Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 1064/2023-T
Data da decisão: 2024-07-04   Outros 
Valor do pedido: € 923.361,96
Tema: Contribuição de Serviço Rodoviário; Competência dos tribunais arbitrais para apreciar actos de repercussão; Legitimidade dos repercutidos para suscitar a ilegalidade dos actos de liquidação de impostos especiais de consumo.
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SUMÁRIO:

I – Tendo sido formulado pedido de declaração de ilegalidade dos actos de repercussão da CSR e de actos de liquidação desta por parte de Requerente que não é sujeito passivo de ISP, importa aferir preliminarmente a possibilidade de o Tribunal arbitral se pronunciar sobre uns e sobre outros.

II – Como por definição, os actos de repercussão são diferentes dos actos de liquidação e uma vez que a competência legalmente atribuída aos Tribunais arbitrais se circunscreve, no aqui relevante, à avaliação de actos de liquidação, os actos de repercussão são, qua tale, inarbitráveis.

III – Os únicos factos relevantes para apurar a legitimidade da Requerente para impugnar os actos de liquidação da CSR são os referentes às relações estabelecidas com o(s) sujeito(s) passivo(s) que intervieram nesses actos.

IV – O círculo de potenciais impugnantes dos actos de liquidação de impostos especiais de consumo coincide necessariamente com o círculo dos potenciais credores do reembolso (porque só eles podem invocar um interesse relevante) e está delimitado no artigo 15.º, n.º 2, do CIEC.

 

DECISÃO ARBITRAL

 

Os árbitros Fernanda Maçãs (Presidente), Dr. Lima Guerreiro e Dr. Rui Miguel Zeferino (árbitros vogais), designados pelo CAAD para formar o Tribunal Arbitral Colectivo, acordam no seguinte:

 

I.RELATÓRIO

1. A..., Lda., titular do número único de pessoa coletiva ..., com sede na Rua ..., n.º ..., ...-... Porto Salvo, B..., S.A., titular do número único de pessoa coletiva..., com sede na Rua..., n.º ..., ...-... Porto Salvo, C..., Lda., titular do número único de pessoa coletiva..., com sede na Rua..., n.º ..., ...-... Barcelos, (doravante, abreviadamente designadas, em conjunto, por «Requerentes»), vêm, na sequência da formação da presunção de indeferimento tácito dos Pedidos de Revisão Oficiosa, apresentados a 30 de maio de 2023 e a 30 de junho de 2023, junto da Alfândega do Jardim do Tabaco, relativos às liquidações de Contribuição de Serviço Rodoviário (“CSR”) praticadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”) com base nas Declarações de Introdução no Consumo (“DIC”) submetidas pela D..., S.A. (doravante “D...” ou “fornecedora de combustível”) e, bem assim, relativo aos consequentes atos de repercussão da referida CSR consubstanciados nas faturas referentes à gasolina e ao gasóleo rodoviário àquela adquiridos pelas Requerentes no período compreendido entre maio de 2019 e dezembro de 2022, apresentar Pedido de Pronúncia Arbitral determinando‐se, nessa medida, a sua anulação, com as demais consequências legais, designadamente, com o reembolso às Requerentes de todas as quantias suportadas a esse título, no montante global de € 923.361,96, acrescidas dos respetivos juros indemnizatórios …”

 

2.O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Requerida.

O Senhor Presidente do CAAD informou as Partes da designação dos Árbitros, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, os quais comunicaram a respetiva aceitação no prazo aplicável. As partes, notificadas dessa designação, não manifestaram vontade de a recusar.

Assim, em conformidade com o preceituado no n.º 8 artigo 11.º do RJAT, decorrido o prazo previsto no n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, sem que as Partes nada viessem dizer, o Tribunal Arbitral Coletivo ficou constituído em 5 de Março de 2024.

 

3.A Requerente fundamenta o Pedido de Pronúncia Arbitral (PPA), sumariamente, com base nos seguintes argumentos:

  1. As Requerentes insurgem-se contra os indeferimentos (tacitamente presumidos) dos Pedidos de Revisão Oficiosa, com referência à contestação das liquidações de CSR praticadas pela AT, com base nas DIC submetidas pela D... e, assim, impugna a declaração da ilegalidade dos atos de liquidação de CSR e, bem assim, relativamente aos consequentes atos de repercussão de CSR.
  2. Embora reconhecendo que o sujeito passivo da CSR seja o que se encontra definido para efeitos de Imposto sobre os Produtos Petrolíferos (“ISP”) – no caso, a D..., as Requerentes alegam que o seu encargo é suportado pelo consumidor do combustível.
  3. Ou seja, os montantes de CSR entregues ao Estado pelos fornecedores de combustível foram incluídos no preço de venda dos combustíveis e, portanto, repercutidos nos respetivos adquirentes, pelo que são os consumidores finais quem têm interesse em agir.
  4. Quanto à competência do Tribunal, a Requerente defende, socorrendo-se na jurisprudência do CAAD, designadamente a consignada no processo arbitral n.º 312/2015-T, de 7 de janeiro de 2016, onde se pode ler que “se algum sentido se pode atribuir de forma mais próxima e fiel à interpretação literal-sistemática dos preceitos é o de que a referência a “impostos” em vez de “tributos” no artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, seguida da remissão expressa para o n.º 1 do artigo 2.º do RJAT e da enunciação expressa de um conjunto de exceções, indicia que o ‘legislador’ da Portaria não teve a intencionalidade restritiva clara que a AT invoca, pois se assim fosse teria feito alusão expressa a essa restrição no leque das alíneas que contemplam as exceções”.
  5. E mais adiante, prossegue o Tribunal Arbitral afirmando que “facto é que o procedimento de liquidação e cobrança dessas “contribuições” em nada se distingue, na sua natureza e estrutura, da dos “impostos” (a AT atua aí como se de impostos se tratasse), donde não há razão válida para excluir a vinculação da AT, nesses casos, à arbitrabilidade. A inexistência de uma referência expressa no texto do artigo 2.º da mencionada Portaria n.º 112-A/2011 a esse tipo de tributos dever-se-á apenas, ao fim e ao cabo, ao facto de, à data dela, ainda não se encontrar atribuído à administração da AT qualquer tributo com tais características”.
  6. Por outro lado, sublinham as Requerentes que não pretendem a apreciação da legalidade do regime jurídico da CSR, mormente, a apreciação da conformidade do normativo previsto na Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto[1], com o disposto nas normas nacionais e comunitárias, não se verificando qualquer incompetência material deste douto Tribunal Arbitral e, em consequência, qualquer exceção de incompetência do tribunal em razão da causa de pedir.
  7. As Requerentes defendem a tempestividade dos pedidos de Revisão Oficiosa sub judice (estão dentro dos quatro anos) porquanto os atos de liquidação de CSR e os consequentes atos de repercussão em análise resultaram de manifesto erro imputável aos serviços.
  8. As Requerentes dão como verificados os requisitos da cumulação de pedidos e da coligação de autores.
  9. Mais em concreto sobre a natureza da CSR esta configura “a contrapartida pela utilização da rede rodoviária nacional, tal como esta é verificada pelo consumo dos combustíveis”, sendo, “uma fonte de financiamento da rede rodoviária nacional a cargo da EP – Estradas de Portugal, E. P. E., no que respeita à respectiva concepção, projecto, construção, conservação, exploração, requalificação e alargamento”.
  10. Relativamente ao âmbito de incidência objetivo, a CSR incide “sobre a gasolina, o gasóleo rodoviário e o GPL auto, sujeitos ao imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos (ISP) e deles não isentos” e, quanto à incidência subjetiva, apesar de serem sujeitos passivos de impostos especiais de consumo os definidos no artigo 4.º do Código dos Impostos Especiais de Consumo, é sobre o consumidor de combustíveis, como as Requerentes, que recai o encargo daquele imposto.
  11. Para as Requerentes, o legislador determinou clara e expressamente que o encargo económico daquele imposto deve recair, por via da repercussão legal, nos respetivos consumidores de combustíveis, nas faturas emitidas aos respetivos consumidores de combustível, transferindo para estes últimos o encargo económico deste imposto.
  12. Para as Requerentes emergem no âmbito da CSR, necessariamente, duas tipologias distintas de atos tributários: i) os atos de liquidação de CSR, emitidos pela AT com base nas DIC apresentadas pela fornecedora de combustível, na sequência dos quais esta entrega ao Estado o imposto aí apurado; e ii) os atos de repercussão da CSR liquidada, materializados nas faturas emitidas pela fornecedora de combustíveis (sujeito passivo da relação jurídico-tributária) aos consumidores de combustível (os terceiros repercutidos sobre os quais deve legalmente recair o encargo económico deste imposto).
  13. Assim, verifica-se que as Requerentes, entidades terceiras sobre as quais a CSR foi legalmente repercutida, vem, através do presente pedido de pronúncia arbitral, contestar, em primeiro lugar, a legalidade dos referidos atos de repercussão da CSR (materializados nas faturas que lhe foram emitidas pela fornecedora de combustível), e, em segundo lugar, em face da existente correlação causal entre os dois tipos de atos acima indicados, a legalidade dos antecedentes atos de liquidação de CSR (praticados pela AT e notificados, tão somente, à referida entidade repercutente), atos que estão na origem daquelas repercussões e sem os quais as mesmas não existiriam.
  14. As Requerentes fazem juntar igualmente (i) a declaração emitida pela fornecedora de combustível que atesta que os montantes de CSR por si entregues aos cofres do Estado foram repercutidos na esfera das Requerentes e (ii) os atos de repercussão de CSR – i.e., as faturas emitidas pela D... às aqui Requerentes por força da aquisição de combustível.
  15. Quanto à prova das liquidações as Requerentes defendem-se com a jurisprudência que vai no sentido de que “para que seja afastada a obrigação de reembolso, terá de existir prova evidente de uma efectiva repercussão do imposto que, desse modo, traduza uma situação de enriquecimento sem causa por parte do operador” (cf. Decisão Arbitral proferida no âmbito do processo n.º 702/2022-T, de 31 de julho de 2023).
  16. Finalmente as Requerentes invocam que a introdução do imposto em apreço na ordem jurídica nacional consubstancia uma violação ao direito da União Europeia e a consequente ilegalidade (abstrata) dos atos tributários aqui em causa, conforme o TJUE já se pronunciou, expressa e especificamente, sobre esta matéria na sequência de um pedido de decisão prejudicial apresentado, pelo Tribunal constituído no âmbito do processo arbitral n.º 564/2020-T, que correu termos no CAAD.
  17. Deve assim concluir-se como naquela Decisão arbitral no sentido de que “a CSR, criada pela Lei n.º 55/2007, de 31 de Agosto, não prossegue “motivos específicos”, na aceção do artigo 1.º, n.° 2, da Diretiva 2008/118, na medida em que as suas receitas têm essencialmente como fim assegurar o financiamento da rede rodoviária nacional, não podendo considerar-se como suficiente, para estabelecer uma relação direta entre a utilização das receitas e um “motivo específico”, os objetivos genéricos de redução da sinistralidade e de sustentabilidade ambiental”.

