SUMÁRIO: I - A Contribuição de Serviço Rodoviário (CSR) reveste a natureza de imposto, sendo o tribunal arbitral materialmente competente para apreciar a legalidade dos respectivos actos de liquidação. II - A Requerente não é sujeito passivo da CSR ou repercutido legal da mesma. A repercussão económica da CSR não é imposta ou sequer pressuposta quer no seu regime regulador, quer por via do Código dos IECs para o qual remetem as respectivas normas de liquidação e pagamento. III - A legitimidade processual assente na existência de um interesse legalmente tutelado, impõe a coexistência da prova da repercussão económica a montante pelo adquirente e da não repercussão económica, por este, no preço dos bens e serviços por si fornecidos.
DECISÃO ARBITRAL
A..., LDA, com o número de identificação fiscal ... e sede social na Rua ..., ..., ..., ...-... Alcabideche, (doravante designado por “Requerente”), solicitou a constituição de Tribunal Arbitral e deduziu pedido de pronúncia arbitral, nos termos do disposto no artigo 2.º, n.º 1, alínea a) e no artigo 10.º, ambos do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”).
I. Relatório
O pedido formulado pela Requerente consiste na declaração de ilegalidade e consequente anulação da decisão tácita de indeferimento do pedido de revisão oficiosa dos actos de liquidação do Imposto Especial de Consumo (IEC), na parcela referente à Contribuição de Serviço Rodoviário, dos períodos de Agosto de 2019 a Dezembro de 2022, no valor de € 5.874,19.
É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante referida por “AT” ou “Requerida”).
O Tribunal Arbitral Singular ficou constituído em 19 de Junho de 2024.
Na sua resposta e envio do processo administrativo em 26 de Junho de 2024, a Requerida apresentou defesa por impugnação e por excepção. Em 8 de Julho a Requerente pronunciou-se sobre a matéria de excepção suscitada pela Requerida.
Por despacho deste Tribunal foi dispensada a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT, bem como a apresentação de alegações.
Posição da Requerente
No pedido de pronúncia arbitral a Requerente alega que:
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Em 4 de Setembro de 2023 apresentou um pedido de revisão oficiosa, em que peticionou a anulação dos actos de liquidação da CSR referente ao período de Agosto de 2019 a Dezembro de 2022. A AT não se pronunciou sobre o pedido no prazo legal estabelecido para o efeito, tendo-se formado indeferimento tácito;
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A CSR foi liquidada pelo sujeito passivo e, posteriormente, repercutido à Requerente;
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Pese embora a Requerente, enquanto repercutido legal, não se apresente como sujeito passivo, a mesma dispõe de legitimidade para recorrer à via administrativa ou judicial de modo a sindicar os actos tributários que conduziram à repercussão;
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O n.º 1 do artigo 9.º do Código de Processo e de Procedimento Tributário (CPPT) dispõe que “têm legitimidade no procedimento tributário, além da administração tributária, os contribuintes, incluindo substitutos e responsáveis, outros obrigados tributários, as partes dos contratos fiscais e quaisquer outras pessoas que provem interesse legítimo protegido”.
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A CSR, criada pela Lei 55/2007, de 31 de Agosto, visava financiar a rede rodoviária nacional a cargo da EP - Estradas de Portugal E.P.E., constituindo uma contrapartida pela utilização da rede rodoviária nacional, tal como esta é verificada pelo consumo de combustíveis. A CSR incide sobre o gás de petróleo liquefeito e as gasolinas e gasóleos rodoviários;
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A CSR é suportada, a final, pelo consumidor do combustível, sendo este, portanto, o efectivo contribuinte da CSR;
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O n.º 4 do artigo 18.º da Lei Geral Tributária (LGT) determina que o repercutido é titular de um interesse legalmente protegido, pelo que, nos termos do referido artigo 9.º do CPPT, o mesmo terá o direito de agir em processo. A CSR era, de facto, repercutida nos consumidores de produtos petrolíferos e, consequentemente, estes (como é o caso da Requerente) têm legitimidade para o presente pedido;
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A Requerente é uma sociedade comercial cujo objecto social corresponde, entre outros, na exploração da indústria de transporte de mercadorias e veículos automóveis em regime de aluguer. No período de Agosto de 2019 a Dezembro de 2022 a Requerente abasteceu as suas viaturas com gasóleo rodoviário, tendo suportado a título de CSR a importância total de € 5.874,19. Este valor corresponde à aplicação da taxa de 111 € por m3 sobre as quantidades de combustível adquirido a fornecedores;
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Os fornecedores são a «B..., LDA» (NIPC...), a «C..., LDA» (NIPC...) e a «D..., SA» (NIPC...);
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Não obstante a CSR ser suportada, em primeira linha, pelo sujeito passivo, certo é que a mesma era repercurtida no consumidor final. Porquanto cabia aos utilizadores da rede rodoviária arcar com os custos da CSR;
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A CSR configura um verdadeiro imposto, afrontando o Direito da União Europeia. Nessa medida, os actos de liquidação da CSR, de que resultou um custo suportado pela Requerente, carecem de anulação por manifesto erro imputável à AT;
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A revisão dos actos tributários pode ser solicitada no prazo de quatro anos e com fundamento em erro imputável aos serviços, na medida em que liquidação da CSR é sempre uma responsabilidade da AT. A vinculação ao princípio da legalidade impõe à AT o dever de correcção de um acto ilegal;
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Decidiu o Supremo Tribunal Administrativo (STA) que “o erro imputável aos serviços a que alude o artigo 78.º n.º 1 in fine da LGT compreende não só o lapso, o erro material ou o erro de facto, como, também, o erro de direito, e essa imputabilidade aos serviços é independente da demonstração de culpa dos funcionários envolvidos na emissão da liquidação afectada pelo erro” (Processo n.º 01007/11 de 14 de Março de 2011);
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Os actos de liquidação da CSR e o acto de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa assentam em erro imputável aos serviços, por desconformidade com o Direito da União Europeia;
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No Processo C-460/21, de 7 de Fevereiro de 2022, o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) decidiu que a CSR não prossegue “motivos específicos”, dado que “(…) as receitas ficam genericamente afectadas a uma empresa pública concessionária da rede rodoviária nacional e cuja estrutura não atesta a intenção de desmotivar o consumo dos principais combustíveis rodoviários”;
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Devido ao manifesto erro imputável aos serviços, a Requerente foi forçada a suportar um custo, uma vez que a CSR procurou onerar o consumidor final. Assim se verificando uma repercussão legal do imposto.
