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Decisão Arbitral
Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr. Pedro Miguel Bastos Rosado e Dra. Raquel Franco, designados pelo Conselho Deontológico do CAAD para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 14-12-2023, acordam no seguinte:
1. Relatório
A…, S.A., B…, S.A., C…, S.A., D…, S.A. e E…, S.A., sociedades comerciais anónimas todas com sede em …, Oeiras, titulares, respetivamente, dos Números Únicos de Identificação de Pessoas Coletivas e de matrícula na Conservatória de Registo Comercial …, …, …, …, … (separada e respetivamente, “1.ª, 2.ª, 3.ª, 4.ª e 5.ª Requerente” ou, conjuntamente, “Requerentes”), vieram requerer a constituição de Tribunal Arbitral nos termos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), tendo em vista a apreciação da legalidade das decisões finais de indeferimento tácito dos pedidos de revisão oficiosa apresentados pelas Requerentes a 28 de Fevereiro e 1 de Março 2023 junto da Direção de Serviços do Imposto Municipal sobre Imóveis e, bem assim, dos seguintes atos tributários, no montante global de 513.393,62 EUR:
As Requerentes pedem a anulação parcial dos actos de liquidação de IMI e AIMI referidos e o reembolso da quantia de € 139.007,46, que entendem ter sido paga em excesso, e, bem assim, o pagamento de juros indemnizatórios.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante “AT”).
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 04-10-2023.
Em 22-11-2023, o Senhor Presidente do CAAD informou as Partes da designação dos Árbitros, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 11.º do RJAT.
Assim, em conformidade com o preceituado no n.º 8 artigo 11.º do RJAT, decorrido o prazo previsto no n.º 1 do artigo 11.º do RJAT sem que as Partes algo viessem dizer, o Tribunal Arbitral Colectivo ficou constituído em 14-12-2023.
A AT apresentou resposta em que defendeu a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.
Por despachos de 30-01-2024 e 08-02-2024, foi dispensada reunião e decidido que o processo prosseguisse com alegações.
As Partes apresentaram alegações.
O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é competente.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março) e estão devidamente representadas.
O processo não enferma de nulidades.
2. Matéria de facto
2.1. Factos provados
Consideram-se provados os seguintes factos relevantes para a decisão da causa:
-
As Requerentes são sociedades comerciais integrantes do GRUPO F… (“GRUPO”), que dedicam a sua atividade aos ramos da construção civil e imobiliário;
-
Entre 2018 e 2022, as Requerentes eram proprietárias, em regime de propriedade plena, de vários terrenos para construção;
-
Os valores patrimoniais tributários (VPT) dos terrenos para construção foram calculados tendo em conta os coeficientes de localização, de afetação e de qualidade e conforto previstos no artigo 38.º do CIMI;
-
Tendo por base esses VPT, a Autoridade Tributária emitiu as liquidações de IMI e AIMI objeto dos presentes autos, no montante global de 513.393,62 EUR, conforme infra se discrimina:
(documentos n.ºs 1 a 10 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
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As Requerentes procederam ao pagamento da totalidade do montante liquidado (documento n.º 13 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
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A 28 de Fevereiro e 1 de Março de 2023, as Requerentes apresentaram individualmente pedidos de revisão oficiosa das respetivas liquidações de IMI e de AMI, em sede dos quais peticionaram a anulação parcial de tais atos tributários e a restituição do imposto pago em excesso, no montante global de 139.007.46 EUR (Documentos n.ºs 15 a 19 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
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Os pedidos de revisão oficiosa não foram decididos até 02-10-2023, data em que as Requerentes apresentaram o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo;
2.2. Factos não provados e fundamentação da fixação da matéria de facto
Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos pelas Requerentes.
Não há controvérsia sobre a matéria de facto.
3. Matéria de direito
3.1. Posições das Partes
As Requerentes apresentaram pedidos de revisão oficiosa de actos de liquidação de IMI (Imposto Municipal sobre Imóveis) e AIMI (Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis), sobre os quais a Autoridade Tributária e Aduaneira não se pronunciou no prazo de quatro meses, pelo que se formou indeferimento tácito, nos termos do artigo 57.º, n.º s 1 e 45 da LGT.
