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SUMÁRIO:
Estão verificados os pressupostos para a inutilidade superveniente da lide se, após a constituição do Tribunal Arbitral, a Requerente obtém a satisfação integral do seu pedido
DECISÃO ARBITRAL[1]
O Árbitro Ana Teixeira de Sousa, designada pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formar o Tribunal Arbitral Singular, constituído em 26-01-2024, decide o seguinte:
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RELATÓRIO
É Requerente A..., com o NIF ..., de ora em diante designado por Requerente.
O Requerente apresentou um pedido de constituição do tribunal arbitral, no CAAD, ao qual foi atribuído o número de processo 804/2023-T.
O pedido apresentado no CAAD tem por objeto o acto de indeferimento do procedimento de
Reclamação Graciosa (RG) n.º ...2021..., apresentada contra a liquidação de IRS n.º.
2021..., relativa ao ano de 2017, com valor total de IRS a pagar no valor de € 4.232,94. tendo procedido ao pagamento integral da mesma, em plano prestacional.
É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira.
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O Requerente A..., com o NIF ... apresentou pedido de pronúncia arbitral e de constituição de Tribunal Arbitral, no dia 09-11-2023, ao abrigo do disposto no artigo 2, nº 1, alínea a) e do disposto no artigo 10º do Decreto-lei nº 10/2011, de 20 Janeiro [Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT)], em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por “Requerida”).
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O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD em 13-11-2023 e notificado, na mesma data, à Requerida.
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Dado que o Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, foi a signatária designada como árbitro pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, ao abrigo do disposto no artigo 6º, nº 1 do RJAT, tendo a nomeação sido aceite, no prazo e termos legalmente previstos.
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Na mesma data, foram as Partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos do disposto no artigo 11º nº 1 alíneas a) e b) do RJAT e nos artigos 6º e 7º do Código Deontológico.
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Em 26-01-2024, em conformidade com o preceituado na alínea c) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído, tendo sido proferido despacho arbitral em 12-02-2024, no sentido de notificar a Requerida para, nos termos do disposto no artigo 17º, nº 1 do RJAT, apresentar Resposta, no prazo máximo de 30 dias e, caso quisesse, solicitar a produção de prova adicional.
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Adicionalmente, foi ainda referido naquele despacho arbitral que a Requerida deveria remeter ao Tribunal Arbitral, dentro do prazo da Resposta, cópia do processo administrativo.
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A Requerida remeteu a resposta e o PA em 14-03-2024.
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Em 28-05-2024 a Requerida apresentou requerimento no sentido de informar o Tribunal que “(…) 1. Por decisão proferida pela Subdiretora geral da Autoridade Tributária e Aduaneira em 12 de maio de 2024 (em anexo), foi revogado o ato objeto do pedido arbitral. 2. Por conseguinte, deixou de existir na ordem jurídica o ato em dissídio. 3. Pelo que, se requere a inutilidade superveniente da lide.
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Em 18-07-2024 o Tribunal determinou que o Requerente fosse notificado para se pronunciar nos seguintes termos: “ (…) No Despacho que anexa a AT determina que o acto de liquidação de IRS n.º. 2021..., do ano de 2017, no valor de € 4.232,94, deve ser objecto de revogação. Igualmente declara que estão verificados os pressupostos que determinam o pagamento de juros indemnizatórios ao Requerente, ao abrigo da lei. Nestes termos solicita-se a notificação ao Requerente para que, no prazo máximo de 5 dias, se pronuncie sobre o requerimento da AT.”
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O Requerente, em requerimento apresentado em 22-07-2024, veio informar que considera satisfatória a decisão da AT de revogação do acto de liquidação de IRS aguardando o reembolso do valor de IRS de € 4.232,94.
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Em 24-07-2024 o Tribunal procedeu à prorrogação do prazo para a prolação da decisão ao abrigo do nº 2 do artigo 21º do RJAT.
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A taxa subsequente de arbitragem foi paga pelo Requerente.
