Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 155/2014-T
Data da decisão: 2014-10-17  IRS  
Valor do pedido: € 17.944,47
Tema: IRS - Tributação de mais-valias na alienação onerosa de participações sociais em micro e pequenas empresas; art. 43º do CIRS.
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Decisão Arbitral

 

 

I – Relatório

 

1. No dia 19.02.2014, os Requerentes, A, contribuinte nº … e B, contribuinte …, casados, residentes na …, …, requereram ao CAAD a constituição de tribunal arbitral, nos termos do art. 10º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, com vista à anulação parcial da liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares nº ..., respeitante ao ano de 2012, tendo como sujeitos passivos os Requerentes e tendo ainda por objeto o ato de indeferimento expresso da reclamação graciosa apresentada contra aquele ato tributário.

Peticionam os Requerentes a anulação do referido ato tributário em metade do valor de 35.888,95 €, resultante da tributação à taxa especial prevista no art. 72º, nº 4 do Código sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (doravante “CIRS”), e ainda o pagamento de juros indemnizatórios sobre o valor que consideram indevidamente liquidado.

 

2. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira.

Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do art. 6.º do RJAT, por decisão do Senhor Presidente do Conselho Deontológico, devidamente comunicada às partes, nos prazos legalmente aplicáveis, foi designado árbitro o signatário, que comunicou ao Conselho Deontológico e ao Centro de Arbitragem Administrativa a aceitação do encargo no prazo regularmente aplicável.

O Tribunal Arbitral foi constituído em 24.04.2014.

 

3. A reunião prevista no artigo 18º do RJAT teve lugar no dia 18.06.2014, pelas 11 horas.

 

4. Os fundamentos apresentados pelos Requerentes, em apoio da sua pretensão, foram, sinteticamente, os seguintes:

Está em discussão o apuramento da liquidação sub judice na parte em que considerou 100% das mais-valias, na medida em que só deveria ter considerado 50% dado que a quota alienada representa a titularidade do capital social de uma pequena empresa, o C, Lda. (C).

 

Constituíram fundamento da reclamação graciosa a circunstância dos reclamantes não terem juntado aos autos comprovativo tanto da realização no valor de € 150.930,00 como da aquisição da quota no valor de € 15.000,00.

 

A alienação das quotas respeita a empresa qualificada como pequena empresa nos termos do anexo ao Decreto-Lei nº 372/2007, de 6 de Novembro para efeitos de aplicação do regime previsto no nº 3 do art. 43º do CIRS, pois, como decorre do nº 4 do mesmo artigo, a respetiva aplicação depende, apenas, do cumprimento dos requisitos previstos no anexo ao Decreto-Lei e não no cumprimento do Decreto-Lei no seu todo.

 

Neste sentido, foi a decisão do Tribunal Arbitral, de 10.10.2013, proferida no processo nº 40/2013-T que decidiu que “(…) para aproveitar do regime previsto nos nºs 3 e 4 do artigo 43º do Código do IRS, não se revela necessário “Apresentar a certificação prevista no Decreto-Lei nº 372/2007, revelando-se possível provar “a qualidade de PME por qualquer outro meio adequado para o efeito” ”.

 

O C cumpria todos os requisitos previstos no Anexo ao Decreto-Lei nº 372/2007, de 6 de Novembro, para efeitos da respetiva qualificação como pequena ou micro empresa (“PME”) de acordo com o último exercício encerrado (2011) antes da alienação (Fevereiro de 2012).Com efeito, o C, exercia, em 2011, a atividade de prática médica e clínica especializada.

 

No ano de 2011, o C, o balanço anual da empresa era de 1.245.435,79 €, o volume de negócio de 2.777.321,06 € e o número de trabalhadores de 28.

 

O D, Lda, era detido a 65% pelo C, e tinha balanço anual de 201.431 €, volume de negócios de 205.153,54 € e 3 trabalhadores.

 

 A E, Lda, era detida a 90% pelo C, e tinha balanço anual de 97.387,14 €, volume de negócios de 82.519,91 € e 3 trabalhadores.

 

 

5. A ATA – Administração Tributária e Aduaneira, chamada a pronunciar-se, contestou a pretensão dos Requerentes, defendendo-se por impugnação.