As Requerentes defendem o seguinte, em suma:
– o cálculo do VPT dos terrenos para construção com base na fórmula ínsita no artigo 38.º, n.º 1, do CIMI – equiparando-os, sem mais, a prédios urbanos destinados a habitação, comércio, indústria e serviços –, originou liquidações de imposto em montante superior ao legalmente devido;
– os pedidos de revisão oficiosa apresentados pelas Requerentes seriam legalmente admissíveis atenta a verificação dos pressupostos legais ínsitos no artigo 78.º, n.º 1, da LGT;
– os pedidos de revisão oficiosa sempre seriam admissíveis à luz do disposto no artigo 78.º, n.ºs 4 e 5, da LGT;
– os pedidos de revisão oficiosa foram tempestivos para efeitos do n.º 4 do artigo 78.º da LGT, atentas as suspensões de prazos determinadas pela Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março;
– no caso em apreço, há injustiça grave porquanto resulta de tributação excessiva e desproporcionada;
– o erro de que padecem as liquidações de IMI e AIMI jamais se poderia considerar imputável às Requerentes – muito menos a um seu comportamento negligente – porquanto o mesmo foi provocado pela Autoridade Tributária, que calculou erroneamente o VPT dos terrenos para construção;
– os atos tributários sub judice não se encontram devidamente fundamentados;
– em momento algum foram dadas a conhecer às Requerentes as motivações da Autoridade Tributária que presidiram à aplicação do método de avaliação previsto no artigo 38.º do CIMI, nem os elementos e documentos que lhe subjazeram;
– restringir ou condicionar a impugnação contenciosa de actos de fixação de valores patrimoniais à dedução de pedido de 2.ª avaliação e subsequente impugnação judicial do acto avaliativo, consubstanciaria restrição injustificada e desproporcionada do direito de tutela judicial efetiva (artigo 20.º/1, da CRP), dado que não existem obstáculos à cognição judicial, em sede de impugnação dos subsequentes actos de liquidação, dos vícios em referência;
– o acto de fixação do VPT é um ato interlocutório imediatamente lesivo dos direitos do sujeito passivo, na medida em que impacta diretamente no apuramento do montante de imposto a pagar a título de IMI e AIMI;
– a interpretação normativa dos artigos 86.º da LGT, 54.º e 134.º do CPPT, 76.º e 77.º do CIMI, no sentido de a impugnação direta e autónoma de atos interlocutórios imediatamente lesivos – como o ato de fixação do VPT – ser um ónus do contribuinte, sob pena de preclusão do direito de impugnação do ato final do procedimento, é materialmente inconstitucional por violação do princípio da tutela jurisdicional efetiva e do direito de acesso à justiça e, bem assim, do princípio da justiça consagrados, respetivamente, nos artigos 20.º, n.º 1, e 268.º, n.º 4, da CRP;
– a falta de fundamentação consubstancia um vício imputável aos atos de liquidação de IMI e AIMI, podendo ser sindicado no âmbito da sua impugnação e não apenas (e só) em sede de impugnação judicial do ato avaliativo;
– ocorreu nos actos de fixação de valores patrimoniais errónea utilização dos coeficientes de localização afectação, de qualidade e conforto, previstos no artigo 38.º do CIMI, na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção;
– a fixação dos coeficientes de localização em mera portaria consubstancia uma violação do princípio constitucional da legalidade fiscal, na sua vertente da reserva de lei formal, consagrado nos artigos 103.º, n.º 2 e 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP, porquanto tais coeficientes deveriam constar de ato legislativo (lei parlamentar ou decreto-lei autorizado);
– o facto de, em conformidade com tais princípios, o direito das Requerentes (a reagir das liquidações de IMI de AIMI) só poder ser limitado, por força da aplicação conjugada dos artigos 86.º da LGT, 54.º e 134.º do CPPT, 76.º e 77.º CIMI, quanto a fundamentos de ilegalidade assentes em vícios intrínsecos ao ato avaliativo, o que exclui, designadamente, vícios antecedentes, atinentes, designadamente, ao regime de avaliação per se, bem como quaisquer vícios formais, como a falta de fundamentação;
– os actos tributários sub judice devem ser anulados com fundamento na violação do princípio da tutela jurisdicional efetiva e do direito de acesso à justiça e, bem assim, do princípio da justiça, consagrados, respetivamente, nos artigos 20.º, n.º 1, e 268.º, n.º 4, da CRP;
– os atos de fixação do VPT apenas poderão considerar-se abrangidos pela regra da impugnação autónoma obrigatória quanto a vícios inerentes ao procedimento de avaliação que se traduzam em desacordo face à avaliação apurada pela Autoridade Tributária, sob pena de se restringir de forma excessiva (e, consequentemente, inadmissível) o direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva, tudo sem justificação material bastante e em manifesta violação do preceituado nos artigos 20.º, n.º 1 e 18.º, n.º 2, da CRP.
A Autoridade Tributária e Aduaneira aceita que houve erros no cálculo dos valores patrimoniais tributários dos imóveis referidos (artigos 14.º e 15.º da sua Resposta), mas defende, em suma, que os actos de liquidação de IMI e AIMI não enfermam de ilegalidade e que os vícios exclusivos dos actos de determinação do VPT são insuscetíveis de ser invocados em impugnação dos actos de liquidação de IMI e AIMI praticados com base nesses valores.
