Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 368/2023-T
Data da decisão: 2024-05-23  IVA  
Valor do pedido: € 170.516,13
Tema: IVA – Anulação de operações de exportação; regularização de imposto sobre vendas anuladas sem documento comprovativo do conhecimento pelo adquirente.

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Sumário:

I - As vendas para exportação de que seja emitida fatura e as mercadorias não sejam colocadas à disposição do adquirente não estão sujeitas a IVA se forem posteriormente anuladas pela emissão de notas de crédito.

II - O artigo 78.º, n.º 5, do CIVA exige, para que o emitente de uma nota de crédito tenha direito à regularização do IVA, a comprovação de que o cliente, seja qual for a sua natureza, tomou conhecimento da retificação ou de que foi reembolsado do imposto.

 

ACÓRDÃO ARBITRAL

 

Os árbitros Rui Duarte Morais (presidente), Nuno Maldonado Sousa (adjunto relator), e Raquel Montes Fernandes (adjunta), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formar o Tribunal Arbitral Coletivo constituído em 31-07-2023, decidem no processo acima identificado nos seguintes termos:

 

Relatório

 

A..., S.A., com sede na Rua ..., n.º..., ...-... Porto, doravante designada por “Requerente”, titular do número de identificação de pessoa coletiva ..., requereu a constituição de tribunal arbitral nos termos do regime jurídico da arbitragem em matéria tributária constante do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (“RJAT”).

 

  1. A Requerente peticiona, a título principal, a anulação das liquidações adicionais de Imposto sobre o Valor Acrescentado (“IVA”), respeitantes ao ano de 2019, no valor de € 151.420,40 e juros compensatórios no valor de € 19.095,73, identificadas seguidamente:

 

 

Pede ainda que a AT seja condenada na restituição dos montantes entretanto pagos em plano prestacional e no pagamento de juros indemnizatórios respetivos, nos termos do artigo 43.º da Lei Geral Tributária (“LGT”).

 

2- O seu pedido assenta na alegação de:

- violação das as regras da incidência do IVA, constantes do artigo 1.º, n.º 1, alínea a) do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (“CIVA”), e do princípio da legalidade tributária, que consta do artigo 55.º da LGT e do artigo 103.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa (“CRP”) (pág. 9 do PPA[1]).

- erro na interpretação e na aplicação do artigo 78.º do CIVA, com referência a “IVA não liquidado em exportações não comprovadas” e “a regularizações de IVA em exportações não comprovadas” (pág. 10 do PPA).

- aponta ainda como vício dos atos tributários a falta de fundamentação legalmente exigida, em violação das regras do artigo 77.º da LGT e do artigo 268.º, n.º 3 da CRP, na modalidade da contradição entre os fundamentos invocados e as correções efetuadas (artigo 101.º e seguintes do PPA, maxime artigo 109.º) e a falta de prossecução dos princípios do inquisitório e da busca da verdade material, previstos no artigo 58.º da LGT (123.º do PPA).

 

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, doravante designada também pelas formas abreviadas “AT” ou “Requerida”, que sustenta as liquidações, afirmando que foram feitas no cumprimento das regras que disciplinam o IVA, em especial as que regulam o IVA nas exportações para países terceiros e a anulação de operações internas motivada pela devolução de bens vendidos.

 

 

  1. Tramitação

 

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi feito em 19-05-2023 e aceite pelo Presidente do CAAD em 22-05-2023, que em 26-05-2023 o notificou à Requerida.

Os árbitros identificados e signatários deste acórdão, manifestaram a aceitação das suas funções no prazo legal.

 Em 11-07-2023, as partes foram notificadas da designação dos árbitros e não manifestaram intenção de os recusar, nos termos previstos nas normas do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e nas normas dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Em conformidade com a disciplina constante do artigo 11.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 31-07-2023.

O prazo para a decisão foi prorrogado por dois meses, por despacho fundamentado que consta da ata da reunião com as partes em 09-01-2024 e por mais dois meses em 25-03-2024, também com indicação do respetivo fundamento.

A Requerida apresentou resposta (“R-AT”) em 02-10-2023, que concluiu afirmando que o pedido do Requerente deve ser julgado improcedente, por não provado e a AT absolvida dos pedidos.

Foi junto o processo administrativo (“PA”) e, foram juntos documentos de natureza probatória pela Requerente.

Em 09-01-2024, realizou-se a primeira reunião do Tribunal Arbitral com as Partes e nela foram ouvidas as testemunhas. Foi ajustada a tramitação processual, no sentido de as Partes apresentarem alegações por escrito, o que fizeram em tempo oportuno.

 

Saneamento

 

O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído, em subordinação às normas dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do RJAT, e é competente.

O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado em 19-05-2023, antes do termo do prazo previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do já referido regime, considerando que a data-limite para pagamento dos atos sub judicio foi fixado para 20-02-2023.

As partes estão devidamente patrocinadas e a Requerida goza de personalidade e capacidade judiciárias (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo regime e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

O processo não enferma de nulidades pelo que cumpre decidi-lo.

 

 

Decisão da matéria de facto

 

Matéria de facto assente

 

Para decidir a ação este Tribunal considera assente:

 

A Requerente desenvolve a sua atividade, desde 1978, no âmbito do retalho de ourivesaria e relojoaria. (PPA, 1.º: PA[2], p. 6)

A Requerente desenvolve aquela sua atividade através de três instalações físicas, abertas ao público, duas no Porto e uma em Lisboa e através de comércio eletrónico pelo sistema de vendas on-line e faz vendas a retalho para empresas ou para particulares no mercado nacional e no internacional. (PPA, 2.º e 4; PA, p. 6)

A Requerente está inscrita, desde 1986, no regime normal mensal do IVA. (PPA, 3.º: PA, p. 6)

No âmbito de operações de venda a empresas, para fora do território da União Europeia, que designa por “exportações”, a Requerente não faz liquidação de IVA. (PPA, 5.º)

Durante ao ano de 2019 a Requerente realizou operações de vendas de diversos produtos para exportação que vieram posteriormente a ser anuladas. (PPA, 6.º)

As encomendas dos clientes a que se refere o item anterior foram realizadas em finais de 2019. (PPA, 7.º)

Em finais de 2019 surgiu o SARS-COV-2 na República Popular da China, situação que teve um impacto enorme na economia global, levando a uma retração dos agentes económicos. (PPA, 7.º e 8.º; facto notório do conhecimento geral)

 As encomendas das peças de ourivesaria e relojoaria que a Requerente comercializa só são expedidas para o adquirente quando são pagas as respetivas faturas, consequentemente os bens eram colocados à disposição do cliente, desde que este pagasse o respetivo preço. (PPA, 9.º e 10.º)

Quando a Requerente e cada um dos seus clientes chegavam a acordo relativamente aos elementos essenciais do negócio, designadamente a concreta peça de relojoaria e o respetivo preço, a Requerente emitia a fatura. (PPA, 11º)

As clientes sociedade B... Inc, a sociedade C... e a sociedade D..., Ltd., sediadas no Japão, e a sociedade E..., sediada em Hong Kong, protelaram várias vezes o pagamento, com a justificação na incerteza da evolução do negócio, tendo em conta o impacto da pandemia SARS-COV-2. (PPA, 12.º)

A Requerente foi acompanhando a situação na expectativa de que cada cliente pagasse o valor em dívida, para depois expedir as mercadorias, mas as clientes referidas no item anterior, acabaram por desistir da compra dos bens. (PPA, 13.º e 14.º).

 As operações com os clientes referidos em “J” e “K” foram anuladas, através da emissão das seguintes quatro notas de crédito: (PPA, 14.º: docs. 21, 22, 23 e 24)

 

Em 2019, no âmbito da venda a retalho, a Requerente realizou a venda de peças de ourivesaria a cinco cidadãs de nacionalidade angolana, titulada pelas faturas com os seguintes números e cujos valores indicados incluem IVA: (PPA, 17.º; PA, considerado no seu conjunto, maxime pp. 23-29)

- FV17000244, no valor de € 71.5000,00;

- FV17000271 e FV17000301, no valor de € 128.700,00;

- FV17000245, no valor de € 52.000,01;

- FV17000287 e FV17000034, no valor de € 30.529,99;

- 2914283, no valor de € 68.650,01.

Relativamente a clientes habituais, com os quais se vai desenvolvendo uma relação de confiança, a Requerente pratica uma política de devoluções com flexibilidade. (PPA, 19.º)

As clientes referidas em “M” decidiram que não queriam aquelas peças de ourivesaria, optando por outras, pelo que a Requerente anulou as operações de venda, através das notas de crédito NC19/000010, NC19/000012, NC19/000016, NC19/000017 e NC19/000023, e regularizou o respetivo IVA ao abrigo do art.º 78 n.º 2. (PPA, 20º e 21º; PA, considerado no seu conjunto, maxime pp. 23-29).

Durante o ano de 2022 a Requerente foi alvo de uma inspeção tributária ao abrigo da OI 2022... de âmbito parcial, compreendendo o IVA e o Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”), relativamente ao ano de 2019. (PPA, 23.º; PA: p. 1)

Em 28 de Novembro de 2022 a Requerente foi notificada do projeto de Relatório de Inspeção Tributária e sobre ele exerceu o seu direito de audição. (PPA, 25º e 26.º: doc. 25)

Na versão final do relatório de inspeção tributária, pode ler-se, para além de tudo o mais que dele consta[3]: (PPA, 23.º: PA, pp. 17-23)

V.2 IVA não liquidado (Exportações não comprovadas)

O sujeito passivo, no mês de dezembro de 2019, contabilizou, a título de vendas (conta 71131) as seguintes faturas, a clientes no valor total de 372.674,78€ (valor isento de IVA, ao abrigo do art.º 14º n.º 1 a) do CIVA):

 

NOTA: As referidas faturas têm inscrito como justificação da isenção “ISENTO DE IVA AO ABRIGO DO ARTIGO 14, N.º 1, ALINEA A) DO CODIGO DO IVA”

 

Os clientes B..., C... e D..., LTD são clientes sedeados no Japão enquanto o cliente E... está sedeado em Hong Kong (China).

 

A exportação constitui um regime aduaneiro que permite a expedição de mercadorias comunitárias para um destino situado fora do território aduaneiro da União Europeia. Se os bens são expedidos para fora da União Europeia, seja o seu destinatário um agente económico, ou um particular, aplica-se uma isenção de IVA.

De acordo com o art.º 14º n.º 1 alínea a) do CIVA “1 – Estão isentas do imposto: a) As transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da Comunidade pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste”.

 

Por sua vez, o n.º 8 do artigo 29.º do Código do IVA[4] dispõe que “8 – As transmissões de bens e as prestações de serviços isentas ao abrigo das alíneas a) a j), p) e q) do n.º 1 do artigo 14.º e das alíneas b), c), d) e e) do n.º 1 do artigo 15.º devem ser comprovadas através dos documentos alfandegários apropriados ou, não havendo obrigação legal de intervenção dos serviços aduaneiros, de declarações emitidas pelo adquirente dos bens ou utilizador dos serviços, indicando o destino que lhes irá ser dado.” (sublinhado nosso).

 

Ainda de harmonia com o disposto no n.º 2 do art.º 14.º da Lei Geral Tributária (LGT), os titulares de benefícios fiscais de qualquer natureza são sempre obrigados a revelar à administração tributária os pressupostos da sua concessão, ou a cumprir outras obrigações previstas na lei ou no instrumento de reconhecimento do benefício, nomeadamente as relativas aos impostos sobre a despesa sob pena de os referidos benefícios ficarem sem efeito. Assim, deverá ser comprovada a verificação dos pressupostos daquela isenção (transmissões de bens abrangidas pela al. a) do nº1 do art. 14.º do CIVA).

 

Impõem-se deste modo que as referidas transmissões sejam devidamente comprovadas.

