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DECISÃO ARBITRAL
SUMÁRIO:
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Os rendimentos auferidos com o exercício de atividade de encenação cénica têm protecção autoral no quadro do Código do Direito de Autor e Direitos Conexos.
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Enquanto tal podem enquadrar-se na categoria B, propriedade intelectual, ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do artigo 3.º do Código do IRS e beneficiar da exclusão de englobamento em 50% conforme artigo 58º nºs 1 do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
O árbitro Dra. Ana Teixeira de Sousa, designada pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para constituir o presente Tribunal Arbitral, profere a seguinte decisão:
1. RELATÓRIO
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A..., NIF..., residente na Rua..., n.º ..., ..., ...-... Charneca da Caparica, tendo em conta o indeferimento expresso do recurso hierárquico, proferido pela Sra. Diretora de Finanças de Setúbal, interposto contra o indeferimento expresso da reclamação graciosa apresentada contra a liquidação de IRS do ano de 2016, vem requerer PRONÚNCIA ARBITRAL, nos termos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro e das suas atualizações, sendo requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira,
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O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD, em 18.01.2023.
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Em conformidade com os artigos 5.º, n.º 2, alínea a), 6.º, n.º 1 e 11.º, n.º 1 do RJAT, o Conselho Deontológico deste Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) nomeou como árbitro singular a Dra. Ana Teixeira de Sousa Professor.
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As partes foram devidamente notificadas dessa designação, à qual não opuseram recusa, nos termos conjugados dos artigos 11.º, n.º 1, alíneas b) e c) e 8.º do RJAT e 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.
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Por força do preceituado na alínea c) do n.º 1 e do n.º 8 do artigo 11.º do RJAT, conforme comunicação do Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, o Tribunal Arbitral ficou constituído em 27.03.2023.
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A AT, tendo para o efeito sido devidamente notificada, ao abrigo do disposto no artigo 17.º do RJAT, apresentou a sua resposta a 26.04.2023, sustentando a improcedência do pedido.
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A Requerente solicitou a audição de uma testemunha, B..., a qual foi ouvida pelo tribunal em 24.01.2024 tendo o CAAD disponibilizado os meios de comunicação à distância Cisco Webex meetings.
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As partes apresentaram alegações tendo a Requerente entregue as suas alegações em 12.01.2024 e a Requerida entregue as alegações em 16.01.2024.
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O prazo para a prolação da decisão foi objecto de três prorrogações nos termos do artigo 21ºnº 2 do RJAT.
Descrição dos factos
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A Requerente prossegue a atividade de “Artistas de Teatro, Bailado, Rádio e Televisão” (CIRS 2010), de “Formadores” (CIRS 8011) e de “Criação Artística e Literária” (CAE 90030).
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Em 2016, a Requerente encenou a obra “...”, da autoria de B..., para a Associação Cultural – Teatro ..., NIPC ... .
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Nesta sequência, a Requerente emitiu duas faturas-recibo, nos montantes de 2.752,50 € e de 1.376,25 €, estando este valor já deduzido do IRS a título de retenção na fonte, que foi inscrito no recibo como sendo retenção ao abrigo do artigo 101º -D nº 1 do CIRS, considerando a retenção na fonte sobre 50% dos rendimentos.
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Em 24/05/2017, a Requerente entregou a declaração de IRS referente a 2016, tendo preenchido o anexo B, nomeadamente, os seguintes campos:
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Campo 403 – Rendimento das atividades profissionais especificamente previstas na Tabela do art.º 151.º do IRS – 11.490,00 €;
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Campo 406 – Propriedade intelectual (rendimentos abrangidos pelo art.º 58.º do EBF – parte não isenta) – 2.279,50 €.
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A Requerente foi, nessa sequência, notificada da liquidação n.º 2017..., de 24/05/2017, com o valor de 2.323,14 € tendo procedido ao pagamento a 30/08/2017.
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Em 31/12/2020, a Requerente foi notificada pessoalmente da liquidação adicional de IRS referente a 2016, com o n.º 2020..., no montante de 2.878,27 €, bem como da liquidação de juros com o n.º 2020..., no montante de 69,31.
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Esta liquidação tem na sua base a declaração oficiosa efetuada pela que substituiu a declaração anteriormente submetida pela Requerente, tendo alterado o Anexo B nos seguintes campos:
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Campo 403 – Passou a ter o valor de 16.049,00 €;
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Campo 406 - Passou a estar não preenchido.
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Estas liquidações geraram o montante adicional a pagar de 555,13 €, conforme demonstração de acerto de contas com o n.º 2020... .
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A Requerente procedeu ao pagamento do montante constante do acerto de contas em três prestações, conforme plano prestacional, DUC e comprovativos de pagamento que se juntam e dão por reproduzidos.
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A Requerente apresentou reclamação graciosa, à qual foi atribuído o n.º ...2021..., tendo sido notificada do projeto de decisão de indeferimento, através de ofício datado de 06/04/2021,
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A Requerente exerceu o seu direito de audição.
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Posteriormente, foi notificada do indeferimento da sua reclamação, através do Ofício n.º 2473, datado de 18/06/2021.
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Não concordando com a decisão da reclamação graciosa interpôs recurso hierárquico da mesma, tendo sido atribuído o n.º ...2021... .
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Através do ofício datado de 14/10/2022, foi notificada do indeferimento do recurso hierárquico.
Argumentos das partes
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Nos presentes autos a Requerente peticiona a anulação das decisões de indeferimento do recurso hierárquico e da reclamação graciosa, a consequente anulação da liquidação adicional de IRS n.º 2020..., bem como, a restituição dos valores já pagos, acrescidos de juros indemnizatórios, nos termos do disposto no artigo 62.º do CPPT.
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Alicerça os seus pedidos na alegada existência de vícios que inquinam a legalidade dos atos que indeferiram a reclamação graciosa e o recurso hierárquico apresentados por violação dos princípios da decisão, do inquisitório e da participação, e, por erro sobre os pressupostos de direito, designadamente, por a AT não acolher a posição por si sufragada de o rendimento obtido com a encenação da peça de teatro da obra literária “...”, da autoria de B..., deve ser enquadrado na categoria B como rendimento proveniente de propriedade intelectual e que, nessa medida, “(…) deve ser considerado no englobamento, para efeitos do IRS, apenas por 50 % do seu valor, líquido de outros benefícios, por força do estatuído no artigo 58.º, n.º 1 do EBF”.
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A Requerente imputa à decisão da reclamação e do recurso hierárquico vários vícios, nomeadamente:
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Vicio de violação do direito de audição pois, em sede direito de audição, foram acrescentados diversos novos elementos e argumentos que não tinham sido previamente apresentados na reclamação que vieram sustentar um enquadramento sólido da encenação na atividade autoral.
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E em sede de recurso hierárquico chegou-se ainda mais longe, com a junção de novas provas que corroboram a tese da Requerente.
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Para além disso, foi aditada prova documental e requerida a inquirição de uma testemunha, não constando dos dois despachos de indeferimento qualquer pronúncia acerca dessa matéria.
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De acordo com o disposto no n.º 7 do artigo 60.º da LGT, os novos elementos suscitados na audição dos contribuintes devem obrigatoriamente ser tidos em consideração na fundamentação da decisão da Administração, algo que não teve lugar na situação subjudice, já que tais elementos não foram sequer mencionados nem apreciados.
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O que decorre também do princípio da decisão, enunciado no n.º 1 do artigo 56.º da LGT, segundo o qual a administração tributária está obrigada a pronunciar-se sobre todas as questões suscitadas pelos interessados.
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Nesse sentido, a falta de apreciação dos novos elementos invocados constituirá um vício de forma, por deficiência de fundamentação.
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A decisão de indeferimento deve ser anulada por violação do direito de audição, bem como dos princípios da decisão (artigo 56.º da LGT), do inquisitório (artigo 58.º da LGT), da participação (artigo 60.º LGT), o que requer.
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Em matéria de erro na aplicação dos pressupostos de direito na decisão do recurso hierárquico, reclamação graciosa e acto de liquidação, a Requerente alega o seguinte:
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A atividade da encenação cénica tem enquadramento sólido na atividade autoral, designadamente enquanto atividade do domínio artístico (original), sendo este o entendimento, não só do legislador, o qual consagrou, expressamente, nos termos da alínea c), do n.º 1, do artigo 2.º do Código de Direito de Autor e Direitos Conexos (“CDADC”), a encenação como obra original, protegida por direito de autor, como também da doutrina nacional maioritária.
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E ainda, enquanto obra derivada (equiparada a original), decorrente da dramatização e transformação de uma obra preexistente, conforme expressamente prevê a alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º do CDADC e a alínea e) e o artigo 3.º do Regulamento de Registo de Obras Literárias e Artísticas (RROLA), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 143/2014, de 26 de setembro.