No entanto, a Autoridade Tributária e Aduaneira opõe-se à pretensão da Requerente pelas seguintes razões, em suma:
– os Requerentes pretendem a anulação do acto impugnado com fundamento em vícios, não dos actos de liquidação, mas sim dos actos que fixaram o Valor Patrimonial Tributário (VPT), os quais constituem atos finais do procedimento de avaliação;
– o que os Requerentes contestam é, apenas e só, o ato de fixação do VPT e não o acto de liquidação;
– os actos de fixação do VPT não são atos de liquidação, mas actos autónomos e individualizados com eficácia jurídica própria e diretamente sindicáveis que põem fim ao procedimento de avaliação;
– o Supremo Tribunal Administrativo no processo n.º 102/22.2BALSB em 23-02-2023, veio uniformizar a jurisprudência sobre esta matéria no seguinte sentido de que «não tendo sido impugnado judicialmente o resultado da segunda avaliação, nos termos previstos na lei, forma-se caso decidido ou resolvido sobre o valor da avaliação, pelo que esta não pode voltar a ser discutida»;
– o artigo 78.º da LGT é inaplicável aos actos de fixação do VPT (actos administrativos em matéria fiscal), na medida em que visa apenas os actos tributários stricto sensu, incluindo o acto de determinação da matéria tributável, quando não dê lugar à liquidação de qualquer tributo, como decidiu o Supremo Tribunal (Pleno) de 23-02-2023, proferido no Proc.º n.º 0102/22.2BALSB.
– o artigo 78.º da LGT não abrange os atos de avaliação patrimonial, que não são atos tributários, previstos no n.º 1, nem são atos de apuramento da matéria tributável previstos no n.º 4 daquela norma;
– tão pouco se verifica qualquer erro no ato de liquidação, que foi calculado com base no VPT constante na matriz predial em estrito e integral cumprimento da lei;
– a revogação e a anulação dos atos administrativos em matéria tributária, estão previstas no artigo 79º da Lei Geral Tributária (LGT), sendo subsidiariamente aplicável o regime previsto nos artigos 165° a 174° do Código de Procedimento Administrativo (CPA), por força do artigo 2. c) da LGT;
– apenas são passíveis de anulação os atos de fixação dos VPT nos casos em que não tenham decorrido cinco anos desde a respetiva emissão;
– a inimpugnabilidade não viola a garantia da tutela jurisdicional efectiva pois a lei prevê vários e diferenciados meios para a impugnação dos valores patrimoniais tributários.
3.2. Vícios que podem ser fundamento de revisão oficiosa
A revisão oficiosa de liquidações de IMI é regulada pelo artigo 115.º do CIMI (Código do Imposto Municipal sobre Imóveis), com remissão para o artigo 78.º da LGT.
Artigo 115.º
Revisão oficiosa da liquidação e anulação
1 - Sem prejuízo do disposto no artigo 78.º da Lei Geral Tributária, as liquidações são oficiosamente revistas:
a) Quando, por atraso na actualização das matrizes, o imposto tenha sido liquidado por valor diverso do legalmente devido ou em nome de outrem que não o sujeito passivo, desde que, neste último caso, não tenha ainda sido pago;
b) Em resultado de nova avaliação;
c) Quando tenha havido erro de que tenha resultado colecta de montante diferente do legalmente devido;
d) Quando, havendo lugar, não tenha sido considerada, concedida ou reconhecida
isenção.
O artigo 78.º da LGT estabelece o seguinte:
Artigo 78.º
Revisão dos actos tributários
1. A revisão dos actos tributários pela entidade que os praticou pode ser efectuada por iniciativa do sujeito passivo, no prazo de reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade, ou, por iniciativa da administração tributária, no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável aos serviços.
2. Revogado.
3. A revisão dos actos tributários nos termos do n.º 1, independentemente de se tratar de erro material ou de direito, implica o respectivo reconhecimento devidamente fundamentado nos termos do n.º 1 do artigo anterior.
4. O dirigente máximo do serviço pode autorizar, excepcionalmente, nos três anos posteriores ao do acto tributário a revisão da matéria tributável apurada com fundamento em injustiça grave ou notória, desde que o erro não seja imputável a comportamento negligente do contribuinte.
5. Para efeitos do número anterior, apenas se considera notória a injustiça ostensiva e inequívoca e grave a resultante de tributação manifestamente exagerada e desproporcionada com a realidade ou de que tenha resultado elevado prejuízo para a Fazenda Nacional.
6. A revisão do acto tributário por motivo de duplicação de colecta pode efectuar-se, seja qual for o fundamento, no prazo de quatro anos.
7. Interrompe o prazo da revisão oficiosa do acto tributário ou da matéria tributável o pedido do contribuinte dirigido ao órgão competente da administração tributária para a sua realização.
No regime de revisão dos actos tributários, que consta do artigo 78.º da LGT, prevêem-se quatro situações essenciais em que é admitida a revisão:
– por iniciativa do sujeito passivo, no prazo de reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade (artigo 78.º, n.º 1, 1.ª parte);
– por iniciativa da administração tributária, no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável aos serviços (artigo 78.º, n.º 1, 2.ª parte);
– revisão da matéria tributável com fundamento em injustiça grave ou notória, desde que o erro não seja imputável a comportamento negligente do contribuinte (artigo 78.º, n.º 3);
– por motivo de duplicação de colecta, seja qual for o fundamento, no prazo de quatro anos (artigo 78.º, n.º 6).
