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SUMÁRIO:
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Nos casos em que há lugar a retenção da fonte, a título definitivo, o erro sobre os pressupostos de facto e de direito dessa retenção é suscetível de configurar “erro imputável aos serviços”, para efeitos de apresentação, no prazo de 4 anos, do pedido de revisão dos atos tributários, nos termos do n.º 1 do artigo 78º da Lei Geral Tributária.
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A circunstância de a Requerente ser um Organismo de Investimento Coletivo, sujeito passivo, não residente para efeitos fiscais em Portugal, sem qualquer estabelecimento estável, não diminui a legitimidade processual, que decorre do artigo 10.º, n.º 2, do RJAT.
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As normas do n.º 1, parte final, e do n.º 3 do artigo 22.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, interpretadas conjugadamente, ao estabelecerem um tratamento fiscal mais favorável para os organismos de investimento coletivo que operem em Portugal de acordo com a legislação portuguesa, em relação aos organismos equiparáveis que tenham sido constituídos de acordo com a legislação de outro Estado-Membro da União Europeia, viola o princípio da liberdade de circulação de capitais consagrado no artigo 63.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.
DECISÃO ARBITRAL
Os Árbitros Conselheiro Carlos Alberto Fernandes Cadilha (Árbitro-Presidente), Dr. Nuno Miguel Morujão e Dr. Gonçalo Marquês de Menezes Estanque (Árbitros Vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, acordam no seguinte:
I- Relatório
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A... (anteriormente designado por B...), Organismo de Investimento Coletivo constituído de acordo com o direito alemão, com o número de contribuinte português ... (adiante designado por “Requerente”), veio, ao abrigo da al. a) e b) do n.º 2 do artigo 10.º do decreto-lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (adiante apenas designado por “RJAT”), em conjugação com o artigo 99.º e n.º 1 do artigo 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), requerer a constituição de tribunal arbitral, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante “AT” ou “Requerida”).
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O Requerente pede a pronúncia arbitral para apreciação da legalidade dos atos de retenção na fonte de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”) incidentes sobre o pagamento de dividendos relativos aos anos de 2019, 2020, 2021 e 2022, bem como da formação da presunção de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa previamente apresentado para o efeito.
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O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e notificado à AT, em 21/12/2023.
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A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico designou como árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo os ora signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
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Em 6/2/2024, as partes foram notificadas da designação dos árbitros, não tendo arguido qualquer impedimento.
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Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 26/2/2024.
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Nestes termos, o Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído para apreciar e decidir o objeto do processo.
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A Requente alega, essencialmente, que:
Questões prévias:
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O objeto mediato dos presentes autos consiste na análise da legalidade dos atos de retenção na fonte de IRC incidentes sobre o pagamento de dividendos relativos aos anos de 2019 a 2022, no valor de EUR 397.812,90, constituindo a formação da presunção de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa o objeto imediato ora sindicado, ao confirmar a legalidade dos referidos atos tributários.
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Decorre da alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do RJAT que estão abrangidos no âmbito da jurisdição do Tribunal Arbitral todos os tipos de atos passíveis de serem impugnados através de impugnação judicial, desde que tenham por objeto os atos mencionados nos n.ºs 1 e 2 do artigo 102.º do CPPT.
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Ora, conforme resulta do quadro legal aplicável em sede de processo tributário, a forma processual de reação contra o indeferimento do pedido de revisão oficiosa (expresso ou tácito) pode ser a impugnação judicial (ou, in casu, arbitral) ou a ação administrativa consoante a decisão comporte, ou não, a apreciação da legalidade do ato tributário.
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A delimitação do âmbito de aplicação da impugnação judicial/arbitral e da ação administrativa em sede tributária decorre diretamente do artigo 97.º, n.º 1, alíneas d) e p), do CPPT, nos termos do qual se estabelece que,
“1 – O processo judicial tributário compreende: (...)
d) A impugnação dos atos administrativos em matéria tributária que comportem a apreciação da legalidade do ato de liquidação; (...)
p) O recurso contencioso do indeferimento total ou parcial ou da revogação de isenções ou outros benefícios fiscais, quando dependentes de reconhecimento da administração tributária, bem como de outros atos administrativos relativos a questões tributárias que não comportem apreciação da legalidade do ato de liquidação; (…)”.
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Pelo que, a utilização do processo de impugnação, ou da ação administrativa, depende necessariamente do conteúdo do ato impugnado, i.e.:
(a) se o ato comporta a apreciação da legalidade de um ato de liquidação é aplicável o processo de impugnação judicial ou arbitral; e
(b) se não comporta tal apreciação, é aplicável a ação administrativa.
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A regra acima aplica-se na ausência de norma especial que estabeleça qualquer disposição em sentido contrário, tal como sucede no caso em apreço, pois não existe qualquer norma especialmente aplicável ao indeferimento do pedido de revisão oficiosa apresentado ao abrigo do artigo 78.º da LGT.
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Em 17/03/2022 foi conhecido o veredito do TJUE no processo que correu termos sob o n.º C-545/19 (AllianzGI-Fonds AEVN), no qual o TJUE se pronunciou, de acordo com a pretensão do Requerente no processo, sobre o regime português de tributação de dividendos auferidos por OIC.
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Conforme já decidiu o STA, “À face do preceituado no art. 97.º, n.ºs 1, alíneas d) e p), e 2, do CPPT, a utilização do processo de impugnação judicial ou do recurso contencioso (atualmente ação administrativa especial, por força do disposto no art. 191.º do CPTA) para impugnar um ato em matéria tributária depende do conteúdo do acto impugnado: se este comporta a apreciação da legalidade de um ato de liquidação será aplicável o processo de impugnação judicial e se não comporta uma apreciação desse tipo é aplicável o recurso contencioso/ação administrativa especial” – vide acórdão proferido no processo n.º 0194/09, de 25/06/2009.
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É, de resto, pacífico o entendimento de que um ato de indeferimento expresso ou tácito de um pedido de revisão oficiosa, que verse sobre a legalidade do tributo que o consubstancia, como sucedeu in casu, é um ato passível de apreciação pelo Tribunal Arbitral, sendo inúmeras as decisões arbitrais neste sentido (cf. acórdão n.º 246/2018-T, n.º 540/2020-T CAAD, ou ainda decisão proferida em sede arbitral, de 23/05/2022, no processo n.º 753/2021-T, que cita acórdão do STA, no processo n.º 0506/18, de 13/03/2019).
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De acordo com o n.º 1 do artigo 57.º da LGT, impende sobre a AT o dever de proferir uma decisão no âmbito do procedimento tributário no prazo de 4 meses, presumindo-se, em caso de desrespeito de tal obrigação, o indeferimento tácito “para efeitos de recurso hierárquico, recurso contencioso ou impugnação judicial” (n.º 5 do artigo 57.º da LGT). Por outras palavras, o indeferimento tácito comporta em si mesmo uma tomada de posição sobre a alegada ilegalidade, razão pela qual tem os mesmos efeitos que resultariam de um indeferimento expresso.
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Assim, tendo o pedido de revisão oficiosa sido enviado a 15/5/2023, presume-se o indeferimento tácito do mesmo quatro meses depois, ou seja, em 15/09/2023, data a partir da qual começou a correr o prazo para impugnação contenciosa do referido indeferimento e, consequentemente, dos atos de retenção na fonte de IRC objeto dos autos, nomeadamente através do recurso ao pedido de constituição de tribunal arbitral no prazo de 90 dias.
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Por outro lado, nos termos do artigo 71.º do CPPT, é admissível a cumulação de pedidos sempre que se verifique a identidade de tributos e do órgão competente para a decisão, bem como dos fundamentos de facto e de direito invocados.
De acordo com o artigo 3.º, n.º 1 do RJAT, “a cumulação de pedidos ainda que relativos a diferentes atos e a coligação de autores são admissíveis quando a procedência dos pedidos dependa essencialmente da apreciação das mesmas circunstâncias de facto e da interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou regras de direito”.
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Assim, mostram-se preenchidos todos os requisitos legais, para que seja admitida a presente cumulação de pedidos – abrangendo a presente impugnação as retenções na fonte de IRC referentes aos anos de 2019, 2020, 2021 e 2022 efetuadas na esfera do Requerente – uma vez que é inequívoca a identidade de tributos, sendo certo que o presente pedido tem por base para todos os períodos de tributação a desconformidade da legislação nacional em que assentam os atos tributários sindicados com o direito comunitário, em particular com os princípios da não discriminação e da liberdade de circulação de capitais.
Questão principal:
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Nos termos do acórdão AllianzGI-Fonds AEVN, C-545/19: “Com as suas cinco questões, que há que examinar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os artigos 56.° e 63.° TFUE devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação de um Estado-Membro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um OIC não residente são objeto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção. Esse órgão jurisdicional interroga-se, por um lado, sobre a questão de saber se esse tratamento fiscal diferente em função do local de residência da instituição beneficiária pode ser justificado pelo facto de os OIC residentes estarem sujeitos a outra técnica de tributação e, por outro, se a apreciação da comparabilidade das situações dos OIC residentes e dos OIC não residentes para efeitos de determinar se existe uma diferença objetiva entre estes, de molde a justificar a diferença de tratamento instituída pela legislação desse Estado-Membro, deve ser efetuada apenas ao nível do veículo de investimento ou deve igualmente ter em conta a situação dos detentores de participações sociais” (cf. AllianzGI-Fonds AEVN, C-545/19).
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O TJUE declarou que: “O artigo 63.° TFUE [relativo à liberdade de circulação de capitais] deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado-Membro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um organismo de investimento coletivo (OIC) não residente são objeto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção”.
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Significa isto que o regime previsto nos artigos 94.º n.º 1 alínea c), 94.º n.º 3 alínea b), 94.º n.º 4 e 87.º n.º 4, todos do CIRC, ao prever que os rendimentos obtidos em Portugal por OIC não residentes, estão sujeitos a retenção na fonte liberatória em sede de IRC a uma taxa de 25% (enquanto se prevê uma isenção de tributação aplicável, nos termos do artigo 22.º do EBF, a dividendos auferidos por OIC residentes), não é compatível com o princípio da livre circulação de capitais, tal como resulta expresso e inequívoco da decisão do TJUE.
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Ora, entende o Requerente que a decisão do TJUE no referido processo implica a necessária procedência do pedido de revisão oficiosa anteriormente apresentado e, bem assim, do presente pedido de pronúncia arbitral, uma vez que a questão a dirimir é materialmente igual.
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Face a tudo o acima exposto e, em concreto, face à situação fáctica objeto do presente pedido de pronúncia arbitral, é evidente que deveria o pedido de revisão oficiosa previamente apresentado pelo ora Requerente ter sido julgada integralmente procedente, por se mostrarem ilegais os atos de retenção na fonte de IRC incidentes sobre o pagamento de dividendos relativos aos anos de 2019 a 2022, por violação do princípio do primado consagrado no artigo 8.º, n.º 4, da CRP, o que motivará a integral procedência do presente pedido arbitral, concluindo-se pela anulação dos atos tributários ora sindicados e pelo direito do Requerente à restituição do imposto indevidamente suportado,
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Acrescido dos juros indemnizatórios legalmente devidos nos termos do artigo 43.º da LGT, tudo com as demais consequências legais.
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Por Despacho Arbitral, de 26/2/2024, nos termos do previsto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 17.º do RJAT, notificou-se a AT para, no prazo de 30 dias, apresentar resposta e, querendo, solicitar a produção de prova adicional, acrescentando dever ser remetido ao tribunal arbitral cópia do processo administrativo dentro do prazo de apresentação da resposta, aplicando-se, na falta de remessa, o disposto no n.º 5 do artigo 110.º do CPPT.
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A Requerida apresentou Resposta a 9/4/2024 com Processo Administrativo.
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A Requerida alegou, em síntese, que:
Questões prévias:
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Relativamente ao pedido de revisão oficiosa, constata-se que a requerente, na qualidade de substituído tributário, pede que o Tribunal Arbitral aprecie, pela primeira vez, as retenções na fonte efetuadas pelo substituto tributário sem que tenha desencadeado procedimento de reclamação graciosa nos termos do artigo 132º do CPPT. Situação esta que está fora da vinculação da AT à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD.
