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DECISÃO ARBITRAL
SUMÁRIO:
Apesar da não impugnabilidade (normal) de atos de liquidação de IMI com fundamento em ilegalidade na fixação do VPT que lhes serviu de base, os n.ºs 4 e 5 do artigo 78.º da LGT admitem a possibilidade (excecional) de revisão oficiosa de atos tributários (incluindo liquidações de IMI e de AIMI) “com fundamento em injustiça grave ou notória, desde que o erro não seja imputável a comportamento negligente do contribuinte”.
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Carla Almeida Cruz, árbitro das listas do CAAD, designada pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formar o Tribunal Arbitral singular, constituído em 28-08-2023, elabora nos seguintes termos a decisão arbitral no processo identificado.
1. RELATÓRIO
FUNDO ESPECIAL DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO A..., pessoa coletiva equiparada número ..., representada por B...– SGOIC, S.A., com o número único de matrícula e de identificação fiscal ..., com sede na ..., n.º..., ...-... Lisboa (doravante, abreviadamente designada de “Requerente”), veio, nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, constante do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, (doravante, abreviadamente designado de “RJAT”), requerer a constituição de Tribunal Arbitral, com vista à anulação da decisão de indeferimento do procedimento de revisão oficiosa que correu termos sob o n.º ...2020..., e, consequentemente a anulação parcial dos seguintes atos de liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis (“IMI”) e de Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis (“AIMI”), no montante total de € 26.566,63:
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ato de liquidação de IMI referente ao ano de 2016, que deu origem aos atos tributários n.ºs 2016..., 2016 ... e 2016 ... (1.ª, 2.ª e 3.ª prestações, respetivamente), no qual se apurou o montante total de imposto a pagar de € 302.231,47 - sendo que no presente pedido de pronúncia arbitral apenas contesta o montante de € 3.807,26, referente aos prédios urbanos identificados no artigo 7.º da petição inicial;
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ato de liquidação de IMI referente ao ano de 2017, que deu origem aos atos tributários n.ºs 2017..., 2017... e 2017... (1.ª, 2.ª e 3.ª prestações, respetivamente), no qual se apurou o montante total de imposto a pagar de € 240.975,31 - sendo que no presente pedido de pronúncia arbitral apenas contesta o montante de € 3.807,26, referente aos prédios urbanos identificados no artigo 7.º da petição inicial;
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ato de liquidação de IMI referente ao ano de 2018, que deu origem aos atos tributários n.ºs 2018..., 2018... e 2018 ... (1.ª, 2.ª e 3.ª prestações, respetivamente), no qual se apurou o montante total de imposto a pagar de € 192.612,29 - sendo que no presente pedido de pronúncia arbitral apenas contesta o montante de € 3.807,26, referente aos prédios urbanos identificados no artigo 7.º da petição inicial;
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ato de liquidação de AIMI n.º 2017... referente ao ano de 2017, no qual se apurou o montante total de imposto a pagar de € 317.209,38 - sendo que no presente pedido de pronúncia arbitral apenas contesta o montante de € 5.076,34, referente aos prédios urbanos identificados no artigo 7.º da petição inicial;
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ato de liquidação de AIMI n.º 2018... referente ao ano de 2018, no qual se apurou o montante total de imposto a pagar de € 250.333,64 - sendo que no presente pedido de pronúncia arbitral apenas contesta o montante de € 5.076,34, referente aos prédios urbanos identificados no artigo 7.º da petição inicial;
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ato de liquidação de AIMI n.º 2019... referente ao ano de 2019, no qual se apurou o montante total de imposto a pagar de € 217.188,25 - sendo que no presente pedido de pronúncia arbitral apenas contesta o montante de € 4.992,17, referente aos prédios urbanos identificados no artigo 7.º da petição inicial.
O Requerente peticiona também o reembolso do imposto pago em excesso, no montante de € 26.566,63, acrescido de juros indemnizatórios, à taxa legal, calculados desde a data do pagamento até ao reembolso integral daquele montante.
É Requerida nestes autos a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (“Requerida” ou “AT”).
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD em 19-06-2023 e foi notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 23-06-2023.
Nos termos do disposto no artigo 6.º, n.º 1 e do artigo 11.º, n.º 1, alínea b) do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitro do Tribunal Arbitral, com árbitro singular, a signatária, que manifestou a aceitação do encargo, no prazo legal.
Em 07-08-2023 as partes foram devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado intenção de recusar a designação do árbitro, nos termos previstos nas normas do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e nas normas dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, e em conformidade com a disciplina constante do artigo 11.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 28-08-2023.
A Requerida, através de despacho arbitral proferido em 29-08-2023, foi notificada para os efeitos previstos no artigo 17.º da RJAT.
Em 28-09-2023, a Requerida, apresentou a sua Resposta, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, na qual pugna pela improcedência e consequente absolvição de todos os pedidos, tendo também nessa data remetido ao tribunal arbitral, cópia do processo administrativo.
Por despacho de 06-10-2023, foi dispensada a realização da reunião a que alude o artigo 18.º, do RJAT e determinada a notificação das partes para produzirem alegações escritas.
Em 25-10-2023, o Requerente apresentou alegações escritas, nas quais reiterou a posição anteriormente assumida na petição inicial.
A Requerida não apresentou alegações, mas por requerimento de 11-12-2023 juntou aos autos o Acórdão do STA proferido no processo 115/23.7BALSB (P462/2021-T) em 22-11-2023.
2. SANEAMENTO
O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, face ao preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.
O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do RJAT.
As partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (cf. artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT, e artigo 1.º, da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
O processo não enferma de nulidades.