Posição da Requerida
A Requerida apresentou contestação, tendo alegado diversas excepções:
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Primeiro, a AT está vinculada à jurisdição dos Tribunais arbitrais nos termos da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, sendo o objecto dessa vincuçação definido pelo artigo 2.º: “(…) que tenham por objecto a apreciação das pretensões relativas a impostos (…)”. No caso em apreço está em causa a apreciação da legalidade da CSR e respetivas liquidações, pelo que tratando-se de uma contribuição e não de um imposto, as matérias sobre a CSR estão excluídas da arbitragem tributária, por ausência de enquadramento legal;
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Ainda que fosse de admitir a competência material dos tribunais arbitrais, os actos de repercussão de CSR não estão contemplados na única potencial norma atributiva de competência a este Tribunal: a da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT: "A declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta";
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Ao tribunal arbitral está vedado pronunciar-se sobre actos de repercussão da CSR, subsequentes e autónomos da sua liquidação. In casu, a repercussão não constitui um acto tributário, sendo que esta não constitui uma repercussão legal, mas antes uma repercussão meramente económica ou de facto;
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Segundo, estamos perante um imposto monofásico em que, nos termos do n.º 1 do artigo 5.º da Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, que criou a CSR, as matérias de liquidação, cobrança e pagamento da CSR, se regem pelo disposto no Código dos IEC. Apenas os sujeitos passivos que tenham procedido à introdução no consumo de produtos em território nacional e provem o pagamento dos respetivos ISP/CSR possuem legitimidade para solicitar o reembolso do valor pago. As liquidações de imposto são emitidas tendo como sujeito apenas estas entidades, estando-lhes, nos termos do Código dos IEC, reservado o direito de identificar tais actos de liquidação e solicitar, em caso de erro, a sua revisão, com vista ao reembolso dos montantes cobrados;
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Os múltiplos adquirentes dos produtos não têm legitimidade para efeitos de solicitação da revisão do acto tributário e consequente pedido de reembolso do imposto. Não sendo a Requerente sujeito passivo nos termos e para o efeito do disposto no artigo 4.º do Código dos IEC, não dispõe de legitimidade para apresentar nem pedido de revisão oficiosa nem, consequentemente, o presente pedido arbitral;
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Não sendo a Requerente a entidade responsável pela introdução no consumo, também não existe qualquer outra via pela qual esta assumiria a qualidade de parte legítima, nem mesmo pela alínea a) do n.º 4 do artigo 18.º da LGT. No caso concreto, não está em causa uma situação de repercussão legal, dado que a repercussão da CSR tem uma natureza meramente económica ou de facto, perdendo a sua natureza de tributo aquando da eventual incorporação no preço de venda ao público pelo sujeito passivo (ao contrário do que se verifica para efeitos do Imposto sobre o Valor Acrescentado);
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A repercussão meramente económica da CSR depende da decisão dos sujeitos passivos, de, no âmbito das suas relações comerciais (ao abrigo do direito civil), procederem, ou não, à transferência parcial ou total da carga fiscal para outrem (os seus clientes), tendo em conta a política de definição dos preços de venda e as consequências para a sua actividade no que respeita ao impacto na procura. Com efeito, os revendedores podem ter um interesse económico em suportar, através da diminuição do preço, o custo adicional gerado pelo agravamento da CSR;
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Não existe no âmbito da CSR um acto tributário de repercussão legal e autónomo do(s) acto(s) de liquidação de ISP/CSR, sendo que as facturas não corporizam actos de repercussão de CSR, apenas titulando operações de compra e venda de combustíveis. Ou seja, a venda não origina, obrigatoriamente, uma repercussão dado que esta, conforme referido, está dependente da política de definição dos preços de venda pelo fornecedor;
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Entende-se, pois, que o legislador tenha restringido no artigo 18.º da LGT, sob a epígrafe “sujeitos”, apenas aos repercutidos legais. E que o artigo 9.º do CPPT, sob a epígrafe “legitimidade”, não contenha qualquer referência à repercussão ou interesse económico;
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Adicionalmente, seguindo o alegado pela Requerente, a mesma, enquanto sociedade comercial que desenvolve uma actividade com fins lucrativos, repassa, necessariamente, no preços dos serviços que presta, os gastos em que incorre, o que inclui as aquisições de combustível. Pelo que as entidades potencialmente lesadas com o encargo da CSR serão os consumidores finais de tais serviços;
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No caso, a Requerente não consegue demonstrar que o valor pago pelos combustíveis adquiridos aos seus fornecedores inclui o valor da CSR pago pelo sujeito passivo da mesma, nem sequer que suportou, a final, o encargo desse tributo, i. e. que não o repassou no preço dos serviços prestados aos seus clientes. Em conclusão, a Requerente não dispõe de legitimidade processual;