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CAUSA DE PEDIR
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Nos termos do Despacho da AT de 12-05-2024 o SP, ora Requerente, vem insurgir-se contra a nota de cobrança nº. 2021..., no valor de € 4.232,94, uma vez que é residente no Reino Unido, conforme foi comprovado na RG nº. ...2018..., relativa ao ano de 2016 e à liquidação nº. 2017...;
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Na referida RG consta que: «(…) compete ao Serviço de Finanças de Lisboa ..., averbar no cadastro a produção de efeitos da alteração de morada efetuada em 21/02/2018, à data de 01/11/2015 e levantar auto de notícia, devendo fazer-se comunicação interna para esse efeito.»;
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A alteração de morada à data de 2015/11/01 nunca foi efectuada, o que resultou em nova nota de cobrança relativa ao ano de 2017;
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Como durante o ano de 2017 continuou a ser residente fiscal no Reino Unido, apresentou nova RG (nº. ...2021...) e juntou uma “carta de confirmação de residência” actualizada e emitida pelos serviços fiscais britânicos, respeitante ao ano fiscal de 2017;
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Tendo-lhe sido comunicado que, tal documento, que havia sido aceite aquando da RG nº. ...2018..., não comprovava o estatuto de residente fiscal no Reino Unido e que deveria apresentar um “certificado de residência”;
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Assim, efectuou novo pedido junto dos serviços fiscais britânicos, tendo recebido novamente uma “carta de confirmação de residência”;
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Tendo contactado directamente aqueles serviços, foi-lhe explicado que o “certificado de residência” é emitido apenas nos casos em que o contribuinte tenha rendimentos fora do Reino Unido – não sendo esse o seu caso –, pelo que o único documento que poderiam emitir era a “carta de confirmação de residência”, que anexou à RG, tendo a mesma sido indeferida;
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Efectuou atempadamente o pagamento da nota de cobrança impugnada no montante de € 4.232,94;
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Peticiona o ressarcimento do valor pago.
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RESPOSTA DA REQUERIDA
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Na Resposta que apresentou ao Tribunal a Requerida considera que a PPA deve ser julgada improcedente com diversos fundamentos.
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Alega a exceção dilatória de conhecimento oficioso, por falta de patrocínio por advogado, que determina a absolvição da instância, nos termos das disposições dos artigos 578.º, 577.º, alínea h) e 576.º, n.º 2 do CPC, aplicáveis por remissão da norma do artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT;
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Caso assim não se entenda,
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Deve ser julgada procedente a exceção de intempestividade da prática do ato processual anteriormente denominada caducidade do direito de ação, exceção dilatória nos termos previstos na alínea k) do n.º 4 do art.º 89 do CPTA, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea c), do CPPT e al. c) do n.º 1 do art. 29.º do RJAT;
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Efectivamente, tendo o prazo de noventa dias para a apresentação do PPA se esgotado no dia 03.07.2022 e, tendo o PPA apenas sido apresentado dia 09.11.2023, tem de se concluir por verificada a exceção de intempestividade da prática do ato processual;
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Ou caso assim não se entenda,
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Deve ser julgado improcedente o presente pedido de pronúncia arbitral, mantendo-se na ordem jurídica o ato tributário de liquidação (nota de cobrança n.º 2021...) e absolvendo-se, em conformidade, a entidade requerida do pedido;
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Efectivamente, nos termos do n.º 1 do artigo 74.º da LGT, é sobre o Requerente que recai o ónus de provar a sua condição de não residente em Portugal / residente no Reino Unido no ano de 2017, uma vez que foi ele que a invocou contrariando o seu cadastro fiscal à data;
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Sendo que tal prova deveria ter sido efetuada mediante a apresentação e um certificado de residência fiscal emitido pelas autoridades fiscais inglesas, como aliás já lhe tinha sido indicado em sede de reclamação graciosa;
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A entidade competente para as questões referentes à residência alegadamente no estrangeiro é a Direção de Serviços de Relações Internacionais (DSRI);
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Pelo que, consultada esta Entidade informou que o documento “letter of confirmation of residence” não serve para efeitos de prova do estatuto de residência para efeitos fiscais;
