resulta incontroversa a inclusão no âmbito da competência material dos Tribunais Arbitrais a apreciação da legalidade de atos de liquidação de impostos.

 

  1. Para o efeito de se responder a esta questão, torna-se necessário qualificar a CSR enquanto “contribuição” ou “imposto”, para daí extrair as necessárias consequências quanto à competência material deste Tribunal Arbitral. Esta análise tem sido amplamente discutida e desenvolvida pela jurisprudência, que importa aqui considerar em cumprimento do desiderato de interpretação e aplicação uniforme do direito que emana do artigo 8.º, n.º 3 do Código Civil.

 

  1. Nas decisões arbitrais proferidas, entre outras, nos processos n.ºs 508/2023-T e 520/2023-T, a CSR foi qualificada como uma contribuição, o que levou aqueles Tribunais Arbitrais a julgar procedente a exceção de incompetência material. No acórdão proferido em 16 de Novembro de 2023, no processo n.º 520/2023-T, referiu-se a este respeito o seguinte:

 

(…) nem se pode aceitar, à face da presunção de que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil), que fosse atribuída à CSR a designação de «contribuição» se legislativamente se pretendesse que ela fosse considerada como um «imposto» e não como uma das «demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas» a que aludem o artigo 165.º, n.º 1, alínea i) da CRP e o artigo 3.º, n.º 2, da LGT. A expressão do pensamento em termos adequados faz-se necessariamente através da expressão correcta e não uma outra que o dissimule.

Assim, em boa hermenêutica, é de concluir que o artigo 2.º da Portaria n.º 112- A/2011, quando se refere a «impostos», está a reportar-se apenas aos tributos a que legalmente é atribuída tal designação (como, por exemplo, o IVA, o IRC e o IRS) e àqueles que, embora tenham outra designação, a própria lei explicitamente considera «impostos» (como sucede com as «contribuições especiais que assentam na obtenção pelo sujeito passivo de benefícios ou aumentos de valor dos seus bens em resultado de obras públicas ou da criação ou ampliação de serviços públicos ou no especial desgaste de bens públicos ocasionados pelo exercício de uma actividade», que o n.º 3 do artigo 4.º da LGT identifica e expressamente considera «impostos»). E, paralelamente, aquele artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 não se estará a reportar a tributos que pela lei são denominados como «taxas» ou «contribuições financeiras a favor das entidades públicas», que não se enquadrem na definição das referidas «contribuições especiais», mesmo que, após análise aprofundada das suas características pelo tribunal previamente definido como competente, se possa concluir que devem ser considerados como impostos especiais, designadamente para efeitos de aplicação das exigências constitucionais relativas a impostos.

No caso da CSR, é manifesto que não se está perante uma «contribuição especial» enquadrável no conceito definido no n.º 3 do artigo 4.º da LGT, pois não assenta «na obtenção pelo sujeito passivo de benefícios ou aumentos de valor dos seus bens em resultado de obras públicas ou da criação ou ampliação de serviços públicos ou no especial desgaste de bens públicos ocasionados pelo exercício de uma actividade», pelo que não há suporte literal mínimo para que seja considerada, na perspectiva legislativa, um dos «impostos» a que alude o artigo 2.º da Portaria n.º 112-/2011.”.

 

  1. Em sentido contrário, pronunciaram-se os Tribunais Arbitrais nas decisões proferidas nos processos n.ºs 564/2020-T, 629/2021-T, 304/2022-T, 305/2020-T, 644/2022-T, 665/2022-T, 702/2022-T, 24/2023-T, 113/2023-T, 294/2023-T e 410/2023-T, que qualificaram a CSR como imposto e, consequentemente, consideraram-na arbitrável. Para o efeito, o acórdão proferido no âmbito do processo n.º 644/2022-T, de 24 de Outubro de 2023, decidiu no seguinte sentido:

 

“Afigura-se a este tribunal que a CSR, não obstante um nomen iuris que pareceria integrá-la na categoria das “contribuições financeiras a favor de entidades públicas” (art. 165º, 1, i) da CRP), preenche todos os requisitos de conteúdo pecuniário, carácter coactivo, unilateralidade, definitividade, ausência de cariz sancionatório, tendo como credor o Estado ou outros entes públicos, e a afectação à realização de fins públicos – que definem um imposto. Essa qualificação não se modifica pela circunstância de surgirem algumas correspectividades como a da obtenção de receitas para financiamento da utilização de vias públicas – pois as contribuições que assentam no especial desgaste de bens públicos são impostos, como estabelece o art. 4º, 3 da LGT. Falta à CSR o carácter de comutatividade, bilateralidade ou sinalagmaticidade grupal ou colectiva que é necessária à contribuição financeira. O seu regime não determina, para o sujeito activo respectivo, qualquer dever de prestar específico, qualquer contraprestação exigível pelo contribuinte, o que significa que tem o carácter unilateral de um verdadeiro imposto (quando muito, alguma “paracomutatividade”, referente à compensação de prestações de que os sujeitos passivos são presumíveis causadores ou beneficiários – mas não a correspectividade bilateral estrita de uma taxa, sem uma contrapartida aproveitada ou provocada individualmente pelo sujeito passivo, como sucede numa taxa).

