Acordam os Árbitros José Pedro Carvalho (Árbitro Presidente), João Sérgio Ribeiro e Manuel Pires, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem Tribunal Arbitral na seguinte
DECISÃO ARBITRAL
I – RELATÓRIO
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No dia 9 de Junho de 2014, A, Lda., adiante designada simplesmente por “Requerente”, pessoa coletiva n.º …, com sede na …, apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (doravante, abreviadamente designado RJAT), visando a declaração de ilegalidade do acto de autoliquidação de IRC do ano de 2012, correspondente a um montante de imposto que entendeu pago a mais, no valor de €153.675,00, e do pedido de reclamação graciosa que apresentou relativamente aos mesmos.
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Para fundamentar o seu pedido alega a Requerente, em síntese, que da leitura conjunta das disposições dos n.ºs 3/c)/7 e 4, ambos do artigo 4.º do CIRC, resulta que as prestações de serviços efectuadas a favor de sujeitos passivos de IRC, mas prestadas e utilizadas no estrangeiro, não são sujeitas a IRC, pelo que incorreu em erro ao autoliquidar o imposto em questão nos autos.
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No dia 11 de Junho, o pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite e automaticamente notificado à AT.
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A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os signatários como árbitros do tribunal arbitral colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
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Em 27 de Julho de 2014, as partes foram notificadas dessas designações, não tendo manifestado vontade de recusar qualquer delas.
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Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral colectivo foi constituído em 13 de Agosto de 2014.
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No dia 1 de Outubro de 2014, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua resposta defendendo-se por impugnação, e sustentando, em suma, que da leitura conjunta das disposições dos n.ºs 3/c)/7 e 4, ambos do artigo 4.º do CIRC, resulta que as prestações de serviços efectuadas a favor de sujeitos passivos de IRC, mas prestadas e utilizadas no estrangeiro, são sujeitas a IRC, pelo que a Requerente não incorreu em erro ao autoliquidar o imposto em questão nos autos.
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Posteriormente, notificadas para o efeito, ambas as partes vieram aos autos comunicar que prescindiam da realização da reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, bem como da apresentação de alegações, pelo que a realização da primeira reunião do Tribunal Arbitral, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 18.º do RJAT, foi dispensada, atendendo a que, no caso, não se verificava qualquer das finalidades que legalmente lhe estão cometidas, e que o processo arbitral se rege pelos princípios da economia processual e proibição da prática de actos inúteis, tendo sido fixado o prazo de 30 dias para a prolação de decisão.
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O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5º. e 6.º, n.º 1, do RJAT.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.
O processo não enferma de nulidades.
Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.
Tudo visto, cumpre proferir
II. DECISÃO
A. MATÉRIA DE FACTO
A.1. Factos dados como provados
1- A liquidação a que se referem os presentes autos resultou de uma acção de inspecção tributária realizada pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Braga (doravante simplesmente IT) a coberto das ordens de serviço n.º …, de 2013-09-18, e n.º …, de 2013-08-14.
2- O referido procedimento de inspecção que deu origem a um Relatório de Inspecção Tributária, que foi notificado à ora reclamante por via do ofício da Direcção de Finanças de Braga - Serviços de Inspecção Tributária n.º …, de 2013-10-01.
3- O imposto em causa foi liquidado/entregue por regularização voluntária do sujeito passivo, na sequência da opinião manifestada pelos inspectores incumbidos do procedimento inspectivo no sentido de que o imposto era devido, tendo a ora Requerente entregue voluntariamente a respectiva declaração de retenções na fonte de IRC n.º …, em 2013.09.24, reportando-se ao período de Janeiro de 2012, com o código “202-IRC- Comissões por intermediação em quaisquer contratos e prestações de serviços”, que tinha como prazo limite para pagamento 20.02.2012.
4- O referido montante foi tempestivamente pago.
5- No ano de 2011, a Requerente comprometeu-se em contratos de prestações de serviços de assistência técnica em Angola, a empresas angolanas, colocando à disposição um corpo técnico, meios e infraestruturas técnicas, designadamente para a elaboração de assistência técnica em projetos de instalações eléctricas, energias alternativas e consultoria de instalação e manutenção de ....