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De acordo quer com os documentos juntos pelo Requerente, quer com os documentos que constituem o processo administrativo, que se junta, constatou-se que os mesmos não atestavam a residência fiscal do Requerente no Reino Unido, nem a sua sujeição plena a imposto naquela jurisdição, para o efeito deveria ter sido exibido um certificado de residência fiscal emitido nos termos do artigo 4.º da CDT Portugal-Reino Unido;
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A liquidação oficiosa em causa teve por base a informação proveniente da troca automática de informação, que tem origem na Diretiva 2011/16/EU do Conselho de 15 de fevereiro de 2011 (DACC1), relativa à cooperação administrativa no domínio da fiscalidade, transposta para a ordem jurídica nacional através do Decreto-Lei 61/2013 de 10 de maio, o qual estabelece a obrigação dos Estados –Membros comunicarem às autoridades competentes de outros Estados-Membros, mediante troca automática, as informações disponíveis relativas a residentes nesses ou noutros Estados, no que se refere a determinados tipos de rendimentos, designadamente rendimentos de trabalho dependente;
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Pelo que, constando o Requerente como residente no registo de contribuintes e atendendo ao valor probatório das informações prestadas pelas administrações tributárias estrangeiras ao abrigo de convenções internacionais de assistência mútua a que o Estado Português esteja vinculado (artigo 76.º n.º 4 da LGT), tinha a AT legitimidade para proceder à liquidação do imposto sore aqueles rendimentos, face ao disposto no artigo 16.º n.º 1 do CIRS;
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A Requerida, após o prazo de Resposta, em 28-05-2024, apresentou requerimento no sentido de informar o Tribunal de que o acto de liquidação em crise foi revogado por despacho da Subdiretora-geral, datado de 12-05-2024.
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A Requerida considera que deixou de existir na ordem jurídica o ato em dissídio pelo que requere a inutilidade superveniente da lide.
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No despacho de revogação do acto de liquidação em crise a Requerida vem fundamentar o processo de revogação com base nos seguintes argumentos:
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Nos termos das instruções internas da AT, respeitantes à alteração de morada, com retroactividade, de residente para não residente, quando estejam em causa países com os quais Portugal tenha celebrado Convenção para Evitar a Dupla Tributação (CDT), será necessária a apresentação de um Certificado de Residência Fiscal (CRF) emitido pela respectiva AF (no caso, pela AF UK -‘HMRC’), para os anos que estiverem em causa, para efeitos de aplicação da respectiva CDT em causa.
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O Requerente não apresentou essa prova, não comprovando que o Reino Unido o tivesse considerado como seu residente fiscal no ano de 2017 e a AF UK comunicou à AT os rendimentos que o Requerente obteve nesse Estado, naquele período (e também nos anos de 2016, 2018 e 2019), o que pressupõe, desde logo, que essa jurisdição o considerou como residente fiscal em Portugal.
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Pese embora a falta dessa aprova, deverá ter-se em atenção que o Requerente contactou novamente a AF UK, que o informou que a emissão de CRF está dependente do facto de o contribuinte ter rendimentos no estrangeiro, não sendo esse o seu caso. Assim, o único documento que lhe enviaram foi a ‘letter of confirmation of residence’.
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Sendo do conhecimento da DSRI que o Reino Unido apenas emite CRF quando o SP obtém rendimentos fora desse Estado, não é, possível ao contribuinte apresentar tal prova, encontrando-se, assim, esgotados os meios internos para a obtenção da prova que lhe é exigida,
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Mostrando-se imprescindível esclarecer se essa jurisdição considerou, ou não, o Requerente como seu residente fiscal nos termos do artigo 4º da CDT celebrada entre Portugal e o Reino Unido, nos anos de 2015, 2016, 2017 e 2018.
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Deste modo, por despacho do Sr. Director da DSRI de 2024/02/27, foi determinado o recurso ao mecanismo de troca de informações com aquele Estado, o abrigo do disposto no artigo 25º da CDT Portugal-Reino Unido.
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Em 2024/04/12, foi recepcionada a resposta ao pedido de troca de informações formulado pela DSRI, nos termos do qual foi referido que :«Tanto quanto é do conhecimento do HM Revenue & Customs, o Sr. A... é considerado residente no Reino Unido para efeitos do artigo 4.º da convenção entre Portugal e o Reino Unido relativamente aos anos de 2015, 2016, 2017 e 2018. Não se sabe o que motivou a comunicação a Portugal dos rendimentos obtidos pelo Sr. A... relativamente ao ano de 2017. A informação que vos foi enviada, foi enviada automaticamente no âmbito do DAC1».