Basta percebermos que, enquanto a CSR é estabelecida a favor da Infraestruturas de Portugal (inicialmente, Estradas de Portugal), sendo esta a entidade titular da correspondente receita, os sujeitos passivos da contribuição são as empresas comercializadoras de combustíveis rodoviários, e, portanto, não são os destinatários da actividade da Infraestruturas de Portugal. Na sua concepção, a CSR incide sobre a gasolina e o gasóleo rodoviário sujeitos ao imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos e dele não isentos, e é devida pelos sujeitos passivos do ISP, sendo aplicável à sua liquidação, cobrança e pagamento o disposto no Código dos Impostos Especiais de Consumo.

Trata-se, assim, de um imposto de receita consignada (a consignação, desacompanhada de qualquer comutatividade, não subverte a sua natureza), e esta conclusão reforça-se com a posição veiculada pelo Tribunal de Contas na Conta Geral do Estado de 2008 (…)

Lembremos, por fim, que a CSR nasceu, com a Lei nº 55/2007, de 31 de Agosto, como um mero desdobramento do ISP, e, sobre este último, nem o nomen iuris permite dúvidas sobre a respectiva natureza.

Não há, nesse ponto, qualquer paralelo entre a CSR e a CESE (Contribuição Extraordinária Sobre o Sector Energético), relativamente à qual uma decisão arbitral (Proc. n.º 714/2020-T) entendeu procedente a excepção de incompetência ratione materiae. A CESE, criada pela Lei do Orçamento do Estado para 2014, é tida como uma contribuição extraordinária cuja receita é consignada ao Fundo para a Sustentabilidade Sistémica do Sector Energético (FSSSE), criado pelo Decreto-Lei n.º 55/2014, de 9 de Abril, tendo por base, portanto, uma contraprestação de natureza grupal, na medida em que constitui um preço público a pagar pelo conjunto de pessoas singulares ou colectivas que integram o sector energético nacional, o que configura uma bilateralidade genérica ou difusa – que pura e simplesmente não encontramos na CSR.”.

 

  1. Assim sendo, cabendo tomar posição sobre a querela jurídica, este Tribunal Arbitral subscreve e acompanha a jurisprudência maioritária que qualifica a CSR como um imposto, uma vez que este corresponde a um tributo que efetivamente não reúne as características de bilateralidade difusa e de responsabilidade de grupo inerente às contribuições. Consequentemente, nem se revela necessário indagar se as contribuições se inserem ou não no âmbito material da arbitragem, uma vez que resulta incontroverso do RJAT e da Portaria de vinculação que tal âmbito abrange a apreciação da legalidade de questões referentes a impostos.

 

  1. Apesar de, em termos gerais, as matérias referentes à CSR serem arbitráveis, para se concluir pela competência material do Tribunal Arbitral é ainda necessário analisar e confrontar os concretos pedidos formulados pela Requerente com a delimitação que resulta do RJAT e da Portaria de Vinculação.

 

  1. No pedido de pronúncia arbitral a Requerente peticionou, entre o demais, a declaração da “(...) a ilegalidade das normas dos artigos 1º, 2º, 3º, 4º e 5º da Lei n. 55/2007, de 31 de Agosto, nas redacções vigentes em 2019 a 2022, por incompatibilidade com o artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva 2008/118/CE do Conselho, de 16 de Dezembro de 2008, e recusem a sua aplicação”, bem como a declaração da “anulação das liquidações de CSR subjacentes às vendas e faturas identificadas no presente pedido, por ilegalidade das mesmas, anulação essa que deverá ser parcial da liquidação de ISP, se não destacável totalmente a liquidação de CSR desta, ou total desta”

 

  1. Portanto, tal como se compreende o pedido da Requerente, a mesma pretende, por um lado, a declaração da ilegalidade dos atos de repercussão da CSR consubstanciados nas faturas referentes ao gasóleo rodoviário adquirido pela Requerente no decurso do período compreendido entre 4 de julho de 2019 e 31 de dezembro de 2022 e, por outro lado, a declaração de ilegalidade das correspondentes liquidações de CSR praticadas pela Requerida, com base nas DIC submetidas pelas respetivas fornecedoras de combustíveis.

 

  1. Em face do conteúdo do pedido apresentado pela Requerente, é notório que não assiste razão à Requerida quando sustenta que a Requerente questiona a desconformidade do regime jurídico, no seu todo, da CSR, peticionando a suspensão da eficácia de ato legislativo emanado pela Assembleia da República no exercício das suas competências. Tal pedido não foi definitivamente formulado pela Requerente, pelo que improcedem quaisquer desconformidades que lhe pudessem ser assacadas.