6- Para efectuar essa prestação de serviços em Angola, a Requerente recorreu à subcontratação desses recursos, meios e infraestruturas, em 2011, à B, que é uma sociedade de direito angolano e que em 2011 não tinha atividade operacional em Portugal, nem fora de Angola.
7- As prestações de serviços que Requerente efectuou, tendo sido realizadas em Angola, foram consideradas pela AT como não sujeitas a IVA.
8- As prestações de serviços que a Requerente adquiriu à B, por subcontratação, foram consideradas sujeitas a IVA em território nacional ao abrigo da alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA.
9- Estando em causa um SP sem sede, estabelecimento estável ou domicílio em território nacional, foi aplicado o mecanismo de reverse charge.
10- O preço das referidas prestações de serviços da B à Requerente, no exercício de 2011, foi de €1.024.500,00, preço que lhe foi pago.
11- Sobre esse preço de €1.024.500,00 que, à taxa de 15%, foi apurado o valor de €153.675,00 de IRC que foi entregue ao Estado pela Requerente.
12- Foi esse valor que foi inscrito na supra-referida declaração de retenções na fonte de IRC n.º …, em 2013.09.24.
13- Em 09-12-2012, a Requerente apresentou reclamação graciosa da autoliquidação referida em 3, nos serviços competentes.
14- A reclamação graciosa foi indeferida por despacho datado de 05-03-2014, notificado por correio registado, enviado em 13-03-2014.
A.2. Factos dados como não provados
Com relevo para a decisão, não existem factos que devam considerar-se como não provados.
A.3. Fundamentação da matéria de facto provada e não provada
Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).
Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao atual artigo 596.º, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, a prova documental e o PA juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.
B. DO DIREITO
Como bem sintetiza a AT, em causa nos autos está dar resposta a uma única questão que é a de saber “se os rendimentos decorrentes de prestação de serviços de assistência técnica realizados em território angolano, por entidade com sede e direcção efectiva em Angola e sem estabelecimento estável em Portugal, estão sujeitas a IRC a pagar por via do mecanismo de retenção na fonte por serem devidos por entidade com sede em Portugal.”, ou se, para que tal sujeição ocorra, é necessário que os serviços sejam realizados ou utilizados em Portugal.
Concretamente, tendo a Requerente subcontratado uma empresa não residente e sem estabelecimento estável em Portugal (angolana) para efectuar em Angola prestações de serviços de assistência técnica a que se obrigara, está em causa saber se será devido, pela empresa estrangeira, IRC ao Estado Português, assistindo à Requerente a correspondente obrigação de retenção daquele imposto na fonte.
A resposta à questão colocada, deriva directamente da interpretação que for dada às normas do n.º 2, do n.º 3, al. c)/7, e do n.º 4, todos do artigo 4.º do CIRC, cuja redacção era, à data relevante, a seguinte:
“2 - As pessoas coletivas e outras entidades que não tenham sede nem direção efetiva em território português ficam sujeitas a IRC apenas quanto aos rendimentos nele obtidos.
3 - Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se obtidos em território português os rendimentos imputáveis a estabelecimento estável aí situado e, bem assim, os que, não se encontrando nessas condições, a seguir se indicam: (...)
c) Rendimentos a seguir mencionados cujo devedor tenha residência, sede ou direção efetiva em território português ou cujo pagamento seja imputável a um estabelecimento estável nele situado: (...)
7) Os derivados de outras prestações de serviços realizados ou utilizados em território português, com exceção dos relativos a transportes, comunicações e atividades financeiras; (...)
4 - Não se consideram obtidos em território português os rendimentos enumerados na alínea c) do número anterior quando os mesmos constituam encargo de estabelecimento estável situado fora desse território relativo à atividade exercida por seu intermédio e, bem assim, quando não se verificarem essas condições, os rendimentos referidos no n.º 7 da mesma alínea, quando os serviços de que derivam, sendo realizados integralmente fora do território português, não respeitem a bens situados nesse território nem estejam relacionados com estudos, projetos, apoio técnico ou à gestão, serviços de contabilidade ou auditoria e serviços de consultoria, organização, investigação e desenvolvimento em qualquer domínio.”