3. FUNDAMENTAÇÃO
3.1. MATÉRIA DE FACTO
3. 1.1. Factos provados
Com relevância para a decisão, consideram-se provados os seguintes factos:
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O Requerente é proprietário, de entre outros, dos seguintes prédios urbanos (“PRÉDIOS”) que constituem terrenos para construção (cf. documento nº 8 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido):
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prédio urbano sito na ... (...), ..., ..., ...-... Sintra, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de União freguesias de ... e ..., ... e ..., do concelho de Sintra, sob o artigo ...; e,
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prédio urbano sito na ..., ..., ..., ...-... Sintra, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de União freguesias de ... ..., ... e ..., do concelho de Sintra, sob o artigo ... .
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O prédio antes referido, inscrito na matriz sob o artigo ..., proveio do art.º..., da extinta freguesia de ... (...) e foi avaliado nos termos do IMI, na sequência da Avaliação Geral, com o número de registo da Mod.1 n.º ... de 15.01.2013, ficha de avaliação n.º..., efetuada em 03.02.2013, tendo o Requerente sido notificado do valor patrimonial de € 914.570,00 em 04.02.2013, pelo ofício n.º ... (cf. documento 8 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido);
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O prédio antes referido, inscrito na matriz sob o artigo ..., proveio do art.º..., da extinta freguesia de ... (...), e foi avaliado nos termos do IMI, na sequência da Avaliação Geral com o número de registo da Mod.1 n.º ... de 15.01.2013, ficha de avaliação n.º..., efetuada em 07.02.2013, tendo o Requerente sido notificado do valor patrimonial de € 1.360.910,00 em 20.03.2013 pelo ofício n.º ... (cf. documento 8 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido);
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Nas referidas avaliações dos PRÉDIOS, o VPT foi apurado com a aplicação do coeficiente de localização de 1,60 do coeficiente de afetação de 1,10 e do coeficiente de qualidade e conforto de 1,0, bem como com a aplicação do valor base dos prédios edificados de € 603 (cf. documento 8 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido);
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Em 03.12.2020, o Requerente apresentou pedido de atualização da inscrição matricial dos PRÉDIOS (cf. documento 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido);
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No dia 22.12.2020, o Requerente foi notificado das avaliações efetuadas pela Autoridade Tributária aos referidos PRÉDIOS que, apesar de terem substituído o coeficiente de localização por “1”, não desconsiderou a majoração de 25% do valor base prevista para os prédios urbanos já edificados, e, bem assim, manteve a percentagem da área de implantação em valor superior a 15% (cf. documento 10 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
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Em 30.12.2020, o Requerente instaurou procedimento de revisão oficiosa, com vista à anulação dos atos tributários acima melhor identificados supra (cf. documentos 2 a 7 e 11, juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
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Através do ofício n.º 2023... de 15.03.2023, notificado em 20.03.2023, o Requerente foi notificado da decisão de indeferimento do procedimento de revisão oficiosa que correu seus termos sob o n.º ...2020..., na qual a Autoridade Tributária invocou para fundamentar esta decisão, designadamente, que (cf. documento 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por integralmente reproduzido):
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O Requerente foi, em datas não apuradas, notificado dos seguintes atos de liquidação aqui impugnados:
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Ato de liquidação de IMI referente ao ano de 2016, que deu origem às notas de liquidação n.º 2016..., de 16-03-2017, nº 2016..., de 22-06-2017, e nº. 2016..., de 25-10-2017 (1.ª, 2.ª e 3.ª prestações, respetivamente), no qual se apurou o montante total de imposto a pagar de € 302.231,47 - sendo que no presente pedido de pronúncia arbitral apenas se contesta o montante de € 3.807,26, referente aos PRÉDIOS identificados na antecedente alínea A) (cf. documento 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
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ato de liquidação de IMI referente ao ano de 2017, que deu origem às notas de liquidação n.º 2017..., de 20-03-2018, nº. 2017..., de 20-06-20218, e nº. 2017..., de 22-10-2018 (1.ª, 2.ª e 3.ª prestações, respetivamente), no qual se apurou o montante total de imposto a pagar de € 240.975,31 - sendo que no presente pedido de pronúncia arbitral apenas se contesta o montante de € 3.807,26, referente aos PRÉDIOS identificados na antecedente alínea A) (cf. documento 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
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ato de liquidação de IMI referente ao ano de 2018, que deu origem às notas de liquidação n.º 2018..., de 04-04-2019, nº. 2018..., de 17-07-2019, e nº. 2018..., de 17-10-2019 (1.ª, 2.ª e 3.ª prestações, respetivamente), no qual se apurou o montante total de imposto a pagar de € 192.612,29 - sendo que no presente pedido de pronúncia arbitral apenas se contesta o montante de € 3.807,26, referente aos PRÉDIOS identificados na antecedente alínea A) (cf. documento 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
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ato de liquidação de AIMI n.º 2017..., referente ao ano de 2017, no qual se apurou o montante total de imposto a pagar de € 317.209,38 - sendo que no presente pedido de pronúncia arbitral apenas se contesta o montante de € 5.076,34, referente aos PRÉDIOS identificados na antecedente alínea A) (cf. documento 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
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ato de liquidação de AIMI n.º 2018 ... referente ao ano de 2018, no qual se apurou o montante total de imposto a pagar de € 250.333,64 - sendo que no presente pedido de pronúncia arbitral apenas se contesta o montante de € 5.076,34, referente aos PRÉDIOS identificados na antecedente alínea A) (cf. documento 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
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ato de liquidação de AIMI n.º 2019... referente ao ano de 2019, no qual se apurou o montante total de imposto a pagar de € 217.188,25 - sendo que no presente pedido de pronúncia arbitral apenas se contesta o montante de € 4.992,17, referente aos PRÉDIOS identificados na antecedente alínea A) (cf. documento 7 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
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Em parte, as liquidações de IMI e AIMI sub judice tiveram por base, para efeitos de determinação do valor tributável e do correspondente montante de IMI a pagar pelo Requerente, os valores patrimoniais tributários dos terrenos para construção, valores estes que estavam fixados segundo a fórmula adoptada à data pela AT, a qual considerava a aplicação de coeficientes de afetação, de localização e de qualidade e conforto, bem como a aplicação da majoração de 25% relativa ao valor do metro quadrado do terreno de implantação constante no nº 1 do artigo 39º do Código do IMI;
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O Requerente, em data não apurada, procedeu ao pagamento das liquidações aqui impugnadas;
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Em 19-06-2023, o Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo [cf. sistema informático de gestão processual do CAAD].