 

4-A Requerida apresentou Resposta nos termos sumários seguintes:

  1. A Requerida começa por alegar a exceção de incompetência, porquanto, nos termos do artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, porque no caso em apreço está em causa a apreciação da legalidade da Contribuição de Serviço Rodoviário (CSR) que, tratando-se de uma contribuição e não um imposto, as matérias sobre a CSR encontram-se, assim, excluídas da arbitragem tributária, por ausência de enquadramento legal. Fundamenta a sua posição designadamente na decisão proferida pelo CAAD, em 29-05-2023, no âmbito do Processo nº 31/2023-T.Esta interpretação do artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 é compaginável com a Constituição, como já decidiu o Tribunal Constitucional (TC) no Acórdão n.º 545/2019, de 16-10-2019, proferido no processo n.º 1067/2018 e posteriormente confirmada por Decisões Sumárias.
  2. Sem conceder alega ainda a Requerida incompetência material por as Requerentes, pretenderem, em rigor, a não aplicação de diplomas legislativos aprovados por Lei da Assembleia da República, decorrentes do exercício da função legislativa, visa, com a presente ação, suspender a eficácia de atos legislativos, que concretizam a legalidade do regime da CSR, no seu todo.
  3. Não sendo da competência do tribunal arbitral nem a fiscalização da legalidade de normas em abstrato, sem enquadramento processual impugnatório de ato concreto de liquidação, nem a execução de sentenças/decisões.
  4. Alega, ainda, a Requerida a incompetência dos tribunais arbitrais para se pronunciarem sobre atos de repercussão da CSR, subsequentes e autónomos dos atos de liquidação de ISP/CSR, que não são atos de tributários e que, para mais, não correspondem a uma repercussão legal, mas a uma repercussão meramente económica ou de facto, como, à frente, se desenvolverá. Este é o entendimento que tem sido uniformemente defendido pela jurisprudência que se pronunciou sobre o tema, concretamente pelos Tribunais Arbitrais nas decisões proferidas âmbito dos Processos n.ºs 296/2023-T, 332/2023-T, 375/2023-T, 408/2023-T, 438/2023-T, 466/2023-T, 467/2023-T e 490/2023-T.
  5. Alega também a Requerida a ilegitimidade processual e substantiva das Requerentes, porquanto pedem que sejam anuladas as liquidações de CSR referentes ao gasóleo rodoviário por aquelas adquiridos aos seus fornecedores nos anos de (maio de) 2019 a (dezembro de) 2022, determinando-se, o reembolso de todas as quantias alegadamente suportadas pelas Requerentes a esse título, acrescidas dos respetivos juros indemnizatórios, com fundamento no facto de terem pago o respetivo valor da CSR.
  6. Ora, apenas os sujeitos passivos que tenham procedido à introdução no consumo dos produtos em território nacional e provem o pagamento dos respetivos ISP/CSR possuem legitimidade para solicitar o reembolso do valor pago.
  7. O que se retira do respetivo regime dos impostos especiais de consumo, designadamente, por se tratar de impostos monofásicos, é que incidem apenas na fase da declaração para consumo, o que, regra geral, ocorre uma única vez, diferentemente do que se passa com os impostos plurifásicos, como é o caso do IVA, que incidem em todas as fases do circuito económico, através do crédito do imposto a jusante e do débito a montante. Ou seja, não sendo as Requerentes sujeito passivo nos termos e para o efeito do disposto no artigo 4.º do CIEC, não têm legitimidade nos termos supra nem para apresentar pedido de revisão oficiosa nem, consequentemente, o presente pedido arbitral, não podendo as Requerentes pedir à AT o reembolso de um tributo que nunca entregaram ao Estado.
  8. Mais, a Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, que instituiu a CSR, não contempla qualquer mecanismo de repercussão legal, sendo reconhecido, do ponto de vista doutrinário, que a repercussão da CSR tem uma natureza meramente económica ou de facto, donde a ilegitimidade das Requerentes ter sido defendida de forma constante nas decisões proferidas no âmbito dos Processos n.ºs 296/2023-T, 332/2023-T, 375/2023-T, 408/2023-T, 438/2023-T, 466/2023-T, 467/2023-T e 490/2023-T.
  9. Finalmente, acresce que, no caso sub judice, as Requerentes não conseguem demonstrar que o valor pago pelos combustíveis que adquiriram aos seus fornecedores, tem incluído o valor da CSR pago pelo sujeito passivo de ISP/CSR, nem que suportou, a final, o encargo de tal tributo, isto é, que não o repassou no preço dos serviços prestados aos seus clientes, sendo estes os consumidores finais.
  10. Ademais todas as faturas juntas aos autos, por si só, não fazem prova do alegado pagamento pois não consubstanciam fatura-recibo, nem recibo, nem nota de crédito, nem a conjugação de documentos (contabilísticos ou outros), que permitam comprovar o pagamento dos montantes alegados pela Requerente.
  11. De resto, as declarações da fornecedora D... Lda., anexas ao pedido arbitral como Documento 3, em que esta afirma que a CSR por ela suportada foi integralmente repercutida a jusante, até à esfera da Requerente, são declarações genéricas, que não identificam quaisquer DICs ou atos de liquidação, nem os montantes alegadamente repercutidos, respetivas datas, quantidades de combustível tributadas, entre outros.
  12. Donde resulta a ineptidão do Pedido, analisado, quer o pedido arbitral, quer a documentação a ele anexa, em lado algum se encontra identificado qualquer ato tributário, porquanto as Requerentes se limitam a identificar faturas de aquisição de combustíveis aos seus fornecedores, alegando que terá sido esta entidade que, na qualidade de sujeito passivo de ISP/CSR, terá procedido à introdução no consumo dos produtos que vieram a ser adquiridos pelas Requerentes.
  13. Pelo que, a identificação das liquidações não é feita pelas Requerentes, nem é possível à AT suprir tal omissão, dada a impossibilidade absoluta em estabelecer qualquer correlação/correspondência (datas, quantidades de produto, valores) entre as faturas apresentadas pelas Requerentes e os atos de liquidação que, a montante, estiveram subjacentes à introdução no consumo (DIC) dos produtos que vieram a ser adquiridos pelas Requerentes à sua fornecedora.
  14. Por outro lado, também nunca seria possível fazer qualquer correspondência entre as quantidades de produtos introduzidos no consumo e as quantidades de produto adquiridas pelas Requerentes aos seus fornecedores.
  15. No sentido de se verificar a ineptidão da petição inicial, em processos arbitrais com pedido idêntico ao presente, a Requerida indica o processo nº 467/2023-T e, mais recentemente, o processo nº 364/2023-T.
  16. Finalmente, quanto à caducidade do direito de ação, alega a Requerida que tomando por referência o alegado pelas Requerentes, aquisições nos anos de (maio de ) 2019 a (dezembro de) 2022, em 03-06-2023 e 01-07-2023, há muito que se encontrava ultrapassado o prazo da reclamação graciosa de 120 (cento e vinte) dias a contar do termo do prazo do pagamento do ISP/ CSR, previsto no artigo 78.º, n.º 1, primeira parte da LGT.
  17. Razão pela qual as Requerentes fundamentam os pedidos de revisão oficiosa em erro imputável ao serviço, de modo a fazer valer-se do prazo de 4 anos previsto no artigo 78.º nº 1, segunda parte da LGT, sendo que não existe qualquer erro imputável aos serviços.
  18. A Requerida defende-se também por impugnação dizendo que as Requerentes  não logram as Requerentes fazer prova do que alegam, designadamente que as Requerentes pagaram e suportaram integralmente o encargo do pagamento da CSR por repercussão, pelo que , não se aceita e se impugna, nessa medida, o vertido nos artigos 22.º, 23.º, 34.º, 42.º, 43.º, 45.º, 46.º, 48.º, 68.º, 69.º,  75.º a 79.º, 84.º e 98.º do pedido arbitral, colocando-se em causa e não se podendo dar como provada a alegada repercussão da CSR, devendo funcionar plenamente as regras do ónus da prova, não se dando como provados os alegados factos invocados no pedido arbitral, sendo que, nos termos do artigo 74.º da LGT, o ónus da prova de factos constitutivos de direito recai sobre quem os invoque. A Requerida impugna a documentação junta pelas Requerentes.