Desta prosa legislativa, retira a Requerente o entendimento de que no caso concreto não estaria obrigada à retenção na fonte de IRC que lhe está a ser exigida, porquanto os serviços por si pagos não foram nem realizados, nem utilizados, em território português.
Por outro lado, do mesmo quadro, retira a AT o entendimento de que aquela retenção será devida, desde que a entidade devedora do rendimento, seja residente em território português, mesmo que o serviço prestado não tenha sido realizado ou utilizado naquele território.
Vejamos, então.
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O conglomerado normativo em causa, carece, desde logo, de uma desconstrução no sentido de, na medida do possível, tornar minimamente compreensível o seu teor, na situação concreta a que se há-de aplicar.
Assim, e expurgando aquele dispositivo legal das passagens alheias ao caso concreto, chegar-se-á a um enunciado assente nos seguintes pontos:
- as pessoas colectivas e outras entidades que não tenham sede nem direcção efectiva em território português ficam sujeitas a IRC apenas quanto aos rendimentos nele obtidos;
- considerando-se como tal aqueles cujo devedor tenha residência, sede ou direcção efectiva em território português ou cujo pagamento seja imputável a um estabelecimento estável nele situado, derivados de outras prestações de serviços[1] realizados ou utilizados em território português, com excepção dos relativos a transportes, comunicações e atividades financeiras;
- excepto quando os mesmos:
o constituam encargo de estabelecimento estável situado fora do território português, relativo à actividade exercida por seu intermédio; e, bem assim
o quando os serviços de que derivam, sendo realizados integralmente fora do território português:
§ não respeitem a bens situados nesse território;
§ nem estejam relacionados com estudos, projectos, apoio técnico ou à gestão, serviços de contabilidade ou auditoria e serviços de consultoria, organização, investigação e desenvolvimento em qualquer domínio.
A operação que se vem de executar, evidencia desde logo, a operatividade normativa desta última referência, à ausência de relação dos serviços prestados com, designadamente, o apoio técnico.
Assim, a regra será, na matéria que nos ocupa, a resultante da conjugação do n.º 2, com o n.º 7, da al. c) do n.º 3, ambos do artigo 4.º do CIRC, ou seja, a de que se consideram obtidos em território português, os rendimentos cujo devedor tenha residência, sede ou direcção efectiva em território português ou cujo pagamento seja imputável a um estabelecimento estável nele situado, derivados de outras prestações de serviços[2] realizados ou utilizados em território português.
A excepção a esta regra, será a de que os rendimentos não se considerarão como obtidos em território português, quando os serviços de que derivam, apesar de utilizados em território português[3], sejam realizados integralmente fora dele desde que:
- não respeitem a bens situados em território português; ou
- os serviços não estejam relacionados, para o que nos interessa, com apoio técnico.
Deste modo, e em suma, à regra de que os rendimentos cujo devedor tenha residência, sede ou direcção efectiva em território português ou cujo pagamento seja imputável a um estabelecimento estável nele situado, derivados de outras prestações de serviços[4] realizados ou utilizados em território português, se consideram obtidos em território português, será oponível a excepção de que os mesmos foram integralmente realizados fora do território português. A esta excepção, todavia, será inoponível à AT quando, não obstante integralmente realizados fora do território português, os serviços estiverem relacionados, para o que nos interessa, com apoio técnico.
Dito de outro modo, para demonstrar o seu direito de tributação de determinados rendimentos de um não-residente sem estabelecimento estável em território português, a AT terá de demonstrar que os mesmos foram obtidos naquele território (n.º 2 do artigo 4.º do CIRC), o que, na matéria que ora nos ocupa, se traduz nos seguintes factos:
- que o devedor tem residência, sede ou direcção efectiva em território português ou cujo pagamento é imputável a um estabelecimento estável nele situado (n.º 3/c do artigo 4.º do CIRC);
- que os rendimentos são derivados de outras prestações de serviços[5] realizados ou utilizados em território português ((n.º 3/c)/7) do artigo 4.º do CIRC).
Serão, estes, então, os factos cuja prova constituirá um ónus da AT, para fundamentar aquele seu direito.