 

A falta dos documentos comprovativos determina a obrigação para o transmitente dos bens ou prestador dos serviços de liquidar o imposto correspondente, conforme dispõe o n.º 9 do mesmo artigo 29.º do CIVA, que refere expressamente que “A falta dos documentos comprovativos referidos no número anterior determina a obrigação para o transmitente dos bens ou prestador dos serviços de liquidar o imposto correspondente”. (sublinhado nosso)

 

Sobre os documentos aduaneiros que comprovam as transmissões isentas refere-se o Ofício-Circulado n.º 15327/2015, de 9 de janeiro de 2015, da Direção de Serviços da Regulação Aduaneira, e a Circular n.º 8/2015.

 

Da análise dos elementos contabilísticos e disponíveis não se verificou a existência de quaisquer documentos comprovativos da exportação dos artigos inscritos nas referidas 4 faturas.

 

Pelo contrário, em todas as outras (32) faturas emitidas pelo sujeito passivo aos clientes já referidos, e às quais aplicou igualmente a isenção prevista no artigo 14º n.º 1 alínea a) do CIVA constavam os documentos comprovativos de exportação (Certificados Comprovativos da Exportação, CCE), cumprindo o disposto no n.º 8 do artigo 29.º do Código do IVA.

 

Deste modo, não se tendo verificado as condições para a atribuição da isenção de IVA nas 4 faturas que perfazem um valor total de 372.674,78 €, foi notificado o sujeito passivo, por escrito no dia 02/08/2022, para entre outras questões, esclarecer estes factos, nos termos que seguem:

 

“2- O sujeito passivo A... SA, contabilizou, a título de vendas (conta 71131) no ano de 2019, as seguintes faturas, no valor total de 372.674,78€ (valor isento de IVA, ao abrigo do art.º 14º n.º 1 a) do CIVA):

 

Relativamente a estas operações solicita-se:

a) Apresentação de documentos alfandegários que atestem a saída de território nacional dos artigos mencionados nos documentos referidos no quadro supra;

b) Apresentação de elementos provatórios das encomendas, nomeadamente mails ou outros;

c) Identificação e apresentação dos meios de pagamento das referidas faturas;

 

(…)

 

Analisada a resposta do sujeito passivo, ressalta, desde logo, a assunção da inexistência de qualquer documento comprovativo de exportação das 4 faturas identificadas, não cumprindo o disposto no artigo 14º nº 1 alínea a), e o artigo 29º n.º 8 e nº 9 do CIVA.

 

Assim, o sujeito passivo vem justificar que as mercadorias não chegaram a ser expedidas para os 3 clientes do Japão e 1 de Hong Kong, derivado da incerteza provocada pelo Covid-19, pelo que foi acompanhando a situação até que esgotadas as negociações as encomendas das referidas faturas foram anuladas, por notas de crédito, que juntou e se resumem de seguida:

 

Relativamente ao facto do sujeito passivo nas 4 faturas aplicar margens brutas superiores a 60% referiu que nem sempre é possível aplicar descontos a todos os modelos de relógios, pois existe pouca margem de negociação junto dos fornecedores. Tais esclarecimentos não têm qualquer correspondência com a realidade, na medida em que o sujeito passivo nas outras faturas de 2019, aplica a estes clientes (com exceção da Opera, por inexistência de mais transações) margens de 3- 7% e nestas 4 faturas, aplica margens superiores a 60%, margens que não correspondem às margens que são recomendadas pelas marcas (PVP – Preço de venda Publico recomendado) e que rondam os 35-38%, pelo que aqui não se trata de aplicação de desconto, mas sim de uma margem muito superior à normal (e recomendada pelas marcas de luxo), e que não é justificada.

 

Conforme decorre da análise das notas de crédito supra inscritas, verifica-se que o sujeito passivo anulou, através da emissão destes documentos, 2 faturas em 30/09/2020 (no valor total de 160.780,49 €) e outras 2 faturas em 16/07/2021 (no valor total de 211.894,29 €), ou seja, 9 e 19 meses após a emissão das faturas em causa, não se conseguindo perceber as motivações para tal demora. Mais, as faturas somente devem ser emitidas, nos termos do artigo 7º, 8º e 36º do CIVA quando exista um elevado grau de certeza de que os artigos seriam exportados, e não com meras intenções/encomendas que o sujeito passivo não comprova nem justifica. Relembre-se que estamos a falar de 4 clientes distintos que, por coincidência, e no mesmo mês não deram seguimento a encomendas feitas por motivos que não são comprovados.

 

Em resumo, o sujeito passivo, faz uma série de considerações genéricas, não comprovadas, muitas delas contraditórias e que não justificam a não liquidação de IVA à taxa normal, à luz das regras vigentes, das 4 faturas de exportação contabilizadas em dezembro de 2019 e que perfazem um valor total de 372.674,78 €.

 

Conforme já se deu nota, as exportações de mercadorias e bens estão isentas de IVA, sendo que para beneficiarem desta isenção têm de obedecer a requisitos formais para que tal isenção se verifique. Tais requisitos previstos no artigo 29 n.º 8 do CIVA não foram cumpridos, conforme se deu nota.

 

Deste modo, o sujeito passivo deveria ter procedido à liquidação do IVA (conforme decorre artigo 29º n.º 9 do CIVA) em dezembro de 2019 (1209), à taxa normal (23%), nas 4 faturas, conforme quadro que segue:

 

 

Na versão final do relatório de inspeção tributária, pode ler-se, para além de tudo o mais que dele consta[5]: (PPA, 23.º: PA, pp. 30-35)

(…)

No que concerne às correções, em sede de IVA, constantes do ponto V.2 IVA não liquidado

(Exportações não comprovadas), do Projeto de relatório o sujeito passivo vem, reafirmar no item designado por B.1 - IVA não liquidado (Exportações não comprovadas), basicamente, o anteriormente exposto nos esclarecimentos prestados, nomeadamente que as faturas em questão foram emitidas na sequência de encomendas e que posteriormente os clientes desistiram das suas encomendas, dando como justificação para tal desistência o aparecimento do COVID 19.

 

Mais alegou que “como bem se compreenderá, a encomenda dos bens (de elevado valor comercial) que a requerente comercializa só é expedida para o adquirente no momento em que é paga a respectiva fatura”. Do alegado pelo sujeito passivo resulta que os bens estavam à disposição do cliente, desde que este pagasse o respetivo preço, e que apesar do negócio não estar concluído a requerente tem de emitir a fatura para que o cliente possa pagar.

 

Desde logo, e a este propósito, importa referir que nem sempre a prática, durante o ano de 2019, da A... SA, confirma o alegado neste direito de audição, na medida em que, em algumas situações, a mercadoria foi expedida para estes clientes sem que o pagamento tivesse sido efetuado, pelo que não colhe o argumento apresentado de que as mercadorias somente seguem com o pagamento efetuado. A titulo de exemplo, pode referir-se a fatura n.º FV19/000004 (de 22/01/2019) e FV19000094 (de 09/07/2019) emitidas a E... na qual as mercadorias constantes das mesmas foram expedidas para Hong Kong em 01/02/2019 e 11/07/2019, respetivamente, sem que as mesmas tivessem sido pagas.

 

No entanto, conforme decorre facilmente da análise das contas correntes destes 4 clientes extracomunitários, a prática mais generalizada era a de efetivamente o pagamento das faturas acontecer nos dias imediatamente subsequentes (2, 3, 4 ou 5 dias) à sua emissão.

 

Ora, nos casos em apreço, segundo o sujeito passivo, tal não aconteceu, tendo os clientes acabado por desistir da compra dos bens, o que determinou que as operações fossem anuladas através da emissão de 4 notas de crédito, e que tendo sido anulada a operação, desapareceu o facto tributário – transmissão de bens - que determina a incidência em IVA (artº 1º n.º 1 a) do CIVA). Refere ainda que “se a operação foi anulada, não existe facto tributário de incidência de imposto e se não existe facto tributário não é necessário a verificação dos factos da isenção pois qualquer isenção só opera se houver sujeição a imposto, concluindo que a correção projetada está assente numa ficção e que “face ao exposto, a correção projetada no âmbito do IVA não liquidado em exportações, viola as regras de incidência do IVA e (art.º 1º/1-a) do CIVA), o principio da legalidade tributária (arts 55º da Lei Geral Tributária e 103º/2 da Constituição da Republica Portuguesa).”

 

Ora, como referido pelo sujeito passivo no direito de audição os bens foram colocados à disposição do cliente e que o sujeito passivo emitiu as facturas. A fundamentação legal apresentada pelo sujeito passivo para a não aceitação da correção proposta, em sede de IVA, para as 4 faturas no valor de 85.715,20€ (falta de liquidação de imposto), não tem correspondência com o enquadramento legal, em sede de IVA, porquanto, dispõe o artigo 7º (Facto gerador e exigibilidade do imposto) n.º 1 a) do CIVA expressamente que:

“1 – Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, o imposto é devido e torna-se exigível:

a) Nas transmissões de bens, no momento em que os bens são postos à disposição do adquirente; (…)”

 

Por sua vez, dispõe o artigo 8º do Código do IVA, sob a epigrafe “Exigibilidade do imposto em caso de obrigação de emitir factura”, o seguinte:

 

(…)

 

O artigo 44º (Requisitos da contabilidade) dispõe que:

 

(…)

 

E o artigo 45º (Registo das operações em caso de emissão de faturas) dispõe no seu n.º 1 que:

 

(…)

 

Assim, sempre que a transmissão de bens ou a prestação de serviços dêem lugar à obrigação de emitir uma fatura ou documento equivalente, nos termos do artigo 29.º do Código do IVA, o imposto torna-se exigível, se o prazo previsto para a emissão da fatura for respeitado, no momento da sua emissão. No caso em análise, contrariamente ao alegado pelo sujeito passivo, o imposto tornou-se exigível na data da emissão das respetivas faturas. Aquando da emissão das referidas faturas o sujeito passivo não liquidou IVA, nos termos do artigo 14.º do Código do IVA.

 

Por sua vez, dispõe o artigo 14º do Código do IVA, sob a epigrafe “Isenções nas exportações

operações assimiladas e transportes internacionais”, o seguinte:

 

(…)

 

Todavia, as transmissões de bens elencadas na alínea a) do n.º 1 do artigo 14.º do Código do IVA são isentas de IVA, desde que comprovadas através dos documentos alfandegários apropriados, conforme determina o artigo 29.º, nº 8 do Código do IVA. A falta dos documentos comprovativos referidos determina a obrigação para o transmitente dos bens de liquidar o imposto, nos termos do disposto no artigo 29.º, n.º 9 do Código do IVA. Conforme amplamente explanado no ponto V.2 IVA não liquidado (Exportações não comprovadas) do presente Relatório o sujeito passivo, não obstante ter sido notificado para o efeito, não apresentou documentos comprovativos da isenção.

 

Por sua vez, o sujeito passivo também não apresenta qualquer prova do alegado, a saber as encomendas, as respetivas anulações/suspensões das encomendas e os contornos dos negócios em causa, bem como o paradeiro das mercadorias. A acrescer, não se consegue determinar qualquer relação de causalidade da desistência por motivos imputáveis do Covid 19, na medida em que 3 dos clientes são do Japão e o Covid 19 somente teve impacto neste país alguns meses após dezembro de 2019. Ou seja, o sujeito passivo continua a fazer uma série de considerações genéricas, não comprovadas, muitas delas contraditórias e que não justificam a não liquidação de IVA à taxa normal.

 

O sujeito passivo vem referir que tendo sido anuladas as operações através da emissão das 4 notas de crédito desapareceu o facto tributário nos termos do artº 1º n.º 1 alínea a) do CIVA e se não existe facto tributário não é necessário a verificação dos factos da isenção, pois qualquer isenção só opera se houver sujeição a imposto, concluindo que a correção projetada está assente numa ficção.

 

Contrariamente ao alegado pelo sujeito passivo, a emissão das notas de crédito, decorridos 9 meses e 19 meses, da data de emissão das faturas a anular, não faz desaparecer o facto gerador e a exigibilidade do imposto, aquando da emissão das respetivas faturas. Por sua vez, aquando da emissão das notas de crédito e cumprido o disposto no n.º 5 do artigo 78º do Código do IVA, isto é, quando o sujeito passivo tiver na sua posse prova de que o adquirente tomou conhecimento da retificação ou de que foi reembolsado do imposto, pode efetuar a regularização a favor do sujeito passivo.