 

5- As Requerentes exerceram contraditório por escrito em relação à matéria de excepção desenvolvendo a argumentação do Pedido arbitral e em especial concluindo que “Em qualquer caso, sublinha-se incisivamente que, qualquer interpretação que conclua pela inexistência do direito dos repercutidos legais (como é o caso das Requerentes) a recorrer ao procedimento de revisão oficiosa regulado no artigo 78.º da LGT – ou que, considerando ser aplicável à CSR o regime especial de reembolso previsto nos artigos 15.º e 16.º do CIEC (o que, não obstante, não se admite), exclua os repercutidos legais do respetivo âmbito subjetivo de aplicação – violaria, de forma grosseira, os princípios constitucionais do acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva, por não acautelar os direitos dos repercutidos (artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa), e da igualdade, por discriminar negativamente os repercutidos relativamente aos demais sujeitos da relação jurídico-tributária de repercussão legal (artigo 13.º da CRP), sendo um tal sentido interpretativo, por esse motivo, materialmente inconstitucional

 

6-Por despacho de 4 de Maio o Tribunal dispensou a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, dando às partes a possibilidade de alegarem e fixando como data limite de prolação da Decisão arbitral o dia 5 de Setembro de 2024.

 

7- Apenas a Requerida alegou remetendo para a Resposta.

 

II- SANEADOR

 

8- O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído.

9- As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e estão devidamente representadas (cfr. artigos 4.º e 10.º, n.º 2, ambos do RJAT, e artigos 1.º a 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março). A cumulação de pedidos e a coligação de autores são legais.

 

10- Em face das excepções invocadas (relativas à competência do Tribunal Arbitral em razão da matéria, à ilegitimidade da Requerente, à ineptidão do pedido de pronúncia arbitral por falta de objecto e à caducidade do direito de açcão), impõe-se o conhecimento prioritário desta matéria, o que será analisado mais adiante a título de questões prévias.

 

III-FUNDAMENTAÇÃO

 

III-1-MATÉRIA DE FACTO

 

§1.º Factos dados como provados

Com relevo para a decisão da causa, dão-se como provados os factos a seguir identificados:

  1. A D..., SA., enquanto fornecedora de combustível e sujeito passivo formal de ISP e CSR, forneceu às Requerentes gasolina e gasóleo rodoviário, nos montantes correspondentes às facturas de aquisição de combustíveis, conforme documentação junta ao Pedido Arbitral - facturas de aquisição de combustíveis (cfr. docs 4 e 5).
  2. As Requerentes fazem juntar aos autos as faturas emitidas pela D..., SA, fornecedora de combustível, que apenas titulam operações de compra e venda de combustíveis, incluindo com desconto (Documentos 4 e 5, acrescido de uma tabela resumo, mero documento particular).
  3. Referem as Requerentes que no que diz respeito aos atos de liquidação de CSR, praticados pela AT e aos quais apenas foi conferido acesso à fornecedora de combustível (sujeito passivo da relação jurídico-tributária), as Requerentes não se encontram em possibilidade de os identificar (ponto 80 do Pedido).
  4. As Requerentes apresentaram, no passado dia 30 de maio de 2023 e 30 de junho de 2023, Pedidos de Revisão Oficiosa, onde suscitaram a revisão dos atos tributários de CSR e, consequentemente, dos atos de repercussão daquele imposto na sua esfera, ao abrigo do artigo 78.º da LGT (cfr. Documento 2).
  5. Os referidos Pedidos de Revisão Oficiosa vieram a presumir-se tacitamente indeferidos, por inércia da AT em emitir uma decisão dentro do prazo de 4 meses previsto no n.º 1 do artigo 57.º da LGT.

 

§2.º Factos dados como não provados

Provado apenas que as Requerentes juntaram facturas do seu fornecedor de combustível, relativas a gasolina e gasóleo rodoviários adquiridos por si e sobre os quais terá incidido CSR no momento da introdução no consumo.

 

§3.º Fundamentação da matéria de facto

O Tribunal Arbitral não tem de se pronunciar sobre todos os detalhes da matéria de facto que foi alegada pelas partes, cabendo-lhe o dever de seleccionar os factos que interessam à decisão e discriminar a matéria que julga provada e declarar a que considera não provada (cfr. artigo 123.º, n.º 2, do CPPT, e artigo 607.º, n.º 3, do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são seleccionados e conformados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções para o objecto do litígio no direito aplicável (cfr. artigo 596.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

A convicção do Tribunal Arbitral fundou-se na livre apreciação das posições assumidas pelas Partes (em sede de facto) e no teor dos documentos juntos aos autos.

 

III-2- DO DIREITO 

 

III-2-1-APRECIAÇÃO DE EXCEPÇÕES E QUESTÕES PRÉVIAS QUE PODEM OBSTAR (OU NÃO) AO CONHECIMENTO DO MÉRITO DO PRESENTE PEDIDO ARBITRAL

 

Por não se conformar com os indeferimentos (tácitos) dos Pedidos de Revisão Oficiosa por si formulados no passado dia 30 de maio de 2023 e dia 30 de junho de 2023,  e, por conseguinte, com a legalidade dos atos de liquidação de CSR que lhe estão subjacentes, e, bem assim, dos consequentes atos de repercussão da referida CSR consubstanciados nas faturas referentes à gasolina e ao gasóleo rodoviário adquiridos pelas Requerentes no período compreendido entre maio de 2019 e dezembro de 2022, as Requerentes suscitam a apreciação junto deste Tribunal da legalidade dos supra referidos atos, requerendo a anulação dos mesmos com as devidas consequências legais.

 As Requerentes fundamentam o pedido, como vimos, nos seguintes termos: 1) Ter a fornecedora repercutido integralmente o valor da CSR a jusante; 2) Terem as Requerentes, na qualidade de consumidoras de combustíveis, “liquidado” na íntegra a CSR, por via da repercussão legal da CSR no preço dos combustíveis adquiridos; 3) Desconformidade entre a Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto e a Diretiva 2008/118/CE e desconformidade face ao Direito da União Europeia das normas internas que instituíram a CSR; 4) Existência de erro imputável aos serviços.

 

Na Resposta a Requerida suscitou o seguinte em matéria de excepção:

  • Da incompetência do Tribunal em razão da matéria, por a CSR não configurar um imposto, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 2.º, n.º 1 do RJAT;
  • Da incompetência do Tribunal por  a Requerente pretender será alegadamente suscitar  a legalidade do regime da CSR, bem como da Consignação de Serviço Rodoviário”, no seu todo, sendo que  a instância arbitral constitui um contencioso de mera anulação, não consentindo  nem o escrutínio sobre a integridade de normas emanadas no exercício da função político-legislativa do Estado, nem a pronúncia sobre a restituição de valores/montantes, por conta da declaração de ilegalidade ou anulação de atos de liquidação (o que só pode ser determinado em sede de execução da decisão) – vide artigo 2.º do RJAT;
  • Da incompetência dos tribunais arbitrais para se pronunciarem sobre atos de repercussão da CSR, subsequentes e autónomos dos atos de liquidação de ISP/CSR;
  • Da ilegitimidade processual e substantiva da Requerente porque apenas os sujeitos passivos que tenham procedido à introdução no consumo dos produtos em território nacional e provem o pagamento dos respetivos ISP/CSR possuem legitimidade para solicitar o reembolso do valor pago;
  • Ineptidão do pedido de pronúncia arbitral por falta de objecto;
  • Caducidade do direito de açcão.

 

Impõe-se o conhecimento prioritário das excepções de incompetência material e da ilegitimidade, com a seguinte advertência, no ponto 33 do Pedido as Requerentes afirmam expressamente “(…) que não pretendem a apreciação da legalidade do regime jurídico da CSR, mormente, a apreciação da conformidade do normativo previsto na Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto[2], com o disposto nas normas nacionais e comunitárias, não se verificando qualquer incompetência material deste douto Tribunal Arbitral e, em consequência, qualquer exceção de incompetência do tribunal em razão da causa de pedir.”

Termos em que esta questão não será apreciada, ainda que sempre devesse ficar prejudicada pela procedência da terceira questão em matéria de excepção de incompetência material, como adiante se verá.

 

Vejamos. 

 

  1. Excepção de incompetência material por a CSR não ser um imposto 

 

A primeira questão a decidir é a alegada excepção de incompetência em razão da matéria. Ou seja, a de saber de a CSR é um imposto ou se, sendo uma contribuição (como entende a AT), ainda assim está dentro do perímetro de jurisdição atribuída legalmente aos Tribunais Arbitrais do CAAD e está compreendida no âmbito de vinculação que foi fixado para a AT pela Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março (que “Vincula vários serviços e organismos do Ministério das Finanças e da Administração Pública à jurisdição do Centro de Arbitragem Administrativa”, em cumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 4.º do RJAT).

Sobre a possibilidade de haver processos arbitrais sobre contribuições e a natureza da CSR existe vasta jurisprudência nem sempre coincidente. Por este tribunal aderir à tese da natureza de imposto da CSR, passamos a seguir, em especial a orientação consignada na Decisão arbitral proferida no processo n.º 847/2023-T, a qual, por merecer a nossa adesão, passamos a transcrever.