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No presente caso, temos diante de nós uma obra dramática (a peça propriamente dita), que resultou da adaptação de uma obra literária, in casu, a obra de B... intitulada “...”, tal como confirmado pela testemunha.
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De todo o exposto se retira que, não obstante estar aqui em causa uma adaptação, e, logo, uma obra derivada, a encenação, em si mesma, possui proteção jusautoral, tornando indiscutível a aplicação do artigo 58.º do EBF para efeitos de IRS.
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Estando em causa, inclusive, uma “nova criação intelectual”, enquanto obra derivada que resulta do produto da transformação da obra originária, e, consequentemente, digna de proteção, nos termos da alínea e) do artigo 3.º e da alínea c) do n.º 1 do artigo 4.º do RROLA.
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Conclusão que, aliás, a Sociedade Portuguesa de Autores já havia chegado, no parecer já remetido à AT anteriormente, pela ora Requerente e sobre o qual a AT nunca se chegou a pronunciar. (Documento n.º 16 junto com o pedido)
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O qual, em todo o caso, se volta a transcrever: “Nos termos do n.º 1 do art.º 1º do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos (CDADC), consideram-se obras as criações intelectuais do domínio literário, científico e artístico, por qualquer modo exteriorizadas, que, como tais, são protegidas. Uma obra será literária, artística ou científica desde que seja emanação de um esforço criador da inteligência, do espírito humano. São irrelevantes o mérito e o objectivo da obra, bastando a sua exteriorização sob qualquer forma apreensível pelos sentidos. O n.º 1 do art.º 2º do CDADC enuncia, de modo meramente exemplificativo, as criações intelectuais que são consideradas obras originais. Entre elas encontram-se a encenação de obras dramáticas ou dramático-musicais (alínea c), as obras de desenho (alínea g) e as obras de design que constituam criação artística (alínea l). De facto a encenação configura uma obra protegida pelo CDADC” (realce nosso).
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A Requerente é, indubitavelmente, titular originária do direito de autor da encenação, conforme exigido pelo n.º 1 do artigo 58.º do EBF, pois esta é uma criação intelectual sua.
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Ainda que, in casu, a obra dramática (teatral) se trate de uma obra derivada decorrente da adaptação de uma obra literária pré-existente e que constitua a sua base,
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A encenação da peça de teatro constitui, em si mesma, uma nova criação intelectual a ser protegida por direito de autor.
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Cujos respetivos direitos caem na esfera da sua titular, a ora Requerente.
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Sendo o desígnio do benefício fiscal em causa o de incentivar a criação artística, por forma a melhorar o nível de desenvolvimento cultural do país,
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Não poderá deixar de concluir-se que a encenação em causa, enquanto obra criada e apreciada como arte e resultado da atividade de produção estética da sua autora cumpre efetivamente essa finalidade de relevo e interesse inegavelmente públicos.
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Pelo que, em face de tudo o supra exposto, considera a Requerente que o rendimento que obteve adveniente da encenação da peça de teatro da obra literária “...”, da autoria de B..., deve ser enquadrado na categoria B como rendimento proveniente de propriedade intelectual, conforme o previsto na alínea c) no n.º 1 do artigo 3.º do CIRS.
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Acrescendo que, sendo esse rendimento proveniente da propriedade literária, artística e científica, deve ser considerado no englobamento, para efeitos do IRS, apenas em 50 % do seu valor, líquido de outros benefícios, por força do estatuído no artigo 58.º, n.º 1 do EBF.
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Termina pedindo anulação da decisão de indeferimento do recurso hierárquico e da reclamação graciosa, com a consequente anulação da liquidação adicional de IRS, atentos os vícios de que padecem.
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Mais requer a restituição dos valores já pagos, acrescidos de juros indemnizatórios, nos termos do disposto no artigo 62.º do CPPT.
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A Requerida, ou AT, responde sustentando a improcedência do presente pedido de pronúncia arbitral com base nos seguintes argumentos:
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Defesa por excepção da incompetência, dado que o PPA, a par do pedido de anulação da liquidação adicional de IRS, igualmente requer a anulação dos actos administrativos que indeferiram a reclamação graciosa e o recurso hierárquico.
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Actos que, nos termos da lei, estão excluídos do âmbito da competência material deste Tribunal Arbitral, não podendo, assim, este conhecê-las e/ou pronunciar-se sobre elas.
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A incompetência material configura uma exceção dilatória. Exceção, que desde já se suscita, e que determina a absolvição da instância no que a este pedido concerne, nos termos do estabelecido na alínea a) do n.º 4 do artigo 89.º do CPTA, aplicável ex vi alínea c) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.
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Quanto aos vícios alegados pela Requerente decorrentes da alegada violação do direito de audição em sede de Reclamação Graciosa e de Recurso Hierárquico, porquanto entender que os novos dados e elementos trazidos em sede de audiência de interessados, bem como a prova testemunhal requerida, não foram apreciados a Requerida argumenta o seguinte.
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Como é manifesto pelo próprio articulado da Requerente, e corroborado pelo P.A., em sede de reclamação graciosa a Requerente exerceu o direito de audição/participação que agora alega ter-lhe sido subtraído.
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Mais, para além dos elementos carreados pela Requerente nas conclusões dos processos administrativos foi tomado em consideração o parecer da DSIRS, vertido na Informação n.º 976/20, de 23/11/2018, a fls. 36 e segs. do P.A.
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Importa também recordar que na reclamação graciosa atende-se, entre outras, à simplicidade de termos e brevidade das resoluções, à dispensa de formalidades essenciais e à limitação dos meios probatórios à forma documental e aos elementos oficiais de que os serviços disponham, sem prejuízo do direito de o órgão instrutor ordenar outras diligências complementares manifestamente indispensáveis à descoberta da verdade material, conforme determina o artigo 69.º do CPPT.
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Tal significa que a Requerida não está obrigada a realizar todas as diligências requeridas pelos contribuintes se entender que as mesmas diligências, não acrescentam nada aos factos já apurados, como, aliás, sucedeu na situação dos autos.
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Improcede a alegada restrição de outros meios de prova, bem como alegada violação dos princípios da decisão, do inquisitório e da participação.
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Igualmente tem que improceder o alegado erro na aplicação dos pressupostos de direito.
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A fundamentação trazida a juízo em nada inova em relação à já analisada em sede de reclamação graciosa e recurso hierárquico.
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Designadamente, “O beneficio fiscal proveniente do artigo 58.º do EBF somente considera para tributação 50% dos rendimentos, no entanto é afastado esse beneficio ao rendimentos provenientes de certas obras a que não reconhece mérito (n.º 2 do artigo 58.º do EBF) ou prioridade e necessidade (desenvolvidas sem independência autoral criativa), dando lugar a uma necessária distinção casuística do caráter de cada obra a avaliar. No caso presente da reclamação, encenação teatral, a mesma carece de autoria, não existindo criação de obra do domínio literário e artístico, pois é desenvolvida a partir de uma obra existente, em que o encenador dedica-se a uma obra pré-existente atribuindo-lhe uma representação teatral que constitui um processo de seleção da estrutura física e representativa de adaptação ou modificação de um espaço performativo para uma determinada obra criada pelo dramaturgo. Sendo explícita esta distinção nos artigos 107.º a 112.º do CDADC, em que depende de autorização do autor a representação teatral de uma obra, mediante contrato de representação que se presume oneroso, dando o direito ao autor de fazer cessar imediatamente a representação não autorizada de uma obra sua. É vislumbrado no Parecer do CEF n.º 36/2003, de 25 de junho, que o requisito de criatividade inerente à titularidade original, enquanto "obra de autor", implica uma originalidade e um incremento de valor literário, científico ou artístico por parte do criador da obra. A obra encenada pela ora reclamante, "...", é proveniente de um dos livros de contos de B... (autor originário).Por esta forma, os rendimentos auferidos com o exercício da atividade de encenação cénica, uma vez que não têm enquadramento na atividade autoral, devem ser tributados como rendimentos da categoria B do CIRS, provenientes de prestações de serviços conforme disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 3.º do CIRS”.
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Em causa está a qualificação jurídica, para efeitos de tributação de IRS, dos rendimentos auferidos pela Requerente pela encenação teatral da obra “...”, da autoria de B... .
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Nos termos do disposto do n.º 1 do artigo 58.º do EBF “Os rendimentos provenientes da propriedade literária, artística e científica, incluindo os provenientes da alienação de obras de arte de exemplar único e os provenientes das obras de divulgação pedagógica e científica, quando auferidos por titulares de direitos de autor ou conexos residentes em território português, desde que sejam os titulares originários, são considerados no englobamento, para efeitos do IRS, apenas por 50 % do seu valor, líquido de outros benefícios” (evidenciado nosso).