 

O sujeito passivo, não comprovou a anulação das 4 faturas através da emissão de 4 notas de crédito (emitidas após 9 e 19 meses da emissão das faturas em causa), quando poderia ter anulado as faturas diretamente (antes de ser comunicada à Autoridade Tributária e Aduaneira) ou através da emissão de notas de crédito, nos termos do artigo 78º n.º 2 do CIVA, ainda no ano de 2019. Aliás, o sujeito passivo anulou para estes clientes, no ano de 2019, 5 faturas através da emissão de notas de crédito nos dias subsequentes à emissão das mesmas, ao contrário das faturas em análise, conforme segue:

 

O sujeito passivo, conforme se deu nota, emitiu e contabilizou as 4 faturas no ano de 2019, as quais foram contabilizadas em ganhos (vendas), não liquidando IVA, nos termos do artigo 14º do CIVA. Mais, as mercadorias constantes das 4 faturas não constam do inventário final de 2019, o que também faz presumir a transmissão dos bens. Nestes termos, não pode vir o sujeito passivo alegar que inexistiu facto tributário, e que tudo assenta numa ficção.

 

Ora, se os bens estavam à disposição do cliente, conforme referiu o sujeito passivo o facto gerador e sua exigibilidade verificaram-se, nos termos do artigo 7º e 8º do CIVA, pelo que as regras de incidência e da sua eventual isenção teriam de obedecer às regras estipuladas no código do IVA, a que se fez referência.

 

Conforme já se deu nota, as exportações de mercadorias e bens estão isentas de IVA, nos termos do artigo 14º do CIVA, sendo que para beneficiarem desta isenção têm de obedecer a requisitos formais para que tal isenção se verifique. Tais requisitos previstos no artigo 29º n.º 8 do CIVA não foram cumpridos, pelo que o alegado pelo sujeito passivo não altera as conclusões extraídas, em sede de Projeto de relatório.

 

Assim, não tendo o sujeito passivo apresentado, no exercício do direito de audição, quaisquer

elementos ou documentos adicionais que conduza a conclusões diferentes das produzidas, mantêm-se as correções propostas no Projeto de Relatório.

 

Na versão final do relatório de inspeção tributária, pode ler-se, para além de tudo o mais que dele consta[6]: (PPA, 23.º: PA, pp. 23-29)

V.3 Regularizações de IVA não aceites (Imposto em falta)

O sujeito passivo A... SA, contabilizou, no ano de 2019, a título de devolução de vendas (conta 71711), 5 Notas de Crédito (NC), emitidas a cidadãs com residência em Angola no valor total de 351.380,01€ (valor com IVA à taxa normal incluído), conforme mapa infra:

 

O sujeito passivo regularizou a seu favor (campo 40) o IVA constante das referidas NC nas declarações periódicas mensais de IVA.

 

As NC supra mencionadas têm inscrito o n.º da fatura que originou a devolução, bem como a data da sua emissão (na maioria dos casos). Nenhuma das referidas 5 Notas de Crédito encontravam-se assinadas pelas clientes, nem tinham qualquer documento anexo que demonstrassem que as clientes tinham tido conhecimento da retificação ou de que foi reembolsado do imposto.

 

O artigo 78º (Regularizações) do CIVA dispõe que:

(…)

Posto isto, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 78.º do Código do IVA, o emitente das faturas pode efetuar a dedução do correspondente imposto até ao final do período de imposto seguinte àquele em que se verificarem as circunstâncias que determinaram a anulação da liquidação ou a redução do seu valor tributável.

 

Sendo que, de acordo com o n.º 5 do mesmo artigo, essa regularização a favor do sujeito passivo apenas pode ser efetuada quando estiver na posse de prova de que o adquirente tomou conhecimento da retificação ou de que foi reembolsado do imposto, sem o que se considera indevida a respetiva dedução. Conforme já se deu nota, tal não sucedeu, pelo que, no caso em apreciação, essa regularização não poderia ser aceite.

 

Entre a data da fatura e a da devolução podem decorrer até 4 anos, sendo, mesmo assim, possível proceder à regularização do IVA. Mas ocorrida a devolução, o fornecedor, caso pretenda efetuar a regularização, terá de fazê-la no mês (ou trimestre) em que esses factos ocorrerem, ou o mais tardar, no mês (ou trimestre) seguinte.

 

Deste modo, havendo indícios de não se terem verificado as condições para a regularização do IVA, a favor do A... nas 5 NC que perfazem um valor total de 65.705,20€, foi notificado o sujeito passivo, por escrito no dia 2/08/2022, para entre outras questões, esclarecer estes factos, nos termos que seguem:

 

(…)

 

O sujeito passivo em resposta por escrito, constante do processo inspetivo, vem referir que a

regularização do IVA a seu favor foi efetuada nos termos do n.º 2 do Art.º 78 do CIVA. Mais, refere que a mercadoria constante das NC foi devolvida em mão, e que as NC não estão assinadas pelo facto das clientes serem consumidores finais, pelo que o documentos solicitados não se justificam por estarmos na presença de não sujeitos passivos de imposto, argumentação esta que carece de qualquer cabimento legal, na medida em que não existe qualquer disposição legal que dispense os consumidores finais de terem conhecimento das NC. Contrariamente ao alegado pelo sujeito passivo, no que tange às notas de crédito emitidas para particulares tal situação não desobriga o sujeito passivo a dar cumprimento ao disposto no n.º 5 do art.º 78.º do CIVA designadamente exibir prova de que os clientes tomaram conhecimento da retificação ou de que foram reembolsados do imposto sob pena de se verificar um eventual enriquecimento sem causa por parte do sujeito passivo.

 

Para além do referido, não indicou nem apresentou qualquer outro meio pelo qual as clientes tivessem tido conhecimentos das NC (ou seja, provar que reembolsou o seu adquirente, ou que este tomou conhecimento da retificação).

 

O sujeito passivo juntou ainda as faturas identificadas nas NC, bem como o extrato de conta dos clientes constantes das mesmas. As faturas identificadas nas NC confirmam a informação já previamente obtida (o n.º e a data de emissão), tendo sido possível com esta informação completar as datas das faturas que não constavam das NC, conforme segue:

 

 

Tendo sido referido que as mercadorias foram entregues em mão, foi ainda remetido ofício ao SEF, (…)

(…)

da informação obtida do SEF, não existe qualquer indicio de que as clientes constantes das 5 Notas de Crédito tenham estado em território nacional no ano de 2019.

 

Posto o anteriormente exposto, fica demonstrado que o sujeito passivo não deu cumprimento ao artigo 78º n.º 5 do CIVA, sendo que os esclarecimentos prestados pelo sujeito passivo, somente vieram confirmar os indícios recolhidos, pelo que não será de aceitar a regularização do IVA (a retirar) constante das referidas NC, conforme segue:

 

 

Na versão final do Relatório de Inspeção Tributária, pode ler-se, para além de tudo o mais que dele consta[7]: (PPA, 23.º: PA, pp. 35-36)

Por último, o sujeito passivo vem, no item designado B.2- Regularizações de IVA (Exportações não comprovadas) nos seus pontos 18 a 39 do direito de audição, procurar rebater o ponto V.3 Regularizações de IVA não aceites (Imposto em falta) do projeto de relatório.

 

O sujeito passivo vem novamente reforçar a ideia de que a AT incorreu em erro na interpretação e na aplicação da lei do previsto no art.º 78º (regularizações) do CIVA, referindo que, na sua interpretação, quando as regularizações são efetuadas, por emissão de nota de crédito, nos termos do art. 78º, para particulares (“Business to consumer”), “não é necessário observar o disposto no n.º 5 do art.º 78 do CIVA, isto porque não houve o exercício do direito à dedução por parte do adquirente, na medida em que não é sujeito passivo do mesmo.” O Sujeito passivo consubstancia este argumento com base no artigo 78º n.º 2, 4 e 5 do CIVA que, na sua ótica, devem ser interpretados em conjunto.

 

Esta argumentação já havia sido utilizada pelo sujeito passivo pelo que se reafirma o anteriormente referido em sede de projeto de relatório, a saber que esta argumentação carece de qualquer cabimento legal, na medida em que não existe qualquer disposição legal que dispense os consumidores finais de terem conhecimento das notas de crédito. Contrariamente ao alegado pelo sujeito passivo, no que tange às notas de crédito emitidas para particulares tal situação não desobriga o sujeito passivo a dar cumprimento ao disposto no n.º 5 do art.º 78.º do CIVA designadamente exibir prova de que os clientes tomaram conhecimento da retificação ou de que foram reembolsados do imposto sob pena de se verificar um eventual enriquecimento sem causa por parte do sujeito passivo. O artigo 78º do CIVA prevê regularizações de IVA a favor do sujeito passivo, desde que ele cumpra com todos os requisitos formais (e não formais) previstos na lei. O sujeito passivo objetivamente não cumpriu nem comprovou estes requisitos.

 

O artigo 78º n.º 5 do CIVA, dispõe que:

“5 – Quando o valor tributável de uma operação ou o respetivo imposto sofrerem retificação para menos, a regularização a favor do sujeito passivo só pode ser efetuada quando este tiver na sua posse prova de que o adquirente tomou conhecimento da retificação ou de que foi reembolsado do imposto, sem o que se considera indevida a respetiva dedução.” (sublinhado nosso).

 

Ou seja, refere expressamente o “adquirente” e não o sujeito passivo, conceitos claramente diferentes dos preconizados no direito de audição, pelo que o sujeito passivo é que incorre em errónea interpretação da lei que regula as regularizações de IVA, nos termos do art.º 78 do CIVA.

 

Por último, o sujeito passivo vem invocar os princípios de neutralidade de IVA e da proporcionalidade citando alegadas decisões (que não identifica, e que como tal impedem a pronuncia sobre tais decisões) do tribunal de justiça da união europeia (TJUE), e que não acrescentam qualquer facto novo aos argumentos anteriormente utilizados.

 

Assim, face ao exposto, e não tendo o sujeito passivo apresentado quaisquer elementos/argumentos que alterassem as correções do Projeto de Relatório notificado ao sujeito passivo, procede-se à elaboração do Relatório em conformidade com as correções propostas anteriormente.

 

As conclusões do Relatório de Inspeção Tributária tiveram despacho de concordância da chefe de divisão em 22-12-2022. (R-AT, 6.º: PA, p. 1)

Em 23 de Dezembro de 2022, a Requerente foi notificada das conclusões da ação de inspeção, onde foi decidido proceder às correções de natureza meramente aritmética resultante de imposição legal, relativamente ao exercício de 2019: (PPA, 28.º; PA, p. 3)

- Correções à matéria coletável relativamente ao IRC: € 124.647,16;

- Imposto em falta, IVA: € 151.420,40.