“Uma vez que a competência dos tribunais arbitrais a constituir no âmbito do CAAD está estabelecida no artigo 2.º do RJAT e abrange (al. a) do seu n.º 1) a “declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta”, mas o proémio do n.º 2 da já citada Portaria n.º 112-A/2011 circunscreveu – ao menos literalmente – tal vinculação às “pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida”, tem-se discutido se as pretensões referentes a “contribuições” podem ser objecto de apreciação por tais tribunais[3]. Aliás, uma parte da Resposta da AT é dedicada a defender que “independentemente do nomen iuris ou da natureza jurídica da CSR, a verdade é que não é, por definição, um imposto e, portanto, o CAAD não tem competência para decidir sobre esta matérias”.

“Uma variante desta tese[4], inicialmente triunfante na decisão do processo n.º 31/2023-T, prevaleceu, depois, nas decisões dos processos n.os 372/2023-T, 508/2023-T, 520/2023-T, 675/2023-T e 876/2023-T. Tem, porém, uma particularidade: em situações em que as Requerentes não são sujeitos passivos da relação tributária (já não assim quando o são), chega à mesmíssima solução, em termos materiais, das teses que, por caminhos não coincidentes, recusam conhecer de mérito – quer por diagnosticarem falta de legitimidade das Requerentes (decisões dos processos n.os 296/2023-T, 332/2023-T, 375/2023-T, 408/2023-T, 409/2023-T, 438/2023-T, 466/2023-T, 467/2023-T, 490/2023-T, 537/2023-T e 604/2023-T), quer por identificarem ineptidão da petição inicial (decisões dos processos n.os 364/2023-T, 467/2023-T [5]e 537/2023-T[6]). Na verdade, com qualquer desses fundamentos, a AT é absolvida da instância e as custas arbitrais recaem sobre as Requerentes – exactamente como na corrente (certo que mais ampla, por abranger também situações em que os requerentes são os próprios sujeitos passivos da relação tributária) que nega a competência relativa dos Tribunais do CAAD para arbitrar as questões referentes à CSR (invocando o que parece ser uma presunção judicial iuris et de iure de falta de vinculação da AT).

“Na sua resposta às excepções, a Requerente defendeu, invocando doutrina vária, a “necessária inclusão deste tributo na categoria das contribuições especiais, sujeitas, por lei, ao regime dos impostos, e, nessa medida, totalmente arbitrável nos termos do RJAT e respetiva portaria de vinculação” até porque “a CSR é exigida com o duplo propósito de remunerar a entidade responsável pela gestão da rede rodoviária nacional, imputando aos – repercutindo nos – utilizadores dessa rede os respetivos custos”.

“Concluía que “a CSR consubstancia uma prestação devida pelo grupo de presumíveis utilizadores da rede rodoviária nacional (identificados por via do seu consumo de combustível) na medida em que essa utilização dê origem a presumíveis maiores despesas de gestão da respetiva rede rodoviária, preenchendo, também por esta via, o conceito de contribuição especial”.

Entende o presente Tribunal, com a jurisprudência do CAAD já citada, que a CSR era um imposto (mal) disfarçado de contribuição. Como se escreveu no Sumário da decisão do processo n.º 629/2021-T, “Uma parcela de um imposto especial de consumo não deixa de ser um imposto especial de consumo por o legislador lhe atribuir uma narrativa (de resto oscilante entre a compensação de custos e a contrapartida de benefícios) e lhe providenciar uma consignação orgânica (mormente se a entidade que dela beneficia deixa de ter como função única providenciar a suposta contrapartida que justificaria a alteração de género)”.

“Nessa decisão, os argumentos usados para caracterizar a CSR como imposto foram essencialmente os seguintes (negritos no original, *notas suprimidas):

- histórico:

A Lei n.º 55/2007, de 31 de Agosto (“Regula o financiamento da rede rodoviária nacional a cargo da EP - Estradas de Portugal, E. P. E.”) criou a CSR por desdobramento do ISP – que é, indiscutivelmente, um imposto especial de consumo. Como se escrevia no artigo 7.º dessa lei, sob a epígrafe “Fixação das taxas do ISP”,

“As taxas do ISP são estabelecidas por portaria conjunta nos termos do Código dos Impostos Especiais de Consumo, por forma a garantir a neutralidade fiscal e o não agravamento do preço de venda dos combustíveis em consequência da criação da contribuição de serviço rodoviário”.

“(…) a única diferença entre os € 525,1 milhões que o ISP perdeu e os € 525,1 milhões que a CSR ganhou em 2008 residiu na alteração da sua designação e na sua afectação. Enquanto imposto especial de consumo louvava-se na cobertura de um custo: os custos ambientais que o preço dos combustíveis não internalizavam (uma externalidade). A partir do momento em que uma parte – arbitrária – da receita gerada pelo ISP passou a ter a designação de CSR, passou (parece – mas contra o já referido pelo legislador*) a louvar-se no benefício proporcionado aos causadores do custo”.

- conceptual:

Procurando identificar os critérios de distinção das taxas, das contribuições financeiras*, das contribuições especiais e dos impostos”, a A. [Suzana Tavares da Silva, As Taxas e a Coerência do Sistema Tributário, 2.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2013] recorre, para a delimitação dos contornos das contribuições financeiras, aos critérios desenvolvidos pelo Tribunal Constitucional Alemão:

1) incidir sobre um grupo homogéneo; 2) manter uma proximidade com a obrigação tributária e as suas finalidades; 3) corresponder a uma relação encargo/benefício capaz de demonstrar que as receitas geradas são fruídas pelos membros do grupo” (p. 91).”

“(…)”.

a CSR apresenta diferenças muito significativas em relação ao comum das contribuições financeiras, sejam elas contribuições para a segurança social, quotas para associações públicas, “taxas” de regulação ou as “grandes contribuições” que foram surgindo a título transitório e se vão mantendo (Contribuição sobre o Sector Bancário, Contribuição Extraordinária sobre o Sector Energético - CESE, Contribuição Extraordinária sobre a Indústria Farmacêutica, …).

“Em primeiro lugar, nessas contribuições para a segurança social, quotas para associações públicas, “taxas de regulação” e “contribuições”, o sujeito passivo é o contribuinte (na CESE há mesmo uma proibição da sua repercussão), enquanto que na CSR um e outro são diferentes: o sujeito passivo (quem tem de entregar o imposto ao Fisco) é o introdutor dos produtos no mercado e o contribuinte (quem tem de suportar a exacção fiscal) é o adquirente dos combustíveis (incluindo, como a já citada jurisprudência arbitral evidencia, adquirentes de combustíveis que nada têm a ver com a utilização das estradas a cargo da Infraestruturas de Portugal).

“Em segundo lugar, o nexo grupal – que faria das contribuições financeiras uma espécie de taxas colectivas – não se estabelece com os sujeitos passivos da CSR, mas sim com terceiros não participantes na relação tributária. (…)

“Em terceiro lugar, enquanto nas contribuições para a segurança social, quotas para associações públicas, “taxas de regulação” e “contribuições” é a pertença ao grupo que permite de imediato a identificação do devedor – sendo a indução de um custo ou a obtenção de um benefício presumida a partir dessa inclusão nele – na CSR não há nenhum grupo prévio a que se possa imputar o pagamento: é porque se paga a CSR que se supõe que se integra o grupo. (…)

“Em quarto lugar, o princípio da equivalência – a que se recorre para conferir unidade de sentido às contribuições financeiras*, equiparando-se o pagamento feito à repartição, tendencialmente idêntica (ou, pelo menos, com base em características dadas e estáveis), dos custos especificamente gerados pelo grupo homogéneo (ou dos benefícios auferidos pelo grupo homogéneo, como nas “taxas” das autoridades reguladoras, ou, forçando mais ou menos a nota, nas tais “grandes contribuições”) – assume na CSR uma ligação a um índice variável: o do consumo dos “grandes combustíveis rodoviários”*. Com a agravante de o presumido benefício não ter uma relação directa com esse índice variável: por um lado, as vias da Rede Rodoviária Nacional (que foram concessionadas, em 2007, à EP - Estradas de Portugal, E.P.E.) não são a totalidade das estradas nacionais (além das auto-estradas concessionadas, e da rede municipal – urbana e rural –, o Plano Rodoviário Nacional prevê a transferência para as autarquias das estradas que não estejam nele incluídas). Noutras palavras: a utilidade proporcionada pela circulação nas estradas a cargo da Infraestruturas de Portugal não é segmentável da que é proporcionada pelas demais; por outro lado, uma fracção crescente dos utilizadores dessa sub-parcela das vias de circulação automóvel – a rede rodoviária nacional – não fica sujeita a essa “contribuição”: o dos utilizadores dela com veículos eléctricos ou velocípedes. (…)

“Em quinto lugar, e não obstante – como já referido – não ser bom critério determinar a natureza de um tributo a partir da sua consignação material ou orgânica*, certo é que a EP - Estradas de Portugal, E.P.E. só gastava o dinheiro em estradas (e no mais necessário a poder fazê-lo, incluindo as suas despesas correntes), mas, com a fusão, em 2015, com a Rede Ferroviária Nacional - REFER E.P.E. para dar origem à Infraestruturas de Portugal, isso deixou de ser assim”.

