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SUMÁRIO
I – A Contribuição de Serviço Rodoviário, criada pela Lei 55/2007, de 31.8, não prossegue motivos específicos, na acepção do artigo l.°/2, da Directiva 2008/118, na medida em que as suas receitas têm essencialmente como fim assegurar o financiamento da rede rodoviária nacional, não podendo considerar-se como suficiente, para estabelecer uma relação directa entre a utilização das receitas e um motivo específico, os objectivos genéricos de redução da sinistralidade e de sustentabilidade ambiental que se encontram atribuídos à concessionária;
II – A recusa do reembolso do imposto indevidamente liquidado, por violação do Direito da União Europeia, apenas é admissível se a Administração Tributária provar que o imposto foi suportado, na íntegra ou parcialmente, por uma pessoa diferente do sujeito passivo, de modo que o reembolso pudesse gerar um enriquecimento sem causa;
III – A prova da repercussão no consumidor final de impostos indirectos suportados pelo operador económico não pode ser efectuada através de meras presunções.
DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros, Carla Castelo Trindade (presidente), Luís Menezes Leitão e Rui M. Marrana (vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral Colectivo, acordam no seguinte:
Relatório
1.A..., Lda (anteriormente designada por B..., Lda.), pessoa colectiva n.º..., com sede na ..., Rua..., ..., ...-... Leiria - doravante referida por Requerente -, veio requerer, ao abrigo do disposto no art. 10.º do DL 10/2011, de 20.1 (Regime da Arbitragem em Matéria Tributária - RJAT) e dos art.os 1.º e 2.º da Portaria 112-A/2011, de 22.3 a constituição de Tribunal Arbitral e deduzir o respectivo pedido de pronúncia sobre a declaração de ilegalidade do indeferimento (tácito) do pedido de revisão oficiosa por si formulado e consequentemente sobre os actos de liquidação n.os..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., relativos aos meses de Junho, Julho, Agosto, Setembro, Outubro e Novembro, todos do ano de 2019, com vencimento a 12/7/2019, 9/7/2019, 12/8/2019, 12/9/2019, 14/10/2019, 12/11/2019 e 12/12/2019, no montante total de 47.263.810,28 €, que englobam o Imposto sobre Produtos Petrolíferos (ISP), a Contribuição de Serviço Rodoviário (CSR) e outros tributos que são objecto daquele pedido, referentes ao período em causa, na parte que respeita ao montante total de 9.816.926,81 € liquidado a título de CSR.
2.É requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante referida por AT ou Requerida.
3.Em 18 de Dezembro de 2023 o pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Ex.mo Presidente do CAAD e seguiu a sua normal tramitação com a notificação da AT.
4.De acordo com o preceituado nos art.os 5.º/3 a), 6.º/2 a) e 11.º/1 a) do RJAT, o Ex.mo Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os árbitros do Tribunal Arbitral colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável. As Partes, notificadas dessa designação, não manifestaram vontade de a recusar.
5.O Tribunal Arbitral ficou constituído em 26 de Fevereiro de 2024.
6.Em 11 de Abril de 2024 a Requerida apresentou Resposta, com defesa por excepção e impugnação, juntando o processo administrativo.
7.No dia seguinte – 13 de Abril de 2024 – foi proferido despacho pela Senhora Presidente do Tribunal Arbitral, concedendo à Requerente dez dias para, querendo, exercer o direito ao contraditório quanto à matéria de excepção invocada na Resposta da AT.
8.Em 16 de Abril de 2024 a AT veio requerer a junção ao processo de duas Declarações de Informação Empresarial Simplificada relativas a 2018, 2019 e 2020.
9.Em 30 de Abril a Requerente respondeu às excepções invocadas pela AT na sua Resposta.
10.Em 8 de Maio de 2024 foi proferido despacho dispensando a reunião prevista no art. 18.º do mesmo diploma, facultando às partes a possibilidade de, querendo, apresentarem, alegações escritas, sendo, para o efeito, concedido um prazo de 15 dias simultâneos.
11.Requerente e Requerida apresentaram as suas alegações em 28 de Maio de 2024.
Posição da Requerente
12.A Requerente é uma sociedade cujo objecto social reside, entre outras actividades, no comércio a retalho de combustíveis.
13.No contexto da sua actividade, a Requerente (conforme resulta das declarações de introdução no consumo por esta realizadas) procedeu a actos de liquidação conjunta de ISP, CSR e outros tributos, relativos aos meses entre Junho e Novembro de 2019, a AT, nos termos seguintes:
Período
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N.º da liquidação
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Data
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ISP (Euros)
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CSR (Euros)
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Doc. N.º
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2019/6
|
...
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12/07/19
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4 332 128,83 €
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838 916,84 €
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1
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2019/6
|
...
|
09/07/19
|
16 511,98 €
|
3 358,38 €
|
2
|
2019/6
|
...
|
09/07/19
|
1 276,16 €
|
172,78 €
|
3
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2019/7
|
...
|
12/08/19
|
6 276 685,27 €
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1 407 913,76 €
|
4
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2019/8
|
...
|
12/09/19
|
6 488 640,75 €
|
1 422 737 28 €
|
5
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2019/8
|
...
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14/10/19
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10 080 172,41 €
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1 897 199,79 €
|
6
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2019/10
|
...
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12/11/19
|
10 684 858,49 €
|
2 366 956,21 €
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7
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2019/11
|
...
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12/12/19
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9 383 536,39 €
|
1 883 202, 93 €
|
8
|
|
|
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47 263 810,28 €
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9 816 926,81 €
|
|
14.Em 30 de Junho de 2023, a Requerente apresentou um pedido de revisão desses actos tributários de liquidação.
15.Em 7 de Julho de 2023 a Requerente apresentou um requerimento de rectificação dos valores reclamados nesse pedido de revisão, tendo em vista a correcção de um erro de cálculo da componente da CSR.
16.A Autoridade Tributaria não se pronunciou sobre o pedido de revisão oficiosa no prazo de 4 meses, referido no art. 57.º/1 da LGT, o que obrigou a Requerente a recorrer ao presente procedimento arbitral.
17.Até ao final do ano de 2022, data de alteração da legislação, a CSR constituía um imposto incidente sobre os grandes combustíveis rodoviários – gasolina, gasóleo rodoviário e GPL auto – sujeitos também ao ISP. Eram, aliás, usadas na sua aplicação as regras que disciplinam o ISP, embora a CSR constituísse um imposto distinto, com enquadramento legal, estrutura e finalidade próprias.
18.Ao nível europeu, a tributação dos produtos petrolíferos e energéticos é enquadrada pela Directiva 2008/118, que fixa a estrutura comum dos Impostos Especiais de Consumo (IEC) harmonizados e pela Directiva 2003/96, que cuida especificamente da tributação dos produtos petrolíferos e energéticos.
19.À luz da Directiva 2008/118, sendo da iniciativa do legislador nacional e onerando produtos já sujeitos ao ISP, a CSR configurava um imposto não harmonizado incidente sobre produtos sujeitos aos IEC harmonizados (excisable goods).
20.Para prevenir que fosse posto em causa o sistema harmonizado dos IEC, a Directiva 2008/118 subordina a criação destes impostos não harmonizados sobre excisable goods à dupla condição de (a) respeitarem a estrutura essencial dos IEC e do IVA e de (b) terem como fundamento um motivo específico.
21.De acordo com a jurisprudência consolidada do TJUE, este motivo específico não pode corresponder a uma finalidade puramente orçamental de obtenção de receita, sendo que a afectação da receita a despesas determinadas pode constituir um indicador de um motivo específico na criação destes impostos.
22.Porém, entende aquele tribunal que nem toda a afectação comprova um motivo específico, sendo necessária uma ligação directa entre a utilização da receita e a finalidade do imposto, não se verificando essa ligação directa quando a receita gerada pelo imposto esteja afectada a despesas suscetíveis de serem financiadas pelo produto de impostos de qualquer natureza.
23.Na falta dessa afectação adequada da receita, para que se concluísse existir motivo específico seria necessário, em segunda linha, e no entendimento daquele tribunal, que a estrutura do imposto claramente servisse para desmotivar o consumo que ele queira prevenir.
24.É certo, porém, que a CSR foi criada por razões de ordem puramente orçamental, uma vez que a Lei 55/2007, de 31.8, que criou a CSR, não faz apelo a qualquer objectivo de política ambiental, energética ou social.
25.As razões invocadas pelo legislador para a criação da CSR estão na necessidade de encontrar receitas próprias para financiamento da EP – Estradas de Portugal, EPE., empresa pública concessionária da rede nacional de estradas, entretanto transformada na Infraestruturas de Portugal, IP, SA, encontrando-se a receita da CSR genericamente consignada ao financiamento da Estradas de Portugal, EPE.
26.A CSR servia, portanto, para financiar despesas suscetíveis de serem custeadas pelo produto de impostos de qualquer natureza, como o são a manutenção e alargamento da rede nacional de estradas, não se verificando a afectação adequada da receita que o TJUE exige para concluir pela presença de um motivo específico.