A Requerente foi notificada das liquidações de IVA, relativamente aos períodos de tributação de 02/2019, 03/2029, 04/2019, 07/2019 e 12/2019, e de juros compensatórios, no valor global de € 170.516,13. (PPA, 7.º e 8.º: documentos n.ºs 1, 3, 5, 7, 9, 11, 13, 15 e 17)

As liquidações de IVA contestadas foram efetuadas ao abrigo da ordem de serviço externa n.º OI2022..., a qual decorreu entre a data de início de 28-06-2022 e a data de conclusão da ação em 22-12-2022. (R-AT, 3.º; PA)

As liquidações adicionais de IVA tiveram por base as seguintes correções: (R-AT, 4.º; PA)

 

A Requerente optou por não impugnar as liquidações adicionais de IRC (PPA, 31, nota 2)

Os bens a que se refere a liquidação de IVA do período 1219, no valor de 85.715,20 €, não chegaram a sair do país com destino a estados terceiros. (R-AT, 8.º, sem contestação nas subsequentes alegações da Requerente)

A Requerente realizou o pagamento em prestações do valor em dívida resultante das liquidações impugnadas. (PPA: 125.º; pagamento não contestado pela Requerida e implicitamente aceite, na medida em que se opõe ao pagamento de juros indemnizatórios, em 75.º e 76.º da R-AT)

 

Factos não provados

Da matéria de facto trazida aos autos pela Requerente no PPA, não se consideraram provadas as afirmações de natureza factual contidas em 77.º do referido PPA, designadamente que, “os bens devolvidos encontram-se no inventário(!) da Recorrente (ao tempo da inspeção)”. Embora a Requerente faça uma remissão expressa para o RIT (“cfr. fls. 28 do RIT”), esta afirmação encontra-se, de algum modo, em contradição com a versão final que se pode ler no PA, a fls. 34 (numeração do ficheiro pdf), onde os Serviços de Inspeção da AT afirmam “as mercadorias constantes das 4 faturas não constam do inventário final de 2019, o que também faz presumir a transmissão dos bens.”. Não se localizou nos autos qualquer outra versão do RIT, onde pudesse ser confirmada a afirmação da Requerente. Não foi produzida qualquer prova relativamente a esta alegação de facto.

Embora não constem do PPA, que é o local próprio para trazer os factos relevantes perante o Tribunal, nas suas Alegações, a Requerente clarifica outros alegados factos, que não se podem considerar provados, designadamente: que tenha acordado com os seus clientes a anulação por acordo da venda dos bens, e que os bens tenham sucessivamente entrado e saído do seu inventário contabilístico. A movimentação contabilística é, por regra, documentada e os documentos que a Requerente invoca como meios de prova não têm essa natureza, pois são, afinal, o requerimento com o seu exercício do direito de audição, que não é mais que o depósito das suas próprias declarações (o documento n.º 25 do PPA), e um simples papel branco, com um quadro numérico pouco esclarecedor, que não tem timbre, assinatura ou qualquer sinal de constituir um documento da sua contabilidade (o documento n.º 26 do PPA). Aliás, como resulta da conjugação dos elementos recolhidos nos autos, o registo do inventário da Requerente do período em causa oferece fundadas dúvidas quanto à sua fiabilidade, pois foi objeto de crítica no RIT e gerou uma correção da matéria coletável de IRC de 124.647,16 € (cfr. RIT, PA, maxime pp. 3 e 9-17) que a Requerente aceitou e com a qual se conformou (cfr. PPA, artigo .31.º, nota de rodapé).

 

Fundamentação da seleção da matéria de facto

Ao Tribunal Arbitral incumbe o dever de selecionar os factos que interessam à decisão da causa e discriminar a matéria que julga provada e declarar a que considera não provada, não tendo de se pronunciar sobre todos os elementos da matéria de facto alegados pelas partes, tal como decorre da aplicação conjugada do artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e do artigo 607.º, n.º 3, do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT. Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram selecionados e conformados em função da sua relevância jurídica, determinada com base nas posições assumidas pelas partes e nas várias soluções plausíveis das questões de direito para o objeto do litígio, conforme decorre do artigo 596.º, n.º 1 do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.

Os factos dados como provados resultaram do confronto da posição manifestada relativamente a cada facto pelas Partes e da apreciação da prova documental, o que foi feito com base nas regras da experiência, da normalidade e da racionalidade, em conformidade com o previsto no artigo 16.º, alínea e) do RJAT, bem como no artigo 607.º, n.º 5 do CPC aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT, das quais resulta que o julgador apreciará livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto. A prova documental encontra-se identificada relativamente a cada facto, junto ao seu relacionamento.

A prova testemunhal promovida pela Requerente, prestada pelo seu diretor financeiro …, permitiu sobretudo entender o modo de operar da Requerente, em situações como as que os autos reportam, o que permitiu assentar a matéria que consta de E, F, H, I, J, K, M e N, mas não logrou comprovar a efetiva prática de determinados atos com natureza formal, nomeadamente os acordos de resolução dos negócios jurídicos, que não foram documentados nos autos, não permitindo o confronto da testemunha com esses registos.

 

Fundamentação – matéria de direito

 

A posição das partes e o objeto do litígio

 

A motivação dos atos tributários impugnados, que são as liquidações de IVA, apresenta a seguinte linha de raciocínio: no âmbito da inspeção tributária levada a efeito, a AT considera ter constatado irregularidades no tratamento de IVA a dois níveis: (i) IVA não liquidado, relativo a exportações que considera não terem sido comprovadas; (ii) regularizações de IVA não aceites por inexistência de confirmação nas notas de crédito que pretendem anular operações de devolução de artigos.

 

No que concerne ao IVA não liquidado em operações de exportação, a AT considera que em dezembro de 2019 a Requerente vendeu a entidades não residentes na União Europeia, mais exatamente no Japão e na China, produtos no valor total de 372 674,78 € e emitiu as respetivas faturas, não liquidou IVA e inscreveu nessas faturas a menção à isenção de imposto “ao abrigo do artigo 14, n.º 1, alínea a) do Código do IVA”. Estas transações não se encontram sustentadas através de documentação alfandegária ou qualquer outra, nomeadamente notas de encomenda. Consequentemente era obrigação da Requerente, enquanto transmitente dos bens, liquidar o imposto nos termos da norma do artigo 29.º, n.º 9 do CIVA.

Sustenta ainda a AT que ainda que as vendas possam ter sido “anuladas”, essa resolução do negócio tem de ser formalizada, para efeitos tributários, através de notas de crédito,  que apenas foram emitidas em 30-09-2020 e em 16-07-2021.

Aduz ainda que “as faturas somente devem ser emitidas, nos termos do artigo 7º, 8º e 36º do CIVA quando exista um elevado grau de certeza de que os artigos seriam exportados, e não com meras intenções/encomendas” não comprovadas nem justificadas.

Conclui que a Requerente “deveria ter procedido à liquidação do IVA (conforme decorre artigo 29º, n.º 9 do CIVA) em dezembro de 2019 (1209), à taxa normal (23%), nas 4 faturas”, o que totaliza imposto calculado sobre a base tributável no valor de 85.715,20 €.

 

Relativamente às regularizações de IVA em operações de devolução de artigos, a AT sustenta que não podem ser aceites, porque não existe confirmação dos clientes nas notas de crédito que pretendem anular essas operações, cujo imposto em causa ascende a 65.705,20 €.

Embora a Requerente tenha regularizado a seu favor o IVA constante das notas de crédito que emitiu, nas declarações periódicas mensais, “nenhuma das referidas 5 Notas de Crédito encontravam-se assinadas pelas clientes, nem tinham qualquer documento anexo que demonstrassem que as clientes tinham tido conhecimento da retificação ou de que foi reembolsado do imposto”. Entende a AT que sendo anulada a operação de venda, de acordo com o disposto no artigo 78.º, n.º 2 do Código do IVA, o emitente das faturas pode efetuar a dedução do correspondente imposto até ao final do período de imposto seguinte, mas que, “de acordo com o n.º 5 do mesmo artigo, essa regularização a favor do sujeito passivo apenas pode ser efetuada quando o comerciante-vendedor estiver na posse de prova de que o adquirente tomou conhecimento da retificação ou de que esse adquirente foi reembolsado do imposto, sem o que se considera indevida a respetiva dedução. Como esse procedimento não foi seguido no caso em apreciação, essa regularização de IVA não pode ser aceite.”

 

Os fundamentos da Requerente para impugnar as liquidações de IVA, são diferentes, consoante a motivação da Requerida para a liquidação em causa tenha sido não ter havido liquidação de IVA, relativo a exportações ou, quando se trate de regularizações de IVA, que não foram aceites pela Requerida, por inexistência de confirmação dos adquirentes nas notas de crédito, na situação da devolução de artigos.

 

No primeiro grupo de situações, que é constituído pela liquidação de IVA nas exportações para fora da União Europeia (“UE”), a Requerente não fez liquidação do IVA por entender que é aplicável a essas situações o regime do artigo 14.º, n.º 1 al. a) do Código do IVA, que regula no sentido de estarem isentas do imposto “as transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da Comunidade pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste” e considerar que a emissão da fatura deve ser feita quando acorda com os seus clientes que estão fora da UE, os elementos essenciais do negócio, designadamente a seleção da concreta peça de relojoaria e o seu preço (veja-se I da matéria assente).

Quando quatro clientes de exportação, domiciliados na China e no Japão, que receberam as suas faturas emitidas em 19, 20, 23 e 31-12-2019 não satisfizeram a obrigação de pagamento dos negócios e não pagaram as dívidas inscritas nas faturas (K e Y da matéria assente), a Requerente, respetivamente em 16-07-2021, em 30-09-2020, em 17-07-2021 e em 30-09-2021 emitiu notas de crédito no exato valor das faturas, com o propósito de anular essas vendas. Entende que o pode fazer a todo o tempo e que mais não fez do que anular operações de venda, que, na sua ótica, nunca chegaram a concretizar-se. Na sua interpretação do artigo 1.º, n.º 1, al. a) do CIVA, quando foi “anulada a operação, desapareceu o facto tributário – transmissão de bens - que determina a incidência em IVA” (artigo 26.º, n.º 12 do PPA), não tendo a obrigação de “comprovação de saída dos bens de território nacional, para efeitos de observância dos pressupostos da isenção”, pois a anulação da venda torna inexistente o facto tributário (artigo 26.º, n.º 13 e n.º 14.º do PPA). Conclui por isso que a liquidação tem o vício da violação de lei, designadamente do artigo 1.º, n.º 1, al. a) do CIVA, do artigo 55.º da LGT e do artigo 103.º, n.º 2 da CRP. Afirma ainda que a AT faz errado enquadramento dos factos e errónea qualificação dos factos tributários (artigo 67.º e 68.º do PPA).

 

Quanto ao segundo grupo de liquidações, fundamentado pela AT pela inexistência de confirmação dos adquirentes nas notas de crédito, está assente que em 2019 a Requerente vendeu a cinco cidadãs de nacionalidade angolana peças de ourivesaria e emitiu as correspondentes faturas, no total de 351.380,01 €, incluindo IVA (veja-se N e AA da matéria assente). Como as cinco clientes devolveram os produtos que tinham comprado, a Requerente emitiu cinco correspondentes notas de crédito e regularizou a seu favor o IVA de 65.705,20 €. As notas de crédito não se encontram assinadas pelas clientes nem existe outro documento que ateste o respetivo conhecimento da operação e o seu reflexo em termos de IVA (veja-se U e AA da matéria assente). A Requerente sustenta que como as clientes que são os sujeitos dessas operações eram “consumidores”[8], quer dizer, clientes finais na cadeia de IVA, não é necessário comprovar o conhecimento da regularização do IVA, através da aposição da assinatura na nota de crédito ou por intermédio de documento que comprove esse conhecimento; essa é a interpretação conjunta, que refere também como interpretação sistemática (artigo 87.º do PPA), que considera resultar das normas do artigo 78.º, n.º 4 e n.º 5 do CIVA. Conclui por isso que a liquidação tem o vício da violação de lei, designadamente destas normas e também da norma do n.º 2 do mesmo artigo que foram mal interpretadas e aplicadas (artigo 94.º PPA). Afirma ainda que as liquidações violam o princípio da neutralidade, porque obrigam a Requerente, que é sujeito passivo que se localiza no interior do circuito económico, a suportar imposto por uma operação anulada (artigo 95.º e seguintes do PPA). Refere ainda que as liquidações violam o princípio da proporcionalidade, remetendo para as normas dos artigos 2.º e 18.º, n.º 2 da CRP (artigos 95.º e 99.º do PPA).

Finalmente aponta ainda, crê-se que a todas as situações, o incumprimento da exigência de fundamentação dos atos tributários, regulada no artigo 77.º da LGT e no artigo 268.º, n.º 3 da CRP.

 

Da contraposição das posições assim manifestadas, o objeto do litígio é prima facie, o de saber se as liquidações feitas pela AT, sobre operações da Requerente de anulação de exportações para o exterior da UE e as liquidações referentes à anulação de devoluções a pessoas singulares, feitas em território nacional, cumprem com o direito aplicável ou, em sentido diverso, se são os procedimentos adotados em cada uma daquelas situações pela Requerente, que melhor cumprem a disciplina normativa.