 

“E, em termos de índices da natureza da CSR[7],

- doutrinal:

“- na recolha de Casalta Nabais Estudos sobre a Tributação dos Transportes e do Petróleo, Almedina, Coimbra, 2019, pp. 42-43, refere-se, a propósito da CSR (e de outras figuras aí referidas), “estarmos perante tributos que, atenta a sua estrutura unilateral, se configuram como efectivos impostos, muito embora dada a titularidade activa das correspondentes relações tributárias (e o destino da sua receita), tenham clara natureza parafiscal”. Como o A. escreve em Direito Fiscal, 11.ª ed, Almedina, Coimbra, 2021, pp. 53-54, “o critério para a distinção entre os tipos de tributos [reporta-se] exclusivamente à estrutura da relação tributária, ao tipo de relação que se estabelece entre os respetivos sujeito ativo e passivo, e não à titularidade activa dessa relação (…) É, pois, a estrutura bilateral da relação jurídica, em que assentam tanto as taxas como as contribuições financeiras, que revela a natureza comutativa destes tributos, os quais, porque concretizam uma efectiva troca de utilidades económicas, têm por base […] uma legitimidade económica. / O que vale também relativamente à titularidade da receita dos tributos. De facto, esta titularidade, até porque esta para além da relação tributária integrando [-se …] numa relação financeira a constituir-se a jusante da relação tributária, nada pode dizer sobre o tipo de tributo” (destaques aditados).

“(…)”.

Filipe de Vasconcelos Fernandes, ob. cit., p. 116, sublinha que “o nexo bilateral que subjaz ao respetivo facto tributário [tem] caráter derivado, já que resulta de uma presunção de benefício ou utilidade na esfera dos sujeitos passivos, por pertencerem ou integrarem, num determinado intervalo de tempo, um grupo, tendencialmente homogéneo de interesses”, e desdobra este, na página seguinte, numa “homogeneidade de interesses” – que, segundo informa, na literatura alemã por vezes se designa por “homogeneidade de grupo” – e numa “responsabilidade de grupo (…) que se deve ao facto de os sujeitos passivos deste tipo de tributo partilharem um ónus ou responsabilidade de custeamento ou suporte da atividade pública que não pode atribuir-se isoladamente, mas apenas em face daquela que é a respetiva inserção no grupo a que efetivamente pertencem”.

E,

- jurisprudencial:

apenas DUAS das 19 decisões do CAAD que a Requerente invoca (na sua Resposta às excepções) para afirmar que tais tribunais arbitrais têm aceite a sua jurisdição sobre a CSR o poderiam substanciar (as dos processos n.os 483/2014-T e 147/2015-T8, que autonomizaram o seu tratamento), sendo as demais resultantes da consideração indiferenciada da CSR com o imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos (ISP).

O mesmo se diga para a jurisprudência dos Tribunais superiores, ainda que estes não tenham de cuidar da delimitação da sua competência em função da natureza do tributo, e se não conheçam decisões suas sobre a CSR.

Também não é indiferente que o Tribunal de Contas, a pp. 90 do seu Parecer sobre a Conta Geral do Estado de 2008 (https://erario.tcontas.pt/pt/actos/parecer-cge/2008/pcge2008-v1.pdf ), tenha considerado o seguinte:

Face ao conteúdo normativo das disposições legais aplicáveis aos vários aspectos de que se reveste a problemática da contribuição de serviço rodoviário e tendo em conta os artigos 103.º, 105.º e 106.º da Constituição, a Lei de enquadramento orçamental e a legislação fiscal aplicável, o Tribunal de Contas considera que a contribuição de serviço rodoviário tem as características de um verdadeiro imposto ou, pelo menos, que dada a sua natureza não pode deixar de ser tratada como imposto pelo que, sendo considerada como receita do Estado, não pode deixar de estar inscrita no Orçamento do Estado, única forma de o Governo obter autorização anual para a sua cobrança”.

 

“No mesmo sentido pode ver-se, por exemplo, a argumentação da decisão do processo n.º 644/2022-T (que, neste ponto, foi parcialmente reproduzida na decisão do processo n.º 467/2023-T):

Afigura-se a este tribunal que a CSR, não obstante um nomen iuris que pareceria integrá-la na categoria das “contribuições financeiras a favor de entidades públicas” (art. 165º, 1, i) da CRP), preenche todos os requisitos de conteúdo pecuniário, carácter coactivo, unilateralidade, definitividade, ausência de cariz sancionatório, tendo como credor o Estado ou outros entes públicos, e a afectação à realização de fins públicos – que definem um imposto.

“Essa qualificação não se modifica pela circunstância de surgirem algumas correspectividades como a da obtenção de receitas para financiamento da utilização de vias públicas – pois as contribuições que assentam no especial desgaste de bens públicos são impostos, como estabelece o art. 4º, 3 da LGT.

“Falta à CSR o carácter de comutatividade, bilateralidade ou sinalagmaticidade grupal ou colectiva que é necessária à contribuição financeira. O seu regime não determina, para o sujeito activo respectivo, qualquer dever de prestar específico, qualquer contraprestação exigível pelo contribuinte, o que significa que tem o carácter unilateral de um verdadeiro imposto (quando muito, alguma “paracomutatividade”, referente à compensação de prestações de que os sujeitos passivos são presumíveis causadores ou beneficiários – mas não a correspectividade bilateral estrita de uma taxa, sem uma contrapartida aproveitada ou provocada individualmente pelo sujeito passivo, como sucede numa taxa).

“Basta percebermos que, enquanto a CSR é estabelecida a favor da Infraestruturas de Portugal (inicialmente, Estradas de Portugal), sendo esta a entidade titular da correspondente receita, os sujeitos passivos da contribuição são as empresas comercializadoras de combustíveis rodoviários, e, portanto, não são os destinatários da actividade da Infraestruturas de Portugal.

“Na sua concepção, a CSR incide sobre a gasolina e o gasóleo rodoviário sujeitos ao imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos e dele não isentos, e é devida pelos sujeitos passivos do ISP, sendo aplicável à sua liquidação, cobrança e pagamento o disposto no Código dos Impostos Especiais de Consumo.

“Trata-se, assim, de um imposto de receita consignada (a consignação, desacompanhada de qualquer comutatividade, não subverte a sua natureza), e esta conclusão reforça-se com a posição veiculada pelo Tribunal de Contas na Conta Geral do Estado de 2008

“(…)”.

“Lembremos, por fim, que a CSR nasceu, com a Lei nº 55/2007, de 31 de Agosto, como um mero desdobramento do ISP, e, sobre este último, nem o nomen iuris permite dúvidas sobre a respectiva natureza”.

 

“Evidentemente, sendo a CSR um imposto, a questão da competência do presente Tribunal Arbitral deixa de ser controvertida, e fica prejudicada a indagação de saber se as questões relativas às contribuições se incluem no âmbito da jurisdição dos Tribunais arbitrais do CAAD – e, ou, no da vinculação da AT à sua jurisdição.”

Termos em que improcede a alegada excepção de incompetência material.

 

  1. Excepção de incompetência quanto à possibilidade de os tribunais arbitrais sindicarem actos de repercussão

 

Como vimos, as Requerentes dirigem o Pedido arbitral contra os indeferimentos (tácitos) dos Pedidos de Revisão Oficiosa por si formulados no passado dia 30 de maio de 2023 e dia 30 de junho de 2023,  e, por conseguinte, contra a legalidade dos atos de liquidação de CSR que lhe estão subjacentes, e, bem assim, dos consequentes atos de repercussão da referida CSR consubstanciados nas faturas referentes à gasolina e ao gasóleo rodoviário adquiridos pelas Requerentes no período compreendido entre maio de 2019 e dezembro de 2022,

No exercício de contraditório à matéria de excepção, suscitada pela Requerida, as Requerentes alegam, entre o mais, que “O mesmo é dizer, portanto, que em matéria de CSR a relação estabelecida entre cada uma das Requerentes e o respetivo fornecedor de combustível não se traduz apenas numa relação privada entre empresas, à qual a administração tributária é estranha, mas, igualmente, como vem sendo apontado pela doutrina e pela jurisprudência, numa relação jurídico-tributária de repercussão legal…”

Embora as Requerentes reconheçam que é a D..., enquanto sociedade cujo objeto social consiste na exploração de postos de abastecimento e comércio por grosso de produtos petrolíferos, os sujeitos passivos “formais” do ISP e da CSR, ao introduzirem no consumo produtos sujeitos aos mesmos, arrogam a sua legitimidade no alegado mecanismo de repercussão. Para as Requerente foram estas a suportar efectivamente o custo associado à CSR e ISP, como alegadamente se comprova pelas facturas juntas e comprovativo do pagamento das mesmas, visando atacar os actos de repercussão em causa.  

Como ficou consignado na Decisão Arbitral, proferida no processo n.º 847/2023-T, “emergem no âmbito da CSR, necessariamente, duas tipologias distintas de atos tributários:

  1. os atos de liquidação de CSR, emitidos pela AT com base nas DIC apresentadas pela fornecedora de combustível (…)
  2. os atos de repercussão da CSR liquidada (…)”.

 

em matéria de CSR a relação estabelecida entre cada uma da Requerente e o respetivo fornecedor de combustível não se traduz apenas numa relação privada entre empresas, à qual a administração tributária é estranha, mas, igualmente, como vem sendo apontado pela doutrina e pela jurisprudência, numa relação jurídico-tributária de repercussão legal, onde se inclui, obviamente, a AT (Requerida)”.