Nos dois primeiros casos, a eventual anulação das liquidações decorrerá de vícios próprios e no terceiro é corolário da anulação da revisão da matéria tributável, neste caso fixada por actos de fixação de valores patrimoniais, de que as liquidações são actos consequentes, por terem por pressuposto o valor tributável naqueles fixados.
Em qualquer caso, a revisão por iniciativa da administração tributária (dita oficiosa), tanto da liquidação como da matéria tributável, é admitida também a pedido do contribuinte, como se conclui do teor expresso do n.º 7 do artigo 78.º ou referir que «interrompe o prazo da revisão oficiosa do acto tributário ou da matéria tributável o pedido do contribuinte dirigido ao órgão competente da administração tributária para a sua realização».
Como decorre do teor literal do n.º 1 do artigo 78.º, a revisão pedida no prazo da reclamação administrativa pode ter por fundamento «qualquer ilegalidade», enquanto a revisão pedida após o decurso desse prazo apenas pode ter por fundamento «erro imputável aos serviços».
O prazo da reclamação administrativa (reclamação graciosa) é de 120 dias, nos termos do artigo 70.º, n.º 1, do CPPT.
No caso em apreço, as Requerentes apresentaram os pedidos de revisão oficiosa em 28 de Fevereiro e 1 de Março de 2023, fora do referido prazo de 120 dias, pois mesmo relativamente às liquidações mais recentes, que são as relativas ao AIMI de 2022, o pagamento é efectuado no mês de Setembro do ano a que o impróprio respeita (artigo 135.º-H, n.º 1, do CIMI).
Assim, está afastada a possibilidade de impugnação com fundamento e «qualquer ilegalidade», prevista na 1.ª parte do n.º 1 do artigo 78.º da LGT.
Na 2.ª parte do mesmo n.º 1 do artigo 78.º da LGT prevê-se a possibilidade de apresentação de pedido de revisão oficiosa no prazo de quatro anos, «com fundamento em erro imputável aos serviços».
Como decorre desta restrição dos fundamentos de revisão oficiosa, nesta 2.ª parte do n.º 1 do artigo 78.º da LGT está-se perante um meio de impugnação de actos de liquidação de alcance limitado, pois esses actos apenas podem ser invalidados com fundamento em erro imputável aos serviços e não com fundamento em qualquer ilegalidade, como sucede com os meios impugnatórios utilizados dentro do prazo normal de impugnação de actos de liquidação, cfr. artigo 99.º do CPPT.
A expressão «erro» utilizada no n.º 1 do artigo 78.º da LGT reporta-se aos vícios dos actos tributários que na dogmática administrativa têm tal designação, que são o erro sobre os pressupostos de facto e o erro sobre os pressupostos de direito. O que exclui, como fundamento da revisão que não é apresentada no prazo de reclamação administrativa (caso em que pode ser invocada «qualquer ilegalidade») todos os vícios a que naquela dogmática não é atribuída a designação de «erro», designadamente os vícios de falta de fundamentação e de natureza formal. ( [1] )
Assim, o pedido de pronúncia arbitral improcede quanto aos vícios de falta de fundamentação e de invalidade formal das portarias que fixaram os coeficientes em que se baseou a determinação dos valores patrimoniais tributários, designadamente as Portarias n.ºs 1119/2009, de 30 de Setembro, e 420-A/2015, de 31 de Dezembro.
3.3. Erros imputáveis à Administração Tributária que podem ser fundamento de revisão oficiosa
A Autoridade Tributária e Aduaneira defende que os actos de fixação de valores patrimoniais são destacáveis e autonomamente impugnáveis e que se encontram consolidados na ordem jurídica por falta de impugnação tempestiva.
São meios processuais diferentes, com efeitos distintos, a impugnabilidade directa de actos de liquidação, com os efeitos retroactivos próprios da declaração de anulabilidade e direito a juros indemnizatórios, e a possibilidade de revisão oficiosa, com os fundamentos previstos no artigo 78.º da LGT, com efeitos mais limitados, não retroactivos, designadamente a nível de direito a juros indemnizatórios, como resulta do disposto no artigo 43.º, n.ºs 1 e 3 da LGT. ( [2] )
No caso em apreço, não foi apresentada reclamação graciosa ou impugnação judicial dos actos de liquidação de IMI nos prazos respectivos (previstos nos artigos 70.º, n.º 1, e 102.º n.º 1, do CPPT), mas foi pedida a revisão oficiosa que, nos termos do artigo 78.º da LGT, além de outros casos, pode ser pedida no prazo de quatro anos a contar dos actos de liquidação com fundamento em erro imputável aos serviços nos termos do seu n.º 1, ou no prazo de três anos com fundamento em injustiça grave e notória na fixação da matéria tributável, nos termos dos seus n.ºs 4 e 5.
Da revisão da matéria tributável apurada com fundamento em injustiça grave ou notória, prevista nos n.ºs 4 e 5 do artigo 78.º da LGT, decorre a anulação dos actos de liquidação que se tenham baseado nessa matéria tributável, pois são actos consequentes.
