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SUMÁRIO:
I – A CSR é devida ao Estado pelo SP, sendo desconhecidos os termos do contrato de fornecimento de combustível celebrado ou da relação comercial entre a Requerente e o SP, designadamente a repercussão ou não da CSR e a sua incorporação no preço do combustível adquirido.
II – Face à sua natureza de imposto objeto de repercussão legal pelo SP, o IVA encontra-se objetiva e claramente discriminado nas faturas. Atento o regime da CSR e a possibilidade ou não de ser repercutida, a mesma não se apresenta discriminada nas faturas emitidas pelo SP.
III – Acresce que faturas apresentadas pela Requerente sem descritivo claro da respetiva natureza e conteúdo, contribuem para a falta de rigor e criam a dúvida sobre a própria presunção da repercussão da CSR, na falta, ainda, de elementos que permitam esclarecer os termos da referida relação contratual e tratamento comercial e fiscal da CSR, ou seja, sobre a efetiva repercussão fiscal no âmbito desses operações comerciais relativas ao fornecimento de combustíveis pelo SP à Requerente.
IV – Assim, não se apresenta possível confirmar a factualidade invocada pela Requerente sobre o pagamento indevido da CSR. Os documentos apresentados, quer na forma, quer no conteúdo, não se apresentam suficientes e adequados para comprovar o pagamento efetivo do imposto pela Requerente.
V – A prova da repercussão no consumidor final de impostos indiretos suportados pelo operador económico e do enriquecimento sem causa do mesmo em virtude da sua restituição não pode ser efetuada através de meras presunções.
Os Árbitros Guilherme W. d'Oliveira Martins, José Nunes Barata e Marcolino Pisão Pedreiro, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formar o Tribunal Arbitral Coletivo, decidem o seguinte:
DECISÃO ARBITRAL
-
RELATÓRIO
A A..., S.A., aqui Requerente, titular do Número de Identificação de Pessoa Coletiva..., com sede na Rua ..., n.º ..., ...-... ..., ... (doravante designada como “Requerente”), veio, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do RJAT e no artigo 99.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (doravante, “CPPT”), apresentar PEDIDO DE PRONÚNCIA ARBITRAL com vista à declaração de ilegalidade e consequente anulação da decisão tácita de indeferimento do pedido de revisão oficiosa.
É Requerida a AT.
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral Coletivo (TAC) foi aceite pelo Senhor Presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) e automaticamente notificado à AT no dia 27 de novembro de 2023.
A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.° e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.° do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), o Senhor Presidente do Conselho Deontológico designou como árbitros os signatários desta decisão, tendo sido notificadas as partes em 17 de janeiro de 2024, que não manifestaram vontade de recusar a designação, nos termos do artigo 11.º n.º1 alíneas a) e b) e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
O TAC encontra-se, desde 6 de fevereiro de 2024, regularmente constituído e é materialmente competente à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
Notificada para o efeito, a Requerida, apresentou a sua resposta a 8 de março de 2024.
Por despacho de 24 de abril de 2024, o TAC proferiu o seguinte despacho:
“1. Notifique-se a Requerente para exercer o direito de resposta quanto à matéria das exceções invocadas pela Requerida.
2. Pretende este Tribunal Arbitral, ao abrigo do princípio da autonomia na condução do processo, previsto no artigo 16.º, alínea c) do RJAT, dispensar a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT, por desnecessária, atendendo a que a prova produzida é meramente documental.
3. Por outro lado, notifica-se as partes para, querendo, produzirem alegações, no prazo de 15 dias, em simultâneo, a começar a contar depois de decorrido o prazo para direito de resposta às exceções, podendo depois o processo prosseguir para a prolação da sentença.
4. Informa-se que a Requerente deverá proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente, até a data limite de apresentação das alegações.
5. Em nome do princípio da colaboração das partes solicita-se o envio das peças processuais em versão word.
Notifiquem-se as partes do presente despacho.”
Ambas as partes entregaram alegações.
-
DESCRIÇÃO SUMÁRIA DOS FACTOS
II.1 Posição da Requerente
A Requerente fundamenta o seu pedido nos seguintes termos:
-
Está em causa na presente ação a declaração de ilegalidade e consequente anulação da decisão tácita de indeferimento do pedido de revisão oficiosa das liquidações de IEC cuja anulação se peticionou no pedido de revisão oficiosa apresentado cujo indeferimento tácito constitui o objeto imediato da presente ação arbitral, relativas aos 04/2019, 05/2019, 06/2019, 07/2019, 08/2019, 09/2019, 10/2019, 11/2019, 12/2019, 01/2020, 02/20220, 03/2020, 04/2020, 05/2020, 06/2020, 07/2020, 08/2020, 09/2020, 10/2020, 11/2020, 12/2020, 01/2021, 02/2021, 03/2021, 04/2021, 05/2021, 06/2021, 07/2021, 08/2021, 09/2021, 10/2021, 11/2021, 12/2021, 01/2022, 02/2022, 03/2022, 04/2022, 05/2022, 06/2022, 07/2022, 08/2022, 09/2022, 10/2022, 11/2022, 12/2022, liquidadas e pagas pela “B..., S.A.” (doravante, B...), NIPC ... na parte correspondente à Contribuição de Serviço Rodoviário (“CSR”) que foi paga (através do mecanismo de repercussão) pela aqui Requerente – conforme melhor se detalha no quadro infra:
Ano
|
Data
|
Fornecedor
|
NIF
|
e-DIC
|
Liquidação IEC
|
Produto
|
Totais (Lts)
|
CSR (€)
|
2021
|
31/03/2021
|
B... SA
|
...
|
31/03/2021
|
mar/21
|
Gasóleo
|
21 782,10
|
2 417,81
|
2021
|
15/04/2021
|
B... SA
|
|
15/04/2021
|
abr/21
|
Gasóleo
|
22 447,67
|
2 491,69
|
2021
|
30/04/2021
|
B... SA
|
|
30/04/2021
|
abr/21
|
Gasóleo
|
21 971,16
|
2 438,80
|
2021
|
15/05/2021
|
B... SA
|
|
15/05/2021
|
mai/21
|
Gasóleo
|
25 260,46
|
2 803,91
|
2021
|
31/05/2021
|
B... SA
|
|
31/05/2021
|
mai/21
|
Gasóleo
|
21 629,01
|
2 400,82
|
2021
|
15/06/2021
|
B... SA
|
|
15/06/2021
|
jun/21
|
Gasóleo
|
21 859,51
|
2 426,41
|
2021
|
30/06/2021
|
B... SA
|
|
30/06/2021
|
jun/21
|
Gasóleo
|
22 141,45
|
2 457,70
|
2021
|
15/07/2021
|
B... SA
|
|
15/07/2021
|
jul/21
|
Gasóleo
|
19 908,14
|
2 209,80
|
2021
|
31/07/2021
|
B... SA
|
|
31/07/2021
|
jul/21
|
Gasóleo
|
21 689,52
|
2 407,54
|
2021
|
15/08/2021
|
B... SA
|
|
15/08/2021
|
ago/21
|
Gasóleo
|
27 740,93
|
3 079,24
|
2021
|
31/08/2021
|
B... SA
|
|
31/08/2021
|
ago/21
|
Gasóleo
|
21 344,08
|
2 369,19
|
2021
|
15/09/2021
|
B... SA
|
|
15/09/2021
|
set/21
|
Gasóleo
|
26 127,39
|
2 900,14
|
2021
|
30/09/2021
|
B... SA
|
|
30/09/2021
|
set/21
|
Gasóleo
|
21 801,81
|
2 420,00
|
2021
|
15/10/2021
|
B... SA
|
|
15/10/2021
|
out/21
|
Gasóleo
|
22 092,37
|
2 452,25
|
2021
|
31/10/2021
|
B... SA
|
|
31/10/2021
|
out/21
|
Gasóleo
|
18 653,49
|
2 070,54
|
2021
|
15/11/2021
|
B... SA
|
|
15/11/2021
|
nov/21
|
Gasóleo
|
19 439,53
|
2 157,79
|
2021
|
30/11/2021
|
B... SA
|
|
30/11/2021
|
nov/21
|
Gasóleo
|
19 407,99
|
2 154,29
|
2021
|
15/12/2021
|
B... SA
|
...
|
15/12/2021
|
dez/21
|
Gasóleo
|
22 472,66
|
2 494,47
|
2021
|
31/12/2021
|
B... SA
|
|
31/12/2021
|
dez/21
|
Gasóleo
|
24 331,60
|
2 700,81
|
2022
|
15/01/2022
|
B... SA
|
|
15/01/2022
|
jan/22
|
Gasóleo
|
22 527,85
|
2 500,59
|
2022
|
31/01/2022
|
B... SA
|
|
31/01/2022
|
jan/22
|
Gasóleo
|
26 227,38
|
2 911,24
|
2022
|
15/02/2022
|
B... SA
|
|
15/02/2022
|
fev/22
|
Gasóleo
|
23 240,57
|
2 579,70
|
2022
|
28/02/2022
|
B... SA
|
|
28/02/2022
|
fev/22
|
Gasóleo
|
16 729,12
|
1 856,93
|
2022
|
15/03/2022
|
B... SA
|
|
15/03/2022
|
mar/22
|
Gasóleo
|
21 263,67
|
2 360,27
|
2022
|
31/03/2022
|
B... SA
|
|
31/03/2022
|
mar/22
|
Gasóleo
|
25 710,85
|
2 853,90
|
2022
|
15/04/2022
|
B... SA
|
|
15/04/2022
|
abr/22
|
Gasóleo
|
25 187,39
|
2 795,80
|
2022
|
30/04/2022
|
B... SA
|
|
30/04/2022
|
abr/22
|
Gasóleo
|
21 259,78
|
2 359,84
|
2022
|
15/05/2022
|
B... SA
|
|
15/05/2022
|
mai/22
|
Gasóleo
|
25 009,60
|
2 776,07
|
2022
|
31/05/2022
|
B... SA
|
|
31/05/2022
|
mai/22
|
Gasóleo
|
28 817,71
|
3 198,77
|
2022
|
15/06/2022
|
B... SA
|
|
15/06/2022
|
jun/22
|
Gasóleo
|
24 395,09
|
2 707,85
|
2022
|
30/06/2022
|
B... SA
|
|
30/06/2022
|
jun/22
|
Gasóleo
|
24 753,42
|
2 747,63
|
2022
|
15/07/2022
|
B... SA
|
|
15/07/2022
|
jul/22
|
Gasóleo
|
22 168,83
|
2 460,74
|
2022
|
31/07/2022
|
B... SA
|
|
31/07/2022
|
jul/22
|
Gasóleo
|
19 522,87
|
2 167,04
|
2022
|
15/08/2022
|
B... SA
|
|
15/08/2022
|
ago/22
|
Gasóleo
|
19 021,02
|
2 111,33
|
2022
|
31/08/2022
|
B... SA
|
|
31/08/2022
|
ago/22
|
Gasóleo
|
27 224,70
|
3 021,94
|
2022
|
15/09/2022
|
B... SA
|
|
15/09/2022
|
set/22
|
Gasóleo
|
21 956,12
|
2 437,13
|
2022
|
30/09/2022
|
B... SA
|
|
30/09/2022
|
set/22
|
Gasóleo
|
19 981,87
|
2 217,99
|
2022
|
15/10/2022
|
B... SA
|
|
15/10/2022
|
out/22
|
Gasóleo
|
19 751,08
|
2 192,37
|
2022
|
31/10/2022
|
B... SA
|
|
31/10/2022
|
out/22
|
Gasóleo
|
18 098,41
|
2 008,92
|
2022
|
15/11/2022
|
B... SA
|
|
15/11/2022
|
nov/22
|
Gasóleo
|
17 489,68
|
1 941,35
|
2022
|
30/11/2022
|
B... SA
|
|
30/11/2022
|
nov/22
|
Gasóleo
|
14 783,46
|
1 640,96
|
2022
|
15/12/2022
|
B... SA
|
|
15/12/2022
|
dez/22
|
Gasóleo
|
16 358,55
|
1 815,80
|
2022
|
31/12/2022
|
B... SA
|
|
31/12/2022
|
dez/22
|
Gasóleo
|
23 228,73
|
2 578,39
|
|
|
|
|
|
|
Total
|
2 056 922,18
|
228 318,36
|
-
E das liquidações de IEC relativas aos períodos 01/2023, 02/2023 e 03/2023, liquidadas pela B..., na parcela relativa à receita consignada à Infraestruturas de Portugal, S.A. (designada por “Consignação de serviço rodoviário”) suportada pela aqui Requerente, conforme melhor se detalha no quadro infra:
Ano
|
Data
|
Fornecedor
|
NIF
|
e-DIC
|
Liquidação IEC
|
Produto
|
Totais (Lts)
|
CSR (€)
|
2023
|
15/01/2023
|
B...SA
|
|
15/01/2023
|
jan/23
|
Gasóleo
|
25 814,44
|
2 865,40
|
2023
|
31/01/2023
|
B... SA
|
|
31/01/2023
|
jan/23
|
Gasóleo
|
25 217,64
|
2 799,16
|
2023
|
15/02/2023
|
B... SA
|
|
15/02/2023
|
fev/23
|
Gasóleo
|
29 765,95
|
3 304,02
|
2023
|
28/02/2023
|
B... SA
|
|
28/02/2023
|
fev/23
|
Gasóleo
|
23 220,15
|
2 577,44
|
2023
|
15/03/2023
|
B... SA
|
|
15/03/2023
|
mar/23
|
Gasóleo
|
27 842,14
|
3 090,48
|
|
|
|
|
|
|
Total
|
131 860,32
|
14 636,50
|
-
O presente pedido de pronúncia arbitral tem como objeto imediato a declaração de ilegalidade e subsequente anulação do ato tácito de indeferimento do pedido de revisão oficiosa apresentado pela Requerente – cf. Documento n.º 1.
-
E, como objeto mediato, a declaração de ilegalidade e consequente anulação parcial dos atos tributários de liquidação de IEC acima indicados, cuja legalidade constituiu objeto do pedido de revisão oficiosa.
-
O pedido de revisão oficiosa em causa foi remetido à Divisão do Imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos da Direção de Serviços de Impostos Especiais de Consumo no dia 28 de abril de 2023 (cf. cópia do Registo dos CTT que se junta como Documento n.º 2).
-
Até à data da submissão do presente Pedido de Pronúncia Arbitral, a Requerente não obteve qualquer resposta por parte da AT quanto ao pedido de revisão apresentado.
-
No âmbito da aquisição de gasóleo rodoviário à B..., a Requerente procedeu ao pagamento da CSR e ISP [na parcela da Consignação do serviço rodoviário].
-
De acordo com o artigo 4.º da Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, na redação em vigor até à alteração promovida pela Lei n.º 24-E/2022, de 30 de dezembro, a CSR incide sobre a gasolina e o gasóleo rodoviário sujeitos ao imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos (“ISP”) e dele não isentos.
-
No que diz respeito à liquidação e cobrança, a CSR é devida pelos sujeitos passivos do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos, sendo aplicável à sua liquidação, cobrança e pagamento o disposto no Código dos IEC, na LGT, e no CPPT, com as devidas adaptações.
-
Ora, nos termos dos artigos 1.º e 88.º do Código dos IEC, estão sujeitos ao ISP, os produtos petrolíferos e energéticos.
-
Sobre os produtos petrolíferos – neste caso, a gasolina e o gasóleo rodoviário – incide ISP e, por esse motivo, também incide CSR, em cumprimento com o disposto no n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, na redação em vigor até à alteração promovida pela Lei n.º 24-E/2022, de 30 de dezembro.