 

“Seja isso assim ou não – e já se verá que desinteressa discuti-lo em sede arbitral – o certo é que, como os Colectivos que decidiram os processos n.os 296/2023-T, 332/2023-T, 409/2023-T, 466/2023-T e 490/2023-T – o presente Tribunal Arbitral entende que não tem competências para apreciar directamente – e sem mais – actos de repercussão. Ainda que se possam integrar numa relação tributária complexa, tais actos ocorrem a jusante dos actos de liquidação e a competência que o legislador atribuiu aos tribunais arbitrais esgota-se – no que ao caso importa [8]– na sindicância dos actos de liquidação. Isso decorre directamente das normas legais, mas corresponde também ao ensinamento da doutrina: Alberto Xavier[9], distinguindo a substituição tributária da repercussão, escrevia que nesta temos “um devedor de imposto, que é do mesmo passo contribuinte, e um terceiro que não desempenha qualquer papel na obrigação tributária”.

“Para Leite de Campos/Benjamim Rodrigues/Lopes de Sousa[10], entre o terceiro repercutido “e o sujeito activo não existe vínculo jurídico, no sentido de que o repercutido não é devedor do sujeito activo. A sua obrigação não nasce da realização do facto tributário, mas sim da realização de um facto ao qual a lei liga o direito de o sujeito passivo de repercutir e a correlativa obrigação do repercutido de reembolsar o sujeito passivo quando este exerça o seu direito. Daqui decorre, nomeadamente, que as relações entre o sujeito passivo e o repercutido inadimplente se regem pelo Direito privado”.

“Sendo isso assim em tese geral, face ao elenco das competências dos tribunais arbitrais constituídos no âmbito do CAAD, e que constam dos artigos 2.º a 4.º do RJAT, nem sequer é preciso discutir a natureza jurídica desses actos de repercussão porque, qualquer que seja, não estão contemplados na única potencial norma atributiva de competência a este Tribunal: a da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT: “A declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta”.

“Quer dizer que este Tribunal se declara liminarmente incompetente para apreciar o primeiro pedido da Requerente (declarar a ilegalidade dos actos de repercussão da CSR consubstanciados nas facturas referentes à gasolina e ao gasóleo rodoviário adquiridos pela Requerente).

“Tal não impede que, por via do seu segundo pedido (o de que o Tribunal declare a ilegalidade das correspondentes liquidações de CSR praticadas pela AT com base nas DIC submetidas pela respectiva fornecedora de combustível), a Requerente possa ainda obter uma pronúncia de mérito da jurisdição arbitral. Isso, porém, depende de outra indagação:

 

III.7. A possibilidade de os tribunais arbitrais sindicarem actos de liquidação (inerentemente ligados a actos de repercussão) por solicitação dos repercutidos

 

“Numa passagem do seu manual[11], Sérgio Vasques afirma que “Se o repercutido estará à margem da relação tributária, não estará por isso à margem do direito.”, referindo que a LGT lhe reconhece o direito “à reclamação, recurso, impugnação ou pronúncia arbitral[12].

“Qualquer que seja a posição a adoptar em tese geral – e, salvo disposição legal em contrário, não há razões para pôr em causa a possibilidade de os contribuintes de facto serem admitidos a invocarem perante os Tribunais a ilegalidade dos impostos que efectivamente pagaram –, tem de se ter em conta o quadro legislativo, e este foi invocado pela AT na sua Resposta para pôr em causa a possibilidade de a repercutida poder vir pedir a revisão de liquidações que lhe eram alheias[13]. Fê-lo a coberto do argumento da ineptidão do PPA por não incluir “a identificação do ato ou atos tributários objeto do pedido arbitral”, como expressamente exigido na alínea b) do n.º 2 do artigo 10.º do RJAT; mas fê-lo igualmente com base numa alegada restrição legal do círculo de sujeitos que podem solicitar o reembolso da CSR, fazendo a equiparação desses pedidos de reembolso a pedidos de revisão (negrito e sublinhado no original):

apenas os sujeitos passivos que tenham procedido à introdução no consumo dos produtos em território nacional e provem o pagamento dos respetivos ISP/CSR possuem legitimidade para solicitar o reembolso do valor pago”.

“Isto porque, defendeu,

no âmbito dos impostos especiais sobre o consumo, encontra-se previsto no CIEC um regime específico, e, conforme referem Sérgio Vasques e Tânia Carvalhais Pereira: “O reembolso por erro corresponde, materialmente, à revisão do ato tributário, com fundamento em erro dos serviços, previsto no artigo 78º da LGT, aqui com um prazo mais curto de 3 anos” (In “Os Impostos Especiais de Consumo”, Editora Almedina, 2016, a págs. 364).

“De facto, o n.º 1 do artigo 5.º da Lei n.º 55/2007, de 31 de Agosto (diploma que criou a CSR), determina a aplicação do CIEC (e da LGT e do Código de Procedimento e Processo Tributário - CPPT) à “liquidação, cobrança e pagamento” da CSR, pelo que sempre teria de se aplicar o disposto no n.º 2 do artigo 15.º do CIEC, o qual estabelece que “apenas podem solicitar o reembolso do imposto pago, os sujeitos passivos referidos no n.º 1 e na alínea a) do n.º 2 do artigo 4.º que tenham procedido à introdução no consumo dos produtos em território nacional e provem o pagamento do respetivo imposto”.

“Acrescentando a Requerida que

 “Prevê o CIEC normativos legais que se fundamentam no regime próprio dos impostos especiais de consumo, designadamente, por se tratarem de impostos monofásicos, que incidem apenas na fase da declaração para consumo, o que, regra geral, ocorre uma única vez”.

 

“Em todo o caso, concluía (invocando o Acórdão do TJUE de 20 de Outubro de 2011, proferido no âmbito do processo C-94/10),

ainda que a repercussão económica viesse a ser provada no âmbito do presente processo, entende o TJUE que um Estado-Membro se pode opor a um pedido de reembolso de um imposto indevido, apresentado pelo comprador sobre quem esse imposto tenha sido repercutido, com o fundamento de não ter sido esse comprador que o pagou às autoridades fiscais, desde que, nos termos do direito interno, esse comprador possa exercer uma ação civil de repetição do indevido contra o sujeito passivo e que o reembolso do imposto indevido, por parte deste último, não seja, na prática, impossível ou excessivamente difícil”.

 

“O Tribunal entendeu ser incompetente para se pronunciar sobre a declaração de ilegalidade da repercussão (o primeiro pedido da Requerente) –, porque esta é subsequente e exterior ao acto tributário, decorrendo de uma relação de direito privado e porque não cabe no âmbito dos actos da AT que o legislador lhe permitiu sindicar –, mas entende que tem obviamente competência para se pronunciar sobre o segundo pedido da Requerente – a declaração de ilegalidade do acto tributário. Ser competente, porém, apenas preenche o pressuposto processual referente ao Tribunal, não o que é respeitante à Requerente. A questão é: pode ela suscitar a revisão das liquidações de CSR em que não teve intervenção – e que, aliás, não consegue identificar – ainda que apenas na medida em que tais liquidações contendam com os pagamentos por ela feitos? Rectius: pode ela, supondo que todo o iter procedimental que desembocou no PPA cumpre os requisitos (o que ainda teria de se apurar) – pode a Requerente, perguntava-se, suscitar a revisão das liquidações conjuntas (e acumuladas) de ISP e CSR no segmento estrito que invoca dizer-lhe respeito?

“A questão está em saber se, portanto, no quadro processual que ficou descrito nos Factos Provados, pode este Tribunal declarar a ilegalidade das “liquidações de CSR praticadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira com base nas DIC submetidas pela respetiva fornecedora de combustível”, ainda que delimitando o âmbito da ilegalidade de tais liquidações pela correspondência aos “atos de repercussão da CSR consubstanciados nas faturas referentes à gasolina e ao gasóleo rodoviário adquiridos pela Requerente no decurso do período compreendido entre abril de 2019 e dezembro de 2022” – uma vez que, em tudo o que as exceda, não foi formulada qualquer pretensão arbitral.

“Na decisão pioneira proferida no processo n.º 408/2023, escreveu-se:

Infere-se do articulado da Requerente que esta legitima a sua intervenção processual do facto singelo de lhe ter sido repercutida a CSR pelas empresas distribuidoras de combustíveis, caracterizando-se no artigo 29.º do ppa como um “consumidor” de combustíveis, sobre o qual “recai, nos termos da lei, o encargo daquele tributo.

Contudo, importa, antes de mais, salientar que a repercussão económica não é, por si só, atributo de legitimidade processual, pois o artigo 9.º do CPPT requer a demonstração de um interesse legalmente protegido, i.e., que mereça a tutela do direito substantivo. Além de que a Requerente não tem a qualidade de “consumidor” de combustíveis, no sentido de consumidor final sobre o qual recai ou deve recair o encargo do tributo, na lógica da repercussão económica que subjaz nomeadamente aos Impostos Especiais de Consumo (“IEC”)

        “(…)"

“A confirmar-se a natureza “pacífica” de tal entendimento – o que não é relevante apurar para os presentes autos – tal permitiria considerar legítima a determinação legislativa do artigo 6.º da Lei n.º 24-E/2022, de 30 de Dezembro (“Altera o Código dos Impostos Especiais de Consumo, a Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, e o Decreto-Lei n.º 91/2015, de 29 de maio, transpondo as Diretivas (UE) 2019/2235, 2020/1151 e 2020/262”) ao atribuir natureza interpretativa à “redação conferida pela presente lei ao artigo 2.º do Código dos IEC”. Isto porque, dada a proibição constitucional da retroactividade de disposições fiscais que abranjam os elementos essenciais dos impostos (artigo 103.º da Constituição), só nesse caso é que tal alteração (a introdução do inciso “sendo repercutidos nos mesmos” – sendo os “mesmos” os “contribuintes” onerados segundo o “princípio da equivalência”, “na medida dos custos que (…) provocam, designadamente nos domínios do ambiente e da saúde pública”) seria verdadeiramente interpretativa e, portanto, constitucionalmente legítima.

