SUMÁRIO
Apresentada impugnação de acto de liquidação de IRS e tendo a Autoridade Tributária, na pendência do processo, revogado o acto impugnado de forma a satisfazer plenamente o pedido do sujeito passivo, verifica-se inutilidade superveniente da lide, com a consequente extinção da instância, aplicando-se o regime de responsabilidade pelas custas do nº 4 do artigo 536º do CPC.
DECISÃO ARBITRAL
I - Relatório
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Em 19.01.2024, A... e. B..., NF ... e NF ..., respectivamente, ambos residentes em ..., ..., França, (doravante designados por “Requerentes”), apresentaram em cumulação, PEDIDOS DE PRONÚNCIA ARBITRAL (PPA) com vista à anulação parcial da liquidação de IRS de 2022 nº 2023... de 14.07.2023 (relativa ao primeiro Requerente) e da liquidação nº 2023... de 16.07.2023 (relativa à segunda Requerente) na parte que são superiores a 6.762,00 € por cada sujeito passivo.
Terminam pedindo: “... DEVE A PRESENTE AÇÃO SER JULGADA PROCEDENTE POR PROVADA E, EM CONSEQUÊNCIA, DEVERÃO SER ANULADOS PARCIALMENTE OS ACTOS DE LIQUIDAÇÃO DE IRS NÚMERO 2023 ... e 2023 ...”.
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É demandada a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (AT ou Requerida).
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O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD em 10-01-2024 e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira nesta data.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral o signatário desta decisão, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.
Em 27-02-2024 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral foi constituído em 19-03-2024, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro.
As partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
O processo não enferma de nulidades.
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Notificada a AT para contestar em 20.03.2024, apresentou em 29.04.2024 a Resposta referindo, em resumo, que foi proferido despacho de “revogação do acto impugnado” em 06.03.2024, pela Senhora Subdirectora-Geral da Direcção de Serviços de IRS, sancionando a informação da Senhora Chefe de Divisão da mesma Direcção de Serviços, na qual se conclui e propõe:
“V — Conclusão
Após apreciação do pedido de pronúncia arbitral, afigura-se-nos que deverá ser aplicada nas liquidações o disposto na alínea b) do nº 2 do artigo 43º do CIRS considerando-se o saldo das mais-valias imobiliárias em apenas 50% do seu valor, restituindo-se ao requerente A... o imposto pago a mais e os respetivos juros indemnizatórios.
VI — Proposta de Decisão
Por tudo o exposto, propõe-se que sejam revogados os atos de liquidação de IRS nº 2023... e nº 2023..., referentes ao período de tributação de 2022.”
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Acrescenta que essa revogação “acarreta a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide por perda de objeto (nos termos da alínea e) do artigo 277.º do CPC aplicável ex vi artigo 29.º, nº 1, alínea e) do RJAT), na medida em que a pretensão dos Requerentes foi reconhecida”.
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Em 19.03.2024 os Requerentes vieram ao processo referir que não aceitavam “a revogação do acto tributário nos termos exarados, uma vez que a Requerida, apesar de corrigir o imposto controvertido, cumprindo as normais legais vigentes, não reconhece que ambos os impostos estão correlacionados e são indissociáveis entre si, uma vez que os requerentes são casados, e apenas não realizaram a declaração conjunta e foram tributados em conjunto porque a declaração de rendimentos não permite a tributação conjunta a não residentes no território português”.
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Por despacho de 30.03.2024 foram os Requerentes convidados a exercer o direito ao contraditório, relativamente à Resposta da AT apresentada em 29.04.2024. Não exercerem esta faculdade.
Cumpre decidir.
Consigna-se que aqui não se configura ser aplicável o regime do nº 1 do artigo 13º do RJAT uma vez que o PPA foi entregue no CAAD em 09.01.2024 e automaticamente comunicado à AT em 10.01.2024, tendo a AT designado representante em 01.02.2024, pelo que o prazo de 30 dias estava precludido à data em que foi junta ao processo a decisão revogatória dos actos impugnados (12.03.2024) e bem assim na data em que foi proferida a decisão (06.03.2024).
É isento de dúvidas ou interpretações que a decisão de revogação dos actos impugnados satisfez plenamente o pedido feito pelos Requerentes, uma vez que tudo o que foi pedido foi satisfeito voluntariamente pela Requerida (anulação parcial das liquidações impugnadas).
A AT refere, quanto ao teor do Requerimento de 19.03.1024 dos Requerentes, que a leitura aí propugnada não está em conformidade, visto que os sujeitos passivos submeteram a declaração de rendimentos com o regime regra da tributação separada, não tendo efetuado, conforme poderiam, a opção pela tributação conjunta dos rendimentos. reafirmando-se que os Requerentes “em 22/05/2023. submeteram cada, a declaração de rendimentos, modelo 3 de IRS, como não residentes, referentes ao ano de 2022, nº ...- 2022 - ...- ..., e nº ... - 2022 - ...- ,.., com rendimentos declarados no quadro 4 do anexo G. Realização: Ano 2022107 — 107.000,00€; Aquisição: Ano 2014/03 - 30 000,00 €, Despesas e encargos - 27.500,00€ (...-U-... . fração AR, quota parte 50%), ou seja, cada um dos Requerentes declarou 50% da totalidade da mais valia (não se vislumbrando que de uma tributação conjunta dos rendimentos, fosse apurado outro montante de Imposto a pagar, porquanto nesse caso teriam de declarar 100% da mais valia, o que é igual a cada um declarar 50% da totalidade da mais valia)”.
Note-se ainda que não foi formulado qualquer pedido visando a apreciação da eventualidade dos Requerentes não terem tido a possibilidade de apresentarem a declaração conjunta e terem sido tributados separadamente porque o sistema informático de recolha de declarações de rendimentos não permitiria a tributação conjunta a não residentes no território português.
Pelo que, quanto a este desiderato, face ao nº 1 do artigo 3º do CPC aqui aplicável supletivamente, não poderá pronunciar-se o Tribunal.
II - Decisão
Nos termos e com os fundamentos expostos, o Tribunal Arbitral decide julgar verificada a causa de extinção da instância por inutilidade superveniente da lide nos termos da alínea e) do artigo 277.º do CPC aplicável ex vi artigo 29.º, nº 1, alínea e) do RJAT.
III - Valor do processo
Fixa-se o valor do processo em € 13 524,00 por ser o montante indicado pelos Requerentes que não mereceu reparo da AT, nos termos do artigo 97.º -A, n.º 1, alínea a do CPPT, aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT e artigo n.º 2 do Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
IV - Custas
Custas pela Requerida por força do regime específico do artigo 536º nº 4 do CPC, sendo o seu montante fixado em 918,00 euros.
Lisboa, 21 de Maio de 2024
O Árbitro,
Augusto Vieira