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Deste modo, face à resposta da AF UK, terá de concluir-se que se está perante um caso de dupla residência fiscal: no ano de 2017 (e também nos anos de 2015 e 2016): o Requerente é considerado como residente em Portugal e, do mesmo modo, é considerado como residente no Reino Unido, ao abrigo do direito interno deste Estado.
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Nestas situações de conflito positivo de residência, o nº. 2 do artigo 4.º da CDT Portugal –Reino Unido, estabelece regras de ‘desempate’, as quais se encontram numa relação de subsidiariedade, ou seja, apenas se aplica o critério seguinte quando o anterior não seja apto a resolver a dupla residência.
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Começando pelo critério da habitação permanente previsto na 1ª parte da alínea a) do n.º 2 do artigo 4º da mencionada CDT, resulta do supra exposto que o contribuinte dispunha de habitação permanente em ambos os Estados.
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Assim, encontrando-se provada a habitação permanente em ambos os Estados, será necessário recorrer à aplicação do segundo critério de desempate: o centro de interesses vitais.
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E, para a aplicação deste critério ao caso em apreço, é fundamental sopesar duas situações: por um lado, no ano de 2017 não existem registos de rendimentos pagos ao contribuinte e declarados por entidades com sede em território nacional; por outro, da consulta ao SITI constata-se que a entidade pagadora dos seus rendimentos de fonte britânica é a ‘B... LTD’.
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Ou seja, os elementos disponíveis, permitem concluir, com algum grau de certeza, que o centro de interesses vitais do Requerente situava-se naquele Estado, onde trabalhava e tinha a sua vida organizada.
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Pelo que, deverá considerar-se que o Requerente logrou provar a sua pretensão: a alteração de morada efectuada em 2018/02/21, deverá retroagir à data de 2015/11/01, porquanto foi residente fiscal no Reino Unido desde esta data.
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Devendo, em consequência, a AT proceder à revogação da liquidação controvertida (nº. 2021...) que o considerou como residente em Portugal, tributando os rendimentos que auferiu no Reino Unido.
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Por último, de referir ainda que, embora a tributação do contribuinte tenha sido originada em virtude de um erro por parte da AF UK, tal erro deverá considerar-se como imputável à AT, para efeitos de aplicação do nº. 1, do artigo 43º da Lei Geral Tributária (LGT), já que o organismo que recebe informação sobre rendimentos obtidos no estrangeiro por pessoas consideradas fiscalmente residentes em Portugal é a AT, devendo entender-se que será esta que, ao aceitar os dados comunicados por outra AF e proceder à consequente liquidação em consonância com os mesmos, terá de assumir eventuais erros decorrentes de uma informação incorrecta por parte de outra jurisdição.
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Encontrando-se, assim, verificados os pressupostos que determinam o pagamento de juros indemnizatórios ao Requerente, ao abrigo da citada disposição legal.
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SANEADOR
4.1. O Tribunal encontra-se regularmente constituído, nos termos do artigo 2º, nº 1, alínea a), artigos 5º e 6º, todos do RJAT e é competente quanto à apreciação do pedido de pronúncia arbitral formulado pelo Requerente.
4.2. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária, são legítimas quanto ao pedido de pronúncia arbitral e estão devidamente representadas, nos termos do disposto nos artigos 4º e 10º do RJAT e do artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março.
4.3. O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo uma vez que foi apresentado no prazo previsto na alínea a) do nº 1 do artigo 10º do RJAT.
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A Requerida informou o Tribunal, no prazo da Resposta, de que “(…) por despacho da Subdiretora-geral de 2024-01-19, foi revogado o ato impugnado nos presentes autos (…)”.
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Neste âmbito, configurando a revogação do acto tributário uma excepção (da inutilidade superveniente da lide), a sua análise será efectuada, preliminarmente, no Capítulo 6. Matéria de Direito.
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Não foram suscitadas quaisquer outras excepções de que cumpra conhecer nem se verificam nulidades.