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Acrescentando n.º 2 do mesmo artigo que “Excluem-se do disposto no número anterior os rendimentos provenientes de obras escritas sem carácter literário, artístico ou científico, obras de arquitectura e obras publicitárias”.
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O n.º 1 do artigo 1.º do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos (CDADC) define como obras “(…) as criações intelectuais do domínio literário, científico e artístico, por qualquer modo exteriorizadas (…)”.
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Dispõem as alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 3.º do CIRS que são rendimentos empresariais e profissionais os auferidos no exercício, por conta própria, de qualquer atividade de prestação de serviços, incluindo as de carácter científico, artístico ou técnico, qualquer que seja a sua natureza, ainda que conexa com atividades mencionadas na alínea anterior; bem como, os provenientes da propriedade intelectual ou industrial ou da prestação de informações respeitantes a uma experiência adquirida no setor industrial, comercial ou científico, quando auferidos pelo seu titular originário.
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É facto assente, a própria Requerente o reconhece, que a peça/obra por si encenada é proveniente de um dos livros de B... que é o autor originário.
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Ou seja, o exercício da atividade que deu origem aos rendimentos em discussão desenvolveu-se tendo por base uma obra já existente, à qual a Requerente deu uma representação cénica.
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A representação cénica é um processo de seleção de estrutura física e representativa da adaptação ou modificação de um espaço performativo para uma determinada obra criada pelo dramaturgo.
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A qual depende da autorização do autor, autorização essa vertida num contrato de representação, que se presume oneroso, e que confere direito ao autor de cessar a representação não autorizada de uma obra sua, cfr. artigos 107.º a 112.º do CDADC.
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Razões que obstam à argumentação expendida pela Requerente e que determinam que os rendimentos obtidos no exercício de atividade de encenação teatral têm que ser tributados como rendimentos de categoria B, a título de prestação de serviços, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 3.º do CIRS.
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Consequentemente, são declarados no campo 403 do Q4A do anexo B da modelo 3 de IRS 2016 pelos 100% do valor, in casu, €4.559,00, e o rendimento tributável (líquido) para o ano em causa determinado nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 31.º do CIRS.
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Pelo que, constatando-se que a Requerente não é a autora da obra que encenou, como obriga o n.º 1 do artigo 58.º do EBF, os rendimentos obtidos com a atividade cénica da obra de B... não podem ser “considerados no englobamento, para efeitos do IRS, apenas por 50 % do seu valor, líquido de outros benefícios”, como pretendido.
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Face a todo o exposto, tem que improceder o pedido da Requerente de anulação das decisões no caso da reclamação graciosa e recurso hierárquico bem como o pedido de anulação da liquidação adicional de IRS e também o pedido de pagamento de juros indemnizatórios tem que improceder.
Saneamento
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Quanto à competência do tribunal a Requerida defende-se por excepção, sustentando a improcedência do presente pedido de pronúncia arbitral, por incompetência material do tribunal dado que o PPA, a par do pedido de anulação da liquidação adicional de IRS, igualmente requer a anulação dos actos administrativos que indeferiram a reclamação graciosa e o recurso hierárquico.
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Actos que, nos termos da lei, estão excluídos do âmbito da competência material deste Tribunal Arbitral, não podendo, assim, este conhecê-las e/ou pronunciar-se sobre elas.
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Cabe decidir.
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Afigura-se-nos que decorre com, mais do que mediana, total clareza da literalidade do pedido, que o que a Requerente efetivamente pretende é a declaração de ilegalidade e a anulação do acto de liquidação adicional de IRS, ainda que o pretendesse também através da declaração de ilegalidade e anulação do acto que indeferiu o Recurso Hierárquico da decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa oportuna e previamente apresentada.
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Efectivamente, o pedido formulado pela Requerente está compreendido no âmbito das competências dos tribunais arbitrais constituídos sob a égide do CAAD, pois nele está incluída a apreciação de pretensões de «declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta», como decorre do estatuído na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT.
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Como bem se afirma na decisão proferida no processo n.º 117/2013-T do CAAD: «…a fórmula «declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta», utilizada na alínea a) do n.º 1 do art. 2.º do RJAT não restringe, numa mera interpretação declarativa, o âmbito da jurisdição arbitral aos casos em que é impugnado directamente um acto de um daqueles tipos. Na verdade, a ilegalidade de actos de liquidação pode ser declarada jurisdicionalmente como corolário da ilegalidade de um acto de segundo grau, que confirme um acto de liquidação, incorporando a sua ilegalidade.
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A inclusão nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD dos casos em que a declaração de ilegalidade dos actos aí indicados é efectuada através da declaração de ilegalidade de actos de segundo grau, que são o objecto imediato da pretensão impugnatória, resulta com segurança da referência que naquela norma é feita aos actos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta, que expressamente se referem como incluídos entre as competências dos tribunais arbitrais. Com efeito, relativamente a estes actos é imposta, como regra, a reclamação graciosa necessária, nos arts. 131.º a 133.º do CPPT, pelo que, nestes casos, o objecto imediato do processo impugnatório é, em regra, o acto de segundo grau que aprecia a legalidade do acto de liquidação, acto aquele que, se o confirma, tem de ser anulado para se obter a declaração de ilegalidade do acto de liquidação. A referência que na alínea a) do n.º 1 do art. 10.º do RJAT se faz ao n.º 2 do art. 102.º do CPPT, em que se prevê a impugnação de actos de indeferimento de reclamações graciosas, desfaz quaisquer dúvidas de que se abrangem nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD os casos em que a declaração de ilegalidade dos actos referidos na alínea a) daquele art. 2.º do RJAT tem de ser obtida na sequência da declaração da ilegalidade de actos de segundo grau.»
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A pretensão de receber o montante de imposto que tenha sido liquidado de forma ilegal é, pois, uma consequência da eventual declaração de ilegalidade, no âmbito do dever de «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado», estatuído na alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º do RJAT, pelo que tal pretensão não contende com a competência dos tribunais arbitrais tributários que funcionam no CAAD.
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Acresce que no PPA o objecto do pedido é, de forma clara, para um sujeito mediano, a anulação da liquidação adicional de IRS, sendo que o pedido de anulação da decisão de recurso hierárquico que indeferiu a reclamação graciosa tem por objecto a liquidação adicional de IRS, emitida pela AT, alegadamente ferida por vício de erro nos pressupostos de direito, daí que a mesma tenha de ser anulada.
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Veja-se também no “Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária” pelo Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, pág. 105, a propósito da declaração de ilegalidade dos actos de liquidação de que foram apresentadas reclamações graciosas ou recursos hierárquicos:”……Embora na alínea a) do artigo 2º apenas se faça referência explícita à competência dos tribunais arbitrais para declararem a ilegalidade dos actos de liquidação, actos definidores da quantia a pagar pelo contribuinte, essa competência estende-se também a actos de segundo e terceiro graus, que apreciem a legalidade desses actos primários, designadamente actos de indeferimento de reclamações graciosas ou recursos hierárquicos interpostos das decisões destas reclamações. Na verdade, essa conclusão retira-se inequivocamente da alínea a) do nº 1 do artigo 10º do RJAT, que faz referência expressa ao nº 2 do artigo 102º do CPPT ( que trata do deferimento da reclamação graciosa) e à “decisão do recurso hierárquico”.
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Nestes termos, é julgada improcedente a exceção de incompetência material do Tribunal Arbitral para apreciar e decidir o presente processo.
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O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, nos termos n.º 1 do artigo 10.º do RJAT e as partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e mostram-se devidamente representadas.
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O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído (artigos 5.º, n.º 2, 6.º, n.º 1, e 11.º do RJAT), e é materialmente competente (artigos 2.º, n.º 1, alínea a) do RJAT), de acordo com os fundamentos infra.
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O processo não padece de nulidades podendo prosseguir-se para a decisão sobre o mérito da causa.
2. FUNDAMENTAÇÃO
Factos dados como provados
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Com base nos documentos trazidos aos autos são dados como provados os seguintes factos relevantes para a decisão do caso sub judice
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A Requerente prossegue a atividade de “Artistas de Teatro, Bailado, Rádio e Televisão” (CIRS 2010), de “Formadores” (CIRS 8011) e de “Criação Artística e Literária” (CAE 90030).
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Em 2016, a Requerente encenou a obra “...”, da autoria de N..., para a Associação Cultural – Teatro ..., NIPC ... .
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Nesta sequência, a Requerente emitiu duas faturas-recibo, nos montantes de 2.752,50 € e de 1.376,25 €, respetivamente, conforme faturas (Documento n.º 1).