3.1.2. Factos considerados não provados
Não foram considerados como não provados nenhuns dos factos alegados, com efetiva relevância para a boa decisão da causa.
3.1.3. Fundamentação da decisão da matéria de facto
Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, à face das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2, do CPPT e 607.º, n.º 3, do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT.
Não há controvérsia sobre a matéria de facto, pelo que no tocante à matéria de facto dada como provada, a convicção do Tribunal fundou-se nos factos articulados pelas Partes, cuja aderência à realidade não foi posta em causa e, portanto, admitidos por acordo, bem como na análise crítica da prova documental que consta dos autos, designadamente os documentos juntos pelo Requerente, cuja correspondência à realidade não é contestada pela Autoridade Tributária e Aduaneira.
Não se deram como provadas, nem não provadas alegações feitas pelas partes, com natureza meramente conclusiva, ainda que tenham sido apresentadas como factos, por serem insuscetíveis de comprovação, sendo que o seu acerto só pode ser aferido em confronto com a fundamentação da decisão da matéria jurídica, constante do capítulo seguinte.
Finalmente, importa sublinhar que a questão essencial a decidir é de direito e assenta na prova documental junta aos autos pelo Requerente, não contestada pela Autoridade Tributária e Aduaneira.
3.2. MATÉRIA DE DIREITO
3.2.1. Objeto do litígio e posição das partes
A questão que constitui o thema decidendum neste processo respeita à impugnabilidade de actos tributários de liquidação de IMI e de AIMI, com base em vícios de fixação do valor patrimonial tributário.
O Requerente defende que o pedido de revisão oficiosa que apresentou é tempestivo e que as liquidações em causa enfermam de erro imputável aos serviços e que se traduziu em injustiça grave e notória na fixação de um valor patrimonial tributário superior ao que resultaria das disposições legais que deveriam ter sido aplicadas, tendo alegado, designadamente, que:
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(…) sem prejuízo do disposto no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 23.02.2023, proferido no processo n.º 102/22.2BALSB (…), a legalidade das liquidações de IMI (e de AIMI) devem poder ser alvo de escrutínio, mesmo quando tenham por base um VPT cuja avaliação não foi contestada, uma vez que a própria liquidação será irremediavelmente ilegal;
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(…) o facto de não ter contestado o VPT dos prédios no prazo de 5 anos a que alude o n.º 1 do artigo 168.º do CPA, não desvincula a Autoridade Tributária de conhecer do mérito do pedido de revisão apresentado pelo Requerente, pelo que, o seu mérito deveria ter sido conhecido pela Autoridade Tributária que, e, em consequência, deveria ter revisto o mesmo em consonância com a posição assumida pelos Tribunais superiores quanto à sua (i)legalidade;
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Mas, ainda que se entenda que as liquidações de IMI/AIMI não padecem de qualquer erro imputável aos serviços, na medida em que a Autoridade Tributária se limitou a aplicar uma determinada taxa sobre o VPT fixado e consolidado na matriz, a Autoridade Tributária sempre estaria adstrita ao conhecimento do mérito do pedido de revisão oficiosa, por injustiça grave e notória, quanto ao IMI de 2017-2018 e quanto ao AIMI de 2018-2019, nos termos dos n.ºs 4 e 5 do artigo 78.º da LGT;
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Independentemente da posição assumida pelo Supremo Tribunal Administrativo no processo n.º 0102/22.2BALSB quanto à impossibilidade de rever os atos tributários de IMI/AIMI por erro imputável aos serviços, nos termos do n.º 1 do artigo 78.º da LGT, sempre será de admitir a sua revisão, por injustiça grave ou notória, nos termos dos n.ºs 4 e 5 do mesmo preceito legal (in casu, quanto ao IMI de 2017-2018 e quanto ao AIMI de 2018-2019), na medida em que esta questão não foi apreciada por aquele Tribunal;
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No caso em análise, caso não se entenda que estamos perante uma injustiça notória (…)sempre se diga que se está (no mínimo) perante uma situação de injustiça “grave”, gerada com as erradas avaliações, pois, a tributação em IMI e em AIMI dos prédios referidos nos autos foi consideravelmente superior ao devido, como resulta da quantificação efetuada pelo Requerente;
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Para efeitos de determinação do VPT dos prédios urbanos para habitação, comércio, indústria e serviços tem-se em consideração tal valor base, nos termos do n.º 1 do artigo 39.º do Código do IMI, porque estão em causa duas componentes do prédio (edificação e terreno), não sendo equiparável a consideração das mesmas componentes na avaliação dos terrenos para construção, que não deverá considerar a majoração de 25% prevista citada na referida norma legal;
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Caso o Tribunal arbitral entenda ser aplicável ao caso sub judice o disposto no n.º 4 do artigo 78.º da LGT, deverá o mesmo conhecer da ilegalidade da aplicação da majoração de 25% prevista no n.º 1 do artigo 39.º do Código do IMI no apuramento do VPT dos imóveis de que o Requerente é detentora e, consequentemente, no IMI/AIMI apurados;
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Caso a pretensão do Requerente - desconsideração da majoração de 25% prevista no n.º 1 do artigo 39.º do Código do IMI - não obtenha provimento, deve, subsidiariamente, ser acolhido o entendimento de que não pode ser aplicada aos terrenos para construção uma percentagem da área de implantação superior a 15%, pelo que a mesma deverá ser sempre reduzida a esse limite mínimo;
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Ficando demonstrada a ilegalidade das liquidações de IMI e de AIMI, as quais devem ser anuladas parcialmente, nos termos e para os efeitos da alínea a) do artigo 99.º do CPPT, aplicável por força da alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT, na parte em que determinam a coleta de IMI e de AIMI referente aos PRÉDIOS em excesso, devendo o Requerente ser reembolsada do montante total de € 26.566,63;
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Sem prejuízo dos cálculos expostos na presente ação, o Requerente (…), nada tem a opor que “[C]aso o tribunal (…) julg[ue] a ação procedente”, “a quantificação do montante devido, deve ser apurado em sede de execução da decisão arbitral, o que desde já se peticiona” (cf. os pontos 74.º e 75.º da Resposta da Autoridade Tributária);
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Caso o Tribunal arbitral venha a julgar procedente a pretensão do Requerente, serão devidos juros indemnizatórios desde o decurso do prazo de um ano sobre a data da apresentação dos pedidos de revisão oficiosa (30.12.2021), à taxa legal máxima em vigor (atualmente de 4%/ano, cf. o n.º 10 do artigo 35.º e o n.º 4 do artigo 43.º, ambos da LGT, o artigo 559.º do Código Civil e a Portaria n.º 291/03, de 8 de abril).