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Terceiro, o pedido de pronúncia arbitral é inepto, dado que as transacções económicas, que ocorrem após a introdução no consumo, não têm por base um acto de liquidação, o que impede a identificação concreta do acto tributário subjacente. A Requerente limita-se a juntar facturas de aquisição de combustível, sem sequer ser capaz de identificar o sujeito passivo da obrigação tributária subjacente;
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Não pode a AT suprir a falha relativa à identificação dos actos tributários, porquanto se revela impraticável estabelecer qualquer correspondência entre os actos de liquidação (que não foram identificados) praticados em relação aos sujeitos passivos de ISP/CSR (que igualmente se desconhecem) e o alegado pela Requerente;
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No caso dos combustíveis, apenas, o sujeito passivo que declarou os produtos para consumo e a quem foi liquidado o imposto e que efectuou o correspondente pagamento, reúne condições para identificar os actos de liquidação. Os revendedores identificados pela Requerente são meros intermediários na cadeia de abastecimento dos combustíveis, o que não permite identificar os sujeitos passivos nem os actos tributários por estes praticados;
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Acresce que as introduções no consumo assentam em quantidades apuradas a 15 graus centígrados. Todavia, as posteriores alienações entre os diversos operadores económicos realizam-se à temperatura observada, a qual não é conhecida. Pelo que, dependendo da temperatura, os valores facturados poderão ser inferiores ou (como será na maioria dos casos) superiores. Daqui decorrendo que, no limite, os litros vendidos e os correspondentes montantes de CSR que a Requerente alega ter suportado, serão, por isso, superiores às importâncias da CSR efectivamente liquidadas e pagas pelos sujeitos passivos dos IECs (considerando a temperatura a 15º centígrados);
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Sem a identificação dos actos de liquidação, não é possível sindicar a respetiva legalidade, pelo que nunca poderia o tribunal determinar a respetiva anulação total ou parcial;
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Quarto, o pedido é ininteligível e é manifesta a contradição entre o mesmo e a causa de pedir. A Requerente formula um pedido de anulação de liquidações de CSR que não identifica através da mera impugnação de alegadas repercussões e nem sequer indentica o nexo (que não existe) entre estas repercussões e aquelas liquidações;
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Fá-lo com base na ideia (errada) de existência de uma repercussão legal e dentro do princípio de que a repercussão económica pode ser inferida ou presumida;
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Quinto, a ausência dos actos tributários impede a aferição da tempestividade do pedido de revisão oficiosa, dado que a contagem do prazo se inicia a partir do termos do prazo de pagamento dos IECs, tendo por referência a data do acto de liquidação;
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A Requerente funda o seu pedido na prática de um erro imputável à AT. Sucede que esta, estando vinculada ao princípio da legalidade e tendo liquidado os IECs em estrita observância do normativo aplicável, não incorreu em qualquer erro de facto ou de Direito;
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O prazo para solicitar a devolução dos IECs está fixado em 3 anos (cfr. o n.º 3 do artigo 15.º do Código dos IECs), assim se constatando a caducidade do direito de acção.
Defendeu-se ainda por impugnação, alegando que:
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A Requerente não logra fazer prova do que alega, designadamente, que pagou e suportou integralmente o pagamento da CSR por repercussão. Exigir que seja a Requerida a provar a inexistência de repercussão (facto negativo) configuraria uma prova diabólica. A prova de pagamento do tributo não pode assentar em juízos meramente presuntivos;
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As facturas anexas não provam o alegado pela Requerente. Essas facturas não são os documentos originais e não contêm qualquer referência aos valores pagos a título de CSR. Acresce que não são apresentados elementos concretos, inclusive o quantum repercutido;
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A Requerente limita-se a aplicar as taxas da CSR às quantidades de litros alegadamente adquiridos, desconhecendo que a liquidação do tributo tem por base a conversão da temperatura observada à temperatura padrão de 15 º Celsius. Na ausência de certificação da temperatura no momento da aquisição dos combustíveis, não é possível efectuar a correspondência para 15º e, consequentemente, apurar o valor da CSR liquidada e eventualmente incluída no preço de venda dos combustíveis à Requerente.
A Requerente pronunciou-se pela improcedência das excepções invocadas pela Requerida
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Saneamento
O tribunal arbitral é competente e foi regularmente constituído.
O processo não enferma de nulidades e as Partes dispõem de personalidade e capacidade judiciárias.