“Ora, como também se referiu, qualquer que seja, em tese geral, a possibilidade de o repercutido invocar a ilegalidade das liquidações que originam a repercussão, no âmbito dos impostos especiais de consumo há uma norma que o veda e que o legislador manteve incólume ao longo das 25 alterações que, em 24 anos, introduziu no CIEC: a do n.º 2 do artigo 15.º (epigrafado “Regras gerais do reembolso”), assim redigida:

Podem solicitar o reembolso os sujeitos passivos referidos no n.º 1 e na alínea a) do n.º 2 do artigo 4.º que tenham procedido à introdução no consumo dos produtos em território nacional e provem o pagamento do respectivo imposto”.

Por sua vez, as disposições relevantes desse artigo 4.º (epigrafado “Incidência subjectiva”), para as quais tal norma remete, têm a seguinte redacção:

1 - São sujeitos passivos de impostos especiais de consumo:

a) O depositário autorizado, o destinatário registado e o destinatário certificado;

(…)

2 - São também sujeitos passivos, sem prejuízo de outros especialmente determinados no presente Código:

  1. A pessoa que declare os produtos ou por conta da qual estes sejam declarados, no momento e em caso de importação”.

“Desde a redacção inicial destas normas, dada pelo Decreto-Lei n.º 73/2010, de 21 de Junho, também a única alteração substancial registada foi o aditamento (pela Lei n.º 24-D/2022, de 30 de Dezembro) do “destinatário certificado” entre os sujeitos passivos identificados à cabeça da norma sobre “Incidência subjectiva”. Quer dizer que nenhum legislador – nem mesmo o que entendeu atribuir natureza interpretativa à alusão à tipicidade da repercussão dos impostos especiais de consumo – considerou necessário, para o que ora importa, alargar o círculo dos “sujeitos passivos” para lá do “destinatário certificado[14].

“Ou seja: só os sujeitos passivos aí identificados – e só quando preencham requisitos adicionais – podem suscitar questões sobre, como se escreve no n.º 1 desse artigo 15.º, “o erro na liquidação”. Só eles, portanto, podem ser titulares de um interesse tutelado pela lei – designadamente para accionarem a revisão oficiosa.

“O mesmo se escreveu na decisão do processo n.º 364/2023-T:

é o art. 9.º, 1 e 4 do CPPT, aplicável ex vi art. 29.º, 1 do RJAT, que define a legitimidade activa no processo arbitral tributário, e lá não se prevê que essa legitimidade se possa perder por efeito de uma repercussão que propiciasse a identificação de um interesse, concorrente ou exclusivo, na esfera de um “repercutido” que não seja o sujeito passivo.

(…)

“A conjugação do art. 9º, 1 e 4 do CPPT com o art. 18º, 3 da LGT dissipa quaisquer dúvidas sobre a ilegitimidade processual da Requerente: têm essa legitimidade os contribuintes, e contribuinte é o “sujeito passivo” na relação tributária, a pessoa singular ou colectiva, património ou organização de facto ou de direito que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte directo, substituto ou responsável.

“Não sendo a Requerente sujeito passivo do ISP, de acordo com a norma de incidência subjectiva constante do art. 4.º, 1, a), do CIEC, não é responsável pelo pagamento da CSR, por força do disposto nos arts. 4.º, 1, e 5.º, 1, da Lei n.º 55/2007 – não sendo consequentemente, na qualidade de contribuinte directo, titular da relação jurídica tributária, e parte legítima no processo (art. 9º, 1 do CPTA).

(…)

“Querendo isto dizer, muito pragmaticamente, que só os sujeitos passivos aí identificados, e só quando preencham requisitos adicionais, podem suscitar questões sobre erros na liquidação”.

“(…)”.

 

“E nem se diga que tal orientação é contrária ao Direito da União, porquanto, como ficou consignado, mais uma vez, na Decisão Arbitral, proferida no processo n.º 847/2023-T, “Sobre a possibilidade de certos interessados serem impedidos de contestar a legalidade de certos tributos (em geral ou numa específica jurisdição) já o TJUE referiu[15] que

na ausência de regulamentação comunitária em matéria de repetição de impostos nacionais indevidamente cobrados, cabe à ordem jurídica interna dos Estados-Membros designar os órgãos jurisdicionais competentes e regular as modalidades processuais dos recursos judiciais destinados a assegurar a protecção dos direitos de que os cidadãos gozam com base no direito comunitário.

“38. Por razões de segurança jurídica, os Estados-Membros estão, em princípio, autorizados a limitar, a nível nacional, o reembolso de impostos indevidamente cobrados. Contudo, estas limitações devem respeitar o princípio da equivalência, nos termos do qual as disposições nacionais devem aplicar-se de maneira idêntica às situações puramente nacionais e às situações reguladas pelo direito comunitário, e o princípio da eficácia, que impõe que o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica comunitária não se torne praticamente impossível ou excessivamente difícil”.

 

“Daqui resulta que, na lógica do Direito da União, nada impede que o legislador nacional limite (e não apenas na jurisdição arbitral, embora por maioria de razão nesta, dada a sua competência por atribuição), os modos e as condições de, e os interessados na, obtenção da declaração de ilegalidade dos actos de liquidação por razões ligadas à prevalência do Direito da União – designadamente excluindo a possibilidade de quem quer que seja que não tenha tido intervenção neles suscitar a avaliação dessa desconformidade[16].

“Diga-se, mas apenas como obiter dictum, que tal opção legislativa, que tem de se admitir justificada face à impraticabilidade de se gerir um sistema, digamos, “aberto” (como o que resultaria dos números indicados acima), foi aliás, no que diz respeito à contrariedade de tais liquidações com o Direito da União, considerada justificável no despacho do TJUE no Processo n.º C-94/10, desde que o “comprador possa exercer uma acção civil de repetição do indevido contra o sujeito passivo e que o reembolso do imposto indevido, por parte deste último, não seja, na prática, impossível ou excessivamente difícil”.

“Se essa condição está ou não preenchida no caso não cabe, evidentemente, a este Tribunal apurar: tal perquisição só poderia ocorrer aquando da aferição da conformidade do sistema legal de recuperação de montantes pagos a título de CSR com o Direito da União (na fase da decisão sobre o fundo), e o Tribunal já concluiu que a Requerente não está em condições de o poder levá-lo a confrontar-se com tal questão (como o poderiam fazer os sujeitos passivos da relação tributária).”

 

“III.8. Conclusão sobre a legitimidade da Requerente e sobre as demais questões enunciadas

 

“Concluindo-se que o presente Tribunal Arbitral é incompetente para se pronunciar sobre o primeiro pedido da Requerente (porque não pode pronunciar-se sobre actos subsequentes aos, e autónomos dos, actos de liquidação), e resultando da lei que a Requerente é parte ilegítima para suscitar o segundo (questionar os actos de liquidação da CSR que pudessem ter alguma ligação com os ditos actos de repercussão), conclui-se que a Requerida terá de ser absolvida da instância, ficando prejudicados todos os passos seguintes no iter cognoscitivo acima delineado, incluindo as questões de constitucionalidade e o pedido de reenvio prejudicial suscitado pela Requerente na sua “réplica” (que só poderiam ser abordadas depois de se estabelecer a competência do Tribunal e a legitimidade da Requerente).

“Não se opinando sobre o mérito, ficam igualmente prejudicados os pedidos de “restituição” e de pagamento de juros indemnizatórios.”

 

As considerações transcritas são plenamente transponíveis para o caso dos autos .

Sublinha-se apenas, ao que já ficou dito, que também não assiste razão às Requerentes quando alegam, entre o mais, que se não for reconhecida a legitimidade processual activa aos “repercutidos legais do (…) violaria, de forma grosseira, os princípios constitucionais do acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva, por não acautelar os direitos dos repercutidos (artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa), e da igualdade, por discriminar negativamente os repercutidos relativamente aos demais sujeitos da relação jurídico-tributária de repercussão legal (artigo 13.º da CRP), sendo um tal sentido interpretativo, por esse motivo, materialmente inconstitucional.”

Ora, o direito à tutela judicial efectiva, em regra, não põe em causa o regime sobre a legitimidade processual activa (ainda que se trate de regime especial) a menos que se demonstrasse que as normas que configuram essa legitimidade processual fossem inconstitucionais. O que não vem demonstrado, uma vez que as Requerentes se limitam a tecer considerações abstractas sobre as alegadas inconstitucionalidades. Acresce que, ficou demonstrado que a configuração da CSR constitui um imposto conforme ao direito Constitucional e ao direito da União, porquanto a sua configuração jurídica cabe na liberdade de conformação infra constitucional do legislador ordinário. O mesmo acontece com a liberdade do legislador para estabelecer “que a incidência subjetiva da CSR, tal como recortada na 1ª. parte do artigo 5.º da Lei n.º 55/2007, abrange apenas os sujeitos passivos de imposto sobre produtos petrolíferos e energéticos, designadamente a entidade a quem as Requerentes adquiriram combustível” (ver ponto 71º do Pedido), “sujeitos passivos formais”, que as próprias Requerentes reconhecem como tal.

Como vimos, as Requerentes tentam fundamentar a sua legitimidade processual activa num alegado mecanismo de repercussão legal que, ao não ser previsto pela Lei n.º 55/2007, não pode ser subvertido pelos tribunais a menos que se considerem inconstitucionais as normas pertinentes, o que, reitera-se, não vem demonstrado.