Por seu turno, a Autoridade Tributária e Aduaneira, pese embora não questione que ocorreram os erros na determinação dos valores patrimoniais tributários dos terrenos para construção invocados pela Requerente e inclusivamente reconheça que “verifica-se ausência de litígio quanto à forma de cálculo aplicável para determinar o VPT dos terrenos para construção”, opõe-se à pretensão da Requerente, invocando, em síntese, as seguintes razões:
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O que o Requerente contesta é apenas e só, o ato de fixação do VPT e não o ato de liquidação;
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Os atos de fixação do VPT não são atos de liquidação, mas antes atos autónomos e individualizados com eficácia jurídica própria e diretamente sindicáveis que põem fim ao procedimento de avaliação;
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O Supremo Tribunal Administrativo no processo n.º 102/22.2BALSB em 23.02.2023, veio uniformizar a jurisprudência sobre esta matéria no sentido de que: “Não tendo sido impugnado judicialmente o resultado da segunda avaliação, nos termos previstos na lei, forma-se caso decidido ou resolvido sobre o valor da avaliação, pelo que esta não pode voltar a ser discutida”;
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No caso em apreço, não tendo o Requerente colocado em causa o valor patrimonial obtido pela 1.ª avaliação, requerendo uma 2.ª avaliação, o mesmo fixou-se, não sendo possível conhecer na posterior liquidação, de eventuais erros ou vícios cometidos nessa avaliação;
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Por estar consolidada a fixação do valor patrimonial tributário, não podem os atos de liquidação impugnados nos presentes autos serem anulados com fundamento em erros no cálculo do VPT;
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O artigo 78.º da LGT não abrange os atos de avaliação patrimonial, que não são atos tributários, previstos no n.º 1, nem são atos de apuramento da matéria tributável previstos no n.º 4 daquela norma;
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Não se verifica qualquer erro no ato de liquidação, o qual foi calculado com base no VPT constante na matriz predial em estrito e integral cumprimento da lei;
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Tão pouco o fundamento da injustiça grave ou notória do nº 4 do art. 78° da LGT, é invocável quando a liquidação do IMI tenha sido efetuada de acordo com o nº 1 do artigo 113º do CIM, com base nos valores patrimoniais inscritos na matriz predial, não impugnados com esse fundamento pelo sujeito passivo no prazo e nos termos previstos na lei;
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O pedido de revisão oficiosa - tendo em conta a data de apresentação do pedido de revisão oficiosa das liquidações e a data da fixação do VPT - sempre seria intempestivo face ao prazo previsto no n.º 4 do artigo 78.º da Lei Geral Tributária;
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Decorre do texto da lei que apenas são passíveis de anulação os atos de fixação dos VPT nos casos em que não tenham decorrido cinco anos desde a respetiva emissão;
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Por força do artigo 168, n.º 1, do CPA, as avaliações, em que foram considerados os coeficientes de localização e afetação na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção, efetuadas à mais de cinco anos já não podem ser objeto de anulação administrativa por determinação legal;
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Quanto aos imóveis supra identificados, já se encontra precludido o prazo para anulação administrativa do ato que fixe valor patrimonial tributário o qual se encontra sanado e produz efeitos jurídicos, nomeadamente para efeitos de cálculo de IMI e de AIMI;
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Também não se verifica qualquer violação da garantia da tutela jurisdicional efetiva pois a lei prevê vários e diferenciados meios para a impugnação dos valores patrimoniais tributários.
Sustenta ainda a AT a propósito do pedido de reembolso formulado pelo Requerente que, na hipótese da ação vir a ser julgada procedente, não deverá ser fixado o valor do montante a reembolsar pois o tribunal não possui todos os elementos necessários para o efeito, peticionando que neste caso a quantificação do montante devido, deve ser apurado em sede de execução da decisão arbitral.
Finalmente, alega ainda a AT que o direito aos juros indemnizatórios após a apresentação de um pedido de revisão oficiosa, só pode ser reconhecido se esta se efetuar mais de um ano após aquele pedido.