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Matéria de facto
Com relevo para a decisão, consideram-se provados os seguintes factos:
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A Requerente desenvolve as actividades de exploração da indústria de transporte de mercadorias e veículos automóveis em regime de aluguer;
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No período de 1 de Agosto de 2019 a 31 de Dezembro de 2022, a Requerente adquiriu gasóleos rodoviários à «B..., LDA», «C..., LDA» e «D..., SA»;
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A «B..., LDA», «C..., LDA» e «D..., SA» operam como revendedores de combustível (no caso, gasóleo), que adquiriram a outros distribuidores ou revendedores (que não foram identificados no presente processo) e posteriormente revenderam à Requerente;
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As facturas que titulam as vendas à Requerente, e que foram por esta integralmente pagas, não contêm qualquer referência à CSR;
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O valor de € 5.874,19 corresponde à aplicação da taxa legal da CSR sobre as quantidades de gasóleo rodoviário adquirido pela Requerente;
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Dado que a liquidação dos IECs tem por base a temperatura de 15º Celsius e não se conhece a temperatura observada no momento da aquisição dos combustíveis pela Requerente, o referido valor de € 5.874,19 não corresponde ao exacto valor que terá sido liquidado pelo sujeito passivo da obrigação tributária;
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Em 4 de Setembro de 2023 a Requerente apresentou pedido de revisão oficiosa, no qual, alegando a qualidade de repercutido legal e económico da CSR, peticionou a anulação da correspondente liquidação de imposto;
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Na ausência de resposta dentro do prazo legal previsto para o efeito, o pedido de revisão oficiosa foi considerado como tacitamente indeferido. O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo.
Considera-se como não provado que:
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A Requerente é um consumidor final dos combustíveis adquiridos aos seus fornecedores, na medida em que tais produtos são utilizados no âmbito da sua actividade económica de exploração da indústria de transporte de mercadorias e veículos automóveis em regime de aluguer;
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Os três referidos fornecedores tenham actuado na qualidade de sujeito passivo de imposto da CSR, do ISP e do Adicionamento sobre as Emissões de CO2. Estas sociedades não constam da base de dados Europeia (SEED) de operadores económicos [https://ec.europa.eu/taxation_customs/dds2/seed/seed_consultation.jsp?Lang=pt] registados para efeito. Não possuem o estatuto de destinatário registado ou depositário autorizado, pelo que não se apresentam como sujeito passivo de IECs, não podendo ter sido responsáveis pela apresentação de declarações de introdução no consumo, sobre as quais foi liquidado e subsequentemente pago o ISP, a CSR e o Adicionamento sobre as Emissões de CO2;
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As facturas de aquisição de combustível permitam demonstrar que os sujeitos passivos de IECs (cuja identidade é desconhecida) liquidaram a CSR e repercutiram no correspondente valor aos intermediários do circuito económico;
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Os referidos fornecedores são os únicos intervenientes no referido circuito económico;
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A Requerente suportou efectiva e integralmente o montante da CSR liquidada e paga pelos sujeitos passivos dos IECs.
Primeiro, porque perante o desconhecimento da identidade dos sujeitos passivos e dos actos tributários por estes praticados, soçobra a prova da liquidação e pagamento do imposto no início do circuito económico e, como tal, não é possível demonstrar a repercussão económica desde esses sujeitos passivos até à Requerente.
Segundo, na medida em que a Requerente não identificou qualquer meio de prova apto a demonstrar que, contrariamente à lógica inerente à prossecução de uma actividade económica, o custo dos combustíveis adquiridos aos seus fornecedores (que incluiria a repercussão económica da CSR que lhes teria sido previamente repercutida por outros revendedores ou pelos sujeitos passivos da obrigação tributária), não foi tido em conta no preço e valor dos serviços prestados por aquela aos seus clientes (que poderão também eles ser operadores económicos ou consumidores finais).
Relativamente à fundamentação da matéria de facto supra, o tribunal não carece de se pronunciar sobre a totalidade dos factos alegados pelas partes, antes lhe cabendo o dever de recortar, de entre a matéria alegada, aquela que se afigura relevante para estabelecer os factos provados e não provados (n.º 2 do artigo 123.º do CPPT e do artigo 607.º do Código de Processo Civil).
A prova foi seleccionada pela correspondente relevância para a decisão arbitral e assentou no processo administrativo enviado pela Requerida e nos documentos apresentados pela Requerente.
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Matéria de direito
Tendo sido suscitadas diversas excepções, impõe-se o conhecimento prioritário das mesmas previamente à apreciação do mérito do pedido.
da ineptidão do pedido de pronúncia arbitral
A Requerida alega que o pedido padece do vício de ineptidão, por não estarem identificados os actos tributários controvertidos, imputando à Requerente a mera indicação de facturas de aquisição de combustíveis as quais não configuram actos tributários e de que não resulta a prova de actos de repercussão de CSR.
A alínea a) do n.º 1 do artigo 98.º, subsidiariamente aplicável por força do RJAT (alínea c) do n.º 1 do artigo 29.º) indica a ineptidão da petição inicial como nulidade insanável do processo judicial tributário, sem, contudo, esclarecer as situações que configuram essa ineptidão.
Subsidiariamente, deve aplicar-se o artigo 186.º do Código de Processo Civil (por força da alínea e) do artigo 2.º do CPPT e da alínea a) do n.º 1 do referido artigo 29.º do RJAT).