27.A estrutura da CSR não indicia, tão pouco, que esteja subjacente à respectiva criação qualquer motivo específico de política ambiental, energética ou social, uma vez que a incidência objectiva da CSR, a sua incidência territorial e a sua estrutura de taxas, distintas do ISP, atestam que o objectivo subjacente à sua criação está em encontrar receitas próprias e estáveis para uma entidade pública e não em desmotivar um qualquer comportamento por parte dos contribuintes.
28.Assim, a CSR criada pela Lei 55/2007 deve considerar-se um imposto desconforme ao art. 1.º/2 da Directiva 2008/118. Neste preciso sentido, que se já se pronunciou o TJUE noutros processos similares.
29.É jurisprudência assente deste tribunal que os Estados-Membros estão obrigados a reembolsar os montantes de imposto indevidamente cobrado em violação do Direito Europeu, embora o possam recusar quando se comprove que o reembolso leve ao enriquecimento sem causa do contribuinte. Esta excepção, contudo, apenas é admitida em termos estritos, exigindo-se que se demonstre a repercussão do imposto, não podendo esta ser presumida pela Administração Tributária, mesmo quando um imposto indirecto seja concebido pelo legislador com o objectivo de ser repercutido ou quando o contribuinte esteja legalmente obrigado a incorporá-lo no preço dos bens. E mesmo quando se comprove a repercussão, não se pode concluir que haja enriquecimento sem causa do sujeito passivo, uma vez que a repercussão pode levar a uma quebra do volume de vendas, maior ou menor.
30.Entende, portanto, o TJUE, que cabe à Administração Tributária o ónus de provar, primeiro, a repercussão do imposto, depois, o enriquecimento sem causa do contribuinte, atendendo aos particularismos económicos que rodeiam as transacções, não se podendo voltar o ónus da prova da repercussão e do enriquecimento sem causa contra o contribuinte.
31.Decorre também da jurisprudência do TJUE, que a invocação de uma excepção de enriquecimento sem causa com o fim de recusar o reembolso de imposto contrário ao Direito da União, exige norma de Direito interno que a preveja.
32.Desta forma, não restam dúvidas e que todos os montantes liquidados pela Requerente, durante o período supra indicado, relativos à CSR deverão ser devolvidos à Requerente, por serem ilegais, pelos motivos supra expostos, tendo tal ilegalidade sido reconhecida em diversos processos neste Centro de Arbitragem, onde foram objecto de pedidos similares, devendo, por isso, julgar-se procedente o pedido de declaração de ilegalidade do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa supra indicado, anulando-se parcialmente as liquidações supra indicadas, na parte que respeita a titulo de CSR, devendo tais montantes ser restituídos à Requerente.
33.A Requerida deverá igualmente ser condenada ao pagamento dos juros de mora de todos os valores supra referidos, nos termos do art. 43.º da LGT.
Posição da Requerida
34.A Autoridade Tributária, na sua resposta, suscita as excepções dilatórias da incompetência do tribunal em razão da matéria e incompetência do tribunal em razão da causa de pedir.
35.Neste ponto, contrariando a argumentação da Requerente, a AT lembra que a sua vinculação à jurisdição dos Tribunais arbitrais ocorre nos termos da Portaria 112-A/2011, de 22.3, sendo que no objecto desta vinculação definido pelo art. 2.º se refere a apreciação das pretensões relativas a impostos. Apenas impostos, portanto, deixando de fora outras contribuições ou tributos, como é o caso da CSR.
36.Fundamenta o seu entendimento no facto de o legislador não ter enquadrado a CSR no conceito, tal como é referido no art. 4.º da LGT. Cita a propósito o entendimento convergente de alguma jurisprudência do CAAD (nomeadamente do Conselheiro Lopes de Sousa no proc. 31/2023-T que encontra do regime definido na Portaria 112-A/2011 um intuito claramente restritivo que impõe uma leitura no mesmo sentido).
37.Nestes termos (encontrando-se a CSR excluída da arbitragem tributária por força do disposto nos art.os 2.º e 3.º do RJAT e art. 2.º da Portaria 112-A/2011, pelas quais a vinculação da Administração Tributária à jurisdição dos tribunais arbitrais se reporta apenas à apreciação de pretensões relativas a impostos, não abrangendo os tributos que devam ser qualificados como contribuição, não se encontra verificada a arbitrabilidade do thema decidendum) não são os tribunais arbitrais do CAAD materialmente competentes para conhecer do mérito do pedido em apreço, o que prejudica o conhecimento do mérito da causa.
38.Além disso, entende e AT que a incompetência material do tribunal em razão da matéria é alcançável por outra via: é que o pedido de pronúncia arbitral visa a não aplicação da CSR o que supõe a apreciação genérica da sua legalidade, o que excede a competência da instância arbitral enquanto contencioso de mera anulação.
39.Há, portanto, novamente incompetência material do tribunal arbitral, tal como tem sido reconhecido em diversos processos (212/2020-T, 707/2019-T, 131/2019-T e 117/2021-T).
40.Também os tribunais superiores se pronunciaram já (embora no âmbito da competência dos tribunais administrativos e fiscais), em acções administrativas, sobre a impugnação de actos legislativos, designadamente nos acórdãos do STA de 01.10.2018 (proc. 01390/17 - ISV), n.º 0637/15, de 07.02.2015, e acórdão de 21.04.2016, do TCA Norte (proc. 00502/15.4BEPRT).
41.Invoca ainda a Requerida a caducidade do direito de acção, resultante do facto de o pedido de revisão oficiosa (cujo indeferimento tácito fundamenta o pedido de pronúncia arbitral) ter ocorrido em 5.7.2023, ou seja, muito depois de decorrido o prazo da reclamação graciosa de 120 dias a contar do termo do prazo do pagamento do ISP/ CSR), previsto no art. 78.º/1 1.ª parte, da LGT.
42.Terá sido por isso que a Requerente fundamentou o pedido de revisão oficiosa em erro dos serviços, a estes imputável, o que lhe permite utilizar o prazo de 4 anos previsto na 2ª parte do art. 78.º/1 da LGT, ao fundamentar o pedido de revisão na ilegalidade das liquidações, por entender que a CSR é um imposto desconforme com o Direito da União Europeia, nomeadamente, com o art. 1.º/2 da Directiva 2008/118.
43.Todavia, as liquidações de CSR foram efectuadas de acordo com a disciplina legal aplicável, pelo que as mesmas não enfermam de qualquer vício, pois, encontram-se em total consonância com as normas aplicáveis, não cabendo á AT deixar de aplicar a norma, com base num julgamento de não conformidade com o Direito da União. Nesse sentido, não lhe pode ser imputado qualquer erro.
44.De facto, tal como tem sido pacificamente entendido na doutrina e jurisprudência, a menos que esteja em causa o desrespeito por normas constitucionais directamente aplicáveis e vinculativas, como as que se referem a direitos, liberdades e garantias (cf. art. 18.º/1 da CRP), a AT não pode recusar-se a aplicar a norma com fundamento em inconstitucionalidade, a menos que o Tribunal Constitucional já tenha declarado a inconstitucionalidade da mesma com força obrigatória geral (cf. art. 281.º da CRP), o que não é o caso.
45.Essa a intempestividade do pedido de revisão das liquidações tem sido reconhecida pela jurisprudência arbitral, nomeadamente nos proc.os 629/2021-T, 345/2017-T, 114/2019-T e 362/2020-T.
46.A Requerida fundamenta ainda a caducidade do direito de acção por outra via: o regime da CSR (Lei 55/2007) estipula no seu art. 5.º (na redacção em vigor até 31.12.2022) que esta é devida pelos sujeitos passivos do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos, sendo aplicável à sua liquidação, cobrança e pagamento o disposto no Código dos Impostos Especiais de Consumo (CIEC), na Lei Geral Tributária (LGT) e no Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), com as devidas adaptações.
47.Ora, aplicando-se as regras especiais relativas aos impostos especiais ao consumo, nomeadamente o disposto no art.os 15.º e 16.º do CIEC, verifica-se que o prazo para o pedido de reembolso é reduzido para 3 anos a contar da data da liquidação do imposto, prazo esse excedido em 5.7.2023 (data da recepção do pedido de revisão na Alfândega de Alverca).
48.Respondendo por impugnação a AT recorda que a CSR constitui a contrapartida pela utilização dos serviços prestados pela IP aos utentes das vias rodoviárias, em nome do Estado, por força da concessão, aprovadas pelo Decreto-Lei 380/2007, suportada pelos seus utilizadores (princípio do utilizador-pagador), e apenas subsidiariamente pelo Estado. Esta contribuição passou a estar incorporada no ISP por força da Lei 24-E/2022 de 30.9 tendo em vista nomeadamente repercutir nos utilizadores da rede viária os custos inerentes à gestão da rede rodoviária nacional tendo em atenção o percurso que estes realizam consumindo uma unidade de medida de combustível [sancionando-se] expressamente a internalização desta como parte do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos.
49.Trata-se, portanto, de parcela do ISP utilizada para financiar a Infraestruturas de Portugal, cujo custo é sempre repercutido nos consumidores, conforme resulta da nova redacção do art. 2.º do CIEC, introduzida pela Lei n.º 24-E/2022.