Alegou a Requerida, ainda em síntese, o seguinte:

 

A reclamação foi indeferida com fundamento no facto da empresa em causa ser uma média empresa.

 

Os Requerentes em sede de direito de audição prévia, no âmbito do procedimento de reclamação graciosa, apresentaram certificação emitida pelo IAPMEI, segundo a qual o C foi qualificado como “Média empresa”.

 

Esta certificação resulta, obviamente, da aplicação dos conceitos e critérios que constam do anexo ao Decreto-Lei nº 372/2007, de 6 de Novembro.

 

E não se diga que a certificação do IAPMEI apresentada se reporta a dados de 2012, porquanto, de acordo com o no nº 1 do art. 4º do aludido Anexo, a certificação efetuada ao C, em 2012, baseou-se nos dados do último exercício contabilístico, calculados numa base anual, ou seja, os dados de 2011.

 

Aliás, o IAPMEI fez uma avaliação da dimensão histórica do C, qualificando este último, nos anos anteriores, de 2010 e 2011, também como média empresa.

 

Como resulta do processo administrativo, a administração tributária, por consulta à certificação do IAPMEI e aos fundamentos que a sustentaram, verificou que o C tinha, à data dos factos relevantes, empresas associadas e parceiras, cujos dados, nos termos considerados no nº 2 do art. 6º, são contabilizados na avaliação da categoria da empresa.

 

Na verdade, o C tinha como empresas associadas:

F, SGPS.

G SGPS SA.

H, SA.

 

Ora, o resultado da agregação dos dados do C com os de tais empresas, como demonstrado no p.a., não permite qualifica-lo como uma pequena empresa, nos termos do art. 2º do anexo ao Decreto-Lei nº 372/2004.

 

6. Em 24.09.2014, pelas 15.30 horas, teve lugar a reunião arbitral para inquirição das testemunhas arroladas pelos Requerentes.

Na mesma reunião, após a inquirição de testemunhas, as partes apresentaram alegações orais.

 

7. O tribunal é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído nos termos do RJAT.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas.

O processo não padece de vícios que o invalidem.

 

 

II – A matéria de facto relevante

8. O tribunal considera provados os seguintes factos:

 

 

1.                  Em 20.07.2013, a Requerida efetuou a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares nº ..., respeitante ao ano de 2012, tendo como sujeitos passivos os Requerentes.

2.                  Desta liquidação consta a tributação autónoma, à taxa especial de 26,5%, de 100% das mais-valias realizadas pelos requerentes na alienação onerosa, pelo preço de 150.930,00 € duma quota com o valor nominal de 15.000 € na sociedade C, do que resultou uma tributação específica a este título no valor de 35.888,95 €.

3.                  Os Requerentes pagaram o imposto liquidado na totalidade.

4.                  No preenchimento do anexo G da declaração de IRS respeitante ao ano de 2012, os Requerentes haviam declarado no quadro 8, Campo 801, a alienação em causa ocorrida em 8 de fevereiro daquele ano, tendo preenchido o quadro 8-A respeitante a alienação onerosa de partes sociais de micro e pequenas empresas, onde declararam que as quotas alienadas respeitavam a uma sociedade micro ou pequena empresa.

5.                  Por não concordarem com o ato de liquidação identificado em 1), os Requerentes apresentaram em 19.08.2013 reclamação graciosa daquele ato tributário.

6.                  A razão da discordância invocada pelos Requerentes reside no entendimento de que a sociedade C, era à data do facto tributário uma pequena empresa e que, em consequência, o saldo das mais-valias deveria ter sido apenas considerado em 50% do seu valor, nos termos do art. 43º, nº 3, do CIRS.

7.                  No âmbito do processo de reclamação graciosa, a Requerida notificou os Requerentes, para efeitos do exercício do direito de audição prévia, da sua intenção de indeferir a reclamação graciosa, tendo alegado, para o efeito que “para justificar o alegado, o reclamante deveria ter juntado aos autos os comprovativos tanto da realização (venda) no valor de € 150.930,00 como da aquisição (compra) no valor de € 15.000,00, assim como da certidão original emitida pelo IAPMEI e que certifique que a sociedade C S.A. – NIPC. … cumpre o requisito de “micro ou pequena empresa””.