Improcede esta excepção, por não se verificar qualquer uma das faltas plasmadas no artigo 186.º do CPC: (i) quando seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir, (ii) se o pedido estiver em contradição com a causa de pedir ou (iii) quando se acumulem causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis.
Com efeito, a Requerente, partindo da (por si alegada) condição de repercutido da CSR previamente liquidada pelos respectivos sujeitos passivos, apresenta o pedido de anulação desses actos de liquidação, para o período de Agosto de 2019 a Dezembro de 2022, e fundamenta a causa de pedir na aquisição de combustíveis cuja introdução no consumo preenche a incidência objectivo daquele imposto.
Pese embora a Requerente não seja sujeito passivo da CSR, o n.º 4 do artigo 78.º da LGT admite que da repercussão de um imposto possa advir a necessidade de tutelar um interesse legalmente protegido e, por esse motivo, confere ao repercutido o direito de reacção, por via administrativa e judicial, contra essa repercussão.
Assim, nada obsta a que a Requerente apresente um pedido de revisão oficiosa e um pedido de pronúncia arbitral contra a repercussão da CSR, suportado nos únicos elementos que lhe é permitido conhecer (as facturas de aquisição de combustíveis). Impor-lhe o conhecimento dos actos tributários da CSR, a cuja liquidação e pagamento a mesma é alheia, corresponderia ao esvaziamento e inutilidade da tutela legal do direito que lhe assiste.
Reconhece-se a evidente dificuldade (senão mesmo impossibilidade) da Requerida em identificar os actos de liquidação, atenta a inexistência de quaisquer elementos sujetivos (identificação dos sujeitos passivos) e objectivos (liquidação e pagamento da CSR). Todavia, daqui não decorre que essa mesma onerosidade possa ser assacada à Requerente, sob pena de, como vimos, se inutilizar a tutela legal do seu direito à sindicância da legalidade dos actos tributários.
Acresce que a falta de identificação dos actos tributários não impediu o exercício do contraditório, no qual a Requerida manifestou a compreender o teor e alcance do pedido formulado pela Requerente. Assim se afastando a ininteligibilidade do pedido e da causa de pedir.
da incompetência material do tribunal arbitral
A CSR, instituída pela Lei n.º 55/2007, de 31 de Agosto, consistiu na autonomização de uma parcela do ISP, cujo valor foi consignado à «EP - Estradas de Portugal, SA» (o Decreto-Lei n.º 374/2007, de 7 de novembro, transformou a «Estradas de Portugal E.P.E.» na «EP - Estradas de Portugal, S.A.» e o Decreto-Lei nº 91/2015 de 29 de maio, operou a incorporação por fusão desta na « REFER, E.P.E.» que é transformada em sociedade anónima, passando a denominar-se «Infraestruturas de Portugal, S.A.»), tendo em vista a concepção, projecto, construção, conservação, exploração, requalificação e alargamento da rede rodoviária nacional. O artigo 3.º da referida Lei apresenta a CSR como a contrapartida pela utilização desse rede rodoviária, verificada a partir do consumo de combustíveis rodoviários (gasolinas, gasóleos e GPL de carburação). A CSR apoia-se no Código dos IECs e na figura do ISP, para efeitos de estabelecimento da incidência subjectiva e objectiva, a par das regras de liquidação e pagamento.
Para a qualificação da CSR como imposto, seguimos de perto a decisão arbitral n.º 304/2022-T, de 5 de Janeiro de 2023, cujo sentido e decisão subscrevemos.
«Baseando-nos em todas os anteriores contributos jurisprudenciais e doutrinários, mas sobretudo no último acórdão citado do STA, concluímos que não é o simples facto de um tributo ter, desde logo, a designação de “contribuição” (ac. TC n.º 539/2015) e nem o facto de esse tributo ter a respetiva receita consignada (ac. TC n.º 232/2022), que o qualifica automaticamente como “contribuição financeira”; antes é, para tal, necessário, como judicia o STA, que esse tributo tenha com finalidade compensar prestações administrativas realizadas de que o sujeito passivo seja presumidamente beneficiário.” Com efeito, o sistema tributário comporta tributos que têm a designação de “contribuições” e são verdadeiros impostos, como se extrai, desde logo, do n.º 3 do art.º 4.º da LGT. Por outro lado, o sistema tributário comporta igualmente impostos que, ao arrepio do princípio da não consignação da receita dos impostos (estabelecido no art.º 7.º da Lei de Enquadramento Orçamental), têm a sua receita consignada (vg. ac. TC n.º 369/99, de 16.06.1999, proc. 750/98). Por conseguinte, nem o nomen juris “contribuição”, nem a afetação da receita a uma finalidade específica são suficientes para qualificar um tributo como “contribuição financeira”. O elemento decisivo para essa qualificação é a existência de uma estrutura de comutatividade que se estabelece entre o ente beneficiário da receita e os sujeitos passivos do tributo. […] Ou seja, para que possamos afirmar estar-se perante uma “contribuição financeira”, é necessário que as prestações públicas que constituem a contrapartida coletiva do tributo beneficiem ou sejam causadas pelos respetivos sujeitos passivos. […] Entendemos, assim, que o que distingue uma “contribuição financeira” de um imposto de receita consignada é a necessária circunstância, de, na primeira, a atividade da entidade pública titular da receita tributária ter um vínculo direto e especial com os sujeitos passivos da contribuição. Tal vínculo pode consistir no benefício que os sujeitos passivos, em particular, retiram da atividade da entidade pública, ou pode consistir num nexo de causalidade entre a atividade dos sujeitos passivos e a necessidade da atividade administrativa da entidade pública. A Contribuição de Serviço Rodoviário não cabe em nenhuma destas hipóteses. Desde logo, a CSR não tem como pressuposto uma prestação, a favor de um grupo de sujeitos passivos, por parte de uma pessoa coletiva. A contribuição é estabelecida a favor da EP - Estradas de Portugal, E. P. E. (art. 3.