 

  1. No que concerne à análise do pedido da ilegalidade dos atos de repercussão da CSR consubstanciados nas faturas referentes ao gasóleo rodoviário adquirido pela Requerente no decurso do período compreendido entre 4 de julho de 2019 e 31 de dezembro de 2022, cumpre referir que a apreciação da legalidade de atos de repercussão de CSR extravasa o âmbito material da arbitragem tributária, tal como se decidiu no acórdão proferido no âmbito do processo n.º 375/2023-T, de 15 de janeiro de 2024, em que se entendeu que:

 

Em relação aos “atos de repercussão” impugnados, o Tribunal não pode conhecer dos mesmos, pois não são actos tributários, não estando prevista a sua sindicabilidade (vd. Art. 2.º do RJAT). No entanto, como foram, em simultâneo, contestados pelas Requerentes os actos de liquidação de CSR, é sobre estes que recai a pronúncia do Tribunal” (negrito nosso)

 

  1. Os atos de repercussão materializam “um fenómeno que consiste na transferência do peso económico de um tributo para pessoa diferente do sujeito passivo e com quem este está em relação, através da sua integração no preço de um qualquer bem”, tal como evidencia SÉRGIO VASQUES, ob. cit., p. 399. Este fenómeno não se subsume a nenhuma das realidades visadas pelo artigo 2.º do RJAT anteriormente transcrito, que determina que os Tribunais Arbitrais são competentes para apreciar a legalidade de atos de liquidação (alínea a) do n.º 1) e de atos de fixação da matéria tributável/matéria coletável/valores patrimoniais na eventualidade de não terem originado qualquer ato de liquidação (alínea b) do n.º 1).

 

  1. Com efeito, independentemente da posição que se adote sobre a natureza jurídica dos atos de repercussão, quanto a se saber se são atos que integram uma relação jurídico-tributária complexa ou se são um fenómeno económico de natureza estritamente privada, é certo é que aqueles não são atos tributários em sentido lato, porque não envolvem o apuramento da matéria coletável/tributável através da aplicação de uma norma tributária substantiva a um caso concreto e muito menos atos tributários de liquidação stricto sensu, que tornam certa, líquida e exigível a obrigação tributária através da operação aritmética de aplicação da taxa legal à matéria tributável previamente determinada (Neste sentido, vide SERENA CABRITA NETO e CARLA CASTELO TRINDADE, Contencioso Tributário, vol. I, Almedina, 2017, p. 278).

 

  1. Este é o entendimento que vem sendo seguido de forma uniforme pela jurisprudência, que se pronunciou sobre esta questão nos processos arbitrais n.º 296/2023-T, 375/2023-T, 332/2023-T, 408/2023-T e 633/2023-T. A título de exemplo, no acórdão proferido em 1 de Fevereiro de 2024, no processo n.º 296/2023-T, decidiu-se que:

 

 “Como os Colectivos que decidiram os processos n.ºs 408/2023-T e 375/2023-T, o presente Tribunal arbitral entende que não tem competências para apreciar directamente – e sem mais – actos de repercussão. Ainda que se possam integrar numa relação tributária complexa, tais actos ocorrem a jusante dos actos de liquidação e a competência que o legislador atribuiu aos tribunais arbitrais esgota-se – no que ao caso importa – na sindicância dos actos de liquidação. Isso decorre directamente das normas legais, mas corresponde também ao ensinamento da doutrina: Alberto Xavier, distinguindo a substituição tributária da repercussão, escrevia que nesta temos “um devedor de imposto, que é do mesmo passo contribuinte, e um terceiro que não desempenha qualquer papel na obrigação tributária.”

Para Leite de Campos/Benjamim Rodrigues/Lopes de Sousa, entre o terceiro repercutido “e o sujeito activo não existe vínculo jurídico, no sentido de que o repercutido não é devedor do sujeito activo. A sua obrigação não nasce da realização do facto tributário, mas sim da realização de um facto ao qual a lei liga o direito de o sujeito passivo de repercutir e a correlativa obrigação do repercutido de reembolsar o sujeito passivo quando este exerça o seu direito. Daqui decorre, nomeadamente, que as relações entre o sujeito passivo e o repercutido inadimplente se regem pelo Direito privado.”

Sendo isso assim em tese geral, face ao elenco das competências dos tribunais arbitrais constituídos no âmbito do CAAD, e que constam dos artigos 2.º a 4.º do RJAT, nem sequer é preciso discutir a natureza jurídica desses actos de repercussão porque, qualquer que seja, não estão contemplados na única potencial norma atributiva de competência a este Tribunal: a da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT: “A declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta;”. Quer dizer que este Tribunal se declara liminarmente incompetente para apreciar o primeiro pedido da Requerente (declarar a ilegalidade dos actos de repercussão da CSR consubstanciados nas facturas referentes ao gasóleo rodoviário e à gasolina adquiridos pela Requerente).”.