Feita essa prova, a contraparte da AT, poderá demonstrar vários factos, que serão impeditivos daquele direito da AT a tributar, integrando aqueles matéria de excepção (peremptória, no caso), nos termos definidos pelo artigo 576.º do Código de Processo Civil: “factos que impedem, modificam ou extinguem o efeito jurídico dos factos articulados pelo autor”.
Tais factos, passarão, por exemplo, pela demonstração que:
- se trata de serviços relativos a “relativos a transportes, comunicações e atividades financeiras” (n.º 3.º/c)/7 do artigo 4.º do CIRC);
- os rendimentos que a AT pretende tributar o constituem encargo de estabelecimento estável situado fora do território português, relativo à actividade exercida por seu intermédio (n.º 4, primeira parte, do artigo 4.º do CIRC);
- os serviços dos quais os rendimentos derivam foram realizados integralmente fora do território português.
A última daquelas excepções – ou seja, a de que os serviços dos quais os rendimentos derivam foram realizados integralmente fora do território português – será inoperante quando os serviços em causa, apesar de realizados integralmente fora do território português:
o respeitam a bens situados naquele território;
o estão relacionados com estudos, projectos, apoio técnico ou à gestão, serviços de contabilidade ou auditoria e serviços de consultoria, organização, investigação e desenvolvimento em qualquer domínio.
Este será, então, o conteúdo normativo decorrente dos textos legais analisados.
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A interpretação acima efectuada, é, de resto, aquela que se apresenta mais coerente, com a sistemática legal.
De facto, e no contexto do próprio CIRC, haverá desde logo que ter em conta o teor do respectivo artigo 94.º, que dispõe, para além do mais, o seguinte:
“1 - O IRC é objeto de retenção na fonte relativamente aos seguintes rendimentos obtidos em território português: (...)
f) Rendimentos referidos na alínea d) do n.º 3 do artigo 4.º obtidos por entidades não residentes em território português, quando o devedor dos mesmos seja sujeito passivo de IRC ou quando os mesmos constituam encargo relativo à atividade empresarial ou profissional de sujeitos passivos de IRS que possuam ou devam possuir contabilidade.
g) Rendimentos provenientes da intermediação na celebração de quaisquer contratos e rendimentos de outras prestações de serviços realizados ou utilizados em território português, com exceção dos relativos a transportes, comunicações e atividades financeiras.
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se obtidos em território português os rendimentos mencionados no n.º 3 do artigo 4.º, excetuados os referidos no n.º 4 do mesmo artigo.”
Ou seja, e para o que interessa, apenas existe obrigação de retenção na fonte, os rendimentos referidos na alínea d) do n.º 3 do artigo 4.º, obtidos por entidades não residentes em território português, e não outros, designadamente que resultassem de uma interpretação do n.º 4 do referido artigo 4.º, confirmando, o n.º 2, da norma transcrita, que o n.º 4 do artigo 4.º, acima analisado, tem uma função – exclusivamente – excepcionante.
Deste modo, e em suma, mesmo que se concluísse, como faz a AT, que o n.º 4 do artigo 4.º do CIRC teria uma intenção de alargar o âmbito de sujeição fixado no n.º 7 da al. c) do n.º 3 que o precede, para o caso de serviços relacionados com estudos, projetos, apoio técnico ou à gestão, serviços de contabilidade ou auditoria e serviços de consultoria, organização, investigação e desenvolvimento em qualquer domínio, prescindindo da sua realização ou utilização em território português, em tal caso, inexistiria qualquer obrigação de retenção na fonte, uma vez que o artigo 94.º do CIRC, apenas a fixa, expressamente, para as situações a que a alínea d) do n.º 3 do artigo 4.º (artigo 94.º/1/f) do CIRC), nunca prescindindo, no que a prestações de serviços diz respeito, da sua realização ou utilização em território português (artigo 94.º, n.º 1/g) e 2, do CIRC).
Esta solução, de resto, está em sintonia com o regime do CIRS, que no seu artigo 18.º/1/f) dispõe que:
“Consideram-se obtidos em território português: (...)
f) Os rendimentos que não se encontrem previstos na alínea anterior decorrentes de atividades profissionais e de outras prestações de serviços, incluindo as de caráter científico, artístico, técnico e de intermediação na celebração de quaisquer contratos, realizadas ou utilizadas em território português, com exceção das relativas a transportes, telecomunicações e atividades financeiras, desde que devidos por entidades que nele tenham residência, sede, direção efetiva ou estabelecimento estável a que deva imputar-se o pagamento;”[6].