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Em 24/05/2017, a Requerente entregou a declaração de IRS referente a 2016, conforme documento que junta e dá por reproduzido (Documento n.º 2) tendo preenchido o anexo B, nomeadamente, os seguintes campos:
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Campo 403 – Rendimento das atividades profissionais especificamente previstas na Tabela do art.º 151.º do IRS – 11.490,00 €;
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Campo 406 – Propriedade intelectual (rendimentos abrangidos pelo art.º 58.º do EBF – parte não isenta) – 2.279,50 €.
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A Requerente foi, nessa sequência, notificada da liquidação n.º 2017..., de 24/05/2017, com o valor de 2.323,14 € (Documento n.º 3).
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Tendo procedido ao pagamento a 30/08/2017 (Documento n.º 4).
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Em 31/12/2020, a Requerente foi notificada pessoalmente da liquidação adicional de IRS referente a 2016, com o n.º 2020..., no montante de 2.878,27 €, bem como da liquidação de juros com o n.º 2020..., no montante de 69,31 €, conforme documentos que se juntam e dão por reproduzidos. (Documento n.º 5)
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Esta liquidação tem na sua base a declaração oficiosa efetuada pela AT (conforme certidão que se junta como Documento n.º 6), que substituiu a declaração anteriormente submetida pela Requerente, tendo alterado o Anexo B nos seguintes campos:
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Campo 403 – Passou a ter o valor de 16.049,00 €;
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Campo 406 - Passou a estar não preenchido.
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Assim, estas liquidações geraram o montante adicional a pagar de 555,13 €, conforme demonstração de acerto de contas com o n.º 2020... (Documento n.º 7).
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A Requerente procedeu ao pagamento do montante constante do acerto de contas em três prestações, conforme plano prestacional, DUC e comprovativos de pagamento (Documento n.º 8).
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A Requerente apresentou reclamação graciosa, à qual foi atribuído o n.º ...2021... .
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Nesta sequência, a Requerente foi notificada do projeto de decisão de indeferimento, através de ofício datado de 06/04/2021 (Documento n.º 9).
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A Requerente exerceu o seu direito de audição, conforme documento que se junta e dá por reproduzido. (Documento n.º 10).
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Posteriormente foi notificada do indeferimento da sua reclamação, através do Ofício n.º ..., datado de 18/06/2021, conforme documento que ora se junta e que se dá por reproduzido. (Documento n.º 11).
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A Requerente, não concordando com a decisão da reclamação graciosa supra identificada, interpôs recurso hierárquico da mesma, tendo sido atribuído o n.º ...2021... .
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Através do ofício datado de 14/10/2022, foi notificada do indeferimento do recurso hierárquico, conforme documento que se junta e dá por reproduzido. (Documento n.º 12).
Factos não provados
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Com relevo para a decisão sobre o mérito não existem factos alegados que devam considerar-se como não provados.
Motivação
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Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da matéria não provada (cf. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).
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Os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis das questões objeto do litígio (v. 596.º, n.º 1, do CPC, ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
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Assim, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados considerando a documentação entregue e os factos alegados pelas partes e não contraditados.
Questão decidenda
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A questão central assenta na qualificação dos rendimentos decorrentes da actividade de encenação de um conto literário, como rendimentos da categoria B do CIRS, provenientes de prestações de serviços conforme disposto na alínea b) do n-º 1 do artigo 3.º do CIRS, como defende a Requerida ou se esses rendimentos devem ser qualificados no quadro dos rendimentos decorrentes de propriedade literária, artística e científica, merecedores da tutela no âmbito do direito de autor e como tal abrangidos pelo benefício fiscal do artigo 58º nº 1 do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
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Em causa está o disposto no n.º 1 do artigo 58.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (“EBF”), do qual decorre que “Os rendimentos provenientes da propriedade literária, artística e científica, incluindo os provenientes da alienação de obras de arte de exemplar único e os provenientes das obras de divulgação pedagógica e científica, quando auferidos por titulares de direitos de autor ou conexos residentes em território português, desde que sejam os titulares originários, são considerados no englobamento, para efeitos do IRS, apenas por 50 % do seu valor, líquido de outros benefícios”.
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A AT entendeu, tanto em sede de reclamação graciosa como de recurso hierárquico, que o artigo em apreço não é aplicável à encenação enquanto modalidade artística, por entender que esta se encontra excluída do âmbito da propriedade literária, artística e científica.
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A AT, no projeto de decisão da reclamação graciosa e consequente decisão final conclui que “(…) os rendimentos auferidos com o exercício da atividade de encenação cénica, uma vez que não têm enquadramento na atividade autoral, devem ser tributados como rendimentos da categoria B do CIRS, provenientes de prestações de serviços conforme disposto na alínea b) do n-º 1 do artigo 3.º do CIRS”, tendo decidido, assim, pelo indeferimento da mesma. .
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A Requerente defende que a atividade da encenação cénica tem enquadramento sólido na atividade autoral, designadamente enquanto atividade do domínio artístico (original), sendo este o entendimento, não só do legislador, o qual consagrou, expressamente, nos termos da alínea c), do n.º 1, do artigo 2.º do Código de Direito de Autor e Direitos Conexos (“CDADC”), a encenação como obra original, protegida por direito de autor, como também da doutrina nacional maioritária.
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E ainda, enquanto obra derivada (equiparada a original), decorrente da dramatização e transformação de uma obra preexistente, conforme expressamente prevê a alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º do CDADC e a alínea e) e o artigo 3.º do Regulamento de Registo de Obras Literárias e Artísticas (RROLA), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 143/2014, de 26 de setembro.
Da legislação aplicável
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Nos termos do art. 58.º do EBF, com a epígrafe “Propriedade intelectual”, n.ºs 1 e 2:
«1- Os rendimentos provenientes da propriedade literária, artística e científica, considerando-se também como tal os rendimentos provenientes da alienação de obras de arte de exemplar único e os rendimentos provenientes das obras de divulgação pedagógica e científica, quando auferidos por autores residentes em território português, desde que sejam o titular originário, são considerados no englobamento para efeitos de IRS apenas por 50% do seu valor, líquido de outros benefícios.
2- Excluem-se do disposto no número anterior os rendimentos provenientes de obras escritas sem carácter literário, artístico ou científico, obras de arquitectura e obras publicitárias».
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Como explicitam F. Pinto Fernandes e J. Cardoso dos Santos, in EBF Anotado, Rei dos Livros, pág. 231, a finalidade daquele benefício fiscal é a de incentivar a criação artística ou literária, por forma a melhorar o nível de desenvolvimento cultural do país.
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No nº 1 do art. 3° do CIRS, dispunha-se (redacção à data dos factos):
«1 - Consideram-se rendimentos do trabalho independente:
a) - Consideram-se rendimentos empresariais e profissionais:
a) Os decorrentes do exercício de qualquer atividade comercial, industrial, agrícola, silvícola ou pecuária;
b) Os auferidos no exercício, por conta própria, de qualquer atividade de prestação de serviços, incluindo as de carácter científico, artístico ou técnico, qualquer que seja a sua natureza, ainda que conexa com atividades mencionadas na alínea anterior;
c) Os provenientes da propriedade intelectual ou industrial ou da prestação de informações respeitantes a uma experiência adquirida no setor industrial, comercial ou científico, quando auferidos pelo seu titular originário.
………………………………………………..
5 - Para efeitos deste imposto, consideram-se como provenientes da propriedade intelectual os direitos de autor e direitos conexos.
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Por sua vez, nos arts. 1º, 2º, 3º, 7º, 9° e 14º do Código de Direitos de Autor e de Direitos Conexos (CDADC), dispõe-se:
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Artigo 1º - Definição
«1 – Consideram-se obras as criações intelectuais do domínio literário, científico e artístico, por qualquer modo exteriorizadas, que, como tais, são protegidas nos termos deste Código, incluindo-se nessa protecção os direitos dos respectivos autores.
2 – As ideias, os processos, os sistemas, os métodos operacionais, os conceitos, os princípios ou as descobertas não são, por si só e enquanto tais, protegidos nos termos deste Código.
3 – Para os efeitos do disposto neste Código, a obra é independente da sua divulgação, publicação, utilização ou exploração.»
Artigo 2º - Obras originais
« 1 - As criações intelectuais do domínio literário, científico e artístico, quaisquer que sejam o género, a forma de expressão, o mérito, o modo de comunicação e o objectivo, compreendem nomeadamente:
a) Livros, folhetos, revistas, jornais e outros escritos;
b) Conferências, lições, alocuções e sermões;
c) Obras dramáticas e dramático-musicais e a sua encenação;
(…)»
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Artigo 3.º(Obras equiparadas a originais)
1 - São obras equiparadas a originais:
a) As traduções, arranjos, instrumentações, dramatizações, cinematizações, e outras transformações de qualquer obra, ainda que esta não seja objecto de protecção;
b) Os sumários e as compilações de obras protegidas ou não, tais como selectas, enciclopédias e antologias que, pela escolha ou disposição das matérias, constituam criações intelectuais;
c) As compilações sistemáticas ou anotadas de textos de convenções, de leis, de regulamentos e de relatórios ou de decisões administrativas, judiciais ou de quaisquer órgãos ou autoridades do Estado ou da Administração.