 

  1. Portanto, há que declarar o presente Tribunal Arbitral incompetente, em razão da matéria, para conhecer o pedido de apreciação da legalidade de atos de repercussão de CSR, impondo-se a absolvição parcial da Requerida da instância quanto a este concreto pedido, em conformidade com o disposto nos artigos 278.º, n.º 1, alínea a), 576.º, n.ºs 1 e 2 e 577.º, alínea a) todos do CPC aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.

 

  1. Em sentido oposto, e sem necessidade de mais valorações, reconhece-se o presente Tribunal Arbitral competente para apreciar o pedido formulado pela Requerente, de declaração de ilegalidade das liquidações de CSR dirigidas às sociedades fornecedoras de combustíveis, porque subsumível ao âmbito material previsto no artigo 2.º, n.º 1, alínea a) do RJAT. Saber se tal impugnação pode ser feita pela Requerente, na qualidade de (alegada) repercutida, ou apenas às fornecedoras de combustíveis, enquanto sujeitos passivos primários a quem foi (alegadamente) liquidada e por quem foi (alegadamente) paga a CSR, é uma questão que não releva para efeitos de determinação de competência, mas tão só para efeitos de apuramento de legitimidade, pelo que será nessa sede apreciada.

 

 

  1. Questão prévia: ilegitimidade processual

 

  1. Não consta do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”) a regulação do pressuposto processual da legitimidade, como possibilidade de intervenção num processo contencioso, cuja conformação jurídica tem, assim, de proceder do direito subsidiariamente aplicável, por via da aplicação do artigo 29.º, n.º 1 do RJAT, que remete para as disposições legais de natureza processual do Código de Processo e de Procedimento Tributário (“CPPT”), do CPTA e do CPC.

 

  1. Da regra geral do direito processual, constante do artigo 30.º do CPC, resulta que é parte legítima quem tem “interesse direto” em demandar, sendo considerados titulares do interesse relevante, para este efeito, na falta de indicação da lei em contrário, “os sujeitos da relação controvertida”. A mesma regra é reproduzida no processo administrativo, que confere legitimidade ativa a quem “alegue ser parte na relação material controvertida” (v. artigo 9.º, n.º 1 do CPTA).

 

  1. A legitimidade no processo é, pois, recortada pelo conceito central de “relação material” que, no âmbito fiscal, há de ser uma relação regida pelo direito tributário, à qual subjaz um ato tributário, cujo sujeito passivo é delimitado no artigo 18.º, n.º 3 da Lei Geral Tributária (“LGT”), como “a pessoa singular ou coletiva, o património ou a organização de facto ou de direito que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte direto, substituto ou responsável.”.

 

  1. No domínio tributário, a legitimidade não pode deixar de ser enquadrada no âmbito das relações jurídicas tributárias que se estabelecem entre a administração tributária, agindo como tal, e as pessoas singulares ou coletivas e entidades equiparadas (vide artigo 1.°, n.º 2, da LGT).

 

  1. Do CPPT resulta a existência de uma norma específica sobre a legitimidade no processo judicial tributário, atribuindo-a aos “contribuintes, incluindo substitutos e responsáveis, outros obrigados tributários, as partes dos contratos fiscais e quaisquer outras pessoas que provem interesse legalmente protegido” (vide artigo 9.º, n.ºs 1 e 4 do CPPT). No mesmo sentido, ainda que se refira somente à legitimidade no procedimento, a LGT determina no seu artigo 65.º que “têm legitimidade no procedimento os sujeitos passivos da relação tributária e quaisquer pessoas que provem interesse legalmente protegido.”. E o artigo 78.º da LGT assegura a mesma posição de legitimidade ou ilegitimidade conferida pelas regras gerais sobre o tema.

 

  1. Em relação aos responsáveis (sujeitos passivos não originários, tal como os substitutos), o legislador teve a preocupação de justificar a razão pela qual lhes é concedida legitimidade processual.

 

  1. Quanto aos responsáveis solidários, deriva “da exigência em relação a eles do cumprimento da obrigação tributária ou de quaisquer deveres tributários, ainda que em conjunto com o devedor principal” (vide artigo 9.º, n.º 2 do CPPT), enquanto no que respeita aos responsáveis subsidiários, está associada ao facto “de ter sido contra eles ordenada a reversão da execução fiscal ou requerida qualquer providência cautelar de garantia dos créditos tributários” (vide artigo 9.º, n.º 3 do CPPT). Em ambas as situações, apesar de não corresponderem à figura do sujeito passivo originário, constitui-se uma relação jurídico-tributária entre estas categorias de sujeitos passivos derivados e o credor tributário Estado, que encerra prestações – principais (de pagamento da obrigação tributária) e acessórias, o que sucede igualmente com o substituto.

 

  1. In casu, a Requerente invoca a qualidade de repercutido legal para deduzir a ação arbitral. Nesse contexto, SÉRGIO VASQUES, afirma que “Se o repercutido estará à margem da relação tributária, não estará por isso à margem do direito.” (vide Manual de Direito Fiscal, 2.ª ed., p. 401), referindo que a LGT lhe reconhece o direito “à reclamação, recurso, impugnação ou pronúncia arbitral”.