Ou seja, não prescindindo o CIRS da conexão derivada da realização ou utilização dos serviços em território português, não se vê razão – pelo contrário – para que o CIRC o faça.
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Face a todo o exposto, uma vez que:
- o direito da AT tributar rendimentos de uma entidade não-residente, sem estabelecimento estável em território português, implica a demonstração de que os mesmos foram obtidos naquele território (n.º 2 do artigo 4.º do CIRC), o que, na matéria que ora nos ocupa, se traduz nos seguintes factos:
o que o devedor tem residência, sede ou direcção efectiva em território português ou cujo pagamento é imputável a um estabelecimento estável nele situado (n.º 3/c do artigo 4.º do CIRC);
o que os rendimentos são derivados de outras prestações de serviços[7] realizados ou utilizados em território português ((n.º 3/c)/7) do artigo 4.º do CIRC);
- não estando em causa que os serviços tenham sido realizados ou utilizados em território português;
deve o acto tributário sub iudice ser anulado, procedendo o pedido arbitral formulado nos autos, sendo que se não se realizarem nem utilizarem os serviços em Portugal, dispensar-se-á a consideração das excepções do 4.º, n.º 4, do CIRC, que só funcionam no pressuposto de haver tributação no âmbito do n.º 3/c)/7 do artigo 4.º do CIRC – o que, no caso, se entende não acontecer.
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Peticiona, ainda, a Requerente a condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios.
Como se escreveu no Ac. do STA de 06-02-2013, proferido no processo 0839/11[8], para cuja se fundamentação, no mais, se remete, “Há direito a juros indemnizatórios nos termos da alínea c) do n.º 1 do art. 43.º da LGT, quando a reclamação graciosa de um acto de autoliquidação é decidida favoravelmente ao contribuinte e a decisão é proferida mais de um ano a contar da data da apresentação da reclamação e o atraso não for imputável à Administração Tributária.”.
No caso, não tendo sido a reclamação graciosa decidida a favor do contribuinte, mas sendo-o, a presente acção, não se vê razão para divergir do expendido naquele aresto.
Deste modo, entende-se serem, no caso, devidos juros indemnizatórios, contados a partir de 10-12-2013.
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C. DECISÃO
Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral:
a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, anulando o acto de autoliquidação de IRC do ano de 2012, na parte correspondente à declaração de retenções na fonte de IRC n.º …, em 2013.09.24, campo 202, no valor de €153.675,00;
b) Condenar a AT no pagamento de juros indemnizatórios, sobre a quantia referida, contados desde 10-12-2013, até integral pagamento.
c) Condenar a AT nas custas do processo, no montante de €3.672,00.
D. Valor do processo
Fixa-se o valor do processo em €153.675,00, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
E. Custas
Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em €3.672.00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela AT, uma vez que o pedido foi apenas totalmente procedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.
Notifique-se.
Lisboa
9 de Dezembro de 2014
O Árbitro Presidente
(José Pedro Carvalho - Relator)
O Árbitro Vogal
(João Sérgio Ribeiro)
O Árbitro Vogal
(Manuel Pires - vencido)
DECLARAÇÃO DE VOTO
Votei vencido nos termos seguintes: Qualquer situação subsumível ao artigo 4.º n.º 3, alínea c), 7) do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC), disposição invocada no processo [os rendimentos da assistência técnica-sobre cuja natureza não há dissensão -, são regulados pelo 3) da mesma disposição, visto serem rendimentos de aplicação de capitais, conforme resulta do artigo 5.º, n.º 2, alínea m) do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), com remissão pelo artigo 94.º, n.º 1 alínea c) do CIRC, excluindo portanto o citado 7) que é residual] não pode ser resolvida, no sentido da inclusão ou da exclusão, sem se atender ao artigo 4.º n.º 4, 2ª parte – a única que ora interessa.