-
Neste sentido, a B..., enquanto sociedade cujo objeto social consiste, entre outras atividades, na exploração de postos de abastecimento e comércio por grosso de produtos petrolíferos, introduziu no consumo produtos sujeitos ao ISP e à CSR, sendo, por isso, o sujeito passivo “formal” destes impostos.
-
Questão diversa consiste em apurar quem deverá suportar o respetivo encargo que, ao abrigo do princípio da equivalência previsto pelo artigo 2.º do Código do IEC, deverá ser imputado ao respetivo utilizador (neste caso, consumidor de gasolina e gasóleo rodoviário), cumprindo-se assim o desígnio de que “os impostos especiais de consumo obedecem ao princípio da equivalência, procurando onerar os contribuintes na medida dos custos que estes provocam, designadamente nos domínios do ambiente e da saúde pública, sendo repercutidos nos mesmos, em concretização de uma regra geral de igualdade tributária”.
-
Assim, no que diz respeito à Requerente, a B..., enquanto fornecedora de gasolina e gasóleo rodoviário, liquidou e cobrou ISP e a CSR à Requerente (bem como aos seus demais clientes), conforme as faturas que aqui se juntam como Documento n.º 3 (documentos agregadamente juntos ao pedido de revisão oficiosa como documento n. º1).
-
Enquanto sujeito passivo de imposto, a B... introduziu no consumo estes produtos através da declaração de introdução no consumo eletrónica (“e-DIC”) (n.º 1 do artigo 10.º do Código dos IEC).
-
A e-DIC deve ser processada até ao final do dia útil seguinte àquele em que ocorra a introdução no consumo (n.º 3 do artigo 10.º do Código dos IEC).
-
Em seguida, e em cumprimento com o disposto no artigo 10.ºA do Código dos IEC, “as introduções no consumo efetuadas num determinado mês pelos sujeitos passivos que detenham um dos estatutos previstos no presente Código são globalizadas no mês seguinte, numa única liquidação, processada de forma automática.”.
-
Pelo que, após liquidar e cobrar ISP e CSR junto dos seus clientes, a B... foi notificada da liquidação de imposto (artigo 12.º do Código dos IEC), procedendo ao respetivo pagamento até ao último dia útil do mês.
-
Neste sentido, o ISP e a CSR foram devidamente entregues ao Estado, através do pagamento de impostos decorrente da entrega da e-DIC.
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Assim, entre o dia 01.04.2019 e 31.03.2023, nas e-DIC entregues diariamente pela B... nos períodos acima referidos, constarão as vendas feitas à aqui Requerente, e nas quais a Requerente suportou o montante relativo à CSR que, tal como o ISP, na parcela relativa à Consignação de serviço rodoviário, lhe foram repercutidos pela B... .
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A CSR e o ISP, na parcela relativa à Consignação de serviço rodoviário, pago pela Requerente à B... foram por esta entregues nos cofres do Estado através do pagamento da liquidação mensal de IEC, que é paga até ao final do mês correspondente.
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Estamos, assim, perante atos tributários a que a Requerida tem o devido acesso, considerando que se tratam de DIC eletrónicas submetidas no Portal das Finanças, a partir das quais é gerada a respetiva liquidação de imposto.
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Assim, a Requerente, na sequência destas aquisições, suportou um montante de € 242.954,86 relativo à CSR e ao ISP, na parcela relativa à Consignação de serviço rodoviário, conforme faturas já juntas e comprovativos de pagamento das mesmas (documentos agregadamente juntos como Documento n.º4 (juntos ao pedido de revisão oficiosa como Documento n. º 2)), e declaração emitida pela B... a confirmar a respetiva repercussão, que comprova o facto de ter sido a Requerente a entidade que suportou efetivamente o custo associado à CSR e ISP, para o que aqui releva, na parcela relativa à Consignação de serviço rodoviário conforme declaração junta como Documento n.º 5 (declaração junta ao pedido de revisão oficiosa como como Documento n.º 3).
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Sucede que os atos de liquidação, na parte correspondente à CSR suportada pela Requerente entre os períodos de 01.04.2019 e 31.12.2022 e ao ISP suportado entre 01.01.2023 e 31.03.2023, na parcela relativa à Consignação de serviço rodoviário, resultantes das declarações de introdução no consumo submetidas pela B... e por esta pagas até ao final do mês seguinte, são, pelas razões adiante expostas, ilegais.
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Devendo ser anuladas e a CSR e o ISP, na parcela relativa à Consignação de Serviço Rodoviário, indevidamente suportadas pela Requerente reembolsadas, acrescidos dos respetivos juros indemnizatórios.
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Tudo em consonância com a jurisprudência recentemente emanada pelo CAAD na sequência de reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça da União Europeia (“TJUE”), bem como com o pedido de revisão oficiosa tempestiva e legitimamente apresentado pela Requerente, que se afigurou meio processual adequado a satisfazer a sua pretensão, nos termos do disposto no artigo 78.º, n.º 1, da LGT, conforme de seguida se demonstrará.
II.2. Posição da Requerida
Por seu turno, a Requerida fundamenta a sua posição nos seguintes termos:
I – Por Exceção
Da incompetência do Tribunal em razão da matéria
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Estabelece o artigo 2.º, n.º1 do RJAT que a competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação das seguintes pretensões: declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta e a declaração de ilegalidade de atos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de atos de determinação da matéria coletável e de atos de fixação de valores patrimoniais;
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Da conjugação do mencionado normativo legal com o vertido no artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, resulta que a vinculação da Administração Tributária à jurisdição dos tribunais arbitrais se reporta apenas à apreciação de pretensões relativas a impostos, não abrangendo os tributos que devam ser qualificados como contribuição;
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Para o que ora releva, no caso em apreço está em causa a apreciação da legalidade da CSR e respetivas liquidações, bem como das liquidações de IEC na parcela relativa à receita consignada à Infraestruturas de Portugal S.A. designada por “Consignação de Serviço Rodoviário”.
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Ora, no que há CSR diz respeito, tratando-se de uma contribuição e não de um imposto, tal matéria encontra-se excluída da arbitragem tributária, por ausência de enquadramento legal.
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E a este propósito veja-se o artigo 4º da LGT onde o legislador não só definiu no nº 1 quais os tributos que considera enquadrados na noção de “imposto”, como vem, ainda, atribuir essa qualidade a determinadas contribuições especiais, definindo no nº 3 aquelas que devem também ser consideradas como um imposto.
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Daqui resulta que existem tributos aos quais, não obstante terem outra designação, o legislador veio atribuir a qualidade de imposto.
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Assim, se o legislador pretendesse atribuir, também, essa qualidade à CSR, tê-la-ia, expressamente, enquadrado naquela definição, o que não fez.
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Ou seja, independentemente do nomen iuris ou da natureza jurídica da CSR, a verdade é que não é, por definição, um imposto e, portanto, o CAAD não tem competência para decidir sobre esta matérias.
Da ilegitimidade processual e substantiva da Requerente
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Reitera-se que, nos presentes autos, vem a Requerente pedir que sejam anuladas as liquidações de CSR compreendidas entre abril de 2019 e dezembro de 2022, e de IEC na parcela relativa à receita consignada à Infraestruturas de Portugal S.A. designada por “Consignação de Serviço Rodoviário”, referentes aos períodos de janeiro a março de 2023, relativas a gasóleo rodoviário alegadamente por si adquiridos, determinando-se, o reembolso de todas as quantias suportadas a esse título, acrescidas dos respetivos juros indemnizatórios contados a partir da data de pagamento até à sua integral devolução.
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Alegando ter sido a Requerente a pagar o respetivo valor da CSR e da Consignação de Serviço Rodoviário;
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Ora, desde logo é importante salientar que - ao contrario do que entende a ora Requerente - a “Consignação de Serviço Rodoviário” não corresponde à “Contribuição de Serviço Rodoviário” [art.º 136º do PPA], nem houve um mero exercício legislativo de “redenominação” e de incorporação direta no ISP [art.º 137º do PPA].
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De forma simples e abreviada, abaixo melhor explicada, a Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, que criou a Contribuição de Serviço Rodoviário (CSR) e vigorou até 31/12/2022, embora sujeitasse tal contribuição à disciplina dos IEC em matéria de liquidação, cobrança e pagamento, determinava que esta contribuição tivesse uma natureza autónoma;
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Entretanto, com a entrada em vigor em 01/01/2023, da Lei nº 24-E/2022, de 30 de dezembro, verificou-se a extinção daquela contribuição e a previsão de consignação parcial da receita do ISP ao serviço rodoviário.
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Assim, por via da Lei nº 24-E/2022, passou a vigorar um novo regime, nos termos do qual, o ISP passou a compreender o montante das taxas unitárias do imposto, no qual está integrado o montante consignado ao serviço rodoviário em território continental, e o montante cobrado a título de adicionamento sobre as emissões de CO2, pelo que, ao contrário do entendido no PPA, trata-se de regimes diferentes.
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Feita esta distinção, procede-se à analise do PPA em conjunto para a CSR e para a Consignação de Serviço Rodoviário, ressalvando-se, sempre que se justifique, a diferença entre os dois regimes,
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Assim sendo, é importante, desde já, salientar que, apenas os sujeitos passivos que tenham procedido à introdução no consumo dos produtos em território nacional e provem o pagamento dos respetivos ISP/CSR possuem legitimidade para solicitar o reembolso do valor pago.
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Prevê o CIEC normativos legais que se fundamentam no regime próprio dos impostos especiais de consumo, designadamente, por se tratarem de impostos monofásicos, que incidem apenas na fase da declaração para consumo, o que, regra geral, ocorre uma única vez;
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Diferentes são os impostos plurifásicos, como é o caso do IVA, que incidem em todas as fases do circuito económico, através do crédito do imposto a jusante e do débito a montante.
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À opção do legislador não terá, certamente, sido alheio o facto de a liquidação do imposto, que tem por base as declarações de introdução no consumo apresentadas pelos sujeitos passivos, abranger vendas efetuadas a um vasto conjunto de entidades que são totalmente alheias à relação jurídica tributária (adquirentes dos produtos);
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Assim, no âmbito dos impostos especiais sobre o consumo, encontra-se previsto no CIEC um regime específico, e, conforme referem Sérgio Vasques e Tânia Carvalhais Pereira: “O reembolso por erro corresponde, materialmente, à revisão do ato tributário, com fundamento em erro dos serviços, previsto no artigo 78º da LGT, aqui com um prazo mais curto de 3 anos” (In “Os Impostos Especiais de Consumo”, Editora Almedina, 2016, a págs. 364.).
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Inexistindo, assim, qualquer dúvida, que, no que concerne aos impostos especiais sobre o consumo, o regime previsto no CIEC (artigos 15.º a 20.º) é o aplicável quando se suscite a questão da revisão do ato tributário e consequente reembolso com os fundamentos previstos nas mesmas normas, incluindo o do erro na liquidação.
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O que decorre, expressamente, do n.º 1 do artigo 5.º da Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, que criou a CSR, ao estabelecer que, quanto às matérias de “liquidação, cobrança e pagamento” da CSR, se aplica o CIEC, disciplina regulada no Capítulo II, da Parte Geral, relativo, precisamente, à liquidação, cobrança e pagamento, no qual se inserem as disposições relativas ao reembolso.
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Sendo que, tal como ocorre no âmbito dos IEC, e em outros tipos de impostos, as disposições especiais previstas nos respetivos códigos prevalecem sobre as normas gerais previstas na LGT e no CPPT.
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E nos termos do artigo 15.º do Código do Impostos Especiais sobre o Consumo, que não foi alterado pela Lei nº 24- E/2022, apenas podem solicitar o reembolso do imposto pago, os sujeitos passivos referidos no n.º 1 e na alínea a) do n.º 2 do artigo 4.º que tenham procedido à introdução no consumo dos produtos em território nacional e provem o pagamento do respetivo imposto.
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Dispondo, também o n.º 1, do artigo 78.º, da LGT, que a revisão dos atos tributários pela entidade que os praticou pode ser efetuada por iniciativa do sujeito passivo, no prazo de reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade, ou, por iniciativa da administração tributária.
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O que corrobora o estabelecido no CIEC quanto ao titular do direito de revisão do ato tributário, já que, como decorre do n.º 2 do artigo 15.º, conjugado com o artigo 16.º, daquele código, só podem solicitar a revisão oficiosa os sujeitos passivos e a administração tributária.
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Como tal, no âmbito dos IEC, de acordo com o estatuído nos artigos 15.º e 16.º do CIEC, os múltiplos adquirentes dos produtos não têm legitimidade para efeitos de solicitação da revisão do ato tributário e consequente pedido de reembolso do imposto.
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Estando tal possibilidade restringida, independentemente do tipo de erro ou da situação que motive o reembolso, ao sujeito passivo (aquele que declara para consumo e paga o imposto que deve em nome e por conta próprios) e que poderá, ou não, no momento da venda, ter transferido parte ou a totalidade desse encargo para outros intervenientes na cadeia de comercialização de combustíveis (distribuidores, grossistas, retalhistas, consumidores finais).
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Ora, no caso concreto, não se encontram reunidos os pressupostos para a revisão dos atos tributários, porquanto tal direito não se encontra incluído na esfera jurídica do repercutido económico ou de facto, não podendo a entidade em que alegadamente teria sido repercutido o imposto apresentar pedido de revisão ou de reembolso por erro.
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Ou seja, não sendo a Requerente sujeito passivo nos termos e para o efeito do disposto no artigo 4.º do CIEC, não tem legitimidade nos termos supra nem para apresentar pedido de revisão oficiosa nem, consequentemente, o presente pedido arbitral.
Da falta de interesse em agir por parte da Requerente
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Salvo douto e melhor entendimento, não se concretizando, nem demonstrando nem provando que a Requerente pagou os valores referentes à CSR e/ou ISP-Consignação de Serviço Rodoviário, carece igualmente a Requerente de interesse em agir;
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Não se verificando no caso em concreto a necessidade objetiva de tutelar qualquer direito legalmente protegido da Requerente;
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Não sendo igualmente o meio utilizado pela Requerente o adequado para fazer valer a sua verdadeira pretensão, conforme supra exposto;
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Não havendo, nessa medida e salvo douto e melhor entendimento, no momento de exercício do alegado “direito de ação” da Requerente, qualquer utilidade dos presentes autos, uma vez que, na prática, o deferimento ou indeferimento da pretensão não acarreta qualquer proveito ou prejuízo para a Requerente, porquanto não logrou concretizar, e muito menos provar, os alegados factos referentes ao pagamento do valor da CSR e/ou ISP-Consignação de Serviço Rodoviário, nomeadamente que estas lhe foram repercutidas e, que por sua vez, também as não repercutiu aos seus clientes, por forma a poder sustentar que suportou de forma efetiva o seu encargo.
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Ora, a falta de interesse em agir, que se verifica no caso em apreço, consubstancia uma exceção dilatória inominada nos termos do vertido nos artigos 576.º, nº 1 e n.º2 e 577.º do CPC, aplicável ao presente processo por via do artigo 29.º, n.º1 al. e) do RJAT, a qual prejudica o conhecimento do mérito da causa, devendo, consequentemente, a Requerida ser absolvida da instância.