 

  1. Contudo, importa começar por referir que a figura do repercutido não se enquadra na categoria de sujeito passivo, nos termos do citado artigo 18.º, n.º 3 da LGT, pelo que, não sendo parte em contratos fiscais, a legitimidade, neste caso, só pode advir da comprovação de que é titular de um interesse legalmente protegido (vide artigo 9.º, n.ºs 1 e 4 do CPPT).

 

  1. Apesar de o repercutido não ser sujeito passivo, a alínea a) do n.º 4 do artigo 18.º da LGT, pressupõe que assiste o “direito de reclamação, recurso, impugnação ou de pedido de pronúncia arbitral nos termos das leis tributárias” a quem “suporte o encargo do imposto por repercussão legal”, estendendo a posição jurídica adjetiva ao repercutido (apesar de não o considerar sujeito passivo), na condição de estarmos perante um caso de “repercussão legal”. A lei implica desta forma que o repercutido legal é titular de um interesse legalmente protegido, condição exigida para que possa intervir em juízo (vide artigo 9.º, n.ºs 1 e 4 do CPPT).

 

  1. Conforme resulta da jurisprudência do CAAD, entre outros, do acórdão 296/2023-T, de 1 de fevereiro de 2024:

Qualquer que seja a posição a adoptar em tese geral – e, salvo disposição legal em contrário, não há razões para pôr em causa a possibilidade de os contribuintes de facto serem admitidos a invocarem perante os Tribunais, incluindo arbitrais, a ilegalidade dos impostos que efectivamente pagaram –, tem de se ter em conta o quadro legislativo, e este foi invocado pela AT na sua Resposta para pôr em causa a possibilidade de a repercutida poder vir pedir a revisão de liquidações que lhe eram alheias. (...)”

 

  1. Neste âmbito, JORGE LOPES DE SOUSA, refere que:

 

nos casos de repercussão legal do imposto, apesar de aquele que suporta o encargo do imposto não ser sujeito passivo, é-lhe assegurado o direito de reclamação, recurso e impugnação [artigo 18. °, n.º 4, da LGT]. São casos de repercussão legal os do IVA e dos impostos especiais de consumo, pois, em face do (…) respetivo regime legal, a lei exige o pagamento dos tributos aos intervenientes no processo de comercialização dos bens ou serviços, visando fazer com que eles venham a ser pagos pelos consumidores finais, que são os titulares da capacidade contributiva que se pretende tributar.” (vide Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, 6.ª edição, 2011, I volume, p. 115).

 

é de considerar ser titular de um interesse suscetível de justificar a intervenção no procedimento tributário quem possa ser diretamente afetado pelo que nele possa vir a ser decidido, inclusivamente quando esteja em causa uma mera situação de vantagem derivada do ordenamento jurídico, o que será a interpretação que melhor se compagina com o direito constitucionalmente garantido de participação dos cidadãos nas decisões que lhes disserem respeito (art . 267.°, n.° 5, da CRP), como tal se tendo de considerar, necessariamente, todas as que tenham repercussão direta na sua esfera jurídica.” (vide Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, 6.ª edição, 2011, I volume, p. 120)

 

  1. Ora, conforme sustentou no acórdão do CAAD, de 1 de fevereiro de 2024, proferido no âmbito do processo 296/2023-T, “qualquer que seja, em tese geral, a possibilidade de o repercutido invocar a ilegalidade das liquidações que originam a repercussão, no âmbito dos impostos especiais de consumo há uma norma que o veda e que o legislador manteve incólume ao longo das 25 alterações que, em 24 anos, introduziu no CIEC: a do n.º 2 do artigo 15.º (epigrafado “Regras gerais do reembolso”).” (negrito nosso).

 

  1. A referida disposição legal (artigo 15.º, n.º 2, do CIEC) estabelece que “Podem solicitar o reembolso os sujeitos passivos referidos no n.º 1 e na alínea a) do n.º 2 do artigo 4.º que tenham procedido à introdução no consumo dos produtos em território nacional e provem o pagamento do respectivo imposto.”.

 

  1. Por sua vez, as disposições relevantes desse artigo 4.º (epigrafado “Incidência subjectiva”), para as quais tal norma remete, têm a seguinte redação:

 

“1 - São sujeitos passivos de impostos especiais de consumo:

a) O depositário autorizado, o destinatário registado e o destinatário certificado; (…)

(...)

2 - São também sujeitos passivos, sem prejuízo de outros especialmente determinados no presente Código:

a) A pessoa que declare os produtos ou por conta da qual estes sejam declarados, no momento e em caso de importação;”

 

  1. Efetivamente, desde a redação inicial destas normas, dada pelo Decreto-Lei n.º 73/2010, de 21 de Junho, também a única alteração substancial registada foi o aditamento (pela Lei n.º 24-D/2022, de 30 de Dezembro) do “destinatário certificado” entre os sujeitos passivos identificados à cabeça da norma sobre “Incidência subjetiva”. Quer dizer que nenhum legislador – nem mesmo o que entendeu atribuir natureza interpretativa à alusão à tipicidade da repercussão dos impostos especiais de consumo – considerou necessário, para o que ora importa, alargar o círculo dos “sujeitos passivos” para lá do “destinatário certificado”.

