SUMÁRIO:
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Tendo os Requerentes, na pendência do processo, obtido por via administrativa a satisfação do seu pedido, principal, há que concluir, relativamente a este, pela extinção da lide por inutilidade superveniente, nos termos art. 277.º, al. e), do CPC, subsidiariamente aplicável.
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Não há lugar ao pagamento de juros indemnizatórios quando o vício da liquidação decorreu de erro na declaração do sujeito passivo
DECISÃO ARBITRAL
A... E B..., com os números de identificação fiscal ... e ..., respetivamente, residentes na Av. ..., ..., ..., ...-... Estoril, apresentaram, nos termos legais, pedido de constituição de tribunal arbitral, sendo requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira.
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O pedido
Os Requerentes peticionam a anulação da liquidação adicional de IRS n.º 2022 ..., no montante total de € 111.499,32.
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O litígio
Segundo a sua fundamentação, a liquidação impugnada decorreu da aplicação da taxa de 28%, prevista no n.º 1 do artigo 72.º, ao saldo apurado entre as mais valias e menos valias, resultantes das operações inscritas no quadro 9 do anexo G; Para apuramento desse saldo não foram consideradas as perdas resultantes das operações inscritas nas linhas 9011, 9012, 9015, 9023, 9024, em cumprimento do determinado no n.º 5 do art. 43.º do CIRS, uma vez que a contraparte das operações tem domicílio ou sede nas Ilhas Caimão, território que integra a lista dos países, territórios ou regiões com regime fiscal claramente mais favorável.
Os Requerentes insurgem-se contra tal liquidação por considerarem que as suas contrapartes nas operações que originaram as perdas em questão não tinham domicílio nas Ilhas Caimão, mas sim as entidades emitentes dos títulos transacionados; ou seja , entendem que que a AT teria confundido os conceitos de entidade emitente dos valores mobiliários com o de contraparte nas operações.
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Tramitação processual
O processo foi aceite em 18-10-2023.
Os árbitros foram designados pelo Conselho Deontológico do CAAD, aceitaram o encargo, não tendo sido suscitada qualquer oposição.
O tribunal arbitral ficou constituído em 02/01/2024.
No prazo para apresentação da resposta, a AT resposta, a AT, em 9-01-2024, veio juntar aos autos um despacho da Srª Subdiretora Geral dos IR, atuando por delegação de competência, anulando a liquidação impugnada. Porém, consta de tal despacho o seguinte: no que concerne aos juros indemnizatórios, não existem motivos que justifiquem o correspondente pagamento.
Notificada para tal, a Requerente veio dizer: (…) apenas o primeiro pedido formulado pelos Requerentes foi atendido, permanecendo por atender e cumprir com a restituição do imposto pago em excesso e o pagamento de juros indemnizatórios, estes últimos defendidos pela Autoridade Tributária e Aduaneira como não devidos. Nesta conformidade, e atento o acima exposto, consideram os Requerentes não ter ocorrido a inutilidade superveniente da lide aduzida pela Autoridade Tributária e Aduaneira, porquanto, e salvo melhor entendimento, deve o processo prosseguir os seus trâmites normais, e o CAAD pronunciar-se pela restituição do imposto pago em excesso e pelo pagamento dos respetivos juros indemnizatórios atendendo a que a liquidação ora anulada pela Autoridade Tributária e Aduaneira apenas vigorou na esfera jurídico tributária dos Requerentes por erro imputável aos Serviços.
Por despacho arbitral, prescindiu-se da realização da reunião a que se refere o art. 18º do RJAT bem como da produção de alegações.
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Saneamento
O processo não enferma de nulidades ou irregularidades. Não existem razões que obstem ao conhecimento do mérito.
III -PROVA
Do exposto decorre a inutilidade da enumeração dos factos provados e não provados.
IV – O DIREITO
Relativamente ao pedido principal (anulação da liquidação) há consenso entre as partes, que o tribunal arbitral partilha, no sentido da inutilidade superveniente da sua apreciação.
O pedido de condenação da Requerida na restituição do imposto indevidamente pago é supérfluo, não carecendo de decisão autónoma, pois da anulação da liquidação decorre a obrigação legal de a administração de proceder à plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade (art. 100º,nº 1, da LGT- Naturalmente que a tradução primeira desta obrigação será a de repetir o indevido.
Relativamente aos juros indemnizatórios, consta do despacho revogatório acima mencionado, o seguinte:
29. Descendo ao caso vertido nos autos, importa salientar que não é controvertido nos autos, que foi o impetrante que indicou, no quadro 9, do anexo G, declaração modelo 3 vigente nº ... - 2021 - ...– ..., o país da contraparte de cada uma das mais e menos valias.
30. Justamente, a coluna intitulada “País da contraparte”, encontra-se direcionada à indicação do país da residência da contraparte - do adquirente.
31. Ou seja, a liquidação orientou-se, precisamente, no sentido dos elementos disponíveis à administração fiscal, aquando da respetiva emissão.
33. Como é percetível, não faz sentido que o contribuinte advogue o erro dos serviços, quando a administração fiscal limitou-se a aderir às informações fornecidas pelo próprio sujeito passivo.
O tribunal não tem elementos que permitam pôr em causa a veracidade de tais alegações.
Caberia ao sujeito passivo o ónus de as impugnar, quando exerceu, por escrito, o seu direito ao contraditório aquando da junção aos autos de tal despacho contraditório, o que não fez.
Assim sendo, não tendo ficado provada a existência de erro imputável aos serviços, improcede o pedido de condenação da Ré no pagamento de juros indemnizatórios.
III – DECISÃO
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Tendo os Requerentes, na pendência do presente processo, obtido, por via administrativa, a satisfação do seu pedido principal, há que concluir pela extinção da lide por inutilidade superveniente, nos termos art. 277.º, al. e), do CPC, subsidiariamente aplicável, com todas as consequências legais
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Improcede o pedido de condenação da Requerida no pagamento de juros indemnizatórios.
VALOR: € 111.499,32
CUSTAS, no montante de 3.060,00 euros, a cargo da Requerida pois a decisão de revogação do ato impugnado, a ser tomada, deveria ter acontecido no prazo estabelecido no artº 13º, nº 1, do RJAT. Porque apenas o fez em momento posterior, depois da constituição do tribunal arbitral, deu causa ao funcionamento deste, pelo que responde pelas custas arbitrais.
A improcedência do pedido relativo a juros indemnizatórios não releva para efeitos de custas, uma vez que o respetivo montante também não releva para efeitos de determinação do valor da ação.
19 de fevereiro de 2024
Os árbitros
Rui Duarte Morais (relator)
Francisco Nicolau Domingos
Filipa Barros