8.                  No exercício do direito de audição apresentado em 30.10.2013, os Requerentes alegaram que a AT pode por consulta direta verificar de imediato no IAPMEI o processo de certificação da empresa em causa, bastando para o efeito introduzir o número de contribuinte da entidade.

9.                  Ainda assim, a Requerente juntou aos autos de reclamação graciosa o certificado emitido pelo IAPMEI relativamente ao C., alegando em simultâneo que a entidade havia sido “classificada, por erro do IAPMEI, como uma empresa MÉDIA, o que também não é verdade, conforme se pode observar através da IES 2012 da entidade referida anteriormente, que se junta como Doc. 2”.

10.              Com o exercício do direito de audição, os Requerentes juntaram ainda como doc. nº 3 o contrato de compra e venda das quotas de que resultaram as mais-valias em causa.

11.              A reclamação graciosa foi indeferida, constando da decisão que:

O sujeito passivo apresenta fotocópia do certificado – fl. 36 dos autos, onde o IAPMEI, I.P. (Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e à inovação) refere que a sociedade “C – NIPC ...” satisfaz os requisitos de “Média Empresa” e, contrariamente ao que é referido pelo reclamante, não se trata de um erro por parte do IAPMEI, I.P. (Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e à inovação).

Na consulta direta efetuada na Divisão de Justiça Administrativa – fls.132 a 136 dos autos, verifica-se que a reclamante tem relações com empresas associadas, nos termos do nº 2 (último parágrafo), do art. 6º (Determinação dos dados da Empresa) do Anexo do Decreto-Lei nº 372/2007 de 6 de Novembro, que refere que “aos dados referidos nº 1º e 2º parágrafos devem juntar-se 100% dos dados das eventuais empresas direta ou indiretamente associadas à empresa considerada, que não tenham sido retomados por consolidação nas contas”, pelo que a sociedade não pode ser considerada “Pequena ou Micro empresa”.

12.              No relatório de Certificação emitido pelo IAPMEI relativamente ao C., consta esta empresa com o volume de negócios de 2.777.321,06 € e 1.245.435,79 € de Balanço e como empresas associadas a F, SGPS, SA (100 %) com um volume de negócios de 0,00 € e um balanço de 2.153.789,00 €; a sociedade G SGPS SA (100%) com um volume de negócios de 0,00 € e um balanço de 3.633.260,00 €; a sociedade H, S.A. (100 %) com um volume de negócios de 2.845.265,248,00 € e um balanço de 23.785.455,00 €, constando ainda como parceira (29,09 %) a sociedade I SGPS com 0,00 € de volume de negócios e 290,90€ de Balanço, dos que resulta um volume de negócios total de 2.848.042.569,06 € e um balanço total de 30.818.230,69€.

13.              Neste relatório consta como data de submissão 31.12.2012 e data de efeito 31.12.2012, mencionando-se ainda na “dimensão histórica” relativamente quer a 2010, quer a 2011 “média”.

14.              No certificado também emitido pelo IAPMEI menciona-se como “data da decisão“ 31.12.2012 e como “data de efeito” 31.12.2012.

15.              Da certidão do registo Comercial da sociedade C. consta que a F, SGPS, SA consta do registo como titular inscrita do capital social da mesma em 05.03.2012, data em que foi inscrita a transformação da sociedade em sociedade anónima, decorrendo do teor de tal certidão que até essa data nunca havia estado inscrita como sócia da mesma.

16.              Em 8 de Fevereiro de 2012 a F, SGPS, SA, adquiriu aos requerentes e aos demais sócios da sociedade C, a totalidade das quotas correspondente a cem por cento do capital social da sociedade (Cfr. Contrato de fls. 93 a 122 do processo administrativo).

17.              Do considerando A) deste contrato consta que o Grupo C. (“C”), é composto pelas seguintes sociedades, para além da própria “C”):

- D, Lda (“D”), pessoa coletiva nº ...;

- E, Lda, (“E”), pessoa coletiva nº ....

18. Do ponto 1.1.13 do mesmo contrato consta que “Grupo C” “significa o conjunto de sociedades referida no considerando A”.