Incidente de intervenção provocada
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Caso o Tribunal arbitral considere que a ora Requerente goza de legitimidade para a interposição do presente pedido de pronúncia arbitral, o que apenas por mero dever de raciocínio se concede, vem a AT suscitar o incidente de intervenção principal provocada da fornecedora de combustíveis, única que é titular do estatuto fiscal em sede de ISP, identificadas no PPA – a B..., S.A. - nos seguintes termos:
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De acordo com o artigo 57.º do CPTA, “para além da entidade autora do ato impugnado, são obrigatoriamente demandados os contrainteressados a quem o provimento do processo impugnatório possa diretamente prejudicar ou que tenham legítimo interesse na manutenção do ato impugnado e que possam ser identificados em função da relação material em causa ou dos documentos contidos no processo administrativo”.
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E, conforme dispõe o artigo 316.º do CPC, aplicável ex vi do artigo 2.º do CPPT,
“1 - Ocorrendo preterição de litisconsórcio necessário, qualquer das partes pode chamar a juízo o interessado com legitimidade para intervir na causa, seja como seu associado, seja como associado da parte contrária.
(…)
3 - O chamamento pode ainda ser deduzido por iniciativa do réu quando este:
a) Mostre interesse atendível em chamar a intervir outros litisconsortes voluntários, sujeitos passivos da relação material controvertida;
b) Pretenda provocar a intervenção de possíveis contitulares do direito invocado pelo autor.”
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De facto, a matéria relativa à discussão da legalidade de um ato de liquidação desta natureza implica, necessariamente, que sejam chamados à demanda os sujeitos passivos, os únicos que têm legitimidade para pôr em crise o ato ou atos de liquidação, identificando-os.
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Todavia, considerando que a intervenção em processos arbitrais é facultativa para a generalidade de potenciais interessados, apenas existindo vinculação legal para a Autoridade Tributária e Aduaneira, nos termos definidos na Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, emitida ao abrigo do artigo 4.º, n.º 1, do RJAT, não há fundamento legal para impor a intervenção da B... .
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Ora, caso aquela empresa não aceite intervir no processo há que concluir que o presente processo arbitral não se adequa ao seu fim, não podendo o mesmo prosseguir por ser inviável obter uma solução global e justa do litígio.
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Sem prescindir, em alternativa, requer-se, desde já, a notificação da B... para intervir na qualidade de testemunha, com o objetivo de depor sobre a eventual repercussão em causa, identificar o ato tributário, esclarecer se repercutiu sobre a Requerente a CSR e/ou ISP-Consignação de Serviço Rodoviário que já havia liquidado, e, para informar se pediu o reembolso do ISP/CSR.
Da ineptidão do pedido arbitral – da falta de objeto
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Está-se perante uma situação de ineptidão da petição inicial quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir, verificando-se deficiências que comprometem irremediavelmente a sua finalidade;
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O que determina a nulidade de todo o processo e a absolvição do réu da instância – vide artigo 98.º, n.º 1, al. a) do Código de Procedimento e Processo Tributários (CPPT) e artigos 186.º, n.º 1, 576.º, n.ºs 1 e 2, 577.º al. b) e 278.º, n.º 1, al. b) do CPC, subsidiariamente aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, al. c) e e) do RJAT, respetivamente;
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No caso concreto, para além do que se tem vindo a expor, o pedido arbitral não preenche nem satisfaz os pressupostos legais de aceitação uma vez que viola o artigo 10.º, n.º 2, al. b) do RJAT, requisito essencial à aceitação do pedido.
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De acordo com o referido normativo legal, do pedido de constituição do tribunal arbitral deve constar a identificação do ato ou atos tributários objeto do pedido arbitral;
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Sendo a identificação do(s) ato(s) tributário(s) objeto do pedido arbitral condição essencial para a aceitação do pedido de constituição do tribunal arbitral em matéria tributária;
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Uma vez que, sendo aceite o pedido sem a identificação do ato ou atos tributários cuja ilegalidade a Requerente pretende ver sindicada, não pode a Requerida exercer em toda a plenitude o contraditório nem pode o douto tribunal apreciar o pedido;
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Ora, da leitura do pedido arbitral e documentos anexos apresentados pela Requerente resulta que nunca e em momento algum indica qualquer ato tributário;
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Limitando-se, a identificar faturas de aquisição de combustíveis à sua fornecedora, sem, no entanto, identificar os atos tributários.
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Apenas invocando a ilegalidade da CSR e/ou do ISP-Consignação de Serviço Rodoviário, entende a Requerente que terá direito a ser reembolsada pelos valores que alegadamente suportou por via da repercussão.
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Sem, no entanto, identificar quaisquer liquidações de IPS/CSR praticadas pela administração tributária e aduaneira com base nas DIC submetidas pela respetiva fornecedora de combustíveis.
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E sem de quaisquer documentos juntos aos autos pela Requerente constar qualquer elemento da alegada repercussão económica da CSR e/ou do ISP-Consignação de Serviço Rodoviário;
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Cumpre notar, a este propósito, que o artigo 429.º do CPC se refere a documentos, e não à questão de identificação e invocação por parte da Requerente de quaisquer atos ou factos que têm obrigatoriamente de ser invocados na petição inicial/pedido arbitral sob pena de ineptidão da petição inicial/pedido arbitral;
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Pelo exposto, salvo douto e melhor entendimento, o pedido arbitral não preenche nem satisfaz os pressupostos legais de aceitação, uma vez que viola o artigo 10.º, n.º2, al.b) do RJAT, devendo, consequentemente, ser declarado inepto.
Da caducidade do direito de ação
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Sem prejuízo do supra exposto no que concerne aos atos de liquidação, cumpre referir que, apesar de a falta de identificação do ato/atos de liquidação em discussão impedir a aferição da tempestividade do “pedido de revisão oficiosa da liquidação” formulado pela Requerente;
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Certo é que se constata que não pode a Requerente fazer valer-se do prazo de 4 (quatro) anos previsto na segunda parte da norma vertida no artigo 78.º, n.º1 da LGT.
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A contagem do prazo para a apresentação do pedido de revisão oficiosa da liquidação inicia-se a partir do termo do prazo de pagamento do imposto, tendo por referência a data do ato de liquidação (global);
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Constata-se que a Requerente apresenta impugnação no tribunal arbitral em 23-11-2023 do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa alegadamente elaborados ao abrigo do artigo 78.º, n.º 1 da LGT e entregue a 28-04-2023;
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Para a apreciação da tempestividade da apresentação do pedido arbitral não pode deixar de ser previamente apreciada a questão da tempestividade do pedido de revisão oficiosa, o que, como supra se demonstrou, é impossível;
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No entanto, tudo leva a crer que, o pedido de revisão oficiosa e, consequentemente, o pedido arbitral, são intempestivos;
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Porquanto, tomando por referência o alegado pela Requerente – aquisições no período compreendido entre abril de 2019 e março de 2023 –, a 28-04-2023, há muito que se encontrava ultrapassado o prazo da reclamação graciosa de 120 (cento e vinte) dias a contar do termo do prazo do pagamento do ISP/ CSR, previsto no artigo 78.º, n.º1, primeira parte da LGT;
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Razão pela qual a Requerente fundamenta o pedido de revisão oficiosa em erro dos serviços a estes imputável, de modo a fazer valer-se do prazo de 4 (quatro) anos previsto no artigo 78.º n.º 1, segunda parte da LGT.
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No entanto, estando a Requerida vinculada ao princípio da legalidade e tendo efetuado toda e qualquer liquidação em estrita observância dos normativos legais em vigor e aplicáveis à data dos factos, não existe qualquer erro imputável aos serviços;
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Ademais, e sem conceder, no âmbito dos IEC, os pedidos de reembolso apresentados nas alfândegas devem ser apreciados à luz do disposto nos artigos 15.º a 20.º do CIEC, sendo pacífico que o regime específico aí previsto é o aplicável quando se suscite a questão da revisão do ato tributário e consequente reembolso com os fundamentos previstos nas mesmas normas, incluindo o do erro na liquidação;
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Pelo que, a acrescer ao facto de a Requerente não ser um sujeito passivo de ISP/CSR e ao facto de não lograr provar o pagamento dos respetivos valores, à data da apresentação do pedido de revisão oficiosa já teria terminado o prazo de 3 (três) anos para requerer o reembolso, ainda que parcial, do alegado valor pago por alegada repercussão económica de CSR e/ou ISP-Consignação de Serviço Rodoviário;
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Face ao exposto, verifica-se que o vício do pedido arbitral decorrente da falta de identificação do(s) ato(s) tributário(s) em crise tem, entre outros, como efeito a impossibilidade de se aferir em pleno da tempestividade do pedido de revisão oficiosa e de reembolso por alegado pagamento de valores a título de alegada repercussão económica da CSR e/ou ISP-Consignação de Serviço Rodoviário, e, consequentemente, da tempestividade do pedido arbitral;
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Não obstante, e mesmo que apenas parcialmente, na estrita medida do supra exposto constata-se caducidade do (alegado) direito de ação por parte da Requerente, o que consubstancia, salvo douto e melhor entendimento, uma exceção perentória, devendo, nessa medida, a Requerida ser absolvida do pedido;
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No entanto, e ainda que assim não se entenda, sempre consubstanciará uma exceção dilatória por assim ser qualificada especialmente nos termos e para o efeito do disposto nos artigos 89.º n.º1, 2 e 4 al. k) do CPTA, devendo, nessa medida, ser a Requerida absolvida do pedido1 ou da instância.
Da falta de pagamento dos valores a título de CSR e/ou de ISP (consignado ao Serviço Rodoviário) por parte da Requerente
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Alega a Requerente que, no período compreendido entre abril de 2019 e dezembro de 2022, suportou, a título de CSR, a quantia global de €228.318,36; e, no período entre janeiro e março de 2023, suportou a título de Consignação de Serviço Rodoviário a quantia global de €14.636,50. [art.º 128º e 135º do PPA]
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Sucede que, salvo douto e melhor entendimento, não faz a Requerente prova do que alega;
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Porquanto dos alegados factos e da leitura dos documentos juntos com o pedido arbitral aos presentes autos não decorre a consequência legal invocada pela Requerente, i.e., a repercussão económica e respetivo pagamento por parte da Requerente dos valores por si acima indicados.
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Refira-se, a este propósito, que não se sabe nem tem como se saber se a Requerente é proprietária de veículos automóveis, se, a ser proprietária, esses veículos automóveis foram, ou não, efetivamente abastecidos com o gasóleo rodoviário adquiridos pela Requerente no âmbito e para o exercício da sua atividade comercial ou deslocações inerentes a tal exercício, nem se a Requerente adquiriu, ou não, e, a ter adquirido, em que datas, onde e em que quantidades adquiriu o referido combustível e onde/quais as viaturas em que foram introduzidos e, consequentemente, consumidos;
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Consequentemente, é forçoso concluir que não logra a Requerente fazer prova de que efetivamente ocorreu repercussão económica nem de que, nessa sequência, efetuou o pagamento e, consequentemente, suportou o valor por si peticionado,
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O que acarreta a respetiva consequência legal vertida no artigo 74.º, n.º 1 da LGT pois o ónus da prova de factos constitutivos de direito recai sobre quem os invoque;
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Sendo de acrescentar que, de acordo com o disposto no artigo 10.º, n.º 2, al. d) e RJAT, os elementos de prova dos factos indicados e a indicação dos meios de prova a produzir devem constar do pedido de constituição de tribunal arbitral, funcionando plenamente o princípio da preclusão;
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Não sendo admissível, a posteriori, que se confundam as regras do ónus da prova e respetivas consequências legais no que concerne aos factos a dar (ou não) como provados com quaisquer construções de raciocínio que eventualmente equacionem e se baseiem em “presunções” sem qualquer sustento fáctico ou legal, sob pena de subversão inconstitucional do sistema do ónus da prova e de princípios que merecem tutela constitucional, designadamente segurança jurídica;
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Face ao exposto, salvo douto e melhor entendimento, não se verifica que houve efetiva repercussão económica da CSR e/ou ISP- Consignação de Serviço Rodoviário, na Requerente, enquanto consumidora final nem que esta efetuou qualquer pagamento nessa sequência e nessa qualidade.
II – Por Impugnação
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Alega então, a Requerente, que adquiriu gasóleo rodoviário à sua fornecedora, no período compreendido entre abril de 2019 e janeiro de 2023, tendo suportado, a título de CSR, a quantia global de €228.318,36, e a título de ISP- Consignação de Serviço Rodoviário o montante de €14.636,50.
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Antes de mais, importante é atentar que:
- O regime fiscal que vigorou até 31/12/2022, tinha por base a Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, que criou a Contribuição de Serviço Rodoviário (CSR), a qual, de acordo com o disposto no seu artigo 5º, era devida pelos sujeitos passivos do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos, sendo aplicável à sua liquidação, cobrança e pagamento o disposto no Código dos Impostos Especiais de Consumo (CIEC), na Lei Geral Tributária (LGT) e no Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), com as devidas adaptações. E, não obstante a sujeição à disciplina dos IEC [em matéria de liquidação, cobrança e pagamento,] tal contribuição tinha uma natureza autónoma;
- Porém, a Lei nº 24-E/2022, de 30 de dezembro, que entrou em vigor em 01/01/2023, veio introduzir profundas alterações nesta matéria, as quais, fundamentalmente, se traduziram na extinção da CSR e, concomitantemente, na previsão de consignação parcial da receita do ISP ao serviço rodoviário.
- Por via dessa lei, passou a vigorar um novo regime, nos termos do qual, o ISP passou a compreender o montante das taxas unitárias do imposto, no qual está integrado o montante consignado ao serviço rodoviário em território continental, e o montante cobrado a título de adicionamento sobre as emissões de CO2 (artigo 88º nº 5, do CIEC);
- Ou seja, por via dessas alterações, ocorreu a extinção da CSR (enquanto contribuição autónoma que incidia sobre determinados produtos sujeitos a ISP) e, simultaneamente, um aumento da taxa do ISP correspondente ao montante consignado ao serviço rodoviário em território continental.
- Daqui decorre que, a partir de 01-01-2023:
· não há lugar a cobrança de quaisquer quantias a titulo de CSR, uma vez que foi extinta em 31/12/2022;
· as liquidações efetuadas ao abrigo do novo regime fiscal, decorrente da Lei n.º 24-E/2022 (tendo por base o montante das taxas unitárias do imposto, no qual está integrado o montante consignado ao serviço rodoviário em território continental, e o montante cobrado a título de adicionamento sobre as emissões de CO2 (artigo 88º n.º 5, do CIEC), não enfermam de ilegalidade “nos mesmos termos em que a CSR vigente até 31 de Dezembro de 2022”, como alegado, nem violam o artigo 1º, n.º 2 da Diretiva 2008/118/CE do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, uma vez que o seu regime jurídico é distinto, não sendo a Consignação de Serviço Rodoviário autónoma como se passava com a CSR.
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Assim, feita esta distinção, para além da já invocada falta de legitimidade da Requerente, uma vez que não é sujeito passivo de imposto nos termos dos artigos 15º nº 2 e 16º do CIEC, iremos analisar as questões levantadas no PPA, impugnando quer a alegada repercussão de CSR como a alegada repercussão da parte do ISP (Consignação ao Serviço Rodoviário) que a Requerente impugna.