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Para mais quando a Requerente não recorreu, em tempo, à reclamação graciosa prevista no referido artigo 132º do CPPT, deixando, desse modo, precludir o prazo de 2 anos aí previsto.
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Ora, o procedimento administrativo de revisão oficiosa não pode substituir a reclamação graciosa prevista no artigo 132.º do CPPT, ainda para mais quando o recurso ao mesmo é feito para além do prazo de 2 anos previsto no n.º 1 de tal artigo.
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Como se conclui na decisão arbitral proferida no proc. n.º 382/2019-T:
“O RJAT contém uma previsão ampla de arbitragem em matéria tributária que, todavia, não tem operacionalidade imediata, uma vez que fica condicionada à vinculação da AT. Tal vinculação traduz-se numa reserva da Administração – representada pelos Ministros das Finanças e da Justiça – e que é objeto de uma limitação concreta, por via de exceções expressamente identificadas. Entre elas, as pretensões tendentes à declaração de ilegalidade de atos de autoliquidação, de retenção na fonte ou de pagamento por conta, que não tenham sido precedidas de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131º a 133º do CPPT. Atenta a natureza voluntária e convencional da arbitragem, o intérprete não pode ampliar o objeto fixado pelo legislador no que concerne à vinculação da AT aos tribunais arbitrais”.
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Como também se referiu no Ac. Arbitral de 09/11/2012, relativo ao Proc. n.º 51/2012: “considerando a natureza voluntária da arbitragem … a interpretação da vinculação da AT não poderá, em caso algum, traduzir-se numa restrição da esfera de liberdade da AT, enquanto parte, de estabelecer os limites da sua vinculação. Só não seria assim, se a sua posição implicasse a frustração total do objetivo pretendido com a instituição da arbitragem tributária, o que não é o caso”.
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Acrescentando que “o Tribunal não se pronuncia sobre a construção doutrinária em que assenta a equiparação do procedimento de revisão oficiosa, por iniciativa do contribuinte, ao procedimento de reclamação graciosa, para efeitos de impugnação judicial. Simplesmente entende que do princípio da consagração do procedimento arbitral enquanto meio de resolução de litígios fiscais alternativo ao processo de impugnação judicial, não decorre automaticamente a extensão da vinculação da AT a todas as situações em que, doutrinaria e/ou jurisprudencialmente for considerada admissível essa impugnação. Em suma, o âmbito da vinculação da AT circunscreve-se aos termos em que se encontra expressa na portaria n.º 112-A/2011, que, no caso sub juditio, é o regime previsto no artigo 132º CPPT, que exige reclamação graciosa prévia, ainda que, para efeitos da impugnabilidade do ato, a doutrina prevalente e determinada corrente dos tribunais judiciais tributários possa admitir em alternativa a revisão oficiosa prévia. Com efeito, a equiparação dos tribunais arbitrais tributários àqueles está limitada pela natureza voluntária da adesão da AT à jurisdição arbitral”.
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Donde, in casu, não tendo o pedido de anulação das retenções na fonte sido precedido, em prazo, de reclamação graciosa necessária, o Tribunal Arbitral carece de competência para apreciar sobre a (i)legalidade das mesmas, ainda que a requerente tenha apresentado um pedido de revisão oficiosa no prazo de 4 anos.
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Tal situação impõe-se por força dos princípios constitucionais do Estado de direito e da separação dos poderes (cf. artigos 2.º e 111.º, ambos da CRP), bem como da legalidade (cf. artigos 3.º, n.º 2 e 266.º, n.º 2, ambos da CRP), como corolário do princípio da indisponibilidade dos créditos tributários ínsito no artigo 30.º, n.º 2 da LGT, que vinculam o legislador e toda a atividade da AT. Sendo constitucionalmente vedada, por força dos princípios constitucionais do Estado de direito e da separação dos poderes (cf. artigos 2.º e 111.º, ambos da CRP), bem como do direito de acesso à justiça (artigo 20.º da CRP) e da legalidade [cf. artigos 3.º, n.º 2, 202.º e 203.º da CRP e ainda o artigo e 266.º, n.º 2, da CRP], como corolário do princípio da indisponibilidade dos créditos tributários ínsito no artigo 30.º, n.º 2 da LGT, a interpretação, ainda que extensiva, que amplie a vinculação da AT à tutela arbitral fixada legalmente, por tal pressupor, necessariamente, a consequente dilatação das situações em que esta obrigatoriamente se submete a tal regime, renunciando nessa medida ao recurso jurisdicional pleno [cf. artigos 25.º e 27.º da RJAT, que impõem uma restrição dos recursos da decisão arbitral].
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Existe, por outro lado, a questão da incompetência material, do Tribunal Arbitral para o conhecimento in casu, da (i)legalidade das retenções na fonte.
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Efetivamente, as retenções na fonte não foram efetuadas pela AT. A AT nunca se pronunciou sobre a (i)legalidade de tais retenções.
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Mais, estando-se perante um indeferimento tácito, sobre o qual a AT não tomou posição expressa sobre a existência de erro imputável aos serviços, compulsado o pedido de revisão oficiosa apresentado não se retira do mesmo que a requerente tenha invocado erro de direito imputável à AT, ou que, tendo-o invocado, o comprove invocando, designadamente, que as retenções na fonte se deveram a orientações ou instruções da AT.
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Antes pelo contrário o que se retira do pedido apresentado é que as retenções na fonte terão sido feitas conformes à lei e que o cumprimento desta importa, no entender da requerente, uma restrição discriminatória ao princípio da livre circulação de capitais, contrária ao art. 63º do TFUE.
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Por outro lado, de acordo com as regras de repartição do ónus da prova constantes do artigo 74.º da LGT, o ónus da prova dos factos constitutivos de direitos cabe a quem os invocar. Assim, revogado que foi o n.º 2 do artigo 78.º da LGT, que estabelecia a presunção de que se considerava “imputável aos serviços, para efeitos do número anterior, o erro na autoliquidação”, e dispondo a lei nova para o futuro (cf. artigo 12.º do Código Civil), o pedido de revisão oficiosa com fundamento em “erro imputável aos serviços”, incluído no n.º 1 do artigo 78.º da LGT, passou a exigir, também no caso de autoliquidação, ao contribuinte a prova da imputabilidade aos serviços do erro que invoca.
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Nos termos do art. 78º nº 1 da LGT “A revisão dos actos tributários pela entidade que os praticou pode ser efetuada por iniciativa do sujeito passivo, no prazo de reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade, ou, por iniciativa da administração tributária, no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável aos serviços”.
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Assim, nos termos do art° 78º da LGT, são diferentes os prazos e os fundamentos da revisão do ato tributário, consoante esta seja efetuada pelo sujeito passivo ou pela AT.
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No caso da revisão dos atos tributários ser efetuada por iniciativa do sujeito passivo, o pedido terá que ser apresentado no prazo da reclamação administrativa, sendo de quatro anos quando a iniciativa cabe à AT, servindo apenas para os casos de erro imputável aos serviços - cfr. n° 1 art° 78º.
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Ou seja: sempre que o contribuinte opte pelo pedido de revisão, não tem quatro anos para o fazer, mas o prazo da reclamação graciosa.
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E quando, como é manifestamente o caso dos autos, no que diz respeito aos exercício de 2019 e 2020, não tenha havido erro imputável aos serviços na liquidação, preclude, com o decurso do prazo de reclamação, o direito de o contribuinte obter a seu favor a revisão do ato de liquidação.
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Por outro lado, a decisão proferida em sede de procedimento de revisão pode, ou não, comportar a apreciação da legalidade do ato de liquidação. Conforme se deliberou no Ac. do STA, de 6/11/08, no proc. nº 0357/08, a forma processual de reação contra o despacho de indeferimento do pedido de revisão oficiosa pode ser a impugnação judicial ou a ação administrativa especial, consoante a decisão comporte, ou não, a apreciação da legalidade do ato de liquidação.
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No caso concreto, o ato de indeferimento do pedido de revisão oficiosa é um ato silente, na medida em que foi apenas por efeito da passagem do tempo que se ficcionou a existência de um indeferimento tácito, para efeitos de impugnação arbitral. Ora, tal indeferimento pode consubstanciar e, no caso teria obrigatoriamente que se reportar a um indeferimento por extemporaneidade.
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Tendo em conta que o p.p.a. não é interposto para a apreciação, direta e nem indireta, de uma liquidação adicional, mas apenas para a apreciação de um indeferimento de um pedido de revisão oficiosa, é evidente que o Tribunal vai ter que decidir se a requerente ainda estava em tempo de apresentar pedido de revisão oficiosa, tendo em conta a existência de erro imputável aos Serviços.
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Donde, não há qualquer dúvida que no presente pedido de pronúncia arbitral foi submetida à apreciação do Tribunal Arbitral uma questão relativa ao controle dos pressupostos de aplicação do art. 78º da LGT.
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Ora, o Tribunal Arbitral não tem competência para apreciar e decidir a questão de saber se o indeferimento do pedido de revisão oficiosa violou, ou não, o art. 78º da LGT, e se os pressupostos de aplicação de tal mecanismo de revisão foram, ou não, bem aplicados pela AT.
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Deste modo, verifica-se a existência de uma exceção dilatória, consubstanciada na incompetência material do tribunal arbitral, a qual obsta ao conhecimento do pedido e, por isso, deve determinar a absolvição da entidade Requerida da instância, atento o disposto nos artigos 576.º, n.º 1 e 577.º, alínea a) do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.
Relativamente à questão em apreço, começa a Requerida por referir que:
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A título prévio, sempre se dirá que, sendo o Requerente um OIC e um sujeito passivo não residente para efeitos fiscais em Portugal, sem qualquer estabelecimento estável, deverá o peticionado ser julgado improcedente.
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Com efeito e recorrendo ao Acórdão Schumacker (processo C-279/03), proferido pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, o direito internacional admite que, em matéria de impostos diretos, as relações entre residentes e não residentes não são comparáveis, pois apresentam diferenças objetivas do ponto de vista do rendimento, da capacidade contributiva e da situação familiar ou pessoal.
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Importa referir que a situação dos residentes e dos não residentes não é, por regra, comparável, e que a discriminação só acontece quando estamos perante a aplicação de regras diferentes a situações comparáveis, ou de uma mesma regra a situações distintas.
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Atendendo a que é o Estado de residência que dispõe de toda a informação necessária para aferir um correto enquadramento contributivo e da sua capacidade contributiva global, a situação de um residente é, com certeza, distinta da de um não residente.
Questão principal:
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Tem o TJUE entendido que o facto de determinado Estado-membro não conceder a não residentes certos benefícios fiscais que concede a residentes, apenas pode ser discriminativo, na medida em que residentes e não residentes não se encontram numa situação comparável.
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Nesse sentido, está o Acórdão Truck Center (C-282/07, de 22/12/2008), “cuja conclusão foi a de que sujeitos passivos residentes e não residentes não se encontram numa situação objetivamente comparável”.
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Pode assim dizer-se que, o princípio da não discriminação atende à necessidade de conferir tratamento igual ao que é igual e diferente àquilo que é diferente, na medida dessa diferença. De facto, resulta da jurisprudência do TJUE que determinada norma ou prática pode ser discriminatória, entrando em conflito com o Direito Comunitário, se não for objetivamente justificada.
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Ora, no caso em apreço, as alegadas diferenças de tratamento encontram-se plenamente justificadas dentro da sistematização e coerência do sistema fiscal português.
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Nesse sentido, veja-se, o Acórdão Bachman (C-204/90) e Comissão/Bélgica (C-300/90), e Acórdão Marks & Spencer (C-446/03), em que o TJUE concluiu que a residência pode constituir um fator justificador das normas fiscais que implicam uma diferença de tratamento entre contribuintes residentes e não residentes.
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Aliás, o TFUE refere expressamente que a proibição de todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados-Membros e entre Estados-Membros e países terceiros (art. 63º, nº 1, do TFUE), não prejudica os Estados-Membros de “Aplicarem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido” [art. 65º, nº 1, alínea a), do TFUE] (Acórdão do STA 01435/12, de 20/02/2013).