50.Por outro lado, a Lei 5/2019 impõe o dever de informação e de facturação do comercializador de combustíveis ao consumidor (detalhando, nomeadamente, a CSR na factura de venda ao consumidor), dever esse que é reafirmado pelo Regulamento 141/2020, de 20.2 da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE).
51.Considera ainda a AT que existe um vínculo entre o destino dado às receitas da CSR e o motivo específico que levou à sua criação, tendo em consideração que a Lei 55/2007 e o Decreto-Lei 380/2007, pelo que os objectivos que lhe estão subjacentes devem ser analisados à luz desse diploma, que prevê, na alínea b) do nº 4 da base 2 que cabe à concessionária prosseguir os objectivos de redução da sinistralidade e de sustentabilidade ambiental. Será ainda relevante o estabelecido nas bases 12 e 42 que impõe obrigações de informação e controlo da concessionária relativamente à sinistralidade e ambiente.
52.Verificar-se-á, portanto, o motivo específico que constitui a razão de ser da CSR.
53.Acrescenta ainda a Requerida que, em qualquer caso, nos termos definidos pelo TJUE (despacho de 07.02.2022, no proc.º C-460/21,) o reembolso de impostos indevidamente liquidados ao contribuinte apenas ser admissível quando não produzam o enriquecimento sem causa. Ora, no caso, a carga fiscal resultante da incidência da CSR é repercutida nos consumidores finais através do correspondente aumento do preço, o que resulta da própria a estrutura tributária da CSR, pelo que o reembolso dos montantes pagos a título de CSR configuraria uma situação de enriquecimento sem causa.
54.Ora da análise efectuada pela AT dos elementos obtidos pela Unidade de Grandes Contribuintes verifica-se que a CSR liquidada pela Requerente foi incluída no preço final de venda dos combustíveis e consequentemente constituiu encargo, não desta, mas de quem adquiriu os combustíveis.
55.De facto, conforme é comumente aceite, quer pela doutrina, quer pela jurisprudência, não obstante a repercussão tenha uma natureza económica, a regra nos IEC é naturalmente a repercussão nos consumidores/adquirentes dos produtos sujeitos a este tipo de impostos.
56.E ainda que assim não fosse, a análise e a descrição do tratamento contabilístico e do enquadramento fiscal efectuado pelo próprio sujeito passivo à CSR, corresponde, por si só, à demonstração objectiva da realidade dos factos, através de elementos que se relacionam com os factores inerentes às transacções comerciais que foram realizadas, sendo que a própria contabilidade da Requerente espelha tal repercussão, não deixando dúvidas sobre tal comprovação.
57.Devendo, por isso, a Requerente assumir categórica e transparentemente se repercutiu ou não a CSR nos preços, não podendo omitir essa informação com o intuito de lhe vir a ser atribuído o reembolso.
58.O elevado peso dos impostos no preço final dos combustíveis faz com que, a não haver repercussão destes no preço final, a empresa estaria recorrentemente a incorrer em prejuízos por cada venda efectuada, e a vender abaixo do preço de custo total do produto que nos termos da normalização contabilística, o que além de economicamente inviável, seria sempre ilegal, nos termos do art. 5.º da Lei 166/2013.
59.Prossegue a AT invocando o eventual enriquecimento sem causa que derivaria do reembolso dos montantes pagos a título de CSR a quem paga o imposto ao Estado, mas não o suporta (já que, quem suporta a carga do imposto são, efectivamente, os clientes finais).
60.Isso mesmo vem sendo reconhecido lembrado na jurisprudência arbitral, nomeadamente no voto de vencido de Manuel Macaísta Malheiros no proc. 305/2022-T.
61.Afinal, a Requerente nos anos em causa não teve qualquer diminuição do volume de vendas, pelo contrário, o que demonstra que o encargo com a CSR não a afectou economicamente, por ter efectivamente repercutido esse custo nos consumidores finais.
62.Isso configuraria ainda uma violação do princípio da justiça tributária, por via do consagrado no art. 103.º/1, da CRP, não sendo a justiça material, por força do princípio da legalidade fiscal, a justiça no exclusivo interesse de qualquer das partes, mas a justiça distributiva, que é a almejada pelo direito fiscal, visando o sistema fiscal a prossecução da verdade e da justiça material.
63.Refere, ainda, a AT que a eventual restituição do valor pedido por ter sido indevidamente pago excederia a competência dos tribunais arbitrais que têm meros poderes de anulação (art. 2.º/1 RJAT).
64.Finalmente, insurge-se a Requerida quanto ao pedido de juros indemnizatórios, por estes nunca serem devidos desde o momento da liquidação, mas apenas depois de decorrido um ano após a apresentação do pedido de revisão oficiosa (art. 43.º/3 LGT).
Posição da Requerente relativamente às excepções
65.Respondendo à excepção da incompetência do tribunal arbitral em razão da matéria e à intempestividade do pedido de revisão oficiosa a Requerente recordou extensa jurisprudência arbitral em sentido inverso (proc.os 48/2012-T, 523/2023-T, 113/2023-T, 676/2023-T, 534/2023-T, 523/2023-T, 491/2023-T, 486/2023-T, 465/2023-T, 410/2023-T, 398/2023-T, 397/2023-T, 396/2023-T, 374/2023-T e 465/2023-T, 294/2023-T, respectivamente).
Alegações
66.Em sede de alegações a Requerente repisou os argumentos presentes no p.p.a. impugnando ainda a pretensão da AT no sentido de considerar repercutida a CSR nos consumidores finais.
67.Também a Requerida manteve tudo quanto havia afirmado na Resposta, reiterando não ser a CSR um imposto e por isso escapar à arbitrabilidade (invocando diversas decisões nesse sentido), insistiu que, em qualquer caso, tendo a instância arbitral meros poderes de anulação não poderá escrutinar a legalidade de normas legais, reafirmou a caducidade do direito de acção nos termos anteriormente referidos, defendeu a conformidade do regime da CSR com o Direito da União e recordou que uma devolução dos montantes pagos constituiria um enriquecimento sem causa (até por os elementos documentais disponíveis demonstrarem a efectiva repercussão).
Saneamento
68.O tribunal foi regularmente constituído e as partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas (v. art.os 4.º e 10.º/2 do RJAT e art. 1.º da Portaria 112-A/2011, de 22.3).
69.Não foram identificadas nulidades ou questões que obstem ao conhecimento do mérito, remetendo-se o tratamento das excepções para a análise da matéria de Direito.
Matéria de facto
Factos provados
70.Os factos relevantes para a decisão da causa que são tidos como assentes são os seguintes:
A.A Requerente é uma sociedade cujo objecto social reside, entre outras actividades, no comercio a retalho de combustíveis.
B.No contexto da actividade exercida pela Requerente, a Autoridade Tributária procedeu a actos de liquidação conjunta de Imposto sobre Produtos Petrolíferos (ISP), Contribuição de Serviço Rodoviário (CSR) e outros tributos, relativos aos períodos de Junho a Novembro de 2019;
C.As liquidações reportam-se às declarações de introdução no consumo (DIC) das quais constam os produtos introduzidos no consumo pela Requerente e as respectivas quantidades;
D.No período em referência, a Requerente suportou um montante global de 47 263 810,28 €, correspondente aos actos de liquidação de ISP, CSR e outros tributos, e um montante parcelar de € 4.622.272,38, correspondente aos actos de liquidação de CSR de acordo com o quadro que segue:
Período
|
N.º da liquidação
|
Data
|
ISP (Euros)
|
CSR (Euros)
|
Doc. N.º
|
2019/6
|
...
|
12/07/19
|
4 332 128,83 €
|
838 916,84 €
|
1
|
2019/6
|
...
|
09/07/19
|
16 511,98 €
|
3 358,38 €
|
2
|
2019/6
|
...
|
09/07/19
|
1 276,16 €
|
172,78 €
|
3
|
2019/7
|
...
|
12/08/19
|
6 276 685,27 €
|
1 407 913,76 €
|
4
|
2019/8
|
...
|
12/09/19
|
6 488 640,75 €
|
1 422 737 28 €
|
5
|
2019/8
|
...
|
14/10/19
|
10 080 172,41 €
|
1 897 199,79 €
|
6
|
2019/10
|
...
|
12/11/19
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10 684 858,49 €
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2 366 956,21 €
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7
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2019/11
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...
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12/12/19
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9 383 536,39 €
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1 883 202, 93 €
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8
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47 263 810,28 €
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9 816 926,81 €
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E.Em 30 de Junho de 2023, a Requerente apresentou um pedido de revisão desses actos tributários de liquidação.
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O pedido arbitral deu entrada em 18 de Dezembro de 2024.
Factos não provados
71.Não há factos relevantes para esta decisão arbitral que não se tenham provado.
72.O tribunal formou a sua convicção quanto à factualidade provada ou não provada com base nos documentos juntos à petição e no processo administrativo remetido pela AT.