19. Do ponto 1.1.14 do mesmo contrato consta que “Grupo H” é ” O conjunto de empresas que atualmente a compradora, bem como os relatórios … e …, o quais se dedicam à produção e comercialização de …”.

20. Da informação empresarial simplificada da “C”, respeitante ao ano de 2011 constam como empresas participadas  do  “C” as seguintes:

- D, Lda (“D”), pessoa coletiva nº ...;

- E, Lda, (“E”), pessoa coletiva;

21.Até 8 de Fevereiro de 2012, data em que a empresa F, SGPS, SA, adquiriu as quotas representativas do seu capital social, a empresa C (“C”) não era empresa associada nem parceira daquela sociedade nem das sociedades G SGPS SA; H, S.A. e  I SGPS, nem com estas havia tido qualquer tipo de relação jurídica.

22.O C., exercia, em 2011, a atividade de prática médica e clínica especializada.

23.No ano de 2011, o C., o balanço anual da empresa era de 1.245.435,79 €, o volume de negócio de 2.777.321,06 € e o número de trabalhadores de 28.

24.O D, Lda, era detido a 65% pelo C. e tinha balanço anual de 201.431 €, volume de negócios de 205.153,54 € e 3 trabalhadores.

25. A E, Lda, era detido a 90% pelo C e tinha balanço anual de 97.387,14 €, volume de negócios de 82.519,91 € e 3 trabalhadores.

 

A prova dos factos dados como provados resulta dos documentos juntos aos autos pelos Requerentes, dos documentos constantes do processo administrativo e das posições das partes manifestadas nos articulados.

Especificamente no que respeita ao facto dado como provado sob o número 21, a prova do mesmo resultou de vários documentos dos quais cumpre destacar o contrato de compra e venda de participações sociais de 8.02.2012 pelo qual a F, SGPS, adquiriu a totalidade das quotas do “C” e do qual decorre claramente que o “Grupo C” e o “Grupo H”, eram grupos distintos e não tinham, até essa data, qualquer relação entre si e que, ao invés, foi só com tal negócio que passaram a fazer parte do mesmo grupo, o que foi confirmado por outros documentos, designadamente, a declaração “IES” do “C” respeitante ao exercício de 2011, a certidão de registo comercial desta empresa e ainda e-mail da autoria de J, funcionário do IAPMEI, datado de 12.09.2014, endereçado à mandatária dos Requerentes.

O teor dos documentos foi, ainda, confirmado pelos depoimentos de várias testemunhas, que se revelaram coerentes, isentos e alicerçados em razões de ciência sólidas.

K, foi gerente e mandatário do C, até à data da venda das participações sociais pelos requerentes e demais ex-sócios, que ocorreu em 8.02.2012.

Referiu que as únicas sociedades em que o C detinha participações sociais até essa data eram o E, Lda e o D, Lda, tendo esclarecido que, até essa data, não havia qualquer tipo de ligação entre o C e as empresas F, SGPS; G SGPS, SA; H SA e I SGPS.

L, atualmente Diretor Financeiro e executivo da H, S.A., e diretor financeiro à data da venda, referiu que o C, nunca foi sócio das sociedades F, SGPS; G SGPS, SA; H SA e I SGPS, nem nunca teve com estas qualquer ligação antes de 8.02.2012.

Referiu ainda, que a certificação pedida junto do IAPMEI foi efetuada em finais de 2012, a 31.12.2012 ou noutro dia de Dezembro de 2012 e que o pedido foi feito por outro membro da equipa.

M iniciou funções na H em 18.06.2012 como responsável pela tesouraria de todo o grupo, incluindo o C, SA. Foi o responsável pelo pedido de certificação de PME por esta empresa, sendo que era a primeira certificação recordando-se que haveria um processo pendente mas não tem a certeza de tal facto.

Referiu que a empresa C, em 2011 não fazia parte do grupo e que poderá ter havido um lapso no preenchimento dum campo do formulário pois quando referiu a relação desta empresa com as sociedades F, SGPS; G SGPS, SA; H SA e I SGPS, queria referir-se à atualidade.

Acrescentou que ficou incrédulo quando teve conhecimento desta situação.

Todos estes depoimentos e os documentos acima mencionados são intrinsecamente coerentes e corroboram-se mutuamente.