º, n.º 2 da Lei n.º 55/2007), sendo essa mesma entidade a titular da receita correspondente (art.º 6.º). No entanto, os sujeitos passivos da contribuição (as empresas comercializadoras de produtos combustíveis rodoviários) não são os destinatários da atividade da EP - Estradas de Portugal, E. P. E., a qual consiste na “conceção, projeto, construção, conservação, exploração, requalificação e alargamento” da rede de estradas (art. 3.º, n.º 2 da Lei n.º 55/2007). Em segundo lugar, também não se encontra base legal alguma para afirmar que a responsabilidade pelo financiamento da tarefa administrativa em causa – que no caso será a “conceção, projeto, construção, conservação, exploração, requalificação e alargamento da rede de estradas” - é imputável aos sujeitos passivos da contribuição, que são as empresas comercializadoras de combustíveis rodoviários. Pelo contrário, o art.º 2.º da Lei n.º 55/2007 diz expressamente que o “financiamento da rede rodoviária nacional a cargo da EP - Estradas de Portugal, E.P. E., (...), é assegurado pelos respetivos utilizadores e, subsidiariamente, pelo Estado, nos termos da lei e do contrato de concessão aplicável.” Portanto, apesar de ser visível, de forma clara, o elemento de afetação da contribuição para financiar a atividade de uma entidade pública não territorial - a EP - Estradas de Portugal, E. P. E. - não é de modo algum evidente a existência, pelo contrário, afigura-se inexistir um “nexo de comutatividade coletiva” entre os sujeitos passivos e a responsabilidade pelo financiamento da respetiva atividade, ou entre os sujeitos passivos e os benefícios retirados dessa atividade. A Contribuição de Serviço Rodoviário visa financiar a rede rodoviária nacional a cargo da EP - Estradas de Portugal, E. P. E. (art.º 1.º da Lei 55/2007). O financiamento da rede rodoviária nacional a cargo da EP - Estradas de Portugal, E. P. E., é assegurado pelos respetivos utilizadores (art.º 2.º). São, estes, como se conclui, os sujeitos que têm um vínculo com a atividade da entidade titular da contribuição e com a atividade pública financiada pelo tributo; são eles os beneficiários, e são eles os responsáveis pelo seu financiamento. No entanto, a contribuição de serviço rodoviário é devida pelos sujeitos passivos do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos, que, nos termos do art.º 4.º n.º 1, al. a) do CIEC, são os “depositários autorizados” e os “destinatários registados”, não existindo qualquer nexo específico entre o benefício emanado da atividade da entidade pública titular da contribuição e o grupo dos respetivos sujeitos passivos. Embora a Autoridade Tributária afirme que a posição dos revendedores de produtos petrolíferos é a de uma “espécie de substituição tributária”, não entendemos assim, pois tal entendimento não tem apoio na lei. Nos termos do n.º 1 do art.º 20.º da LGT, “a substituição tributária verifica-se quando, por imposição da lei, a prestação tributária for exigida a pessoa diferente do contribuinte”. Para que estivéssemos, no caso presente, perante uma situação de substituição tributária, era necessário que os consumidores que pagam o preço dos combustíveis aos revendedores estivessem na posição de “contribuintes”. Sobre o conceito de contribuintes, o n.º 3 do art.º 18.º diz que “o sujeito passivo é a pessoa singular ou coletiva, o património ou a organização de facto ou de direito que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte direto, substituto ou responsável.” De onde se retira que o contribuinte é uma das espécies da categoria “sujeitos passivos” e estes são as pessoas (ou entidades) que estão obrigadas ao pagamento da prestação tributária, o que não acontece com os consumidores dos combustíveis. Concluímos, assim, que não estamos perante uma situação de substituição, pelo que os sujeitos passivos da CSR são igualmente os respetivos contribuintes diretos. Ainda poderia acrescentar-se que o universo de entidades que beneficiam ou dão causa à atividade financiada pela CSR não é um grupo delimitado de pessoas, mas é toda a população de um modo geral. E que o efetivo sacrifício fiscal, suportado através de uma repercussão meramente económica, não é suportado apenas pelos que efetivamente utilizam a rede de estradas a cargo da Infraestruturas de Portugal S.A., mas também pelos que utilizam vias rodoviárias que não se incluem nessa rede. Por conseguinte, conclui também este tribunal que a Contribuição de Serviço Rodoviário, apesar do seu nomen juris e de a sua receita se destinar a financiar uma atividade pública específica, não tem o caráter de comutatividade, bilateralidade ou sinalagmaticidade grupal ou coletiva que é necessária à contribuição financeira. […]».