Em qualquer caso, a revisão por iniciativa da administração tributária (dita oficiosa), tanto da liquidação (n.ºs 1 e 3) como da matéria tributável (n.ºs 4 e 5), é admitida também a pedido do contribuinte, como se conclui do teor expresso do n.º 7 do artigo 78.º ou referir que «interrompe o prazo da revisão oficiosa do acto tributário ou da matéria tributável o pedido do contribuinte dirigido ao órgão competente da administração tributária para a sua realização».
Esta questão da invocação de vícios de actos de avaliação em procedimento de revisão oficiosa foi apreciada no acórdão proferido em 10-05-2021, no processo arbitral n.º 487/2020-T, cuja jurisprudência aqui se reafirma, no essencial.
Por força do preceituado no artigo 15.º do CIMI a avaliação dos prédios urbanos é directa e, por isso, ela é «susceptível, nos termos da lei, de impugnação contenciosa directa» (artigo 86.º, n.º 1, da LGT).
Nos termos do n.º 2 do mesmo artigo 86.º da LGT, «a impugnação da avaliação directa depende do esgotamento dos meios administrativos previstos para a sua revisão».
Os termos da impugnação da avaliação directa de valores patrimoniais constam do artigo 134.º do CPPT, em que se estabelece que:
– «os atos de fixação dos valores patrimoniais podem ser impugnados, no prazo de três meses após a sua notificação ao contribuinte, com fundamento em qualquer ilegalidade» (n.º 1); e
– «a impugnação referida neste artigo não tem efeito suspensivo e só poderá ter lugar depois de esgotados os meios graciosos previstos no procedimento de avaliação» (n.º 7).
Como decorre do n.º 1 do artigo 134.º, ao fixar um prazo especial de três meses para impugnação de actos de fixação de valores patrimoniais, «com fundamento em qualquer ilegalidade», e do n.º 7 do mesmo artigo, ao exigir o esgotamento dos meios graciosos, está afastada a possibilidade de essa impugnação com fundamento em ilegalidade se fazer, por via indirecta, na sequência da notificação de actos de liquidação que a tenham como pressuposto, como são os de IMI, sem observância do prazo de impugnação referido e sem esgotamento dos meios de revisão previstos no procedimento de avaliação.
No âmbito do IMI, quando o sujeito passivo não concordar com o resultado da avaliação directa de prédios urbanos, pode requerer ou promover uma segunda avaliação, no prazo de 30 dias contados da data em que o primeiro tenha sido notificado (artigo 76.º, n.º 1, do CIMI).
Só do resultado das segundas avaliações (que esgotam os meios graciosos do procedimento de avaliação) cabe impugnação judicial nos termos do CPPT (artigo 77.º, n.º 1 do CIMI).
Isto significa que os actos de avaliação de valores patrimoniais previstos no CIMI são actos destacáveis, para efeitos de impugnação contenciosa, sendo objecto de impugnação autónoma, não podendo na impugnação dos actos de liquidação que com base neles sejam efectuadas discutir-se a legalidade daqueles actos.
Assim, o sujeito passivo de IMI pode impugnar as liquidações, mas não são relevantes como fundamentos de anulação eventuais ilegalidades dos antecedentes actos de fixação de valores patrimoniais, que se firmaram na ordem jurídica, por falta de tempestivo esgotamento dos meios graciosos previstos nos procedimentos de avaliações e de subsequente impugnação autónoma a deduzir no prazo de três meses, nos termos dos n.ºs 1 e 7 do artigo 134.º do CPPT.
Na verdade, não sendo impugnado tempestivamente o acto de fixação de valores patrimoniais, forma-se caso decidido ou resolvido sobre a avaliação, que se impõe em sede de liquidação de IMI, sendo que «o imposto é liquidado anualmente, em relação a cada município, pelos serviços centrais da Direcção-Geral dos Impostos, com base nos valores patrimoniais tributários dos prédios e em relação aos sujeitos passivos que constem das matrizes em 31 de Dezembro do ano a que o mesmo respeita» (artigo 113.º do CIMI). O mesmo sucede quanto à liquidação de AIMI, que é feita com base nos valores patrimoniais que constam das matrizes prediais em 1 de Janeiro o ano a que respeita o imposto (artigos 135.º-C, n.º 1, e 135.º-G, n.º 1, do CIMI).
Este regime de impugnação autónoma justifica-se por razões de coerência do sistema jurídico tributário inerentes ao facto de cada acto de avaliação poder servir de suporte a uma pluralidade de actos de liquidação de impostos (liquidações anuais de IMI e eventuais liquidações de IMT) e ser relevante para vários efeitos a nível de IRS ( [3] ), IRC ( [4] ) e Imposto do Selo ( [5] ), o que não se compagina com a possibilidade de plúrima avaliação incidental que se reconduzisse à fixação de diferentes valores patrimoniais tributários para o mesmo prédio, no mesmo momento.
