Decisão Arbitral
Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Prof. Doutor Francisco Nicolau Domingos e Dr. Arlindo José Francisco (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 09-05-2024, acordam no seguinte:
1. Relatório
A..., titular do número de identificação fiscal ... (doravante designado por “Primeiro Requerente”), e B..., titular do número de identificação fiscal ... (doravante designada por “Segunda Requerente”), ambos residentes na Rua ..., n.º ..., ..., ...-... Alcobaça, apresentaram, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), pedido de pronúncia arbitral tendo em vista:
– ser declarado ilegal e anulado o despacho proferido Senhor Diretor de Finanças Adjunto de Leiria em 22 de novembro de 2023 que rejeitou liminarmente o pedido de revisão oficiosa com o n.º ...2023..., o qual tinha por objeto o ato de liquidação de IRS relativo a 2018 com o n.º 2019 ... e data de 3 de julho de 2019;
– ser declarado ilegal e anulado o ato de liquidação de IRS relativo a 2018 com o n.º 2019 ... e data de 3 de julho de 2019, no montante correspondente a € 60.096,59, por ter indevidamente submetido a tributação uma mais-valia obtida com a alienação de participações sociais adquiridas antes de 1 de janeiro de 1989, violando, assim, a exclusão de tributação em IRS que resulta do regime transitório consagrado no artigo 5.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de novembro, bem como por não ter dado relevância à menos-valia apurada igualmente neste contexto;
– em consequência, ser determinada a restituição aos Requerentes do IRS indevidamente liquidado e pago em excesso em relação a 2018, no montante de € 60.096,59, acrescido de juros indemnizatórios desde 30 de junho de 2024 (data em que a apresentação do pedido de revisão oficiosa completa um ano) até à data de processamento da nota de crédito.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 29-02-2024.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
Em 17-04-2024, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 08-05-2024.
A Autoridade Tributária e Aduaneira não apresentou resposta e, em 11-06-2024, veio comunicar a revogação do acto impugnado, juntando cópia de um despacho nesse sentido em que, além do mais, se reconhece à Requerente o direito a juros indemnizatórios a partir de 30-06-2024.
Por requerimento de 26-06-2024, a Requerente veio dizer o seguinte, em suma, que «confirmada, em decorrência do douto despacho da Exma. Senhora Subdiretora-Geral da Área dos Impostos sobre o Rendimento de 6 de junho de 2024, a eliminação da ordem jurídica do ato de liquidação impugnado, isto é, da primeira liquidação ou liquidação original de IRS do ano de 2018, o processo arbitral torna-se destituído de objeto, o que consubstancia uma causa de extinção da instância por inutilidade superveniente (cf. artigo 277.º, alínea e), do Código de Processo Civil, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT)» e que a responsabilidade pelas custas do processo deve ser imputada à Autoridade Tributária e Aduaneira.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, e é competente.
As partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades.
Importa apreciar a questão da inutilidade superveniente da lide.
2. Matéria de facto
Mostram os autos o seguinte:
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A Autoridade Tributária e Aduaneira foi notificada da apresentação do pedido de pronúncia arbitral, por correio electrónico de 29-02-2024;
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Em 09-05-2024, foi constituído o Tribunal Arbitral;
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Por despacho de 06-06-2024, a Autoridade Tributária e Aduaneira revogou a liquidação impugnada e reconheceu aos Requerentes o direito a juros indemnizatórios nos termos em que os peticionaram;
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Em 07-06-2024, a Autoridade Tributária e Aduaneira informou CAAD do despacho de revogação.
3. Inutilidade superveniente da lide
O objecto do processo arbitral é um acto de liquidação de tributos, do tipo dos referidos no artigo 2.º, n.º 1, do RJAT.
A Autoridade Tributária e Aduaneira dispõe do prazo de 30 dias a contar do conhecimento do pedido de constituição do tribunal arbitral, para proceder à revogação, ratificação, reforma ou conversão do ato tributário cuja ilegalidade foi suscitada, nos termos do n.º 1 do artigo 13.º do RJAT.
Findo esse prazo, a administração tributária fica impossibilitada de praticar novo acto tributário relativamente ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, imposto e período de tributação, a não ser com fundamento em factos novos (n.º 3 do mesmo artigo 13.º).
Revogado o acto impugnado e reconhecido pela Autoridade Tributária e Aduaneira e reconhecido o direito dos Requerentes a juros indemnizatórios a partir de 30-06-2024, como peticionaram, estão satisfeitas as pretensões formuladas pela Requerente.
Assim, não tem utilidade o prosseguimento do processo.
Por isso, verifica-se uma excepção dilatória que é causa de extinção da instância e implica a absolvição da Requerida da instância, nos termos dos artigos 277.º, alínea e), e 278.º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Civil, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.
4. Encargos do processo
De harmonia com o disposto no artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, «da decisão arbitral proferida pelo tribunal arbitral consta a fixação do montante e a repartição pelas partes das custas directamente resultantes do processo arbitral».
Pelo que se referiu ocorre uma causa de extinção da instância que é imputável a Autoridade Tributária e Aduaneira, pois apenas revogou a liquidação depois de constituído o Tribunal Arbitral.
A regra básica sobre responsabilidade por encargos dos processos é a de que deve ser condenada parte que a elas houver dado causa, entendendo-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).
No caso em apreço, a causa de extinção da instância é imputável à Autoridade Tributária e Aduaneira, pelo que lhe é imputável a responsabilidade pelas custas do presente processo.
5. Decisão
Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:
– julgar extinta a instância;
– absolver da instância a Autoridade Tributária e Aduaneira;
– condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagar as custas do presente processo.
6. Valor do processo
De harmonia com o disposto no art. 306.º n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 60.096,59.
7. Custas
Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 2.448,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo Autoridade Tributária e Aduaneira.
Lisboa, 26-06-2024
Os Árbitros
(Jorge Lopes de Sousa)
(Francisco Nicolau Domingos)
(Arlindo José Francisco)