Sendo correta a interpretação feita pela AT do direito aplicável, caberá ainda ver se os atos que praticou se encontram devidamente fundamentados.

 

Apreciação jurídica da questão

Crê-se que o preâmbulo do IVA, apesar dos seus quase 40 anos de vigência, sintetiza ainda bem o funcionamento geral do imposto, deixando claro que todos os operadores económicos estão sujeitos a tributação e não apenas os consumidores, sendo a base tributável de cada um deles limitada ao valor acrescentado em cada fase ou, melhor dito nas palavras do legislador (veja-se a versão que consta no Decreto-Lei n.º 394-B/84 de 26 de dezembro):

(…)

4 - O IVA visa tributar todo o consumo em bens materiais e serviços, abrangendo na sua incidência todas as fases do circuito económico, desde a produção ao retalho, sendo, porém, a base tributável limitada ao valor acrescentado em cada fase.

 

A dívida tributária de cada operador económico é calculada pelo método do crédito de imposto, traduzindo-se na seguinte operação: aplicada a taxa ao valor global das transacções da empresa, em determinado período, deduz-se ao montante assim obtido o imposto por ela suportado nas compras desse mesmo período, revelado nas respectivas facturas de aquisição. O resultado corresponde ao montante a entregar ao Estado.

 

O IVA, aplicado de um modo geral e uniforme em todo o circuito económico, pressupondo a repercussão total do imposto para a frente, corresponde a uma tributação, por taxa idêntica, efectuada de uma só vez, na fase retalhista.

 

O método do crédito de imposto assegura, assim, que os bens utilizados na produção por uma empresa não sejam, em definitivo, tributados: as aquisições são feitas com imposto, mas dão lugar a uma dedução imediata no respectivo período de pagamento (salvo excepções, muito limitadas, destinadas a prevenir desvios fraudulentos).

 

É evidente que a simplicidade conceptual que se retratou e que tem como objetivo tributar todos os intervenientes no circuito económico, desde os operadores do setor primário, até aos clientes finais, é densificado através de um conjunto de regras que asseguram que a tributação é feita de acordo com os princípios enunciados.

Cabe aqui referir que a legislação sobre o IVA aplicável neste processo, utiliza nomenclatura diversa daquela em que a Requerente se expressa, pois não é possível reconduzir as operações que são objeto de imposto, do ponto de vista da incidência subjetiva aos anglicismos business to business e business to consumer, pois o CIVA remete-nos para uma complexa qualificação que não permite por qualquer forma fazer equivaler as pessoas singulares a contribuintes que não são sujeitos passivos, nem considerar que todos os agentes de negócio são sujeitos passivos. Uma leitura atenta do artigo 2.º do CIVA vai revelar que não há qualquer exclusão do conceito de sujeito passivo para as pessoas singulares (v.g. artigo 2.º, n.º 1, alínea a), as pessoas coletivas de direito público não são forçosamente sujeitos passivos e mesmo as pessoas coletivas de direito privado (v.g. as comissões de moradores que assumam a forma de associações com personalidade jurídica), só assumem a qualidade de sujeitos passivos na medida em que efetuem as operações que o artigo 2.º, sobretudo no n.º 1 alínea a) refere.

Vêm estas considerações a propósito da metodologia que deve ser seguida no tratamento das relações tributárias no âmbito do IVA; cada relação jurídico-tributária tem de ter determinada individualidade e deve ser analisada nessa individualidade concreta, sendo sempre tarefa ingrata reconduzir determinados regimes a determinados grupos, quando estes conjuntos de entidades não correspondam rigorosamente àqueles grupos de sujeitos que a lei especialmente consagre. Cite-se a título de exemplo, as situações em que Portugal seja subscritor de tratados internacionais, com incidência fiscal, com determinados estados, que não são membros da UE e que esses instrumentos obriguem a tratar situações de exportação de modo diferente, consoante o seu destino. É essa a metodologia que este acórdão segue, embora não seja sustentada pela AT a existência de qualquer particularidade do regime de tratamento das operações com a China e o com o Japão, trazidas a estes autos. Mas nada impede que o Estado português convencione com outros estados que não sejam membros da UE determinadas regras relativas a impostos sobre transações, que afastem o regime comum, por efeito da norma do artigo 8.º, n.º 2 da CRP.

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Importa agora apreciar as operações que a AT considerou serem base de incidência de IVA e a legalidade das liquidações a que deram lugar.

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O primeiro grupo de situações a averiguar é constituído pelas liquidações originadas por invocadas operações de exportação.

Com especial relevância para a decisão, está assente que as encomendas das peças de ourivesaria e relojoaria que a Requerente comercializa só são expedidas para o adquirente quando são pagas as respetivas faturas. Consequentemente os bens eram colocados à disposição do cliente, desde que este pagasse o respetivo preço e quando a Requerente e cada um dos seus clientes chegavam a acordo relativamente aos elementos essenciais do negócio, designadamente a concreta peça de relojoaria e o respetivo preço, a Requerente emitia a fatura (H e I da matéria assente).

Durante ao ano de 2019 a Requerente realizou operações de vendas de diversos produtos para exportação que vieram posteriormente a ser anuladas, designadamente as clientes sociedade B..., a sociedade C... e a sociedade D..., Ltd., sediadas no Japão, e ainda a sociedade E..., sediada em Hong Kong, que protelaram várias vezes o pagamento. A Requerente foi acompanhando a situação na expectativa de que cada cliente pagasse o valor em dívida, para depois expedir as mercadorias, mas as clientes referidas, acabaram por desistir da compra dos bens (J e K da matéria assente).

Neste circunstancialismo a Requerente contabilizou, a título de vendas, as faturas seguintes aos clientes referidos, com menção a “valor isento de IVA, ao abrigo do art.º 14º n.º 1 a) do CIVA” (R da matéria assente):

 

As encomendas constantes das referidas faturas foram anuladas, por notas de crédito, que a Requerente emitiu e se resumem de seguida:

 

Em função das conclusões da ação de inspeção a AT procedeu às correções relativamente ao exercício de 2019, relativamente ao imposto em falta, IVA, no valor correspondente às operações agora em análise de € 85.715,20 (W, X e Z da matéria assente):

 

A razão de ser das liquidações feitas pela Requerida, encontra-se efetivamente fundamentada, sendo o seu percurso intelectivo marcado pelos seguintes pontos: (i) não existe qualquer documento comprovativo de exportação das 4 faturas identificadas, não cumprindo o disposto no artigo 14º nº 1 alínea a), e o artigo 29º n.º 8 e nº 9 do CIVA; (ii) as exportações de mercadorias e bens estão isentas de IVA, sendo que para beneficiarem desta isenção têm de obedecer a requisitos formais para que tal isenção se verifique e tais requisitos previstos no artigo 29 n.º 8 do CIVA não foram cumpridos; (iii) deste modo, o sujeito passivo deveria ter procedido à liquidação do IVA (conforme decorre artigo 29º n.º 9 do CIVA) em dezembro de 2019 (1219), à taxa normal (23%), nas 4 faturas; (iv) o sujeito passivo anulou, através da emissão destes documentos, 2 faturas em 30/09/2020 (no valor total de 160.780,49 €) e outras 2 faturas em 16/07/2021 (no valor total de 211.894,29 €), ou seja, 9 e 19 meses após a emissão das faturas em causa, não se conseguindo perceber as motivações para tal demora.

 

Em crítica à posição manifestada pela Requerente no exercício do seu direito de audição, a Requerida faz ainda notar que nas 4 faturas no valor de 85.715,20 € sem que fosse feita a liquidação de imposto, não tem correspondência com o enquadramento legal, em sede de IVA, porque o artigo 7º n.º 1 a) do CIVA regula “expressamente” que o imposto é devido e torna-se exigível, nas transmissões de bens, quando os bens são postos à disposição do adquirente.

 

Não parece ao Tribunal que a AT interprete corretamente a situação de facto e isso torna-se muito claro quando pretende aplicar à situação sub judicio a regra de que “o imposto é devido e torna-se exigível quando os bens são postos à disposição do adquirente”. Como se assentou em H, os objetos “só são expedidos para o adquirente quando são pagas as respetivas faturas, consequentemente os bens eram colocados à disposição do cliente, desde que este pagasse o respetivo preço”, quer dizer, a colocação à disposição ou a entrega dos bens está sujeita à condição resolutiva de pagamento (artigo 270.º do Código Civil) e, como não houve pagamento, os bens nunca foram colocados à disposição dos adquirentes.

Aliás o apuramento desta questão de facto, que é a de saber que condições foram afinal estipuladas para a compra e venda, cada compra e venda em concreto, que é assim que o CIVA as trata, é deficientemente tratada pela AT.

Vejamos:

 No exercício do seu direito de audição (artigos 7.º e 8.º do documento 25 junto com o PPA), a Requerente é clara quando afirma que os bens vendidos nestas quatro operações só eram colocados à disposição do adquirente, quando este pagasse o preço constante da fatura. Ora esta afirmação do Requerente goza da presunção de veracidade e boa-fé, nos termos do artigo 75.º, n.º 1 da LGT e cabia à AT ilidir essa presunção, para poder afirmar, como faz no RIT, (S da matéria assente) que a realidade era diferente. A AT afirma exatamente que “Ora, como referido pelo sujeito passivo no direito de audição os bens foram colocados à disposição do cliente e que o sujeito passivo emitiu as facturas”, atribuindo natureza confessória à declaração da Requerente.

Comete desde logo ilegalidade pois aproveita apenas parte da declaração da Requerente, o que contraria frontalmente o princípio da indivisibilidade da confissão, que constitui regra nos termos do artigo 360.º do Código Civil: quem aceita determinada confissão tem de aceitar também como verdadeiros os outros factos ou circunstâncias, salvo se provar a sua inexatidão.

A este propósito a AT limita-se a afirmar que noutras vendas com o mesmo cliente a Requerente teve essa prática, havendo registo de vendas em que a mercadoria foi expedida para clientes que não identifica, sem que houvesse prévio pagamento. É evidente que a invocação de uma prática do cliente em determinadas situações, que nem sequer se sabe se têm fatores comuns relativamente ao cliente e à situação em questão, não são suficientes para ilidir a presunção de que a Requerente goza. E, nunca é demais repetir, a tributação de cada operação é avaliada em concreto e essa avaliação exige que a situação em concreto se identifique com a previsão da norma de incidência, para que a tributação surja como a estatuição da mesma norma. A fundamentação de facto da AT é por isso deficiente e viola frontalmente as regras do artigo 75.º, n.º 1 da LGT e do artigo 360.º do Código Civil.

 

Assim o direito aplicável é mais exatamente feito nos seguintes termos: (i) a Requerente acordou com os seus quatro clientes identificados e residentes em países fora da UE a venda de artigos de relojoaria identificados subordinada à condição resolutiva do seu pagamento e, nos termos do artigo 29.º, n.º 1, al. a) do CIVA emitiu as quatro faturas; (ii) as operações de venda celebradas pela Requerente com os seus clientes estavam isentas de IVA, nos termos da norma do artigo 14.º, n.º 1, al. a) do CIVA; (iii) como a venda para exportação está isenta de IVA e essa menção é inscrita na fatura, a regra do artigo 8.º, n.º 1 torna-se praticamente inoperante, porque o IVA que seria então devido, é de valor nulo por haver isenção objetiva, face às operações de exportação, não se podendo presumir uma transação fictícia apenas para cálculo de IVA, porque ela não consta da lei e não pode por isso alicerçar qualquer juízo da AT (349.º do Código Civil); (iv) a Requerente, por não lhe terem sido pagas as encomendas pelos seus quatro clientes, no uso do direito de resolução da compra e venda que lhe é conferido pela lei (432.º, n.º 1 do Código Civil), resolveu os quatro negócios de venda, que perderam qualquer efeito (433.º do Código Civil); (v) em cumprimento das normas do CIVA  a Requerente emitiu os documentos de regularização das operações, que foram notas de crédito, que não conduziram ao lançamento a seu favor de nenhum imposto, porque nenhum imposto tinha sido imputado nas faturas respetivas.