Matéria de Direito
Excepções
73.A primeira excepção invocada pela AT refere-se à incompetência do tribunal arbitral em razão da matéria, por considerar que a contribuição de serviço rodoviário deve ser qualificada como contribuição financeira, e não como imposto, encontrando-se excluída da arbitragem tributária, por força do disposto nos art.os 2.º e 3.º do RJAT e do art. 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22.3, defendendo a este propósito o entendimento do Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, expresso no acórdão proferido no processo arbitral 31/2023-T e retomado nos proc.os 508/2023-T, 520/2023-T e 675/2023-T.
74.Insiste ainda que a competência da instância arbitral no que concerne à impugnação de contribuições financeiras foi igualmente objecto de análise nos proc.os 182/2019-T, 138/2019-T, 123/2019-T e 585/2020-T que tiveram por objecto outras contribuições (Contribuição sobre o Sector Bancário - CSB - e Contribuição Extraordinária Sobre o Sector Energético - CESE).
75.Importa, portanto, analisar esta questão, o que faremos seguindo os termos do proc. 23/2024-T, com a devida vénia ao Relator (Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha).
76.A competência contenciosa dos tribunais arbitrais em matéria de arbitragem tributária, tal como resulta do referido art. 2.º do RJAT, compreende a apreciação de pretensões que visem a declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta e a declaração de ilegalidade de actos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de actos de determinação da matéria colectável e de actos de fixação de valores patrimoniais.
77.O art. 4.º/1 do RJAT faz ainda depender a vinculação da AT à jurisdição dos tribunais arbitrais de portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, que deverá estabelecer, designadamente, o tipo e o valor máximo dos litígios abrangidos.
78.E o diploma que, em execução desse preceito, define o âmbito e os termos da vinculação da AT à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é a Portaria 112-A/2011, de 22.3 a qual, no seu n.º 2, sob a epígrafe Objecto de vinculação, na redacção dada pela Portaria 287/2019, de 3.9, dispõe o seguinte:
Os serviços e organismos referidos no artigo anterior vinculam-se à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD que tenham por objecto a apreciação das pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida referidas no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com excepção das seguintes:
a) Pretensões relativas à declaração de ilegalidade de actos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário;
b) Pretensões relativas a actos de determinação da matéria colectável e actos de determinação da matéria tributável, ambos por métodos indirectos, incluindo a decisão do procedimento de revisão;
c) Pretensões relativas a direitos aduaneiros sobre a importação e demais impostos indirectos que incidam sobre mercadorias sujeitas a direitos de importação;
d) Pretensões relativas à classificação pautal, origem e valor aduaneiro das mercadorias e a contingentes pautais, ou cuja resolução dependa de análise laboratorial ou de diligências a efectuar por outro Estado membro no âmbito da cooperação administrativa em matéria aduaneira;
e) Pretensões relativas à declaração de ilegalidade da liquidação de tributos com base na disposição anti abuso referida no n.º 1 do artigo 63.º do CPPT, que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos do n.º 11 do mesmo artigo.
79.A referência a serviços e organismos que se vinculavam à jurisdição arbitral era feita para a Direcção-Geral dos Impostos e a Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo, que foram, entretanto, extintas, tendo-lhes sucedido a Autoridade Tributária e Aduaneira.
80.A Portaria n.º 112-A/2011, também chamada Portaria de vinculação, fixa, por conseguinte, um segundo nível de delimitação das pretensões que poderão ser sujeitas à jurisdição arbitral. Tratando-se de um mero regulamento de execução, a Portaria não poderia ir além do estabelecido na lei quanto ao âmbito de competência material dos tribunais arbitrais, mas poderia estabelecer restrições quanto ao âmbito da vinculação à arbitragem tributária, mormente por referência ao tipo de litígios e ao valor do processo.
81.Ainda a este propósito, o acórdão proferido no Processo n.º 48/2012-T, depois seguido por diversos outros arestos, consignou o seguinte:
A competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é, em primeiro lugar, limitada às matérias indicadas no artigo 2.º, n.º 1, do [RJAT].
Numa segunda linha, a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é também limitada pelos termos em que Administração Tributária se vinculou àquela jurisdição, concretizados na Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, pois o artigo 4.º do RJAT estabelece que «a vinculação da administração tributária à jurisdição dos tribunais constituídos nos termos da presente lei depende de portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, que estabelece, designadamente, o tipo e o valor máximo dos litígios abrangidos.
Em face desta segunda limitação da competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, a resolução da questão da competência depende essencialmente dos termos desta vinculação, pois, mesmo que se esteja perante uma situação enquadrável naquele artigo 2.º do RJAT, se ela não estiver abrangida pela vinculação estará afastada a possibilidade de o litígio ser jurisdicionalmente decidido por este tribunal arbitral.
82.No caso, a Portaria de vinculação, aparentemente, estabelece duas limitações: refere-se a pretensões relativas a impostos, de entre aquelas que se enquadram na competência genérica dos tribunais arbitrais, e a impostos cuja administração esteja cometida à AT. Haverá de concluir-se, nestes termos, que a vinculação se reporta a qualquer das pretensões mencionadas no art. 2.º/1 do RJAT que respeitem a impostos - com a exclusão de outros tributos - e a impostos que sejam geridos pela AT.
83.A constitucionalização das contribuições financeiras resultou da alteração introduzida no art. 165.º/1 i), da Lei Fundamental, pela revisão constitucional de 1997, que autonomizou as contribuições financeiras a favor das entidades públicas como uma terceira categoria de tributos.
84.A LGT, aprovada em 1998, passou a incluir entre os diversos tipos de tributos, os impostos e outras espécies criadas por lei, designadamente as taxas e as contribuições financeiras a favor das entidades públicas, definindo, em geral, os pressupostos desses diversos tipos de tributos no subsequente art. 4.º.
85.A doutrina tem caracterizado as contribuições financeiras como um tertium genus de receitas fiscais, que poderão ser qualificadas como taxas colectivas, na medida em que visam retribuir os serviços prestados por uma entidade púbica a um certo conjunto ou categoria de pessoas. Como referem Gomes Canotilho/Vital Moreira, a diferença essencial entre os impostos e estas contribuições bilaterais é que aqueles visam financiar as despesas públicas em geral, não podendo, em princípio, ser consignados a certos serviços públicos ou a certas despesas, enquanto que as segundas, tal como as taxas em sentido estrito, visam financiar certos serviços públicos e certas despesas públicas (responsáveis pelas prestações públicas de que as contribuições são contrapartida), aos quais ficam consignadas, não podendo, portanto, ser desviadas para outros serviços ou despesas (Constituição da República Portuguesa Anotada, I vol., 4.ª Ed., Coimbra, pg. 1095). Neste sentido, as contribuições são tributos com uma estrutura paracomutativa, dirigidos à compensação de prestações presumivelmente provocadas ou aproveitadas pelos contribuintes, distinguindo-se das taxas que são tributos rigorosamente comutativos e que se dirigem à compensação de prestações efectivas (Sérgio Vasques, Manual de Direito Fiscal, Coimbra, 2015, pg. 287).
86.Por outro lado, o Tribunal Constitucional tem também reconhecido a existência dessas diferentes categorias jurídico-tributárias, designadamente para efeito de extrair consequências quanto à competência legislativa, admitindo que as taxas e outras contribuições de carácter bilateral só estão sujeitas a reserva parlamentar quanto ao seu regime geral, mas não quanto à sua criação individual e quanto ao regime concreto, podendo portanto ser criadas por diploma legislativo governamental e reguladas por via regulamentar desde que observada a lei-quadro (cfr., entre outros, o acórdão 365/2008).
87.Fica, portanto, claro que as contribuições financeiras se distinguem dos impostos.
88.A Contribuição de Serviço Rodoviário, criada pela Lei 55/2007, de 31.8, visa financiar a rede rodoviária nacional a cargo da EP - Estradas de Portugal, EPE (art. 1.º), que, entretanto, passou a denominar-se Infraestruturas de Portugal, SA, sendo que o financiamento da rede rodoviária nacional a cargo desta entidade é assegurado pelos respectivos utilizadores e, subsidiariamente, pelo Estado, nos termos da lei e do contrato de concessão aplicável (art. 2.º).
89.A mesma contribuição corresponde à contrapartida pela utilização da rede rodoviária nacional, tal como esta é verificada pelo consumo dos combustíveis, e constitui uma fonte de financiamento da rede rodoviária nacional a cargo da Infraestruturas de Portugal, SA, no que respeita à respectiva concepção, projecto, construção, conservação, exploração, requalificação e alargamento, ainda que a exigência da contribuição não prejudique a eventual aplicação de portagens em vias específicas ou o recurso da entidade concessionária a outras formas de financiamento (art. 3.º).
90.A contribuição incide sobre a gasolina e o gasóleo rodoviário sujeitos ao imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos e dele não isentos (art. 4.º/1) e é devida pelos sujeitos passivos do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos, sendo aplicável à sua liquidação, cobrança e pagamento o disposto no Código dos Impostos Especiais de Consumo (art. 5.º/1).
91.O produto da Contribuição de Serviço Rodoviário constitui receita própria da actualmente denominada Infraestruturas de Portugal, SA (art. 6.º).
