Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 445/2023-T
Data da decisão: 2024-02-22  IRS  
Valor do pedido: € 12.286,40
Tema: Inutilidade superveniente da lide.
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SUMÁRIO

Quando, na pendência da instância, se verifique ter ocorrido a satisfação voluntária das pretensões da Requerente, por parte da Requerida, dá-se a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, como causa de extinção da instância.

 

DECISÃO ARBITRAL

I – Relatório

1.A..., contribuinte n.º..., residente em ..., ..., na Alemanha, veio requerer, ao abrigo do disposto nos art. 2.º/1 a) e 10.º e seguintes do DL 10/2011, de 20.1 (Regime da Arbitragem em Matéria Tributária) e dos art. 1.º e 2.º da Portaria 112-A/2011, de 22.3 a constituição de Tribunal Arbitral e deduzir o respectivo pedido de pronúncia sobre o acto de indeferimento tácito da Reclamação graciosa apresentada em 28.11.2022 do acto de liquidação do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas singulares (IRS) n.º 2022..., respeitante aos rendimentos auferidos no ano de 2021, no valor total de 12.286,40 € (doze mil duzentos e oitenta e seis euros e quarenta cêntimos)

2.É requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante referida por AT ou Requerida.

3.Em 21 de Junho de 2023 o pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Ex.mo Presidente do CAAD e seguiu a sua normal tramitação com a notificação da AT.

4.De acordo com o preceituado nos artigos 5.º/3 a), 6.º/2 a) e 11.º/1 a) do RJAT, o Ex.mo Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou o árbitro do Tribunal Arbitral singular, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável. As Partes, notificadas dessa designação, não manifestaram vontade de a recusar.

5.O Tribunal Arbitral ficou constituído em 30 de Agosto de 2023.

6.Notificada a Requerida, na mesma data, para apresentar resposta no prazo de 30 dias, veio a mesma, em 29 de Setembro de 2023, apresentar um Requerimento informando ter sido deferida em 26 de Junho de 2023 a reclamação graciosa apresentada pela Requerente, deferimento esse que foi notificado a esta em 30 de Junho de 2023.

7.Nesses termos, a pretensão da Requerente encontrar-se-ia satisfeita.

8.Em 6 de Outubro de 2023 a Requerente apresentou um Requerimento solicitando a declaração da extinção da instância por inutilidade superveniente da lide e bem assim a responsabilização da AT pelo pagamento da totalidade das custas.

 

II. Saneamento

9.O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos dos art. 2.º/1 a), 4.º, e 5.º, todos do RJAT.

10.As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão regularmente representadas, nos termos dos art. 4.º e 10.º/2 do RJAT, e dos art. 1.º a 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

11.O processo não enferma de nulidades.

III. Matéria de facto

Factos provados

12.Os factos relevantes para a decisão da causa que são tidos como assentes são os seguintes:

  1. Em 27 de Junho de 2023 a AT foi notificada da apresentação do pedido de pronúncia arbitral relativa ao indeferimento tácito da Reclamação graciosa apresentada em 29 de Novembro de 2022 do acto de liquidação do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas singulares (IRS) n.º 2022...;
  2. Em 30 de Agosto de 2023 o Tribunal Arbitral foi constituído;
  3. Em 29 de Setembro de 2023 a AT comunicou ter sido deferida em 26 de Junho de 2023 a reclamação graciosa apresentada pela Requerente, deferimento esse que foi notificado a esta em 30 de Junho de 2023.

Factos não provados

13.Não há factos relevantes para esta decisão arbitral que não se tenham provado.

 

14.O tribunal formou a sua convicção quanto à factualidade provada ou não provada com base nos documentos juntos à petição e no processo arbitral.

15.Ao Tribunal incumbe o dever de seleccionar os factos que interessam à decisão e discriminar a matéria que julga provada e declarar a que considera não provada, não tendo de se pronunciar sobre todos os elementos da matéria de facto alegados pelas partes, tal como decorre da aplicação conjugada do art. 123.º/2, do Código de Procedimento e Processo Tributário e do art. 607.º/3, do CPC, aplicáveis por força do art. 29.º/1, a) e e) do RJAT.

 

III. Matéria de Direito

16.Tendo sido deferida a reclamação graciosa apresentada pela Requerente, cumpre apreciar a utilidade da apreciação do pedido.

17.A respeito da inutilidade superveniente da lide pronunciou-se já o Supremo Tribunal Administrativo em acórdão de 30 de Julho de 2014, proferido no âmbito do processo n.º 0875/14, no qual referiu que [a] inutilidade superveniente da lide (que constitui causa de extinção da instância - al. e) do art. 277º do CPC) verifica-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a solução do litígio deixe de interessar, por o resultado que a parte visava obter ter sido atingido por outro meio.

18.A doutrina tem também conferido ao conceito em análise esse mesmo sentido referindo Lebre de Freitas, Rui Pinto e João Redinha que a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide dá-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo, ou encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida. Num e noutro caso, a solução do litígio deixa de interessar – além, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por já ter sido atingido por outro meio (Código de Processo Civil Anotado, Vol. 1, 2.ª Ed., Coimbra Editora, 2008, p. 555).

19.Ora, conforme resulta da matéria de facto dada como provada nos presentes autos, a reclamação graciosa apresentada pela Requerente foi deferida pela AT, com a consequente revogação do acto tributário, o que implica a inutilidade e impossibilidade deste tribunal declarar a ilegalidade e determinar a consequente anulação de um acto que já se encontra suprimido da ordem jurídica.

20.Com a referida revogação, a Requerente atingiu a totalidade dos efeitos pretendidos com o presente pedido de pronúncia arbitral, já que a AT reconheceu no acto de revogação anulatória o direito aos juros indemnizatórios que aquela havia peticionado.

21.Em face do exposto entende este tribunal que se verifica a inutilidade superveniente da lide quanto à apreciação da legalidade e consequente anulação do acto tributário e da decisão de indeferimento da reclamação graciosa impugnados pela Requerente, de tal forma que se julga extinta a instância nos termos e para os efeitos previstos no artigo 277.º e), do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º/1 e), do RJAT.

22.Sendo certo que, tal como a Requerente afirma, o deferimento da reclamação ocorreu depois do prazo que lhe permitiu assumir o indeferimento tácito e que a informação sobre esse deferimento surgiu depois de apresentado o pedido de pronúncia arbitral, não pode deixar de se considerar que, tendo a Requerida dado causa à inutilidade superveniente da lide, deve a mesma suportar a totalidade das custas (no sentido da pretensão formulada pela Requerente que não mereceu oposição por parte da Requerida).

IV. Decisão

Em face do supra exposto, decide-se

  1. Julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide;
  2. Condenar a Requerida nas custas do processo.

V. Valor do processo

De harmonia com o disposto no art. 306.º/2, do CPC e 97.º-A/1 a), do CPPT e 3.º/2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de 12.286,40 € (doze mil duzentos e oitenta e seis euros e quarenta cêntimos), indicado pela Requerente sem oposição da Autoridade Tributária e Aduaneira

VI. Custas

Nos termos da Tabela I anexa ao RCPAT, as custas são no valor 918.00 € (novecentos e dezoito euros), a pagar pela Requerida, nos termos dos artigos 12.º/2, e 22.º/4, do RJAT, e artigo 4.º do RCPAT.

 

Notifique-se.

Lisboa, 22 de Fevereiro 2024

 

O Árbitro

 

 

Rui M. Marrana

Texto elaborado em computador, nos termos do disposto

no art. 131.º/5, do CPC, aplicável por remissão do art. 29.º/1 e), do RJAT.

A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.