É evidente que a AT, de forma pouco clara, deixa no ar a ideia de que as mercadorias poderiam ter sido afinal exportadas e haveria então de, alternativamente, liquidar o imposto ou obter a confirmação alfandegária da saída dos bens da UE. Fá-lo no RIT (S da matéria assente), quando afirma que:

Por sua vez, o sujeito passivo também não apresenta qualquer prova do alegado, a saber as encomendas, as respetivas anulações/suspensões das encomendas e os contornos dos negócios em causa, bem como o paradeiro das mercadorias. (o itálico é da autoria do relator).

Também esta afirmação viola a presunção de veracidade das declarações da Requerente que a LGT fixa, nos termos aludidos.

Na sua resposta escrita às questões colocadas também por escrito, a Requerente afirmou claramente (RIT, p. 20):

As referidas encomendas foram efetuadas no final do ano. Nesta altura, em Portugal ainda não se faziam sentir os efeitos da contingência do impacto da pandemia Covid-19 mas nos países destes clientes (mercado asiático) sim. Os clientes manifestaram relutância em avançar com o pagamento pois atravessavam clima incerto que apenas se veio a sentir em Portugal em meados de março de 2020. Por motivos comerciais e também sensíveis ao panorama que estava a ser vivido no mundo, o departamento comercial decidiu ir acompanhando a situação.

 

Assim e face ao enquadramento não existem documentos que atestem a saída porque os produtos não chegaram a ser expedidos. Sem a evolução esperada e esgotadas as negociações as encomendas das referidas faturas foram anuladas por notas de crédito, conforme quadro seguinte:

(…) (o sublinhado consta do original)

Note-se que das questões colocadas à Requerente, por escrito, durante a inspeção, não consta qualquer pedido de esclarecimento sobre o destino das mercadorias (PA, pp. 19-20), o que constitui uma falta do dever de procurar a verdade material. O Tribunal não afirma, nem pode afirmar, porque não cabe na sua competência, que a AT deveria ter ou não ter pedido qualquer informação; mas já é função do Tribunal qualificar os atos ou omissões da AT, quando a sua conduta leva a determinado fundamento da tributação oficiosa. A afirmação de não saber o paradeiro das mercadorias, sem ter feito qualquer diligência para esclarecer essa questão, que a AT considerou relevante e por isso a inscreveu no RIT (PA, p. 20), constitui violação do princípio do inquisitório previsto no artigo 58.º da LGT que lhe exige que realize todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material, que foi também violado.

Embora se tenha assentado em S que consta do RIT que “as mercadorias constantes das 4 faturas não constam do inventário final de 2019, o que também faz presumir a transmissão dos bens.”, essa afirmação não pode ser considerada correta para efeitos probatórios. Em primeiro lugar porque a presunção de que a AT fala não existe na lei, formulada nestes termos e porque o facto de os bens não constarem do inventário não indicia necessariamente que eles tenham sido transacionados através das operações em análise; tanto pode significar que os bens foram vendidos a outros adquirentes como pode ter acontecido, ou como a Requerente afirma nas suas alegações finais, que a emissão das faturas “retirou” os artigos do inventário escritural mas eles ficaram na sua posse e registados no inventário físico. O Tribunal não tem elementos que lhe permitam fixar esta matéria de facto, como se deu conta em sede própria.

Não tendo sido as mercadorias postas à disposição dos quatro destinatários das faturas, não está preenchida a previsão da norma do artigo 7.º, n.º 1, alínea a) do CIVA, que a AT identificou como norma de incidência que fundamenta as liquidações, que são por isso ilegais.

É importante referir que o facto de as transmissões de bens só terem sido anuladas 9 e 11 meses após a sua faturação não tem qualquer significado enquanto indício da disponibilização dos bens, em particular no contexto mundial de pandemia que se vivia à data, e que condicionou fortemente os negócios jurídicos e as expedições de bens entre países. Se a AT entende que as notas de crédito foram emitidas para lá do prazo previsto na lei, esse facto não é idóneo para gerar qualquer imposto.

Note-se que o Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT) prevê expressamente que constitui contraordenação punível com coima a inexistência de registos e documentos com eles relacionados, qualquer que seja a respetiva natureza (artigo 120.º, n.º 1) e mesmo o atraso na elaboração de documentos de escrita – como eram as notas de crédito ou documento equivalente que expressasse a resolução da compra e venda em causa – constitui contraordenação grave e punível (artigo 121.º, n.º 2 e n.º 5). Aliás, a consulta do registo do inventário nas próprias instalações da Requerente está previsto nos termos do artigo 113.º, n.º 3 e a sua recusa constitui infração punível com coima até 75.000 €. Em casos extremos a ocultação de elementos do inventário, que constituem valores, para obviar a que a administração fiscal fiscalize, determine, avalie ou controle a matéria coletável, pode inclusivamente constituir crime de fraude, previsto e punido, nos termos do artigo 103.º, n.º 1, al. a) do RGIT.

É neste sentido que no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 02-10-2013, [Jorge Dias], no processo 105/11.2IDCBR.C1, se sumariou[9]:

1.- O crime de fraude fiscal é um crime de perigo em que o bem jurídico protegido é a ofensa à Conta do Estado na rúbrica que inclui as receitas fiscais destinadas à realização de fins públicos de natureza financeira, económica ou social e é um crime de “resultado cortado”, pois a obtenção de vantagem patrimonial ilegítima não é elemento do tipo. Basta apenas que as condutas sejam preordenadas à obtenção de tal vantagem;

2.- O crime de fraude fiscal só pode ser cometido através de ocultação ou alteração de factos ou valores que devam constar dos livros de contabilidade ou escrituração, ou das declarações apresentadas ou prestadas a fim de que a administração fiscal especificamente fiscalize, determine, avalie ou controle a matéria coletável, da ocultação de factos ou valores não declarados e que devam ser revelados à administração tributária ou da celebração de negócio simulado.

3.- O tipo objetivo de ilícito preenche-se, pois, com a adoção de condutas que visem a não liquidação, entrega ou pagamento da prestação tributária ou outras vantagens patrimoniais suscetíveis de causarem diminuição das receitas tributárias, tendo o legislador concretizado esses comportamentos nas alíneas a), b) e c) do nº 1 do artigo 103.

Mas os impostos não são sanções por falha no cumprimento de diretrizes contabilísticas ou formalidades tributárias. Seria fastidioso explicar nesta sede a natureza de imposto, tal é a naturalidade com que ela é entendida pelos membros da nossa sociedade. Em termos populares, que não andam longe da dogmática jurídica, imposto é a contribuição dos cidadãos para os gastos comuns da sociedade de que são membros e contêm em si um nexo de solidariedade entre cada cidadão e a sua sociedade. Coimas e outras penas não são impostos e, estas sim, destinam-se a atingir objetivos corretivos dos comportamentos em sociedade, de punição, de prevenção geral e de prevenção especial dos comportamentos que forem censuráveis. Aliás, o Sistema de Normalização Contabilística aprovado pelo Decreto-Lei n.º 158/2009, de 13 de julho, que rege a organização do inventário (artigo 12.º) é bem claro no seu artigo 14.º, na estatuição das sanções por irregularidades no registo contabilístico, como ilícitos de mera ordenação social, nos seguintes termos:

Artigo 14.º - Ilícitos de mera ordenação social

1 - A entidade sujeita ao SNC que não aplique qualquer das disposições constantes nas normas contabilísticas e ou de relato financeiro cuja aplicação lhe seja exigível e que distorça com tal prática as demonstrações financeiras individuais ou consolidadas que seja, por lei, obrigada a apresentar, é punida com coima de (euro) 1500 a (euro) 30 000.

2 - A entidade sujeita ao SNC que efetue a supressão de lacunas de modo diverso do aí previsto e que distorça com tal prática as demonstrações financeiras individuais ou consolidadas que seja, por lei, obrigada a apresentar, é punida com coima de (euro) 1500 a (euro) 30 000.

3 - A entidade sujeita ao SNC que não apresente qualquer das demonstrações financeiras que seja, por lei, obrigada a apresentar, é punida com coima de (euro) 1500 a (euro) 30 000.

4 - A falta de elaboração, publicação ou disponibilização no sítio Web, nos termos previstos no artigo 11.º-G, do relatório de informações relativas ao imposto sobre o rendimento, ou, quando aplicável, da declaração a que se refere a alínea b) do n.º 2 do artigo 11.º-B e a alínea b) do n.º 2 do artigo 11.º-C, é punível com coima de (euro) 1500 a (euro) 30 000.

5 - Caso as infracções referidas nos números anteriores sejam praticadas a título de negligência, as coimas são reduzidas a metade.

6 - Na graduação da coima são tidos em conta os valores dos capitais próprios ou dos fundos patrimoniais e do total de rendimentos das entidades, os valores associados à infração e a condição económica dos infratores.

7 - A organização do processo e a decisão sobre aplicação da coima competem ao presidente da Comissão de Normalização Contabilística, com possibilidade de delegação.

8 - O produto das coimas reverte nas seguintes proporções:

a) 60 % para o Estado;

b) 40 % para a Comissão de Normalização Contabilística.

9 - Aos ilícitos de mera ordenação social previstos no presente decreto-lei é subsidiariamente aplicável o regime geral do ilícito de mera ordenação social.

 

É, pois, procedente o pedido de anulação das liquidações relativas a estas quatro transações e a liquidação dos juros correspondentes.

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O segundo grupo de situações a averiguar, é constituído pelas liquidações referentes à anulação de transações provocadas por devoluções de mercadorias por pessoas singulares.

Com especial relevância para a decisão das questões está assente que (i) em 2019, no âmbito da venda a retalho, a Requerente realizou a venda de peças de ourivesaria a cinco cidadãs de nacionalidade angolana, titulada pelas faturas com os números e valores abaixo discriminados (factos assentes M e T); (ii) as citadas clientes decidiram que não queriam aquelas peças de ourivesaria, optando por outras, pelo que a Requerente anulou a operação de venda, através das notas de crédito NC19/000010, NC19/000012, NC19/000016, NC19/000017 e NC19/000023 (facto assente O); (iii) a Requerente regularizou a seu favor o IVA constante das referidas notas de crédito nas declarações periódicas mensais de IVA (facto assente T); (iv) nenhuma das referidas cinco notas de crédito se encontravam assinadas pelas clientes, nem tinham qualquer documento anexo que demonstrassem que as clientes tinham tido conhecimento da retificação ou de que foi reembolsado do imposto (facto assente T).

As faturas e as notas de crédito em causa são as que constam do quadro seguinte (factos assentes M, O e T):

 

 

A decisão de efetuar as liquidações pela Requerida, encontra-se devidamente fundamentada, sendo o seu percurso intelectivo marcado pelos passos seguintes. A Requerente regularizou a seu favor o IVA que consta das notas de crédito nas suas declarações mensais, no valor total de 65.705,20 €, correspondente às citadas notas de crédito. Nenhuma das notas de crédito contém assinatura pelas clientes, nem tinham anexo documento que demonstrasse que as clientes tinham tido conhecimento da retificação ou de que foi reembolsado o imposto.

Para estes factos a AT identificou e aplicou as normas do artigo 78.º, n.º 2, que prevê a possibilidade da dedução do IVA e o n.º 5 do mesmo artigo do CIVA que regula no sentido de essa regularização a favor da Requerente só poder ser feita quando esta tenha na sua posse prova de que o adquirente tomou conhecimento da retificação ou de que foi reembolsado do imposto. Não havendo esta confirmação do adquirente esta norma considera indevida a dedução.

Como já se escreveu a Requerente sustenta diferente interpretação da norma do artigo 78.º, n.º 5 do IVA, que, na sua ótica, deve ser interpretado em conjugação com o n.º 4 do mesmo artigo conduzindo à conclusão de que a confirmação a que se refere o n.º 5 só é aplicável a “sujeitos passivos” e a exigência não é aplicável a “consumidores finais”.