2 - A protecção conferida a estas obras não prejudica os direitos reconhecidos aos autores da correspondente obra original.
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Artigo 7º - Exclusão de protecção
«1 – Não constituem objecto de protecção:
a) As notícias do dia e os relatos de acontecimentos diversos com carácter de simples informações de qualquer modo divulgadas;
b) Os requerimentos, alegações, queixas e outros textos apresentados por escrito ou oralmente perante autoridades ou serviços públicos;
c) Os textos propostos e os discursos proferidos perante assembleias ou outros órgãos colegiais, políticos e administrativos, de âmbito nacional, regional ou local, ou em debates públicos sobre assuntos de interesse comum;
d) Os discursos políticos.
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(…)»
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Artigo 9º - Do conteúdo do direito de autor
«1 - O direito de autor abrange direitos de carácter patrimonial e direitos de natureza pessoal denominados direitos morais.
2 - No exercício dos direitos de carácter patrimonial o autor tem o direito exclusivo de dispor da sua obra e de frui-la e utilizá-la, ou autorizar a sua fruição ou utilização por terceiros total ou parcialmente.
3 - Independentemente dos direitos patrimoniais, e mesmo depois da transmissão ou extinção destes, o autor goza de direitos morais sobre a sua obra, designadamente o direito de reivindicar a respectiva paternidade e assegurar a sua genuinidade e integridade».
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Artigo 14º - Determinação da titularidade em casos excepcionais
«1 - Sem prejuízo do disposto no artigo 174º, a titularidade do direito de autor relativo a obra feita por encomenda ou por conta de outrem, quer em cumprimento de dever funcional quer de contrato de trabalho, determina-se de harmonia com o que tiver sido convencionado.
2 - Na falta de convenção, presume-se que a titularidade do direito de autor relativo a obra feita por conta de outrem pertence ao seu criador intelectual».
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Como decorre do disposto na al. c) do nº 1 do transcrito art. 3º do CIRS englobam-se na categoria B os rendimentos provenientes da propriedade intelectual, sendo que o n° 5 dispunha então, inequivocamente, que, para efeitos de tributação em IRS, são rendimentos deste tipo os auferidos a título de direitos de autor e direitos conexos.
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Ora, como salienta André Salgado de Matos (Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) - Anotado, 1ª edição, 1999, anotação 3 ao art. 3º, p. 97.) - reportando-se, embora, à inicial redacção do art. 3º do CIRS - apesar de parecer que o legislador fiscal pretendeu abstrair de qualquer outra concepção de propriedade intelectual, construindo um conceito específico para efeitos tributários, «a sua preocupação foi desnecessária pois já existe um conceito doutrinal amplo de propriedade intelectual que abrange, para além do direito de autor e direitos conexos, os direitos da propriedade industrial.”
Ratio do artigo 58º do Estatuto dos Benefícios Fiscais
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Como explicitam F. Pinto Fernandes e J. Cardoso dos Santos, in EBF Anotado, Rei dos Livros, pág. 231, citados no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo 01105/13.3BELRS de 02/02/2022 2ª Secção a finalidade daquele benefício fiscal é a de incentivar a criação artística ou literária, por forma a melhorar o nível de desenvolvimento cultural do país.
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Sendo, como vimos, o conceito de “propriedade intelectual” repleto de dificuldades, (…), ter-se-á querido abranger os rendimentos de “obras de carácter literário, artístico e científico”, o que, nas palavras de Rui Duarte Morais in “Sobre o IRS, 3ª ed. Almedina, pág. 78”, citado no mesmo Acórdão do STA, está regulado pelo Código do Direito de Autor e Direitos Conexos, sendo que, nas palavras desse doutrinador, “classicamente, obras protegidas, seriam criações do espírito humano nos domínios literário, artístico e científico. Hoje avultam, em termos de importância económica, outras criações — cuja proteção se procura lograr dentro dos quadros do direito de autor”.
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Mantendo ainda referência ínsitas no Acórdão do STA 01105/13.3BELRS de 02/02/2022 2ª Secção citando o Prof. Oliveira Ascensão, (Direitos intelectuais – Propriedade ou exclusivo, Themis, ano IX, nº 15 (2008), pág. 138).) se exara no acórdão do STJ, de 29/11/2012, processo nº 957/03.0TBCBR.C2.S1, «… na ausência de um conteúdo positivo do direito intelectual a doutrina avalizada defende que o direito intelectual, designadamente o que se protege, não é um direito de utilização de bens mas “consiste essencialmente na resultante exclusão de terceiros das actividades relativas a bens intelectuais. É por isso um direito exclusivo e não um direito de propriedade».
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Além disso, como supra já se referiu, aceita-se que o direito do autor abrange direitos de carácter patrimonial (disposição, fruição, utilização, reprodução e apresentação ao público) e de natureza pessoal (os denominados direitos morais, no exercício dos quais o autor tem o direito exclusivo, semelhante ao do proprietário, à reivindicação da paternidade e garantia da genuidade e integridade) – cfr. os supra transcritos nºs. 1 e 2 do art. 9º do CDADC, sendo que, esta dupla abrangência ocorre «quer se sigam as concepções monistas que caracterizam o direito de autor como unitário onde coexistem combinados interesses de diferente natureza mas que se aglutinam num só direito e que tomam como matriz o direito de propriedade (cf., neste sentido, Doutor Cunha Gonçalves – “Tratado de Direito Civil”, IV, 27 ss; H. Hubmann – “Das Recht des Schopperischen Geites, cit. pelo Prof. Oliveira Ascensão, in “Direito Autoral”, 317) quer se considere como um conjunto de direitos autónomos prevalecendo, em alguns casos, os direitos patrimoniais e noutros os pessoais ou, até, pessoalíssimos, independentes, mas complementares (cf. Dr. Luís Francisco Rebelo, in “Visita Guiada ao Mundo do Direito de Autor”, 44). E ainda, na linha do Prof. Oliveira Ascensão (ob. cit. 331) e do Dr. Alberto de Sá e Mello (“O Direito Pessoal de Autor no Ordenamento Jurídico Português”, 38, este embora com algumas reservas) a uma concepção pluralista que encontra “não apenas um direito pessoal ou moral ou um direito patrimonial com características que os conservam autónomos, como defendem os dualistas, mas um feixe de direitos pessoais e patrimoniais que se revelariam independentes e com características de comportamento distintas perante as várias vicissitudes sofridas pela situação jurídica a que respeita o direito de autor”.
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No que respeita ao chamado direito moral, este “mais não é do que o reconhecimento do carácter eminentemente pessoal da criação literária e artística, com todas as consequências que daí derivam em relação à obra intelectual como reflexo do criador e resultado do seu labor criativo».(Cfr. o supra mencionado aresto do STJ, que, nesta parte, transcreve o acórdão do mesmo STJ, de 1/7/2008, Revista nº 1920/08.)
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O Dr. António Maria Pereira (Propriedade literária e artística – Conceito e tipos legislativos, in Revista da Ordem dos Advogados, Ano 40, Vol. II, Maio/Agosto, 1980, pp. 485-501.) sublinha que as «criações do espírito humano» se dividem, para efeitos jurídicos, «em duas grandes categorias: as que têm, sobretudo, uma afectação industrial ou comercial — como é o caso das patentes, dos modelos industriais, das marcas, das tecnologias, etc. e as que são de natureza literária ou artística. As primeiras integram o domínio da propriedade industrial, as segundas são objecto do que se chama a propriedade literária ou artística ou, numa expressão mais moderna, o direito de autor.»
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E também ele, enunciando as várias condições para que se verifique a protecção da obra literária ou artística (originalidade, forma de expressão, mérito e destino da obra, conteúdo), conclui que este direito de propriedade literária e/ou artística se decompõe num certo número de direitos parcelares ou prerrogativas cujo exercício permite ao autor explorar a sua obra ou autorizar outras pessoas a fazê-lo, sendo costume considerar, a este respeito, os chamados direitos patrimoniais (que se corporizam na faculdade que assiste ao autor de receber uma remuneração como compensação pelo seu trabalho de criação intelectual, aqui se incluindo de tradução, de reprodução, de representação e execução pública, de radiodifusão (que engloba a televisão), de recitação pública e de adaptação) e o chamado direito moral (o direito de reivindicar a paternidade da obra, opondo-se a qualquer deformação, mutilação ou outra modificação da mesma, ou ainda a qualquer atentado contra ela, prejudicial à sua honra ou à sua reputação).