Por seu turno, este n.º 4, 2ª parte, conexiona-se exclusivamente com o 7) e, para ter efeito útil, tem de o complementar. Nela se estabelece não serem considerados obtidos em território português os rendimentos dos serviços de que derivam, sendo realizados integralmente fora do território português, não respeitantes a bens situados nesse território NEM ESTEJAM RELACIONADOS COM ESTUDOS, etc. (a relevância é nossa). Se a regra, no n.º 4, 2ª parte, é a não obtenção dos correspondentes rendimentos em território português, então, a excepção só pode significar que os rendimentos RELACIONADOS COM ESTUDOS, etc. são considerados obtidos em território português, visto claramente serem a excepção ao disposto no início da disposição (Não se consideram obtidos em território português) e não que se tivesse deixado em aberto a solução relativa aos rendimentos RELACIONADOS COM ESTUDOS, etc., solução que dependeria da utilização ou não utilização em território português exigida pelo 7), como fundamenta o acórdão, não se descortinando razão para tal dada a natureza desses rendimentos afim dos rendimentos da assistência técnica, para os quais é suficiente a conexão financeira (artigo 4.º, n.º 3, alínea c) do CIRC e artigos 5.º, n.º 2, alínea m) e 18.º, n.º 1, alínea d) do CIRS) e ainda mais estranhamente quando a localização da utilização desses serviços pode suscitar tantas dificuldades. Aliás, este n.º 4, na parte que interessa, refere-se a rendimentos que, mesmo pelo 7), pelo menos, muitas vezes, não poderiam ser considerados como utilizados em território português (designadamente no caso de imóveis), mas elimina todas as dúvidas, o que demonstra bem o seu carácter esclarecedor e, portanto, facilitador da interpretação, carácter que deve ser considerado em toda a sua extensão. A solução agora sustentada implica, pois, não só eliminar as dificuldades da localização da utilização de prestações de serviços – tanto na regra como nas excepções –, mas também coincide, como se viu, com o regime adoptado para os rendimentos da assistência técnica, regime que corresponde aos vectores da política fiscal de países do tipo do nosso, política reflectida, embora limitadamente, em algumas convenções para evitar as duplas tributações celebradas pelo nosso País e na reserva formulada por Portugal ao artigo 12.º, n.º 2 do Modelo de Convenção da OCDE sobre o Rendimento e o Capital, reserva para evitar a aplicação do artigo 7.º do mesmo Modelo a esse rendimentos e para possibilitar a adopção para eles, no Direito Convencional, do factor de conexão financeira.
Quanto ao argumento, relativamente à não sujeição, que se pretende retirar do disposto no artigo 94.º, n.º 1, alínea f), prova demais. É suficiente, para o efeito, comparar essa alínea f) com outras alíneas do mesmo número e atentar no disposto no mesmo artigo 94.º n.º 3, alínea b) e n.º 5, sempre importando, aliás, a compatibilização da disciplina legal subordinada da retenção na fonte com os normativos relativos à sujeição tributária.
Por último, o apelo ao estabelecido no artigo 18.º, n.º 1, alínea f) do CIRS nada prova, porque essa disposição e o n.º 3 do mesmo artigo, que torna aplicável o artigo 4.º n.º 4 do CIRC, repetem, mutatis mutandis, o estabelecido no CIRC e que suscita a questão nuclear do processo e já objecto de dilucidação. Aliás, o artigo 18.º, n.º 1 torna bem clara a distinção entre os rendimentos como são considerados no processo [n.º 1, alínea f)] e os rendimentos da assistência técnica [ n.º 1, alínea d)] , natureza dos rendimentos em causa.
Manuel Pires
[1] Que não as incluídas nos pontos 1 a 7 da al. c) do n.º 3 do artigo 4.º do CIRC.
[2] Que não as incluídas nos pontos 1 a 7 da al. c) do n.º 3 do artigo 4.º do CIRC.
[3] Conditio sine qua non para haja tributação em Portugal e para que, por conseguinte, se justifique a excepção.
[4] Que não as incluídas nos pontos 1 a 7 da al. c) do n.º 3 do artigo 4.º do CIRC.
[5] Que não as incluídas nos pontos 1 a 7 da al. c) do n.º 3 do artigo 4.º do CIRC.
[7] Que não as incluídas nos pontos 1 a 7 da al. c) do n.º 3 do artigo 4.º do CIRC.