3.2.2. Apreciação da questão
A questão controvertida no presente processo - já após a prolação do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência de 23-02-2023, proferido no processo n.º 102/22.2BALSB - foi objeto de pronúncia e de decisão por parte do CAAD em vários processos, designadamente em 11-04-2023 no âmbito do processo nº 769/2022-T, em 02-07-2023 no âmbito do processo nº 770/2022-T, e mais recentemente em 15-02-2024, no âmbito do processo nº564/2023-T, cuja factualidade é em tudo semelhante à dos presentes autos, e cujo teor subscrevemos, com as necessárias adaptações, quer quanto à motivação, quer quanto ao sentido decisório, atento o que dispõe a norma do artigo 8º, nº3 do Código Civil.
Assim sendo, a atualidade e sólida fundamentação da decisão proferida no âmbito do mencionado processo arbitral nº 769/2022-T, justifica a adesão à solução da questão nele expressa, cujo conteúdo, com as necessárias adaptações, acompanhamos de perto, nos termos que se passam a enunciar.
3.2.2.1. Da admissibilidade de revisão oficiosa
Comecemos por nos debruçar sobre a admissibilidade de revisão oficiosa.
Quanto a esta matéria, acompanhamos a argumentação da decisão proferida no processo arbitral nº 769/2022-T, que considerou que:
“O artigo 78.º da LGT prevê no seu n.º 1, «a revisão dos actos tributários pela entidade que os praticou», reportando-se a actos de liquidação.
Mas, no seu n.º 4, prevê-se a possibilidade de «revisão da matéria tributável apurada com fundamento em injustiça grave ou notória», pelo que se admite a revisão de actos de avaliação, que são um tipo de actos de fixação da matéria tributável, como decorre do n.º 1 do artigo 81.º da LGT.
O n.º 7 do artigo 78.º da LGT confirma expressamente que a revisão oficiosa pode ser «do acto tributário ou da matéria tributável».
Os actos de fixação de valores patrimoniais reconduzem-se a actos e fixação da matéria tributável, pois é aos valores com base neles determinados que são feitas ulteriores liquidações de impostos (como, por exemplo, o IMI, o IMT, o IUC e direitos aduaneiros). “
No caso em apreço, o Requerente pediu a revisão oficiosa dos actos de liquidação de IMI e AIMI e também de actos de fixação da matéria tributável, com fundamento em injustiça grave e notória, pelo que se concluí que o seu pedido é abstractamente susceptível de enquadramento no artigo 78.º da LGT.
3.2.2.2. Da consolidação do acto de fixação do valor patrimonial tributário
Vejamos agora a questão da consolidação do acto de fixação do valor patrimonial tributário.
A AT sustenta que no caso dos autos, não tendo o Requerente colocado em causa o valor patrimonial obtido pela 1.ª avaliação, requerendo uma 2.ª avaliação, o mesmo fixou-se, não sendo possível conhecer na posterior liquidação, de eventuais erros ou vícios cometidos nessa avaliação.
Considera deste modo a AT que se encontra consolidada a fixação do valor patrimonial tributário, não podendo os atos de liquidação impugnados nos presentes autos serem anulados com fundamento em erros no cálculo do VPT.
Como foi entendido na decisão proferida no âmbito do processo arbitral nº 769/2022-T, que subscrevemos:
“São meios processuais diferentes, com efeitos distintos, a impugnabilidade directa de actos de liquidação, com os efeitos retroactivos próprios da declaração de anulabilidade e direito a juros indemnizatórios, e a possibilidade de revisão oficiosa, com os fundamentos previstos no artigo 78.º da LGT, com efeitos mais limitados, não retroactivos, designadamente a nível de direito a juros indemnizatórios, como resulta do disposto no artigo 43.º, n.ºs 1 e 3 da LGT.
No caso em apreço, não foi apresentada reclamação graciosa ou impugnação judicial dos actos de liquidação de IMI nos prazos respectivos (previstos nos artigos 70.º, n.º 1, e 102.º n.º 1, do CPPT), mas foi pedida a revisão oficiosa que, nos termos do artigo 78.º da LGT, além de outros casos, pode ser pedida no prazo de quatro anos a contar dos actos de liquidação com fundamento em erro imputável aos serviços nos termos do seu n.º 1, ou no prazo de três anos com fundamento em injustiça grave e notória, nos termos dos seus n.ºs 4 e 5.
Da revisão da matéria tributável apurada com fundamento em injustiça grave ou notória, prevista nos n.ºs 4 e 5 do artigo 78.º da LGT, decorre a anulação dos actos de liquidação que se tenham baseado nessa matéria tributável, pois são actos consequentes.
Em qualquer caso, a revisão por iniciativa da administração tributária (dita oficiosa), tanto da liquidação (n.ºs 1 e 3) como da matéria tributável (n.ºs 4 e 5), é admitida também a pedido do contribuinte, como se conclui do teor expresso do n.º 7 do artigo 78.º ou referir que «interrompe o prazo da revisão oficiosa do acto tributário ou da matéria tributável o pedido do contribuinte dirigido ao órgão competente da administração tributária para a sua realização».
Esta questão da invocação de vícios de actos de avaliação em procedimento de revisão oficiosa foi apreciada no acórdão proferido em 10-05-2021, no processo arbitral n.º 487/2020- T, cuja jurisprudência aqui se reafirma, no essencial.
Por força do preceituado no artigo 15.º do CIMI a avaliação dos prédios urbanos é directa e, por isso, ela é «susceptível, nos termos da lei, de impugnação contenciosa directa» (artigo 86.º, n.º 1, da LGT).
Nos termos do n.º 2 do mesmo artigo 86.º da LGT, «a impugnação da avaliação directa depende do esgotamento dos meios administrativos previstos para a sua revisão».