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Portanto, o direito de autor coenvolve direitos exclusivos de carácter patrimonial (disposição, fruição, utilização, reprodução e apresentação ao público com percepção de remuneração) e direitos morais (reivindicação da paternidade e garantia da genuinidade e integridade).
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5.4. No plano tributário e com referência à questão de saber o que deve entender-se por rendimentos provenientes da propriedade intelectual, para efeitos do disposto no art. 45º do EBF (que correspondia ao actual art. 56º) o Dr. Nuno Sá Gomes, acentuando que, nos termos do nº 3 do art. 3º do CIRS (na redacção original), «a expressão “propriedade intelectual” corresponde a “direitos de autor e direitos conexos”», também ressalva os direitos morais ou pessoais do autor e sustenta que «…parece deverem ser considerados rendimentos sujeitos a tributação, pela categoria b) do Código do IRS, todas as outras receitas dos próprios autores, pessoas singulares, previstas no respectivo código, incluindo as receitas auferidas pela transmissão do direito de propriedade sobre o suporte da obra (…) E serão, igualmente, rendimentos a considerar na tributação, por trabalho independente, as quantias recebidas por efeito da transmissão cessão ou oneração dos direitos de autor … desde que auferidos pelos seus originários, titulares, que sejam pessoas singulares». (Benefícios fiscais aos rendimentos provenientes da propriedade artística e literária, Parecer de 31/10/1989, in CTF nº 358, Abril-Junho de 1990, pp. 365/391.)
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E enunciando o problema de saber quais são os requisitos que devem revestir as obras literárias de arte plásticas ou visuais ou as obras literárias para sobre elas se constituírem direitos de autor, acaba por referir essencialmente a propriedade artística e as dificuldades quanto à classificação da obra de arte, sem se debruçar especificamente sobre o conceito da obra literária.
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Por sua vez, o Prof. Rui Duarte Morais salienta (Sobre o IRS, 2ª edição, Almedina, pp. 82/83.) que serão subsumíveis à previsão da al. c) do nº 1 do art. 3º do CIRS «os rendimentos resultantes da cedência de direitos de autor e direitos conexos, quando o cedente seja o titular originário (o autor). A estes direitos se pretende referir o legislador fiscal com a referência, porventura menos feliz, a "propriedade intelectual". Internacionalmente, é corrente o uso da expressão copyright para os designar.
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Classicamente, obras protegidas seriam criações do espírito humano nos domínios literário, artístico e científico. Hoje, avultam, em termos de importância económica, outras criações - cuja protecção se procura lograr dentro dos quadros do direito de autor -, em especial no domínio da informática (software) e, também, os chamados direitos conexos (direitos dos artistas intérpretes ou executantes, dos produtores fonográficos e videográficos e dos organismos de radiodifusão sonora ou visual).»
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Não devendo, ainda, esquecer-se que também a inicial redacção do art. 58º do EBF arrancava da distinção entre obras literárias e não literárias, nestas últimas se incluindo as de arte e científicas, sendo certo, contudo, que, de acordo com o que se dispunha à data dos factos, também às obras não literárias seria aplicável o benefício em questão se os rendimentos auferidos fossem provenientes da “propriedade” dos mesmos.
Do enquadramento doutrinário do direito de autor
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O direito de autor abrange direitos de carácter patrimonial e os chamados direitos morais de autor. Para o direito fiscal, só interessam, obviamente, os primeiros. Trata-se de direitos de exclusivo sobre a disposição e fruição e disposição da sua obra, abrangendo a possibilidade de a sua fruição ou utilização serem autorizadas ou cedidas a terceiro (art. 10° DL 63/85, 14/3). O titular do direito de autor é, salvo disposição em contrário, o criador intelectual da obra literária ou artística (art. 12° DL 63/85, 14/3) que, contudo, pode aliená-lo, onerá-lo ou cedê-lo (art. 44º DL 63/85, 14/3). São os rendimentos decorrentes desses actos de disposição pelo titular originário que são tributados nesta categoria.
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Quanto à ligação dos direitos de autor à cultura. como salientam os Profs. Gomes Canotilho e Vital Moreira (Constituição da República Portuguesa Anotada, I Vol., 4ª edição revista., 2007, anotação I ao art. 42º, pp. 620/621.) “A Constituição, embora contenha numerosas remissões sobre «cultura», «direitos culturais», «política cultural», abstém-se de definir a «cultura». A cultura é um conceito aberto, irreconduzível a qualquer definição imposta por instâncias ou instituições políticas ou a qualquer caracterização tipológico-formal. Estamos perante uma criação cultural quando um acto, conduta ou o seu resultado possa ser reconhecido ou ser recognoscível como uma forma possível de criação humana. O ponto de partida para qualquer criação cultural - intelectual, artística ou científica - é sempre: (1) a dimensão de criatividade humana assente (2) na iniciativa humana capaz (3) de dar forma a diferentes meios de expressão e de compreensão da realidade humana e material. (…)
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Na criação cultural confere-se centralidade à liberdade de pensamento nas suas várias expressões (liberdade de expressão, comunicação e informação, liberdade de consciência, liberdade de profissão). Na liberdade de criação científica são dominantes os critérios de intersubjectividade da comunidade científica que apontam para uma pesquisa séria da investigação da verdade segundo procedimentos e métodos específicos, possibilitadores de aquisições científicas dotadas de valor objectivo, decisivamente excludentes de «imposturas científicas». (…)
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O n° 2, conjugado com o n° 1, torna mais clara a densificação semântica do conceito de «criação intelectual, artística e científica». Ela abrange: (a) o processo de criação ou conformação; (b) a obra, concebida como objectivação da criação cultural; (c) a divulgação, o conhecimento e a comunicação do «produto», da criação cultural na qual se inclui, por ex., o «ensino científico», o «ensino das artes». Estas dimensões justificam a extensão da garantia constitucional, quer à actividade cultural em si («invenção e produção»), quer à irradiação do produto cultural («divulgação»).”
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Por sua vez o nº 1 do art. 1303º do CCivil estabelece que «os direitos de autor e a propriedade industrial estão sujeitos a legislação especial», sendo que o anterior Código de Direito de Autor (aprovado pelo DL nº 46.980, de 27/4/1966) foi, posteriormente, revogado pelo DL nº 63/85, de 14/3 que aprovou o actualmente vigente Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos (CDADC) considerando protegidas (cfr. o seu art. 1º) as «criações intelectuais do domínio literário, cientifico e artístico», independentemente do modo de exteriorização, incluindo-se nessa protecção os direitos dos respectivos autores.
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Ora, como, citando o Prof. Oliveira Ascensão, (Direitos intelectuais – Propriedade ou exclusivo, Themis, ano IX, nº 15 (2008), pág. 138).) se exara no acórdão do STJ, de 29/11/2012, processo nº 957/03.0TBCBR.C2.S1, «… na ausência de um conteúdo positivo do direito intelectual a doutrina avalizada defende que o direito intelectual, designadamente o que se protege, não é um direito de utilização de bens mas “consiste essencialmente na resultante exclusão de terceiros das actividades relativas a bens intelectuais. É por isso um direito exclusivo e não um direito de propriedade».
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O direito de autor e os direitos conexos são regidos, em Portugal, por várias convenções internacionais, entre as quais a Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas, de 9 de setembro de 1886, revista em Paris, a 24 de Julho de 1971; e, no direito interno, pelo Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos CDADC (Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 63/85, de 14 de Março, e alterado por diversas leis).
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Conforme referido o Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos define, no seu artigo 1º, como obras sujeitas a protecção “as criações intelectuais do domínio literário, científico e artístico, por qualquer modo exteriorizadas”. Do mesmo modo, por não existir exteriorização, não são objecto de protecção “as ideias, os processos, os sistemas, os métodos operacionais, os conceitos, os princípios e as descobertas” (Artigo 1º/2 do CDADC).
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O artigo 2º/1 do mesmo Código contém uma enumeração exemplificativa do que se entende por criação intelectual sujeita a protecção pelo direito de autor. Refere, pois, este artigo:
“1 – As criações intelectuais do domínio literário, científico e artístico, quaisquer que sejam o género, a forma de expressão, o mérito, o modo de comunicação e o objectivo, compreendem nomeadamente:
a) Livros, folhetos, revistas, jornais e outros escritos;
b) Conferências, lições, alocuções e sermões;
c) Obras dramáticas e dramático-musicais e a sua encenação;
d) Obras coreográficas e pantomimas, cuja expressão se fixa por escrito ou por qualquer outra forma;
e) Composições musicais, com ou sem palavras;
f) Obras cinematográficas, televisivas, fonográficas, videográficas e radiofónicas;
g) Obras de desenho, tapeçaria, pintura, escultura, cerâmica, azulejo, gravura, litografia e arquitectura;”.