Neste sentido, pode ler-se na Decisão arbitral proferida no processo n.º 467/2023-T, citando a Decisão arbitral proferida no processo n.º 375/2023-T, que:

“44. compreende-se que o legislador não tenha adoptado um conceito irrestrito de legitimidade activa, rodeando-se de algumas cautelas, atentas as dificuldades práticas que uma tal abertura suscitaria, quer na ligação entre o acto de liquidação do imposto, a determinação da sua efectiva repercussão (económica) e a determinação do seu quantum; quer ainda no potencial desdobramento/duplicação de devoluções de imposto indevidas: simultaneamente ao sujeito passivo e ao(s) múltiplos repercutido(s) económicos da cadeia de valor. Ou seja, o mesmo imposto poderia ser restituído a diversos intervenientes, de forma dificilmente controlável e mapeável, com manifesto prejuízo para o Estado, em colisão com os princípios da igualdade e da praticabilidade.

45. Por fim, não se diga que as ora Requerentes ficaram desprovidas de tutela, pois nada impede o ressarcimento, através de uma acção civil de repetição do indevido instaurada contra os seus fornecedores, se reunirem os devidos pressupostos, nos termos declarados pelo Acórdão do Tribunal de Justiça, de 20 de outubro de 2011, no processo C-94/10, Danfoss A/S (pontos 24 a 29). Nesta perspectiva, está acautelada a observância do princípio fundamental da tutela jurisdicional efetiva (vd. artigo 20.º da Constituição).”

 

 

IV-DECISÃO

Termos em que se decide neste Tribunal Colectivo:

a) Julgar o presente Tribunal Arbitral incompetente para se pronunciar sobre o pedido de declaração dos actos de repercussão da CSR consubstanciados nas facturas referentes à gasolina e ao gasóleo rodoviário adquiridos pelas Requerentes no período compreendido entre  Maio de 2019 e Dezembro de 2022;  

b) Julgar as Requerentes partes ilegítimas para suscitar a declaração de “ilegalidade (…) das correspondentes liquidações de CSR praticadas pela Administração Tributária e Aduaneira com base nas DIC submetidas pela respetiva fornecedora de combustível”;

c) Em consequência, absolver a AT da instância, condenando as Requerentes nas custas, nos termos abaixo fixados.

 

 

V - VALOR DO PROCESSO

Em conformidade com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2 do CPC e 97.ºA do CPPT, e artigo 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, o valor do pedido é fixado em €. 923.361,96.

 

VI - CUSTAS ARBITRAIS

Nos termos do disposto nos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e no artigo 4.º, n.º 4 do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor da taxa de arbitragem em €12.852,00, nos termos da Tabela I do mencionado Regulamento, a cargo das Requerentes.

 

Registe-se e notifique-se.

 

Lisboa,  4  de Julho de 2024

 

Os Árbitros

 

(Fernanda Maças - presidente)

 

 

Dr. Lima Guerreiro (árbitro vogal ) – com declaração de voto

 

 

Dr. Rui Miguel Zeferino (árbitro vogal)

 

 

 

DECLARAÇÃO DE VOTO

 

Em  minha opinião, já expressa entre outras , nas Decisões Arbitrais nº s 537/2023- T,  736/2023- T, 874/2023- T, 914/2023-T,  e 981/2023-T, a legitimidade da impugnação da CSR não está reservada aos sujeitos passivos de ISP, integrando o universo definido no art. 15º do Código dos Impostos Especiais de Consumo, compreendendo também quem suporta,  por repercussão legal, o encargo do imposto. De outro modo, seria incompreensível a alínea a) do nº 4 do art. 18º da LGT, que declara não ser sujeito passivo quem suporta por repercussão legal o encargo tributário, mas sem prejuízo do direito de reclamação, recurso, impugnação ou de pedido de pronúncia arbitral nos termos das leis tributárias.

No presente processo arbitral não está em causa a legalidade de qualquer ato de repercussão que o Tribunal Arbitral não possa conhecer, mas  apenas a legitimidade das  Requerentes  para  contestar no âmbito da jurisdição arbitral um conjunto de liquidações da autoria dos serviços aduaneiros.

Essa legitimidade depende de dois requisitos cumulativos e não meramente alternativos: a transferência do encargo da CSR para a esfera do sujeito passivo para a esfera do impugnante e que essa repercussão tenha sido legal e não meramente económica  ou de facto, pelo que o impugnante, independentemente da sua vontade,  está  necessariamente obrigado a suportá-la, requisitos que , segundo essas Decisões Arbitrais e muitas outras no mesmo sentido, o Tribunal Arbitral teria necessariamente de apreciar.

 

Lisboa, 4 de Julho de 2024

 

O Árbitro

 

(António Barros Lima Guerreiro)

 



[1] Na redação vigente até 31 de dezembro de 2022, posteriormente alterada por imposição da Lei n.º 24-E/2022, de 30 de dezembro.

[2] Na redação vigente até 31 de dezembro de 2022, posteriormente alterada por imposição da Lei n.º 24-E/2022, de 30 de dezembro.

[3] Na fórmula usada na decisão do processo n.º 629/2021-T, “Isso não releva do âmbito de competência do tribunal, releva do âmbito de sujeição a ele de um dos intervenientes processuais”, invocando em nota a “decisão do caso n.º 146/2019-T (com um voto de vencido) que acaba por reconduzir a primeira [“competência – delimitada legislativamente”] a incompetência absoluta e a segunda [“vinculação – delimitada pela portaria dentro da liberdade de opção atribuída por lei”] a incompetência relativa”.

 

[4] Em todas as decisões elencadas a seguir renunciou-se expressamente a estabelecer a natureza da CSR em homenagem à liberdade de vinculação que o legislador atribuiu ao autor da portaria de vinculação, por se ter entendido que, como se escreveu vg na decisão n.º 508/2023-T, outra solução implicaria “impor indagações com esse nível de dificuldade, incerteza de resultados e morosidade para definição da competência dos tribunais arbitrais”. Nesse sentido, escreveu-se aí o seguinte (negrito aditado): “aquele artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 não se estará a reportar a tributos que pela lei são denominados como «taxas» ou «contribuições financeiras a favor das entidades públicas», que não se enquadrem na definição das referidas «contribuições especiais», mesmo que, após análise aprofundada das suas características pelo tribunal previamente definido como competente, se possa concluir que devem ser considerados como impostos especiais, designadamente para efeitos de aplicação das exigências constitucionais relativas a impostos” (destaque aditado).

 

[5] Esta decisão assenta numa dupla fundamentação: ilegitimidade e ineptidão da petição inicial e, por isso, surge em duplicado na listagem.

 

[6] No decisório só se invoca a ilegitimidade da Requerente, mas no Sumário, a mais desta, faz-se referência à ineptidão da Petição inicial, razão pela qual também surge em duplicado na listagem.

[7] Escreveu-se então: “Ainda que a qualificação jurídica de um tributo como imposto ou não-imposto tenha de depender das suas características intrínsecas (…), não são indiferentes os índices que – sendo externos a essa qualificação – foram invocados pela Requerente e pela Requerida. Assim, para começar, a jurisprudência do CAAD (e dos tribunais estaduais que a examinaram) não é indiferente”.

[8] Nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do RJAT, os tribunais arbitrais constituídos no CAAD também são competentes para “A declaração de ilegalidade de actos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de actos de determinação da matéria colectável e de actos de fixação de valores patrimoniais”.

[9] Manual de Direito Fiscal I, Reimpressão, s/ed., Lisboa, 1981, p. 409.

[10] Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, 4.ª ed, encontro da escrita, Lisboa, 2012, p. 187. Tenha-se em conta que, embora os AA. admitissem que essa “primeira impressão” desse lugar a “uma nova noção de sujeito passivo” (p. 188), acabavam por concluir (p. 189) que “A repercussão efectua-se fora do âmbito da obrigação tributária.” e (p. 190), que “a repercussão é estranha à relação jurídico tributária”. No mesmo sentido – ainda que aparentemente por referência ao IVA, Nina Aguiar, in Códigos Anotados e Comentados - Justiça Tributária - LGT.CPPT.RGIT.RCPITA.RAT.LPFA, Lexit, 2018, p. 45: “aquele que suporta o imposto”, “Não é (…) sujeito de qualquer relação jurídica tributária”.

[11] Manual de Direito Fiscal, 2.ª ed., Almedina, Coimbra, p. 401.

 

[12] Dispõe o n.º 4 do artigo 18.º do RJAT que “Não é sujeito passivo quem: a) Suporte o encargo do imposto por repercussão legal, sem prejuízo do direito de reclamação, recurso, impugnação ou de pedido de pronúncia arbitral nos termos das leis tributárias; (…)”.

 

[13] O Tribunal não fez uma indagação de Direito Comparado, mas como resulta do n.º 58 da decisão que o TJUE proferiu, em 2 de Outubro de 2003, no processo C-147/01 (Weber's Wine World Handels-GmbH et al. v. Abgabenberufungskommission Wien), essa é uma solução que não é específica do Direito nacional: “na medida em que tenha efectivamente havido repercussão, foram os consumidores que suportaram o encargo do imposto sobre as bebidas alcoólicas. Ora, nem a ordem jurídica do Land de Viena nem a da República da Áustria oferecem, em geral, aos consumidores a possibilidade de invocarem, no quadro de um procedimento de tributação, a ilegalidade de um imposto assim repercutido”.

[14] O que foi reiterado na decisão do processo n.º 364/2023-T.

[15] Nos n.os 37 e 38 da decisão citada na nota 11.

 

[16] Como se referiu supra, nota 11, é o que acontece na Áustria.