SUMÁRIO:
1. A revogação do ato tributário de liquidação na pendência de processo arbitral é causa de inutilidade superveniente da lide.
2. Tendo a revogação ocorrido após o decurso do prazo previsto no artigo 13.º, n.º 1, do RJAT, a responsabilidade pelo pagamento das custas recai sobre a AT.
DECISÃO ARBITRAL
1. A..., contribuinte n.º..., titular do passaporte n.º ..., emitido pelos Estados Unidos da América, válido até 09/03/2030, veio nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.º 1, alínea a) do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, requerer a constituição de Tribunal Arbitral com vista à anulação da liquidação de IRS n.º 2023..., relativa ao ano de 2022, no valor de € 59 485,33.
1.1. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 20 de novembro de 2023.
1.2. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou como o signatário como árbitro, nomeação aceite dentro do prazo legal.
1.3. Notificadas as partes dessa designação, não manifestaram vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
1.4. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação dada pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral foi constituído no dia 30 de janeiro de 2024.
1.5. No dia 5 de fevereiro foi prolatado o despacho determinado pelo artigo 17.º, n.º 1, do RJAT, na redação dada pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro.
1.6. No dia 8 de março de 2024, a Requerida informou que “por despacho de 06/03/2024 da Senhora Subdiretora-Geral para a área da Gestão Tributária-IR, a liquidação objeto do pedido foi revogada (...)”.
1.7. Por requerimento de 13 de março, a Requerente pronunciou-se no sentido de se decretar a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, com a condenação da Requerida no pagamento das custas.
1.8. Na sequência, foi determinada a dispensa da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e agendada a prolação da decisão final.
2. O tribunal arbitral foi regularmente constituído, ex vi o disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do RJAT.
3. As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas, como determinado pelos artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, não enfermando o processo de quaisquer nulidades.
Cumpre apreciar e decidir da extinção da instância.
4. Relativamente a tal questão, consideram-se provados os seguintes factos:
4.1. A Requerente apresentou no dia 20 de novembro de 2023, um pedido de pronúncia arbitral com vista à anulação apresentar pedido de pronúncia arbitral contra a liquidação de IRS n.º 2023..., relativa ao ano de 2022, no valor de € 59 485,33.
4.2. Em 8 de março de 2024, a Requerida informou que tal liquidação foi revogada por despacho da Senhora Subdiretora-Geral para a área da Gestão Tributária-IR datado de 6 de março de 2024.
4.3. Por requerimento de 13 de março, a Requerente pronunciou-se no sentido de se decretar a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, com a condenação da Requerida no pagamento das custas.
4.2. Não há factos relevantes para decisão da causa que não se tenham provado.
4.3. Considerando o disposto nos artigos 596.º, n.º 1 e 607.º, n.os 2 a 4, ambos do Código de Processo Civil (por remissão do disposto no artigo 29.º, n.º 1, do RJAT), incumbe ao Tribunal o dever de selecionar a matéria de facto pertinente para a decisão judicativa.
No caso sub iudicio, a decisão sobre os factos provados e não provados radicou, segundo o princípio da livre apreciação da prova, no acervo documental presente nos autos, existindo consenso entre as partes.
5. A impossibilidade da lide ocorre em caso de morte ou extinção de uma das partes, por desaparecimento ou perecimento do objeto do processo ou por extinção de um dos interesses em conflito. Já a inutilidade da lide tem lugar quando, em virtude de novos factos ocorridos na pendência do processo, a decisão a proferir já não tiver qualquer efeito útil, ou porque não é possível dar satisfação à pretensão que o demandante quer fazer valer no processo ou porque o fim visado com a ação foi atingido por outro meio – cf. Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil Anotado, vol. III, pp. 367-373. De acordo com Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto – Código de Processo Civil Anotado, Vol. 1º, Coimbra Editora, 2ª ed., p. 555 –, “a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide dá-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo, ou encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida. Num e noutro caso, a solução do litígio deixa de interessar – além, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por já ter sido atingido por outro meio”.
Tendo sido revogado o ato de liquidação na pendência da causa, o presente processo fica esvaziado de objeto, pelo que a continuação da instância deixa de ter qualquer utilidade.
6. Responsabilidade pelas Custas
Dispõe o artigo 536.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 29.º do RJAT, que “nos casos de extinção da instância por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, a responsabilidade pelas custas fica a cargo do requerente, salvo se tal impossibilidade ou inutilidade for imputável ao réu ou requerido, caso em que é este o responsável pela totalidade das custas”.
Resulta dos Autos que a AT não usou a prerrogativa prevista no artigo 13.º, n.º 1, do RJAT, sendo que a liquidação sindicada nos autos apenas foi revogada após a notificação a que se refere o artigo 17.º do RJAT, razão pela qual a extinção da instância acaba por ser totalmente imputável à Requerida.
7. Decisão
Atento o exposto, este Tribunal Arbitral decide:
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Julgar extinta a instância por impossibilidade superveniente da lide; e,
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Condenar a Requerida nas custas processuais infra determinadas.
7. Valor do processo
De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária atribui-se ao processo o valor de € 59 485,33.
8. Custas
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 2.142,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida.
Coimbra, 3 de abril de 2024,
João Pedro Rodrigues