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Para a presente situação o que aqui interessa é a alínea c) deste artigo, em que se refere “obras dramáticas e dramático-musicais e a sua encenação”. Ora, de acordo com o que refere este diploma legal, poderia dizer-se que a encenação é tutelada pelo direito de autor.
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No entanto, mais nenhuma referência existe na legislação sobre a protecção autoral a conceder ao encenador e a doutrina diverge.
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Para Maria Regina Rendinha, in “Uma interpelação do teatro ao Direito – Nótula sobre a Propriedade Intelectual” In: Teatro do Mundo. O Teatro na Universidade. Ensaio e Projecto, p. 113. Disponível em: http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/10138.pdf a tutela da encenação é, praticamente, inexistente. Afirma-se que existe uma protecção autoral da encenação, mas não se faz qualquer outra referência à questão em causa. Por outro lado, o conjunto de direitos que derivam para o autor da obra dramática adaptada, através do contrato de representação criam um forte obstáculo, não apenas à protecção autoral da encenação, mas à própria liberdade criativa do encenador.
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Refere, a este propósito, ainda, Maria Regina Redinha:“O objecto preferencial de protecção, quando não único, no figurino do Código é a obra literária subjacente a um contrato de representação. Daí que exaustivamente se enumerem e enunciem os extensos direitos que do contrato de representação derivam para o autor da obra – art. 113º CDADC –, sem que exista simétrica disposição relativa ao(s) autor(es) da representação.
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Já Luiz Francisco Rebello in “Introdução ao Direito de Autor”, Vol. 1, Lisboa, Publicações Dom Quixote,1994 pág. 68, citado por Paula Isabel Pratas Teles de Meneses Leitão in “Direitos de autor na encenação de obras dramáticas”, na dissertação apresentada na Universidade Católica conducente ao, grau de mestre em Direito Forense, datada de 30 de Outubro de 2015, também entende que a protecção autoral da encenação deve ser feita como direito original sendo mais correcta do que a mera protecção da encenação teatral através do regime dos direitos conexos. Afirma o autor, sobre a consideração do encenador como sujeito de direitos conexos:“É desconhecer a evolução estética da arte dramática, que atribui ao encenador uma função criativa, e não de mero intérprete ou executante, pois é ele quem opera a conversão do texto dramático em acção dramática: a representação de uma peça teatral é uma realidade qualitativamente distinta do respectivo texto e, tal como a coreografia de um bailado ou a realização de um filme, constitui-se numa verdadeira criação artística autónoma, cuja protecção legal encontra no Direito de Autor, tal como aquelas, a sua sede mais adequada.”
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Similarmente entende Luís Menezes Leitão, in MENEZES LEITÃO, Luís Manuel Teles de. Direito de Autor. Coimbra: Almedina, 2011, p. 81., citado pela mesma autora na dissertação “Direitos de autor na encenação de obras dramáticas” afirma a existência manifesta de um contributo original por parte do encenador, visto que a criação apresentada em palco habitualmente constitui uma realidade diversa da que o texto dramático apresenta, “o qual normalmente deixa inúmero espaço para a actividade criativa do encenador.”
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Contudo, dado que nada mais se afirma sobre os direitos do encenador, a protecção autoral da encenação é deixada a cargo da autonomia das partes contratuais. Como afirma António Xavier, in XAVIER, António. As Leis dos Espectáculos e Direitos Autorais. Coimbra: Almedina, 2002, p. 56, citado na obra “Direitos de autor na encenação de obras dramáticas” “Já vimos como o CDAC considera a encenação como obra protegida. E, nada mais se dizendo na lei sobre a encenação, fica para o contrato a definição dos direitos e deveres do encenador. É normal que as condições financeiras constem de uma quantia fixa e de uma percentagem de bilheteira. A escolha dos outros colaboradores artísticos também pode constar do contrato. Quanto a reposições e digressões, tivemos conhecimento de contratos em que se estipulavam, ab initio, as condições de remuneração do encenador pela supervisão das reposições. Se a encenação estivesse expressa por escrito, ou por qualquer outro meio, o encenador só poderia “exigir” o que a lei lhe confere como autor: o poder de “fiscalização” sobre a montagem para verificar se a sua encenação inicial não foi, porventura, desvirtuada”.
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Autores existem, que entendem, por outro lado, que o encenador não deve ser protegido pelo direito de autor. Esta é a posição de Oliveira Ascensão, in OLIVEIRA ASCENSÃO, José de. Direito Civil, Direito de Autor e Direitos Conexos. Coimbra: Coimbra Editora, 1992, pp. 79-80. citado na dissertação “Direitos de Autor na encenação de Obras Dramáticas” que entende que a encenação, enquanto acto teatral, não é uma obra, por si só, não é mais do que o texto onde se baseia: “A encenação não faz uma obra dramática. Se há alteração da obra dramática preexistente teremos verdadeiramente uma transformação desta, mas então nada nos autoriza a falar duma obra de encenação. Também a encenação não é uma obra de natureza diferente. Se se pretender ver esta nas instruções para a apresentação em cena, defrontamos o princípio de que as instruções não são tuteladas por si. Se virmos essa obra no próprio espectáculo teatral, teremos uma realidade diferente, que é atingida pelo direito ao espectáculo, que o artigo 117º atribui ao empresário, aos artistas e ao autor, mas não ao encenador. (…) Poderá ripostar-se que o mesmo acontece afinal na obra cinematográfica, em que o realizador é considerado autor (art. 22º/1-a). É verdade. Mas justamente a obra cinematográfica é uma obra diferente da obra preexistente. É uma obra cinética, não um texto. Ora, em relação à obra dramática ou dramático-musical não se encontra um novo género que seja diferente do texto em que se baseia.”
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Afirma ainda Oliveira Ascensão que o regime constante do artigo 181º do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos seria um motivo para a não consagração da encenação, enquanto obra sujeita a tutela autoral: “Implicitamente, está integrando o encenador entre os artistas protegidos, pois só assim se compreende que os represente. Uma vez que o encenador não pode ser protegido simultaneamente por um direito de autor e um direito conexo, a contradição resolve-se em face do art. 122º [181º] que traz um regime concreto contra a mera declaração do art. 2º.”29. “
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Assim, Oliveira Ascensão acaba por afastar a tutela autoral do encenador, ao afirmar que este pode ser protegido pelos direitos conexos.
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A doutrina que entende que a encenação não é uma obra original divide-se entre a consideração da encenação enquanto obra derivada (que, nos termos da legislação, é equiparada a obra original e protegida pelo direito de autor) ou a tutela de um direito conexo que protege o empresário e o intérprete-executante, mas ignora em absoluto a existência de quem criou o objecto artístico.
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Tal como defende Paula Isabel Pratas Teles de Menezes Leitão poderíamos dizer que a encenação de um texto dramático (sublinhe-se aqui de novo que não é a única forma de criação teatral) depende tanto do texto dramático preexistente como o filme depende do seu argumento. Com a diferença clara de os argumentos de cinema não constituírem obras literárias. Não existe qualquer dúvida para o espectador que assiste ao “acto teatral” de que um “espectáculo de teatro” e um “texto dramático” não são a mesma realidade. Podem co-existir ambos naquele momento, mas são criações díspares, cada uma assinada pelo seu autor. É isso que permite que, por exemplo, esteja documentada a existência, na base de dados do Centro de Estudos de Teatro da Faculdade de Letras (Cet-base) de 42 espectáculos, com referência ao texto “Romeu e Julieta”, de William Shakespeare e que cada um possa ter sido único, à sua maneira, com a marca autoral de quem o criou
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A protecção autoral do encenador está consagrada na lei, conforme artigo 2º do CDADC.
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Vejamos os critérios mínimos, segundo a maioria da doutrina, para haver protecção autoral neste caso da criação teatral.
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O primeiro critério avançado é o da fixação ou seja, o da exteriorização.
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No caso da obra encenada, há desde logo uma maior desmaterialização. E também da sua natureza efémera. Por um lado ela verifica-se após a primeira representação, efectivamente, se um encenador deixar a meio o processo de encenar um texto ou uma peça antes da estreia outro encenador pegará nesse texto ou peça para o finalizar.
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Por outro lado a obra esgota-se após a representação.
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Ora o CDADC consagra a necessidade de fixação das obras coreográficas e pantomimas “por escrito ou por qualquer outra forma”.
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Desta forma, para a encenação não deve estar sujeita a um regime mais restritivo. Acompanha-se a conclusão de Paula Isabel Menezes Leitão na obra já citada “Direitos de Autor na Encenação de Obras Dramáticas” de que a fixação pode ser feita pelo encenador de forma escrita ou através de qualquer meio que considere adequado à criação em causa.