92.A actividade de concepção, projecto, construção, conservação, exploração, requalificação e alargamento da rede rodoviária nacional, que é objecto de financiamento através da Contribuição de Serviço Rodoviário foi atribuída, em regime de concessão, à EP - Estradas de Portugal, EPE. pelo Decreto-Lei 380/2007, de 13.11, que aprovou as bases da concessão e nas quais se prevê que, entre outros rendimentos, essa contribuição constitua receita própria dessa entidade (Base 3 b)). E, por outro lado, nelas se estabelece, como uma das obrigações da concessionária, a prossecução dos objectivos de redução da sinistralidade e de sustentabilidade ambiental (Base 2/4 b)).
93.À luz do regime jurídico sucintamente descrito, dificilmente se poderia concluir que a CSR constitui uma contribuição financeira.
94.Como se refere no acórdão proferido no proc. 269/2021, corroborado pelo acórdão tirado no processo 304/2022, a CSR não tem como pressuposto uma prestação, a favor de um grupo de sujeitos passivos, por parte de uma pessoa colectiva. A contribuição é estabelecida a favor da EP - Estradas de Portugal, EPE (art. 3.º/2), sendo essa mesma entidade a titular da receita correspondente (art. 6.º). No entanto, os sujeitos passivos da contribuição (as empresas comercializadoras de produtos combustíveis rodoviários) não são os destinatários da actividade da EP - Estradas de Portugal, EPE, a qual consiste na concepção, projecto, construção, conservação, exploração, requalificação e alargamento da rede de estradas (art. 3.º/2).
95.Por outro lado, nada permite afirmar que a responsabilidade pelo financiamento da actividade administrativa que se encontra atribuída à EP - Estradas de Portugal, EPE é imputável aos sujeitos passivos da contribuição, que são as empresas comercializadoras de combustíveis rodoviários. Quando é certo que o art. 2.º da Lei 55/2007 declara expressamente que o financiamento da rede rodoviária nacional a cargo da EP - Estradas de Portugal, E.P.E. (...) é assegurado pelos respectivos utilizadores e, subsidiariamente, pelo Estado, nos termos da lei e do contrato de concessão aplicável.
96.Nestes termos, o financiamento da rede rodoviária nacional é assegurado pelos respectivos utilizadores, que são os beneficiários da actividade pública desenvolvida pela EP - Estradas de Portugal, EPE, verificando-se, no entanto, que a contribuição de serviço rodoviário é devida pelos sujeitos passivos do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos, que, nos termos do artigo 4.º, n.º 1, alínea a), do CIEC, são os depositários autorizados e os destinatários registados.
97.Não existindo, deste modo, qualquer nexo específico entre o benefício emanado da actividade da entidade pública titular da contribuição e o grupo dos sujeitos passivos.
98.Resta acrescentar que o regime jurídico da CSR não é equiparável ao previsto para a Contribuição sobre o Sector Bancário (CSB) ou para a Contribuição Extraordinária sobre o Sector Energético (CESE), que são caracterizadas como típicas contribuições financeiras, não tendo qualquer aplicação ao caso a jurisprudência constante dos acórdãos proferidos nos proc.os 182/2019-T, 138/2019-T, 123/2019-T, que tiveram por objecto a CSB, nem a dos acórdãos proferidos nos proc.os 248/2019-T e 585/2020-T, que incidiram sobre a CESE.
99.Por todo o exposto, improcede a alegada excepção da incompetência material do tribunal arbitral com fundamento na qualificação da CSR como contribuição financeira.
100.A AT suscita ainda a excepção da incompetência do tribunal arbitral para conhecer do presente pedido na medida em que se pretende discutir a legalidade do regime da CSR no seu todo. Invoca, portanto, a incompetência do tribunal em razão da causa de pedir.
101.A arguição assenta num evidente equívoco.
102.A Requerente formulou um pedido de pronúncia arbitral sobre a legalidade dos actos de liquidação de CSR referente aos meses de Junho a Novembro de 2019, invocando como causa de pedir, a desconformidade da contribuição com a Directiva 2008/118, relativa ao Regime Geral dos Impostos Especiais de Consumo.
103.Estando em causa, no caso vertente, a desconformidade da CSR com a Directiva 2008/118/, não pode deixar de concluir-se pela competência contenciosa do tribunal para a apreciação do litígio.
104.De facto, como é sabido, as directivas são actos através dos quais os órgãos competentes da União impõem aos Estados-membros a transposição do respectivo regime, ou seja, a adopção de actos subsequentes que adeqúem a sua ordem jurídica às regras por elas fixadas.
105.Por não se dirigirem aos particulares, entende-se genericamente que não podem ser invocadas por estes como tendo criado direitos na respectiva esfera jurídica (não têm, portanto, efeito directo).
106.A jurisprudência europeia reconheceu, todavia, uma excepção (ac. 17.12.70 SACE, proc. 33/70): tratando-se de disposições precisas e incondicionais de directivas, a não transposição destas (ou a transposição incorrecta) no prazo por elas estabelecido, permite aos particulares invocá-las contra entes públicos (efeito directo vertical), já que, caso contrário, esses entes estaria a retirar vantagem de um incumprimento das obrigações gerais face ao Direito da União, privando esses mesmos particulares de direitos que teriam sido constituídos na sua esfera jurídica se a transposição tivesse ocorrido nos termos previstos.
107.Essa será a situação em apreço (e a que adiante se voltará): saber se a proibição constante do art. 1.º da Directiva 2008/118 pode ser invocada pela Requerente para arguir a ilegalidade dos actos de liquidação de CSR que a contrariam, por não se verificarem os necessários motivos específicos.
108.Isso mesmo foi reconhecido explicitamente pelo TJUE – a quem cabe determinar em exclusivo a interpretação do Direito da União (art. 267.º TFUE) – no Despacho de 2.2.2022 (Vapo Atlantic SA c. Autoridade Tributária, proc. C-460/21).
109.Ora, o Direito da União aplica-se na ordem interna portuguesa nos termos por ele definidos (art. 8.º/4 CRP), sendo que esses termos determinam a sua prevalência sobre o Direito nacional, por força do princípio do primado (ac. 15.07.1964 Costa c. ENEL, proc. 6/64 e Declaração sobre o primado do direito comunitário, anexa ao TFUE).
110.A impugnação judicial de um acto de liquidação pode ser deduzida com fundamento em qualquer ilegalidade (art. 99.º do CPPT), nada permitindo distinguir entre a ilegalidade resultante de normas de direito interno, de direito internacional ou de direito da União.
111.Não existe, portanto, qualquer obstáculo a que o tribunal arbitral se pronuncie sobre o fundamento de ilegalidade do acto de liquidação baseado em desconformidade da CSR com o direito da União, sendo manifestamente improcedente a invocada excepção de incompetência do tribunal em razão da causa de pedir.
112.Ainda em matéria de incompetência, a Requerida refere que a eventual restituição do valor pedido por ter sido indevidamente pago excederia a competência dos tribunais arbitrais que têm meros poderes de anulação (art. 2.º/1 RJAT).
113.Tal como se referirá adiante – a propósito do pedido de reembolso (cf. infra § 158 ss.) – , o disposto no artigo 24.º b) do RJAT determina que a AT deve, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo, restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito. O que está em sintonia com o preceituado no art. 100.º da LGT, aplicável por força do disposto no art. 29.º/1 a) do RJAT.
114.Donde, a reconstituição da situação jurídica em resultado da anulação do acto tributário, determina naturalmente o reembolso do imposto indevidamente pago.
115.Não tem portanto, qualquer cabimento a pretensão da Requerida no sentido de que a devolução exceda os poderes do tribunal arbitral.
116.A AT invoca ainda a excepção da caducidade do direito de acção, por considerar que o pedido de revisão oficiosa (cujo indeferimento fundamenta o pedido arbitral) foi apresentado depois de decorrido o prazo de 120 dias a contar da data do pagamento da CSR, previsto na primeira parte do art. 78.º/1 da LGT.
117.Reconhece, todavia, que esse pedido de revisão se fundou num erro dos serviços, o que, nos termos da segunda parte do mesmo art. 78.º/1 da LGT alarga para 4 anos o prazo. Mas a Requerida considera inaplicável este dispositivo já que se limitou a fazer a interpretação das normas aplicáveis aos factos, sempre sobre o espectro do princípio da legalidade e, não tendo, a prerrogativa de poder desaplicar normas com base num julgamento de pretensa desconformidade com o direito comunitário (atribuição reservada aos Tribunais). Neste enquadramento, será forçoso concluir pela inexistência de imputabilidade de erro aos serviços tributários enquanto fundamento de um procedimento de revisão dos actos de liquidação.
118.Não colhe o argumento da AT que volta a insistir num equívoco.
119.De facto, se – tal como se referiu anteriormente –, o Direito da União se aplica na ordem interna portuguesa nos termos por ele definidos (art. 8.º/4 CRP), e esses termos determinam a sua prevalência sobre o Direito nacional (por força do princípio do primado), sempre que se verifique qualquer desconformidade entre este e aquele, deve a AT aplicar aquele.