Os termos da impugnação da avaliação directa de valores patrimoniais constam do artigo 134.º do CPPT, em que se estabelece que: – «os atos de fixação dos valores patrimoniais podem ser impugnados, no prazo de três meses após a sua notificação ao contribuinte, com fundamento em qualquer ilegalidade» (n.º 1); e – «a impugnação referida neste artigo não tem efeito suspensivo e só poderá ter lugar depois de esgotados os meios graciosos previstos no procedimento de avaliação» (n.º 7).
Como decorre do n.º 1 do artigo 134.º, ao fixar um prazo especial de três meses para impugnação de actos de fixação de valores patrimoniais, «com fundamento em qualquer ilegalidade», e do n.º 7 do mesmo artigo, ao exigir o esgotamento dos meios graciosos, está afastada a possibilidade de essa impugnação com fundamento em ilegalidade se fazer, por via indirecta, na sequência da notificação de actos de liquidação que a tenham como pressuposto, como são os de IMI, sem observância do prazo de impugnação referido e sem esgotamento dos meios de revisão previstos no procedimento de avaliação.
No âmbito do IMI, quando o sujeito passivo não concordar com o resultado da avaliação directa de prédios urbanos, pode requerer ou promover uma segunda avaliação, no prazo de 30 dias contados da data em que o primeiro tenha sido notificado (artigo 76.º, n.º 1, do CIMI).
Só do resultado das segundas avaliações (que esgotam os meios graciosos do procedimento de avaliação) cabe impugnação judicial nos termos do CPPT (artigo 77.º, n.º 1 do CIMI).
Isto significa que os actos de avaliação de valores patrimoniais previstos no CIMI são actos destacáveis, para efeitos de impugnação contenciosa, sendo objecto de impugnação autónoma, não podendo na impugnação dos actos de liquidação que com base neles sejam efectuadas discutir-se a legalidade daqueles actos.
Assim, o sujeito passivo de IMI pode impugnar as liquidações, mas não são relevantes como fundamentos de anulação eventuais ilegalidades dos antecedentes actos de fixação de valores patrimoniais, que se firmaram na ordem jurídica, por falta de tempestivo esgotamento dos meios graciosos previstos nos procedimentos de avaliações e de subsequente impugnação autónoma a deduzir no prazo de três meses, nos termos dos n.ºs 1 e 7 do artigo 134.º do CPPT.
Na verdade, não sendo impugnado tempestivamente o acto de fixação de valores patrimoniais, forma-se caso decidido ou resolvido sobre a avaliação, que se impõe em sede de liquidação de IMI, sendo que «o imposto é liquidado anualmente, em relação a cada município, pelos serviços centrais da Direcção-Geral dos Impostos, com base nos valores patrimoniais tributários dos prédios e em relação aos sujeitos passivos que constem das matrizes em 31 de Dezembro do ano a que o mesmo respeita» (artigo 113.º do CIMI).
Este regime de impugnação autónoma justifica-se por razões de coerência do sistema jurídico tributário inerentes ao facto de cada acto de avaliação poder servir de suporte a uma pluralidade de actos de liquidação de impostos (liquidações anuais de IMI e eventuais liquidações de IMT) e ser relevante para vários efeitos a nível de IRS, IRC e Imposto do Selo, o que não se compagina com a possibilidade de plúrima avaliação incidental que se reconduzisse à fixação de diferentes valores patrimoniais tributários para o mesmo prédio, no mesmo momento.
Por outro lado, a caducidade do direito de acção derivada da inércia do lesado por actos administrativos durante um prazo razoável, é generalizadamente justificada por razões de segurança jurídica, necessária para adequado funcionamento da administração pública, que é um valor constitucional ínsito no princípio do Estado de Direito democrático e é reconhecida generalizadamente em matéria administrativa e tributária.
O prazo de três meses para impugnação de actos de fixação de valores patrimoniais é perfeitamente razoável, sendo o prazo geral previsto a lei para a impugnação da generalidade dos actos administrativos com fundamentos geradores de vícios de anulabilidade (artigo 58.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e artigo 102.º do CPPT).
A natureza de actos destacáveis que é atribuída aos actos de avaliação de valores patrimoniais é, há muito, reconhecida pela jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, desde o tempo em que regime idêntico ao do artigo 134.º, n.ºs 1 e 7 do CPPT, previsto nos n.ºs 1 e 6 do artigo 155.º do Código de Processo Tributário de 1991, quer em sede de Sisa, quer de contribuição autárquica, quer de IMI quer de IMT, como pode ver-se pelos seguinte acórdãos:
– de 30-06-1999, processo n.º 023160;
– de 02-04-2003, processo n.º 02007/02;
– de 06-02-2011, processo n.º 037/11;
– de 19-09-2012, processo n.º 0659/12;
– de 5-2-2015, processo n.º 08/13”
Em face do antes exposto, importa concluir que as ilegalidades dos actos de avaliação invocados pelo Requerente, que não foram objecto de impugnação tempestiva autónoma, não podem considerar-se ilegalidades dos actos de liquidação de IMI e de AIMI, susceptíveis de serem invocadas em processo impugnatório destes actos.
Assim, tendo as liquidações sido efectuadas com base nos valores patrimoniais dos prédios que constavam das matrizes a 31 de Dezembro do ano a que respeita o IMI, não há erro da Administração Tributária ao efectuar as liquidações e, por isso, o pedido de revisão oficiosa não podia ser deferido ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º da LGT, assistindo por isso razão a Autoridade Tributária e Aduaneira, quanto a esta questão, o que é reconhecido pelo Supremo Tribunal Administrativo, no mencionado Acórdão Uniformizador de Jurisprudência de 23-02-2023, processo n.º 102/22.2BALSB, citado pela AT.