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Salvo douto e melhor entendimento, não logra a Requerente fazer prova do que alega, designadamente sobre o facto de ter adquirido e pago combustível e, consequentemente, ter suportado o encargo do pagamento da CSR e/ou do ISP-Consignação de Serviço Rodoviário, por repercussão;
-
Pelo que não se aceita e se impugna, nessa medida, o vertido nos artigos 16º, 23º, 24º, 27º, 28º, 29º, 30º, 32º, 33º, 34º, 73º, 77º, 78º, 88º, 126º, 127º, 128º, 129º e 135º do pedido arbitral, colocando-se em causa e não se podendo dar como provada a alegada repercussão da CSR e/ou do ISP-Consignação de Serviço Rodoviário, devendo funcionar plenamente as regras do ónus da prova, não se dando como provados os alegados factos invocados no pedido arbitral, sendo que, nos termos do artigo 74.º da LGT, o ónus da prova de factos constitutivos de direito recai sobre quem os invoque.
-
Pelo que não se aceita e se impugna, nessa medida, o vertido nos artigos do pedido arbitral relativos ao pagamento da CSR e/ou ISP-Consignação de Serviço Rodoviário, colocando-se em causa e não se podendo dar como provado que a Requerente tenha pago ainda que parcialmente os valores por si indicados, alegadamente repercutidos na aquisição das quantidades de combustível em apreço e a correspondência dos documentos juntos com o pedido arbitral com a realidade dos factos.
-
Do teor do Doc. 3, junto com o pedido arbitral - faturas de aquisição de combustíveis – apenas constam valores referentes ao IVA, não contendo aquelas quaisquer referências a montantes pagos a título de ISP ou CSR, sendo absolutamente omissas nesse aspeto, o que se comprova com o sistema e-fatura, e sistema SAFT-T, que apenas indicam o IVA associado a cada venda de combustível efetuado, não existindo qualquer tipo de informação relevante para a identificação das DIC e respetivas liquidações de ISP/CSR a montante.
-
Não tendo sido, também, apresentados, além disso, quaisquer comprovativos de pagamento ao Estado do ISP/CSR, consubstanciados pela apresentação dos respetivos Documentos Únicos de Cobrança (DUC) e das Declarações Aduaneiras de Importação/Documentos Administrativos Únicos (DAI/DAU) com averbamento do número do movimento de caixa.
-
Acresce que existem faturas que contêm uma parcela com a designação "descontos", das quais constam valores sem descritivo da respetiva natureza e conteúdo, o que contribui para a falta de rigor e, por si só, suscita dúvidas quanto a própria presunção da repercussão da CSR e/ou ISP-Consignação de Serviço Rodoviário.
-
Já do teor do documento junto sob o nº 5 – declaração emitida pela B... - em que esta se limita a afirmar, na qualidade de fornecedora da Requerente e alegado sujeito passivo de ISP/CSR, “que a Contribuição de Serviço Rodoviário por si entregue, na qualidade de sujeito passivo, junto dos cofres do Estado, por referência ao combustível rodoviário fornecido à empresa (…), foi por si integralmente repercutida na esfera da referida empresa” também não faz prova da repercussão aí alegada, pelo que igualmente se impugna o seu teor.
-
Pois, para além de se referir apenas à Contribuição de Serviço Rodoviário e não ao ISP-Consignação de Serviço Rodoviário, não identifica quaisquer DICs ou atos de liquidação, nem os montantes alegadamente repercutidos, respetivas datas, quantidades de combustível tributadas, entre outros, com os quais se possa correlacionar a quantidade de combustível que veio a ser adquirido pela Requerente ao fornecedor, que revestiu a posição de sujeito passivo de ISP/CSR.
-
Trata-se apenas de uma declaração genérica, que está longe de conter os elementos concretos indispensáveis à exata e concreta comprovação, quer dos montantes de IPS/CSR alegadamente repercutidos à Requerente no período em causa, quer de que a Requerente suportou de facto a CSR e em que medida.
-
SANEAMENTO
O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (vide artigos 4.º e 10.º, n.º 2, ambos do RJAT, e artigos 1.º a 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º e 6.º, n.º 2, alínea a), do RJAT.
O processo não enferma de nulidades.
-
Fundamentação
IV.1. Matéria de facto
Factos dados como provados
Considera-se como provada a seguinte matéria de facto:
-
Está em causa na presente ação a declaração de ilegalidade e consequente anulação da decisão tácita de indeferimento do pedido de revisão oficiosa das liquidações de IEC cuja anulação se peticionou no pedido de revisão oficiosa apresentado cujo indeferimento tácito constitui o objeto imediato da presente ação arbitral, relativas aos 04/2019, 05/2019, 06/2019, 07/2019, 08/2019, 09/2019, 10/2019, 11/2019, 12/2019, 01/2020, 02/20220, 03/2020, 04/2020, 05/2020, 06/2020, 07/2020, 08/2020, 09/2020, 10/2020, 11/2020, 12/2020, 01/2021, 02/2021, 03/2021, 04/2021, 05/2021, 06/2021, 07/2021, 08/2021, 09/2021, 10/2021, 11/2021, 12/2021, 01/2022, 02/2022, 03/2022, 04/2022, 05/2022, 06/2022, 07/2022, 08/2022, 09/2022, 10/2022, 11/2022, 12/2022, liquidadas e pagas pela “B..., S.A.” (doravante, B...), NIPC ... na parte correspondente à Contribuição de Serviço Rodoviário (“CSR”) que foi paga (através do mecanismo de repercussão) pela aqui Requerente – conforme melhor se detalha no quadro infra:
Ano
|
Data
|
Fornecedor
|
NIF
|
e-DIC
|
Liquidação IEC
|
Produto
|
Totais (Lts)
|
CSR (€)
|
2021
|
31/03/2021
|
B... SA
|
...
|
31/03/2021
|
mar/21
|
Gasóleo
|
21 782,10
|
2 417,81
|
2021
|
15/04/2021
|
B... SA
|
|
15/04/2021
|
abr/21
|
Gasóleo
|
22 447,67
|
2 491,69
|
2021
|
30/04/2021
|
B... SA
|
|
30/04/2021
|
abr/21
|
Gasóleo
|
21 971,16
|
2 438,80
|
2021
|
15/05/2021
|
B... SA
|
|
15/05/2021
|
mai/21
|
Gasóleo
|
25 260,46
|
2 803,91
|
2021
|
31/05/2021
|
B... SA
|
|
31/05/2021
|
mai/21
|
Gasóleo
|
21 629,01
|
2 400,82
|
2021
|
15/06/2021
|
B... SA
|
|
15/06/2021
|
jun/21
|
Gasóleo
|
21 859,51
|
2 426,41
|
2021
|
30/06/2021
|
B... SA
|
|
30/06/2021
|
jun/21
|
Gasóleo
|
22 141,45
|
2 457,70
|
2021
|
15/07/2021
|
B... SA
|
|
15/07/2021
|
jul/21
|
Gasóleo
|
19 908,14
|
2 209,80
|
2021
|
31/07/2021
|
B... SA
|
|
31/07/2021
|
jul/21
|
Gasóleo
|
21 689,52
|
2 407,54
|
2021
|
15/08/2021
|
B... SA
|
|
15/08/2021
|
ago/21
|
Gasóleo
|
27 740,93
|
3 079,24
|
2021
|
31/08/2021
|
B... SA
|
|
31/08/2021
|
ago/21
|
Gasóleo
|
21 344,08
|
2 369,19
|
2021
|
15/09/2021
|
B... SA
|
|
15/09/2021
|
set/21
|
Gasóleo
|
26 127,39
|
2 900,14
|
2021
|
30/09/2021
|
B... SA
|
|
30/09/2021
|
set/21
|
Gasóleo
|
21 801,81
|
2 420,00
|
2021
|
15/10/2021
|
B... SA
|
|
15/10/2021
|
out/21
|
Gasóleo
|
22 092,37
|
2 452,25
|
2021
|
31/10/2021
|
B... SA
|
|
31/10/2021
|
out/21
|
Gasóleo
|
18 653,49
|
2 070,54
|
2021
|
15/11/2021
|
B... SA
|
|
15/11/2021
|
nov/21
|
Gasóleo
|
19 439,53
|
2 157,79
|
2021
|
30/11/2021
|
B... SA
|
|
30/11/2021
|
nov/21
|
Gasóleo
|
19 407,99
|
2 154,29
|
2021
|
15/12/2021
|
B... SA
|
|
15/12/2021
|
dez/21
|
Gasóleo
|
22 472,66
|
2 494,47
|
2021
|
31/12/2021
|
B... SA
|
|
31/12/2021
|
dez/21
|
Gasóleo
|
24 331,60
|
2 700,81
|
2022
|
15/01/2022
|
B... SA
|
|
15/01/2022
|
jan/22
|
Gasóleo
|
22 527,85
|
2 500,59
|
2022
|
31/01/2022
|
B... SA
|
|
31/01/2022
|
jan/22
|
Gasóleo
|
26 227,38
|
2 911,24
|
2022
|
15/02/2022
|
B... SA
|
|
15/02/2022
|
fev/22
|
Gasóleo
|
23 240,57
|
2 579,70
|
2022
|
28/02/2022
|
B... SA
|
|
28/02/2022
|
fev/22
|
Gasóleo
|
16 729,12
|
1 856,93
|
2022
|
15/03/2022
|
B... SA
|
|
15/03/2022
|
mar/22
|
Gasóleo
|
21 263,67
|
2 360,27
|
2022
|
31/03/2022
|
B... SA
|
|
31/03/2022
|
mar/22
|
Gasóleo
|
25 710,85
|
2 853,90
|
2022
|
15/04/2022
|
B... SA
|
|
15/04/2022
|
abr/22
|
Gasóleo
|
25 187,39
|
2 795,80
|
2022
|
30/04/2022
|
B... SA
|
|
30/04/2022
|
abr/22
|
Gasóleo
|
21 259,78
|
2 359,84
|
2022
|
15/05/2022
|
B... SA
|
|
15/05/2022
|
mai/22
|
Gasóleo
|
25 009,60
|
2 776,07
|
2022
|
31/05/2022
|
B... SA
|
|
31/05/2022
|
mai/22
|
Gasóleo
|
28 817,71
|
3 198,77
|
2022
|
15/06/2022
|
B... SA
|
|
15/06/2022
|
jun/22
|
Gasóleo
|
24 395,09
|
2 707,85
|
2022
|
30/06/2022
|
B... SA
|
|
30/06/2022
|
jun/22
|
Gasóleo
|
24 753,42
|
2 747,63
|
2022
|
15/07/2022
|
B... SA
|
|
15/07/2022
|
jul/22
|
Gasóleo
|
22 168,83
|
2 460,74
|
2022
|
31/07/2022
|
B... SA
|
|
31/07/2022
|
jul/22
|
Gasóleo
|
19 522,87
|
2 167,04
|
2022
|
15/08/2022
|
B... SA
|
|
15/08/2022
|
ago/22
|
Gasóleo
|
19 021,02
|
2 111,33
|
2022
|
31/08/2022
|
B... SA
|
|
31/08/2022
|
ago/22
|
Gasóleo
|
27 224,70
|
3 021,94
|
2022
|
15/09/2022
|
B... SA
|
|
15/09/2022
|
set/22
|
Gasóleo
|
21 956,12
|
2 437,13
|
2022
|
30/09/2022
|
B... SA
|
|
30/09/2022
|
set/22
|
Gasóleo
|
19 981,87
|
2 217,99
|
2022
|
15/10/2022
|
B... SA
|
|
15/10/2022
|
out/22
|
Gasóleo
|
19 751,08
|
2 192,37
|
2022
|
31/10/2022
|
B... SA
|
|
31/10/2022
|
out/22
|
Gasóleo
|
18 098,41
|
2 008,92
|
2022
|
15/11/2022
|
B... SA
|
|
15/11/2022
|
nov/22
|
Gasóleo
|
17 489,68
|
1 941,35
|
2022
|
30/11/2022
|
B... SA
|
|
30/11/2022
|
nov/22
|
Gasóleo
|
14 783,46
|
1 640,96
|
2022
|
15/12/2022
|
B... SA
|
|
15/12/2022
|
dez/22
|
Gasóleo
|
16 358,55
|
1 815,80
|
2022
|
31/12/2022
|
B... SA
|
|
31/12/2022
|
dez/22
|
Gasóleo
|
23 228,73
|
2 578,39
|
|
|
|
|
|
|
Total
|
2 056 922,18
|
228 318,36
|
-
E das liquidações de IEC relativas aos períodos 01/2023, 02/2023 e 03/2023, liquidadas pela B..., na parcela relativa à receita consignada à Infraestruturas de Portugal, S.A. (designada por “Consignação de serviço rodoviário”) suportada pela aqui Requerente, conforme melhor se detalha no quadro infra:
Ano
|
Data
|
Fornecedor
|
NIF
|
e-DIC
|
Liquidação IEC
|
Produto
|
Totais (Lts)
|
CSR (€)
|
2023
|
15/01/2023
|
B... SA
|
|
15/01/2023
|
jan/23
|
Gasóleo
|
25 814,44
|
2 865,40
|
2023
|
31/01/2023
|
B... SA
|
|
31/01/2023
|
jan/23
|
Gasóleo
|
25 217,64
|
2 799,16
|
2023
|
15/02/2023
|
B... SA
|
|
15/02/2023
|
fev/23
|
Gasóleo
|
29 765,95
|
3 304,02
|
2023
|
28/02/2023
|
B... SA
|
|
28/02/2023
|
fev/23
|
Gasóleo
|
23 220,15
|
2 577,44
|
2023
|
15/03/2023
|
B... SA
|
|
15/03/2023
|
mar/23
|
Gasóleo
|
27 842,14
|
3 090,48
|
|
|
|
|
|
|
Total
|
131 860,32
|
14 636,50
|
-
O presente pedido de pronúncia arbitral tem como objeto imediato a declaração de ilegalidade e subsequente anulação do ato tácito de indeferimento do pedido de revisão oficiosa apresentado pela Requerente – cf. Documento n.º 1.
-
E, como objeto mediato, a declaração de ilegalidade e consequente anulação parcial dos atos tributários de liquidação de IEC acima indicados, cuja legalidade constituiu objeto do pedido de revisão oficiosa.
-
O pedido de revisão oficiosa em causa foi remetido à Divisão do Imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos da Direção de Serviços de Impostos Especiais de Consumo no dia 28 de abril de 2023 (cf. cópia do Registo dos CTT que se junta como Documento n.º 2).
-
Até à data da submissão do presente Pedido de Pronúncia Arbitral, a Requerente não obteve qualquer resposta por parte da AT quanto ao pedido de revisão apresentado.
-
No âmbito da aquisição de gasóleo rodoviário à B..., a Requerente procedeu ao pagamento da CSR e ISP [na parcela da Consignação do serviço rodoviário].
Factos dados como não provados
Não existem quaisquer factos não provados relevantes para a decisão da causa.
O Tribunal formou a sua convicção quanto à factualidade provada com base nos documentos juntos à petição e no processo administrativo junto pela Autoridade Tributária, e em factos não questionados pelas partes.
Fundamentação da matéria de facto provada e não provada
A matéria de facto foi fixada por este TAC e a convicção ficou formada com base nas peças processuais e requerimentos apresentados pelas Partes, bem como nos documentos juntos aos autos.
Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem o dever de se pronunciar sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de selecionar a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor, cfr. n.º 1 do artigo 596.º e n.ºs 2 a 4 do artigo 607.º, ambos do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi das alíneas a) e e) do n.º do artigo 29.º do RJAT e consignar se a considera provada ou não provada, cfr. n.º 2 do artigo 123.º Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do n.º 7 do artigo 110.º do CPPT, a prova documental e o PA juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, tendo em conta que, como se escreveu no Acórdão do TCA-Sul de 26-06-2014, proferido no processo n.º 07148/13[1], “o valor probatório do relatório da inspeção tributária (...) poderá ter força probatória se as asserções que do mesmo constem não forem impugnadas”.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a decisão, em relação às provas produzidas, na íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a experiência de vida e conhecimento das pessoas, conforme n.º 5 do artigo 607.º do CPC.