120.Não se vislumbra qualquer fundamento para o entendimento de que apenas os tribunais possam desaplicar o direito interno por desconformidade com o direito da União. Da mesma maneira que se não entende que o princípio da legalidade se restrinja à aplicação dos actos legislativos nacionais (devendo, antes, remeter para a noção de Estado de Direito, o que implica sujeitar todo o exercício do poder público ao direito aplicável, qualquer que seja a sua origem).
121.Nestes termos, a eventual aplicação de uma regra nacional contrária a uma regra de direito da União que prevalece sobre aquela não pode deixar de consubstanciar um erro de direito da AT. O que conduz à aplicação da segunda parte do mesmo art. 78.º/1 da LGT e afasta a pretensa caducidade do direito de acção.
122.A AT insiste, todavia, que essa mesma caducidade resultaria ainda da aplicação do regime especial relativo ao reembolso dos impostos sobre o consumo (art. 15.º/3 do CIEC) que reduz o prazo para 3 anos.
123.Não colhe também esse argumento, na medida em que aquele regime especial (relativo ao reembolso) não se aplicará à CSR nos termos do art. 1.º do CIEC. Este código é aplicável à CSR apenas para efeitos de liquidação, cobrança e pagamento, nos termos do art. 5.º/1 da Lei 55/2007.
124.Improcedendo, portanto, as excepções invocadas pela Requerida, importa analisar a matéria de direito propriamente dita.
125.A questão central que vem colocada é a de saber se a CSR, criada pela Lei 55/2007, de 31.8, que constitui um imposto incidente sobre os combustíveis rodoviários também sujeitos ao Imposto sobre Produtos Petrolíferos, e que se encontra enquadrada pela Directiva 2008/118, tem um motivo específico na acepção do art. 1.º/2 dessa Directiva.
126.Nos termos da referida Lei 55/2007, na sua redacção originária, a CSR visa financiar a rede rodoviária nacional a cargo da EP - Estradas de Portugal, EPE (art. 1.º), que, entretanto, passou a denominar-se Infraestruturas de Portugal, SA, sendo que o financiamento da rede rodoviária nacional a cargo desta entidade é assegurado pelos respectivos utilizadores e, subsidiariamente, pelo Estado, nos termos da lei e do contrato de concessão aplicável (art. 2.º).
127.A mesma contribuição corresponde à contrapartida pela utilização da rede rodoviária nacional, tal como esta é verificada pelo consumo dos combustíveis, e constitui uma fonte de financiamento da rede rodoviária nacional a cargo da Infraestruturas de Portugal, SA, no que respeita à respectiva concepção, projecto, construção, conservação, exploração, requalificação e alargamento, ainda que a exigência da contribuição não prejudique a eventual aplicação de portagens em vias específicas ou o recurso da entidade concessionária a outras formas de financiamento (art. 3.º).
128.A contribuição incide sobre a gasolina e o gasóleo rodoviário sujeitos ao imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos e dele não isentos (art. 4.º/1) e é devida pelos sujeitos passivos do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos, sendo aplicável à sua liquidação, cobrança e pagamento o disposto no CIEC (art. 5.º/1).
129.O produto da Contribuição de Serviço Rodoviário constitui receita própria da actualmente denominada Infraestruturas de Portugal, SA (art. 6.º).
130.A Requerente sustenta que a CSR foi criada por razões de ordem puramente orçamental, em vista à angariação de receitas próprias para financiamento da empresa pública concessionária da rede nacional de estradas, em violação do direito europeu, e, especialmente, do referido art. 1.º/2 da Directiva 2008/118. Em contraposição, a AT considera que a actividade da Infraestruturas de Portugal tem subjacente a prossecução de objectivos de redução da sinistralidade e de sustentabilidade ambiental, que se pode entender como motivo específico da criação da contribuição e não pode circunscrever-se a uma mera finalidade de natureza orçamental.
131.Analisando esta questão, interessa começar por ter presente a Directiva 2008/118, que estabelece o regime geral dos impostos especiais de consumo que incidem directa ou indirectamente sobre o consumo, entre outros, dos produtos energéticos, e, em especial, o seu art. 1.º/2, que tem a seguinte redacção:
Os Estados-Membros podem cobrar, por motivos específicos, outros impostos indirectos sobre os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo, desde que esses impostos sejam conformes com as normas fiscais da Comunidade aplicáveis ao imposto especial de consumo e ao imposto sobre o valor acrescentado no que diz respeito à determinação da base tributável, à liquidação, à exigibilidade e ao controlo do imposto, regras estas que não incluem as disposições relativas às isenções.
132.Interpretando esta disposição na perspectiva de saber se a CSR prossegue um motivo específico na acepção da Directiva, o despacho do TJUE de 7.2.2022, proferido em reenvio prejudicial no proc. C-460/21, começou por assinalar que para se considerar que prossegue um motivo específico, na acepção da referida disposição, um imposto deve visar, por si só, assegurar a finalidade específica invocada, de tal forma que exista uma relação directa entre a utilização das receitas e a finalidade da imposição em causa (§ 25). Acrescentando que só se pode considerar que um imposto que incide sobre produtos sujeitos a impostos especiais de consumo quando prossegue um motivo específico, na acepção do artigo 1.º, n.° 2, da Directiva 2008/118/CE, se esse imposto for concebido, no que respeita à sua estrutura, nomeadamente, à matéria colectável ou à taxa de tributação, de modo a influenciar o comportamento dos contribuintes num sentido que permita realizar o motivo específico invocado, por exemplo, através da tributação significativa dos produtos considerados para desencorajar o respectivo consumo (§ 27).
133.No desenvolvimento destes critérios gerais, o despacho do TJUE, na parte que mais releva, formula ainda as seguintes considerações:
29. No caso em apreço, importa salientar, em primeiro lugar, como resulta da jurisprudência referida no n.° 26 do presente despacho, que, embora a afectação predeterminada do produto da CSR ao financiamento, pela concessionária da rede rodoviária nacional, das competências gerais que lhe são atribuídas possa constituir um elemento a tomar em consideração para identificar a existência de um motivo específico, na acepção do artigo l.°, n.° 2, da Directiva 2008/118, essa afectação não pode, enquanto tal, constituir um requisito suficiente.
30. Em segundo lugar, para se considerar que prossegue um motivo específico, na acepção desta disposição, a CSR deveria destinar-se, por si só, a assegurar os objectivos de redução da sinistralidade e de sustentabilidade ambiental que foram atribuídos à concessionária da rede rodoviária nacional. Seria esse o caso, nomeadamente, se o produto deste imposto devesse ser obrigatoriamente utilizado para reduzir os custos sociais e ambientais especificamente associados à utilização dessa rede que é onerada pelo referido imposto. Seria então estabelecida uma relação directa entre a utilização das receitas e a finalidade da imposição em causa.
31. Em terceiro lugar, como resulta do n.° 14 do presente despacho, é certo que a Autoridade Tributária sustenta que existe uma relação entre a afectação das receitas geradas pela CSR e o motivo específico que levou à instituição deste imposto, uma vez que o decreto-lei que atribuiu a concessão da rede rodoviária nacional à IP impõe a esta última que trabalhe em prol, por um lado, da redução da sinistralidade nessa rede e, por outro, da sustentabilidade ambiental.
32. No entanto, como foi salientado no n.° 15 do presente despacho, resulta da decisão de reenvio que o produto do imposto em causa no processo principal não se destina exclusivamente ao financiamento de operações que supostamente concorrem para a realização dos dois objectivos mencionados no número anterior do mesmo despacho. Com efeito, as receitas provenientes da CSR destinam-se, mais amplamente, a assegurar o financiamento da actividade de concepção, projecto, construção, conservação, exploração, requalificação e alargamento da rede rodoviária nacional.
33. Em quarto lugar, os dois objectivos atribuídos à concessionária da rede rodoviária nacional portuguesa estão enunciados em termos muito gerais e não deixam transparecer, à primeira vista, uma real vontade de desencorajar a utilização quer dessa rede quer dos principais combustíveis rodoviários, como a gasolina, o gasóleo rodoviário ou o gás de petróleo liquefeito (GPL) automóvel. A este respeito, é significativo que o órgão jurisdicional de reenvio destaque, na redacção da sua primeira questão prejudicial, que as receitas geradas pelo imposto são genericamente afectadas à concessionária da rede rodoviária nacional e que a estrutura deste imposto não atesta a intenção de desmotivar um qualquer consumo desses combustíveis.
34. Em quinto lugar, o pedido de decisão prejudicial não contém nenhum elemento que permita considerar que a CSR, na medida em que incide sobre os utilizadores da rede rodoviária nacional, foi concebida, no que respeita à sua estrutura, de tal modo que dissuade os sujeitos passivos de utilizarem essa rede ou que os incentiva a adoptar um tipo de comportamento cujos efeitos seriam menos nocivos para o ambiente e que seria susceptível de reduzir os acidentes.
35. Por conseguinte, sem prejuízo das verificações que caberá ao órgão jurisdicional de reenvio efectuar atendendo às indicações que figuram nos n.ºs 29 a 34 do presente despacho, as duas finalidades específicas invocadas pela Autoridade Tributária para demonstrar que a CSR prossegue um motivo específico, na acepção do artigo l.°, n.° 2, da Directiva 2008/118, não se distinguem de uma finalidade puramente orçamental.