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Também o Supremo Tribunal Administrativo (STA), no âmbito do proc. nº 0654/13, de 27 de Novembro referiu que “Resulta da jurisprudência comunitária que embora da legislação nacional decorra, em abstrato, uma restrição à livre circulação de capitais não consentida pelo art. 56º do Tratado da Comunidade Europeia (actual art. 63º TFUE), importa averiguar se essa restrição, consubstanciada em maior tributação de entidade não residente, será neutralizada, em concreto, por via da Convenção celebrada entre os Estados para evitar a dupla tributação”.
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O Decreto-Lei nº 7/2015, de 13 de janeiro, veio proceder à reforma do regime de tributação dos OIC, ficando estes sujeitos passivos de IRC excluídos na determinação do seu lucro tributável dos rendimentos de capitais, prediais e mais valias, referidos nos artigos 5.º, 8.º e 10.º do CIRS, conforme prevê o n.º 3 do artigo 22º do EBF, a que acresce a isenção das derramas municipal e estadual, conforme n.º 6 da mencionada norma legal. Contudo paralela a esta opção legislativa de “aliviar” estes sujeitos passivos da tributação em IRC, é criada uma taxa em sede de Imposto do Selo incidente sobre o ativo global líquido dos OIC. Ou seja, optou-se por uma tributação na esfera do Imposto do Selo tendo sido aditada, à TGIS, a Verba 29, de que resulta uma tributação, por cada trimestre, à taxa de 0,0025% do valor líquido global dos OIC aplicado em instrumentos do mercado monetário e depósitos, e à taxa 0,0125%, sobre o valor líquido global dos restantes OIC, sendo que, neste caso, a base tributável pode incluir dividendos distribuídos.
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Esta reforma na tributação veio apenas a incidir sobre os OIC abrangidos pelo artigo 22.º do EBF, dela ficando excluídos os OIC constituídos e que operem ao abrigo de uma legislação estrangeira.
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Por outro lado, está também prevista a tributação autónoma à taxa de 23%, nos termos do n.º 11 do artigo 88.º, do Código do IRC e do n.º 8 do artigo 22.º do EBF, dos dividendos pagos a OIC com sede em Portugal, quando as partes sociais a que respeitam os lucros não tenham permanecido na titularidade do mesmo sujeito passivo, de modo ininterrupto, durante o ano anterior à data da sua colocação à disposição e não venham a ser mantidas durante o tempo necessário para completar esse período.
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Por isso, neste caso, não parece estarmos perante situações objetivamente comparáveis, porquanto a tributação dos dividendos opera segundo modalidades diferentes e nada indica que a carga fiscal que onera os dividendos auferidos pelos OIC abrangidos pelo artigo 22.º, do EBF, possa ser mais reduzida do que a que recai sobre os dividendos auferidos em Portugal pela requerente.
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E ainda que o Fundo não consiga recuperar o imposto retido na fonte em Portugal no seu estado de residência, também não está demonstrado que o imposto não recuperado pelo Fundo não possa vir a ser recuperado pelos investidores.
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Ou seja, a aparente discriminação na forma de tributar os dividendos distribuídos por sociedades residentes a OIC não residentes, não pode levar a concluir, em nossa opinião, por uma menor carga fiscal dos OIC residentes, pois como se viu embora o regime fiscal aplicável aos OIC constituídos ao abrigo da legislação nacional, consagre a isenção dos dividendos distribuídos por sociedades residentes, não afasta a tributação desses rendimentos, seja por tributação autónoma (IRC), seja em imposto do selo, quando os mesmos rendimentos integram o valor líquido destes organismos, logo, não pode afirmar-se que as situações em que se encontram aqueles OIC e os Fundos de Investimento constituídos e estabelecidos noutros Estados Membros que auferem dividendos com fonte em Portugal, sejam objetivamente comparáveis.
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E não sendo as situações comparáveis, parece difícil de aceitar o argumento da requerente de que a legislação nacional e particularmente o artigo 22.º do EBF está em desconformidade e contrariaria o disposto no TFUE, nomeadamente, quanto à liberdade de circulação de capitais, tendo em apreço a proibição geral de discriminação face a uma restrição injustificada à liberdade de estabelecimento prevista no artigo 63.º do referido TFUE.
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Não compete à AT avaliar a conformidade das normas internas com as do TFUE, não podendo aceitar de forma direta e automática as orientações interpretativas do TJUE, quando estas não têm, na sua origem, a apreciação de compatibilidade entre as disposições do direito interno português e o direito europeu.
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Na verdade, tem a AT que considerar que no processo de elaboração das normas em questão o legislador doméstico terá tido em atenção todo o ordenamento jurídico, quer nacional quer internacional, pelo que essas normas devem respeitar os mesmos, sendo certo, também, que não cabe à AT a sindicância das normas no que concerne à sua adequação relativamente ao Direito da UE.
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Quando se trata de densificar conceitualmente o âmbito normativo da liberdade de circulação de capitais observa-se a inexistência de uma definição deste conceito. Por este motivo, o TJUE tem sucessivamente acolhido e sublinhado o valor enumerativo e indicativo, mas não exaustivo, da Diretiva n.º 88/361/CEE, incluindo o respetivo Anexo I, nomeadamente o número IV, onde se subsumem ao conceito, uma vasta constelação de operações e transações transfronteiriças sobre certificados de participação em OIC, em que se incluem os relevantes in casu.
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Com efeito, a distribuição de dividendos efetuada por sociedades residentes em Portugal, ao ora Requerente, é passível de ser qualificada como movimento de capital na aceção do artigo 63.º do TFUE e da própria Diretiva 88/361/CEE, de 24 de junho de 1988.
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No âmbito da apreciação da conformidade das normas do CIRC e do EBF, atinentes aos dividendos com o princípio da liberdade de circulação de capitais, a Requerente convoca o artigo 63.º do TFUE que estabelece o seguinte: “1. No âmbito das disposições do presente capítulo, são proibidas todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados-Membros e entre Estados-Membros e países terceiros” 2.”No âmbito das disposições do presente capítulo, são proibidas todas as retenções aos pagamentos entre Estados-Membros e países terceiros”.
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Por sua vez, prescreve o Artigo 65.º do TFUE:
“1. O disposto no artigo 63.º não prejudica o direito de os Estados-Membros: a) Aplicarem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido;
b) Tomarem todas as medidas indispensáveis para impedir infrações às suas leis e regulamentos, nomeadamente em matéria fiscal e de supervisão prudencial das instituições financeiras, preverem processos de declaração dos movimentos de capitais para efeitos de informação administrativa ou estatística, ou tomarem medidas justificadas por razões de ordem pública ou de segurança pública.
2 - (…)
3. As medidas e procedimentos a que se referem os n.ºs 1 e 2 não devem constituir um meio de discriminação arbitrária, nem uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais e pagamentos, tal como definida no artigo 63.º”.
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Para se avaliar se o tratamento fiscal aplicado aos dividendos obtidos em Portugal, é menos vantajoso do que o tratamento fiscal atribuído aos dividendos obtidos pelos OIC abrangidos pelo artigo 22.º do EBF, e se tal diferenciação é suscetível de afetar o investimento em ações emitidas por sociedades residentes, teria de ser colocado em confronto o imposto retido na fonte, com carácter definitivo, à taxa de 15%, e os impostos – IRC e Imposto do Selo – que incidem sobre os segundos, e que, em conjunto, podem, em certos casos, exceder 23% do valor bruto dos dividendos.
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Além do mais, o imposto retido à Requerente poderá eventualmente dar lugar a um crédito de imposto por dupla tributação internacional, tanto na esfera da Requerente, bem como na esfera dos investidores.
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Ora, a verdade é que a Requerente não esclareceu/provou (apenas alegou) se, no caso concreto, existiu ou não um crédito de imposto por dupla tributação internacional na esfera da própria Requerente ou dos investidores.
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Pelo que, contrariamente ao afirmado pela Requerente, não pode afirmar-se que se esteja perante situações objetivamente comparáveis, porquanto, a tributação dos dividendos opera segundo modalidades diferentes, e nada indica que a carga fiscal que onera os dividendos auferidos pelos OIC abrangidos pelo artigo 22.º do EBF, possa ser mais reduzida do que a que recai sobre os dividendos auferidos em Portugal pela Requerente, antes, pelo contrário.
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Assim, com o devido respeito, a jurisprudência do TJUE não autoriza o intérprete a extrair a conclusão, em abstrato, de que a mera existência de uma retenção na fonte de IRC incidindo apenas sobre os dividendos pagos por uma sociedade residente a um Fundo de Investimento estabelecido noutro Estado-Membro constitui por si só uma restrição à livre circulação dos fluxos de capital no espaço europeu, sem que seja feita uma apreciação global do regime fiscal aplicável aos Fundos de Investimento constituídos e estabelecidos em Portugal.
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Para efeitos de averiguar, em concreto, se as situações objetivas dos OIC abrangidos pelo artigo 22.º do EBF e dos Fundos de investimento estabelecidos noutros Estados-Membros são comparáveis, no tocante à tributação dos dividendos distribuídos por uma sociedade residente, necessário se torna comparar a carga fiscal que onera uns e outros em relação ao mesmo tipo de investimentos.
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Só deste modo será possível concluir se a desvantagem de cash-flow criada pela retenção na fonte de IRC, aos fundos de investimentos estabelecidos noutros Estados-Membros da UE, cria um obstáculo ao acesso ao mercado financeiro nacional, colocando-os numa situação desfavorável quando comparada com a situação tributária aplicada aos OIC abrangidos pelo artigo 22.º do EBF.
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Aliás, a Requerente ao analisar a desconformidade da legislação nacional com o artigo 63.º do TFUE, centra-se exclusivamente nos n.ºs 1 e 3 do artigo 22.º do EBF, que estabelece a isenção de retenção na fonte, o que revela uma visão parcial do regime de tributável aplicável aos OIC abrangidos por este dispositivo legal. Pois, se a Requerente tivesse sido constituída ao abrigo da legislação nacional, não teria incidido qualquer retenção na fonte em sede de IRC sobre os dividendos auferidos, mas poderia ter incidido a tributação autónoma, à taxa de 23%, e, eventualmente, o imposto do selo previsto na Verba 29 da TGIS.
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Portanto, em lugar de se acentuar a discriminação existente no Estado de residência fiscal do credor dos rendimentos, será mais acertado falar em diferentes modalidades de tributação que até pode redundar, em certos casos, numa carga fiscal menor dos dividendos auferidos em Portugal por Fundos de Investimento constituídos ao abrigo da legislação de outros Estados-Membros da UE.
Dos Juros indemnizatórios:
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Em face do exposto e inexistindo qualquer ilegalidade sobre os atos impugnados, não há, lugar ao pagamento de juros indemnizatórios.
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Sem conceder, sempre se dirá que, a al. c) do n.º 3 do art.º 43.º da LGT, determina que são devidos juros indemnizatórios quando a revisão do ato tributário por iniciativa do contribuinte se efetuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária.
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Assim, apenas em 18/05/2023, se iniciou a contagem do prazo legalmente estabelecido, tanto para efeitos de prolação da decisão a recair sobre o pedido de revisão oficiosa, como para efeitos de contagem do eventual direito a juros indemnizatórios, que nos termos do disposto pela c) do n.º 3 do art.º 43.º da LGT e al. b) do art.º 279.º do CC, apenas se iniciarão em 16/5/2024.
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Por Despacho Arbitral de 10/4/2024, o Tribunal Arbitral proferiu o seguinte despacho: Notifique-se a Requerente para se pronunciar, querendo, sobre a matéria de exceção suscitada, na resposta, pela Autoridade Tributária.
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A Requerente apresentou Resposta a 26/4/2024, alegando, em síntese, que:
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A AT suscita a exceção de incompetência, em razão da matéria, do Tribunal Arbitral, o que é manifestamente improcedente.
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O objeto do processo arbitral é o ato de liquidação, de autoliquidação, de retenção na fonte, ou de pagamento por conta.