Somente quando a força probatória de certos meios se encontrar pré-estabelecida na lei (e.g., força probatória plena dos documentos autênticos, conforme artigo 371.º do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.
IV. 2. Matéria de Direito
A Requerente manifestou a sua discordância com os atos tributários inerentes à liquidação de CSR, inicialmente perante a Requerida e, face ao indeferimento tácito, apresentou pedido de pronúncia arbitral perante a CAAD, como exposto supra.
A Requerida na resposta veio alegar as diversas exceções supracitadas, as quais serão apreciadas no ponto seguinte.
IV.2.A. EXCEÇÕES
-
Da incompetência do Tribunal em razão da matéria
O TJUE no despacho proferido no processo C‑460/21, a 7 de fevereiro de 2022, afirma-se que a CSR foi criada com uma finalidade puramente orçamental de obtenção de receita (imposto), não lhe estando subjacente qualquer “motivo específico” de política ambiental, energética ou social, dando-se por reproduzidos os demais argumentos.
As taxas da CSR possuem valor fixo, estabelecido na própria Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, incidindo sobre os litros do produto transacionado/introduzido no consumo e não sobre o valor da transação, reforçando a sua natureza de imposto específico, uma vez que possui um valor fixo, independente do nível de preço.
Quando ao demais afirmado pela Requerida sobre a incompetência do Tribunal, observa-se que na interpretação das peças processuais devem observar-se o princípio constitucional da tutela jurisdicional efetiva, pelo que o Tribunal deve extrair da redação dada ao pedido na petição inicial o sentido mais favorável aos interesses do peticionante.
Observa anterior decisão e respetiva fundamentação, concluindo, em síntese, que “não procede a alegada exceção de incompetência material do Tribunal Arbitral em virtude da natureza do tributo, uma vez que a competência dos tribunais arbitrais abrange a apreciação das pretensões dos sujeitos passivos referentes a qualquer espécie de tributo, nos termos do art.º 2.º do RJAT; e também não se verifica a falta de vinculação prévia da Autoridade Tributária à jurisdição dos tribunais arbitrais no presente processo, por força do art.º 2º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, que limita essa vinculação prévia às “pretensões relativas a impostos” (…) Nos termos do corpo do art.º 99.º do CPPT, “constitui fundamento de impugnação qualquer ilegalidade”, entendendo-se que aqui se inclui a ilegalidade abstrata da liquidação (CAAD, decisão arbitral de 31.01.2018, proc. nº 104/2017-T).” – Cf. Proc. 304/2022T.
Acresce, estarmos perante uma questão jurídica que integra a competência do Tribunal arbitral, relacionada com a apreciação de atos tributários e respetiva legalidade da liquidação da CSR, criada pela Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, por ser um tributo desconforme ao Direito da União Europeia, nomeadamente, ao n.º 2 do artigo 1.º da Diretiva n.º 2008/118/CE, de 16/12/2008, tendo por base o entendimento sufragado pelo despacho proferido pelo TJUE em 07/02/2022, no Proc. C-460/21.
Termos em que se conclui pela regular constituição e competência material do Tribunal arbitral – Cf. al. a) n.º 1, art.º 2.º e art.º 4.º, ambos do RJAT.
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Da ilegitimidade processual e substantiva da Requerente, da falta de interesse em agir por parte da Requerente e da falta de pagamento dos valores a título de CSR por parte da Requerente
Quando é cobrado imposto em violação do direito da União Europeia, tem sido entendido que subiste a obrigação de restituí-lo ao sujeito passivo (SP), nos termos da lei e da jurisprudência da EU e nacional, salvaguardadas situações de enriquecimento sem causa.
O pedido em apreciação consiste em saber se nos termos desses ordenamentos jurídicos, os restantes intervenientes nas operações comerciais e, em regra, os contribuintes consumidores finais a quem o imposto possa ter sido repercutido e que o possam ter suportado economicamente têm o direito de exigir diretamente da Requerida/Estado a apreciação das respetivas liquidações e o reembolso do imposto indevidamente pago, caso seja provado ter sido acrescido ao preço de compra do bem/produto por eles adquirido.
As empresas petrolíferas, em regra, repercutem o ISP e, no caso a CSR, nos operadores a jusante. Enquanto impostos aplicados ao consumo, estes caracterizam-se pelo facto de o seu encargo financeiro poder ser repercutido -repercussão fiscal - nos intervenientes na atividade comercial, maxime, no consumidor final.
A legitimidade deve ser enquadrada no âmbito das relações jurídicas tributárias que se estabelecem entre a administração tributária e as pessoas singulares ou coletivas e entidades equiparadas - têm legitimidade no procedimento os sujeitos passivos da relação tributária e quaisquer pessoas que provem um interesse legalmente protegido. - Cf. n.º 2 do art. 1.º e art.º 65.º da LGT.
Nos termos da alínea a) do n.º 4 do art.º 18.º da LGT assiste o “direito de reclamação, recurso, impugnação ou de pedido de pronúncia arbitral nos termos das leis tributárias” a quem “suporte o encargo do imposto por repercussão legal”.
Nesse sentido, o CPPT contém uma norma específica sobre a legitimidade no processo judicial tributário, atribuindo-a aos “contribuintes, incluindo substitutos e responsáveis, outros obrigados tributários, as partes dos contratos fiscais e quaisquer outras pessoas que provem interesse legalmente protegido” – Cf. art. 9.º do CPPT.
No caso da CSR alegadamente paga pela Requerente, enquanto consumidor final, existe a demonstração de um interesse legalmente protegido e que merece a tutela do direito, porquanto é no contribuinte consumidor final que, em regra, recai o pagamento dos tributos indiretos.
Por fim, atenta a jurisprudência da UE, o “Tribunal de Justiça referiu expressamente a possibilidade de o comprador final poder exigir, diretamente às autoridades nacionais, a restituição do montante do imposto indevido cujo encargo suportou” – Cf. Acórdão Comateb e O (-192/95 a C-218/95, Colect., p. I-165, n.º 20) de 14 de Janeiro de 1997.”
A plena eficácia do direito de reparação e a proteção efetiva dos contribuintes poderia ficar manifestamente prejudicada perante uma interpretação restrita no sentido de apenas os SP (no caso de CSR) gozarem do direto de ação e de pedirem o reembolso ao Estado – artigos 4.º a 12.º e 15.º a 20.º do CIEC, limitando-se formalmente a outros sujeitos da relação tributária a efetiva reparação dos prejuízos incorridos - os contribuintes que possam ter suportado efetivamente o imposto e ser objetivamente lesados pelos respetivos atos de liquidação.
Nesse sentido, afirma-se: “Por conseguinte, no caso em que um Estado-Membro tenha cobrado um imposto especial sobre o consumo em violação do direito da União e o sujeito passivo tiver repercutido este sobre o seu cliente, um direito a indemnização deste cliente contra o Estado não pode ser recusado com o fundamento de que é de excluir de antemão um nexo de causalidade direto entre a cobrança do imposto e o dano do cliente.” – Cf. Proc. C-94/10, conclusões referidas.
Termos em que a Requerente, na qualidade de consumidor final dos produtos sujeitos a ISP e, subsequentemente a CSR, a quem este imposto possa ter sido repercutido, é titular de um interesse legalmente protegido e, ipso facto, de legitimidade processual, enquanto forma de acesso à justiça e de proteção dos direitos e reparação dos prejuízos que suportou com o pagamento da CSR considerada em desconformidade com o direito da União.
Por sua vez, o invocado pela Requerida direito de acesso à justiça, em matéria tributária, através da jurisdição civil contra o SP, o qual se limitou a cumprir a lei vigente e que, em princípio, não obteve qualquer ganho, mas antes um prejuízo, afigura-se que tal possibilidade seria muito difícil ou inexistente, na medida em que não ocorre nenhuma das situações previstas no artigo 476º do Código Civil. Observa-se que a repetição do indevido dependeria, ainda, do enriquecimento sem causa do SP, o qual, em regra, não ocorreu por ter entregado ao Estado um imposto que repercutiu no consumidor final.
Por fim, atento o princípio da efetividade deve ser reconhecido ao consumidor final, em regra, o repercutido de impostos indiretos, o direito de reclamar diretamente junto da administração tributária os montantes de imposto indevidamente liquidados e alegadamente pagos - (Cf. Acórdão do TJUE de 20 de outubro de 2011, Proc. C-94/10).
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Incidente de intervenção provocada
Entende-se que a intervenção de terceiros no processo tributário, não constitui um caso omisso, a preencher diretamente pelas normas do Código de Processo Civil. – Cf. Proc. n.º 5/2012-T.
Na presente ação entende-se não haver lugar a litisconsórcio, porquanto os interesses de ressarcimento do imposto pago por declaração de ilegalidade dos atos de liquidação, no caso concreto, em abstrato, o interesse do contribuinte consumidor final exclui o interesse do SP em relação aos factos tributários em apreciação e eventual reembolso, sendo reconhecido o imposto indevidamente pago e o reembolso devido ao contribuinte consumidor fiscal, desde logo, excluía, a mesma pretensão e decisão em relação ao SP.
Observa-se ainda que “Atenta a natureza subjetiva do contencioso tributário em geral e a estrutura do processo de impugnação judicial … se não encontra espaço para a defesa de contra interesses particulares na manutenção do ato impugnado…” Processo 0624/10, Acórdão de 17-11-2010.
Por sua vez, no âmbito da jurisdição arbitral vigora, plenamente, o princípio da livre condução do processo pelos árbitros, não sendo, portanto, de aplicação automática qualquer norma de natureza processual que não resultem daquela respetiva lei, sem prejuízo dos conteúdos normativos diretamente transponíveis para o processo arbitral, mas tal transposição é sempre, e em qualquer caso, mediada pelo prudente critério dos árbitros, sempre “com vista à obtenção, em prazo razoável, de uma pronúncia de mérito sobre as pretensões formuladas.” – Cf. artigo 16.º do RJAT.
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Da ineptidão do pedido arbitral – da falta de objeto
A Requerida defende a que o pedido de pronúncia arbitral é inepto por a Requerente não identificar os atos que são objeto do pedido arbitral, como exige a alínea b) o n.º 2 do artigo 10.º do RJAT.
Diz, em suma, “que através das faturas apresentadas pela ora Requerente não é possível determinar a ligação entre as mesmas e qualquer liquidação ou liquidações concretas. Há uma absoluta falta de correspondência entre as quantidades de combustíveis declaradas para introdução no consumo pelo sujeito passivo de imposto (ISP/CSR) e as correspondentes liquidações, referentes ao período das faturas de aquisição à C.... S.A. indicadas pela Requerente, que não permitem à AT identificar, os atos de liquidação em crise”.
O artigo 98.º, n.º 1, alínea a), do CPPT, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, indica como uma das nulidades insanáveis em processo judicial tributário, a ineptidão da petição inicial.
Não indicando o CPPT as situações em que se deve entender que ocorre ineptidão da petição inicial, há que fazer apelo ao CPC, que é de aplicação subsidiária, nos termos do artigo 2.º, alínea e), daquele Código, e também o é no âmbito do processo arbitral tributário, por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.
No artigo 186.º, n.º 1, do CPC, indicam-se as seguintes situações de ineptidão da petição inicial:
a) Quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir;
b) Quando o pedido esteja em contradição com a causa de pedir;
c) Quando se cumulem causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis.
O n.º 3 do mesmo artigo estabelece que «se o réu contestar, apesar de arguir a ineptidão com fundamento na alínea a) do número anterior, a arguição não é julgada procedente quando, ouvido o autor, se verificar que o réu interpretou convenientemente a petição inicial».
No caso em apreço é manifesto que a ineptidão arguida pela AT não se enquadra nas referidas alíneas b) e c), pelo que só se pode aventar o seu enquadramento na alínea a).
No que concerne à alínea a), não se estando perante uma situação de falta do pedido ou de causa de pedir, apenas se poderá enquadrar a arguição no conceito de inteligibilidade.
No entanto, percebe-se o que pretende a Requerente com os pedidos que formula: “a declaração de ilegalidade dos atos de repercussão da CSR consubstanciados nas faturas referentes ao gasóleo rodoviário adquirido pela Requerente no decurso do período compreendido entre novembro de 2018 e outubro de 2022, e, bem assim, das correspondentes liquidações de CSR praticadas pela Administração Tributária e Aduaneira com base nas DIC submetidas pela fornecedora de combustíveis, determinando-se, nessa medida, a sua anulação, com as demais consequências legais, designadamente, com o reembolso à Requerente de todas as quantias suportadas a esse título, acrescidas dos respetivos juros indemnizatórios contados nos termos acima referidos”.
Como resulta da matéria de facto fixada, a mencionada fornecedora de combustíveis repercutiu nas respetivas faturas a CSR correspondente a cada um desses consumos, tendo a Requerente, por conseguinte, suportado integralmente este imposto (Docs. 1 e 2) e com a aquisição do referido combustível, a Requerente suportou, assim, a título de CSR, a quantia global de € 102.256,48 (Docs. 1 e 2).
A eventual dificuldade que a AT possa ter para identificar as liquidações que ela própria emitiu aos fornecedores de combustíveis relacionadas com as faturas em causa, é um problema de organização dos seus serviços, pelo que é ela própria quem deve suportar os seus hipotéticos inconvenientes
Como se referiu na fundamentação da decisão da matéria de facto, a liquidação da CSR era efetuada com base nas DIC, que deviam ser processadas até ao final do dia útil seguinte àquele em que ocorra a introdução no consumo (artigo 10.º, n.ºs 1 e 3, do CIEC), pelo que se afigura que era possível à AT apurar qual a DIC relacionada com cada fatura e a respetiva liquidação que emitiu.
Neste contexto, não era exigível à Requerente que identificasse as liquidações que a AT emitiu com base nas vendas de combustíveis em causa, nem essa identificação é necessária para apurar a legalidade da cobrança de CSR ínsita nas faturas em causa.
A exigência de identificação das liquidações, numa situação deste tipo, em que o repercutido não tem possibilidade de as identificar e a identificação não é imprescindível para apurar a legalidade da cobrança de CSR ínsita nas faturas, seria incompaginável com o princípio constitucional da proporcionalidade e o direito à tutela judicial efetiva garantido pelos artigos 20.º e 268.º, n.º 4, da CRP, pois inviabilizaria a possibilidade prática de a Requerente impugnar contenciosamente atos que lhe aplicam tributação e lesam a sua esfera jurídica.
Pelo exposto, improcede a exceção da ineptidão do pedido de pronúncia arbitral.
-
Da caducidade do direito de ação
Por último, invoca a Requerida a exceção de caducidade do direito de ação, para tanto sustentando que o pedido de revisão oficiosa apresentado e cuja declaração de ilegalidade da decisão foi peticionada é intempestivo.
Isto porque, segundo defende, o pedido de revisão oficiosa por iniciativa do sujeito passivo apenas pode ser apresentado dentro do prazo de 120 dias contado do termo do prazo do pagamento voluntário do tributo.
Refere, assim, que “porquanto, tomando por referência o alegado pela Requerente – aquisições no “período compreendido entre 31/03/2019 e 31/12/2022” (sic) –, a 31-03-2023 há muito que se encontrava ultrapassado o prazo da reclamação graciosa de 120 (cento e vinte) dias a contar do termo do prazo do pagamento do ISP/ CSR, previsto no artigo 78.º, n.º1, primeira parte da LGT”.