A Requerida argumenta adicionalmente que ao tribunal arbitral está vedado pronunciar-se sobre actos de repercussão da CSR, subsequentes e autónomos da sua liquidação. A repercussão não constitui um acto tributário e, in casu, não estamos perante a figura da repercussão legal.
Convocando a decisão arbitral n.º 987/2023-T:
«Como é sabido, é pelo critério do pedido que se afere a competência de um tribunal. Nesta sede, puramente formal, irrelevam assim quaisquer considerações em torno da viabilidade substancial da pretensão deduzida, as quais apenas deverão aferidas na fase do julgamento da causa. Assim, não se verificará aquele apontado vício da instância se a pretensão concretamente deduzida, apreciada em abstrato e alheando-se de qualquer avaliação do seu mérito, couber no quadro das competências jurisdicionais do tribunal em que a ação pende. No caso presente não subsistem dúvidas de que a pretensão deduzida - de resto, de modo bastante claro e sem qualquer ambiguidade ou equivocidade - é a de invalidação de atos de liquidação da CSR, com fundamento em que o conteúdo exatório desses atos foi repercutido na esfera jurídica da requerente e assacando-se-lhes um vício que, de acordo com a argumentação sufragada, seria causa da respetiva ilegalidade. Para apreciar a competência do tribunal é indiferente, portanto, saber se o vício invocado procede quer no que diz respeito à existência efetiva dos seus elementos constitutivos quer mesmo no que diz respeito ao efeito invalidante que se lhe atribui - tudo isso pertence já ao conhecimento da questão de fundo - ou se a requerente tem legitimidade adjetiva para o invocar em juízo, matéria que subingressará já no quadro da apreciação da exceção de ilegitimidade. Ora, a jurisdição arbitral tributária é competente para conhecer de pretensões relativas à “declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos” [art. 2.º, n.º 1, al. a), do RJAT]. Tanto basta, assim, para concluir pela manifesta improcedência da exceção de incompetência com este fundamento, na medida em que o que se peticiona não é a declaração de ilegalidade dos atos de repercussão, mas antes a declaração de ilegalidade de atos de liquidação da CSR cujos efeitos foram alegadamente repercutidos na esfera da requerente, pretensão que claramente se compreende no âmbito material da jurisdição arbitral tributária».
Assim se concluindo pela improcedência desta excepção.
da ilegitimidade da requerente
A Requerente alega que, na qualidade de consumidor final, suportou o encargo da CSR, que foi previamente liquidada pelos sujeitos passivos. Sendo a CSR a contrapartida pela utilização da rede rodoviária nacional, tal como esta é verificada pelo consumo de combustíveis, a Requerente apresenta-se como repercutido legal. Tendo, economicamente, suportado o encargo do imposto.
Antecipando a conclusão, entendemos que não lhe assiste razão e que procede a excepção de ilegitimidade invocada pela Requerida.
Vejamos.
Apesar de o repercutido legal não ser sujeito passivo, a alínea a) do n.º 4 do artigo 18.º da LGT, determina que assiste o “direito de reclamação, recurso, impugnação ou de pedido de pronúncia arbitral nos termos das leis tributárias” a quem “suporte o encargo do imposto por repercussão legal”. A lei determina que o repercutido legal é titular de um interesse legalmente protegido, condição necessária à sua intervenção em juízo.
Todavia, a Lei n.º 55/2007, de 31 de Agosto, não estabelece qualquer mecanismo de repercussão legal deste imposto. Limita-se a identificar os sujeitos passivos da obrigação tributária e o objecto do imposto. E, por remissão para o Código dos IECs (no seu n.º 1 do artigo 5.º), o facto gerador da obrigação tributária, o momento da exigibilidade da mesma e os meios de liquidação e pagamento.
Em momento algum se determina a entidade que, ao longo da cadeia de comercialização dos combustíveis sujeitos a CSR, deve suportar o valor do imposto liquidado e pago. Não se institui um mecanismo de repercussão legal e nada se refere quanto à obrigatoriedade de repercussão económica.
É errónea a qualificação de “repercussão legal” dada pela Requerente. Porque a ser “legal”, a repercussão teria de constar de uma norma habilitadora, a qual não existe.
Ao não revestir a qualidade de sujeito passivo de CSR ou de repercutido legal, a legitimidade processual da Requerente exige a demonstração de um interesse legalmente protegido, nos termos dos n.º 1 e n.º 4 do artigo 9.º do CPPT.
Sucede que a a Requerente baseia a sua intervenção processual na alegação de lhe ter sido repercutida a CSR pelas empresas fornecedoras de combustíveis, caracterizando-se como um consumidor de combustíveis que suporta (a final) o encargo daquele tributo.
O que nos reconduz ao probatório.
Não constituindo, como vimos, uma imposição legal, a repercussão económica dependerá das políticas comerciais adoptadas pelos diversos agentes económicos intervenientes no circuito de comercialização. O qual é mais longo do que aquele que é representado pela Requerente, tendo em conta que os seus fornecedores não são sujeitos passivos da CSR, razão pela qual haverá, pelo menos, mais um intermediário económico a montante desses fornecedores (ou mais, caso o mesmo não seja o sujeito passivo da CSR).