 

Com interesse para a decisão da causa inexistem factos não provados

 

-III- O Direito aplicável

 

 

9. Dispõe o art. 10º, nº 1 do Código do Imposto sobre os rendimentos das pessoas singulares que:

Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de:

(…)

b) Alienação onerosa de partes sociais (…)”.

 

Por outro lado, estabelece o nº 4 do mesmo artigo que:

“O ganho sujeito a IRS é constituído:

a)      Pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição (…)”.

 

Dispõe, ainda, o art. 43º do mesmo código que:

1-O valor dos rendimentos qualificados como mais valias é o correspondente ao saldo apurado entre as mais-valias e as menos valias realizadas no mesmo ano (…).

(…)

3-O saldo referido no nº 1, respeitante às transmissões previstas na alínea b) do nº 1 do art. 10º, relativo a micro e pequenas empresas não cotadas nos mercados regulamentado ou não regulamentado da bolsa de valores, quando positivo, é igualmente considerado em 50% do seu valor.

4- Para efeitos do número anterior entende-se por micro e pequenas empresas as atividades definidas, nos termos do anexo ao Decreto-Lei nº 372/2007, de 6 de Novembro”.

 

O art. 72º, nº 4 do CIRS, na redação em vigor em 31.12.2012, previa para o facto tributário em causa a taxa especial de 26,5% por cento tendo o contribuinte a opção pelo englobamento, nos termos do nº 7 do mesmo artigo (que não foi exercida no caso sub judice).

 

10. O art. 1º, do Decreto-Lei nº 372/2007, de 6 de Novembro, estabelece que:

1- É criada a certificação por via electrónica de micro, pequena e média empresas, adiante designadas por PME.

2- A certificação referida no número anterior permite aferir o estatuto de PME de qualquer empresa interessada em obter tal qualidade.

(…)”.

 

Por sua vez, estabelece o art. 2º do mesmo diploma que “Para efeitos do presente Decreto-Lei, a definição de PME, bem como os conceitos e critérios a utilizar para aferir o respectivo estatuto, constam do seu anexo, que dele faz parte integrante (…)”.

 

Os objetivos da certificação vêm previstos no art. 5º do Decreto-Lei em causa, prevendo o art. 6º o procedimento pelo qual “os interessados” devem formular o seu pedido.

Dos objetivos da certificação, previstos no art. 5º, nenhum tem aplicação ao benefício fiscal previsto no art. 43º, nº 3, do CIRS. Por outro lado, o art. 3º do Decreto-Lei em causa faz referência à sua aplicabilidade às empresas que necessitem de apresentar e comprovar o estatuto de PME no âmbito de procedimentos administrativos para cuja instrução ou decisão final seja legalmente ou regulamentarmente exigido.

Resulta, assim, do regime legal, que o mesmo é aplicável às empresas e que são estas as interessadas na certificação em questão, detendo, também, em consequência, a legitimidade para o respetivo procedimento. Os titulares das participações sociais, enquanto tal, não detêm, portanto, a legitimidade para o respetivo pedido de certificação que, mesmo para as empresas, apenas é necessário no âmbito de procedimentos administrativos para cuja instrução ou decisão final seja legalmente ou regulamentarmente exigido.

No caso em apreço, do art. 43º, nº 3, do CIRS não resulta que a certificação seja legalmente exigida. Ao invés, o nº 4, do art. 43º deste código remete expressamente para o anexo ao Decreto-Lei nº 372/2007 e não para o Decreto-Lei no seu todo.

Assim sendo, não pode deixar de se concluir que para a aplicação do nº 3, do art. 43º do CIRS basta que o alienante da participação social em causa faça a prova de que, à luz do anexo, a sociedade em causa era efetivamente uma micro ou pequena empresa, não sendo necessário que tal entidade fosse detentora da certificação emitida pelo Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas.

Foi, também, neste sentido, o entendimento do tribunal arbitral, no processo 40/2013-T[1], que se acompanha e onde se pode ler:

A remissão do nº 4 do art. 43º do CIRS deve considerar-se apenas para o Anexo do Decreto-Lei nº 372/2007, como alegam os Requerentes, ou para o decreto-lei no seu todo, como alega a requerida.