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É pacífico que um ato de indeferimento expresso ou tácito de um pedido de revisão oficiosa, que verse sobre a legalidade do tributo que o consubstancia, é um ato passível de apreciação pelo Tribunal Arbitral, sendo inúmeras as decisões jurisprudenciais neste sentido.
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“A tempestividade será aferida pela aplicação conjugada dos artigos 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT e 102.º, n.º 1, alínea d) do CPPT, que não contém qualquer distinção quanto ao conteúdo da decisão do pedido de revisão oficiosa” (nesse sentido, vejam-se, entre muitas outras, as decisões arbitrais nos proc. n.º 484/2020-T, proc. n.º 707/2019-T, de 09.03.2020, 99/2020-T, de 02.11.2020, 485/2020-T, de 10.08.2021, 397/2019-T, de 12.06.2020, 617/2015-T, de 22.02.2016 e 203/2015-T, de 17.11.2015).
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Além da doutrina, também o STA já oportunamente clarificou que “[o] objeto real da impugnação é o ato de liquidação e não o ato que decidiu a reclamação, pelo que são os vícios daquela e não deste despacho que estão verdadeiramente em crise” (acórdão do STA proferido em 18.05.2011, no proc. n.º 0156/11).
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De igual forma, também JORGE LOPES DE SOUSA refere que “a fórmula «declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta», utilizada na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT, numa mera interpretação declarativa, não restringe o âmbito da jurisdição arbitral aos casos em que é impugnado diretamente um ato daqueles tipos, pois a ilegalidade de atos de liquidação pode ser declarada jurisdicionalmente como corolário da ilegalidade de um ato de segundo grau, que confirme um ato de liquidação, incorporando, com essa confirmação, a sua ilegalidade”. (cf. Guia da Arbitragem Tributária, Coord. NUNO VILLA-LOBOS e MÓNICA BRITO VIEIRA, 2013, Almedina, págs. 121 e 122).
Mais salientando que “é inequívoco, pelo que se disse em relação às decisões de indeferimento de reclamações graciosas e recursos hierárquicos, que se incluem nas competências do CAAD os casos em que a declaração de ilegalidade dos atos aí indicados é efetuada através da declaração de ilegalidade de atos de segundo grau, que são o objeto imediato da pretensão impugnatória” (cf. ob. cit., pág. 122, com negrito nosso).
Concluindo que “[o]btida a conclusão de que a fórmula utilizada na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT não exclui os casos em que a declaração de ilegalidade resulta da ilegalidade de um ato de segundo grau, ela abrangerá também os casos em que o ato de segundo grau é o de indeferimento de pedido de revisão do ato tributário, pois não se vê qualquer razão para restringir” (cf. idem, com negrito e sublinhado nossos).
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Termos em que é forçoso concluir pela inexistência de incompetência material do Tribunal Arbitral, improcedendo a exceção invocada pela Requerida na Resposta.
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Por Despacho Arbitral de 13/5/2024, o Tribunal Arbitral proferiu o seguinte despacho: Notifique-se a Requerente para se pronunciar, querendo, quanto à possibilidade de ser declarada a absolvição da instância com fundamento na intempestividade da impugnação administrativa necessária a que se refere o artigo 132.º do CPPT, relativamente aos atos de retenção na fonte realizados 15 entre maio de 2019 e 20 de maio de 2021. Prazo: dez dias.
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A Requerente apresentou Resposta a 28/5/2024, alegando, em síntese, que:
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A questão suscitada no Despacho é pacífica e tem sido decidida unanimemente em casos em tudo semelhantes pelo STA (vejam-se, entre outros, os acórdãos do STA no processo n.º 087/22.5BEAVR, de 9/11/2022, no processo n.º 0565/07, de 14/11/2007, no recurso n.º 26233, de 12/12/2001, no recurso n.º 1460/02, de 25/3/2005, recurso n.º 1461/02, de 19/2/2003, recurso n.º 1771/02, de 2/4/2003, recurso n.º 422/03, de 9/4/2003).
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Efetivamente, como pode ler-se no acórdão do STA, cujo relator foi o Conselheiro Gomes Correia, no processo n.º 087/22.5BEAVR, de 9/11/2022:
“[o] meio procedimental de revisão do acto tributário não pode ser considerado como um meio excepcional para reagir contra as consequências de um acto de liquidação, mas sim como um meio alternativo dos meios impugnatórios administrativos e contenciosos (quando for usado em momento em que aqueles ainda podem ser utilizados) ou complementar deles (quando já estiverem esgotados os prazos para utilização dos meios impugnatórios do acto de liquidação)”.
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Ainda, como assevera a Conselheira Isabel Marques da Silva em acórdão de 9/12/2021, processo n.º 0706/11.9BELRS:
“É assim jurisprudência reiterada e pacífica do STA, segundo a qual, tal como a administração tributária pode, por sua iniciativa, proceder à revisão oficiosa do ato tributário, no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável aos serviços (art.º 78º da Lei Geral Tributária) também o contribuinte pode, naquele prazo da revisão oficiosa, pedir esta mesma revisão com aquele fundamentos (cfr. Acórdãos do STA com os números 0140/13, de 29.05.2013, 476/12 de 12.09.2012, 259/12 de 14.06.2012, 1007/11 de 14.03.2012”.
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De igual forma, como assinalou o Conselheiro Jorge Lino do STA, em acórdão de 14/11/2007, no processo n.º 0565/07:
“[c]omo se vê, a questão de saber se se pode pedir a revisão de um acto tributário de retenção na fonte, sem primeiramente deduzir reclamação graciosa, tem resposta afirmativa no aresto acabado de reproduzir. A questão de saber se se pode impugnar o indeferimento de pedido de revisão de idêntico acto, sem primeiramente se reclamar, deve ter resposta idêntica, desde logo porque, como se diz no mesmo citado acórdão, «o pedido de revisão por iniciativa do contribuinte configura (...) uma verdadeira reclamação»”.
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Com efeito, o artigo 78.º da LGT prevê a revisão do ato tributário por iniciativa:
i. do sujeito passivo, no prazo de reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade; ou,
ii. da AT, no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável aos serviços.
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Esta previsão não significa, no entanto, que os sujeitos passivos não possam, no prazo da revisão oficiosa aplicável à AT, solicitar a esta entidade que tome a iniciativa de a realizar. Em termos jurisprudenciais, tem sido aceite, com relevante unanimidade, que o pedido de revisão oficiosa pode ser espoletado, no prazo de quatro anos, pelo próprio contribuinte e com fundamento em qualquer ilegalidade.
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Assim, defendeu o Conselheiro Lopes de Sousa, em acórdão proferido no proc. n.º 402/06 do STA, de 17/2/2006 que:
“I- Mesmo depois do decurso dos prazos de reclamação graciosa e de impugnação judicial, a Administração Tributária tem o dever de revogar actos de liquidação de tributos que sejam ilegais, nas condições e com os limites temporais referidos no art. 78.º da L.G.T.
II - O dever de a Administração efectuar a revisão de actos tributários, quando detectar uma situação de cobrança ilegal de tributos, existe em relação a todos os tributos, pois os princípios da justiça, da igualdade e da legalidade, que a administração tributária tem de observar na globalidade da sua actividade (art. 266.º, n.º 2, da C.R.P. e 55.º da L.G.T.), impõem que sejam oficiosamente corrigidos, dentro dos limites temporais fixados no art. 78.º da L.G.T., os erros das liquidações que tenham conduzido à arrecadação de quantias de tributos que não são devidas à face da lei.
III - A revisão do acto tributário com fundamento em erro imputável aos serviços deve ser efectuada pela Administração tributária por sua própria iniciativa, mas, como se conclui do n.º 7 (anterior nº 6) do art. 78º da L.G.T., o contribuinte pode pedir que seja cumprido esse dever, dentro dos limites temporais em que Administração tributária o pode exercer.
IV - O indeferimento, expresso ou tácito, do pedido de revisão, mesmo nos casos em não é formulado dentro do prazo da reclamação administrativa mas dentro dos limites temporais em que a Administração tributária pode rever o acto com fundamento em erro imputável aos serviços, pode ser impugnado contenciosamente pelo contribuinte [art. 95.º, n.ºs 1 e 2, alínea d), da L.G.T.].
V - A formulação de pedido de revisão oficiosa do acto tributário pode ter lugar relativamente a actos de retenção na fonte, independentemente de o contribuinte ter deduzido reclamação graciosa nos termos do art. 152.º do CPT (ou 132.º do CPPT), pois esta é necessária apenas para efeitos de dedução de impugnação judicial”.
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Em Acórdão do STA datado de 14/3/2012 (proferido no recurso n.º 1007/11), a Conselheira Dulce Neto afirma de forma absolutamente cristalina que:
“[c]om efeito, no caso vertente, em que o pedido de revisão teve por objecto um acto de liquidação que o sujeito passivo reputa de ilegal – por, na sua perspectiva, ter sido emitido ao abrigo de uma errada interpretação e aplicação do Direito aplicável, com desacertada aplicação aos factos relevantes – nada impede que ele possa, no prazo de quatro anos contados da liquidação (ou, caso o tributo não tenha ainda sido pago, a todo o tempo), solicitar à Administração que reveja oficiosamente esse acto, ficando com isso investido de um direito a uma decisão sobre o pedido formulado” (vd. acórdão proferido no recurso n.º 1007/11).
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No mesmo Acórdão, o STA conclui que:
“[a] revisão do acto tributário por «iniciativa da administração tributária» pode ser efectuada «a pedido do contribuinte», como resulta do artigo 78.º, n.º 7 da LGT e do artigo 86.º, n.º 4, alínea a), do CPPT, bem como dos princípios da legalidade, justiça, igualdade e imparcialidade – artigo 266.º, n.º 2 da CRP. E o «erro imputável aos serviços» constante do artigo 78.º, n.º 1, in fine, da LGT compreende o erro de direito e não apenas o lapso, erro material ou erro de facto, como aliás veio esclarecer o n.º 3 do artigo 78.º da LGT, na redacção introduzida pelo artigo 40.º da Lei n.º 55-B/04, de 30 de Dezembro”. (idem).
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No mesmo sentido vai o acórdão proferido pelo STA em 3/6/2020, no proc. n.º 095/18, quando refere que:
“Na verdade e como bem se discorre na sentença (…), o procedimento de revisão dos actos tributários, previsto no art. 78° da Lei Geral Tributária, é específico da Administração Tributária e de natureza oficiosa, independentemente de ter lugar por sua iniciativa ou a pedido do interessado, bem como do resultado da revisão, constituindo-se simultaneamente numa garantia e num direito, relativamente os actos tributários finais ou intermédios, negativos ou positivos, neste sentido”.
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Aliás, já no âmbito do CPT (cujo artigo 94.º tinha um âmbito mais restrito que o atual artigo 78.º da LGT), o Conselheiro Benjamim Rodrigues afirmava inequivocamente que:
“[p]ermitindo a lei a revisão do ato tributário, não é possível falar-se de uma estabilização definitiva dos efeitos do ato tributário sem que todos os prazos da sua reclamação, pedido de revisão oficiosa judicial, de revisão e de recurso contencioso estejam esgotados. Mesmo quando oficiosa, a revisão do ato tributário pode ser impulsionada por pedido dos contribuintes, tendo a administração tributária o dever de proceder a ela, caso se verifiquem os respetivos pressupostos legais” (cf. acórdão do STA datado de 20/3/2002, recurso n.º 026580).
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Assim, o mesmo Venerando STA já se pronunciou de forma clara, afirmando que: “[n]a verdade, é hoje pacífico que a revisão prevista no art. 78.º da LGT constitui um poder-dever da AT, à qual se impõe, por força dos princípios justiça, da igualdade e da legalidade dos impostos, que a AT está obrigada a observar na sua actividade (cfr. art. 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa e art. 55.º da LGT), que não exija dos contribuintes senão o imposto resultante dos termos da lei; e é também jurisprudência consolidada, que, tal como a AT deve, por sua iniciativa, proceder à revisão oficiosa do acto tributário (no prazo de quatro anos após a liquidação, ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, como decorre do n.º 1 do art. 78.º da LGT), com fundamento em erro imputável aos serviços, também o contribuinte pode, dentro dos mesmos prazos, pedir que seja cumprido esse dever (Cfr. RUI DUARTE MORAIS, Manual de Procedimento e Processo Tributário, Almedina, 2012, 28.5, págs. 212 a 214.) (Por mais recente, e com indicação de numerosa jurisprudência, vide o acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 3 de Junho de 2015, proferido no processo n.º 793/14” – cf. Acórdão do STA, de 4/5/2016, no processo n.º 0407/15.