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MATÉRIA DE FACTO
5.1. Preliminarmente, e no que diz respeito à matéria de facto, importa salientar que o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas Partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da matéria não provada [cfr. artigo 123º, nº 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e artigo 607º, nºs 3 e 4, do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi artigo 29º, nº 1, alíneas a) e), do RJAT].
5.2. Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito.
Factos provados
5.3. Com relevo para a decisão da causa consideram-se provados os seguintes factos:
a) Em 26-01-2024, em conformidade com o preceituado na alínea c) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído.
b) A Requerida remeteu a resposta e o PA em 14-03-2024.
c) Em 28-05-2024 a Requerida apresentou requerimento no sentido de informar o Tribunal que “(…) 1. Por decisão proferida pela Subdiretora geral da Autoridade Tributária e Aduaneira em 12 de maio de 2024 (em anexo), foi revogado o ato objeto do pedido arbitral. 2. Por conseguinte, deixou de existir na ordem jurídica o ato em dissídio. 3. Pelo que, se requere a inutilidade superveniente da lide.
d) No Despacho que anexa, a AT determina que o acto de liquidação de IRS n.º. 2021..., do ano de 2017, no valor de € 4.232,94, deve ser objecto de revogação. Igualmente declara que estão verificados os pressupostos que determinam o pagamento de juros indemnizatórios ao Requerente, ao abrigo da lei.
e) Na Informação que sustenta o Despacho de revogação a AT reconhece: (……) 24. Pelo que, deverá considerar-se que o Requerente logrou provar a sua pretensão: a alteração
de morada efectuada em 2018/02/21, deverá retroagir à data de 2015/11/01, porquanto foi residente fiscal no Reino Unido desde esta data.
25. Devendo, em consequência, a AT proceder à revogação da liquidação controvertida (nº. 2021...) que o considerou como residente em Portugal, tributando os rendimentos que auferiu no Reino Unido.
26. Por último, de referir ainda que, embora a tributação do contribuinte tenha sido originada em virtude de um erro por parte da AF UK, tal erro deverá considerar-se como imputável à AT, para efeitos de aplicação do nº. 1, do artigo 43º da Lei Geral Tributária (LGT), já que o organismo que recebe informação sobre rendimentos obtidos no estrangeiro por pessoas consideradas fiscalmente residentes em Portugal é a AT, devendo entender-se que será esta que, ao aceitar os dados comunicados por outra AF e proceder à consequente liquidação em consonância com os mesmos, terá de assumir eventuais erros decorrentes de uma informação incorrecta por parte de outra jurisdição.
Informação
27. Encontrando-se, assim, verificados os pressupostos que determinam o pagamento de juros indemnizatórios ao Requerente, ao abrigo da citada disposição legal.
Conclusão
Após apreciação do pedido de pronúncia arbitral e tendo em conta todo o exposto,
afigura-se-nos que o acto de liquidação de IRS n.º. 2021..., do ano de 2017, no valor de € 4.232,94, deverá ser objecto de revogação.”
e) O Requerente procedeu ao pagamento integral da nota de cobrança, em plano prestacional (liquidação a que respeita a referida nota de cobrança, vide informação da DF de Setúbal de 18 de outubro de 2023).
f) O Requerente, em requerimento apresentado em 22-07-2024, veio informar que considera satisfatória a decisão da AT de revogação do acto de liquidação de IRS aguardando o reembolso do valor de IRS de € 4.232,94.
Motivação quanto à matéria de facto
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No tocante à matéria de facto provada, a convicção do Tribunal Arbitral fundou-se, para além da livre apreciação das posições assumidas pelas Partes, no teor dos documentos juntos aos autos pelo Requerente e pela Requerida.
Dos factos não provados
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Não se verificaram quaisquer factos como não provados com relevância para a decisão arbitral.
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MATÉRIA DE DIREITO
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No caso, o objecto principal do processo, em conformidade com o pedido arbitral apresentado, respeita ao pedido de anulação da liquidação de IRS n.º 2021..., referente ao ano de 2017, com valor total de IRS a pagar no valor de € 4.232,94, tendo o Requerente procedido ao pagamento integral da mesma, em plano prestacional.