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Acresce que o artigo 12 º do CDADC estabelece que:
(Reconhecimento do direito de autor)
O direito de autor é reconhecido independentemente de registo, depósito ou qualquer outra formalidade.
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Outro requisito mínimo é o da originalidade. O argumento mais utilizado contra a protecção autoral da encenação é a “falta de originalidade”, derivada do facto de a encenação depender de uma obra pré-existente.
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Efectivamente, o dramaturgo tem o direito de controlar aquilo que criou. Esse dierito está consagrado até no artigo 113º do CDACD que regula os direitos do autor no contrato de representação.
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Há contudo que atender ao artigo 109.º (Forma, conteúdo e efeitos) aplicável ao contrato de representação que refere: 1 - Pelo contrato de representação o autor autoriza um empresário a promover a representação da obra, obrigando-se este a fazê-la representar nas condições acordadas.
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Pelo que não está aqui em causa o contrato celebrado com o encenador.
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Segundo se lê no estudo “Direitos de Autor na Encenação de Obras Dramáticas” op, citado, partir das décadas sessenta e setenta, o paradigma da criação teatral mudou radicalmente e foi criada uma nova concepção de teatro, a que, em 1999, o teórico alemão Hans-Thies Lehmann veio designar como “teatro pós-dramático”.
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A Evolução estética do teatro pós dramático implica, em primeiro lugar, que cada vez mais, a criação teatral se separa do texto dramático, o que leva a que não se possa preterir a protecção autoral da criação teatral; em segundo lugar, a preocupação com o processo, mais do que o resultado e a criação de objectos artísticos cada vez mais efémeros. Pelo que o Direito pode vir a ter cada vez mais dificuldades em definir os objectos sujeitos a tutela autoral.
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Ora no caso objecto do presente julgamento crê-se que é possível atribuir à Requerente, enquanto autora da encenação teatral da obra “...”, da autoria de B..., para a Associação Cultural – Teatro ..., NIPC...a protecção inerente ao direito de autor.
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A Requerente prossegue a atividade de “Artistas de Teatro, Bailado, Rádio e Televisão” (CIRS 2010), de “Formadores” (CIRS 8011) e de “Criação Artística e Literária” (CAE 90030).
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A Sociedade Portuguesa de Autores, no parecer já remetido à AT anteriormente, que a Requerente junta e que se dá por reproduzido para todos os efeitos legais. (Documento n.º 16) conclui o seguinte:
“Nos termos do n.º 1 do art.º 1º do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos (CDADC), consideram-se obras as criações intelectuais do domínio literário, científico e artístico, por qualquer modo exteriorizadas, que, como tais, são protegidas. Uma obra será literária, artística ou científica desde que seja emanação de um esforço criador da inteligência, do espírito humano. São irrelevantes o mérito e o objectivo da obra, bastando a sua exteriorização sob qualquer forma apreensível pelos sentidos. O n.º 1 do art.º 2º do CDADC enuncia, de modo meramente exemplificativo, as criações intelectuais que são consideradas obras originais. Entre elas encontram-se a encenação de obras dramáticas ou dramático-musicais (alínea c), as obras de desenho (alínea g) e as obras de design que constituam criação artística (alínea l). De facto a encenação configura uma obra protegida pelo CDADC” .
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A AT efetuou um pedido de esclarecimento à Associação Cultural “Teatro...”, relativamente aos rendimentos da propriedade intelectual da aqui Requerente, pagos pela primeira, no ano de 2016,
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Tendo os mesmos sido prestados e indicado que a Requerente preencheu corretamente a declaração de rendimentos, no que aos rendimentos provenientes de propriedade intelectual, conforme documento (Documento n.º 17).
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O autor da obra, B..., assina uma declaração que corrobora em testemunho perante o tribunal no sentido de que a encenação levada a cabo pela Requerente corresponde não à totalidade da obra “...”, mas a excertos da mesma. O autor considera que: a a encenação do conto que escreveu implica um trabalho criativo em profundidade, uma compreensão muito própria, particular e pessoal das palavras escritas, de modo a projectá-las em palco (…….). O que daí resulta não é a mera leitura de um conto pré-existente. Outro encenado teria uma visão completamente diferente do mesmo texto. Trata-se na verdade de todo um processo autoral inventivo, no plano da criação.
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A testemunha também referiu que aqueles textos, encenados por outro encenador, seriam interpretados, entoados e conceptualizados de forma completamente diferente. Acrescentou, ainda, que não teve qualquer intervenção na encenação.
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Neste sentido, e tendo em conta todo o exposto, a Requerente é, indubitavelmente, titular originária do direito de autor da encenação, conforme exigido pelo n.º 1 do artigo 58.º do EBF, pois esta é uma criação intelectual sua.
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Ainda que, in casu, a obra dramática (teatral) se trate de uma obra derivada decorrente da adaptação de uma obra literária pré-existente e que constitua a sua base.
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A encenação da peça de teatro constitui, em si mesma, uma nova criação intelectual a ser protegida por direito de autor.
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Cujos respetivos direitos caem na esfera da sua titular, a ora Requerente.
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Sendo o desígnio do benefício fiscal em causa o de incentivar a criação artística, por forma a melhorar o nível de desenvolvimento cultural do país,
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Não poderá deixar de concluir-se que a encenação em causa, enquanto obra criada e apreciada como arte e resultado da atividade de produção estética da sua autora cumpre efetivamente essa finalidade de relevo e interesse inegavelmente públicos.
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Pelo que, em face de tudo o supra exposto, considera-se que o rendimento que a Requerente obteve adveniente da encenação da peça de teatro da obra literária “...”, da autoria de B..., deve ser enquadrado na categoria B como rendimento proveniente de propriedade intelectual, conforme o previsto na alínea c) no n.º 1 do artigo 3.º do CIRS.
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Sendo esse rendimento proveniente da propriedade literária, artística e científica, deve ser considerado no englobamento, para efeitos do IRS, apenas por 50 % do seu valor, líquido de outros benefícios, por força do estatuído no artigo 58.º, n.º 1 do EBF.
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Ficando assim justificadamente afastada a necessidade de julgar os outros fundamentos apresentados pela Requerente para solicitar a anulação do acto de liquidação adicional de IRS.
Juros indemnizatórios
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A Requerente pede ainda a condenação da AT no reembolso do imposto indevidamente pago acrescido de juros indemnizatórios.
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De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão vincula a Administração Tributaria, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo, cabendo-lhe “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito”. O que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT, aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.
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Por efeito da reconstituição da situação jurídica em resultado da anulação do acto tributário, há́ assim lugar ao reembolso do imposto indevidamente pago.
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Ainda nos termos do n.º 5 do artigo 24.º do RJAT “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previstos na Lei Geral Tributaria e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”, o que remete para o disposto nos artigos 43.º, n.º 1, e 61.º, n.º 5, de um e outro desses diplomas, implicando o pagamento de juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respetiva nota de crédito.
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Há́ assim lugar, na sequência de declaração de ilegalidade do ato de liquidação, ao pagamento de juros indemnizatórios, nos termos das citadas disposições dos artigos 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º, n.º 5, do CPPT, calculados sobre a quantia que a Requerente pagou indevidamente, à taxa dos juros legais (artigos 35.º, n.º 10, e 43.º, n.º 4, da LGT).
3. DECISÃO
Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral:
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Considerar o pedido procedente e determinar a anulação do ato da liquidação adicional de IRS referente a 2016, com o n.º 2020..., no montante de 2.878,27 €, bem como da liquidação de juros com o n.º 2020..., no montante de 69,31 que gerou o montante adicional de IRS a pagar de 555,13 €, conforme demonstração de acerto de contas com o n.º 2020 ...e condenar a Requerida a reembolsar a Requerente do valor pago indevidamente;
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Condenar a Requerida, nos termos do artigo 43.º, n.º 1 da LGT e 61.º, n.ºs 2 e 5 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), no pagamento dos juros indemnizatórios, à taxa resultante do n.º 4 do artigo 43.º da LGT, calculados sobre as quantias indevidamente pagas, desde o dia em que foram pagas até ao efetivo e integral reembolso das mesmas.
4. VALOR DO PROCESSO
Fixa-se o valor do processo em 595,98 € (quinhentos e noventa e cinco euros e noventa e oito cêntimos) nos termos do artigo 306.º, n.º 1 do CPC e do 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, interpretados em conformidade com o artigo 10.º, n.º 2, alínea e), do RJAT.
5. CUSTAS
Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 306.00 (trezentos e seis euros), a cargo da Requerida, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e do artigo 4.º, n.º 4, do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária e da Tabela I anexa ao mesmo.
Notifique-se.
Lisboa, 26 de Março de 2024
O Árbitro
Ana Teixeira de Sousa
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