Adiante-se desde já que não assiste razão à Requerente e a mera aproximação exegética deixa logo o interprete de sobreaviso porque, como é sabido o n.º 5 não faz qualquer divisão entre tipos de adquirentes – há sempre que ver o caso concreto – e a velha máxima já adverte para que ubi lex non distinguir nec nos distinguere debemus e porque as normas do n.º 4 e do n.º 5 têm diferentes destinatários; enquanto o n.º 4 regula o comportamento que o cliente destinatário da nota de crédito deve adotar para seu tratamento tributário, e o n.º 5 regula as formalidades que o emitente da nota de crédito deve seguir para exercer o direto à dedução. Não sendo as situações reguladas complementares ou opostas uma relativamente à outra, porque têm destinatários diferentes, a interpretação conjugada sempre seria uma tarefa complexa.

Mas ultrapasse-se o juízo imediato e procure-se mais profundamente a interpretação da norma.

A jurisprudência tem salientado a natureza do direito à dedução, como elemento fundamental no regime do IVA. A este propósito no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (“STA”) de 08-07-2009 [Isabel Marques da Silva], no processo 0199/09[10], sumariou-se:

I - O direito à dedução do imposto suportado a montante, constitui característica fundamental do sistema comum do IVA, essencial para garantia da neutralidade do imposto e "peça-chave" do seu funcionamento, pelo que não pode excluir-se tal direito pelo facto de a declaração primariamente entregue ter sido substituída por outra, eventualmente incorrectamente preenchida mas procurando conformar-se com o novo enquadramento da actividade do contribuinte feita pela Administração tributária.

 

Em consonância, na decisão de Tribunal Singular de 23-06-2020 [Clotilde Celorico Palma], no processo que correu sob a égide do CAAD pelo n.º 484/2019-T referiu-se:

Importa em especial ter presente que é jurisprudência constante do Tribunal de Justiça da União Europeia que, sendo o direito à dedução um elemento fundamental do regime de IVA, só é possível limitar este direito nos casos expressamente previstos pela Directiva IVA e, ainda assim, com respeito pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade, não se podendo esvaziar o sistema comum do IVA do seu conteúdo.

(…)

Como o TJUE salientou, na ausência de circunstâncias fraudulentas ou abusivas e sob reserva de eventuais regularizações em conformidade com as condições previstas na Directiva IVA, o direito à dedução, uma vez constituído, permanece adquirido. As medidas que os Estados membros têm a faculdade de adoptar, ao abrigo do artigo 273.º da Directiva IVA, para assegurar a cobrança exacta do imposto e evitar a fraude, não devem, contudo, ir além do que é necessário para atingir tais objectivos e não devem pôr em causa a neutralidade do IVA.

 

A propósito da dedução indevida de imposto por falta de prova de que o adquirente tomou conhecimento da retificação de IVA, ficou esclarecido nesta decisão que “o n.º 5 do artigo 78.º do CIVA, não excepciona nem desobriga da exibição de comprovativo da prova de que o cliente tomou conhecimento da regularização de imposto pelo facto de estarmos perante um sujeito passivo nacional ou outro.” (o itálico é da responsabilidade do relator).

Note-se que sobretudo desde 2012 o Estado Português, no âmbito do reforço do combate à fraude e à evasão fiscais lançou medidas legislativas que incentivam todos os cidadãos a reforçar o combate à informalidade e à evasão fiscal sustentada num dever de cidadania. Neste sentido, pelo Decreto-Lei n.º 198/2012 de 24 de agosto foi criada uma dedução em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”), correspondente a uma parte do IVA suportado por qualquer membro do agregado familiar, incluído em faturas que titulam prestações de serviços em determinados setores de atividade e comunicadas à AT. Embora a atividade da Requerente não se encontre entre aquelas que conferem o direito à dedução em IRS (veja-se o artigo 4.º-A do citado Decreto Lei e artigo 78.º-F do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares), a realidade é que a emissão de faturas em que seja liquidado IVA tem efeitos que ultrapassam em muito o CIVA e acabam por abranger hoje todo o circuito económico; desde o cabeleireiro à tabacaria que vende jornais, passando pelos restaurantes, todos são diariamente instados a emitir faturas para que os contribuintes de qualquer natureza façam o respetivo tratamento de IVA, ora puramente em sede de IVA ou quando o façam no exercício de uma atividade comercial ou industrial ou simplesmente para ver bonificada a sua liquidação de IRS. Nenhum emitente pode saber qual o destino que foi dado à fatura que emitiu; não pode saber se o seu cliente é consumidor final ou comerciante; se lhe compra determinado artigo para uso próprio ou para o introduzir no circuito económico, revendendo esse bem, em Portugal ou noutro país da UE. Como a Requerente bem fez notar, o movimento de pessoas e bens no espaço Schengen é incontrolável pelas autoridades que gerem o movimento de estrangeiros e é, por maioria de razão, incontrolável pelos comerciantes, quando esse movimento coincide com o território da UE. A movimentação do IVA e o seu controle não admitem exceções fundadas em conceitos que a lei em causa não consagra, como é o caso do conceito de consumidor. O artigo 78.º, n.º 5 do CIVA refere-se mais exatamente a adquirente que é aquele que compra o bem; seja ou não seja sujeito passivo de IVA. Se o adquirente em causa, português ou estrangeiro, requer ao comerciante que lhe seja emitida fatura e nela se liquidar IVA, o atual sistema tributário visto no seu conjunto, exige que a anulação da fatura que confere tais direitos, tenha que ser expressamente confirmada por esse adquirente, para que adote o comportamento devido, seja esse comportamento a regularização, pela sua parte, do IVA que deduziu anteriormente, seja para se inibir de utilizar essa fatura em benefícios obtidos em IRS ou até, quando não tenham o direito a deduzir o IVA (v.g. por praticarem atos isentos, como acontece nas atividades médicas), o considerarem como gasto, para efeitos de IRC ou no exercício de atividades tributadas em IRS, diminuindo a matéria coletável e a receita da Fazenda. O sistema fiscal é hoje uma teia complexa destinada a assegurar a satisfação dos interesses públicos e tende a criar todos os mecanismos para obviar à evasão fiscal, quer esta seja protagonizada pelo comerciante, quer seja protagonizada pelo adquirente. Para obviar a que isso aconteça, só há uma interpretação, guiada pelo elemento teleológico que a norma do artigo 78.º, n.º 5 do CIVA pode ter; todas as anulações de faturas emitidas nos termos previstos no CIVA, só conferem direito à regularização se o adquirente confirmar que o adquirente tomou conhecimento da retificação ou de que foi reembolsado do imposto, deixando por isso de deter qualquer direito de origem tributária sobre o Estado.

Crê-se que é nesta linha de pensamento que Alexandra Coelho Martins considera, parafraseando Xavier de Basto, que assumem especial relevância os aspetos formais dos documentos em sede de IVA, “pela circunstância de os mesmos consubstanciarem um título de crédito com base no qual os contribuintes exercem um direito, também de crédito, contra o Estado”[11] direito esse que há de ser documentado com título bastante, seguindo o princípio da segurança jurídica, para permitir o respetivo controlo. Conclui por isso que as “exigências formais especiais atinentes às faturas ou documentos de débito[12], como condição para a dedução do IVA, erige a factura, ou documento de débito equivalente, em formalidade ‘ad substantiam’”, quer dizer, formalidades que exigem determinado preceito, que não pode ser substituído.

É evidente que sendo o IVA um imposto de natureza comunitária e sendo o direito à dedução uma das suas pedras de toque, a possibilidade de os Estados-Membros restringirem esse direito, tem limitações, e a jurisprudência esclareceu também que as medidas legislativas impostas pela legislação portuguesa, para assegurar a mencionada cobrança exata do imposto e evitar a fraude se encontravam dentro dos limites impostos pelo direito comunitário. Nesse sentido, no Acórdão do STA de 01-10-2018 (Pedro Delgado), no processo n.º 0380/08.0BEBJA 0204/14, sumariou-se[13]:

I - De acordo com a jurisprudência do TJUE o direito comunitário não se opõe a que um sistema jurídico nacional recuse a restituição de impostos indevidamente cobrados em condições susceptíveis de implicar um enriquecimento sem causa dos contribuintes (Acórdãos C- 192/95- Comateb, C-309/06 — Marks & Spencer, C-566/07, Stadeco e C- 398/09 -Lady & Kid A/S).

II - Em tais casos, a jurisprudência comunitária vem também afirmando que «compete aos órgãos jurisdicionais nacionais «apreciar, à luz das circunstâncias de cada caso concreto, se o encargo do imposto foi transferido no todo ou em parte pelo operador para outras pessoas e, se for esse o caso, se o reembolso ao operador constitui enriquecimento em causa» (cf. Acórdão Comateb e Acórdão C-566/07, Stadeco).

III - A norma do artº 71 nº 5 do CIVA, na redacção dada pelo artº 1º do Dec.Lei n.º 198/90, de 19 de Junho, ao condicionar a regularização a favor do sujeito passivo do imposto indevidamente liquidado à prova de que o adquirente tomou conhecimento da rectificação ou de que foi reembolsado do imposto, não viola o direito comunitário, já que, pese embora constitua uma limitação ao direito ao reembolso, tal excepção visa precisamente obviar ou prevenir o enriquecimento sem causa do respectivo titular.

 

Veja-se que o n.º III deste sumário do Acórdão do Alto Tribunal é claríssimo ao afirmar que a regra do artigo 71.º, nº 5 (atual artigo 78.º n.º 5) do CIVA, na redação dada pelo artigo 1º do Decreto-Lei n.º 198/90, de 19 de junho, ao condicionar a regularização a favor do sujeito passivo do imposto indevidamente liquidado, à prova de que o adquirente tomou conhecimento da retificação ou de que foi reembolsado do imposto, não viola o direito comunitário. É esta a linha que este Tribunal segue, para negar validade aos argumentos de violação dos princípios da proporcionalidade e da neutralidade, por adesão aos argumentos que constam do acórdão, a que se adere por entender ser a mais adequada interpretação e por seguir o princípio geral da uniformização de julgados previsto no artigo 8.º do Código Civil.

Embora não conste do sumário, este douto Acórdão é também paradigmático para esclarecer o âmbito de aplicação da exigência de conhecimento pelo adquirente da retificação do IVA, tanto mais que as normas reguladoras mantêm o sentido. A matéria de facto em causa, que aqui é citada em forma sintetizada, foi a seguinte: (i) a recorrente explorava e administrava o parque zoológico e até 30 de Abril de 2007 utilizava nas entradas do parque a taxa prevista no artigo 18.º,  n.º 1 al. c) do CIVA[14] (21%), [mantém hoje o número]. A partir de 1 de Maio de 2007, passou a cobrar as entradas no parque, à taxa prevista no art.° 18.º n.º 1 al. a) do CIVA (5%), enquadramento confirmado pela Direção de Serviços do IVA. A Recorrente que por erro de interpretação entregou nos cofres do Estado IVA à taxa normal, quando deveria ter entregado à taxa reduzida, procedeu à regularização a seu favor, do IVA liquidado em excesso aos visitantes não sujeitos passivos (particulares), tendo na sua posse, apenas os documentos internos de regularização contabilística, não tendo procedido ao reembolso do imposto liquidado em excesso aos adquirentes dos serviços (consumidores finais). A Administração Fiscal entendeu e agiu em conformidade, para que o sujeito passivo pudesse regularizar a seu favor o IVA a mais liquidado, deveria estar habilitado a provar que o adquirente, mesmo sendo um particular, tomou conhecimento da retificação, ou de que foi reembolsado do imposto, sem o que considerava indevida a dedução, nos termos do nº 5 do art.º 71.º do CIVA[15].

A questão foi submetida a juízo, sendo lapidar a fundamentação da decisão do STA, que assim se manifestou:

A questão suscitada neste recurso prende-se com o problema da repercussão do imposto.