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Neste sentido, vide ainda Acórdão do STA, de 6/2/2013 no processo n.º 0839/11: “O facto de não terem sido accionados os referidos mecanismos de efectivar a limitação ou exclusão do imposto, nem terem sido impugnados (administrativa ou judicialmente) as respectivas liquidações nos termos e prazos previstos na lei (art.º 132º do CPPT), não obsta à posterior dedução de pedido de revisão oficiosa dessas liquidações nos termos e prazos previstos no art.º 78º da LGT, pois que o dever de a Administração Tributária efectuar a revisão existe em relação a todos os tributos e formas de liquidação”.
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No que respeita ao fundamento da revisão do ato tributário por iniciativa da AT, determina o artigo 78.º, n.º 1 da LGT que a mesma deverá ocorrer tendo por base “erro imputável aos serviços”.
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Veja-se, ainda a este propósito, a jurisprudência arbitral mais recente, nomeadamente a decisão proferida pelo CAAD a 13/9/2021, no âmbito do processo n.º 9/2021-T, quando refere que:
“Recorde-se que nos casos previstos na norma de iniciativa oficiosa de revisão, podem os contribuintes provocar a revisão a levar a efeito pela A. Fiscal, visto se entender a revisão como um poder-dever, pois os princípios da justiça, da igualdade e da legalidade, que a Fazenda Pública tem de observar na globalidade da sua actividade (artº.266, nº.2, da C.R.P., artº.55, da L.G.T.), impõem que sejam oficiosamente corrigidos todos os erros das liquidações que tenham conduzido à arrecadação de tributo em montante superior ao que seria devido à face da lei. O conceito de "erro imputável aos serviços" a que alude o artº.78, nº.1, 2ª. parte, da L.G.T., embora não compreenda todo e qualquer "vício" (designadamente vícios de forma ou procedimentais) mas tão só "erros", estes abrangem o erro nos pressupostos de facto e de direito, sendo essa imputabilidade aos serviços independente da demonstração da culpa dos funcionários envolvidos na emissão do acto afectada pelo erro. Por outras palavras, o dito “erro imputável aos serviços” concretiza qualquer ilegalidade não imputável ao contribuinte por conduta negligente, mas à A. Fiscal, mais devendo tal erro revestir carácter relevante, gerando um prejuízo efectivo, em virtude do errado apuramento da situação tributária do contribuinte, daí derivando o seu carácter essencial”.
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Decorre, ainda, do acórdão do STA de 12/12/2001, tirado no âmbito do recurso n.º 26233 que:
“esta imputabilidade aos serviços é independente de culpa de qualquer dos seus funcionários ao efetuar liquidação afetada por erro (…) a administração tributária está genericamente obrigada a atuar em conformidade com a lei (arts. 266º, nº 1 da CRP e 55º da LGT), pelo que, independentemente da prova da culpa de qualquer das pessoas ou entidades que a integram, qualquer ilegalidade não resultante de uma atuação do sujeito passivo será imputável a culpa dos próprios serviços”.
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Neste sentido, veja-se ainda o acórdão do STA, de 12/11/2009, proferido no proc. n.º 681/2009, onde se afirma que:
a “letra da lei, ao referir a imputabilidade do erro aos serviços, aponta manifestamente no sentido de poder servir de base à responsabilidade por juros indemnizatórios a falta do próprio serviço, globalmente considerado, como aliás é admitido em geral (…). A administração tributária está genericamente obrigada a atuar em conformidade com a lei [artigos 266, n.º 1, da CRP, 17.º, n.º 1, alínea a) do CPT e 55.º da LGT], pelo que, independentemente da prova da culpa de qualquer das pessoas ou entidades que as integram, qualquer ilegalidade não resultante de uma atuação do sujeito passivo será imputável a culpa dos próprios serviços”.
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Do acima exposto, resulta que é jurisprudência unânime e reiterada que a circunstância de ter decorrido o prazo de reclamação graciosa e de impugnação do ato de liquidação, não obsta a que seja pedida a respetiva revisão oficiosa e seja impugnado contenciosamente o eventual ato de indeferimento desta.
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O STA também já defendeu expressamente que “[e]m face do princípio da equivalência dos meios processuais (implicando que às entidades não residentes devam ser asseguradas as mesmas possibilidades legais que às entidades residentes), o estabelecimento do prazo de 2 anos, previsto no nº 1 do art. 89º do CIRC (a que corresponde o actual art. 95º do mesmo diploma) para pedir o reembolso do montante retido na fonte, por uma sociedade não residente, após ter reunido o requisito temporal de detenção da participação social em momento posterior à distribuição dos lucros e consequente tributação por retenção na fonte, não impede que esta lance mão do pedido de revisão oficiosa ao abrigo do disposto no art. 78º da LGT, verificados que estejam os respectivos pressupostos”. – Acórdão n.º 01458/13, de 14/5/2014.
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Assim, em harmonia com a jurisprudência já existente sobre o tema em situações semelhantes, a revisão oficiosa do ato de retenção na fonte pode ser solicitada pelo contribuinte, com base em erro de direito imputável aos serviços, para além do prazo previsto no artigo 131.º do CPPT, e, em concreto, no prazo de quatro anos a contar da data do ato tributário, i.e., a contar da data da retenção.
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Por fim, sempre se refira que o Tribunal Constitucional decidiu “não julgar inconstitucional a norma que considera os pedidos de revisão oficiosa equivalentes às situações em que existiu «recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário», para efeito da interpretação da alínea a) do artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, encontrando-se tais situações, por isso, abrangidas pela jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD” (vd. acórdão do TC n.º 244/18, de 11/5/2018, processo n.º 636/17).
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Por Despacho Arbitral de 29/5/2024, o Tribunal Arbitral proferiu o seguinte despacho:
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Afigura-se que a matéria de facto relevante para a decisão da causa poderá ser fixada com base na prova documental, tornando-se desnecessária a realização de outras diligências instrutórias.
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Assim, e em aplicação dos princípios da autonomia do tribunal arbitral na condução do processo, e da celeridade, simplificação e informalidade processuais (artigos 19.º, n.º 2, e 29.º, n.º 2, do RJAT), e não havendo outros elementos sobre que as partes devam pronunciar-se, dispensa-se a reunião do tribunal arbitral a que se refere o artigo 18.º desse Regime, bem como a apresentação de alegações, relegando para final a apreciação das exceções suscitadas.
II- Saneamento
-
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, sendo beneficiárias de legitimidade processual (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
-
A AT procedeu à designação dos seus representantes nos autos e a Requerente juntou procuração e substabelecimento, encontrando-se, assim, as Partes devidamente representadas.
-
Em conformidade com o preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, 6.º, n.º 1 e 11.º, n.º 1, do RJAT (com a redação introduzida pelo artigo 228.º da lei nº 66-B/2012, de 31 de dezembro), o Tribunal encontra-se regularmente constituído.
-
O processo não enferma de nulidades.
III- Fundamentação
III.1 – Matéria de facto
-
Com relevo para a apreciação e decisão das questões suscitadas quanto ao mérito, dão-se como assentes e provados os seguintes factos:
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A Requerente é uma entidade jurídica de direito alemão, um Organismo de Investimento Coletivo (“OIC”), com residência fiscal na Alemanha, constituída sob a forma contratual e não societária.
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A Requerente é um sujeito passivo de IRC não residente, para efeitos fiscais, em Portugal e sem qualquer estabelecimento estável no país (cf. certificado de residência fiscal emitido pelas Autoridades Fiscais alemãs, relativo aos anos de 2019 a 2022, que se junta como Doc. n.º 1).
-
Entre 2019 e 2022, a Requerente foi titular de investimentos financeiros em Portugal, em concreto, participações sociais nas seguintes sociedades residentes, para efeitos fiscais, em Portugal:
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C... SGPS, S.A.
-
D... S.A.
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E... SGPS S.A.
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Nos referidos anos, a Requerente, na qualidade de acionista destas sociedades residentes em Portugal, recebeu dividendos sujeitos a tributação em Portugal, por se tratar do Estado da fonte de obtenção dos mesmos.
-
Os dividendos recebidos no decorrer dos anos de 2019 a 2022, foram sujeitos a tributação por retenção na fonte liberatória, à taxa de 25%, prevista no n.º 4 do artigo 87.º do Código do IRC (“CIRC”).
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Nos anos em causa, a Requerente recebeu dividendos e suportou em Portugal IRC por retenção na fonte no montante total a seguir discriminado:
Ano da retenção na fonte
|
Valor bruto do dividendo
|
Data de pagamento
|
Taxa de retenção na fonte
|
Guia de pagamento
|
Valor da retenção na fonte (€)
|
2019
|
432 194,33
|
15.05.2019
|
25%
|
...
|
108 048,58
|
2020
|
476 473,83
|
14.05.2020
|
25%
|
...
|
119 118,46
|
2020
|
18 695,24
|
14.05.2020
|
25%
|
...
|
4 673,81
|
2020
|
9 160,11
|
21.05.2020
|
25%
|
...
|
2 290,03
|
2020
|
2 405,55
|
15.07.2020
|
25%
|
...
|
601,39
|
2020
|
1 603,70
|
16.12.2020
|
25%
|
...
|
400,92
|
2021
|
444 059,45
|
26.04.2021
|
25%
|
...
|
111 014,86
|
2021
|
23 811,56
|
26.04.2021
|
25%
|
...
|
5 952,89
|
2021
|
3 346,85
|
06.05.2021
|
25%
|
...
|
836,71
|
2021
|
7 487,55
|
20.05.2021
|
25%
|
...
|
1 871,89
|
2021
|
9 557,10
|
20.05.2021
|
25%
|
...
|
2 389,27
|
2021
|
5 348,25
|
16.09.2021
|
25%
|
...
|
1 337,06
|
2021
|
5 659,25
|
16.09.2021
|
25%
|
...
|
1 414,81
|
2022
|
26 843,01
|
28.04.2022
|
25%
|
...
|
6 710,75
|
2022
|
7 003,02
|
28.04.2022
|
25%
|
...
|
1 750,75
|
2022
|
6 994,75
|
10.05.2022
|
25%
|
...
|
1 748,68
|
2022
|
1 806,50
|
10.05.2022
|
25%
|
...
|
451,62
|
2022
|
17 048,63
|
18.05.2022
|
25%
|
...
|
4 262,15
|
2022
|
81 497,92
|
18.05.2022
|
25%
|
...
|
20 374,48
|
2022
|
10 255,18
|
20.09.2022
|
25%
|
...
|
2 563,79
|
TOTAL
|
397.812,90
|
Este quadro permite discriminar, relativamente aos anos em questão, (i) os montantes brutos dos dividendos recebidos, (ii) a data de pagamento dos referidos rendimentos, (iii) o número das guias de pagamento através das quais o imposto retido na fonte foi entregue junto dos cofres da AT em Portugal e (iv) o imposto suportado por retenção na fonte (cf. Doc. 2 e 3, juntos aos autos).
-
Em 15/05/2023, a Requerente apresentou pedido de revisão oficiosa para apreciação da legalidade dos referidos atos de retenção na fonte de IRC relativos aos anos de 2019 a 2022. Nesse pedido de revisão oficiosa, requereu a anulação dos atos de retenção por vício de ilegalidade, por violação direta do Direito da UE, bem como o reconhecimento do seu direito à restituição do imposto indevidamente suportado em Portugal (invocando para o efeito acórdão TJUE C-545/19, acórdão TJUE C-65/64, acórdão STA proc. 01172/14 e acórdão STA proc. 0654/13, acórdão TJUE C-443/06 e acórdão STA 0275/08).
-
A Requerente nunca foi notificada de qualquer decisão sobre o pedido de revisão oficiosa apresentado.