O prazo de 4 anos previsto no artigo 78º nº 1 2ª parte da LGT, prossegue a Requerida, só é aplicável se o fundamento da revisão consistir em erro e esse erro for imputável aos serviços.
Erro esse que in casu não se verifica já que, de acordo com a Requerida, os atos de liquidação impugnados foram praticados ao abrigo dos artigos 4º e 5º da Lei 55/2007, não podendo a Requerida, que se encontra sujeita ao princípio da legalidade, deixar de aplicar quaisquer normas com base num julgamento de não conformidade com o direito comunitário.
Respondendo a esta exceção, defende a Requerente que o erro imputável aos serviços, ao abrigo do qual o artigo 78º da LGT permite a apresentação de pedido de revisão oficiosa no prazo de 4 anos, comporta não apenas o erro de facto como também o erro de direito, quer este resulte da má interpretação das normas legais em vigor ou da aplicação de normas desconformes com o bloco de legalidade que lhes serve de parâmetro, designadamente o Direito Europeu.
Em causa nos autos está a interpretação da norma contida no número 1 do artigo 78º da LGT, que dispõe o seguinte:
“A revisão dos atos tributários pela entidade que os praticou pode ser efetuada por iniciativa do sujeito passivo, no prazo de reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade, ou, por iniciativa da administração tributária, no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável aos serviços”.
O dissenso entre a Requerente e a Requerida reside na interpretação da 2ª parte deste preceito, concretamente, em saber se a revisão oficiosa do ato pode ter lugar a pedido do sujeito passivo, ultrapassado o prazo da reclamação administrativa, por um lado, e, por outro lado, na interpretação da locução “erro imputável aos serviços”.
Vamos por partes.
No que diz respeito à possibilidade de, ultrapassado o prazo da reclamação administrativa, o sujeito passivo pedir a revisão oficiosa do ato tributário, parece-nos que tal questão se encontra há muito ultrapassada, já que, tendo a AT o dever legal de decidir os pedidos que lhe sejam formulados pelos interessados, não pode escusar-se a tomar a iniciativa de revisão oficiosa do ato tributário quando tal lhe seja pedido pelos interessados - neste sentido vejam-se, entre outros, acórdãos do STA de 04MAIO2016, processo nº 0407/15 e de 29MAIO2013, processo nº 0140/13, ambos in www.dgsi.pt.
O mesmo se diga em relação à definição de “erro imputável aos serviços”, a qual, como defende a Requerida, se encontra há mais de 20 anos estabelecida na jurisprudência, no sentido de que tal erro comporta quer o erro de facto, quer o erro de direito.
Como bem se sumaria no recente acórdão do TCA Sul de 05NOV2020, disponível in www.dgsi.pt, “I. Existindo uma obrigação genérica de a Administração Tributária atuar em plena conformidade com a lei, legalmente preceituada, desde logo, no artigo 266.°, nº2, da CRP e bem assim no artigo 55.° da LGT, qualquer ilegalidade não resultante de uma atuação do sujeito passivo será imputável à própria Administração. II- Para a questão se subsumir no “erro imputável aos serviços”, constante no artigo 78.º, nº 1, da LGT importa, desde logo, que o contribuinte não tenha contribuído, por qualquer forma, para a emissão do ato de liquidação, ou seja, não pode existir uma conduta, seja ela ativa ou omissiva, que tenha determinado a emissão do ato de liquidação, nos moldes em que o foi.” (realce nosso).
Sendo certo que tal ilegalidade poderá reconduzir-se à ilegalidade da liquidação (ilegalidade em concreto) ou à ilegalidade do tributo, isto é, à ilegalidade absoluta da liquidação (ilegalidade abstrata), comportando esta última a ilegalidade de normas nacionais violadoras do direito comunitário [5].
No caso dos autos, o fundamento do pedido de revisão oficiosa apresentado pela Requerente e do subsequente pedido de pronúncia arbitral é a ilegalidade abstrata da CSR e não propriamente das liquidações efetuadas, as quais, como bem defende a Requerida, o foram em cumprimento do princípio da legalidade.
Em defesa da sua tese, defende ainda a Requerida que o erro imputável aos serviços, para efeito do disposto no artigo 78º nº 1 da LGT, no que à alegada violação do direito comunitário respeita, abrange apenas o erro na aplicação do direito comunitário que vincula diretamente todos os poderes públicos e os particulares, sem necessidade de qualquer lei nacional que o determine.
Entendemos ser esta questão perfeitamente inócua para o litígio em causa, já que, como é sabido, às diretivas comunitárias é reconhecido o efeito direto vertical, podendo, em consequência, as respetivas normas ser invocadas diretamente pelos particulares junto dos tribunais, independentemente da sua aplicação direta, isto é, independentemente de esta vincular diretamente todos os poderes públicos e os particulares, sem necessidade de qualquer lei nacional que o determine.
Em suma, temos, assim, por assente, que (i) o pedido de revisão oficiosa pode ter lugar por iniciativa do sujeito passivo, quer dentro do prazo de reclamação administrativa, com base em qualquer fundamento, quer dentro do prazo de 4 anos, com fundamento em erro imputável aos serviços; (ii) o erro imputável aos serviços comporta quer o erro de facto, quer o erro de direito; e (iii) o erro de direito engloba o erro derivado da violação de qualquer norma de direito comunitário, independentemente de este vincular ou não diretamente os poderes públicos e os particulares.
Improcede, pois, a exceção de caducidade do direito de ação invocada pela Requerida.
IV.2.B. Sobre o mérito da causa – sobre a ilegalidade das liquidações da CSR e o imposto alegadamente suportado pelo contribuinte consumidor final por repercussão fiscal
A questão jurídica sub judice relaciona-se com a ilegalidade da liquidação da CSR, criada pela Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, por ser um tributo desconforme com o direito da União Europeia, nomeadamente, ao n.º 2 do artigo 1.º da Diretiva n.º 2008/118/CE, de 16/12/2008.
Está em causa na presente ação a declaração de ilegalidade e consequente anulação da decisão tácita de indeferimento do pedido de revisão oficiosa das liquidações de IEC cuja anulação se peticionou no pedido de revisão oficiosa apresentado cujo indeferimento tácito constitui o objeto imediato da presente ação arbitral, relativas aos 04/2019, 05/2019, 06/2019, 07/2019, 08/2019, 09/2019, 10/2019, 11/2019, 12/2019, 01/2020, 02/20220, 03/2020, 04/2020, 05/2020, 06/2020, 07/2020, 08/2020, 09/2020, 10/2020, 11/2020, 12/2020, 01/2021, 02/2021, 03/2021, 04/2021, 05/2021, 06/2021, 07/2021, 08/2021, 09/2021, 10/2021, 11/2021, 12/2021, 01/2022, 02/2022, 03/2022, 04/2022, 05/2022, 06/2022, 07/2022, 08/2022, 09/2022, 10/2022, 11/2022, 12/2022, liquidadas e pagas pela “ B... , S.A.” (doravante, B...), NIPC ... na parte correspondente à Contribuição de Serviço Rodoviário (“CSR”) que foi paga (através do mecanismo de repercussão) pela aqui Requerente – conforme melhor se detalha no quadro infra:
Ano
|
Data
|
Fornecedor
|
NIF
|
e-DIC
|
Liquidação IEC
|
Produto
|
Totais (Lts)
|
CSR (€)
|
2021
|
31/03/2021
|
B... SA
|
|
31/03/2021
|
mar/21
|
Gasóleo
|
21 782,10
|
2 417,81
|
2021
|
15/04/2021
|
B... SA
|
|
15/04/2021
|
abr/21
|
Gasóleo
|
22 447,67
|
2 491,69
|
2021
|
30/04/2021
|
B... SA
|
|
30/04/2021
|
abr/21
|
Gasóleo
|
21 971,16
|
2 438,80
|
2021
|
15/05/2021
|
B... SA
|
|
15/05/2021
|
mai/21
|
Gasóleo
|
25 260,46
|
2 803,91
|
2021
|
31/05/2021
|
B... SA
|
|
31/05/2021
|
mai/21
|
Gasóleo
|
21 629,01
|
2 400,82
|
2021
|
15/06/2021
|
B... SA
|
|
15/06/2021
|
jun/21
|
Gasóleo
|
21 859,51
|
2 426,41
|
2021
|
30/06/2021
|
B... SA
|
|
30/06/2021
|
jun/21
|
Gasóleo
|
22 141,45
|
2 457,70
|
2021
|
15/07/2021
|
B... SA
|
|
15/07/2021
|
jul/21
|
Gasóleo
|
19 908,14
|
2 209,80
|
2021
|
31/07/2021
|
B... SA
|
|
31/07/2021
|
jul/21
|
Gasóleo
|
21 689,52
|
2 407,54
|
2021
|
15/08/2021
|
B... SA
|
|
15/08/2021
|
ago/21
|
Gasóleo
|
27 740,93
|
3 079,24
|
2021
|
31/08/2021
|
B... SA
|
|
31/08/2021
|
ago/21
|
Gasóleo
|
21 344,08
|
2 369,19
|
2021
|
15/09/2021
|
B... SA
|
|
15/09/2021
|
set/21
|
Gasóleo
|
26 127,39
|
2 900,14
|
2021
|
30/09/2021
|
B... SA
|
|
30/09/2021
|
set/21
|
Gasóleo
|
21 801,81
|
2 420,00
|
2021
|
15/10/2021
|
B... SA
|
|
15/10/2021
|
out/21
|
Gasóleo
|
22 092,37
|
2 452,25
|
2021
|
31/10/2021
|
B... SA
|
|
31/10/2021
|
out/21
|
Gasóleo
|
18 653,49
|
2 070,54
|
2021
|
15/11/2021
|
B... SA
|
|
15/11/2021
|
nov/21
|
Gasóleo
|
19 439,53
|
2 157,79
|
2021
|
30/11/2021
|
B... SA
|
|
30/11/2021
|
nov/21
|
Gasóleo
|
19 407,99
|
2 154,29
|
2021
|
15/12/2021
|
B... SA
|
|
15/12/2021
|
dez/21
|
Gasóleo
|
22 472,66
|
2 494,47
|
2021
|
31/12/2021
|
B... SA
|
|
31/12/2021
|
dez/21
|
Gasóleo
|
24 331,60
|
2 700,81
|
2022
|
15/01/2022
|
B... SA
|
|
15/01/2022
|
jan/22
|
Gasóleo
|
22 527,85
|
2 500,59
|
2022
|
31/01/2022
|
B... SA
|
|
31/01/2022
|
jan/22
|
Gasóleo
|
26 227,38
|
2 911,24
|
2022
|
15/02/2022
|
B... SA
|
|
15/02/2022
|
fev/22
|
Gasóleo
|
23 240,57
|
2 579,70
|
2022
|
28/02/2022
|
B... SA
|
|
28/02/2022
|
fev/22
|
Gasóleo
|
16 729,12
|
1 856,93
|
2022
|
15/03/2022
|
B... SA
|
|
15/03/2022
|
mar/22
|
Gasóleo
|
21 263,67
|
2 360,27
|
2022
|
31/03/2022
|
B... SA
|
|
31/03/2022
|
mar/22
|
Gasóleo
|
25 710,85
|
2 853,90
|
2022
|
15/04/2022
|
B... SA
|
|
15/04/2022
|
abr/22
|
Gasóleo
|
25 187,39
|
2 795,80
|
2022
|
30/04/2022
|
B... SA
|
|
30/04/2022
|
abr/22
|
Gasóleo
|
21 259,78
|
2 359,84
|
2022
|
15/05/2022
|
B... SA
|
|
15/05/2022
|
mai/22
|
Gasóleo
|
25 009,60
|
2 776,07
|
2022
|
31/05/2022
|
B... SA
|
|
31/05/2022
|
mai/22
|
Gasóleo
|
28 817,71
|
3 198,77
|
2022
|
15/06/2022
|
B... SA
|
|
15/06/2022
|
jun/22
|
Gasóleo
|
24 395,09
|
2 707,85
|
2022
|
30/06/2022
|
B... SA
|
|
30/06/2022
|
jun/22
|
Gasóleo
|
24 753,42
|
2 747,63
|
2022
|
15/07/2022
|
B... SA
|
|
15/07/2022
|
jul/22
|
Gasóleo
|
22 168,83
|
2 460,74
|
2022
|
31/07/2022
|
B... SA
|
|
31/07/2022
|
jul/22
|
Gasóleo
|
19 522,87
|
2 167,04
|
2022
|
15/08/2022
|
B... SA
|
|
15/08/2022
|
ago/22
|
Gasóleo
|
19 021,02
|
2 111,33
|
2022
|
31/08/2022
|
B... SA
|
|
31/08/2022
|
ago/22
|
Gasóleo
|
27 224,70
|
3 021,94
|
2022
|
15/09/2022
|
B... SA
|
|
15/09/2022
|
set/22
|
Gasóleo
|
21 956,12
|
2 437,13
|
2022
|
30/09/2022
|
B... SA
|
|
30/09/2022
|
set/22
|
Gasóleo
|
19 981,87
|
2 217,99
|
2022
|
15/10/2022
|
B... SA
|
|
15/10/2022
|
out/22
|
Gasóleo
|
19 751,08
|
2 192,37
|
2022
|
31/10/2022
|
B... SA
|
|
31/10/2022
|
out/22
|
Gasóleo
|
18 098,41
|
2 008,92
|
2022
|
15/11/2022
|
B... SA
|
|
15/11/2022
|
nov/22
|
Gasóleo
|
17 489,68
|
1 941,35
|
2022
|
30/11/2022
|
B... SA
|
|
30/11/2022
|
nov/22
|
Gasóleo
|
14 783,46
|
1 640,96
|
2022
|
15/12/2022
|
B... SA
|
|
15/12/2022
|
dez/22
|
Gasóleo
|
16 358,55
|
1 815,80
|
2022
|
31/12/2022
|
B... SA
|
|
31/12/2022
|
dez/22
|
Gasóleo
|
23 228,73
|
2 578,39
|
|
|
|
|
|
|
Total
|
2 056 922,18
|
-
8,36
|
E das liquidações de IEC relativas aos períodos 01/2023, 02/2023 e 03/2023, liquidadas pela B..., na parcela relativa à receita consignada à Infraestruturas de Portugal, S.A. (designada por “Consignação de serviço rodoviário”) suportada pela aqui Requerente, conforme melhor se detalha no quadro infra:
Ano
|
Data
|
Fornecedor
|
NIF
|
e-DIC
|
Liquidação IEC
|
Produto
|
Totais (Lts)
|
CSR (€)
|
2023
|
15/01/2023
|
B... SA
|
|
15/01/2023
|
jan/23
|
Gasóleo
|
25 814,44
|
2 865,40
|
2023
|
31/01/2023
|
B... SA
|
|
31/01/2023
|
jan/23
|
Gasóleo
|
25 217,64
|
2 799,16
|
2023
|
15/02/2023
|
B... SA
|
|
15/02/2023
|
fev/23
|
Gasóleo
|
29 765,95
|
3 304,02
|
2023
|
28/02/2023
|
B... SA
|
|
28/02/2023
|
fev/23
|
Gasóleo
|
23 220,15
|
2 577,44
|
2023
|
15/03/2023
|
B... SA
|
|
15/03/2023
|
mar/23
|
Gasóleo
|
27 842,14
|
3 090,48
|
|
|
|
|
|
|
Total
|
131 860,32
|
14 636,50
|
Por força do princípio do primado e da colaboração leal estabelecido no artigo 4º do TUE, as decisões do TJUE devem ser adequadamente observadas, sendo a decisão sobre a CSR amplamente seguida em decisões sobre a ilegalidade das respetivas liquidações - Proc. C-460/21, do TJUE.