 

Como é sabido o IVA diz-se um imposto indirecto na medida em que, sendo por regra exigido do vendedor, o legislador pressupõe que através da repercussão sobre os preços ele acabe “indirectamente” por ser suportado pelo comprador, cuja riqueza se pretende afinal onerar (Cfr. Sérgio Vasques, Manual de Direito Fiscal, Almedina, 2ª edição, pag. 217.).

A repercussão define‑se, em técnica tributária, como o instrumento que permite transferir o encargo fiscal para o contribuinte final, de modo que a imposição seja neutra para o particular ou empresa que inicialmente paga e depois repercute, aparecendo como um simples degrau no processo de cobrança (Vide Pérez Royo, F, «Curso de Derecho Tributario. Parte Especial», Tecnos, 4ª edição, 2010, p. 741.).

 

Ora, como esclarece Sérgio Vasques (O imposto sobre o valor acrescentado, edição Almedina, pags. 186/187, 191/192) do ponto de vista material a atribuição ao sujeito passivo de um direito incondicional ao reembolso facilmente gera situações de enriquecimento sem causa quando se lida com impostos indirectos cuja estrutura e mecânica estão voltadas para a repercussão sobre terceiros.

 

Com efeito «a atribuição ao sujeito passivo de um direito incondicional ao reembolso gera um conflito potencial entre as pretensões do sujeito passivo e as do repercutido. O reconhecimento de um direito ao reembolso ao sujeito passivo não pode ser feito sem ter presente que a aplicação dos impostos indirectos não assenta numa relação apenas a dois, entre o sujeito passivo e a administração, mas antes numa relação triangular, em que além destes figura também o repercutido. E se o sujeito passivo deve ver garantido o reembolso de impostos liquidados em violação do direito europeu, não menos devemos garantir o reembolso àqueles que por princípio suportam o seu peso». (ob. citada pag. 187).

 

Assim admitindo-se que o sujeito passivo possa, por regra, solicitar e obter o reembolso, tal solução só será aceitável se o mesmo for obrigado, por sua vez, a reembolsar o comprador.

 

Nas palavras daquele autor, cujo sentido aqui também se sufraga, estando em causa imposto indirecto excessivo, só se pode dizer reposto o direito quando se desfaça por completo o circuito da liquidação e o valor que o sujeito passivo obtenha da administração a título de imposto seja devolvido àqueles aos quais o sujeito passivo a título de imposto o exigiu. O sujeito passivo constitui mero intermediário na liquidação do IVA e por isso deve ser tratado também como mero intermediário na sua reposição» - cf. ob. citada, pags. 191 e 192.

 

Razão pela qual se entende que o facto de os particulares não terem direito à dedução do IVA não significa que não tenham direito ao imposto, quando pago em excesso. Se aos sujeitos passivos de imposto o IVA é devolvido através do método da dedução, aos particulares deverá ser restituído através do reembolso.

(…)

No caso concreto a recorrente ao pretender apoderar-se do IVA pago em excesso pelos repercutidos (consumidores finais que adquiriram os bilhetes de ingresso no parque zoológico) está a obter um enriquecimento sem causa, na exacta medida do imposto pago em excesso pelos seus clientes, consumidores finais.

 

E foi exactamente para obviar ou prevenir esse enriquecimento sem causa que o legislador optou pela solução normativa do nº 5 do artº 71º do CIVA.

 

Por isso bem andou a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja ao concluir que para permitir o reembolso a lei nacional impõe como condição a comunicação aos adquirentes da alteração da taxa, não distinguindo entre consumidores finais e outros sujeitos passivos.

(o sublinhado nesta citação é da autoria do relator)

 

A melhor interpretação da norma do artigo 78.º, n.º 5 do CIVA exige efetivamente que para que o emitente da nota de crédito dirigida ao seu cliente, tenha direito à regularização do IVA, é sempre necessária comprovação de que o cliente e adquirente, seja qual for a sua natureza para efeitos de IVA (i.e., sujeito passivo ou consumidor final), tomou conhecimento da retificação ou de que foi reembolsado do imposto.

Improcede pelas razões invocadas, nesta parte, o pedido da Requerente.

 

Os pedidos de restituição do imposto pago e de juros indemnizatórios

No seu pedido arbitral a Requerente peticionou a restituição dos valores entregues à Requerida para satisfação das liquidações impugnadas e também o pagamento de juros indemnizatórios.

No local próprio deste acórdão assentou-se em CC que a Requerente realizou o pagamento em prestações do valor em dívida resultante das liquidações impugnadas.

A obrigação de restituição à Requerente das quantias pagas para satisfação das liquidações de imposto e respetivos juros que vão ser anuladas, surge como consequência necessária e natural dessa anulação, como reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, nos termos da norma do artigo 100.º, n.º 1 da LGT. Há por isso que determinar a restituição desses montantes à Requerente, o que se determinará, fazendo notar que a restituição não compreende apenas o valor das liquidações anuladas, mas também os outros encargos que a Requerente suportou no âmbito do plano de pagamento em prestações que cumpriu, compreendendo, eventualmente, juros e outros encargos processuais que não se encontram discriminados nestes autos.

No que concerne a juros indemnizatórios há que levar em conta que a ilegalidade que está na génese da anulação dos atos tributários, é inteiramente imputável à Requerida, que seguiu uma linha de investigação da verdade material pouco profícua e aplicou mal a lei, nas situações já analisadas. O erro na apreciação da matéria de facto está perfeitamente ao alcance de qualquer homem médio e o conhecimento rigoroso da lei é, muito mais do que uma obrigação, uma vocação e um princípio de atuação da AT. Neste caso concreto a AT não logrou satisfazer esses princípios (artigo 8.º, n.º 1 e n.º 2, al. a) da LGT) e a sua conduta, comparada com o padrão citado e com as obrigações que a lei lhe exige, leva a que se considere que, nas situações particulares em que se declara a anulação dos correspondentes atos, agiu com negligência.

Nos termos das normas dos artigos 43.º, n.º 1 e 100.º, n.º 1 da LGT a Requerida deve pagar juros indemnizatórios à Requerente, para conseguir a almejada reconstituição da situação pretérita à emissão das liquidações anuladas.

 

Decisão

Pelas razões expostas este Tribunal Arbitral coletivo delibera:

  1. Julgar procedente o pedido de anulação das liquidações correspondentes a IVA sobre as transações para exportação, designadamente a liquidação n.º 2022..., no valor de 85 715,20 € e a liquidação dos juros correspondentes, n.º 2023..., no valor de 9 759,79 €.
  2. Julgar improcedente o pedido de anulação das liquidações correspondentes a regularizações de IVA e dos respetivos juros.
  3. Condenar a Requerida a restituir à Requerente as quantias que dela recebeu para satisfação das liquidações agora anuladas.
  4. Condenar a Requerida no pagamento dos juros indemnizatórios correspondentes às liquidações anuladas no ponto I. supra, contados nos termos da lei.
  5. Condenar a Requerente e a Requerida no pagamento das custas do processo, em função do seu decaimento, apurado no capítulo próprio deste acórdão.

 

Valor do processo

Nos termos do artigo 3.º, n.º 3 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e cumprindo com a previsão do artigo 306.º, n.º 2 do CPC e do artigo 94.º, n.º 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aplicáveis ex-vi artigo 29.º, n.º 1, alínea c) e alínea e) do RJAT, fixa-se ao processo o valor de 170 516,13 €.

 

Custas

O valor da taxa de arbitragem é fixado em 3 672.00 €, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária e fica a cargo da Requerente na proporção de 44 % e da Requerida, na proporção de 56 %.

Notifique-se.

 

Lisboa, 23 de maio de 2024

 

Os árbitros,

 

 

 

Rui Duarte Morais (Presidente)

 

 

 

 

Raquel Montes Fernandes (árbitra adjunta)

 

 

 

Nuno Maldonado Sousa (árbitro adjunto e relator)

 



[1] Sigla de “Pedido de Pronúncia Arbitral”.

[2] “PA” é a sigla de “processo administrativo tributário” ou simplesmente processo administrativo, como é referido na lei.

[3] Os realces e sublinhados da citação, constam do original.

[4] A citação tem a seguinte nota de rodapé: “3 Pretende esta disposição legal evitar a fraude fiscal que a isenção prevista na al. a) do nº1 do artigo 14º do Código do IVA de certo modo poderia proporcionar. Impõem-se deste modo que as referidas transmissões sejam devidamente comprovadas. E o comprovante será o documento alfandegário, qualificando a operação como de exportação.”

[5] Os realces e sublinhados da citação, constam do original.

[6] Os realces e sublinhados da citação, constam do original.

[7] Os realces e sublinhados da citação, constam do original.

[8] A designação da Requerente é exatamente “B2C (Business to Consumer)”.

[11] Alexandra Coelho Martins – Os aspetos formais do direito à dedução de IVA: a dedução do imposto em operações simuladas. .Instituto Superior de Gestão. Acessível em https://www.isg.pt/wp-content/uploads/2021/02/22_4_iva_alexandra-martins_deduc%E2%95%9Eo-onus.pdf

[12] As “notas de crédito” são verdadeiramente um documento a favor do emitente em termos de IVA e de débito contra o Estado.

[14] O artigo 18.º do CIVA, até ao Decreto-Lei nº 102/2008, de 20/06, que procedeu à republicação do CIVA tinha a seguinte redação:

Artigo 18.º

1 - As taxas do imposto são as seguintes:

a) Para as importações, transmissões de bens e prestações de serviços constantes da lista I anexa a este diploma, a taxa de 5%;

b) Para as importações, transmissões de bens e prestações de serviços constantes da Lista II anexa a este diploma, a taxa de 12%;

c) Para as restantes importações, transmissões de bens e prestações de serviços, a taxa de 21%.

2 - Estão sujeitas à taxa a que se refere a alínea a) do nº 1 as importações e transmissões de objectos de arte previstas em legislação especial.

3 - As taxas a que se referem as alíneas a), b) e c) do n.º 1 são, respectivamente, de 4%, 8% e 15%, relativamente às operações que, de acordo com a legislação especial, se considerem efectuadas nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.

4 - Nas transmissões de bens constituídos pelo agrupamento de várias mercadorias, formando um produto comercial distinto, aplicar-se-ão as seguintes taxas:

a) Quando as mercadorias que compõem a unidade de venda não sofram alterações da sua natureza nem percam a sua individualidade, a taxa aplicável ao valor global das mercadorias será a que lhes corresponder ou, se lhes couberem taxas diferentes, a mais elevada;

b) Quando as mercadorias que compõem a unidade de venda sofram alterações da sua natureza e qualidade ou percam a sua individualidade, a taxa aplicável ao conjunto será a que, como tal, lhes corresponder.

5 - Nas prestações de serviços respeitantes a contratos de locação financeira, o imposto será aplicado com a mesma taxa que seria aplicável no caso de transmissão dos bens dados em locação financeira.

6 - A taxa aplicável às prestações de serviços a que se refere a alínea c) do nº 2 do artigo 4º é a mesma que seria aplicável no caso de transmissão de bens obtidos após a execução da empreitada.

(Redacção dada pelo artigo 1º do Decreto-Lei nº 16/97, de 21 de Janeiro)

7 - Aos serviços referidos na alínea n) do n.º 8 do artigo 6.º aplica-se a taxa referida na alínea c) do n.º 1.

8 - Quando não isentas, ao abrigo do artigo 13º ou de outros diplomas, às importações de mercadorias que sejam objecto de pequenas remessas enviadas a particulares ou que sejam contidas nas bagagens pessoais dos viajantes, sujeitas ao direito aduaneiro forfetário previsto nas disposições preliminares da Pauta Aduaneira Comum, aplicar-se-á a taxa referida na alínea c) do nº 1, independentemente da sua natureza.

9 - A taxa aplicável é a que vigora no momento em que o imposto se torna exigível.

[15] O artigo 71.º, na redação que vigorou até ao Decreto-Lei nº 102/2008, de 20/06, corresponde exatamente à redação que tem hoje, e desde então, o artigo 78.º, n.º 5 do CIVA.