Por outro lado, a caducidade do direito de acção derivada da inércia do lesado por actos administrativos durante um prazo razoável, é generalizadamente justificada por razões de segurança jurídica, necessária para adequado funcionamento da administração pública, que é um valor constitucional ínsito no princípio do Estado de Direito democrático e é reconhecida generalizadamente em matéria administrativa e tributária.
O prazo de três meses para impugnação de actos de fixação de valores patrimoniais é perfeitamente razoável, sendo o prazo geral previsto a lei para a impugnação da generalidade dos actos administrativos com fundamentos geradores de vícios de anulabilidade (artigo 58.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e artigo 102.º do CPPT).
A natureza de actos destacáveis que é atribuída aos actos de avaliação de valores patrimoniais, quando inseridos num procedimento de liquidação, é, há muito, reconhecida pela jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, desde o tempo em que regime idêntico ao do artigo 134.º, n.ºs 1 e 7 do CPPT, previsto nos n.ºs 1 e 6 do artigo 155.º do Código de Processo Tributário de 1991, quer em sede de Sisa, quer de contribuição autárquica, quer de IMI quer de IMT, como pode ver-se pelos seguinte acórdãos:
– de 30-06-1999, processo n.º 023160 ([6] );
– de 02-04-2003, processo n.º 02007/02;
– de 06-02-2011, processo n.º 037/11;
– de 19-09-2012, processo n.º 0659/12 ([7] )
– de 5-2-2015, processo n.º 08/13;
– de 13-7-2016, processo n.º 0173/16;
– de 10-05-2017, processo n.º 0885/16.
Pelo exposto, as ilegalidades dos actos de avaliação invocados pelas Requerentes, que não foram objecto de impugnação tempestiva autónoma, não podem considerar-se ilegalidades dos actos de liquidação de IMI, susceptíveis de serem invocadas em processo impugnatório destes actos.
Por outro lado, o pedido de revisão não foi efectuado no prazo da reclamação administrativa a que se refere a 1.ª parte do n.º 1 do artigo 78.º da LGT, pelo que só poderia ser feita a revisão com fundamento em erro imputável aos serviços, nos termos da 2.ª parte daquele número.
Ora, os actos de liquidação de IMI, em si mesmos, não enfermam de qualquer erro imputável aos serviços, pois, por força do disposto no artigo 113.º, n.º 1, do CIMI «o imposto é liquidado anualmente, em relação a cada município, pelos serviços centrais da Direcção-Geral dos Impostos, com base nos valores patrimoniais tributários dos prédios e em relação aos sujeitos passivos que constem das matrizes em 31 de Dezembro do ano a que o mesmo respeita». O mesmo sucede quanto às liquidações de AIMI, que têm de ser efectuadas com base nos valores patrimoniais que constam das matrizes prediais em 1 de Janeiro o ano a que respeita o imposto (artigos 135.º-C, n.º 1, e 135.º-G, n.º 1, do CIMI).
Assim, tendo as liquidações sido efectuadas com base nos valores patrimoniais dos prédios que constavam das matrizes a 31 de Dezembro do ano a que respeita o IMI e que de Janeiro dos anos a que respeita o AIMI, não há qualquer erro da Administração Tributária ao efectuar as liquidações e, por isso, o pedido de revisão oficiosa não podia ser deferido ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º da LGT.
Por isso, tem razão a Autoridade Tributária e Aduaneira, quanto a esta questão, o que é reconhecido pelo Supremo Tribunal Administrativo no recente acórdão uniformizador de jurisprudência de 23-02-2023, processo n.º 102/22.2BALSB, citado pela Autoridade Tributária e Aduaneira, em que se decidiu que
«Deixando o contribuinte precludir a possibilidade de sindicar o valor patrimonial tributário nos termos previstos nos artigos 76.º e 77.º do Código do IMI, não pode arguir a ilegalidade da liquidação com fundamento na ilegalidade subjacente ao cálculo do valor patrimonial tributário que lhe serviu de matéria coletável».
3.4. Possibilidade de revisão oficiosa com fundamento em injustiça grave ou notória
Nos termos do n.º 4 do artigo 78.º da LGT, «o dirigente máximo do serviço pode autorizar, excepcionalmente, nos três anos posteriores ao do acto tributário a revisão da matéria tributável apurada com fundamento em injustiça grave ou notória, desde que o erro não seja imputável a comportamento negligente do contribuinte.
Pode questionar-se, como faz a Autoridade Tributária e Aduaneira, se esta possibilidade de revisão oficiosa pode fazer-se quando o acto que fixou a matéria tributável é um acto de fixação de valor patrimonial, susceptível de impugnação autónoma.
Designadamente, apesar da referida jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal Administrativo, poderia duvidar-se, com toda a pertinência, se o Supremo Tribunal Administrativo considerava esta jurisprudência uniformizada aplicável às situações em que o pedido de revisão oficiosa tem por fundamento «injustiça grave ou notória» na fixação da matéria tributável, pois a fixação de valores patrimoniais reconduz-se a fixação da matéria tributável e o artigo 78.º, n.º 4, da LGT estabelece que «o dirigente máximo do serviço pode autorizar, excepcionalmente, nos três anos posteriores ao do acto tributário a revisão da matéria tributável apurada com fundamento em injustiça grave ou notória, desde que o erro não seja imputável a comportamento negligente do contribuinte».