De acordo com o referido entendimento do TJUE, diversos sujeitos passivos de ISP/CSR e outros interessados, têm vindo a suscitar junto do CAAD a ilegalidade dos atos tributários e subsequente o direito de reembolso do imposto indevidamente liquidado.
Na sequência do referido Proc. C-460/21, do TJUE, a Lei n.º 24-E/2022, de 30 de dezembro veio alterar significativamente a Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, consignando parcialmente a receita do ISP ao serviço rodoviário, antes financiado pela CSR, agora eliminada.
Em face declaração de ilegalidade da CSR pelo TJUE e os subsequentes pedidos de revisão dos atos de liquidação e pedido de reembolso, a Requerida não emitiu orientações para o reembolso da CSR, contrariamente à prática em outros EM na sequência da declaração de ilegalidade de tributos.
O pedido em apreciação consiste, desde logo, em saber se nos termos desses ordenamentos jurídicos, para além dos SP, o contribuinte consumidor final a quem o imposto seja presumivelmente repercutido e o possa ter suportado economicamente tem o direito de exigir diretamente da Requerida a revisão dos atos de liquidação e o reembolso de imposto indevidamente pago, no caso, da CSR repercutida no preço dos combustíveis adquiridos.
Na sequência da apreciação das exceções invocadas pela Requerida e do reconhecimento da legitimidade da Requerente, consumidor final, esta tem um interesse legalmente protegido e o direito de ação e de interpelar diretamente a Requerida, por forma à revisão dos respetivos atos de liquidação de CSR e ser ressarcida dos prejuízos decorrentes do alegado pagamento indevido do imposto, caso confirmada a sua repercussão no preço dos produtos adquiridos.
As empresas petrolíferas, em regra, repercutem o ISP e, ao tempo, a CSR nos operadores a jusante, incluindo, nos consumidores finais. Enquanto impostos aplicados ao consumo, estes caracterizam-se pelo facto de o seu encargo financeiro ser, em regra, repercutido nos restantes operadores da atividade comercial, maxime, no consumidor final.
Na sequência da liquidação de imposto em violação do direito da União Europeia, o TJUE tem entendido que subiste a obrigação de restituí-lo ao sujeito passivo (SP), nos termos da lei e da jurisprudência da EU e nacional, salvaguardando situações de enriquecimento sem causa – Cf. Proc. C 94/10, conclusões de 24 março de 2011.
A jurisprudência da UE afirma que compete aos órgãos jurisdicionais nacionais «apreciar, à luz das circunstâncias de cada caso concreto, se o encargo do imposto foi transferido no todo ou em parte pelo operador para outras pessoas e, se for esse o caso, se o reembolso ao operador constitui enriquecimento sem causa» - cf. Acórdão Comateb e Acórdão C-566/07, Stadeco e cfr. Proc. 02185/17.8BEPRT - TCAN
Atenta a jurisprudência, o “Tribunal de Justiça referiu expressamente a possibilidade de o comprador final poder exigir, diretamente às autoridades nacionais, a restituição do montante do imposto indevido cujo encargo suportou” – Cf. Acórdão Comateb e O (-192/95 a C-218/95, Colect., p. I-165, n.º 20) de 14 de Janeiro de 1997.”
Sublinha-se que “No mesmo acórdão, o Tribunal de Justiça referiu, contudo, que a restituição ao sujeito passivo do montante do imposto, apesar de este o ter repercutido sobre o comprador, equivaleria para aquele a um pagamento em dobro suscetível de ser qualificado como enriquecimento sem causa, sem que, porém, sejam remediadas as consequências da ilegalidade do imposto para o comprador. O Tribunal de Justiça reconheceu, assim, que o imposto contrário ao direito da União pode atingir economicamente outra pessoa para além do sujeito passivo e que existe uma necessidade de devolver o montante do imposto ao património desta pessoa.” Cf. Proc. C-94/10, conclusões, de 24 de março de 2011.
Nesse sentido, atentas as especificidades e casuísmo das respetivas operações comerciais, os elementos de prova são essenciais, inclusive para determinar quem efetivamente suportou imposto, o quantum efetivamente pago, pelo que nas referidas conclusões afirma-se ainda: “A jurisprudência do Tribunal de Justiça, de acordo com a qual a questão da repercussão ou não de um imposto indireto constitui uma questão de facto em cada caso concreto, na medida em que repercussão efetiva, total ou parcial, depende de vários fatores próprios a cada transação comercial” – Cf. Acórdãos de 25 de fevereiro de 1988, Les Fils de Jules Bianco e Girard (331/85, 376/85 e 378/85, Comateb e o. (já referidos) e Weber’s Wine World e o. (C-147/01).
Assim, “a reparação dos prejuízos através do direito ao reembolso tem também, por fim, efeitos sobre a questão de saber como poderão ser eliminadas as consequências económicas para o comprador final do imposto cobrado em violação do direito da União.” – Cf. conclusões citadas.
Termos em que o direito de reembolso do consumidor final da CSR face ao Estado pode ser reconhecido por motivos de equivalência e efetividade – Cf. Acórdãos de 6 de outubro de 2005, MyTravel (C-291/03) e de 15 de março de 2007, Reemtsma Cigarettenfabriken (C-35/05).
Acresce que o reembolso e reparação do dano seria manifestamente mais difícil caso apenas se admitisse a possibilidade de o consumidor final pedir indemnização ao sujeito passivo, como referido, pelo que o princípio da efetividade visa assegurar que o consumidor final se possa dirigir diretamente ao Estado para realizar os seus direitos e reparar os danos sofridos por pagamento de impostos ilegais.
Na falta de regulamentação, na EU e interna, de natureza processual ou substantiva, para o reembolso de impostos cobrados em violação do direito da União Europeia, cabe aos Tribunais a decisão de cada caso sub judice.
Termos em que o princípio da efetividade se apresenta especialmente relevante no sentido de tornar efetiva a aplicação das normas jurídicas, bem como assegurar que os direitos, garantias e deveres estabelecidos pela legislação sejam realmente aplicados e produzam os resultados pretendidos – no caso a proteção de direitos e a reparação dos prejuízos sofridos pelos contribuintes lesados.
A plena eficácia do direito de reparação e a proteção efetiva dos contribuintes poderia ficar manifestamente prejudicada perante uma interpretação restrita no sentido de apenas os SP (no caso de CSR) gozarem do direto de pedirem o reembolso ao Estado– artigos 4.º a 12.º e 15.º a 20.º do CIEC, limitando-se formalmente os titulares desse direito e impedindo-se a efetiva reparação dos prejuízos incorridos pelos contribuintes objetiva e efetivamente lesados, como referido.
Nesse sentido, afirma-se: “Por conseguinte, no caso em que um Estado-Membro tenha cobrado um imposto especial sobre o consumo em violação do direito da União e o sujeito passivo tiver repercutido este sobre o seu cliente, um direito a indemnização deste cliente contra o Estado não pode ser recusado com o fundamento de que é de excluir de antemão um nexo de causalidade direto entre a cobrança do imposto e o dano do cliente.” – Cf. Proc. C-94/10, conclusões referidas.
No âmbito do reconhecimento do direito ao reembolso da CSR e de entre as diferentes interpretações possíveis dos regimes legais, deve privilegiar-se aquela que melhor concretize os direitos e garantias dos interessados, essencial, ainda, para adequada realização do princípio do acesso à justiça, porquanto para os direitos serem efetivos torna-se essencial que se reconheça aos cidadãos contribuintes a legitimidade para reivindicá-los perante os Tribunais, em especial, perante atos ilegais de liquidação de impostos.
O contribuinte consumidor final que demonstre que a CRS foi repercutida no preço dos produtos que adquiriu tem o direito de obter o reembolso da CSR indevidamente suportada, mediante o recurso aos meios de reação previstos na legislação tributária e, junto da AT, contestar diretamente os respetivos atos tributários – Vd nesse sentido o acórdão do TJUE de 14 de janeiro de 1997, Société Comateb, Procs. apensos C-192/95 a C-218/95, ponto 24.
A apreciação das liquidações de CSR, enquanto imposto indireto, implica conhecer todos os factos tributários que deram origem à receita desse imposto. A CSR incide sobre a gasolina e o gasóleo rodoviário sujeitos a ISP, materializando-se nos atos de comercialização e o consumo desses produtos, sendo esses factos/acontecimentos que, de acordo com a lei, geram a obrigação tributária.
A liquidação de um tributo envolve diversos elementos fundamentais para sua correta execução, de entre os principais elementos da liquidação, tudo se inicia com o facto gerador, enquanto acontecimento da vida real previsto na lei que dá origem à obrigação tributária principal, ou seja, a obrigação de pagar o imposto. O conhecimento do fato gerador é o primeiro passo para a liquidação do imposto, pois define todos os elementos da respetiva relação jurídico-tributária.
O conhecimento preciso desse facto tributário, através dos respetivos elementos de suporte e de registo, revela-se essencial para verificar os direitos e as obrigações geradas, os intervenientes na relação tributária e a conformação dos respetivos direitos e deveres.
Assim, no caso sub judice, de ilegalidade das liquidações de CRS, por forma à respetiva apreciação, reposição da legalidade e subsequente ressarcimento dos contribuintes lesados é crucial conhecer quem efetivamente pagou o imposto em cada um dos diferentes atos comerciais ocorridos.
O SP que entregou ao Estado o imposto indevidamente liquidado, em regra, é o titular do direito ao reembolso, caso não obtenha um benefício indevido pelo pagamento efetivo desse imposto pelo consumidor final – enriquecimento sem causa como referido.
Para esse efeito e no caso da CSR, a prova documental e objetiva do efetivo pagamento pelo contribuinte consumidor final é essencial para comprovar por quem o imposto, total ou parcialmente, foi suportado e pago.
Na apreciação das liquidações indevidas de CSR e o subsequente direito ao reembolso, reveste especial relevo o conhecimento preciso dos elementos, objetivos e subjetivos, que integraram os acontecimentos/factos tributários que estiveram na origem dessas liquidações. O rigoroso conhecimento desses elementos é essencial face à natureza do imposto indireto como a CSR, domínio em é essencial conhecer quem pagou efetivamente o imposto, a quem e quem efetuou a sua entrega ao Estado, por forma à adequada compreensão e apreciação das respetivas relações jurídico-tributárias e, subsequentes direitos e deveres.
Observa-se que a anulação «de um ato administrativo constitui a Administração no dever de reconstituir a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado…” (…) e, no plano tributário, “em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade”, - Cf. n.º 1 do artigo 172.º do CPA, n.º 1 do artigo 173.º do CPTA e artigo 100.º da LGT.
Consequentemente, no pedido de reembolso pelo SP este deve demonstrar a repercussão do CSR e a AT apreciar os inerentes atos tributários e as operações materiais - factos tributários - que suportam e fundamentam os atos de liquidação e pagamento do imposto. A apreciação das liquidações e o reconhecimento do reembolso de CSR ao SP, implica, igualmente, conhecer se o SP economicamente suportou o imposto, tido por indevido, face à natureza e à prática da repercussão fiscal inerente a esse imposto.
“A repercussão fiscal consiste na transferência do imposto que legalmente incide sobre um sujeito passivo, para um terceiro, alheio à relação jurídica tributária, com quem aquele tem relações económicas. Nas palavras de alguns autores, o repercutido será um mero "contribuinte de facto" (titular da capacidade contributiva), por contraposição ao "contribuinte de direito", aquele a quem é juridicamente exigível o pagamento do tributo. De acordo com a doutrina pode fazer-se a distinção entre a repercussão obrigatória ou legal, a qual encontra consagração, por exemplo, em sede de I.V.A., por contraposição à repercussão voluntária (…)” – Proc. 0581/17.0BEALM, acórdão STA de 28-10-2020.
Termos em que o reconhecimento da legitimidade de ação do contribuinte consumidor final no imposto indireto – CSR - e o equilíbrio entre o direito material e direito processual, exige a clara e rigorosa demonstração dos elementos essenciais para decisão, em especial, meios de prova detalhados que permitam apurar inequivocamente quem efetivamente suportou o imposto, ou seja, a presença de elementos completos sobre o facto tributário subjacente às liquidações do imposto.
Em suma, constitui objeto imediato dos autos arbitrais a decisão de indeferimento do procedimento de Revisão Oficiosa do Ato Tributário, e constitui seu objeto mediato as liquidações de CSR praticadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”) com base nas DIC submetidas pela B... e, bem assim, dos consequentes atos de repercussão da referida CSR consubstanciados nas faturas referentes à gasolina e ao gasóleo rodoviário àquela adquiridos pela Requerente.
A acima identificada fornecedora de combustível entregou ao Estado, enquanto sujeito passivo da respetiva relação jurídico -tributária, os valores apurados nos atos de liquidação conjunta de Imposto sobre os Produtos Petrolíferos e Energéticos (“ISP”) e de CSR praticados pela AT com base nas DIC por aquela submetidas.
Neste principal, a fornecedora de combustível repercutiu nas respetivas faturas a CSR correspondente a cada um dos consumos realizados pela Requerente, tal como se demonstra através da declaração emitida pela B... (cf. Documento 5).
Não podemos, contudo, deixar de acompanhar o que a Requerida alega:
-
Do teor do Doc. 3, junto com o pedido arbitral - faturas de aquisição de combustíveis – apenas constam valores referentes ao IVA, não contendo aquelas quaisquer referências a montantes pagos a título de ISP ou CSR, sendo absolutamente omissas nesse aspeto, o que se comprova com o sistema e-fatura, e sistema SAFT-T, que apenas indicam o IVA associado a cada venda de combustível efetuado, não existindo qualquer tipo de informação relevante para a identificação das DIC e respetivas liquidações de ISP/CSR a montante.
-
Não tendo sido, também, apresentados, além disso, quaisquer comprovativos de pagamento ao Estado do ISP/CSR, consubstanciados pela apresentação dos respetivos Documentos Únicos de Cobrança (DUC) e das Declarações Aduaneiras de Importação/Documentos Administrativos Únicos (DAI/DAU) com averbamento do número do movimento de caixa.
-
Acresce que existem faturas que contêm uma parcela com a designação "descontos", das quais constam valores sem descritivo da respetiva natureza e conteúdo, o que contribui para a falta de rigor e, por si só, suscita dúvidas quanto a própria presunção da repercussão da CSR e/ou ISP-Consignação de Serviço Rodoviário.
Já do teor do documento junto sob o nº 5 – declaração emitida pela B...- em que esta se limita a afirmar, na qualidade de fornecedora da Requerente e alegado sujeito passivo de ISP/CSR, “que a Contribuição de Serviço Rodoviário por si entregue, na qualidade de sujeito passivo, junto dos cofres do Estado, por referência ao combustível rodoviário fornecido à empresa (…), foi por si integralmente repercutida na esfera da referida empresa” também não faz prova da repercussão aí alegada, pelo que igualmente se impugna o seu teor.
Pois, para além de se referir apenas à Contribuição de Serviço Rodoviário e não ao ISP-Consignação de Serviço Rodoviário, não identifica quaisquer DICs ou atos de liquidação, nem os montantes alegadamente repercutidos, respetivas datas, quantidades de combustível tributadas, entre outros, com os quais se possa correlacionar a quantidade de combustível que veio a ser adquirido pela Requerente ao fornecedor, que revestiu a posição de sujeito passivo de ISP/CSR.