 

  1. Quer dizer que só os sujeitos passivos aí identificados, e só quando preencham requisitos adicionais, podem suscitar questões sobre, tal como resulta do n.º 1 desse artigo 15.º, “o erro na liquidação”. Ora, esta solução apresenta total cabimento face à impraticabilidade que seria fazer a gestão de um sistema demasiadamente aberto a todo o género e tipo de reembolsos, com uma duvidosa forma de controlo. A esta mesma conclusão chegaram, entre outras, as decisões proferidas nos processos n.ºs 296/2023-T, 408/2023-T, 375/2023-T e 633/2023-T.

 

  1. Por outro lado, acresce que se afigura claro que a CSR não constitui um caso de repercussão legal.

 

  1. A Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, que instituiu a CSR não contempla qualquer mecanismo de repercussão legal, nem sequer, adiante-se, de repercussão meramente económica, isto, sem prejuízo de ser um dado que, em princípio, as empresas repassam nos preços praticados os gastos em que incorrem, independentemente da sua natureza (e, portanto, incluindo os gastos tributários), por forma a concretizarem o objetivo lucrativo que preside à sua criação e manutenção (vide artigos 22.º do Código das Sociedades Comerciais e 980.º do Código Civil).

 

  1. Infere-se do articulado da Requerente que esta legitima a sua intervenção processual do facto singelo de lhe ter sido repercutida a CSR pela empresa fornecedora de combustíveis [B..., S.A.], caracterizando-se como um consumidor de combustíveis, sobre o qual recai, nos termos da lei, o encargo daquele tributo.

 

  1. Contudo, a repercussão económica não é, por si só, atributo de legitimidade processual, pois o artigo 9.º do CPPT requer a demonstração de um interesse legalmente protegido, i.e., que mereça a tutela do direito substantivo. Além de que a Requerente não tem a qualidade de consumidor de combustíveis, no sentido de consumidor final sobre o qual recai ou deve recair o encargo do tributo, na lógica da repercussão económica que subjaz nomeadamente aos Impostos Especiais de Consumo (“IEC”). Na verdade, o combustível adquirido é um fator de produção no circuito económico, pelo que se a CSR, conforme alega a Requerente, se destina a ser suportada pelo consumidor, à partida esta não faz parte das entidades potencialmente lesadas, que são os consumidores e não os operadores económicos.

 

  1. Nos termos da lei que prevê a CSR, não existe qualquer referência sobre quem deve recair o encargo do tributo do ponto de vista económico, pelo que é errónea a afirmação da Requerente de que é sobre si que recai tal encargo. Basta atentar, para esta conclusão, no artigo 5.º, n.º 1 da citada lei: “A contribuição de serviço rodoviário é devida pelos sujeitos passivos do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos, sendo aplicável à sua liquidação, cobrança e pagamento o disposto no Código dos Impostos Especiais de Consumo, na lei geral tributária e no Código de Procedimento e Processo Tributário, com as devidas adaptações.”. Assim, o legislador limitou-se a identificar o sujeito passivo da CSR, nada acrescentando sobre a repercussão da mesma, pelo que o artigo 5.º, n.º 1, não remete para o artigo 2.º do CIEC (que prevê a repercussão legal nos impostos especiais sobre o consumo), mas apenas para as normas desse código que regulam a liquidação, cobrança e pagamento do imposto pelo sujeito passivo.

 

  1. Como salienta o acórdão do CAAD, de 8 de janeiro de 2024, proferido no âmbito do processo 408/2023-T, com o qual se concorda:

 

“1. A Lei n.º 55/2007 define o sujeito passivo e devedor da CSR, mas não contém qualquer regra de repercussão legal, nem se pronuncia sobre a sua repercussão económica;

2. A Requerente não é consumidor final, o que significa que os gastos em que incorre são presumivelmente, de acordo com as regras da experiência comum, repercutidos no elo subsequente do circuito económico até atingirem os consumidores finais, esses sim, onerados com o encargo económico do imposto e demais gastos incorridos na produção dos bens e serviços;

3. Se a CSR foi economicamente repercutida pelos distribuidores de combustíveis à Requerente, não há razões para crer que esta, no exercício de uma atividade económica que visa o lucro e dentro dessa racionalidade, não tenha também repassado de alguma forma o encargo da CSR, no todo ou em parte, para os seus clientes, que nem sequer são os consumidores finais (os próprios clientes).”

 

  1. Ora, não sendo a Requerente o sujeito passivo da CSR, nem repercutido legal desta contribuição, não lhe assiste legitimidade processual, a menos que, como interessada, alegue e demonstre factos que suportem a aplicação da norma residual atributiva de legitimidade, i.e., que evidencie um interesse direto e legalmente protegido na sua esfera, passível de justificar a faculdade de demandar a Requerida em juízo, ónus que sobre si impende.