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No pedido é referido que no ano de 2017, o Requerente considerou que a sua residência fiscal se situou no Reino Unido, e nesta medida, não tem de pagar qualquer imposto referente ao ano de 2017, uma vez que se considera um Não Residente naquele ano fiscal.
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Peticionando o reembolso do IRS pago relativo ao ano de 2017.
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Contudo, tendo em consideração o requerimento da Requerida, de 28-05-2024 no sentido de informar o Tribunal que “(…) 1. Por decisão proferida pela Subdiretora geral da Autoridade Tributária e Aduaneira em 12 de maio de 2024 (em anexo), foi revogado o ato objeto do pedido arbitral. 2. Por conseguinte, deixou de existir na ordem jurídica o ato em dissídio. 3. Pelo que, se requere a inutilidade superveniente da lide.
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E no Despacho que anexa a AT determina que o acto de liquidação de IRS n.º. 2021..., do ano de 2017, no valor de € 4.232,94, deve ser objecto de revogação. Igualmente declara que estão verificados os pressupostos que determinam o pagamento de juros indemnizatórios ao Requerente, ao abrigo da lei.
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Assim, tendo sido invocada a excepção da inutilidade superveniente da lide cumpre analisar e decidir preliminarmente.
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Da análise da documentação anexada aos autos, pela Requerida, o Tribunal Arbitral obteve evidência de que a liquidação de IRS objecto do pedido de pronúncia arbitral foi revogada por despacho datado de 12-05-2024 originando uma inutilidade superveniente da lide.
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Como resulta dos factos provados, com a revogação da liquidação impugnada nos autos, a pretensão impugnatória de anulação da liquidação de imposto, no montante de EUR 4.232,94, apresentada pelo Requerente ficou satisfeita, pelo que se torna inútil o prosseguimento da presente lide quanto ao pedido, na medida em que do seu prosseguimento não resultará qualquer efeito sobre a relação jurídica material controvertida.
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Com efeito, verifica-se a inutilidade superveniente da lide quando, por facto ocorrido na pendência da causa, a solução do litígio deixe de ter interesse e utilidade, o que justifica a extinção da instância (cfr. artigo 277º, al. e), do Código de Processo Civil).[2]
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Nestes termos, este Tribunal Arbitral entende verificar-se a inutilidade superveniente da lide no que diz respeito ao pedido de anulação do acto tributário identificado, o que implica a extinção da instância nos termos do disposto no artigo 277º, alínea e) do CPC (aplicável ex vi artigo 29º, nº 1, alínea e) do RJAT) quanto àquela pretensão.
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DECISÃO
Nestes termos, tendo em consideração as conclusões apresentadas no Capítulo anterior, decidiu este Tribunal Arbitral Singular:
a) Julgar extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos do art. 277º do Código do Processo Civil, aplicável ex vi art. 29º, nº 1, alínea e) do RJAT;
b) Condenar a Requerida no pagamento integral das custas do presente processo.
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VALOR DO PROCESSO
Tendo em consideração o acima exposto nesta decisão, bem como o disposto nos artigos 306º, nº 2 do CPC, artigo 97º-A, nº 1 do CPPT e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor do processo em EUR 4.232,94 (quatro mil, duzentos e trinta e dois euros e noventa e quatro cêntimos)..
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VALOR DAS CUSTAS
Nos termos do disposto na Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor das custas do Processo Arbitral em EUR 612,00, a cargo da Requerida, de acordo com o artigo 22º, nº 4 do RJAT.
Notifique-se.
Lisboa, 23 de Setembro de 2024
O Árbitro
(Ana Teixeira de Sousa)
[1] A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990, excepto transcrições efectuadas.
[2] Quanto a esta temática, pronunciou-se o Supremo Tribunal Administrativo, em 30-07-2014, em Acórdão proferido no âmbito do processo nº 0875/14, nos termos do qual se refere que “a inutilidade superveniente da lide (que constitui causa de extinção da instância - al. e) do art. 277º do CPC) verifica-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a solução do litígio deixe de interessar, por o resultado que a parte visava obter ter sido atingido por outro meio”.
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