-
A factualidade provada teve por base a apreciação crítica da posição assumida por cada uma das partes, na análise crítica dos documentos juntos aos autos, incluindo o Processo Instrutor, cuja autenticidade e veracidade não foram impugnadas por nenhuma das partes.
-
Inexistem outros factos, com relevo para apreciação do mérito da causa, que não se tenham provado.
III.2 – Matéria de Direito
III.2.1) Questões prévias:
-
Da competência material do Tribunal Arbitral.
Como ficou provado, a Requerente, OIC constituído de acordo com o direito alemão, recebeu dividendos e suportou em Portugal IRC retenção na fonte, durante o período em causa (2019 a 2022), pelas quantias discriminadas na matéria de facto.
Em 15/05/2023, a Requerente apresentou, ao abrigo do disposto no artigo 78.º da Lei Geral Tributária (“LGT”), pedido de revisão oficiosa para apreciação da legalidade dos referidos atos de retenção na fonte de IRC relativos aos anos de 2019 a 2022, no qual solicitou a anulação dos mesmos por vício de ilegalidade por violação direta do Direito da UE, bem como o reconhecimento do seu direito à restituição do imposto indevidamente suportado em Portugal.
A Requerente nunca foi notificada de qualquer decisão no procedimento.
Não se conformando com a omissão de decisão do pedido de revisão oficiosa por parte da AT, que traduz uma decisão tácita de indeferimento (cf. n.º 1 e n.º 5 do artigo 57.º LGT), e assim, confirmação da legalidade dos atos tributários sindicados, a Requerente apresentou pedido de pronúncia arbitral.
Na Resposta, a AT suscita exceção, quanto à incompetência do Tribunal Arbitral, em razão da matéria, por não ter, previamente, desencadeado procedimento de reclamação graciosa nos termos do n.º 1 e 3 do artigo 132.º do CPPT (no prazo aí previsto, de 2 anos), situação que fica prova da previsão de vinculação da AT à jurisdição dos tribunais arbitrais do CAAD, cf. n.º 1 do artigo 2.º do RJAT.
Considerando que a AT nunca se pronunciou sobre a (i)legalidade das retenções, e não tendo o pedido de anulação das retenções na fonte sido precedido, em prazo, de reclamação graciosa necessária, o Tribunal Arbitral carece de competência para apreciar sobre a (i)legalidade das mesmas, ainda que a requerente tenha apresentado um pedido de revisão oficiosa, no prazo de quatro anos.
Vejamos.
Nos termos da jurisprudência do STA, refere o Conselheiro José Gomes Correia, que:
“VI- O meio procedimental de revisão do acto tributário não pode ser considerado como um meio excepcional para reagir contra as consequências de um acto de liquidação, mas sim como um meio alternativo dos meios impugnatórios administrativos e contenciosos (quando for usado em momento em que aqueles ainda podem ser utilizados) ou complementar deles (quando já estiverem esgotados os prazos para utilização dos meios impugnatórios do acto de liquidação).
VII – Assim, nos casos como o dos autos, em que há lugar a retenção da fonte, a título definitivo, de quantias por conta de imposto de selo, cobrado no âmbito de operações de concessão de crédito, e suportado pelas Recorrentes, o erro sobre os pressupostos de facto e de direito dessa retenção é susceptível de configurar “erro imputável aos serviços”, para efeitos de apresentação, no prazo de 4 anos, do pedido de revisão dos atos tributários, nos termos do n.º 1 do artigo 78º da Lei Geral Tributária”, como pode ler-se no processo n.º 087/22.5BEAVR, de 09.11.2022.
No mesmo sentido aponta o acórdão do Conselheiro José Gomes Correia, STA de 9 de novembro de 2022 (Processo n.º 087/22), onde se refere, “assim, nos casos como o dos autos, em que há lugar a retenção da fonte, a título definitivo, (…) de quantias por conta de imposto de selo, cobrado no âmbito de operações de concessão de crédito, e suportado pelas Recorrentes, o erro sobre os pressupostos de facto e de direito dessa retenção é susceptível de configurar “erro imputável aos serviços”, para efeitos de apresentação, no prazo de 4 anos, do pedido de revisão dos atos tributários, nos termos do nº1 do artigo 78º da Lei Geral Tributária”.
Está em causa, em ambos os arestos, retenção na fonte a título definitivo pelo substituto fiscal, e o STA concluiu[1] que o erro sobre os pressupostos de facto e de direito dessa retenção é suscetível de configurar “erro imputável aos serviços”, para efeitos de apresentação, no prazo de 4 anos, do pedido de revisão dos atos tributários, nos termos do n.º 1 do artigo 78º da LGT.
Está em causa, pois, na situação sub judice, uma substituição fiscal, em que é Requerente o substituído fiscal, que enquanto destinatário dos dividendos, líquidos de retenção na fonte, não tem qualquer intervenção na liquidação do imposto (feita entre o substituto fiscal e a AT), considerando-se por isso aplicável o prazo de 4 anos.
Por outro lado, em outro acórdão do STA (proc. 01950/13, de 2/7/2014) a Conselheira Isabel Marques da Silva, conclui que:
“I - Não apenas o pedido de revisão apresentado dentro do prazo de reclamação administrativa, mas também o pedido de revisão oficiosa da liquidação com fundamento em erro imputável aos serviços apresentado no prazo de 4 anos, aproveitam ao sujeito passivo para efeitos de lançar mão da impugnação judicial em caso de indeferimento tácito.
II - É que, não estando legalmente estabelecida a distinção entre as duas situações para efeitos de utilização da presunção de indeferimento tácito, não cabe ao juiz distingui-las na tentativa de obviar a que os prazos de impugnação administrativa e contenciosa possam ser “contornados”, antes se lhe impõe o conhecimento das pretensões dos contribuintes feitas valer através dos meios que o legislador coloca ao seu dispor para tutela dos seus direitos”.
Assim, atenta a jurisprudência acima exposta, e os prazos pertinentes referidos, e considerando ainda que o indeferimento de uma revisão oficiosa não pode deixar de ser sindicável, independentemente de ser tácito ou expresso, como resulta do teor expresso da al. a) do artigo 2.º do RJAT.
Para além da apreciação direta da legalidade de atos deste tipo, incluem-se ainda nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD competências para apreciar atos de segundo ou terceiro grau que tenham por objeto a apreciação da legalidade de atos daqueles tipos, designadamente de pedidos de revisão oficiosa, como se depreende das referências expressas que se fazem no artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do RJAT ao n.º 1 al. b) do artigo 102.º do CPPT.
No caso em apreço, a Requerente apresentou um pedido de revisão oficiosa, que não foi apreciado no prazo de quatro meses, previsto no artigo 57.º, n.º 5 da LGT, pelo que se formou indeferimento tácito em 16/9/2024.
Nas situações de indeferimento tácito não há, obviamente, apreciação expressa da legalidade de ato de liquidação, mas, tratando-se de uma ficção de ato destinada a assegurar a impugnação contenciosa em meio processual que tem por objeto um ato de liquidação, o meio de impugnação adequado depende do conteúdo ficcionado.
Neste caso, estando-se perante indeferimento tácito de um pedido de revisão oficiosa, que tem por objeto direto retenções na fonte, é de considerar que o ato ficcionado conhece da legalidade da retenção na fonte e, por isso, o meio processual adequado para a sua impugnação contenciosa é o processo de impugnação judicial, nos termos das alíneas d) e p) do n.º 1 do artigo 97.º do CPPT, de que é meio alternativo o processo arbitral.
Aliás, esta interpretação no sentido da identidade dos campos de aplicação do processo de impugnação judicial e do processo arbitral é a que está em sintonia com a referida autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, concedida pelo artigo 124.º da lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, em que se revela a intenção de o processo arbitral tributário constitua “um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária” (n.º 2).
Nesse sentido (com as devidas adaptações), cf. acórdão 540/2020-T do CAAD.
Improcede, por conseguinte, a exceção de incompetência material do Tribunal Arbitral.
-
Da intempestividade da impugnação administrativa necessária (artigo 132.º do CPPT), relativamente aos atos de retenção na fonte realizados entre 15 de maio de 2019 e 20 de maio de 2021
A Requerente foi notificada, por Despacho de 13/5/2024, quanto à possibilidade de ser declarada a absolvição da instância com fundamento na intempestividade da impugnação administrativa necessária a que se refere o artigo 132.º do CPPT, relativamente aos atos de retenção na fonte realizados 15 entre maio de 2019 e 20 de maio de 2021.
Com efeito, em caso de impugnação de retenção na fonte, o n.º 3 do artigo 132.º do CPPT estabelece que a impugnação judicial será precedida de reclamação graciosa para o órgão periférico regional da administração tributária competente, no prazo de dois anos.
No caso em análise, a Requerente impugna atos de retenção na fonte realizados entre 15 de maio de 2019 e 20 de setembro de 2022 e apresentou o pedido de revisão oficiosa em 16 de maio de 2023. E ainda que se atribua ao pedido de revisão oficiosa o mesmo efeito jurídico da reclamação graciosa, essa equivalência apenas pode ser reconhecida quando o pedido de revisão oficiosa tenha sido apresentado dentro do prazo previsto para aquela forma de impugnação administrativa, isto é, dentro do prazo de dois anos.
E assim, poderá entender-se que o pedido de revisão oficiosa foi apresentado intempestivamente, para efeito de poder ser considerado como correspondendo à impugnação administrativa necessária nos termos do artigo 132.º do CPPT, relativamente aos atos de retenção realizados em 20 de maio de 2021 e em datas anteriores a essa, com a consequente inimpugnabilidade desses atos tributários.
Atenta essa possibilidade, foi proferido o Despacho Arbitral antes mencionado.
Sucede, porém, que, conforme referido acima, estamos perante retenção na fonte a título definitivo pelo substituto fiscal, e o erro sobre os pressupostos de facto e de direito dessa retenção na fonte é suscetível de configurar “erro imputável aos serviços”, para efeitos de apresentação, no prazo de 4 anos, do pedido de revisão dos atos tributários, nos termos do n.º 1 do artigo 78º da LGT.
Esta é também a posição jurisprudencialmente dominante, ainda que com nuances, ao nível da fundamentação.
Citamos, por todos, o Acórdão do STA, de 9/11/2022, proferido no âmbito do proc. n.º 087/22: “assim, nos casos como o dos autos, em que há lugar a retenção da fonte, a título definitivo, de quantias por conta de imposto de selo, cobrado no âmbito de operações de concessão de crédito, e suportado pelas Recorrentes, o erro sobre os pressupostos de facto e de direito dessa retenção é susceptível de configurar “erro imputável aos serviços”, para efeitos de apresentação, no prazo de 4 anos, do pedido de revisão dos atos tributários, nos termos do nº1 do artigo 78º da Lei Geral Tributária”.
Termos em que, considera-se tempestivo o pedido de revisão oficiosa apresentado e, como tal, improcede, a exceção por intempestividade do presente pedido de pronúncia arbitral.
-
Da cumulação de pedidos.
Nos termos do artigo 71.º do CPPT, é admissível a cumulação de pedidos sempre que se verifique a identidade de tributos e do órgão competente para a decisão, bem como dos fundamentos de facto e de direito invocados.
Nos termos do n.º 1 do artigo 3.º do RJAT, “A cumulação de pedidos ainda que relativos a diferentes actos e a coligação de autores são admissíveis quando a procedência dos pedidos dependa essencialmente da apreciação das mesmas circunstâncias de facto e da interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou regras de direito”.
Pelo que, no caso em apreço, estão preenchidos todos os requisitos legais para que seja admitida a presente cumulação de pedidos – abrangendo a presente impugnação as retenções na fonte de IRC referentes aos anos de 2019, 2020, 2021 e 2022, na esfera do Requerente (enquanto substituída fiscal) – sendo inequívoca a identidade de tributos, e de fundamentos da impugnação (princípios de Direito da União Europeia, atinentes à não discriminação e da liberdade de circulação de capitais).
-
Da ilegitimidade subjetiva: não residência e ausência de estabelecimento estável do sujeito passivo.