Trata-se apenas de uma declaração genérica, que está longe de conter os elementos concretos indispensáveis à exata e concreta comprovação, quer dos montantes de IPS/CSR alegadamente repercutidos à Requerente no período em causa, quer de que a Requerente suportou de facto a CSR e em que medida.
Ora, a CSR é devida ao Estado pelo SP, sendo desconhecidos os termos do contrato de fornecimento de combustível celebrado ou da relação comercial entre a Requerente e o SP, designadamente a repercussão ou não da CSR e a sua incorporação no preço do combustível adquirido.
Face à sua natureza de imposto objeto de repercussão legal pelo SP, o IVA encontra-se objetiva e claramente discriminado nas faturas. Atento o regime da CRS e a possibilidade ou não de ser repercutida, a mesma não se apresenta discriminada nas faturas emitidas pelo SP.
Assim, não se apresenta possível confirmar a factualidade invocada pela Requerente sobre o pagamento indevido da CSR. Os documentos apresentados, quer na forma, quer no conteúdo, não se apresentam suficientes e adequados para comprovar o pagamento efetivo do imposto pela Requerente.
Em anteriores decisões arbitrais, tem-se entendido que “A prova da repercussão no consumidor final de impostos indiretos suportados pelo operador económico e do enriquecimento sem causa do mesmo em virtude da sua restituição não pode ser efetuada através de meras presunções.” – Cf. Processo n.º: 304/2022-T – CAAD.
No sentido dessa posição, entende-se que a prova da repercussão do imposto (CSR) invocada pelo consumidor final (Requerente) deve ser objetiva e inequivocamente demonstrada por documentos que identifiquem claramente o efetivo pagamento do imposto, não podendo ser presumida, nem aceite, ainda, mediante mera “declaração” genérica e sem os requisitos declarativos, maxime, quando as partes conhecem o conteúdos das suas relações comerciais e o SP se encontra legalmente obrigado a registar as respetivas operações/transações, quer para efeitos contabilísticos, quer para efeitos tributários.
E essa obrigação de informação existe e poderia ser fornecida pela Requerente no âmbito da sua relação contratual com o SP, o qual reúne, ainda, as condições de prestar as informações necessárias, completas e rigorosas ao contribuinte final/Requerente, a qual tem um interesse jurídico atendível nessas informações e registos detalhados e integrais, os quais igualmente suportaram a CSR cobrada e a entregue ao Estado pelo SP, enquanto elementos essências para apreciar as liquidações de CSR controvertidas.
A prova de um facto positivo – repercussão fiscal da CSR - impende sobre quem a invoca – a Requerente -, por forma a comprovar a qualidade de entidade repercutida e lesada no âmbito da relação jurídico-tributária da CSR.
Por fim, recorda-se a jurisprudência do TJUE e o teor do Acórdão de 7 de fevereiro de 2022, Proc. C-460/21, ponto 44: "Com efeito, ainda que, na legislação nacional, os impostos indiretos tenham sido concebidos de modo a serem repercutidos no consumidor final e que, habitualmente, no comércio, esses impostos indiretos sejam parcial ou totalmente repercutidos, não se pode afirmar de uma maneira geral que, em todos os casos, o imposto é efetivamente repercutido. A repercussão efetiva, parcial ou total, depende de vários fatores próprios de cada transação comercial e que a diferenciam de outras situações, noutros contextos. Consequentemente, a questão da repercussão ou da não repercussão em cada caso de um imposto indireto constitui uma questão de facto que é da competência do órgão jurisdicional nacional, cabendo a este último apreciar livremente os elementos de prova que lhe tenham sido submetidos – Vd, neste sentido, Acórdãos de 25 de fevereiro de 1988, Les Fils de Jules Bianco e Girard, 331/85, 376/85 e 378/85, EU:C:1988:97, n.º 17, e de 2 de outubro de 2003, Weber’s Wine World e o., C‑147/01, EU:C:2003:533, n.º 96.
A Requerente vem pretender justificar a ocorrência de uma efetiva repercussão do imposto assenta em meros juízos presuntivos e declaração genérica, própria (tabela e extratos de faturas) e de terceiros (declarações), sem efetuar a demonstração objetiva da realidade dos factos através de elementos de prova que se relacionem com os fatores inerentes às transações comerciais que foram realizadas, pelo que o presente pedido arbitral deve improceder na totalidade, com as legais consequências.
-
DECISÃO
Em face do supra exposto, o Tribunal Arbitral decide:
-
Julgar improcedente o presente pedido arbitral;
-
Condenar a Requerente ao pagamento das custas.
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Valor do processo
Fixa-se o valor do processo em € 242.954,86, nos termos do disposto no artigo 32.º do CPTA e no artigo 97.º-A do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT, e do artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).
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Custas
Nos termos da Tabela I anexa ao RCPAT, as custas são no valor de € 4.284,00, a pagar pela Requerente, uma vez que o pedido foi totalmente improcedente, conformemente ao disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, do RJAT, e artigo 4.º, n.º 5, do RCPAT.
Notifique-se.
Lisboa, 3 de junho de 2024
Os Árbitros,
(Guilherme W. d’Oliveira Martins)
(José Nunes Barata)
Declaração de voto de vencido do árbitro Marcolino Pisão Pedreiro
Não acompanho a decisão que fez vencimento, pelas razões que passo a enunciar.
Na decisão da matéria de facto considera-se provado que:
“No âmbito da aquisição de gasóleo rodoviário à B..., a Requerente procedeu ao pagamento da CSR e ISP [na parcela da Consignação do serviço rodoviário].” (al. g) do probatório)
Constando também desta parte da decisão que “Não existem quaisquer factos não provados relevantes para a decisão da causa.”
Porém, na parte referente à matéria de Direito, afirma-se o seguinte:
“(…)não se apresenta possível confirmar a factualidade invocada pela Requerente sobre o pagamento indevido da CSR. Os documentos apresentados, quer na forma, quer no conteúdo, não se apresentam suficientes e adequados para comprovar o pagamento efetivo do imposto pela Requerente.
(…).
(…)entende-se que a prova da repercussão do imposto (CSR) invocada pelo consumidor final (Requerente) deve ser objetiva e inequivocamente demonstrada por documentos que identifiquem claramente o efetivo pagamento do imposto, não podendo ser presumida, nem aceite, ainda, mediante mera “declaração” genérica e sem os requisitos declarativos, maxime, quando as partes conhecem o conteúdos das suas relações comerciais e o SP se encontra legalmente obrigado a registar as respetivas operações/transações, quer para efeitos contabilísticos, quer para efeitos tributários.
E essa obrigação de informação existe e poderia ser fornecida pela Requerente no âmbito da sua relação contratual com o SP, o qual reúne, ainda, as condições de prestar as informações necessárias, completas e rigorosas ao contribuinte final/Requerente, a qual tem um interesse jurídico atendível nessas informações e registos detalhados e integrais, os quais igualmente suportaram a CSR cobrada e a entregue ao Estado pelo SP, enquanto elementos essências para apreciar as liquidações de CSR controvertidas.”
(…)
A Requerente vem pretender justificar a ocorrência de uma efetiva repercussão do imposto assenta em meros juízos presuntivos e declaração genérica, própria (tabela e extratos de faturas) e de terceiros (declarações), sem efetuar a demonstração objetiva da realidade dos factos através de elementos de prova que se relacionem com os fatores inerentes às transações comerciais que foram realizadas, pelo que o presente pedido arbitral deve improceder na totalidade, com as legais consequências”
Além destas asserções não se me afigurarem congruentes com as afirmações em sede de decisão de matéria de facto acima referidas, não acompanho a apreciação ínsita nas passagens acabadas de citar.
Como refere o Professor Rui Duarte Morais, no processo tributário “Vale, também o princípio da livre apreciação das provas, as quais deverão ser apreciadas segundo a livre convicção do julgador, ainda que, necessariamente, fundamentada”[2]
E, segundo o ensinamento do Professor José Lebre de Freitas “(…) o princípio da livre apreciação da prova significa que o julgador deve decidir segundo a sua íntima convicção, formada no confronto com os vários meios de prova.
(…)
Representando, tal como os princípios anteriores, uma conquista que se tem vindo a desenvolver desde a Revolução Francesa, a livre apreciação implantou-se historicamente em substituição dum sistema de prova legal em que os próprios depoimentos testemunhais eram valorados em função de factores meramente quantitativos. Hoje, a liberdade de apreciação da prova pelo julgador constitui a regra, sendo exceção os casos em que a lei impõe a conclusão a tirar de certo meio de prova.
Mas as exceções são importantes.
(…)
Outro tipo de exceção ao princípio da livre apreciação da prova é constituído pela imposição legal, directa ou indirecta, de que a prova de determinado facto se faça por certo meio probatório, normalmente documental.”[3]
No caso em apreço inexiste norma que impunha para a prova da repercussão documento com as características apontadas na decisão, não impedindo a lei, em abstrato, que a prova se possa fazer, até, por meio de prova diverso do documental.
Por outro lado, refere Luís Filipe Pires de Sousa:
“Os documentos provenientes de terceiros não possuem uma eficácia probatória própria, quer em função do conteúdo quer em função da proveniência. Colocam-se, assim, duas questões quanto a estes documentos: qual o seu valor probatório e se estão sujeitos a impugnação de genuinidade (art. 444º do CPC).
(…)
A jurisprudência nacional tem afirmado que os documentos provenientes de terceiros são livremente apreciados pelo tribunal nos termos do art. 366º.”[4]
(…)
Assim, à luz da autorizada doutrina citada, no meu entender, a declaração emitida pelo fornecedor de combustíveis, no sentido de que procedeu à repercussão do imposto à Requerente, está sujeita ao princípio da livre apreciação da prova, não estando, à partida, excluído que o facto se possa considerar provado com base numa declaração genérica. Não está, pois, a meu ver, o Tribunal dispensado de formular uma apreciação e um juízo específicos sobre o caso concreto.
Refere ainda José Lebre de Freitas:
“No âmbito do princípio da livre apreciação da prova, não é exigível que a convicção do julgador sobre a realidade dos factos alegados pelas partes equivalha a uma absoluta certeza, raramente atingível pelo conhecimento humano. Basta-lhe assentar num juízo de suficiente probabilidade ou verosimilhança, que o necessário recurso às presunções judiciais (arts. 349 e 351 CC) por natureza implica, mas não dispensa a máxima investigação para atingir, nesse juízo, o máximo de segurança. Quando no espírito do julgador, em vez da convicção, se forma a dúvida sobre a realidade dos factos a provar, nomeadamente como resultado do confronto entre a prova produzida pela parte onerada com o respetivo ónus e a contraprova oposta pela parte contrária (art. 346 CC), o facto não pode ser dado como provado, em prejuízo da parte onerada ou, na dúvida sobre a determinação desta, em prejuízo da parte a quem o facto aproveitaria (art. 414).”[5]
Face ao exposto e à luz do princípio da livre apreciação da prova entendo que, no caso concreto, a repercussão deveria ter sido considerada provada, no que respeita à parte referente à contribuição do serviço rodoviário.
Antes de mais, porque a Requerida ao referir que “Já do teor do documento junto sob o nº 5 – declaração emitida pela B... - em que esta se limita a afirmar, na qualidade de fornecedora da Requerente e alegado sujeito passivo de ISP/CSR, e “que a Contribuição de Serviço Rodoviário por si entregue, na qualidade de sujeito passivo, junto dos cofres do Estado, por referência ao combustível rodoviário fornecido à empresa (…), foi por si integralmente repercutida na esfera da referida empresa” também não faz prova da repercussão aí alegada, pelo que igualmente se impugna o seu teor.” E “Pois, para além de se referir apenas à Contribuição de Serviço Rodoviário e não ao ISP-Consignação de Serviço Rodoviário, não identifica quaisquer DICs ou atos de liquidação, nem os montantes alegadamente repercutidos, respetivas datas, quantidades de combustível tributadas, entre outros, com os quais se possa correlacionar a quantidade de combustível que veio a ser adquirido pela Requerente ao fornecedor, que revestiu a posição de sujeito passivo de ISP/CSR.” aceita implicitamente que a B... tenha emitido a declaração.
De tal declaração consta que a B..., S.A., “declara, para os devidos efeitos, que a Contribuição de Serviço Rodoviário por si entregue, na qualidade de sujeito passivo, junto dos cofres do Estado, por referência ao combustível fornecido à entidade A..., S.A., com NIPC..., foi por si integralmente repercutida na esfera da referida empresa.”
Tal declaração é –em abstrato– objetivamente contrária aos interesses da declarante na medida em que logicamente impede, em termos práticos, como é bom de ver, que tal entidade venha deduzir pretensão judicial idêntica à da requerente relativamente ao imposto aqui em causa.
Decorre das regras da experiência da vida que não é comum fazer-se uma declaração objetivamente contrária ao interesse de quem a faz, se a mesma não for verdadeira.
Por outro lado, à luz dos princípios da praticabilidade, eficiência e da racionalidade não se afigura razoável exigir que a declaração em causa tenha os detalhes referidos pela Requerida e pela decisão.
A declaração deve interpretar-se, à luz do artigo 236.º do Código Civil, no sentido de que se reportam a todos os fornecimentos de combustíveis efetuados pela declarante à Requerentes. Assim sendo, não se vislumbra a necessidade de especificar, operação a operação, o que seria até contrário aos princípios referidos.
A não se entender assim, sempre poderia o Tribunal, ao abrigo da al. e) do art. 16.º do RJAT e do artigo 99.º, n.º 1, da LGT, notificar as Requerentes para juntar aos autos os documentos complementares julgados necessários, ou diretamente à entidade declarante, a fim de serem prestados os esclarecimentos adicionais julgados pertinentes,[6] o que, no caso, não se me afigura necessário, face ao acima exposto.
Em conclusão, entendo que é de considerar que o documento em causa é idóneo a gerar um juízo de suficiente probabilidade ou verosimilhança da ocorrência da repercussão alegada pela Requerente. E, não tendo a Requerida produzido qualquer contraprova a respeito do facto, entendo ser de considerar provada a repercussão, embora tão só relativamente à Contribuição de Serviço Rodoviário, pois só a tal tributo se refere a declaração.
De resto, tal apreciação e convicção é ainda reforçada pelo facto de, como é incontroverso, o tributo estar legalmente concebido para ser repercutido aos utilizadores do combustível.
Termos em que, no meu, entender, a ação deveria ter sido julgada procedente na parte referente à Contribuição de Serviço Rodoviário.
O árbitro-adjunto
(Marcolino Pisão Pedreiro)
[1] Disponível em www.dgsi.pt, tal como a restante jurisprudência citada sem menção de proveniência.
[2] MANUAL DE PROCEDIMENTO E PROCESSO TRIBUTÁRIO, Almedina, 2012, pag. 257.
[3] INTRODUÇÃO AO PROCESSO CIVIL, Coimbra Editora, 3ª Ed., 2013, pags. 196-199.
[4] DIREITO PROBATÓRIO MATERIAL, Almedina, 2020, pags. 165-166
[6] Sobre a sintonia entre a al. e) do art. 16º do RJAT e do art. 99º, nº 1, da LGT, cfr. Jorge Lopes de Sousa, GUIA DA ARBITRAGEM TRIBUTÁRIA, Coord. Nuno de Villa-Lobos-Tânia Carvalhais Pereira, Revisto e atualizado, 2ª Ed., 2017, pag. 188.
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