3.2.2.3. Da admissibilidade de revisão oficiosa dos actos com fundamento em injustiça grave ou notória
Sucede que, o referido Acórdão Uniformizador não só tem subjacente situação factual distinta da dos presentes autos, o que desde logo determinaria a sua não aplicabilidade ao caso concreto, como também não se pronuncia especificadamente, para o que aqui importa, sobre a situação da revisão oficiosa prevista nos nºs 4 e 5 do artigo 78º da LGT, em que se prevêem excepções à inimpugnabilidade de actos de fixação da matéria tributável consolidados.
Aqui chegados, há agora que apreciar a possibilidade de revisão neste condicionalismo, e analisar os requisitos decorrentes dos nºs 4 e 5 do artigo 78º da LGT, para o que nos socorremos e seguimos, também aqui com as necessárias adaptações, da jurisprudência que decorre da decisão arbitral proferida no processo nº 487/2020-T do CAAD:
“(…) verificada a tempestividade do pedido teremos que apreciar se a fixação dos valores patrimoniais resultam de qualquer informação incorretamente prestada pela Requerente relativamente à natureza dos prédios, o que não se verifica, uma vez que a avaliação foi realizada pela AT, com base numa fórmula prevista na Lei, sem qualquer intervenção da Requerente.
Esta circunstância afasta qualquer comportamento negligente da sua parte. Antes pelo contrário, o erro tem de ser completamente imputável à AT, na medida em que utilizou na avaliação e fixação de valores patrimoniais dos terrenos para construção, as normas legais aplicáveis aos prédios edificados, o que nos permite concluir que os erros apontados pela Requerente na fixação dos valores patrimoniais dos terrenos para construção em causa, só poderão ser exclusivamente imputáveis à AT. Tais erros conduziram ao apuramento de valores patrimoniais dos terrenos para construção não correspondentes ao legalmente previsto no artigo 45º do CIMI e consequentemente aos atos de liquidação de IMI desproporcionalmente superiores aos legalmente exigíveis, o que se traduz em “injustiça grave ou notória”, ficando, deste modo, preenchidos os requisitos exigidos pelo nº 4 do artigo 78º da LGT.”
Vertendo a jurisprudência citada para o caso em concreto, há que concluir que se verificam todos os requisitos exigíveis para a revisão da matéria tributável prevista nos nºs 4 e 5 do artigo 78º da LGT.
3.2.2.4. Da tempestividade do pedido de revisão oficiosa
Finalmente, importa ainda analisar a tempestividade do pedido de revisão oficiosa apresentado pelo Requerente.
A Requerida pugna pela respectiva intempestividade, sustentando que “(…) o pedido de revisão oficiosa - tendo em conta a data de apresentação do pedido de revisão oficiosa das liquidações e de interposição da presente ação - sempre seria intempestivo face ao prazo previsto no n.º 4 do artigo 78.º da Lei Geral Tributária.”.
Vejamos se assim é.
O prazo para ser autorizada a revisão da matéria tributável pelo dirigente máximo do serviço é o prazo dos “três anos posteriores ao do acto tributário”, previsto no n.º 4 do artigo 78.º da LGT.
Os “três anos posteriores ao do acto tributário” terminam no dia 31 de Dezembro do terceiro ano posterior àquele em que foi praticado o acto tributário.
Olhemos para o caso em concreto e para a matéria de facto que resultou assente.
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A nota de cobrança de IMI relativa ao ano de 2016, foi emitida em 2017 (cf. alínea I), i) dos factos provados). Por isso, relativamente ao IMI do ano de 2016, o termo dos três anos posteriores ao do acto tributário, praticado em 2017, ocorreu em 31-12-2020.
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A nota de cobrança de IMI relativa ao ano de 2017, foi emitida em 2018 (cf. alínea I), ii) dos factos provados). Por isso, relativamente ao IMI do ano de 2017, o termo dos três anos posteriores ao do acto tributário, praticado em 2018, ocorreu em 31-12-2021[1].
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A nota de cobrança de IMI relativa ao ano de 2018, foi emitida em 2019 (cf. alínea I), iii) dos factos provados). Por isso, relativamente ao IMI do ano de 2018, o termo dos três anos posteriores ao do acto tributário, praticado em 2019, ocorreu em 31-12-2022.
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A nota de cobrança de AIMI relativa ao ano de 2017, foi emitida em 2017 (cf. alínea I), iv) dos factos provados). Por isso, relativamente ao AIMI relativa ao ano de 2017, o termo dos três anos posteriores ao do acto tributário, praticado em 2017, ocorreu em 31-12-2020.
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A nota de cobrança de AIMI relativa ao ano de 2018, foi emitida em 2018 (cf. alínea I), v) dos factos provados). Por isso, relativamente ao AIMI relativa ao ano de 2018, o termo dos três anos posteriores ao do acto tributário, praticado em 2018, ocorreu em 31-12-2021.
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A nota de cobrança de AIMI relativa ao ano de 2019, foi emitida em 2019 (cf. alínea I), vi) dos factos provados). Por isso, relativamente ao AIMI relativa ao ano de 2019, o termo dos três anos posteriores ao do acto tributário, praticado em 2019, ocorreu em 31-12-2022.
O Requerente apresentou o pedido de revisão oficiosa em 30-12-2020 (cf. alínea G) dos factos provados), pelo que é de concluir que o pedido foi apresentado tempestivamente quanto a todas as liquidações aqui em discussão.
Conclusão:
Verificam-se, assim, todos os requisitos de que depende a revisão da matéria tributável prevista nos n.ºs 4 e 5 do artigo 78.º da LGT, pelo que em vez do indeferimento do pedido de revisão oficiosa, a Autoridade Tributária e Aduaneira deveria ter efectuado a revisão e anulado parcialmente as liquidações impugnadas.