Em primeiro lugar, importa ter presente que o art. 9º, nº 3, do Código Civil, aplicável ex vi do artigo 29º, nº 1, alínea e), do RJAT, dispõe que “na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.”

Ora, a verdade é que o nº 4 do art. 43º do CIRS remete expressamente para o Anexo ao Decreto-Lei nº 372/2007 e não para o diploma legal no seu todo. Se o legislador tivesse querido que a remissão em causa fosse para o texto do diploma legal, certamente que se teria expressado em conformidade.

(…).

O que o legislador fiscal quis no nº 4 do art. 43º do CIRS foi apenas importar, para efeito de aplicação do nº 3, os conceitos de micro e de pequena empresa e não importar um meio de prova da condição de PME. O desiderato do legislador é o de que a remissão  seja feita especificamente para o Anexo, por ser no anexo que se contêm as definições de microempresa e de pequena empresa.

Ao contrário do que pretende a Requerida, a lei não exige qualquer requisito formal consistente na apresentação da certificação electrónica. Desde logo, seria estranho, como notam os Requerentes, que fosse exigido a determinado sujeito passivo um documento que não está na sua disponibilidade obter, nada relevando para o efeito, como é evidente, a pessoa em questão ter sido ou não sócio-gerente da empresa em causa”.

A própria Requerida veio acolher esta interpretação na recente circular nº 7/2014, do Diretor Geral dos Impostos, de 29.07.2014, onde se pode ler:

“(…) a qualificação de micro ou pequena empresa para efeitos de aplicação dos nºs 3 e 4  artigo 43º do CIRS, deve assentar na realidade material das entidades cujas partes sociais foram objeto de transmissão onerosa, com base na verificação dos requisitos materiais vertidos no anexo ao Decreto-Lei 372/2007, de 6 de Novembro, à data da alienação, impendendo sobre os sujeitos passivos o respetivo ónus da prova, nos termos do nº 1 do art. 74º da Lei Geral Tributária.

6. Por conseguinte:

a) A existência de Certificação emitida pelo IAPMEI, válida à data da alienação das partes sociais, faz presumir a verificação dos requisitos materiais constantes do anexo ao Decreto-Lei nº 372/2007, de 6 de novembro, pelo que releva como prova bastante do estatuto de micro ou pequena empresa para efeitos do regime previsto nos nºs 3 e 4 do artigo 43º do CIRS.

b) Caso a empresa não seja detentora de Certificação como micro ou pequena empresa, nos termos antes referidos, cumpre, ainda assim, aferir de a entidade, à data da alienação das parte sociais, preenchia os requisitos materiais constantes do anexo ao Decreto-Lei nº 372/2007, de 6 de novembro, com a consequente e eventual qualificação da entidade como micro ou pequena empresa para efeitos do nº 3 do art. 43º do CIRS

 

11.Cabe, assim, verificar se, face à matéria de facto provada, a sociedade C, Lda, era à data dos factos relevantes, uma pequena empresa como alegam os Requerentes, ou antes uma média empresa como alega a Requerida.

 

12. Nos termos do art. 1º do Anexo do Decreto_Lei 372/2007 “Entende-se por empresa qualquer entidade que, independentemente da sua forma jurídica, exerce uma actividade económica (…)”.Quanto a este aspeto, é de observar que resulta da matéria de facto provada que o “C” exercia uma atividade económica.

Por sua vez, estabelece o art. 2º, nº 2, do mesmo diploma que “Na categoria das PME, uma pequena empresa é definida como uma empresa que emprega menos de 50 pessoas e cujo volume de negócios anual ou balanço total anual não excede 10 milhões de euros”.

Dispõe, ainda, o no 3º, do art. 3º que:

Entende-se por «empresas associadas» as empresas que mantêm entre si uma das seguintes relações:

a)      Uma empresa detém a maioria dos direitos de votos dos acionistas ou sócios de outra empresa;

(…)

 

Por outro lado, nos termos do art. 4º, nº 1 do anexo em questão “Os dados considerados para o cálculo dos efetivo e dos montantes financeiros são os do último exercício contabilístico encerrado, calculados numa base anual. Os dados são tidos em conta a partir da data de encerramento das contas (…)”.