Este artigo 78.º, n.º 4, da LGT atribui natureza excepcional à revisão que aí admite e a excepcionalidade estará, naturalmente, no afastamento do regime normal de sindicância de actos de fixação da matéria tributável.
E, essas dúvidas sobre a aplicabilidade daquela jurisprudência a estas situações de revisão excepcional da matéria tributável eram pertinentes porque o acórdão uniformizador de 23-02-2023, na apreciação que faz, não alude sequer a esta possibilidade excepcional de revisão da matéria tributável, pelo que poderia, justificadamente, ser interpretado como reportando-se às outras situações, em que não se está perante injustiça grave e notória que, na perspectiva legislativa, justificam um regime excepcional.
No entanto, o Pleno do Supremo Tribunal Administrativo, nos acórdão de 22-11-2023, proferido no processo n.ºs 0115/23.7BALSB, aplicou aquela jurisprudência, que considerou consolidada, a uma situação em que estava em causa um pedido de revisão oficiosa formulado não só ao abrigo do n.º 1, mas também ao abrigo do n.º 4 daquele artigo 78.º, e esclareceu que o acórdão de 23-02-2023, proferido no Proc.º n.º 0102/22.2BALSB, «deve ser lido no sentido de que o artigo 78º é inaplicável aos actos de fixação do VPT (actos administrativos em matéria fiscal), na medida em que visa apenas os actos tributários stricto sensu, incluindo o acto de determinação da matéria tributável, quando não dê lugar à liquidação de qualquer tributo».
Neste contexto, visando o regime legal dos recursos para uniformização de jurisprudência obstar a que se produzam decisões jurisdicionais divergentes sobre as mesmas questões de direito, os tribunais arbitrais, como tribunais que julgam em 1.ª instância, apesar de não se inserirem na hierarquia dos tribunais administrativos e fiscais, devem aplicar a jurisprudência uniformizada, quando não se entrevê, com objectividade, a possibilidade de ela ser alterada.
Pelo exposto, aplicando a referida jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal Administrativo, tem de se concluir que também não era possível a revisão com fundamento no n.º 4 do artigo 78.º da LGT, pelo que fica prejudicado o conhecimento das restantes questões suscitadas pelas Requerentes, com excepção da questão da constitucionalidade desta restrição à impugnação.
3.5. Questões de inconstitucionalidade suscitadas pelas Requerentes
As Requerentes defendem que
– restringir ou condicionar a impugnação contenciosa de actos de fixação de valores patrimoniais à dedução de pedido de 2.ª avaliação e subsequente impugnação judicial do acto avaliativo, consubstanciaria restrição injustificada e desproporcionada do direito de tutela judicial efectiva (artigo 20.º, n.º 1, e 268.º, n.º 4, da CRP);
– a interpretação normativa dos artigos 86.º da LGT, 54.º e 134.º do CPPT, 76.º e 77.º do CIMI, no sentido de a impugnação direta e autónoma de atos interlocutórios imediatamente lesivos – como o ato de fixação do VPT – ser um ónus do contribuinte, sob pena de preclusão do direito de impugnação do ato final do procedimento, é materialmente inconstitucional por violação do princípio da tutela jurisdicional efetiva e do direito de acesso à justiça e, bem assim, do princípio da justiça consagrados, respetivamente, nos artigos 20.º, n.º 1, e 268.º, n.º 4, da CRP;
Na verdade, o que está em causa não é propriamente uma restrição ao direito de impugnação contenciosa dos actos de liquidação, mas sim a caducidade do direito de impugnar os actos de fixação de valores patrimoniais, por falta de impugnação tempestiva pelos meios próprios previstos na lei.
Como efeito, os actos de fixação de valores patrimoniais podem ser impugnados contenciosamente, com fundamento em qualquer ilegalidade, e a condição do esgotamento dos meios administrativos previstos para a sua revisão, que consta do n.º 2 do artigo 86.º da LGT e do n.º 7 do artigo 134.º, do CPPT, é justificada, pois tem em vista atenuar a margem de subjectividade inerente aos conceitos indeterminados que influenciam a avaliação de imóveis (como, por exemplo, a «qualidade construtiva» ou a «localização excepcional». E, decerto, como dizem as Requerentes, a 2.ª avaliação nem será necessária quando estiver em causa a impugnação de actos de fixação de valores patrimoniais com fundamento em vícios que não tenham a ver com a avaliação, como é o caso dos vícios de falta de fundamentação e de forma.
De qualquer modo, à face da referida jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, não é por as Requerentes não terem requerido 2.ª avaliação que é de rejeitar a possibilidade de revisão oficiosa, mas sim por não terem impugnado tempestivamente, por qualquer forma, os actos de fixação de valores patrimoniais.