Pelo exposto, justifica-se a anulação do indeferimento do pedido de revisão, quanto à matéria tributável, bem como a anulação parcial das consequentes liquidações de IMI e de AIMI, na parte em que excederam o que seria devido se tivessem tido como pressupostos avaliações realizadas nos termos legais [artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT].
3.2.3. Do reembolso do imposto pago e do pagamento de juros indemnizatórios
O Requerente peticiona o reembolso do imposto indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios, tendo na petição inicial peticionado juros desde a data do pagamento até ao efetivo reembolso, e, posteriormente, em sede de alegações, reduzido o seu pedido no sentido de reclamar apenas os juros devidos após o decurso do prazo de um ano desde a data de apresentação do pedido de revisão oficiosa.
Em sede de Resposta, a Autoridade Tributária e Aduaneira, sustenta que o Tribunal não possui todos os elementos necessários para fixar o valor a reembolsar, tendo peticionado que a quantificação do montante devido, seja apurado em sede de execução da decisão arbitral, pretensão à qual o Requerente em sede de alegações declarou não se opôr (cf. III/j) das alegações).
Na sua Resposta, sustenta também a AT que o direito aos juros indemnizatórios após a apresentação de um pedido de revisão oficiosa, só pode ser reconhecido se esta se efetuar mais de um ano após aquele pedido.
Cumpre decidir.
Afigura-se que a Autoridade Tributária e Aduaneira tem razão, pois a determinação do valor exacto a reembolsar depende da determinação dos valores das avaliações de cada um dos prédios e do que, entretanto, a Autoridade Tributária e Aduaneira pode ter já reembolsado, na sequência dos procedimentos de avaliação iniciados em dezembro de 2020, a que o Requente alude em 10º da sua petição.
Quanto ao pedido de pagamento de juros indemnizatórios formulado pelo Requerente, o artigo 43.º, n.º 1, da LGT estabelece que são devidos juros indemnizatórios quando se determine, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
O pedido de revisão do acto tributário é equiparável a reclamação graciosa quando é apresentado dentro do prazo da reclamação administrativa, que se refere no n.º 1 do artigo 78.º da LGT, como se refere no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12-7-2006, proferido no processo n.º 402/06.
Como também se refere no mesmo acórdão, «nos casos de revisão oficiosa da liquidação (quando não é feita a pedido do contribuinte, no prazo da reclamação administrativa, situação que é equiparável à de reclamação graciosa) (...) apenas há direito a juros indemnizatórios nos termos do art. 43.º, n.º 3, da LGT».
No caso em apreço, a norma à face da qual tem de ser aferida a existência de direito a juros indemnizatórios é a alínea c) deste n.º 3 do artigo 43.º da LGT, que estabelece que estes são devidos «quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária»
Como decorre da matéria de facto fixada, o pedido de revisão foi apresentado em 30-12-2020, pelo que apenas a partir de 30-12-2021 há direito a juros indemnizatórios.
Considerando que o Requerente, por via da redução do pedido que fez em sede de alegações, peticiona juros indemnizatórios após o decurso do prazo de um ano desde a data de apresentação do pedido de revisão oficiosa, procede o pedido de juros que este formulou.
4. DECISÃO
Nos termos expostos, o Tribunal Arbitral decide:
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Julgar integralmente procedente o pedido formulado pelo Requerente, e em consequência:
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Anular a decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa;
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Anular parcialmente o ato de liquidação de IMI referente ao ano de 2016, que deu origem às notas de liquidação n.º 2016..., de 16-03-2017, nº 2016..., de 22-06-2017, e nº. 2016..., de 25-10-2017, o ato de liquidação de IMI referente ao ano de 2017, que deu origem às notas de liquidação n.º 2017..., de 20-03-2018, nº. 2017..., de 20-06-20218, e nº. 2017..., de 11-10-2018, o ato de liquidação de IMI referente ao ano de 2018, que deu origem às notas de liquidação n.º 2018..., de 04-04-2019, nº. 2018..., de 17-07-2019, e nº. 2018..., de 17-10-2019, o ato de liquidação de AIMI n.º 2017..., referente ao ano de 2017, o ato de liquidação de AIMI n.º 2018 ... referente ao ano de 2018 e o ato de liquidação de AIMI n.º 2019... referente ao ano de 2019, todos melhor identificados em I) dos factos provados, no montante total de € 26.566,63;
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Julgar procedente o pedido de reembolso, e condenar a Autoridade Tributária Aduaneira a pagar ao Requerente a quantia que vier a ser determinada em execução da presente decisão;
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Julgar procedente o pedido de juros indemnizatórios, e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento desses juros, calculados a partir de 30-12-2021, sobre o montante que for determinado em execução do presente acórdão.
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Condenar a Requerida no pagamento das custas do processo.
5. VALOR DO PROCESSO
Fixa-se o valor do processo em € 26.566,63 (vinte e seis mil, quinhentos e sessenta e seis euros e sessenta e três cêntimos), nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e do artigo 306.º, n.º 2, do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT e do artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
6. CUSTAS
Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 1.530,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela Requerida, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 5, do citado Regulamento.
Notifique-se.
Lisboa, 11 de Junho de 2024.
O Árbitro
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(Carla Almeida Cruz)
[1] Àqueles prazos de caducidade do direito de pedir a revisão oficiosa acrescem ainda os períodos em que esses prazos estiveram suspensos durante o ano de 2021, por força do preceituado no artigo 6.º-C, n.ºs 1, alínea c) e 2, daquela Lei n.º 1-A/2020, aditado pela Lei n.º 4-B/2021, de 1 de Fevereiro.