 

  1. Contudo, o único facto que a Requerente alega para este efeito é o de lhe ter sido repercutida a CSR. Qualifica esta repercussão, erradamente, como legal, que, a ser “legal”, sempre teria de constar de uma norma com essa natureza, a qual, porém, não existe.

 

  1. Acresce que, sem prejuízo de a CSR ter sido consagrada como “contrapartida” da utilização da rede rodoviária nacional, a lei não indica ou sequer sugere sobre quem é que deve constituir encargo, contrariamente ao que a Requerente afirma. Na realidade, a Requerente é tão-só um cliente comercial dos sujeitos passivos que liquidaram a CSR.

 

  1. Portanto, tal como foi afirmado no acórdão do CAAD, de 8 de janeiro de 2024, proferido no âmbito do processo 408/2023-T:

 

Não integra, nem é parte da relação tributária, nem é repercutido legal. Também não se descortina, nem disso foi feita prova, que tenha sido a Requerente a suportar economicamente o imposto, para o que seria necessário demonstrar duas vertentes cumulativas:

− Que a CSR foi repercutida à Requerente, qual o montante e em que períodos;

− Que, por sua vez, o preço dos serviços de transportes que presta aos seus clientes não comportam a repercussão de CSR e em que medida, por forma a poder sustentar que suportou de forma efetiva o encargo do imposto”.

 

  1. Conforme anteriormente referido, a Requerente limitou-se a juntar as faturas do seu fornecedor de combustíveis [B..., S.A.], bem como declaração genérica do mesmo, que estão longe de conter os elementos concretos indispensáveis à comprovação do acima exposto. Posto isto, a Requerente não logrou, por isso, atestar que suportou o tributo contra o qual reage. E esta seria, segundo entendemos, a única forma de lhe poder ser reconhecida a legitimidade residual para a presente ação arbitral, tendo em conta que não é sujeito passivo, nas diversas modalidades que o conceito acomoda, nem repercutido legal da CSR.

 

  1. Igualmente, como acima referido, e tal resulta dos acórdãos do CAAD, de 8 de janeiro de 2024 e de 1 de fevereiro de 2024, proferido no âmbitos dos processos n.ºs 408/2023-T e 296/2023-T, compreende-se que o legislador não tenha adotado um conceito irrestrito de legitimidade ativa, rodeando-se de algumas cautelas, atentas as dificuldades práticas que uma tal abertura suscitaria, quer na ligação entre o ato de liquidação do imposto, a determinação da sua efetiva repercussão (económica) e a determinação do seu quantum; quer ainda no potencial desdobramento/duplicação de devoluções de imposto indevidas: simultaneamente ao sujeito passivo e ao(s) múltiplos repercutido(s) económicos da cadeia de valor.

 

  1. Isto é, o mesmo imposto poderia ser restituído a diversos intervenientes, de forma dificilmente controlável, com manifesto prejuízo para o Estado, em colisão com os princípios da igualdade e da praticabilidade.

 

  1. Por fim, em cumprimento do desiderato do direito nacional e da União Europeia, não se diga que a Requerente ficou desprovida de tutela, pois nada impede o ressarcimento, através de uma ação civil de repetição do indevido instaurada contra os seus fornecedores, se reunir os devidos pressupostos, nos termos declarados pelo Acórdão do Tribunal de Justiça, de 20 de outubro de 2011, no processo C-94/10, Danfoss A/S (pontos 24 a 29). Nesta perspetiva, está acautelada a observância do princípio fundamental da tutela jurisdicional efetiva (vide artigo 20.º da Constituição).

 

  1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo já entendeu, em relação a um caso de liquidação de Imposto Automóvel (correspondente ao atual Imposto sobre Veículos), que o adquirente não tem legitimidade para impugnar a respetiva liquidação, precisamente por não se tratar de um caso de repercussão legal (vide Acórdão de 1 de outubro de 2003, processo n.º 0956/03).

 

  1. Em suma, à face do exposto deve julgar-se verificada a exceção de ilegitimidade da Requerente, constituindo uma exceção dilatória de conhecimento oficioso que obsta a que o Tribunal Arbitral conheça a questão de fundo e demais questões suscitadas, com a consequente absolvição da Requerida da instância, nos termos do disposto nos artigos 9.º do CPPT, 65.º da LGT, 55.º, n.º 1, alínea a) e 89.º, n.ºs 2 e 4, alínea e) do CPTA, ex vi artigo 29.º, n.º 1 do RJAT.

 

  1. Em síntese, não tendo ficado provado, por nenhum dos meios probatórios apresentados pela Requerente, o valor da CSR repercutido pelo fornecedor de combustíveis à Requerente, nem que esta tenha suportado o encargo económico do imposto em definitivo, falece à Requerente legitimidade para pedir a anulação das respetivas liquidações e o reembolso do imposto, solução que se enquadra numa interpretação conforme à Constituição (v. artigo 268.º, n.º 4), porquanto o direito à impugnação dos atos lesivos não pode deixar de reportar-se aos sujeitos cuja esfera jurídico-patrimonial sofreu a lesão (os lesados) e não a outros.