Refere a AT (cf. 38.º da Resposta) que deverá o peticionado ser julgado improcedente, por a Requerente ser um organismo de investimento coletivo e um sujeito passivo não residente para efeitos fiscais em Portugal, sem qualquer estabelecimento estável.
Porém a circunstância descrita, provada, não diminui a legitimidade processual do sujeito passivo, que decorre do artigo 10.º, n.º 2, do RJAT, pelo que sempre seria improcedente uma eventual exceção quanto à ilegitimidade processual do sujeito passivo.
III.2.2) Da ilegalidade das liquidações de IRC por incompatibilidade com a liberdade de circulação de capitais.
Sustenta a Requerente, essencialmente, que o regime especial de tributação aplicável aos fundos de investimento que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional, nos termos da parte final do n.º 1 e do n.º 3 do artigo 22.º do EBF, implicando a exclusão desse regime jurídico dos organismos equiparáveis que operem em Portugal de acordo com a legislação portuguesa mas tenham sido constituídos de acordo com a legislação de outro Estado-Membro da União Europeia ou de Estado terceiro, viola o princípio da liberdade de circulação de capitais consagrado no artigo 63.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE).
A Autoridade Tributária contrapõe que o artigo 22.º do EBF, aplicável aos rendimentos obtidos por fundos de investimento que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional, estabelece uma exclusão na determinação do lucro tributável dos rendimentos de capitais, prediais e mais-valias, deslocando a tributação para a esfera do imposto do selo, além de que sujeita os OIC às taxas de tributação autónoma previstas no artigo 88.º do Código do IRC. Não podendo afirmar-se, neste condicionalismo, que se esteja perante situações objetivamente comparáveis, porquanto, a tributação dos dividendos opera segundo modalidades diferentes, e nada indica que a carga fiscal que onera os dividendos auferidos pelos OIC abrangidos pelo artigo 22.º do EBF possa ser mais reduzida do que a que recai sobre os dividendos auferidos em Portugal pela Requerente.
A questão que nestes termos vem colocada foi analisada no acórdão do Tribunal de Justiça de 17 de março de 2022, proferido no Processo n.º C-545/19, em reenvio prejudicial suscitado no Processo n.º 93/2019-T em que se extrai a seguinte conclusão:
O artigo 63.° do TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado-Membro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um organismo de investimento coletivo (OIC) não residente são objeto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção.
E, seguindo a jurisprudência do Acórdão n.º 842/2023-T do CAAD, não pode deixar de se sufragar esse entendimento, que, aliás, vem na linha de anterior jurisprudência do TJUE, ainda que não sobre a específica questão que está em análise nos presentes autos.
O citado artigo 22.º do EBF, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 7/2015, de 31 de janeiro, e pela Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro, na parte que mais interessa considerar, dispõe o seguinte:
Artigo 22.º
Organismos de Investimento Coletivo
1 – São tributados em IRC, nos termos previstos neste artigo, os fundos de investimento mobiliário, fundos de investimento imobiliário, sociedades de investimento mobiliário e sociedades de investimento imobiliário que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional.
2 – O lucro tributável dos sujeitos passivos de IRC referidos no número anterior corresponde ao resultado líquido do exercício, apurado de acordo com as normas contabilísticas legalmente aplicáveis às entidades referidas no número anterior, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
3 – Para efeitos do apuramento do lucro tributável, não são considerados os rendimentos referidos nos artigos 5.º, 8.º e 10.º do Código do IRS, exceto quando tais rendimentos provenham de entidades com residência ou domicílio em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável constante de lista aprovada em portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, os gastos ligados àqueles rendimentos ou previstos no artigo 23.º-A do Código do IRC, bem como os rendimentos, incluindo os descontos, e gastos relativos a comissões de gestão e outras comissões que revertam para as entidades referidas no n.º 1.
4 - Os prejuízos fiscais apurados nos termos do disposto nos números anteriores são deduzidos aos lucros tributáveis nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 52.º do Código do IRC.
5 – Sobre a matéria coletável correspondente ao lucro tributável deduzido dos prejuízos fiscais, tal como apurado nos termos dos números anteriores, aplica -se a taxa geral prevista no n.º 1 do artigo 87.º do Código do IRC.
6 – As entidades referidas no n.º 1 estão isentas de derrama municipal e derrama estadual.
(…)
8 - As taxas de tributação autónoma previstas no artigo 88.º do Código do IRC têm aplicação, com as necessárias adaptações, no presente regime.
(…).
Como resulta, em especial, do disposto nos n.ºs 3 e 6, as entidades referidas no n.º 1, beneficiam de um regime consideravelmente mais favorável que o regime geral de tributação em IRC, porquanto não são considerados, para efeitos do apuramento do lucro tributável, os rendimentos de capitais, os rendimentos prediais e mais-valias, além de que essas entidades estão isentas de derrama municipal e derrama estadual. Por outro lado, nos termos do transcrito n.º 1, o benefício fiscal assim estabelecido aplica-se aos organismos de investimento coletivo que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional, o que conduz a afastar, numa interpretação literal do preceito, os organismos equiparáveis que operem no território nacional segundo o direito interno mas tenham sido constituídos segunda legislação de um outro Estado Membro da União Europeia ou de Estado terceiro.
A questão carece de ser analisada, nestes termos, à luz da alegada violação do princípio da proibição da liberdade de circulação de capitais.
No presente caso, como resulta da matéria de facto tida como assente, a Requerente é um Organismo de Investimento Coletivo mobiliário, constituída segundo o direito da Alemanha.
Alega a Requerente, neste contexto, que as normas do artigo 22.º, n.ºs 1 e 3, do EBF se tornam incompatíveis com o princípio da liberdade de circulação de capitais consagrado no artigo 63.º do TFUE.
Conforme tem sido entendimento comum, o princípio da proibição de discriminação em razão da nacionalidade consagrado no artigo 18.º do TFUE apenas deve ser objeto de aplicação autónoma quando esse mesmo princípio se não encontre concretizado em disposições específicas do Tratado relativas às liberdades de circulação. E, nesse sentido, pode dizer-se que o princípio da não discriminação se realiza, designadamente, por via do direito à livre circulação de movimentos de capitais a que se refere o artigo 63.º do Tratado (cf. PAULA ROSADO PEREIRA, Princípios do Direito Fiscal Internacional – Do Paradigma Clássico ao Direito Fiscal Europeu, Coimbra, 2011, pág. 254).
O artigo 63.º proíbe todas as restrições aos movimentos de capitais, bem como todas as restrições aos pagamentos entre Estados-Membros e entre Estados-Membros e países terceiros.
O artigo 65.º consigna, todavia, que o artigo 63.º não prejudica o direito de os Estados-Membros aplicarem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido (n.º 1), esclarecendo o n.º 3, em todo o caso, que essa possibilidade não deve constituir um meio de discriminação arbitrária, nem uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais e pagamentos.
Em relação à liberdade de circulação de capitais, o Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia, datado de 17/3/2022, proferido em reenvio prejudicial no âmbito do Processo n.º C-545/19 de 10 de abril de 2014, esclarece o âmbito de aplicação desse princípio, formulando, na parte que mais interessa reter, os seguintes considerandos:
36 Resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que as medidas proibidas pelo artigo 63.°, n.° 1, TFUE, enquanto restrições aos movimentos de capitais, incluem as que são suscetíveis de dissuadir os não residentes de investir num Estado-Membro ou de dissuadir os residentes de investir noutros Estados (-).
37 No caso em apreço, é facto assente que a isenção fiscal prevista pela legislação nacional em causa no processo principal é concedida aos OIC constituídos e que operam de acordo com a legislação portuguesa, ao passo que os dividendos pagos a OIC estabelecidos noutro Estado-Membro não podem beneficiar dessa isenção.
38 Ao proceder a uma retenção na fonte sobre os dividendos pagos aos OIC não residentes e ao reservar aos OIC residentes a possibilidade de obter a isenção dessa retenção na fonte, a legislação nacional em causa no processo principal procede a um tratamento desfavorável dos dividendos pagos aos OIC não residentes.
39 Esse tratamento desfavorável pode dissuadir, por um lado, os OIC não residentes de investirem em sociedades estabelecidas em Portugal e, por outro, os investidores residentes em Portugal de adquirirem participações sociais em OIC e constitui, por conseguinte, uma restrição à livre circulação de capitais proibida, em princípio, pelo artigo 63.° TFUE (-).
40 Não obstante, segundo o artigo 65.°, n.° 1, alínea a), TFUE, o disposto no artigo 63.° TFUE não prejudica o direito de os Estados-Membros aplicarem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido.
41 Esta disposição, enquanto derrogação ao princípio fundamental da livre circulação de capitais, é de interpretação estrita. Por conseguinte, não pode ser interpretada no sentido de que qualquer legislação fiscal que comporte uma distinção entre os contribuintes em função do lugar em que residam ou do Estado-Membro onde invistam os seus capitais é automaticamente compatível com o Tratado FUE. Com efeito, a derrogação prevista no artigo 65.º, n.º 1, alínea a), TFUE é ela própria limitada pelo disposto no artigo 65.º, n.º 3, TFUE, que prevê que as disposições nacionais a que se refere o n.º 1 desse artigo «não devem constituir um meio de discriminação arbitrária, nem uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais e pagamentos, tal como definida no artigo 63.º [TFUE]» (-).
42 O Tribunal de Justiça declarou igualmente que, por conseguinte, há que distinguir as diferenças de tratamento permitidas pelo artigo 65.°, n.° 1, alínea a), TFUE das discriminações proibidas pelo artigo 65.°, n.° 3, TFUE. Ora, para que uma legislação fiscal nacional possa ser considerada compatível com as disposições do TFUE relativas à livre circulação de capitais, é necessário que a diferença de tratamento daí decorrente diga respeito a situações que não sejam objetivamente comparáveis ou se justifique por uma razão imperiosa de interesse geral (-).
Quanto à existência de situações objetivamente comparáveis, o Tribunal de Justiça concluiu que o “critério de distinção a que se refere a legislação nacional (…), que tem por objeto unicamente o lugar de residência dos OIC, não permite concluir pela existência de uma diferença objetiva de situações entre os organismos residentes e os organismos não residentes (considerando 73), havendo de entender-se que, “no caso em apreço, a diferença de tratamento entre os OIC residentes e os OIC não residentes diz respeito a situações objetivamente comparáveis (considerando 74).
E não há motivo para que o tribunal arbitral, face aos elementos factuais conhecidos, deva dissentir do entendimento formulado, quanto a esta matéria, em sede de reenvio prejudicial.
Em relação à possibilidade de uma restrição à livre circulação de capitais ser admitida por razões imperiosas de interesse geral, o Tribunal de Justiça declarou que, para esse efeito, “é necessário que esteja demonstrada a existência de uma relação direta entre o benefício fiscal em causa e a compensação desse benefício por uma determinada imposição fiscal” (considerando 78). Concluindo que, no caso, “não há uma relação direta (…) entre a isenção da retenção na fonte dos dividendos de origem nacional auferidos por um OIC residente e a tributação dos referidos dividendos enquanto rendimentos dos detentores de participações sociais nesse organismo” e a “necessidade de preservar a coerência do regime fiscal nacional não pode, por conseguinte, ser invocada para justificar a restrição à livre circulação de capitais induzida pela legislação nacional (…)” (considerandos 80 e 81).
Neste contexto, decidiu o TJUE que:
O artigo 63.° TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado-Membro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um organismo de investimento coletivo (OIC) não residente são objeto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção.
Voltando à situação do caso, e como resulta do ponto II e notas explicativas da nomenclatura anexa à Diretiva 88/361/CEE, o conceito de movimentos de capitais, para efeito da liberdade de circulação a que refere o artigo 63.º do TFUE, abrange os investimentos mobiliários (cf. considerandos 21 e 22 do acórdão do TJUE de 16 de março de 1999, no Processo C-222/97).
O artigo 22.º, n.º 1, do EBF, ao circunscrever o regime de tributação constante do n.º 3 aos fundos e sociedades de investimento mobiliário que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional, estabelece um regime mais gravoso para as entidades equiparáveis que operem no território nacional mas se tenham constituído segundo o direito de um outro Estado-Membro ou de Estado terceiro, sem que tenha sido apresentada qualquer justificação para esse tratamento discriminatório.