 

Daqui decorre que a sociedade C, tinha à data dos factos relevantes para a sua qualificação como pequena empresa, como empresas associadas, o D, Lda, da qual era titular de a 65% do capital social e a E, Lda, da qual era titular de 90% do capital social e que, naquela data, não tinha empresas parceiras.

 

13. Nos termos do art. 6º do referido anexo:

(…).

2- Os dados incluindo os efetivos, de uma empresa que tenha empresas parceiras ou associadas são determinados com base nas contas e em outros dados da empresa, ou – caso existam- das contas consolidadas nas quais a empresa for retomada por consolidação.

(…)

Aos dados referidos no primeiro e segundo parágrafo devem juntar-se 100 % dos dados das eventuais empresas directa ou indirectamente associadas à empresa considerada, que não tenham sido retomadas por consolidação nas contas.

3-(…)

Para efeitos da aplicação do nº 2, os dados das empresas associadas à empresa considerada resultam das respectivas contas e de outros dados, consolidados, caso existam. (…)”

 

14. Assim sendo, aos dados da empresa C, há que adicionar os dados das empresas associadas acima referidas.

Ora, tal como resulta do probatório, no ano de 2011, o C, o balanço anual da empresa era de 1.245.435,79 €, o volume de negócio de 2.777.321,06 € e o número de trabalhadores de 28.

Por outro lado, o D, Lda., tinha balanço anual de 201.431 €, volume de negócios de 205.153,54 € e 3 trabalhadores.

Por sua vez, a E, Lda., tinha balanço anual de 97.387,14 €, volume de negócios de 82.519,91 € e 3 trabalhadores.

Por conseguinte, considerando os dados das três empresas, o volume de negócios anual era de 3.064.994,51 €, o Balanço de 1.544.253,93 € e o número de trabalhadores de 34, pelo que a empresa C, à data dos factos relevantes, era uma pequena empresa face ao art. 2º, nº 2 do Anexo ao Decreto-Lei nº 372/2007, de 6 de Novembro.

Assim sendo, nos termos do art. 43º, nº 3, do CIRS, o saldo das mais valias apuradas apenas poderia ser considerado em metade do seu valor não podendo, pois, deixar de proceder a pretensão anulatória dos impugnantes.

 

15. Os impugnantes vieram, ainda, peticionar o pagamento de juros indemnizatórios uma vez que pagaram a totalidade do valor da liquidação.

Nos termos do art. 43º, nº 1, da Lei Geral Tributária “São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”.

No caso em apreço, verifica-se que os Requerentes apresentaram a sua declaração de IRS nos termos da lei e de acordo com a verdade material apurada nos autos. A Requerida, essencialmente por ter feito uma interpretação do art. 43º, nºs 3 e 4 do CIRS, que não se afigura correta e que a própria Requerida, entretanto, já abandonou, conforme resulta da circular nº 7/2014, procedeu à tributação das mais valias em causa considerando a totalidade do seu valor e não apenas cinquenta por cento, conforme resulta do art. 43º, nº 3, do CIRS.

Assim sendo, verifica-se a existência a erro imputável aos serviços sendo, pois, de acolher também esta pretensão dos Requerentes.

 

 

 

 

-IV- Decisão

 

                                               Assim, decide o Tribunal arbitral:

 

Julgar totalmente procedente o pedido de pronúncia arbitral anulando-se o parcialmente o ato de liquidação, no valor peticionado de 17.944,47 € (dezassete mil novecentos e quarenta e quatro euros e quarenta e sete cêntimos) e condenar a Requerida a pagar juros indemnizatórios aos Requerentes sobre o montante em causa desde a data do pagamento do imposto indevido.

 

Valor da ação: 17.944,47 € (dezassete mil novecentos e quarenta e quatro euros e quarenta e sete cêntimos) nos termos do disposto no art. 315.º n.º 2, do CPC e 97.º-A,n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem.

 

 

Custas pela Requerida, no valor de 1224 €, nos termos do nº 4 do art. 22º do RJAT.

 

 

Lisboa, CAAD, 17 de Outubro de 2014

 

 

                            O Árbitro

 

 

                                                   (Marcolino Pisão Pedreiro)

 

 



[1]https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?s_processo=40%2F2013T&s_data_ini=&s_data_fim=&s_resumo=&s_artigos=&s_texto=&id=86