 

  1. A título conclusivo, em resultado da apreciação das questões prévias referentes à incompetência em razão da matéria e à ilegitimidade processual, o presente Tribunal Arbitral é incompetente para se pronunciar sobre o pedido da Requerente quanto à declaração da ilegalidade dos atos de repercussão da CSR consubstanciados nas faturas referentes ao gasóleo rodoviário adquirido pela Requerente no decurso do período compreendido entre 4 de julho de 2019 e 31 de dezembro de 2022 (porque não pode pronunciar-se sobre atos subsequentes aos, e autónomos dos, atos de liquidação), e resultando da lei que a Requerente é parte ilegítima para suscitar o pedido de declaração de ilegalidade das correspondentes liquidações de CSR praticadas pela Requerida, com base nas DIC submetidas pelas respetivas fornecedoras de combustíveis (questionar os atos de liquidação da CSR que pudessem ter alguma ligação com os ditos atos de repercussão), conclui-se que a Requerida terá de ser absolvida da instância, ficando prejudicados todos os passos seguintes no iter cognoscitivo acima delineado.

 

  1. Não se opinando sobre o mérito, fica igualmente prejudicado o conhecimento dos pedidos de reembolso do imposto (CSR), bem como o pedido de pagamento de juros indemnizatórios.

 

 

  1.  DECISÃO

 

Termos em que, com os fundamentos de facto e de direito que supra ficaram expostos, decide o Tribunal Arbitral Coletivo decide:

 

  1. Considerar o presente Tribunal Arbitral incompetente para se pronunciar sobre o pedido de declaração de declaração da ilegalidade dos atos de repercussão da CSR consubstanciados nas faturas referentes ao gasóleo rodoviário adquirido pela Requerente no decurso do período compreendido entre 4 de julho de 2019 e 31 de dezembro de 2022;
  2. Considerar o Tribunal Arbitral competente para apreciar o pedido de declaração de ilegalidade das correspondentes liquidações de CSR praticadas pela Requerida, com base nas DIC submetidas pelas respetivas fornecedoras de combustíveis;
  3. Considerar a Requerente parte ilegítima para suscitar a declaração de ilegalidade das correspondentes liquidações de CSR praticadas pela Requerida, com base nas DIC submetidas pelas respetivas fornecedoras de combustíveis;
  4. Em consequência, absolver a Requerida da instância, condenando a Requerente nas custas, nos termos abaixo fixados.

 

 

  1. VALOR DO PROCESSO

 

            Fixa-se ao processo o valor de € 106.117,13 (cento e seis mil cento e dezassete euros e treze cêntimos), de acordo com o disposto no artigo 32.º do CPTA e no artigo 97.º- A, n.º 1, alínea a) do CPPT, aplicáveis por força do que se dispõe no artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e no artigo 3.º, n.º 2 do RCPAT.

 

 

 

 

 

  1.     CUSTAS

 

            Custas no montante de 3.060,00 (três mil e sessenta euros), a cargo da Requerente, por ter sido total o seu decaimento, em conformidade com a Tabela I anexa ao RCPAT e com os artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4, do RJAT, 4.º, n.º 5 do RCPAT, e 527.º do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.

 

Notifique-se.

23 de setembro de 2024

 

 

Os Árbitros

 

(Fernando Araújo)

(Presidente)

(Estou de acordo com o sentido último da decisão, com a ressalva de que tenderia a apreciar a ineptidão do pedido antes da excepção de ilegitimidade, e entendo verificar-se ineptidão por ininteligibilidade do pedido, dado que, na ausência de uma repercussão formalizada, ao estilo do IVA – e não obstante a especificação de montantes (eventualmente) repercutidos ter chegado a ser prevista no art. 11.º, 1 da Lei n.º 5/2019, de 11 de Novembro, e no art. 9.º do Regulamento Relativo ao Regime de Cumprimento do Dever de Informação do Comercializador de Combustíveis Derivados do Petróleo e de GPL ao Consumidor, da ERSE, publicado no DR, II Série, de 20 de Fevereiro de 2020 –, não é possível identificar as liquidações de CSR às quais corresponderiam, a existir repercussão, as facturas dadas como prova, pelo que o acto impugnado não está satisfatoriamente identificado, em violação dos arts. 10º, 2, b) do RJAT, 108º do CPPT e 78º do CPTA. Isso acarretaria a consequência da nulidade de todo o processo, constituindo uma excepção dilatória de conhecimento oficioso, geradora da absolvição da instância, nos termos dos arts. 193º, 1, 493º, 1 e 2, 494º, b) e 495º do CPC).

 

 

 

(Hélder Faustino)

 

 

 

(Rui Miguel Zeferino Ferreira)

(Relator)