Segundo o disposto no artigo 65.º, n.º 3, do TFUE, os Estados-Membros podem estabelecer distinções em matéria fiscal entre sujeitos passivos que não se encontrem em idêntica situação
em função do lugar da nacionalidade ou residência desde que não implique uma discriminação arbitrária ou uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais e pagamentos.
Havendo de entender-se, tal como refere o acórdão do TJUE proferido no Processo n.º C-545/19, que a diferença de tratamento na legislação fiscal nacional, em relação à livre circulação de capitais, apenas é compatível com as disposições do Tratado se respeitarem a situações objetivamente não comparáveis ou se se justificar por razões imperiosas de interesse geral (cf. ainda considerando 58 do acórdão de 10 de fevereiro de 2011, nos Processos C-436/08 e C-437/08).
De acordo com o disposto no artigo 8.º, n.º 4, da CRP, as disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições são aplicáveis na ordem interna, e nesse sentido prevalecem sobre as normas do direito nacional, motivo por que os tribunais devem recusar a aplicação de lei ou norma jurídica que se encontre em desconformidade com o direito europeu (cf., entre outros, o acórdão do STA de 1 de julho de 2015, Processo n.º 0188/15).
Resta acrescentar, no plano interno, importa referir o acórdão do STA n.º 7/2024, de 28 de setembro de 2023 (Processo n.º 93/19.7BALSB - Pleno da 2.ª Secção), tirado em recurso por oposição de julgados entre as decisões arbitrais proferidas nos Processos n.ºs 96/2019-T e 90/2019-T, tomando em consideração o citado acórdão do TJUE proferido no Processo n.º C-545/19, uniformizou a jurisprudência no sentido de que a interpretação do artigo 63.º do TFUE é incompatível com o artigo 22.º do EBF, na medida em que limita o regime de isenção nele previsto aos OIC constituídos segundo a legislação nacional, dele excluindo os OIC constituídos segundo a legislação de outros Estados Membros da União Europeia:
“1 - Quando um Estado Membro escolhe exercer a sua competência fiscal sobre os dividendos pagos por sociedades residentes unicamente em função do lugar de residência dos Organismos de Investimento Colectivo (OIC) beneficiários, a situação fiscal dos detentores de participações destes últimos é desprovida de pertinência para efeitos de apreciação do carácter discriminatório, ou não, da referida regulamentação;
2 - O art.º 63, do TFUE, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado-Membro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um OIC não residente são objecto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção;
3 - A interpretação do art.º 63, do TFUE, acabada de mencionar é incompatível com o art.º 22, do E.B.F., na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 7/2015, de 13/01, na medida em que limita o regime de isenção nele previsto aos OIC constituídos segundo a legislação nacional, dele excluindo os OIC constituídos segundo a legislação de outros Estados Membros da União Europeia”.
Finalmente, reclama a AT que a Requerente não demonstra, em concreto, que seja prejudicada fiscalmente por efeito da distribuição de dividendos.
E assim é, com efeito, a Requerente não demonstra quantitativamente, qual a tributação que suportou, afinal, e qual a tributação que suportaria, em caso de ser OIC residente. Mas nem por isso a jurisprudência antes exposta deixa de ser aplicável, já que, em qualquer caso, o fundamento da liquidação contraria o Direito da União Europeia, e assim, a liquidação é ilegal.
Considera-se porém que, nas circunstâncias em presença, em que o ato administrativo, decisório da revisão oficiosa, se produziu tacitamente por efeito do decurso do tempo, aquilo que sustenta a AT configura fundamentação a posteriori, que não cumpre as exigências do dever legal de fundamentar o ato administrativo, de “dar conhecimento ao administrado das razões da decisão, permitindo-lhe optar pela aceitação do acto ou a sua impugnação graciosa ou contenciosa, e também uma função endógena, consistente na própria ponderação do ente administrador, de forma cuidada, séria e isenta” (cf. processo 03014/11.1BEPRT, proferido pelo STA em 2/2/2022, pelo Conselheiro Joaquim Condesso).
Pelo que, os atos de retenção na fonte impugnados e a decisão de indeferimento tácito da reclamação graciosa contra eles apresentada são assim ilegais por assentarem em disposição legal que viola o princípio da liberdade de circulação de capitais consagrado no artigo 63.º, n.º 1, do TFUE.
III.2.3) Dos juros indemnizatórios.
A Requerente pede ainda a condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios, à taxa legal, calculados sobre o imposto, até ao reembolso integral da quantia devida.
Nos termos da al. b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a AT, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo, cabendo-lhe “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito”.
O que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT, aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.
Ainda nos termos do n.º 5 do artigo 24.º do RJAT “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previstos na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”, o que remete para o disposto nos artigos 43.º, n.º 1, e 61.º, n.º 5, de um e outro desses diplomas, implicando o pagamento de juros indemnizatórios, desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento
da respetiva nota de crédito.
Nesse contexto, importa considerar o que ficou estabelecido no Acórdão STA (Conselheiro Francisco Rothes), datado de 21/2/2024, proferido no processo n.º 093/23.2BALSB:
“Pedida pelo sujeito passivo a revisão oficiosa do acto de liquidação que não foi oportunamente reclamado nem impugnado e vindo o acto a ser anulado por decisão arbitral, os juros indemnizatórios são devidos depois de decorrido um ano após a apresentação daquele pedido [cf. artigo 43.º, n.º 3, alínea c), da LGT]”.
Pelo que, na sequência da declaração de ilegalidade dos atos tributários de retenção na fonte, são devidos juros indemnizatórios depois de decorrido um ano após a apresentação do pedido de revisão oficiosa, calculados sobre a quantia de retenção na fonte ilegalmente paga, à taxa dos juros legais (cf. artigos 35.º, n.º 10, e 43.º, n.º 4, da LGT). O pedido de revisão oficiosa foi apresentado em 15/05/2023 pelo que os juros indemnizatórios são devidos desde 16/05/2024 até ao processamento da respetiva nota de crédito.
IV. Decisão
Nos termos expostos, este Tribunal decide:
-
Julgar procedente o pedido de anulação do indeferimento tácito de revisão oficiosa das retenções na fonte sobre os dividendos, resultantes em retenções na fonte indevida de IRC, atinentes aos exercícios de 2019, 2020, 2021 e 2022, devendo tais atos tributários ser anulados do ordenamento jurídico, com as legais consequências.
-
Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira na restituição das quantias pagas ilegalmente e no pagamento dos juros indemnizatórios, à taxa legal, desde a data de 16/05/2024 até à do processamento da respetiva nota de crédito.
V. Valor do Processo
De harmonia com o disposto nos artigos 306.º n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de 397.812,90 €.
VI. Custas
Nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, as custas são no montante de 6.426,00 €, a cargo da Requerida, conforme ao disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem.
Notifique-se.
Lisboa, 24 de junho de 2024.
O Árbitro Presidente,
__________
Conselheiro Carlos Alberto Fernandes Cadilha (com declaração de voto em anexo)
O Árbitro Vogal,
__________
Nuno Miguel Morujão (Relator)
O Árbitro Vogal,
Gonçalo Marquês de Menezes Estanque
Declaração de voto de vencido
Teria julgado procedente a excepção de inimpugnabilidade dos actos de retenção na fonte realizados entre 15 de maio de 2019 e 20 de maio de 2021, que fora suscitada oficiosamente pelo tribunal arbitral, com os fundamentos que seguem.
Nos termos do artigo 2.º, n.º 1, alínea a), da Portaria 112-A/2011, de 22 de Março, os serviços e organismos que integram a Administração Tributária vinculam-se à jurisdição arbitral no tocante a qualquer dos tipos de pretensões identificadas o n.º 1 do artigo 2.º desse RJAT, com exceção das relativas à “declaração de ilegalidade de atos de autoliquidação que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário” (CPPT).
No caso de impugnação de retenção na fonte, o artigo 132.º do CPPT estatui o seguinte:
1- A retenção na fonte é susceptível de impugnação por parte do substituto em caso de erro na entrega de imposto superior ao retido.
2 - O imposto entregue a mais será descontado nas entregas seguintes da mesma natureza a efectuar no ano do pagamento indevido.
3- Caso não seja possível a correcção referida no número anterior, o substituto que quiser impugnar reclamará graciosamente para o órgão periférico regional da administração tributária competente no prazo de 2 anos a contar do termo do prazo nele referido.
4 – O disposto no número anterior aplica-se à impugnação pelo substituído da retenção que lhe tiver sido efectuada, salvo quando a retenção tiver a mera natureza de pagamento por conta do imposto devido a final.
O n.º 3 do artigo especifica, à semelhança do que sucede em caso de erro na autoliquidação, a que se refere o artigo 131.º, que a impugnação judicial será obrigatoriamente precedida de reclamação graciosa dirigida ao órgão periférico regional da administração tributária, no prazo de dois anos a contar da apresentação da declaração de rendimentos. Essa disposição, que tem igualmente aplicação quando a impugnação judicial seja deduzida pelo substituído, tem o sentido inequívoco de tornar exigível a prévia impugnação administrativa do acto tributário como condição de acesso à via jurisdicional, e constitui um requisito de impugnabilidade contenciosa.
Esse, aliás, é o princípio geral que resulta do artigo 185.º, n.º 1, do Código de Procedimento Administrativo (CPA), subsidiariamente aplicável no processo arbitral, segundo o qual, “as reclamações e os recursos são necessários ou facultativos, conforme dependa, ou não, da sua prévia utilização a possibilidade de acesso aos meios contencioso de impugnação e de condenação à prática de acto devido”.
Tendo sido apresentado, no caso vertente, um pedido revisão oficiosa contra actos de retenção na fonte, e ainda que se atribua ao pedido de revisão oficiosa o mesmo efeito jurídico da reclamação graciosa, essa equivalência apenas pode ser reconhecida quando o pedido de revisão oficiosa tenha sido apresentado dentro do prazo previsto para aquela forma de impugnação administrativa, isto é, dentro do prazo de dois anos - artigo 132.º, n.º 3, do CPPT (cfr., neste sentido, os citados acórdãos proferidos nos Processos n.ºs 840/2021-T e 778/2023-T na situação similar de impugnação no caso de erro na autoliquidação).
Ou seja, havendo lugar a prévia impugnação administrativa necessária para efeito de poder deduzida a impugnação judicial dos actos de retenção na fonte, o pedido de revisão oficiosa apenas pode ser entendido como preenchendo esse requisito procedimental se for apresentado no prazo de dois anos legalmente previsto para a reclamação graciosa.
No caso em análise, constata-se que a Requerente impugna atos de retenção na fonte realizados em 15 de maio de 2019 e 20 de setembro de 2022, e apresentou o pedido de revisão oficiosa em 15 de maio de 2023 (alíneas f) e g) da matéria de facto), e, fê-lo, portanto, relativamente aos actos de retenção na fonte realizados entre 15 de maio de 2019 e 20 de maio de 2021, para além do prazo de dois anos de que dispunha para interpor a reclamação graciosa.
Sendo assim, é de concluir que o pedido de revisão oficiosa foi apresentado intempestivamente, para efeito de poder ser considerado como correspondendo à impugnação administrativa a que se refere o artigo 132.º, n.º 3, do CPPT, relativamente aos actos de retenção na fonte realizados entre 15 de maio de 2019 e 20 de maio de 2021, pelo que se verifica a inimpugnabilidade desses actos tributários por falta de precedência de impugnação administrativa dentro do prazo legalmente previsto.
Carlos Fernandes Cadilha
[1] Tendo em ambos os casos sido ponderada a revogação do n.º 2 do artigo 78.º LGT, operada pela Lei do Orçamento de Estado de 2016, mediante a qual os erros na autoliquidação deixaram de ser ficcionados como imputação aos serviços, e, portanto, não se justifica tratamento diferenciado daquele que é conferido na hétero-liquidação e é por força dessa alteração, recai sobre o contribuinte o ónus de comprovar a imputabilidade do erro.
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