134.Revertendo à situação do caso, o que se constata é que a CSR o visa financiar a rede rodoviária nacional a cargo da EP - Estradas de Portugal, EPE. (actual Infraestruturas de Portugal, SA), sendo o financiamento assegurado pelos respectivos utilizadores, como contrapartida pela utilização da rede rodoviária nacional, utilização essa que é verificada pelo consumo dos combustíveis. Ademais, o produto da CSR constitui uma receita própria da Infraestruturas de Portugal, SA. e o financiamento da rede rodoviária nacional apenas subsidiariamente é assegurado pelo Estado.
135.A actividade de financiamento, concepção, projecto, construção, conservação, exploração, requalificação e alargamento da rede rodoviária nacional foi atribuída, em regime de concessão, à EP - Estradas de Portugal, EPE. (agora denominada Infraestruturas de Portugal, SA) pelo Decreto-Lei 380/2007, de 13.11. Nas bases da concessão igualmente se prevê que, entre outros rendimentos, a CSR constitua receita própria dessa entidade (Base 3 b)). E, por outro lado, nelas se estabelece, como uma das obrigações da concessionária, a prossecução dos objectivos de redução da sinistralidade e de sustentabilidade ambiental referidos no quadro II do anexo às presentes bases (Base 2/4, b)).
136.No quadro II do anexo apenas se estabelece, na Parte I, alguns objectivos de redução de sinistralidade por referência a certos indicadores de actividade (número de pontos negros, gravidade dos acidentes nas travessias urbanas, número de vítimas mortais), e, na Parte II, alguns objectivos de sustentabilidade ambiental em vista a assegurar, tendencialmente, os indicadores ambientais que aí são referidos.
137.Como resulta com clareza do despacho do Tribunal de Justiça proferido em reenvio prejudicial, as receitas provenientes da CSR destinam-se essencialmente a assegurar o financiamento da rede rodoviária mediante a consignação à Infraestruturas de Portugal, SA, e têm uma finalidade puramente orçamental. Nem a estrutura do imposto revela a intenção de desmotivar o consumo dos combustíveis. E, por outro lado, a finalidade específica que poderia justificar a criação da CSR de modo a poder considerar-se conforme o direito europeu é apresentada em termos muito genéricos, não tendo sido sequer feita a prova – que incumbia à Autoridade Tributária – de que tenham sido cumpridos os objectivos de redução da sinistralidade e de sustentabilidade ambiental, que se encontram definidos no quadro II do anexo às bases da concessão.
138.Haverá de concluir-se, face a todo o exposto, que a CSR, criada pela Lei 55/2007, de 31.8, não prossegue motivos específicos, na acepção do art. l.°/2, da Directiva 2008/118, na medida em que as suas receitas têm essencialmente como fim assegurar o financiamento da rede rodoviária nacional, não podendo considerar-se como suficiente, para estabelecer uma relação directa entre a utilização das receitas e um motivo específico, os objectivos genéricos de redução da sinistralidade e de sustentabilidade ambiental.
139.Importa ainda conferir – porque se trata de uma outra questão de direito levantada no presente processo – se o reembolso da CSR indevidamente liquidada ao contribuinte é admissível quando a carga fiscal resultante da incidência do imposto é repercutida nos consumidores finais através do correspondente aumento do preço, gerando uma situação de enriquecimento sem causa.
140.Quanto a esta matéria, e para considerar apenas os aspectos mais relevantes em apreciação, o Tribunal de Justiça pronunciou-se nos seguintes termos:
38. […] Assim, um Estado-Membro está, em princípio, obrigado a reembolsar os impostos cobrados em violação do direito da União, ao abrigo das regras processuais nacionais aplicáveis e no respeito pelos princípios da equivalência e da efectividade.
39. A obrigação de reembolsar os impostos cobrados num Estado-Membro em violação das disposições da União conhece apenas uma excepção. Com efeito, sob pena de conduzir a um enriquecimento sem causa dos titulares do direito, a protecção dos direitos garantidos na matéria pela ordem jurídica da União exclui, em princípio, o reembolso dos impostos, direitos e taxas cobrados em violação do direito da União quando seja provado que o sujeito passivo responsável pelo pagamento desses direitos os repercutiu efectivamente noutras pessoas.
40. Por conseguinte, incumbe às autoridades e aos órgãos jurisdicionais nacionais assegurar o respeito pelo princípio da proibição do enriquecimento sem causa, incluindo quando nada conste a este respeito no direito nacional.
[…]
42. Por conseguinte, um Estado-Membro só se pode opor ao reembolso de um imposto indevidamente cobrado à luz do direito da União quando as autoridades nacionais provarem que o imposto foi suportado na íntegra por uma pessoa diferente do sujeito passivo e quando o reembolso do imposto conduzisse, para este sujeito passivo, a um enriquecimento sem causa. Daqui resulta que, se só tiver sido repercutida uma parte do imposto, as autoridades nacionais só estão obrigadas a reembolsar o montante não repercutido.
43. Constituindo esta excepção ao princípio do reembolso dos impostos incompatíveis com o direito da União uma restrição a um direito subjectivo resultante da ordem jurídica da União, há que interpretá-la de forma restritiva, atendendo nomeadamente ao facto de que a repercussão de um imposto no consumidor não neutraliza necessariamente os efeitos económicos da tributação no sujeito passivo.
[…]
45. Não se pode, no entanto, admitir que, no caso dos impostos indirectos, exista uma presunção segundo a qual a repercussão teve lugar e que cabe ao contribuinte provar negativamente o contrário. Sucede o mesmo quando o contribuinte tenha sido obrigado, pela legislação nacional aplicável, a incorporar o imposto no preço de custo do produto em causa. Com efeito, essa obrigação legal não permite presumir que a totalidade do imposto tenha sido repercutida, mesmo no caso de a violação de essa obrigação conduzir a uma sanção.
46. O direito da União exclui assim que se aplique toda e qualquer presunção ou regra em matéria de prova destinada a fazer recair sobre o operador em causa o ónus de provar que os impostos indevidamente pagos não foram repercutidos noutras pessoas e que visem impedir a apresentação de elementos de prova destinados a contestar uma pretensa repercussão.
47. Além disso, mesmo na hipótese de vir a ser provado que o imposto indevido foi repercutido sobre terceiros, o respectivo reembolso ao operador não implica necessariamente um enriquecimento sem causa por parte deste, visto que a integração do montante do referido imposto nos preços praticados pode dar origem a prejuízos associados à diminuição do volume das suas vendas.
141.Como sublinha ainda o TJUE, a questão da repercussão ou da não repercussão em cada caso de um imposto indirecto constitui uma questão de facto que é da competência do órgão jurisdicional nacional, cabendo a este último apreciar livremente os elementos de prova que lhe tenham sido submetidos (§ 44).
142.No caso vertente, não há prova evidente de que tenha havido uma efectiva repercussão do imposto nos consumidores, de modo a poder a admitir-se que o reembolso do imposto indevidamente liquidado, por violação do direito da União Europeia, podia traduzir-se numa situação de enriquecimento sem causa por parte do operador.
143.Para essa demonstração, a AT admite que se possa tratar de prova impossível, já que o tributo não é individualizado em termos contabilísticos (sendo processado em conjunto com o ISP). Invoca, no entanto, desde logo, o dever de informação do comercializador de combustíveis ao consumidor (detalhando a CSR na factura, nos termos da Lei5/2019 de 11.1 e do Regulamento 141/2020 de 20.2 da ERSE). E afirma depois que, da análise dos elementos disponíveis sobre a Requerente, resulta que a CSR liquidada foi incluída no preço de venda dos combustíveis e consequentemente constitui encargo de quem os adquiriu. Transcreve também partes da Norma Contabilística e de Relato Financeiro 18 (NCRF 18) de onde retira a repercussão por princípio da CSR. Cita ainda um estudo da Entidade Nacional para o Sector Energético (ENSE) de onde retira também ser significativo o peso do ISP (que inclui a CSR) no preço dos combustíveis. E conclui assinalando que a repercussão estará provada através da contabilização das operações de compra e venda, tendo em conta o custo das mercadorias vendidas e das matérias consumidas (CMVMC). Até porque, se assim não fosse, a empresa estaria a sofrer prejuízos e a vender abaixo do custo, o que é ilegal (art. 5.º da Lei 166/2013).
144.Trata-se em todos os casos de meras ilações ou considerações genéricas, que, em substância, não permitem concluir que o imposto tenha sido parcial ou integralmente repercutido.
145.Ou seja, a AT, para justificar a ocorrência de uma efectiva repercussão do imposto nos consumidores, assenta em meros juízos presuntivos, sem efectuar a demonstração objectiva da realidade dos factos através de elementos de prova que se relacionem com os factores inerentes às transacções comerciais que foram realizadas.
146.Tendo em consideração a posição que a AT tem tomado nos processos envolvendo a CSR, não pode deixar de se salientar a dualidade de critérios (reprovável e causadora da maior perplexidade) que se consubstancia no facto de arguir a ilegitimidade dos requerentes quando – como é o caso – sejam sujeitos passivos da CSR por considerar que há uma repercussão evidente, ao passo que, quando os requerentes são consumidores finais, invoca novamente a ilegitimidade destes por não serem os sujeitos passivos do tributo, recusando liminarmente qualquer fenómeno de repercussão.