Como já se referiu, o regime de impugnação autónoma de actos de avaliação justifica-se por razões de coerência do sistema jurídico tributário inerentes ao facto de cada acto de avaliação poder servir de suporte a uma pluralidade de actos de liquidação de impostos e ser relevante para vários outros efeitos.
Por outro lado, como também já se referiu, a caducidade do direito de acção decorrente da inércia do lesado por actos administrativos, é justificada por razões de segurança jurídica, que é um valor constitucional, ínsito no princípio do Estado de Direito.
Para além disso, como também já se disse, o prazo de três meses para impugnação de actos de fixação de valores patrimoniais, previsto no n.º 1 do artigo 134.º do CPPT, afigura-se ser razoável para assegurar adequadamente os direitos de impugnação contenciosa.
Neste contexto, tendo em mente o princípio da segurança jurídica, afigura-se que é materialmente constitucional o artigo 78.º, n.º 4, da LGT, interpretado, como fez o Supremo Tribunal Administrativo, com o alcance de não viabilizar a revisão oficiosa quando a causa da injustiça é um acto de fixação de valor patrimonial tributário.
3.6. Conclusão
Em face do exposto, conclui-se que improcede o pedido de pronúncia arbitral, pelo que não se justifica a anulação das liquidações impugnadas.
4. Reembolso de quantias pagas e juros indemnizatórios
As Requerentes pedem reembolso do imposto que entendem que pagaram a mais, com juros indemnizatórios.
Improcedendo o pedido de anulação das liquidações de IMI, improcede o pedido de reembolso das quantias pagas, que pressupõe essa anulação, bem como o pedido de juros indemnizatórios, que pressupõe a existência de uma quantia a reembolsar.
5. Decisão
De harmonia com o exposto acordam neste Tribunal Arbitral em:
-
Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral;
-
Absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira de todos os pedidos.
6. Valor do processo
De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 139.007,46, atribuído pelas Requerentes, sem contestação da Autoridade Tributária e Aduaneira.
7. Custas
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 3.060,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo das Requerentes.
Lisboa, 04-03-2024
Os Árbitros
(Jorge Lopes de Sousa)
(Pedro Miguel Bastos Rosado)
(Raquel Franco)
[1] Essencialmente neste sentido podem ver-se a jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Administrativo, designadamente os seguintes acórdãos: de 5-5-1999, processo n.º 05557-A, publicado no BMJ n.º 487, página 181; de 17-11-2004, processo n.º 0772/04; de 1-10-2008, processo n.º 0244/08; de 29-10-2008, processo n.º 0622/08; de 21-1-2009, processo n.º 0945/08; de 4-2-2009, processo n.º 0766/08; de 9-9-2009, processo n.º 0369/09; de 4-11-2009, processo n.º 0665/09; de 12-11-2009, processo n.º 0822/09; de 2-12-2009, processo n.º 0892/09; de 24-2-2010, processo n.º 022/10; de 7-9-2011, processo n.º 0416/11.
[2] Sobre os diferentes efeitos da impugnação judicial ou reclamação graciosa apresentados nos prazos respectivos e os efeitos da revisão oficiosa pedido para além desses prazos, pode ver-se o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12-07-2006, processo n.º 0402/06.
[3] Artigos 10.º, n.º 6, alínea d), 31.º, n.º 13, alínea d), 41.º, n.º 4, 43.º, n.º2, alínea b), 45.º, n.º 3, 46.º, n.º 3, e 51.º, n.º 2, do CIRS.
[4] Artigos 56.º, n.º 2, 64.º, n.ºs 2, 3, alíneas a) e b), 4 e 5, 139.º, n.º 1, 2, e 3 do CIRC.
[5] Artigos 13.º, n.ºs 1, 6 e 7, 31º, n.º 2, , 32.º do Código do Imposto do Selo ,
[6] Publicado em https://dre.pt/web/guest/pesquisa/-/search/3997226/details/normal?q=23160.
[7] Refere-se neste aresto:
Na verdade, em sede de IMI, a lei prevê um procedimento de determinação da matéria tributável – a avaliação do prédio (art. 14.º do CIMI) – que termina com o acto de fixação do VPT que serve de base à liquidação do imposto. Este acto, como é sabido, é um acto destacável para efeitos de impugnação contenciosa, pelo que é autonomamente impugnável, numa excepção ao princípio da impugnação unitária que, em regra, vigora no processo tributário (cfr. art. 134.º do CPPT) e que se encontra «em sintonia com o preceituado no art. 86.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que os actos da avaliação directa são directamente impugnáveis»
(...)
[t]ratando-se de actos destacáveis e inexistindo qualquer restrição relativa às ilegalidades que podem ser objecto de impugnação contenciosa, os vícios de que enferme o referido acto de avaliação apenas poderão ser arguidos em impugnação do acto de avaliação e não do acto de liquidação que seja praticado com base naquele, já que a atribuição da natureza de acto destacável tem por fim, precisamente, autonomizar os vícios deste acto para efeitos de impugnação contenciosa».