Não estando o sujeito passivo (não identificado nos autos) obrigado à repercussão legal do encargo inerente à CSR por si declarada nas introduções no consumo (que originam as liquidações de imposto e consequente pagamento), a repercussão será o resultado das políticas comerciais que, em cada momento, forem sendo livremente praticadas pelos diversos operadores.
Não se podendo pressupor ou inferir, legal ou economicamente, que cada um dos intermediários do circuito de comercialização repercute, no todo ou em parte, o valor da CSR liquidado ao sujeito passivo que inicia o circuito de transmissão onerosa de combustíveis sujeitos a imposto, tudo se resume aos meios de prova juntos aos autos e a respectiva aptidão à demonstração, de facto, dessa repercussão.
Ora, o probatório organizado pela Requerente esgota-se na junção de facturas que nada permitem concluir pela liquidação da CSR a montante. Na verdade, apenas se poderá presumir que os sujeitos passivos (não identificados) terão satisfeito essa sua obrigação tributária sob pena de incumprimento normativo.
Nada se sabe sobre a repercussão económica do encargo da CSR pelo sujeito passivo e/ou intermediários que precedem a «B..., LDA», a «C..., LDA» e a «D..., SA». A inexistência de informação sobre o valor que eventualmente terá sido repercutido a estes revendedores, preclude qualquer conclusão quanto à repercussão - por estes - à Requerente.
A tudo isto acresce que a Requerente, contrariamente ao que alega, não é um consumidor final dos combustíveis que adquire, dado que os utiliza como recurso na prossecução da sua actividade comercial de transporte de mercadorias.
Também aqui a Requerente não cuidou de juntar elementos probatórios que permitam concluir que o encargo inerente à CSR, a ter-lhe sido integral ou parcialmente repercutido - que, como vimos supra, não pode ser determinado - não foi por esta repercutido, total ou parcialmente, aos seus clientes. Que poderão, também eles, ser operadores económicos ou consumidores finais.
Pelo exposto, a Requerente não logrou demonstrar nem a repercussão económica da CSR nos combustíveis por si adquiridos, nem a ausência de repercussão desse valor nos preços por si praticados.
Por fim, a liquidação da CSR terá sido efectuada à unidade de medida de 15º Celsius (n.º 1 do artigo 91.º do Código dos IEC). Todavia, a posterior comercialização a revendedores, de entre os quais a «B..., LDA», «C..., LDA», «D..., SA» e por estas à Requerente baseou-se na temperatura observada, a qual não é conhecida.
Quer isto dizer que nem sequer é possível estabelecer, ao contrário do que alega a Requerente, que a CSR foi liquidada no valor de € 5.874,19. Esta importância resulta da mera aplicação da taxa da CSR às quantidades facturadas pela «B..., LDA», «C..., LDA», « D..., SA» à Requerente, o que, por mera diferença de temperatura, não poderá corresponder ao imposto liquidado (que poderá ter sido superior ou inferior ao valor indicado pela Requerente).
O que constituirá um dos fundamentos pelo qual o artigo 15.º do Código dos IEC reserva a legitimidade activa aos sujeitos passivos, que, por participação directa na liquidação do imposto, dispõem da informação e documentação necessárias a aferição da factualidade e legalidade.
Note-se que à Requerida não pode ser imposto o conhecimento da relação causal entre as liquidações da CSR por si realizadas e as diversas facturas emitidas pelos operadores que intervêm no circuito económico. Desde logo, porque tal implicaria a identificação de todo o circuito económico que precede a comercialização dos combustíveis à Requerente até alcançar o sujeito passivo do imposto. Sendo exigível à Requerente um impulso probatório mínimo que, pelo menos, permitisse a identificação do(s) sujeito passivo(s).
Em suma, a Requerente não demonstrou que a CSR lhe foi repercutida e, muito menos, que suportou a CSR contra a qual reage. E esta seria a única forma de lhe poder ser reconhecida a legitimidade para o presente pedido de pronúncia arbitral (dado não ser sujeito passivo nem repercutido legal da CSR).
Mesmo a aceitar-se que o encargo representado pela CSR poderia ter sido repercutido ao longo do circuito económico, certo é que a Requerente, ao não se apresentar como consumidor final, não pode subsumir-se ao conceito de entidade potencial ou efectivamente lesada pela repercussão económica. Em rigor, a Requerente é apenas um operador no circuito económico entre o sujeito passivo e o consumidor final.
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Decisão
Face ao exposto, o tribunal arbitral decide julgar procedente a excepção de ilegimitidade activa da Requerente, o que obsta à apreciação do mérito do pedido e determina a consequente absolvição da Requerida da instância.
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Valor do Processo
Fixa-se ao processo o valor de € 5.874,19 indicado pelo Requerente como respeitante ao montante da CSR cuja anulação pretende (valor da utilidade económica do pedido) e não impugnado pela Requerida, de harmonia com o disposto nos artigos 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”), 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 306.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, este último ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.
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Custas
Custas no montante de € 612,00 (seiscentos e doze), a suportar integralmente pela Requerente, por decaimento, em conformidade com a Tabela I anexa ao RCPAT e com o disposto nos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4 do RJAT e 4.º do RCPAT.
Lisboa, 3 de Setembro de 2024
(José Luís Ferreira)