147.Em relação à situação em apreço, haverá que ter presente que, como resulta com evidência do despacho proferido pelo TJUE em reenvio prejudicial e outra jurisprudência nele citada, não é admissível a prova da repercussão de impostos indirectos através de presunção. E, como se refere no parágrafo 45, acima transcrito, mesmo que exista uma obrigação legal de incorporar o imposto no preço de custo do produto, essa obrigação, por si só, não permite presumir que a totalidade do imposto tenha sido repercutido. Não podendo extrair-se, por conseguinte, do tratamento contabilístico do custo das mercadorias vendidas, quando este custo deva incluir todos os gastos incorridos, incluindo a incidência do imposto, que a totalidade do imposto tenha sido repercutida no consumidor final.
148.Resta acrescentar, tal como foi também assinalado pelo Tribunal de Justiça, que a repercussão de um imposto no consumidor não neutraliza necessariamente os efeitos económicos da tributação no sujeito passivo e mesmo que viesse a provar-se que o imposto indevidamente liquidado foi repercutido sobre terceiros, o respectivo reembolso ao operador não implica necessariamente um enriquecimento sem causa por parte deste, visto que a integração do montante do referido imposto nos preços praticados pode dar origem a prejuízos associados à diminuição do volume das suas vendas.
149.Pelo que sempre seria necessário demonstrar que, nas condições de mercado resultantes do agravamento da tributação, o contribuinte teria beneficiado, ao menos parcialmente, por efeito da repercussão do imposto.
150.Por todo o exposto, não pode opor-se ao pedido de reembolso do imposto indevidamente liquidado uma suposta situação de enriquecimento sem causa por efeito da repercussão do imposto nos consumidores.
151.No sentido do exposto supra nos n.os 139 e seguintes, se pronunciaram os acórdãos proferidos nos proc. 564/2020-T, 24/2023-T e 113/2023-T.
152.A AT levanta também algumas questões de constitucionalidade que importa ponderar.
153.Assim, alega que ao reembolsar a CSR à Requerente o Estado estaria a transferir para esta entidade as verbas que os consumidores finais suportaram quando adquiriram os combustíveis, o que configuraria uma violação do princípio da justiça tributária, no sentido de justiça distributiva, por via do consagrado no ar. 103.º/1 da Constituição.
154.Como é sabido, o controlo difuso da constitucionalidade pelos tribunais é normativo, incidindo sobre uma norma ou interpretação normativa que tenha sido aplicada em decisão judicial ou em acto administrativo, competindo à parte suscitar de modo processualmente adequado a questão de constitucionalidade que se pretende ver apreciada (art. 72.º/2 da LTC).
155.A suscitação processualmente adequada da questão implica a precisa delimitação do seu objecto, mediante a especificação da norma, segmento normativo ou a dimensão normativa que se entende ser inconstitucional (acórdãos 450/06, 21/06, 578/07, 131/08) e a indicação das razões pelas quais se considera verificada a violação de normas ou princípios constitucionais (acórdãos 645/06, 708/06, 630/08), não bastando uma referência genérica a essas normas ou princípios ou a imputação da inconstitucionalidade aos próprios actos jurídicos que são objecto de impugnação judicial.
156.Tendo-se limitado a Requerida a imputar os vícios de inconstitucionalidade ao reembolso, por parte do Estado, da CSR suportada pelo contribuinte com a aquisição de combustíveis, sem indicação da norma ou interpretação normativa que entende terem sido aplicadas em violação da Lei Fundamental e sem um mínimo desenvolvimento quanto às razões que justificam um juízo de inconstitucionalidade, não há que tomar conhecimento de qualquer dessas questões.
157.A Requerente pede ainda a condenação da Autoridade Tributária no reembolso do imposto indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios.
158.De harmonia com o disposto no artigo 24.º b) do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a AT, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo, cabendo-lhe restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito. O que está em sintonia com o preceituado no art. 100.º da LGT, aplicável por força do disposto no art. 29.º/1 a) do RJAT.
159.Por efeito da reconstituição da situação jurídica em resultado da anulação do acto tributário, há assim lugar ao reembolso do imposto indevidamente pago.
160.A Requerente pede ainda a condenação da Autoridade Tributária no pagamento de juros indemnizatórios.
161.Ainda nos termos do art. 24.º/5 do RJAT é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previstos na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário, o que remete para o disposto nos art.os 43.º/1 e 61.º/5, de um e outro desses diplomas, implicando o pagamento de juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respectiva nota de crédito.
162.No caso de pedido de revisão oficiosa, em face do disposto no art. 43.º/3 c) da LGT, apenas são devidos juros indemnizatórios depois de decorrido um ano após a iniciativa do contribuinte, e não desde a data do desembolso da quantia liquidada, constituindo esse o entendimento jurisprudencial corrente (cfr., entre outros, os acórdãos do Pleno do STA de 21 de Fevereiro de 2024, proc. 093/23 e proc.º 098/2023).
163.No caso, o pedido de revisão oficiosa foi apresentado em 30 de Junho de 2023, pelo que são devidos juros indemnizatórios desde 1 de Julho de 2024, ou seja, a partir de um ano depois da apresentação do pedido de revisão oficiosa.
Decisão
Em face do supra exposto, decide-se
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Julgar procedente o pedido arbitral e anular os actos de liquidação de contribuição de serviço rodoviário impugnados, bem como a decisão de rejeição do pedido de revisão oficiosa contra eles deduzido;
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Condenar a Autoridade Tributária no reembolso do imposto indevidamente pago e no pagamento de juros indemnizatórios calculados desde 1 de Julho de 2024 até à data do processamento da respectiva nota de crédito.
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Condenar a Requerida no pagamento integral das custas do presente processo.
Valor do processo
Fixa-se o valor do processo em 9.816.926,81 € (nove milhões oitocentos e dezasseis mil novecentos e vinte seis euros e oitenta e um cêntimos) nos termos do disposto no art. 32.º do CPTA e no art. 97.º-A do CPPT, aplicáveis por força do disposto no art. 29.º/1 a) e b), do RJAT, e do art. 3.º/2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).
Custas
Nos termos da Tabela I anexa ao RCPAT, as custas são no valor de 121.788 € (cento e vinte e um mil setecentos e oitenta e oito euros), a pagar pela Requerida, nos termos dos art.os 12.º/2, e 22.º/4, do RJAT, e art. 3.º/2, do RCPAT e Tabela I anexa a esse Regulamento.
Notifique-se.
Lisboa, 14 de Agosto de 2024
A Presidente do Tribunal Arbitral
(Carla Castelo Trindade, vencida conforme declaração em anexo)
O Árbitro vogal
(Luís Menezes Leitão)
O Árbitro vogal, relator
(Rui M. Marrana)
Texto elaborado em computador.
A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.
DECLARAÇÃO DE VOTO
Com a devida vénia pelo presente colectivo, voto vencida por discordar do entendimento que fez vencimento quanto à caducidade do direito de acção.
Ao contrário do defendido pelo Tribunal Arbitral nos parágrafos 122 e 123 do acórdão, considero que o regime do reembolso por erro previsto nos artigos 15.º, n.º 3 e 16.º do Código dos IEC, aplicável aos Impostos Especiais sobre o Consumo (“IEC”), consiste em lei especial face ao regime de revisão dos actos tributários previsto no artigo 78.º da LGT.
Isto na medida em que é a própria Lei n.º 55/2007, de 31 de Agosto, que criou a Contribuição de Serviço Rodoviário, que remete no seu artigo 5.º, n.º 1, para o regime da “liquidação, cobrança e pagamento” previsto no Código dos IEC, onde se insere precisamente o regime de reembolso por erro acima referido.
Esta relação de especialidade entre os mencionados regime é, de certo modo, confirmada, por Sérgio Vasques e Tânia Carvalhais Pereira, Os Impostos Especiais de Consumo, Almedina, 2016, pp. 364 e ss, quando afirmam que “O reembolso por erro corresponde, materialmente, à revisão do ato tributário, com fundamento em erro dos serviços, previsto no artigo 78º da LGT, aqui com um prazo mais curto de 3 anos”.
Resulta do exposto que, no presente caso, a Requerente apenas tinha um “prazo de três anos a contar da data da liquidação do imposto” para apresentar pedido de reembolso por erro nos termos dos artigos 15.º, n.º 3 e 16.º do Código dos IEC, e já não um “prazo de quatro anos após a liquidação” conforme previsto no artigo 78.º da LGT.
Em termos práticos, significa isto que à data da apresentação do pedido de revisão oficiosa da CSR, em 30 de Junho de 2023, tinha já decorrido o prazo de três anos para requerer o reembolso por erro relativamente a todas as liquidações contestadas, já que a última delas data de 12 de Dezembro de 2019.
Nestes termos, teria julgado procedente a excepção de caducidade e absolvido a Requerida da instância, com as demais consequências legais.
(Carla Castelo Trindade)